You are on page 1of 18
Pro-Posigdes - vol 13, N. 3 (39) - set/cez. 2002 Literatura e Trauma Mario Seligman Sea Resumo: O autor apresenta um histérico do conceito de trauma dentro das teorias psicanalitcas dos primeizos trabalhos de Freud até os trbalhos atuais que pensam trauma, quer como uma modalidae do “real” lacaniano, quer como coneeitos, tal qual 0 ” (SA, 1960, p. 72). A histeria seria uma doen- ca desencadeada por uma reagio de defesa diante de uma nova situagio que recalearia a representacio inaceitivel. Freud escreveu entio que “a defsa obtém sucesso na expulido da representagaoinsuportiel do cnscent, se existe cenas seats ina tis enguanto recordagies inconcientes na pessoa em questa, até ent saudvel, ese a represen tao a ser recalcada pode ser colocada em wma relagio association com uma tal vivénca injanté” (SA, 1960, p. 71). A cena primaria — a cena da seducio — seria a base da situagio traumitica, que se da a posteriori, em uma segunda situagao que chama- ria A tona aquela “‘protocena” recalcada. Aqui jé estio os elementos centrais da For oct eisa coresentacdo paroxtmica do concets de tours, sequternos — com agns denon raver que. aberdogem do autor vctod para. cinica — perso Gesc6 no Figo de HOH EBER, Erentucimerte ndicarees outs ones bologfcas pars os res nlewssodos mse opohandar Na euxetoo. 137 Pro-Posig6es - vol. 13, N. 3 (39) - set/dez. 2002 teoria do inconsciente, da associagio, do recalque ¢ da temporalidade complexa da economia psiquica: todos articulados em torno de uma teoria do trauma. E sabido que Freud posteriormente abandonou a tese da realidade da "protocena” em favor de uma teotia de sua qualidade fantasmitica? A etiologia realista foi substituida — nunea de modo definitivo, no entanto — por uma teoria que leva ‘em conta as fases libidinais. (LAPLANCHE, PONTALIS, 1988, p. 682) Por ou- tro lado, com a Primeira Guerra Mundial, a questio do trauma externo volta a ser decisiva pata a psicanilise, Nas suas Verksungen zur Einfibrung in die Prychoanalse (1915-17), compostas durante esse periodo de guerra, Freud trata das neuroses traumiticas a partir da experiéncia coetinea dos soldados e sobreviventes daque- le evento, Essas neuroses traumaticas sio caractetizadas, escreveu Freud cntio, pela “fixagao no momento do acidente traumatico que esti na sua base. Esses doentes repetem nos seus sonhos regularmente a situagio traurmitica. Quando ‘ocorrem ataques de tipo histérico, que permite uma anélise, percebe-se que 0 ataque cotresponde a uma total transposicio naquela situagio. E. como se esses pacientes nfo tivessem se desvencithado da situagao traumética, como se ela esti- vesse diante deles como uma tarefa [Aufgate] no dominada e nds aceitamos com toda seriedade esse ponto de vista [.”" SA, 1960, cap. I, p. 274). Freud percebe lum paralelo evidente desses casos com as neuroses espontineas. Bles permitem descortinar uma visio da economia do funcionamento da nossa psique. Afinal, para Freud, “a expressio [‘traumitico’] nao tem outro sentido, que nfo econémi- co. Nés — afitmou ele — assim denominamos a uma vivencia que traz em um petiodo de tempo curto um erescimento de estimulo de tal ordem, que 0 trans- porte [Frledigung] ou elaboracio [Aufarbeig] da mesma no se di do modo nor- ‘mal, do que resultam distérbios duradouros no funcionamento energético” GA, 1960, p. 275). ‘Alguns anos depois, em Jenseits des Lasipringjps (1920), essa teoria da neurose de guerra foi desenvolvida dentro de uma reflexio sobre as pulsdes. Esse texto também deve ser entendido dentro dos esforcos da psicanilise de entio no senti- do de dar conta dos efeitos dos eventos traumaticos da guerra. Em 1918 um congresso sobre a psicanilise das neuroses de guetta foi realizado em Budapeste com contribuigdes de Ferenczi, Abraham, Simmel e Jones, as quais, no ano se- guinte, foram publicadas em um volume prefaciado pelo proprio Freud. O im- portante para nds no ensaio de Freud de 1920 & a relagio que ele destaca entre 0 trauma ¢ 0 pavor (ou susto, Schreck) que representaria uma quebra na nossa Angtbercitschafi — uma anggstia que tem 0 valor positive de nos preparar para 0 desconhecido —e do nosso pira-excitagdes (Reigschuls). O trauma é deserito como uma fixagao psfquica na situacio de ruptura. Esse tipo de fixagio Freud compara a do paciente histérico que para ele também é alguém que “softe de reminiscén- 2, BORLESER (2000, p. 799) ecoxde ume oxa do oud a Fle co 219.1697, na gud ee expen pera.0 ‘extova cbardonando ¢ feofa oo seaugd0. Em peta gat eo porcebsu quo na ext bone Sucess0 na sun trap votods para acotose do pociete uo ovelaroo Gace oigndra: em sag.ngo lugot a floabincs das nesoass nscale 8 crenga na pices em masa Ge cous sane ro os tomas or iio, ews abondera @ feera da recov da cana vecclcoda deviso & propa caroctersicu do mates inconscieie: uma vee que N00 erste clgo como um sina de veokcode no Recrecierte no fers ura base sckda po sepa 7500 63 verdad, 138 Pro-Posig6es - vol. 13, N. 3 (39) - set dex, 2002 cits” (SA, 1960, ILL, p. 223). A quarta parte do Pans além do principio do prageralbre com 0 aniincio intrigante e nada gratuito: “O que se segue é especulagio, com freqiiéncia uma especulagio que vai longe demais, que cada um, segundo a sua pripria posicio, iri clogiar ou desprezar” (SA, 1960, p. 234). Apés localizar 0 sistema consciente de percepgio no local externo do eérebro, no cértex, ele afir- ma que “todos os processos de excitagio [Ermgmenorging| deixam nos outros sistemas, como base da meméria, marcas duradouras, restos de recordagao por- tanto, que nio tem nada a ver com o tornar-se consciente. Elas sio normalmente mais fortes € duradouras quando 0 proceso que as eriow nunca chegou a consci- éncia” (SA, 1960, p. 257). O que Freud introduz aqui € 2 interessante ¢ arriscada tese — na verdade jé ensaiada por ele e Breuer nos anos 90 — da incompatibili- dade de registros simultineos no sistema percepgio-consciéncia e no inconscien- tes “das Bewyftscin entstebe an Stelle der Exinerungsipu”, “a conscéncia surge no lngar do ‘rapo mmeminice”,escreveu cle entio (SA, 1960, p. 237). A neurose de guerra marcada pela quebra do para-excitagdes levaria o individuo a uma regressio a modos de reagio primitivos. As imagens do trauma que se repetem nos sonhos visam, para Freud, “reparar um dominio da excitagio com base no desenvolvimento da an- ‘gistia, cujo fracasso foi a causa da neurose traumitica” (SA, 1960, III, p. 241 5) Jaem Inibisia, Sintoma a ¢ Angistia, Freud deseteve 0 total desamparo do indivi- ‘duo na situacio de choque. A fonte da situagio traumitica tanto pode ser uma excitagio pulsional interna como vir de uma vivéncia externa. “O ego que nor- malmente desenvolve um sinal de angiistia na situacio de perigo € dominado por uma angustia automitica” (BOHLEBER, 2000, p. 801; LAPLANCHE, PONTALIS, 1988, p. 683). Vitios outros autores desdobraram ¢ desenvolveram essa teoria do trauma, Destaquemos alguns pontos desses trabalhos. O. Fenichel, no seu ensaio “Der Begriff “Trauma’ in der heutigen psychoanalytischen Neurosenlehre”, de 1937, descreve a angiistia primaria como uma situagio normal da ctianca exposta as agressdes do seu meio. Os traumas fizem parte, para ele, do desenvolvimento humano. Jé a angiistia secundéria teria a fungio de impedi vivéncias trauméticas, Para Fenichel “quanto mais energia psiquica é aplicada para controlar recalques, ppassados, tanto menos o ego pode conectar quantidades de excitagio e tanto mais facilmente cle se expde a traumatismos. Na situagio de desamparo o ego regride a um modo primitivo, passivo-receptivo de lidar com a realidade” (BOHLEBER, 2000, p. 801s). Outro aspecto importante, na teoria do trauma, paraa teoria da representagio, foi desenvolvido do ponto de vista nio mais da descrigio do traumatismo pontu- il — por um evento acidental — mas sim do ponto de vista da relagio objet. Desse ponto de vista o trauma & visto como uma quebra de confianca (antes de ‘mais nada com a pessoa amada que postetiormente nega ter realizado 0 ato vio- lento}. A quebra na relagio objetal gera o surgimento de uma “ilha interna de |, faa singbo dp desarpar © regs o um estado posivoweceptio nfo deka do cork. a rt aotantes co muras porshech 8 gues comecns cord Tyumen cus os erro Co Fame lw, desrevram er sues cb como fondo es nevis os Goarnedes © eHasores ‘orton certo dos Comps de Concanogée, Nas odntovetoerrosa tocar nasa coreaquénci ita do tour fe sctelio do tour curds) quo Ransornacs posto or Yobb som wrap 139 Pro-Posigdes - vol. 13, N. 3 (89) - setter. 2002 cexpetigncias traumiticas que fica separada encapsulada da comunicagio inter- na” (BOHLEBER, 2000, p. 805)', Jé outros trabalhos no eaminho aberto pelas pesquisas de, entre outros, Freud, Ferenczi, Ernst Simmel ¢ Karl Abraham acima ‘mencionadas, sobretudo apés a guerra do Vietni, levaram a um aprofundamento da tcoria do trauma de guerra ¢ & introducio, em 1980, do diagnostico de “Post- traumatic Stress Disorder” (PTSD). (CARUTH, 1995, p. 3; BOHLEBER, 2000, p. 810). ‘Também os estudos especificos sobre os sobreviventes de campos de concen- ttagio navistas trouxcram novos elementos para a teoria do trauma. Em 1967 foi realizado em Copenhague o primeito simpésio sobre os problemas psiquicos de sobreviventes (BOHLEBER, 2000, p. 812). WG. Niederland cunhou catio 0 conceito de “sindrome de sobrevivente”. Para ele, o sobrevivente € caracterizado por uma situacdo crénica de angiistia e depressio, marcada por distiibios de sono, pesadelos recortentes, apatia, problemas somaticos, anestesia afetiva, “automatizacio do ego”, incapacidade de verbalizar a experiencia traumitica, culpa por ter sobrevivido e um trabalho de trauma que aio é coneluido. Jé H. Keystal descreve um estado cataténico que leva a um “robot-state”. Ele diagnos- ticou também uma cisio interna entre um eu que observa e outro que é abando- nado, a saber, o corpo. Essa mesma cisio, de resto, podemos ver nos testemunhos em video de sobreviventes de Campo de Concentragio, que costumam refetit- asi mesmos na terceira pessoa. Nao existe identifieagio entre o ‘eu fora do KZ” (abreviagio de campo de concentragio em alemio) com aquele “eu” que passou por aquela vivéncia.* Bolileber sintetiza, com base na pesquisa de Martin Bergmann de 1996, as conseqiiéncias dos estudos de sobreviventes para a teoria do trauma: “4 Wore Bortsber 2000, p. 828) cié na possttodo de ate ogbo das uae coordagersbékoar qua tm \domnado Gert do lara do ter "Do parle ce vita do molcoscaloge@feora pecanalica do fauna neces de ares a: madeos, fro o hemenulion, tawado ra hose do loro oD ‘come também do pccecenémica, Ac rival da erparBncia paca. © Modal pscseconémica — pat o qual paruigmotcomanto encontase o cheque Iaumdkeo — goslace a exnetiénla da Sorrinagao © de um ecedenio om veenel, angisia © axciaeda que NOo podom so! kad gue etic. A posvidode o o dasampar que lagosarentesa0 dol Somveios PASH OK OU Sriegorse 2a As consiugdes dos modelos ns foots ds elagdo one. perinan do ornament cot ‘nlogboe obetot intenas exerts colocam no camo o feol desaraar @ a ntamingn ae ae Jga;be olin e comuncagte ten, oque lempor coreoquéncia quao Fauma nao pede sar Pvegado verona {5 iso 6360 lombim pode sar ponsad come a clvagem ono o meméianekumantc uma mere mas ciovo.Tnooracion'’. que Banjara casocoua meméxo Fucksionace hour charrane aero pono fo ce que.99use corte ca memoteasiocodo aor memos nseo compo. Dis meres "nvolortote des mores st ener der von Prous Devonian Gegersiorde TAmemove Invortate Oos ‘memeres € um cos objetos pretax de rout, GS 9.613). Nao dona do ser erossrfoofalo deo ‘otis ott do tour tt chagace a dgumos coreLzbos que karma ua corrmeere29 9 nO00 02 remota rwclurtare coma Fico 62 wdo Houmdlica: “Come Hows comprovou, ecordaebes ersamenoa, snimenios » eraciments ro corrpatnert cue fernoam © cto fepennarmano 20 Pidces pal o entncio do um four.” GOHIERER. 2000, p.825) A peneicoe erte Her © Sescuo”carsitu um fonos na elexdo Fedo Geese polo mend at suaalsas © sebehuGo ra oboe Foucault Auleius (com T makeub) nesceu com 6 ormantemcoefansarente&enttontopde 32 agra, ca fartasa © 09 “Roast ns sents do uta do nheln na Worch. S, com ot roménticosaltsratszo pide cbordion oregsto de meres como inate 9 sicUS XX come Fasano (or vanguard Herts © orsieas oo so cos quoros e ca vonca en uma excale Rous uu Uratifertua ob roume que fedcolzou cats alemancs que Besioven nice em abr coiarr0 sco 1K Alterctuta—0 082105 —abandne oregeto da rnlogao eandowmes.so om arraseiogeo ‘eveno. £0 que veremos mas aslo com Kata 8 com & nego de taxlernunho. 140 Pro-Posigdes - vol. 13, N. 3 (39) - setter, 2002 1. tanto a questio da personalidade pré-traumitica como a questio correlata dda regressio a uma fase primitiva da vida psicossexual deixam de desempenhat um papel agora. A questio central aqui slo a duragio e a intensidade do terror a que os sobreviventes foram submetidos; 2. a incapacidade de enlutar leva & melancolias 3. 0 tereeiro ponto essencial para uma abordagem da representagio da cena traumitica: “a capacidade de falar e agic por metiforas foi perdida, Diferentemente de pacientes psiedticos, 0 coneretismo animico sesultante é apenas parcial. [sso levou i importante descoberta de que os sobreviventes vivem em uma dupla reaidade. No cotidiano eles aruam conforme & realidade, De tempos em tempos, no entanto, & realidade psiquica do Holocausto brota e destedi a vida deles. © trauma destruit em algumas regides animicas a capacidade de dlstinguir entre a realdade e a fantasia”; rnctetizado por um longo petiodo de laténcia, que pode chepar a atingir décadas. $6 depois desse petiodo a ncurose traumitica brots; 5.08 traumatismos softidos foram além da capacidade de elaboracao dos sobrevi- -ventes ¢ vieram a mareara geracio seguinte. BOHLEBER, 2000, p. 814 s) Sobretu- do nas fannlias em que os pais se protegeram do trauma negando-o ¢ se recusando @ falar dele, as criancas teceberam de modo inconsciente os fatos, relacionam-se com cle via fantasia e— dentro de um esquema mitico-repetitivo — “agindo””. Em certos casos, a identifieagio com o sofrimento dos pais levou 0 que jé foi denominado de “elescopage” de duas ou até trés gerages (BOHLEBER, 2000, p, 817): um desastre de engavetamento miikiplo que reduz trés geragbes 20 expago do tempo — fora do tempol ~ do tezuma. A temporalidade para essas criangzs identificadas com 0 soft- ‘mento de seus pais torna-se fragmentada. Nicolas Abraham ¢ Maria Torok desenvol- ‘veram nesse contexto o importante conceito de identificagio endocriptica”. De tes- to, a teoria da memaria etiptica claborada por esses autores & central dentro dos descobramentos da teoria do trauma’. A essa decantagio topogrifica — em termos da pique ~ das recordagdes que sio como que enterradas vivas, corresponde um estancamento temporal’. F uma carateristica dos pacientes traumatizados manifesti- {CE ABRAHANN TOROK 1976: 1995: DERAION. 1999: LANDA, WEGEL 19, 1, sgcrneapongto da wen heumaica am ure cpio cbeata por Abcam @ MTok Mata TO0k 1 soveredo Acros nso do oya Navas paoecsmelapscobgor, decuirdoactingaenbelnioegso ‘caspulbe einoopcoga9 do dbelb — cuaknorsesxsncasha deingootloudenaarifokioomonccko Terevu: A eoposticoeo ce cogs um dos Uos rovirerios Sule, poser, claurnoni, Eric Frroecao das pubses poe fm Gepancincls eb © Rcoooza0 Go obo cia cu vlogs um lame Irogal. © opto ncocrach exctorente no gat co ons pica, tara som (om nome Jo testo pan also Ge seu corfesao| ama outa con pean: 0 case cing pcr tecalaer io erumert comemoeive, 0 chjta neaponaa rercao Liar 6 doa oscrerercks em ave tol esa Io bare da niovgc: quarts rule na va ce Ego, You bar: que os dob mecanignos Opec ‘erGodotomerto er canals cottes um arn ogc0 ae cut, Das eses cas oveios HOO as pukbos © Rcopacive de obo] eb rear lomo noo ar rhurra cheza @ comuricaeS DeiAivHs, TORO 19%, 228 As co Pu carer estore Gosh de oreo, Oo ‘okies Sires pcre com a mera ensplecersprtca, Volo @ pena pars eho Meo Cr merumonic nan toner orfor un pasado ave nao ol hnitoco. No cone dos mnamenios a ‘Shean es bua ¢ potodamors, obo, conta Or ‘rtrrenumenice do Jochen Gow do Hout het [Pecuamn excors casa todgao Tonananie’ acorns Clos coeIogor o hrc da GENE @ HOFER, 141 ProPoslees - vol. 13, N. 3 (39) - set/dex. 2002 rem uma sensagio de diminuigio no fluxo do tempo: como se 0 seu relégio tivesse ficado parado no momento do traumatismo.* (BOHLEBER, 2000, p. 827) ‘Também devemos a Dori Laub importantes contribuigdes para a reflexio sobre © trauma e 0 testemunho dos sobreviventes de KZ (Konzentrationslage). Apesat de ser conhecida a difieuldade — e em alguns casos, a impossibilidade — da narrativa a cena traumatica, ele destaca o aspecto de “necessidade” dessa tradugio testem- sal: “Existe em cada sobrevivente uma necessidade imperativa de ‘eontar’¢ por- tanto de ‘conhecer’ a sua propria historia, desimpedido dos fantasmas do passado conta os quais temos de nos proteger. Devemos conhecer a nossa verdade enterta- da para podermos viver as nossas vidas” (LAUB, 1995, p. 63), escreveu ele tanto na «qualidade de um sobrevivente, como de um analista de sobreviventes ¢ ainda como um dos responsiveis pelo arquivo Fortunoff de videos de sobreviventes ca Univer sidade de Yale. Laub também destaca 2 impossbilidade de traducao total da expe- riéncia, nto em termos do pensamento, como da meméria c da linguagem. Daf ele afirmar cue existe uma impossibilidade de se testemunhar 0 KZ: ‘This allan of suitmesing te reich in my view, what és central fo the Holoeaust experience” (“Esse colapso do testemunho é precisamente, do meu ponto de vista, o que & central na expetién- cia do Holocausto”, (LAUB, 1995, p. 65)). E ele ainda escreve: “durante a sua existéncia hist6rica o evento no produ tatemunbas. Nao apenas porque de fato os snavistas tentaram exteeminar as testemunhas fiseas dos seus crimes; mas a estrutu- 1 inerentemente incomprcensivel «iluséria do evento impediu o seu prdprio teste- munho, mesmo da parte de suas préprias vitimas” (LAUB, 1995, p. 65)’. Laub cenfatiza a belatedness do testemunho: o tempo que ele demorou para ser elaborado para que a sociedade pudesse ouvi-lo é resultado da impossibilidade de testeme- ‘har diretamente evento. A narrativa do testemunho ~€ Laub destaca o testemu- 1 ComWote: nom aodernos recor ce um perl haéicona evict |do 18:0] como um momento ‘G2 colo — Nourna — hea Nex sus fone "Sob 0 eonceo Ge hse’ — recgeas mn 1940 — oe ‘Secor "cr cobncixor no norco 0 far do rhewTarodo que os kgs oss arumaries So tira corsobnce Hilerce do au bo paoce mos hawt ra Eucpa, Ra cer ane. 0 rina vesge. A Roveligio deh egos ord uminckenlo ern auo esa Corsclsnco se ones. Teminaxoopaneto cia do arog veccuse quo om vrs boo: do Pos, ndbpondors uns dos ous e ne mes Po, ‘eran depois os conto efatigos neces res foes Uma ixarrsTo cout. que tvez ovat ‘eas nnucéo potsica execu: Gul crit on dt qsietes cana rhava/ De noweckr Jom cupid oe (og. fou Tesora cortors pou anterior BENLALN TSES, 230: CSL pp. 701s) 9, Loup contnus: "Uma tastrrunna @ a feremunha co verioae do que acontacay cuonio um ever ue a a da pasegugao nazsa cos deus a verode do averio No pce se regahoga no rap e na memexa nem dos que esa derto ou fo, par pes deus ou quolaer outce, [elndotol cporas a realeode co sttonoe eo faa de respoea de expaciodoes ov do ado qu0 560 ‘erponeavele peo fto de que o hota esa endo hga som leternurhs: 0, pata, © PSEC ‘Grounséncia de enter arto co everve que fonava rpersavel prépionagén Je que una esernsrho ‘oosta ext, Gu fo. alguim que pusorse sot do aku 09 refers Comrckarranie ota e Sesumontindor ro quoi ovarvo ese se Jord © gor! ura moda Ndependente de refséncio ‘herds co qual o evento podot cr observto,Fode-so deer ave, parent, Netotcarrene noo iy ‘entra toerruns do Ho}ocauso, nem de deo nar Go oa de ever¥O ALB, 1998p. 686) CD ‘40 eno cborsageM do L9UD Gove Se vst do POND Go vet Ga pacendlcs: ro fesorrurho jute ‘sim carne no Teserrarno done So rset (3b "round ca ner & essancel © perlbo;bo dos esemurhor de deri. lm 39 KZ metro evans er conta a Shige axorna Gm Ub Ge BOSCO! te encontonom.. sobreiso lavandove am conta essa sivanGe. Dal RB posers (aavor-0) docu ‘ceiso mposbiidode de festerunno una “obuz000",@, ro fa, urna Blinaa0 co festornunno, ‘como osata curs outer De eo, Laud 80 pimat otecernace a nacasicace 0 estou 80 0.08 dora do couble na do necesionce 8 ca mpcsinicods 142 Pro-Posigdes - vol, 13, N. 3 (39) - setter, 2002 nnho oral, realizado diante da cimara de video — permite que 0 sobrevivente estabe- loca uma ponte com o “tu” ilhado que existe dentro dele" Nesse contexto € importante destacar também a complexa relagao existente centre 0s discursos individuais das testemunhas — no registro da meméria — © da meméria coletiva que se articula na cena piblica, 0 discurso juridico (no ambi- to dos julgamentos no tribunal e cortes, locais ou internacionais) ¢ 0 hist6rico, ‘Também fala-se muito sobte sociedades inteiras traumatizadas pela guerra ou por eventos como a Shoah (Catistrofe, em hebraico). No caso da Alemanha, Alexander © Margarete diagnosticaram nos anos 60 um nivel tal de recaleamento do passado ¢ de negagio da culpa que getou uma bloqueio no proceso de luto. A hist6ri torna-se assim “destealizada”. (BOHLEBER, 2000, p. 818) A luta pela justica nos tribunais, bem como no registro histdrico, caminha paralela ao trabalho de luto/de trauma das vitimas e da sociedade. © reconhecimento social da culpa ajuda a restabelecer o prinefpio de realidade e a capacidade de diferenciae a fanta- sia da realidade, Por outro lado, é evidente que no devemos, indo no sentido contritio, projetar de modo indevido conceitos desenvolvidos na psicanilise so- bre a abordagem juridica e historica, sem realizar as devidas mediagies, © ponto de vista de J. Cohen (1985) pode servie para sintetizar alguns dos tragos centrais da teoria do trauma, O trauma é caracterizado, para ele, pelo enfraqueci- ‘mento da eapacidade de organizacio dos tragos mneménicos nos representantes objetais na nossa mente. (BOHLEBER, 2000, p. 831) Desse modo ocorre uma clivagem interna: os fatos vividos ndo sio reconhecidos como parte do ego. Hi ‘uma falha na capacidade de representagio interna, Ocorre um registro, mas nfo a representacio — do mesmo modo como se di na teoria do proto-recaleamento. O bburaco no ego é “sanaclo” de modo reativo através da criagio de casulos ou cripeas internos. Outro ponto central, no nosso contexto, éa exatidéo das imagens traumé- tieas, que tem seu correspondente tanto no coneretismo dos fragmentos de memé- rin ¢ das tentativas de represcntacio da cena do trauma, como também na fragmen- tacio da narrativa. Mesmo que alguns teéricos tenham posto em questi o quanto esse cariter realista corresponderia a uma imagem “exata” da cena traumatiea", & 10. Vos ovtoes cescievern 0 rauma como uma especie de umn gis cultnomo que representa um niicleo due ressente & sibolzagée @ a9 spriicode, Col fiber @ melita do “bucre nega" IBOHLEBER, 2000p. 623). cue, oreo, ferbern i oicplcade oo pple evento Ga Shah. 11. Na vou azresentacqu todo longo e per vazes,assstadraments -raumoscarerta.~engdiodo {debate om Tone da recovered-mornay de pacientes com Nsuras de cbuso ssiual a fone riercia, Espectarnontoro rio wigo-srba fe dover ovr congo sty ica cunt Oost9 GoTMCIGOO (rogetea.| dsculewe mus sole a verdad dos Ceres de abuso aus sstenom inhows process ekicos. Ct, quonio a ese debate ete cos. Soller (1996)@ lots (199) Eclao também o paral Sesse debate com a quot Gorell 8, S0b13/30, do 990 FOIMA MAS! G9 9409 rez negocios na mada om que Nettodars nogom a iors da shoo e Gas Coma Ge 065 ro Segunda Guana. © cose da pueuno-axziogios do ipsovdo} Bjorn Wri GoFou events Coma 6 dabato emton da Tarra recuperoda~ v8 Ua ipa que cot possads com Bo fm fogmertos de maréia co poclaro fem mute aver cam quad do nogaciansme, WASH. fue. olde. nav fel ee chara Dasteten on sur a sus logit (2 oo eres a path Se uma \Gertfcogbo “poteligica com os tras doak2)tonude omc’ pexaosregacentéasquepreterdgm reauztoaosce esernunhos & chave do srulagta, Omak emvel na negacionema nde apenas fo ‘So raprog.at ma ra vee | mere oe cesta, mae ermbam 2 fo d= que ose Pe Go feccrome psquica do soblewerta ants © cuba care iendnia 0 Seeger o ealiade do cena foumétca, CL quanto c esse debate orev Into SEUGNANN-SIVA 19996] e sobiewda0 io Ge Meter |2000), © ti ce Wher fl pubicodo em porguss (CL WRXONISH, 1998), 143 Pro-Posigées - vol, 13, N. 3 (39) - setVdlez. 2002 inegivel que existe esse cariter literal dessas imagens. A actibia do flsbbad domina ‘a mente como uma imagem fantasmatica que assombra o individuo traumatizada. Trauma e Literatura ‘A tesc da incompatibilidade entre « meméria duradoura ¢ a atividade de defe- sa dos choques do sistema percepcio-consciéneis, que vimos em Freud no seu ara alim do principio do prazer, € talvez. mais importante pela sua carreira fora da tcoria psicanalitiea propriamente dita do que no seu interior. Walter Benjamin apoiou-se nla no seu conhecido ensaio Sabre alguns temas em Baudelaire, de 1939 G5, 1972 ss, I, p. 612-615), para desdobrar a sua teotia da modetnidade © do homem moderno como alguém que acumula apenas sivtnaiar estércis (Erkebmisi) para construgio de narrativas que se alimentavam, antes, da experiéndia autlntica (Exfabrung). Essa experiencia, para Benjamin, s6 seria capaz de perdurar na modernidade de modo fragmentatio, como na meméria involunticia, tal como ele alé na obra de Proust. A onipresenca dos choques na modernidade ea mobilizagio do homem moderno para apari-los faz com que s6 exista a “Jembranga conscien- te” (benufte Erinnerang, GS, 1972-55, 1, . 614). “Surge uma interrogagao”, formu- Jou Benjamin, no mesmo ensaio: “de que modo a poesia litica poderia estar fan- damentada cm uma experiéncia para a qual o choque se tornou norma?” BENJAMIN, 1989, p. 110; GS, 1972 ss, 1, p. 614). Baudelaire (e Valéry), para o critico, como é bem conhecido, teria conseguido transpor para a poesia 0 princi- pio do choque que penetrou no cotidiano da vida moderna, — O que nos interessa aqui é antes de mais nada a afirmacio de Benjamin que equipara a experigncia na modernidade & experiéncia do choque. Nesse ponto ele pode ser aproximado da Ieitura lacaniana do real como um ‘“desencontro”: como algo que escapa ao sim- bolico. Essa nogko Iacaniana de real representa um dos frutos da doutrina psica- nalitica do trauma. Como lemos em Lacan: A fungio do |] real enguanto encontro ~ 0 encontro, na medida em que ele pre tr pert u mnedda em cue ce € ecnoalmene o encontr peti ~ resentot-se pela pomeira ver a historia da psicanalise em uma Forma que era lem s1o suficiente para despertar nossa atengio, aquela do trauma! ‘Também em Nicolas Abraham ¢ Maria ‘Torok (1995, “A Topica Realitiria”, 1.237) a realidade é revista do ponto de vista da psicanilise como 0 “lugar em que © segredo esti escondido”. ssa realidade psicanalitica (e Abraham e Torok se V2 tocan “Tqut @ Axeator. ct. Cov (2000 p. 131}. Sod Weigel em sou ensco “Télescapage im Unbowaiian, Zim Veneer von Touma, Geschentnopat urd ise far ua oflca conundert oD fo de C. Coun Unclered Epavence, aura, Neratva. end Hiry anda 0 argo acta clad 11 pubtcods ip. 91-112. Pra Weiget Caran desl Tosa a cotoa des concotes roudnos do You, ‘Reorecente de pulido Ge mate, ra meade om cue el tra cosa. sza%0 oF fanas @ 6s colocadD oma parle de um “pregiora © da nom. u acompanno apencs er pare 6 efica Go WeigoL ‘vaddo que Car ds wozos Ib Froud som kar om cons 0 cca ® mesmo a cussion da buco ca pelaborarae come atoetapcanofi. 44 no seu ersao do 1991, "Urclorned Bpience: Faurno.erd fhe Posty of Hitoy” Fr: YO Flonch Stags 1.79, 1991 cleo ave poderros keriica este prema. Fereuto iad, Wigainée lewsem conta nem os contbutos conics para onoglo de rou @ thal nem parabe que ctmer 6 Jeol coma four’ noo agrcn exlue a smbowogoo, es OPS ‘pom por os sous res 144 Pro-Posigdes - vol 13, N. 3 (39) - set/dez. 2002 ditigem a essa realidade), “realidade enquanto ctime cometido”, tem paralelo com o récaleamento dinimico, tipico da histeria, mas tem a caracteristica de se localizar no seio do proprio ego. A realidade incorporada em um imulo fiea, segundo os autores, sob a guarda de um ego que deve ser cheio de “‘malicia, de asticia e de diplomacia” (ABRAHAM, TOROK, 1995, p. 239). © “blo de real dade” incorporado tem também a caractristica da ‘‘dmetafoizasio” (p. 245). A cripta é criada como resposta 4 incapacidade de enlutar, & recusa de introjecio. Assim como a teoria do trauma em Preud corresponde, em linhas gerais, a uma tentativa de dar conta de uma nova “tealidade” psiquica ¢ social do homem mo- derno — incluindo ai a realidade cotidiana violenta ¢ a do terror das guerras — do mesmo modo seria equivocado desvincular a teoria da cripta da experiéncia histérica do século XX. A escalada demogeifica, tecnolégica ¢ belicosa desse periodo gerou um nimero tal de assassinatos como nunea antes poderia ter ocor- Fido, Essa realidade da morte é gritante na mesma medida em que é emudecida, silenciada, enterrada. Ela retorna compulsivamente — 4 mente de uma sociedade culpada e que “no entende” sua historia. Como Freud afirmou — na linha de Nietzsche: “o que permaneceu incompreendido retorna; como uma alma penada, nao tem repouso até encontrar resolugio ¢ liberta¢io” (LAPLANCHE, PONTALIS, 1988, p. 126) O keep smiling e 0 the show must go an— a que assistimos novamente estes dias nos EUA, apesar de toda parandia ¢ da repetisao (traumati- ca) das imagens destealizadas do choque que abalou o mundo, verdadciras Deckerinnerangen dos verdadeieos traumas ~ servem para manter a fachada de uma sociedade que guarda a sua “realidade” como um segredo. Qual o papel da literatura nesse contexto? Fim primeiro lugar, seria inocente, é clato, acteditar na existéncia de tal coisa como a “literatura” na qualidade de um “bloco uniforme”. Mas é inegivel que existe tal modalidade artistica — por mais «que j nio tenhamos a seguranga para delimiti-la. De resto, justamente uma das principais caracrerstcas da literatura é a de nto possut limites: & 9 de existir Constantemente negando seu mite E qual limite & esse? E aquele que a “separa” do “real”. A literatura, portanto, encena a criagio do “real”. A sua “enctiptagio”, ‘sua resisténcia ao simbélico, o desejo de introjesio. Talvez. seja ousado afirmar algo tio geral com relagio a uma manifestacio cultural que vai do bestseller a ‘obras como as de Guimaries Rosa, Beckett, Blanchot ¢ Paul Celan — mas a ousa- dla da empresa literiria, da literatura desde a sua configuracio romantica, exige ¢ ‘40 mesmo tempo justifica tal leitura. No mais, jé para Friedrich Schlegel e Novalis, a literatura € meio-de-reflexio, fiz parte do processo infinito de clivagem Eu/ Nao-Eu. (GS, 1972 ss, I, p. 62-72; BENJAMIN, 1993, p. 80-3). A literatura esti nna vanguarda da linguagem: ela nos ensina a jogar com o simbélico, com as suas, fraquezas ¢ artimanhas. Ela é marcada pelo “real” — e busca caminhos que levem a cle, procura estabelecer vasos comunicantes com ele. Ela nos fala da vida e da morte que esti no seu centro — vide Blanchot... -, do visivel e da sua moldura que nnio percebemos no nosso estado de vigilia ¢ de constante Ayer — diante do pavor do contato com as eatistrofes externas ¢ internas. De certo modo podemos afitmar que a literatura é também uma porteira da cripta. Uma figura que tanto vem “de dentro” como esti “fora”, diante da cripta, de 145, Pro-Posigées - vol. 13, N. 3 (89) - set/dlez. 2002 costas para cla. Essa eripta evidentemente — assim como a nogio forte de “real” — possui a mesma carateristica da concepgio freudiana de Unbeimlick: como algo de familiar que nao pode ser revelado. O que pode habitar esse timulo senio 0 proprio hist6rico? Algo que conhecemos mas nos “esquecemos” dele... E esse elemento “esqjuecido” que € encenado em muitas histérias de Kafka. Kafka traca, retraca, apaga para novamente riscar o limite interdito que permite que nés vivamos assen- tados sobre nossos tiimulos sem olhar pata baixo. Nas suas obras o olhar tear “de ‘haixo’. Orson Welles traduziu esse fato genialmente na sua filmagem de O Provo 20 explorar os canireplngées, sem que com isso tornasse as pessoas gigantes: sobretu- do K. nao é um gigante. Apenas seu advogado, que, na verdade, é um dos tiltimos, ‘na hierarquia da justica.., essa instituigio que representa tanto a lei ~ 0 cédigo civil, da drtasem oposigio a0 campo (ef. "Um médico rural”) — como o eddigolinguistico, simbélico. A justica€ tio impenetrivel quanto o niicleo duro da linguagem, que em termos psicanalticos no pode ser dissociada dos nossos traumas constitutivos, do desamparo e da tentativa de dar conta da angistia por meio dela. Ocupar a boca ‘com linguagem, nos ensina Torok, s6 é possivel em meio a uma “comunidade de bocas vazias”. A justiga do veredicto, condena, censura — como nosso superego mas também estabelece no seu cédigo correto € o errado: 0 bem € o mal. Era linguagem — a nossa linguagem pés-queda e pos-babélica'” — s6 existe a partir do ‘conhecimento do bem ¢ do mal, do re-conhecimento da vergonha: diante do espe- téeulo da nudez de nossos eorpos. (Nao por acaso na iitima frase de O Proceso lemos: “Era como se a vergonha devesse sobreviver a el.”) A culpa incorporada na linguagem ¢ a vergonha do corpo sempre caminharam juntas na histéria mitica da hhumanidade. Nao ha esperanga na literatura de Kafka, porque ele leva até as iti mas conseqiiéncias o saber em torno dessa linguagem “decaida”, dessa linguagem que condena a priori, que exclui e vive dessa exclusio. Na sua literatura, a lingua gem € desconstruida enquanto maquina de conccituacio ¢ consolo diante da “Que- da’. Dai a impossibilidade da metifora e a sua literalizagio que leva os leitores 20 “desespero”. O espeticulo da catistrofe a que se resume a vida (moderna) é apre- sentado como se fosse um evento banal. Também a temporalidade da narrativa é estancada: a literatura de Kafka reduz 0 mundo a ingens sem um necessirio nexo entre clis (ANDERS, 1993, p. 30). Sua obra apresenta 0 “trauma” do individuo, alienado moderno que porta em sia marca do choque. Kafka nos fala de uma “fetida... rasgada por um raio que ainda perdura” (ANDERS, 1993, p. 60): esse raio €0 mesmo flash do “real” que nos paralisa e que nossa sociedade miditica repro duz incessantemente em imagens sem significado, Essa reflexto também possui tum coroliio que resistimos muitas vezes em reconhecer: identificamo-nos com a literatura de Kafka, com K., porque somos filhos de nossa era, porque de certo ‘modo nos identiicamos com os sobreviventes, porque sentimo-nos culpados ¢ nos voltamos para os mottos, mesmo que sempre “tarde demais”™. Kafka apresenta 0 12, Longo mao aq de tes da rota ao Inquager de Weta Baryon fa como from deeervoNeos ‘ot $048 escfos 6 nico dos ores vive. Ck andise que fe dla No LIM Lor 0 UO dO MNoD. Were Bano: ernentima 8 cica podtoa pp. 79-123. 14. Conan (2000) quarto & naqse ce ouma em Lacon como casper pars. @ eri "do cue, com> Um comproriso ico que se da serere “com cosa, no Gores Coup Malcresico. 146 Pro-PosigGes - vol. 13, N. 3 (39) - setydez 2002 ‘nosso mundo desterritorializado © nos identificamos com essa paisagem. A culpa vai mais longe do que 0 peso histético do sécalo XX poderia fizer pensar: ela remonta a toda histéria da humanidade como uma histéria de barbirie, de recaleamento. Nio apenas porque Inr Anfang nar die Tat (No prep fio at), como Goethe e Freud nos recordam, nao apenas porque “nunca existe um documento de altura que no seja 20 mesmo tempo um documento de barbirie”, como Benja- min nos ensinou (GS, 1972 ss, I, p. 696): Kafka encena nas suas metamorfoses — ‘nas duas diregdes, do animal para o homem, como em “Um relatério para uma Academia” ¢, no contriio, como n! A metanoyfse — todo o drama da humanidade ‘enquanto hist6ria da repressio da natureza externa ¢ interna. No limite, ele mostra que essa separagio entre natureza “externa” e “interna” € tao frigil quanto 2 dife- renca entre 0 familiar e 0 sinisto tal como eles encontram-se mesclados no sentido de Unbeindich. Sua obra localiza-se, paradigmaticamente para a nossa visio de “lite- ratura”, “Diante da le”, como se chama uma das narrativas (de 1914) do volume Um midico ruray, publicado em 1920. Vor dem Gesetz significa tanto diante da let como “antes” da lei. Se a lei € 0 interdito, como Derrida recorda, ela retratada pot Kafka como algo intesditado". E essa mesma double bina que nfo permite uma metalinguagem, a no ser via uma infinita meen abyme. A literatura descreve justa- mente esse movimento. Dai Kafka fazer a literatura “voltae” as suas origens miticas: antes da lei, antes e para além dos géneros com seus contornos formais reconhedi- veis. Se ele nao conseguiu concluir os seus romances, é justamente porque sua literatura revelou os limites hist6ricos desse género'* A literatura, 20 longo do século XX, foi abalada pela hist6ria, assim como Benjamin afirmou que a reprodutibilidade técnica gerou um “abalo violento” (GS, 1972 ss, VII, p. 353) da tradigao. A reprodutibilidade representou o “fim” da tradigio ¢ da sua passagem pelas geragées. O fim também da unicidade da obra, 1.0 urna bea tan Gosia arate ct. Dwi (198) Vo nok no corto do comand Kare Tote que Cov (2000 eaten do santo da cena qunrrando. desi pot rex irErot0900 GOs sontos, onde ecto que “0 sonno & o guardon do sono. El fenta explcor pocque opal que sorha ‘Com seufho tater auelne aparece olango Fa vont noo ess vendo que egou queenoncd.derara xo Gespeer © appa fogo que se expalha sce 0 compo do ho que est sero vlad. © pla "protean sornare, poronta, dor nas a despero! © opogat meciclorente © ego. © pal hada emo enqurto desesa um serine quando © corpo de 10 ino. Ereyerto © pa serha,o sero ‘uar60 do Soar, deme. Es serro: 60 Forno Foca © Papal do EALO ONG CON UCI do $70 (128) Pre Lacon ro enna, © sore om qunibo 6 uno peri do chega “tarde Gera do olcomreiaqto é mare do cong, 0 cospora um dospr poxcomerte a quote esiavc users © vespotor Seta um entocraarmerio ante o quatro inion do sono @ ofa a recepeo tad de Lm enderecorenio. de un ovso Geico mote. - Apioxna! a lisa do sorho ~ 2 sobIeuCO Cesse ‘ewer para orauray mero nd Brad mal do ave dosioon 0 ou opel do "gun dao Le fe:09p0 4 faxdo © Inguagom rsnumont. Ou #90: vers altoctue como uma Goposies daquetes ‘tpectos co cuts que eo otacacos pal Gp do"narna’.o orbs doe/o 06 0°00, AHO, ‘ otretude oquela esc par acres poderesce como um Kata, anca ura nova 2 sobre 0 coiKen ‘revel, coma escaveu Keeler uma rata de 16 anero ce 1922, que ostetges [emo @ exer o] roe career leunca 6 erat recordar que Kato excreveu dent de um emocoarakrerte aptbtce: so HEN, ‘como ela meso 0 esioveu am ua cata do 192) 6 seu amigo Max Be lolanco oa Noctua do “tons ludeus que comecoram 9 esrevor om clomdc’.).nasceu de olgumos mpossibilodes ‘ndaments: a Irposibiisode Go No efctver fl. nego do neceussod’ de teslemuna 0 Impostsidode de escrwer em cleo, « mnpossbIcode de excreve do manekc dlseria” Mos em s69d3 ee orertou. “amber se pode octescentr umo auto mpcsibkiode, almpossbkiogs de lercrvetar (ROUTER, 1993.56) 147 Pro-Posigées - vol. 13, N. 3 (39) - setidez. 2002 com sua matetialidade através da qual ela dava um “testemunho” (Zeugenscaf) do seu presente (GS, 1972 ss, VI, p. 353). Ora, mas a literatura nao transmite seus testemunhos apenas na matetilidade do seu suporte. Na qualidade de produto do intelecto, seu testemunho est “inscrito” na propria linguagem, no uso que faz dela, no modo como através de uma intrineada tecedura, cla amarra 0 “real”, a imaginagio, os conceitos € o simbélico. Podemos, portanto, falar de um teor testemunhal da obra literiria que permanece mesmo em plena era da reprodutibilidade técnica e, depois dela, na era da sintese de imagens. As midias tecnologicas, de resto, também sio capazes de dar esse testemunho: como sobre- tudo o video se mostrou capaz nas iltimas trés décadas, Nzo por acaso, portanto, também Dori Laub, como vimos ~ entre outros, como Geoffrey Hartman ¢ Lawrence Langer -, valotiza o “teor testemunhal” dos depoimentos filmaclos”. A oralidade ¢ 0 gestos sio parte essencial do testemunho nesses videos. Mas também a literatura tem recursos de teansposicio da oralidade ¢ da gestualidade, também ela pode testemunhar ~ seniio mais o passado longinquo da tradi¢io — a0 menos o presente, Fa literatura no século XX foi em grande parte uma literatura marcada pelo seu presente traumitico. Cabe a nés aprendermos a ler esse teor testemunhal, assim como aprendemos que os sobreviventes necessi- tam de um interlocutor para seus testemunhos. A literatura de uma era de catés- ttofes desenvolveu também a nossa sensibilidade pata reler ¢ reeserever a hist6ria da literatura, do ponto de vista do testemuno. Na hispano-América desenvol- yeu-se um género proprio, a literatura de testemunho, que vem sendo praticado € teofizado descle os anos 50 e que ganhou impulso com a fandacio do Prémio da Casa de las Culturas de las Américas dedicado a ele, desde 1970 (ALZUGARAT, 1994). Com relacio & Shoah, surgiram centenas de publicagées de sobreviventes, de membros da “segunda geragio” ¢ de outros escritores que deixaram em suas cobras as marcas de um evento que também catalisou a reflexio filoséfica, socio- l6gica, lteriria estética ‘Bu gostaria de concluir essas reflexes sobre literatura e trauma com algumas palavras sobre Primo Levi, Primo Levi encerra 0 seu livro 4 Thigea (1963), obra que conta a sua volta para Turim apés a libertagio do campo de concentragio rnazista de Auschwitz, narrando um sonho que nao cessou de visiti-lo, mesmo - Ct. Hafrnan{1996) @ Langa (1991) € verade que o tne Stach, de Claude Laren [1985), sem ot 'eul908 6 vooo-are ras apkcando "wuauey do chera decurrenio que oapsodra dori a5) 'epresena,op6s os 4gamentos de Nuzomibrg cde Borman om Jouealém, de ato mano, um prnero poracigma para o movimento do fundagda de "idooarqA” com estorunhs ca Snorn, Nose Cox, ‘Govern vero Ghema enquanio ate de eungco do ec enema ete que Seriarin compa a ‘sl capa de pene nos Nostasvissras.-@ que 8 COnlem aguns do lamarsnstesernans ‘deo. Mando oa. ura conocido cor tlogso oo vero cof dara ecle eu Tost NO onto do cb de ae na 00 da sus sould teeica 0 que s2 vol Oca Co 8 ue Mos ‘omunicamosimats 6. paasayomin atadeeo, cesohska que mone pam else, corno 63000 St Posie cxcla, cane essa cotgsota. ene Gmelancota oo tabaha decor destagos dasa) ‘eo comemoropto da uma rove barbers, commo deo faz no rua "Empoténca © pobveea oo 198%, Em ume votanie do manusat com e760 0 texto pubicodo, ros apes 9 pede “bers Aber wer korn Gorn ansticn ornermen, ce Menthe were den Ere pa8. Oe Yo PY Hog rl cam Sapo ers Sormien ce Aiqutrenncretes becder, fo Uber rar? (‘Mos QUE pda vr a aR ‘crumantioge ta Ge foo entertro aestlocseo que enconta cone clo como boyagem do um ‘colecionador ou de ur comeciarte de onigigocer” [G8 1972, p. 961 a). Ol erat Gu tos ‘Sanoran se identicara com tsa do stosadat come colelorad com aM 0 seu eT prtegrcnerorcte 148 Pro-Posig6es - vol. 13, N. 3 (89) - sot/dez. 2002 muito tempo apés essa volta: “F um sonho dentro de outro soaho, plural nos particulates, tinico na substineia, Estou & mesa com a familia, ou com amigos, . ‘mas, mesmo assim, sinto uma angiistia sutil e profunda, 2 sensagao dlefinida de uma ameaca que domina. E, de fato, continuando 0 sonho, pouco a pouco ou brutalmente, todas as vezes de forma diferente, tudo desmorona € se desfar a0 ‘meu redor, © cenétio, as paredes, as pessons, ¢ a angistia se torna mais intensa © mais precisa, Tudo agora tornou-se c20s: estou 86 no centro de um nada tarvo © ‘inzento. E, de repente, “sei” 0 que isso significa, ¢ sei também que sempre soube disso: estou de novo no campo de concentracio, ¢ nada era verdadeiro fora do campo de concentragi0” (LEVI, 1997, pp. 258 s) Essa sensagio de clausura dentro da realidade do campo de concentracio, mesmo apés ter retornado a sua casa, é um tema central nas obras dos sobrevi- ventes dos KZ.. Primo Levi redigiu’ 0 seu primeiro livro de relato sobre os eventos eatastedficos que ele vivera logo apés ter tetornado de Auschwitz. Para cle esse livro, intitulado Fi isto um bomem? (1947), nasceu de uma necessidade interna de dar testemunho da sua experiéncia. Como podemos ler numa decla- ragio de 1979 reproduzida na sua biografia de autoria de Myriam Anissimoy, “provavelmente eu nunca teria escrito se eu nao tivesse tido essa expetiéncia para contae”. Uma das tarefas desse tipo de testemunho € a de tornat possivel a “saida” de dentro do eieculo de fogo que fecha, na meméria, a experiéncia radical do campo de concentragio, Mas o proprio Levi € o primeiro a constatar ‘ impoténcia das palavens diante da tarefa do testemunho: “a nossa lingua nio tom palavras para expressar esta ofensa, a aniquilacio de um homem”, cle ¢s- creveu (LEVI, 1990, p. 51). Dessa impossibilidade de descrever 0 terror do Holocausto advém a impossibilidade de se libertar da sua imagem ¢ do sew pesot a necessidade de testemunhar. Assim como cicamos Freud, acima, tam- ibém vale lembrat as palavras de Paul Valéry que vo em um sentilo semelhan- te: “a nossa memaria nos repete o discurso que nds nao haviamos comprecndi do. A repetigzo responde 4 incompreensio”. Primo Levi deve ser considerado como um dos autores que levou mais longe € do modo mais acabado a reinseticio testemunhal da catéstrofe. literatura de cunho testemunhal, no entanto, foi € é ainda praticada por iniimeros outros so- breviventes da guerra (€ por testemunhas “secundarias”, que nfo vivenciaram diretamente os eventos), tais como Jorge Semprun, Ida Fink, Charlotte Delbo, Jean Améry, Robert Antelme, ‘Tadeusz Borowski, Nelly Sachs © Paul Celan, cevidente, como ji afirmamos acima, que toda literatura tem seu teor testemunhal: esse teor panhou uma nova dimensio no século XX e a consciéncia tedrica desse faro deu-se — como é comum na historia da Teoria Litetaria — tardiamente, Em um poema que define a sua poética, Celan escreveu: “Nos tios ao norte do futuro / eu lango a rede que tu / hesitante earregas / com sombras eseritas por / pedsas”” (CELAN, 1983, Il, p. 14) Se nesse poema—curto como um epiti- fio =, as sombras remetem as letras sobre o papel branco, as pedras, pot sua vez, ‘como ocorte freqiientemente a pottica de Celan, representam 0 timulo, as kip des que a sua pocsia busca levantar para os milhdes de judeus que morretam sem direito a serem enterrados. 149 Pro-Posigoes - vol, 13, N. 3 (39) - set/dez. 2002 De Paul Celan vém os versos que revelam a esséncia do testemunho: “Nin- guém / testemunha para a / ‘Testemunha” (CELAN, 1983, Il, p. 72). Também Primo Levi ressaltou intimeras vezes essa unicidade do testemunho: este expressa © ponto de vista tinico ¢ insubstituivel do narrador. Os sobreviventes que nao sucumbiram nos campos de trabalho e que tiveram a sorte de niio serem selecio- nnados para as cimaras de gés so testemunhas conscientes da limitacio da sua nnatrativa. Como Levi escreveu em Os afggader¢ os sobrevitentes: NOs, tocados pela sorte, tentamos natrat com maior ou menor sabedoria nfo s6 nosso destino, mas também aquele dos outros, dos que submergicam: mas tem sido um discurso ‘em nome de terceiros’, a narracio de coisas vistas de perto, no experimentadas pes- soalmente, A. demolicao levada a cabo, a obra consumada, ninguém a narrow, assim como ninguém jamais voltou para contar sua morte” (LEVI, 1990, p. 48). Se é verdade que “ninguém jamais voltou pata contar sua morte”, ndo & menos verdade o fato de que os sobreviventes so aqueles que, como verses modernas em catne € oss0 de Ulisses,visitaram ainda em vida o inferno. A impossibilida- de da narragio advém do “excesso” de realidade com o qual os sobreviventes haviam se defrontado, O testemunho no deve ser confundido nem com 0 género autobiogrifico nem com a historiografia ~ ele apresenta uma outra vor, um “canto — ou lamento — patalelo”, que se junta & disciplina historica no seu trabalho de colher os tragos do passado. Um dos fenémenos que marcam de modo mais caracteristico as itimas déca- das é a insisténcia no tema do “fim da historia”. Sem davida a filosofia “‘inexistencialista” (VIDAL-NAQUET, 1987) que gera o discurso sobre o fim da arte, do individuo, do espaco piiblico, da nagio ete. em parte também alimenta esse debate sobre o fim da histéria. O que, na verdade, ocorre é 0 fim da hist6ria nos scus molds tradicionais, compreendicla como um narrativa que visa & recu- peragio ¢ 4 “representacao” de um pasado coletivo, nacional etc. Também entra em colapso na nossa era de eatistrofes e de genocidios a propria nocio de evolu- ao linear da histéria. A literatura do testemunho apresenta um modo totalmente diverso de se relacionar com o passado. A sna tese central afirma a necessidade de se partic de um determinado “presente” para a elaboracao do testemunho, A concepcio linear do tempo é substituida por uma concepeao topogritica: a me- méria € concebida como um local de construcio de uma cartografia, sendo que, rnesse modelo, diversos pontos no mapa mneménico entrecruzam-se, como em lum campo arqueoldgico, ou em um hipertexto. Como Celan mesmo, definindo a sua poética, afitmou, a sua poesia visa construir “cercamentos [Eafiedangen) em torno do sem-palavra, do sem-limites”: ele quer mapear o passado. Ao invés de visar 2 uma representagio do passado, a literatura do testemunho tem em mira a sua consirago a partir de um presente (SELIGMANN-SILVA, 2000, p. 95 ss). Primo Levi, nascido em 1919, suicidou-se em 1987. Para ele “‘o suicidio € um ato meditado, uma escolha no instintiva”. Muitos outros sobreviventes acaba- ram de modo voluntitio com as suas vidas, tais como Paul Celan, ‘Tadeusz Borowski e Jean Améry. Também o fildsofo Walter Benjamin seguira 0 mesmo caminho: em 1940 ele se suicidou em Port Bou, na fronteira entre a Espanha ea 150 Pro-Posigées - vol. 13, N. 8 (89) - seller. 2002 CARUTH, Cathy. Unclaimed Experience, Trauma, Narrative and History, Baltimore & Londres: johns Hopkins University Press, 199 ‘Modalidades do despertar craumitico (Freud, Lacan e a Btica da Meméria). “radugio C. Valladio de Mattos. In: SELIGMANN-SILVA; NESTROVSKI, Arthuz. Cotécirofe« Reprewntazio, Sio Paulos Escuta, 2000, p. 111-136. CELAN, Paul. Gecazmale Werke in fing Biden. Organizado por Beda Alleman, ¢ Stefan Reichert , Frankfurt aM: Subskamp, 1983. COHEN, J. Trauma and Repression. Pax, Inguiry. 5, 1985, p. 163-189. DERRIDA, Jacques. Préjugés. Devant In loi. In: DERRIDA Jacques et al. (Org). La fact de jer. Pasis, 1985, p. 87-139. DERRIDA, Jacques. Fora, As palavras angulosas de Nicolas Abraham ¢ Maria Torok “Tradugio Fabio Landa, In: LANDA, Fabio. Eni sabre aera teria em pricandlve, Seguido de Fora de Jacques Derrida. Sio Paulo: Unesp/Fapesp, 1999, p, 269-319, FENICHEI. Der Begriff Trauma’ in der heutigen psychoanalytischen Neurosenlehre (1937). In: Aufsitze, vl, Olten, 1981, p. 58-79. FREUD, Sigmund. Frou Stine, Pranklurt/M: Fischer Verlag, 1970. (Citada como SA). GERZ, Jochen. La question serie. Atles: Actes du Sud, 1996, 2146 Steines Mabnmel gegen Raison — Saarbricken, Statgart: Verlag Gerd Hj, 1992. gerne der Kant. Interven (1970-1995), Regensburg: Lindinger + Schid Verlig, 1995. : Bsther Shalev-Gere. Das Hamburger Mainmal gegen Fashisnnr, Harbury: Gerd Hatje, 1994 HARTMAN, Geoffiey. Toe longest shadow in the aftermath of the Holocaust. Bloomingan: Indianapolis, 1996. HOHEISEL, Horst; KNITZ, Andreas, Zermablne Gerbicite. Kunst alt Unavg, Weimar: ‘Thiiringisches Haupestaatsarchiv, 1999 KAFKA, Franz. Gesammelte Werke in ostf Binion. Nac der Kritiche Ausgabe. Ong, Hans- Gerd Koch, Frankfurt a, Main: Fischer, 1994 LACAN, Jacques. Le sécel comme trauma, In: Semin, ivro XI, Les quatre concepts fonadamentaux de la psychanalyse, 1964. LANGER, Lawrence L. The Holecaust and the Literary Imagination. New Haven: Yale University Press, 1979. Hoban Tsien. Toe Rains of Menor. New Haven/London: Yale UR, 1991. —— Preempeing te Hlecant, New Haven /London: Yale UP, 1998, LAPLANCHE, Jean, PONTALIS, Jean-B. Vocabubii da Pacandlie. Sto Paulo: Martins Fontes, 10. ed, 1988, TAUB, Dori, Truth and testimony the progress and the strugple. In CARUTH, Cathy (Org). Trans, Explorations in Memory. Bakimore e Londres: Johns Hopkins Unviresity Press 1995, p. 61-75, LEVI, Primo. Zio wor Homem. ‘Traduio Luigi del Re. Rio de Janciro: Rocco, 1988, ‘A Tréqua. Tracucio M, Lasechesi, Sto Paulo: Cia, das Teeras, 197. 0 afar o sabres, Rio de Janeiro: Paz & Terra, 1990, LOFTUS, Elisabeth F The realty of repressedl memories. Amencen Pocholgst. 485), maio 1993, p. 518-537, 152 Pro-Posig6es - vol. 13, N. 3 (89) - satdex. 2002 MACHLER, Stefan, Der Fal Wilkomirrki Oler de Wabrheit einer Bitgrapbie,Zitich: Pendo Verlag, 2000, MITSCHERLICH, Alexander; MITSCHERLICH, Margarete, Die Unfabighit go trawarn. Miinehen: Piper, 1977 (1, ed, 1967) NIEDERLAND, WG. Clinical observations on the “Survivor Syndrome”, Int. J, Pyebe- Anal. 49, 1968, p. 313-315. Faken der Verienng: Das Oberlebenden-Syndrom. Seelenmord, Prankfurt/ Mz Subekamp, 1980 SELIGMANN-SI.VA, Marcio NESTROVSKI, Archur. (Orgs). Cate e Representa Sio Paulo: Escuta, 2000. Ler loro do mundo, Walter Bejaine romantsno ¢ iva pottc, Sio Palos Tominuras, 1999, (Os Fragmentos de uma farsa: Binjamin Wilkomirski. Cl n. 23, jun, 1999, “Liverarura de Testemunho”). —______ Histéria como Trauma. In: SELIGMANN-SULVA, Marcio; NESTROVSKI, “Arthur (Orgs). Catixiree « Represmtaa, Sto Paulo: Eseuta, 2000, p. 73-98 VIDAL-NAQUET, Pierre. Les arasins de da ménair: “Un Bichmann de papier” et autres cessuis sur le révisionisme. Paris: La Découverte, 1987 WEIGEL, Sigrid, Télescopage im UnbewuBitsein. Zum Verhiltnis von Trauma, Geschichtsbegriff und Literatur. Ta: WEIGEL, Sigrid (Org). Trawmra, Zwischen Psychoanalyse und kulturellen Deutungsmuster. Kéln/Weimar/Wien: Bohlau, 1999, p. 51.76. WILKOMIRSK1, Binjamin, Fragontr, Memiries de uma infnia 1939-1248, Traducio 8. “Tellaoli Sio Paulo: Cia, das Letras, 1998 00-63 (Dos 153

You might also like