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Apresentagao ‘A bioquimica é, sem divida, uma das ciéncias mais fascinantes porque desmonta o ser vivo em seus componentes basicos e tenta explicar o funcionamento ordenado das reagdes quimicas que tornam possivel a vida, freqlentemente adjetivada como milagre ou fendmeno, Entretanto, 0 processo quimico muito bem organizado que estabelece toda a existéncia da vida em nosso planeta, tem sido desvendado, continuamente, por cientistas do mundo inteiro, Muito j4 se sabe, porém 0 desconhecido é a esséncia do conhecimento humano e a luta para desvenda-lo advém da natureza desbravadora da humanidade, que no se furta com explicagdes empiricas e procura a razio dos fatos ao invés de eternizé-los mitos. Os capitulos que se seguem representam a organizagdo de informagées basicas para o aprendizado de Bioquimica Humana, resultado do contetido das aulas que ministro ha pouco mais de uma década, Como tal, possuem um cariter estritamente diditico, no dispensando, de forma alguma, a consulta as referéncias bibliogrificas sugeridas ao final de cada capitulo e outras, existentes na literatura especializada. Entretanto, ndo se tratam de “apostilas” repletas de dicas e “macetes” que tornam o ensino estereotipado. Pelo contririo, é um trabalho realizado com carinho e atengdo para facilitar o aprendizado em bioquimica nos cursos de Farmécia, Medicina, Biologia, Biomedicina, Nutricdo, Enfermagem, Odontologia ¢ areas afins. formato eletrénico em arquivos PDF é uma alternativa econdmica e pritica de acesso aos meus textos originais, contomando dificuldades editoriais préprias de nossa regiao, Acima de tudo, este E-book (livro eletrénico) corresponde a um protétipo para uma futura publicagdo em formato tradicional e, como todo material didatico, estes textos esto em constante atualizagdo, sendo a sua opinido (informando falhas, sugerindo mudangas etc.) de extrema valia para a realizagdo de um trabalho cada vez mais completo, possibilitando um retorno positive para o proceso ensino- aprendizagem. Prof, Ricardo Vieira Universidade Federal do Para Centro de Ciéncias Biolégicas Laboratério de Genética Humana e Médica Ay, Augusto Corréa n® 1 ~ Guamé Belém - Pard - CEP: 66.075-900 Fone/Fax: (091) 211-1929 smail; jrvieira@ufpa.br HomePage: http:/www.fundamentosdcbioquimica hpg.com.br Belém-Pard 2003 A Georgete, minha companheira e cimplice. A meus pais, Benedito e Scila Vieira, meus mestres. A meus alunos, meus inspiradores. Capitulo 1 O que estuda a Bioquimica? estudo da Bioquimica infere um coneeito nato de que exis- te uma quimica da vida, ow ento que hd vida pela quimica. Antes que um conceito filoséfico ou religioso, a vida, aqui, deve ser tratada como o resultado da maximi- zasio de fatores fisicos e quimicos presentes em um sistema aberto extremamente frigil: a célula, Neste microscépico tubo de ensaio esto os componentes necessirios para que o ser vivo complete o classico ciclo da vida, ou seja, nascer, crescer, reproduzir © morrer, tudo resultado de um processo natural de de- senvolvimento de reagées quimicas tipicas com reagentes, produtos e catalisadores que, quanto melhor as condigdes dtimas de reagao, melhor a eficdcia com que serdo executadas. Do ponto de vista quimico, os seres vivos sdo constituidos de elementos bastante simples € comuns em todo o universo: carbo- no, hidrogénio, nitrogénio e oxigénio (bases dos compostos organicos), além de uma infi- nidade de outros elementos presentes em quantidades relativamente menores, mas de funcdes imprescindiveis ao funcionamento celular (p.ex.: ferro, enxoffe, célcio, sédio, potassio, cloro, cobalto, magnésio etc.) O agrupamento desses elementos, em moléculas com fungdes distintas, foi um pas- so longo e decisivo para a afirmacio do pro- cesso de vida em nosso planeta. O processo de obtengdo de energia através da glicose na auséncia de oxigénio, por exemplo, é um pro- cesso to organizado que ele & exatamente 0 mesmo em todos os seres vivos, diferindo somente na forma como o produto final é pro- cessado, sendo que a maioria dos seres vivos prossegue com o metabolismo aerébio, porém todos os seres vivos, sem excegio, realizam 0 metabolismo anaerdbio de degradagdo da gli- cose. Existe uma relagdo direta entre a produ- G80 de oxigénio pelas cianoficeas ¢ 0 surgi- mento dos seres multicelulares levando a incrivel diversidade de espécies dos dias atu- ais. Sobre este aspecto, veja 0 que dizem Al- berts, B. ef al. (1997). rvidéncias geoldgicas sugerem que houve mais de sum bilhdo de anos de intervalo entre o aparecimen- to das cianobatérias (primeiros organismos a libe- rar oxigénio como parte do seu metabolism) ¢ 0 pperiodo em que grandes concentragies de oxigénio comecaram a se acumular na atmosfera. Esse in- tervalo tao grande devew-se, sobretudo, é grande quantidade de ferro solve existente nos oceanos, que reagia com 0 oxigénio do ar para formar e- normes depésitos de dxido de ferro.” Certamente, este processo lento de libe- ragdo de oxigénio como um dejeto indesejavel dos primeiros habitantes de nosso planeta, foi responsvel pelo surgimento de um outro orga- nismo adaptado em consumir este oxigénio como comburente de moléculas organicas libe- rando, assim, a energia térmica tio necessiria para a manutengo da vida. ‘Mas, descrever o processo complexo que ¢ a vida nao é tarefa tio simples quanto possa parecer. Na verdade desde que o universo surgiu ha cerca de 20 bilhées de anos, a vida na Terra tem apresentado mecanismos impares de reprodugdo ¢ desenvolvimento que muitas ve- zes sio tnicos na natureza e desafiam os con- ceitos bioquimicos como por exemplo os seres que habitam as fossas abissais vulcdnicas do Pacifico, que sobrevivem & temperaturas supe- riores a 120°C; ou os virus, que ndo possuem estrutura celular sendo formados, basicamente, apenas por proteinase dcidos nucléicos. Um fato comum a todos os seres vivos, porém, & a presenga de macromoléculas exclu- sivas dos seres vivos (carboidratos, lipidios, proteinas, vitaminas e acidos nucléicos) deno- minadas de biomoléculas. Desta forma, a qui- mica da vida esti attelada a composigdo bisica de todo ser vivo, uma vez que todos possuem pelo menos dois tipos de biomoléculas, como no caso dos virus. Lavosier e Priestly (final do século XVIN, Pasteur, Liebig, Berzelius e Bernard (século XIX) foram pioneiros na pesquisa de qual seria a composicdo dos seres vivos, sendo Fundamentos de Bioquimica - Capitulo 1 ~ 0 que Estuda a Bioguimica? 2 © termo biequimiea introduzido em 1903 pelo quimico alemio Carl Neuberg. Inicial- mente, esta nova ciéneia era denominada quimica fisiolégica ou entio quimica biolégi- ca, tendo a Alemanha, em 1877, publicado a primeira revista oficial desta nova disciplina (Zeitschrift fiir Physiologisce Chemile) e, em 1906, a revista norte-americana Journal of Biological Chemistry consagrou-se como im- portante divulgadora das novas descobertas no campo da bioquimica, sendo editada até hoje. Apés 1920, os Estados Unidos tiveram_ uma participagdo decisiva para o crescimento desta nova ciéncia com a descoberta, isola- mento, sintese e descrigo do mecanismo de regulacdo bioldgica de incontveis compostos bioquimicos com a utilizagao de isétopos ra- diativos como marcadores. Desde 1950, a bioquimica tém-se tomado, cada vez mais, ‘uma das ciéncias que mais crescem no campo do conhecimento humano tendo papel decisi- vo na elucidagdo do mecanismo fisiolégico ¢ patolégico de regulagdo de varios compostos bioquimicos de fundamental importéncia para a satde do ser humano. Atualmente, os méto- dos de diagnéstico e tratamento da maioria das doengas, so estudados a partir de uma base bioquimica, revelando as causas, as con- seqiiéncias e maneiras de se evitar o inicio ou a propagagdo das mais diversas patologias. Neste capitulo, sero apresentadas as principais moléculas envolvidas no processo da vida, introduzindo 0 estudo dos fundamen- tos de bioquimicas que serd efetuado nos ca- pitulos posteriores. A Natureza das Biomoléculas As biomoléculas possum caracteris- ticas quimicas comuns as demais moléculas da natureza. Porém, quando associadas em um sistema biolégico, possuem uma dindmica prdpria de regulagao e sintese, que proporcio- nam as caracteristicas de cada ser vivo. O ambiente ideal para que ocorram estas reagdes €a célula, com uma série de organelas especi- alizadas nas mais variadas fungdes bioqui cas, A principio, os seres vivos dos cinco reinos da natureza (Animalia, Plantae, Fungi, Monera ¢ Protista) possuem mecanismos pr6- prios de organizaciio celular, de acordo com sua relagdo com o meio ambiente (as plantas so aut6trofas, por exemplo) ou entre si (os Mone- ras ¢ Protistas so unicelulares), ainda havendo distingdo quanto & organizagdo das organelas celulares (os moneras sao procariotas, e portan- to, ao contrario dos demais, ndo possuem ne- nhuma estrutura intracelular de membrana). Apesar das diferengas, contudo, todos os seres vivos apresentam uma dindmica bioquimica celular muitissimo parecida, evidenciando 0 sucesso evolutivo dos processos experimenta- dos nos bilhdes de anos de aperfeicoamento. As vias metabdlicas celulares constituem um ema- ranhado de reages quimicas que se superpoem, mas, maravilhosamente, no se atropelam e sim se completam formando um complexo e preciso ciclo quimico de consumo de reagentes (em bioquimica denominado de substratos) e for- maciio de produtos, como em uma reagao qi mica qualquer. A forma de regulacdo destas reagdes levam a uma intricada mecanica meta- bélica tendo ao centro a degradaco (catabo- lismo) e sintese (anabolismo) de biomoléculas, Os virus traduzem um capitulo a parte no estudo da bioquimica por apresentarem me- canismos tinicos de reprodugdo e desenvolvi- mento. Possuem apenas dois tipos de biomolé- culas, proteinas e acido nucléico (DNA ou RNA), necessitando do ambiente celular para seu desenvolvimento, podendo permanecer cristalizados por milhares de anos em estado de inércia quando fora do meio biolégico. Alguns virus mais complexos, possuem carboidratos € lipidios em sua composigao oriundos da mem- brana do hospedeiro durante 0 processo litico. Agua E 0 composto quimico mais abundante (de 60 a 85% do peso total da maioria dos teci dos) sendo o solvente adequado para os com- postos minerais ¢ bioquimicos (Figura 1-1). Apesar de nao ser uma biomolécula verdadeira (existe em grande quantidade livre na natureza, independente, até, da existéncia organismos vivos - existe 4gua na lua e livre no vacuo do espaco), gracas 4 sua polaridade, a 4gua conse- gue dissolver a maioria das biomoléculas (ex- cegdo as gorduras) criando uma capa de solva- Ricardo Vieira Fundamentos de Bioquimica - Capitulo 1 ~ 0 que Estuda a Bioguimica? 3 tagdo ao redor delas, induzida por pontes de hidrogénio. Entretanto, a Agua também parti- cipa ativamente em reagdes bioquimicas (p. ex.: hidrélise, condensagdo) 0 que a tora um dos componentes quimicos mais importantes para a vida. De fato, o simple: na forma liquida permite a inferéncia de exis- téncia de formas de vida (pelo menos como nds a concebemos) seja no mais arido e quen- te deserto, nos gélidos e secos pélos da Terra ou nas mais profundas, escuras e ferventes fossas abissais do Pacifico (e, quem sabe, em outros planetas do nosso sistema solar). Figura 1-1: A molécula da agua possui polaridade devido a diferenga de carga entre os dtomos de hidro- génio ¢ o de oxigénio que, por ser mais eletronegativo, favorece a eriago de uma nuvem eletrSnica em tomo de seu nicleo, induzindo a uma carga formal positiva ppara os étomos de hidrogénio. Esta polaridade permite © surgimento de pontes de hidrogénio o que toma a ‘gua um soluto perfeito para a maioria das biomoléeu- as. (Adaptado de Lolinger, AL et al, 199) Em organismos multicelulares, a gua distribui-se em dois ambientes: liquido intra- celular (LIC) e liquido extracelular (LEC) que, por sua vez, compde-se do liquide intra- vascular (plasma sangiiineo) ¢ liquido inters- ticial nos seres mais complexos, como ¢ 0 caso do ser humano, objeto central de nosso estudo. O sangue é 0 mais importante com- partimento liquide do organismo e serve de base para o estudo do metabolismo de varios compostos bioquimicos. Freqiientemente, os valores médios da concentragdo das biomolé- culas em um individuo, para efeito de estudos metabslicos, baseiam-se na composigdo plas- mitica (a parte liquida do sangue). © sangue exerce um importante papel no estudo da bioquimica, uma vez que possui fungSes chaves na manutengdo dos processos fisiolégicos. E indispensavel pelo transporte de nutrientes, metabélitos, produtos de excrecdo, gases respiratérios, horménios e de células & moléculas de defesa, Em animais de grande porte, é indispensavel como dissipador do calor produzido pela alta taxa metabélica celular, impedindo que as células entrem em colapso quimico em virtude do aumento da temperatura ambiente, A capacidade de coagulagdo é uma importante propriedade sangiiinea que garante 6 fluxo constante do sangue nos vasos, evitando perdas por hemorragia ‘A maioria dos seres multicelulares pos- sui sangue ou algum tipo de liquido com fungio correlata (p.cx.: a hemolinfa de insetos), sendo que mamiferos e aves possuem um sistema de manutengo da temperatura corpérea extrema- mente eficaz ("sangue quente"), © que ndo per- mite modificagées bruscas na temperatura de ago bioquimica. Os demais animais de "san- gue frio" nfo conseguem evitar as trocas de temperatura com o meio ambiente e a tempera- tura interna varia consideralvelmente, levando a um metabolismo energético diversificado dos de "sangue quente”, Entretanto, varios peixes velozes (p.ex.: tubardo, salmao) possuem me- canismos particulares de aquecimento constante do sangue para manter uma temperatura cons- ‘tante para suas as altas atividades metabélicas de predadores, o que os toma verdadeiros pei- xes de "sangue quente”, A 4gua, ainda, ¢ importante na manu- tengo do equilibrio quimico celular mantendo as concentrages de H’ © demais eletrélitos dentro de faixas estreitas evitando variagées letais de pH e osmolaridade. E claro que esta manutengdo sé é possivel gragas a um comple- xo proceso bioquimico e fisioldgico envolven- do horménios (p.ex.: aldosterona, cortisol), Grgdos especializados (p.ex.: rins, pulmées, adrenais) ¢ um sistema fisiolégico de tampaes bioquimicos (p.ex.: Hb/HbO2; H;CO/HCOs). Em organismos marinhos, a agua é a responsavel pelo fornecimento do oxigénio ¢ dispersdo de excrementos, como 0 CO> € com- postos nitrogenados, que favorecem a matéria Ricardo Vieira Fundamentos de Bioquimica - Capitulo 1 ~ 0 que Estuda a Bioguimica? 4 prima para o fitoplincton produ, carboidra- tos, aminoacidos (e outros nutrientes) ¢ o O: essenciais para a manutengdo do equilibrio ecolégico da Terra. Proteinas Sao as biomoléculas mais abundantes, possuindo iniimeras fungdes, dentre elas a indispensavel fungo catalisadora exercida pelas enzimas, sem a qual ndo seria possivel a maioria das reagdes celulares (apesar de al- gumas moléculas de RNA possuirem ago catalitica idéntica a enzimas). Sao formadas por aminodcidos ligados por ligagdes quimicas extremamente fortes entre seus grupamentos funcionais amino (NHz) e acido carboxilico (COOH), as liga- ses peptidicas (Figura 1-2). ceaminoscidos | 1 HN -C-H | 1 COOH oem Ligagdes peptidicas R | 1 N-C-H | ri H COOH Extenide carbeiterminal Figura 1-2: A ligayio peptica entre dois aminodci- dos 6 extremamente rigida e ndo gira, porém pode doar ou receber protons quando em meio basico ou deido. Outras ligagdes ocorrem entre o res- tante da cadeia carbonada dos aminodcidos, como ligagdes covalentes entre os grupamen- tos -SH de dois aminoacidos cisteina, for- mando uma ponte dissulfeto, pontes de hidro- génio entre grupamentos polares da cadeia carbonada, ou até ligages fracas do tipo de van der Waals, mas que garantem uma incri- vel estabilidade e conformagdo tridimensional tinica as proteinas, relacionada diretamente com sua fungdo (Figura 1-3). igura 1-3: A estrutura tridimensional da mioglobina, proteina especializada em liberar © O2 gue transporta, somente em baixa pO; que traduz. sua importdncia no ‘metabolismo muscular. (Adaprado de Campbel, MK, 1995) De fato, essa propriedade de assumir formas variadas proporciona um papel impor- tante na estereoquimica celular, onde as reagGes so quase todas enziméticas ¢ ocorrem com ‘uma especificidade da enzima ao substrato ga- rantida pela forma tridimensional final das pro- teinas. Quaisquer modificagdes nesta estrutura modificaré a afinidade da enzima pelo substrato e isso seré utilizado pela célula para regular a ago enzimatica. ‘As proteinas normalmente abastecem e suprem as necessidades corpéreas de aminodci- dos e do nitrogénio neles contido. Toda protei- na presente na dieta de seres humanos é digeri- da e entra na circulagdo como aminodcidos individualizados ou mesmo como dipeptideos (compostos por dois aminodcidos), indo ao figado que inicia seu proceso metabélico. Os animais so capazes de sintetizar somente 10 dos 20 aminodcidos necessarios para a sintese protéica (0s aminodcidos deno- minados nio-essenciais: glicina, alanina, seri na, prolina, cisteina, dcido aspartico, écido glu- tamico, asparagina, glutamina e tirosina), ¢ os outros 10 sto incapazes de serem sintetizados e devem estar presente na alimentagdo (os ami- nodcidos essenciais: treonina. lisina, metioni- na, arginina, valina, fenilalanina, leucina, trip- tofano, isoleucina e histidina). Ricardo Vieira Fundamentos de Bioquimica - Capitulo 1 ~ 0 que Estuda a Bioguimica? 5 Alguns aminodcidos podem ser sinte- tizados no organismo mas a uma taxa que o toma essencial na alimentago, como é 0 caso da arginina que é utilizada quase que inte- gralmente na sintese da uréia ¢ da histidina que & produzida em quantidade insuficiente para a sintese protéica, porém tornam-se qua- se que desnecessirios na dieta de adultos, quando o crescimento (¢, portanto, a fase de maior sintese de proteinas estruturais) chega ao fim. Em contrapartida, os aminodcidos ditos ndo-essenciais cisteina e tirosina sto sintetizados a partir dos aminodcidos essenci- ais metionina ¢ fenilalanina, o que os torna, de cera maneira, dependentes da presenga desses aminodcidos essenciais. No figado, os aminodcidos absorvidos no processo digestivo so convertidos nas proteinas plamaticas: 1) alumina (fungio de transporte); 2) a:1-globulina (glicoproteinas ¢ lipoproteinas de alta densidade); 3) a2- globulinas (haptoglobinas, transportadoras de hemoglobina que saem das hemécias); 4) B- globulinas (transferrina, lipoproteinas de bai- xa densidade) e 5) fatores da coagulaco san- giimea (fibrinogénio e protrombina). No plasma sangiiineo encontra-se, ainda, uma infinidade de proteinas produzidas em outros locais do organismo, como é 0 caso das globulinas (os anticorpos) que sao sintetizadas por linfécitos e outras proteinas teciduais. Alguns aminodcidos sio convertidos, no figado, em bases nitrogenadas (para a sin- tese de dcidos nucléicos) e outros produtos nitrogenados. Em varios tecidos, possuem fungdes das mais diversas, como base de sin- tese de horménios ¢ neurotransmissores. A parte nitrogenada dos aminodcidos metabolizada no figado de mamiferos, anfi- bios adultos, ¢ tartarugas & convertida em uréia e excretada pelos rins. Aves, répteis, insetos ¢ invertebrados terrestres excretam 0 nitrogénio protéico como acido Girico, enquan- to que peixes, invertebrados aquaticos, anfi- bios na forma larviria excreta na forma de am@nia (crocodiles sintetizam, também, amé- nia ¢ tartarugas uréia a partir do nitrogénio protéico), A cadeia carbonada dos aminoacidos é convertida em intermediérios do metabolismo energético celular, porém esta fungdo corres- ponde a uma pequena fragdo do poderio biol6- gico das proteinas que so, sem divida nenhu- ma, as biomoléculas de maior niimero de fun- Ses em um organismo vivo. A funcdo energé tica & prioridade de duas outras moléculas: os carboidratos e os lipidios. Carboidratos Jo os principais substratos energéticos da célula, através da degradaco da glicose por via anacrdbia ¢ acrbia (Figura 1-4). Popular- mente sto chamados de agticares em virtude do seu mais conhecido representante, a sacarose, formada por um molécula de glicose e outra de frutose com sabor doce caracteristico. O amido (um polimero linear ou ramificado de glicose), entretanto, é a forma de carboidrato mais co- mum na alimentagio, representando cerca de 90% dos carboidratos da dieta. Em mamiferos, a lactose (formada por glicose e galactose) é importante fonte energética presente no leite, apesar da maioria dos mamiferos utilizarem 0 leite como tinica fonte de alimento somente em seus primeitos periodos de vida (em ratos al- guns dias, em humanos cerca de um ano). Figura 1-4: A molécula de glicose (uma hexose - car boidrato de seis carbonos) em sua forma ciclica De qualquer forma, os carboidratos sto as principais biomoléculas energéticas, uma vez © metabolismo glicolitico anaerdbio & via co- mum de todos os seres vivos Jo dos virus por ndo terem estrutura celular, sendo considerados por muitos autores como formas intermediérias entre setes vivos ¢ particulas quimicas de transmissio de infeccdes, assim como os prions, estes compostos apenas de proteinas). Ricardo Vieira Fundamentos de Bioquimica - Capitulo 1 ~ 0 que Estuda a Bioguimica? 6 Hé a necessidade de ingestio minima de cerca de 50 - 100 g de carboidratos por dia para garantir suprimento de glicose sangtii- nea (glicemia) que, por sua vez, nutriré os tecidos, permanecendo a glicemia normal em tomo de 70 - 110 mg/dl. A hipoglicemia ca- racteriza-se por varios sinais ¢ sintomas como tonturas, fraqueza muscular, suor firo, invita lidade, fome, palpitagao, dor de cabega, sono- Iéncia, convulsao, podendo atingir o coma ¢ a morte. A hiperglicemia quase sempre é um achado patolégico laboratorial, sendo dificil a percepgo de sinais sintomas clinico diretos, sendo observada, principalmente, em patolo- gias especificas como o diabetes mellitus, caracterizada pela auséncia ou produco insu- ficiente de insulina (ou de seus receptores celulares). As principais fontes de carboidratos so os vegetais produtores de amido como reserva energética (p.ex.: milho, mandioca, beterraba, arroz € todos os cereais), seguido dos produtores de sacarose (cana-de-agivcar, beterraba). As frutas contém grande quantida- de de frutose, além de outros carboidratos; 0 leite e seus derivados, contém a lactose. Os alimentos de origem animal (fora 0 leite e seus detivados) contém muito pouco teor de carboidratos, reservando-se ao figado € aos misculos as principais fontes em virtude de serem sede da sintese de glicogénio (poli- mero de glicose bem mais ramificado que 0 amido, sintetizado, também por fungos e al- guns protozodrios). Entretanto, apés o abate do animal, as reservas de glicogénio rapida- mente se esgotam em virtude da continuidade do metabolismo celular mesmo apés a morte fisioldgica. Assim sendo, a quantidade de glicogénio presente na alimentagdo humana é quase inexistente, estando presente, portanto, somente na dieta de animais carnivoros que devoram suas presas imediatamente apés o abate Os carboidratos podem ser convertidos em gorduras quando ha a ingestio de quanti- dades excessivas is necessidades energéticas podendo levar a patologias associadas ao ex- cesso de alimentagao (obesidade, aterosclero- Uma mé-higiene den proporciona a utilizagao dos carboidratos pe- los microorganismos presentes na boca 0 que aumenta a incidéneia de caries dentarias em virtude da destruicaio da dentina pelo acido léc- tico ou etanol (produto final do metabolismo anaeribio de bactérias e fungos). Da mesma forma, uma ingestio aumentada de carboidratos pode proporcionar distirbios intestinais com as bactérias produzindo grande quantidade de ga- ses, com comprometimentos patolégicos diver- sos. A caréncia de carboidratos na alimenta- 40, por sua vez induz ao consumo aumentado das gorduras e proteinas musculares para a pro- dugdo de energia, caracteristicas 0 que é co- mumente utilizado em dietas de programas de redugdo de peso corpéreo. Deve-se levar em consideragdo, entretanto, que a utilizagdo em excesso de lipidios (principalmente) e proteinas para a produedo de energia, poderd trazer in- convenientes fisiolégicos, com a produgdo de dejetos metabdlicos danosos ao organismo quando em grande quantidade, como é 0 caso dos corpos ceténicos que induzem a queda do pH ¢ da destruigdo da camada mielinica dos neurénios. Lipidios A gorduras, como so conhecidas popu- larmente, so a principal fonte de armazena- mento energético, podendo manter alguns tipos de células vivas por varios anos (p.ex.: semen- tes oleaginosas), 3s lipidios fornecem significativa quan- tidade de energia (quase o dobro dos carboidra- tos), porém ndo é esta a sua fungao primaria na alimentagdo, uma vez que a absorgdo intestinal dos lipidios se da pela linfa ¢ nao pela corrente sangilinea como os demais nutrientes. Desta forma, os lipidios energéticos (dcidos graxos na forma de triglicerideos - Figura 1-5) so capta- dos pelos tecido adiposo Id ficando armazenado até que haja necessidade energética (como no caso de dietas hipoglicidicas ou no paciente diabético o qual ndo consegue produzir energia através da glicose, uma vez que ela ndo penetra na célula). Por esta razio, os acidos graxos ndo so to bem aproveitados para o metabolismo energético como a glicose que, apesar de menos I6rica, € bem mais rapidamente degradada pelas céhulas. Ricardo Vieira Fundamentos de Bioquimica - Capitulo 1 ~ 0 que Estuda a Bioguimica? 7 ; on Acido estearico (18:0) ¥ wee- 0-n1 H-C- O-R1I webs ooRs H Figura 15: 0s iis entices, 0 sido xii possui 18 carbonos sem nenhuma dupla ligagio (satu- rado); 0 carbono 1 & denominado alfa (a) e contém 0 gTupamento funcional (COOH); 0 segundo denomina- se © 0 iiltimo carbono (18) & denominado émega-1 (©), sendo 0 carbono 17 denominado w-2, 0 16 de w-3 assim sucessivamente, Além de conferir um sabor caracteris- tico aos alimentos e de proporcionar uma sen- sagdo de saciedade, a dieta lipidica veicula as vitaminas lipossoliveis e supre o organismo dos acidos graxos essenciais poli-insaturados que 0 ser humano ¢ incapaz de sintetizar, co- mo 0 Acido linolico (0-6); linoléico (0-6 & 9); aracdénico (20:4). Os dcidos graxos saturados (presente nas moléculas de triglicerideos) fornecem energia quando as fontes de carboidratos se esgotam, sendo bem mais caléticos que os insaturados. O excesso da utilizagao dos lipi- dios para 0 metabolismo energético fornece uma quantidade de um composto energético alternativo, os corpos ceténicos, que suprem miasculos e neurdnios na falta de glicose (neu- rénios s6 consomem glicose e corpos ceténi- cos como combustivel energético), porém trazem complicagdes clinicas quando produ- zidas em excesso (como a degeneragio da bainha mielinica de protegdo dos neurdnios € a queda do pH plasmitico). O colesterol (Figura 1-6) é encontrado exclusivamente em gorduras animais, sendo a gema do ovo a principal fonte, mas nao possui funcio energética e acumula-se nos vasos sangilincos quando a ingestdo didria supera a quantidade de 1g. Atualmente, 0 Ministério de Satide tem proibido a divulgagao do rétulo “nao contém colesterol” que comumente eram colocados em frascos de dleos vegetais, © que corresponde a uma redundancia, uma vez. que nenhum éleo de origem vegetal contém colesterol, mas leva as pessoas a relacionarem a auséncia colesterol com uma melhor qualida- de do dleo, o que nao é verdade (a qualidade de um éleo vegetal esti em uma maior quantidade de dcidos graxos poli-insaturados, menos calé- ricos), oF no ‘COLESTEROL Figura 1-6: A molécula de colesterol estd presente ivamente em gorduras animais. Quimicamente, é tum aleool de cadeia longa, mas que é classificado como lipidio em virtude de sua insolubilidade na gua. © excesso de lipidios da alimentagao induz a uma rapida deposigdo dos triglicerideos nos adipécitos ¢ a saturagio do figado na de- gradagio do colesterol. A nio realizac3o de exercicios fisicos para compensar uma ingest3o aumentada de lipidios, pode refletir-se em so- brepeso e até a obesidade, principalmente quando a alimentagdo ocorre em periodos de baixa atividade fisica (como a noite, antes do sono), Acidos Nucléicos Os Acidos desoxirribunucléico (DNA) (Figura 1-7) e ribonucléico (RNA) sio as molé- culas informacionais, através das quais so sin- tetizadas todas as proteinas do organismo. O processo de replicagdo (sintese do DNA) é rea- lizado de forma extremamente cuidadosa para que niio resulte em erros na seqtiéncia de DNA do genoma das células filhas ¢, consequente- mente, erros na produedo de proteinas, uma vez que durante o ciclo de vida de uma célula, hi a sintese de RNAm (mensageiro) a partir de um molde da molécula de DNA. Este processo (transcrigdo) esté intimamente atrelado & sinte se de proteinas (tradugdo), onde 0 RNAm & processado de maneira tal a se encaixar nos RNA dos ribossomos (RNAr) c favorecer a adigdo de aminodcidos que chegam transporta- dos pelos RNA transportadores (RNAt). Ricardo Vieira Fundamentos de Bioquimica - Capitulo 1 ~ 0 que Estuda a Bioguimica? 8 340m ‘A descoberta da estrutura de dupla heli ce em espiral da molécula de DNA em 1953 por Wat- ick, trouxe informagSes importantissimas para desvendar o papel dos acidos nueléicas para o metabo- lismo de todos os seres vivos. Tanto o RNAr quanto o RNAt (assim como os RNAm), sio sintetizados a partir de uma ou mais seqiiéncias de nucleotideos de DNA (unidade de polimerizagio dos dcidos nucléicos, formados por uma pentose, uma base nitrogenada ¢ um grupamento fosfato). Estas seqiléncias que codificam uma informa- G40 (proteinas ou moléculas de RNA) sio demoninadas de genes, as unidades basicas das caracteristas genéticas. O cromossomo € formado por uma nica molécula de DNA superenovelada e que possui um tamanho enorme, perto das propor- ges microsedpicas da célula. Se unissemos todos os 23 pares de cromossomos do ser hu- mano, por exemplo, terfamos uma molécula de cerca de 1,5m (imagine tudo isso enovela- do dentro do macleo celular!). Entretanto, a- penas cerca de 95% de todo esse DNA cor- respondes a genes (regides codificadoras de informago). A grande maioria do DNA cons- titui-se de regides que ndo codificam nenhu- ma informagdo (sintese de proteinas ou RNA), mas possui fungdo de espacamento entre os genes (possibilitando um enovela- mento ordenado do cromossomo) além de conter regides de controle da expressio géni- ca e zonas de DNA repetitivo (utilizadas na identificagdo individual tal como uma "impres- so digital de DNA"). Dentro das seqiiéncias codificadoras dos genes (os éxons) existem outras que nao codifi- cam absolutamente nada (os introns), mas que podem possuir fungdes de regulagdo da expres- so do gene bem como informagdes que sio utilizadas no estudo da evolugao molecular que permite relacionar a caracterizagao de espécies, géneros e grupos filogenéticos bem definidos, estabelecendo os caminhos evolutivos que as espécies atuais devem ter percorrido, o que faz. de seu estudo uma poderosa ferramenta da pa- Ieontologia, antropologia ou qualquer ramo da biologia evolutiva. A tecnologia da manipulagao da molé- cula de DNA (p.ex.: sintese in vitro , reagdes de hibridizagdo) tem sido utilizada com grandes vantagens no diagnéstico de doengas metabdli cas de cunho genético ¢ doengas infecciosas (pela identificagao de DNA de microorgani mos em amostras biolégicas). Entretanto, os custos € da mao-de-obra altamente qualificada para sua execugdo, ainda restringem a maioria das téenicas & laboratérios de pesquisa. Contu- do, hé um futuro bastante promissor para esta proxima década na popularizagio dos métodos diagnésticos por biologia molecular. Vitaminas Fazem parte de um grupo de biomolécu- las nao sintetizadas pelo ser humano e que pre- cisam estar presentes em pequenissimas con- centragdes na célula para que ocorram varias reagdes celulares indispensaveis para a vida, (a maioria funcionando como co-fatores enzimat cos), 0 que garante o elo indispensavel entre os animais e vegetais na cadeia alimentar, uma vez. que sto produzidas por vegetais, bactérias, fun- gos ¢ animais, tormando-se indispensdveis na alimentagao. Quimicamente, as vitaminas sio dificeis de serem classificadas, uma vez que pertencem as mais variadas classes quimicas (p.ex.: a vi tamina A é um terpeno, a BI é uma amina, a C um dcido carboxilico). De uma maneira geral, classificamos as vitaminas, quanto as caracte- risticas de solubilidade, como hidrossoliveis (BI, B2, B6, B12, C, biotina, Acido félico, sci: do pantoténico) e lipossohiveis (A, D, E, ¢ K) Ricardo Vieira Fundamentos de Bioquimica - Capitulo 1 ~ 0 que Estuda a Bioguimica? 9 Sdo requeridas na dieta em quantida- des minimas, sendo chamadas de oligoele- mentos (do grego oligos= pouco) juntamente com alguns minerais. A maioria delas possui baixa resisténcia ao calor 0 que faz com seja necessdrio ingerir os alimentos que as contém crus, pois a cocedo destruiria as vitaminas (as vitaminas lipossoliiveis so as menos termo- labeis). Entretanto, apesar do conceito geral de que vitaminas sio indispensaveis na dieta, nem sempre isso é verdade. Algumas ndo si0 necessarias na dieta de todos os animais, em virtude de serem sintetizadas no organismo (p.cx.: somente os primatas, alguns roedores ¢ passaros néo sintetizam a vitamina C). Outras sdo sintetizadas por microrganismos da flora intestinal normal, sendo absorvidas indepen- dente da ingestio de fontes alimenticias (Vi- tamina B12 ¢ K). A vitamina K pode ser obti- da pela conversao de um derivado do coleste- rol apés a agdo da radiagdo ultravioleta solar € & considerada por alguns autores mais um horménio do que uma vitamina. Outra caracteristica marcante das vi taminas € 0 fato de que a sua auséncia espec' fica na alimentago causa uma doenca caren- cial propria (p.ex.: 0 escorbuto na caréncia de vitamina C; 0 béri-béri na caréncia de B1). Contudo, esta propriedade ndo ¢ evidenciada muito facilmente, pois em um estado de des- nutrigGo, ha a culminancia de varias caréncias vitaminicas levando a um quadro sintomato- légico complexo ¢ nao apenas 0 aparecimento de uma doenga carencial especifica. ‘A maioria das vitaminas s40 cofatores de reagdes enzimaticas (0 que justifica em si sua necessidade em pequena quantidade, jé que as reagdes enzimiticas sdo reciclaveis) € a sua inexisténcia na célula toma invidvel 0 processo de vida. Interessantemente, a admi- nistragdo de vitaminas em dosagens acima das necessidades didrias so utilizadas na terapéu- tica para corrigir sintomas que nem sempre tem correlagio direta com sua ago biolégica (p. ex.: a vitamina BG é utilizada no tratamen- to de enjéos). Esta conduta terapéutica sé pode ser realizada sob prescricao médica, uma vex que altas dosagens de vitaminas podem ser toxicas ¢ s6 so possiveis com a adminis- tragdo de vitaminas na forma de medicamen- tos (somente a vitamina C pode atingir niveis de hipervitaminose por ingestio das fontes ali- mentares). 0 uso indiscriminado de vitaminas co- mo medicamento por pessoas leigas que acred tam serem "elementos milagrosos e energéti- cas" & uma preocupagao constante dos profis- sionais de saiide, atualmente, uma vez que tra- ta-se de moléculas altamente especializadas sua agdo téxica pode trazer a lesdes graves para © sistema biolégico se mio for administrada com pericia e precauydo. Minerais Sdo compostos de origem inorginica necessarios para uma série de fungdes biogui- micas importantes como, por exemplo, _co- fatores de reagdes enzimaticas (Mg™’, K'), fato- res da coagulagao (Ca''), regulagao do equili brio hidro-eletrolitico e acido basico (Na’, K’, CI), elementos estruturais (Ca, P*, F), trans- porte (Fe) e muitas outras fungdes. ‘As necessidades de minerais para as fungdes fisiolégicas podem ser divididas, arbi- trariamente, em dois grupos: os macromine- rais necessirios em quantidades acima de 100 me/dia (célcio, fasforo, sédio, potdssio, clore- tos, magnésio) © microminerais necessarios em quantidades abaixo de 100 mg/dia (cobalto, iodo, ferro, fiir, crémio). De maneira diferente aos demais nutri- entes, os minerais possuem um processo de absorgdo intestinal incompleto, ou seja enquan- to todos os carboidratos, lipidios e proteinas ingeridos devem ser absorvidos (sendo haverd proliferagdo bacteriana e, consequentemente, distirbios digestivos) os minerais possuem um limiar proprio para cada um deles (p.ex.: 0 Na 6 de cerca de 180 mEq/l) acima do qual nao ha a passagem do mineral para a veia porta- hepatica (que comunica o intestino e 0 figado) o excesso é excretado pelas fezes. Desta mancira, ha um controle digestive importante da concetragdo plasmatica dos mi- nerais. Contudo, quaisquer distirbios digestivos (p.cx.: patasitarios, inflamatérios, medicamen- tos) podem alterar a absorgdo dos minerais le- vando a sua deplecao e também de agua, uma vez que haveré distirbio no balanga hidro- Ricardo Vieira Fundamentos de Bioquimica - Capitulo 1 ~ 0 que Estuda a Bioguimica? 10 clettolitico, levando a diarréias ¢ a conseqtien- te desidratagao, que muitas vezes ¢ fatal A célula: 0 tubo de ensaio da vida E a unidade morfo-fisiolégica dos se- res vivos, possuindo estruturas como as mito- céndrias (em todos os seres vivos, com exce- ¢0 dos procariotas) ¢ glioxiomas (vegetais ¢ uns poucos protistas) que so a sede da pro- dugdo de energia da célula (Figura 1-8) Nas células das folhas dos vegetais existem os cloroplastos, estruturas semelhan- tes as mitocéndrias responsiveis pela fotos- sintese (Figura 1-9). Existe uma semelhanga estrutural muito grande entre mitocddrias & cloroplastos, apesar das fungdes diametral- mente opostas (producdo de energia a partir de biomoléculas e captagdo de energia para a produgdo de biomoléculas, respectivamente). Acredita-se que tais organelas eram organis- mos independentes, em um passado evoluti- vo muito distante, mas que criaram uma rela- Go simbiética com algumas células primiti- vas gerando as atuais células vegetais ¢ ani- mais atuais De fato, a existéncia de DNA comple- tamente diferente do néicleo, qualifica essas organelas como candidatas as primeiras estru- turas vivas auto-suficientes, no sentido ener- gético, a surgirem na histéria da vida na Ter- ra. Figura 1-8: A mitocéndria € a sede das reagdes ener géticas em eucariotas. Os ribossomos sio formados por RNAr € sao a sede da sintese protéica, libe- rando-as para reticulo endoplasmatico ¢, posteriormente, aparelho de Golgi onde as proteinas poderdo ser liberadas para 0 uso celular ou extracelular. Os peroxiomas sio importantes para desdobrar os radi livres formados pelo oxigénio evitando assim o enve- Thecimento e a morte celular. Os lisossomas, por sua vez, contém enzimas hidroliticas que degradam alimentos ou a propria célula (apop- tose = morte celular programada) sendo importante para determinar o tempo de vida util de uma célula. ‘As células eucariotas possuem um ni- cleo organizado que regula as atividades de reprodugdo e sintese protéicas (através do DNA). A maioria das reagées bioquimicas o- correm no citosol, que mantém rela meio externo ¢ com as organelas através de um sistema de membranas lipidico-protéico, idén- tico 4 membrana plasmitica. Os procariotas ndo possuem sistema de membrana intracelular organizado, ndo possu- indo as organclas que apresentam esta estrutura (p.ex.: micleo, mitocéndrias). Possuem (assim como os vegetais) uma parede celular extre- mamente resistente formada de polissacirides. Compreender os mecanismos que levam a imteragdo das biomoléculas com o sistema celular, seja na sintese, metabolismo ou degra- dagio, € func%o da Bioquimica. Utilizando-se de conceitos interdisciplinares (Biologia, Histo- logia, Fisiologia etc.), a Bioquimica procura explicar o funcionamento da célula a partir de um Angulo molecular, possibilitando, inclusive, a manipulagio in vitro de condigdes exclusivas das células vivas, podendo recriar o processo da quimica da vida com o advento da engenharia genética, Estamos vivendo tempos de mudan- a8 extremamente importantes no pensar cienti- fico acerca de questées vitais para a perpetua- Go de nossa espécie - ameagada de extingao pela superpopulagdo e destruigo desgovernada do ecossistema. A compreensaio dos mecanis- mos basicos de manuteng3o da vida no ambien- te celular, é indispensavel para o profissional da frea de satide e ciéncias biolégicas para que possa se posicionar em assuntos vitais e, inclu- sive, éticos dentro do exercicio de sua profis- sio. Na Figura 1-9 representa as principais organelas de uma célula eucariota Ricardo Vieira Fundamentos de Bioquimica - Capitulo 1 - 0 que Estuda a Bioquimica? ul ~ Centiolos ee — Aparato te Nwueoio < ndoplasmatca \ eoconeia Lsossomos — Membrana nar Figura 1-9 - Representago esquemitica de uma célula eucariota Curiosidades 0 estudo da bioquimica jé rendeu 63 ganhadores do Prémio Nobel de Quimica e Medicina, a mais importante premiagao cien- tifica, instituida desde 1901. Dentre eles, esté ‘um dos tinicos cientistas que ganhou duas vezes 0 prémio Nobel: é Frederick Sanger que em 1958 descobriu a estrutura da insulina e em 1980 desenvolveu técnicas de seqiiencia- mento de DNA. Linus Pauling também ga- nhou dois prémios: em 1954 por seus estudos com ligagSes quimicas de biomoléculas e em 1962 © prémio Nobel da Paz. Neste seleto clube de ganhadores de mais de um prémio ‘Nobel consta, ainda, Marie S. Curie em 1911 ganhou o Nobel de Quimica e em 1903 0 de Fisica. A seguir, a listagem completa dos ga- nhadores do Prémio Nobel de Quimica e Me- dicina com estudos bioquimicos. +2000 - MEDICINA: Anvil Caso, Paul Orage Bi R and oon eden na ua de sia no ssa nen +1999 MEDICINA: Gist Bibel por dscobrr qe rtenas possiom sas qu rear so lcalzagioe canspoe stl. + Toot MEDICINA: Rober F Furchgo, Lou J. la © Ferid Und pela excobra d ire de dio ten no faslao cs fungto wo nite cardovselr + 1997 - MEDICINA: Staley B. Prince pola desobenta dos prions, novo ml bolo de infer de aig protin + ors QUIAMCA: Paul B. Boyer c Jou E. Walker pea cu dagtodo mecnisno enemtco de snese do ATP © ene C. Stou pela descent da ezina responsive pla sinese do ap +1994 - MEDICINA: Aled. Gia ¢ Matin Rodel ele scot das proteins 1995 - Richard J, Roberts e Phylip A. Sharp pela deseoberta de splingenes 1083 - QUIMICA: Kary B, Mullins pela invenglo do metodo do PCR (Polymerase Chain Reaction - Reagbo em Casa da Polit ras) para a sntese Invitro de DNA e Michas! Smith pelo estado fem proeinas mutagénias 1982 - MEDICINA: Edmond H. Fisher © Edwin G. Krebs pela escobeta da fosfoilagsoreversve de protein. 1981 = MEDICINA: Erwin Nebore Bet Sakmann pla dessobers| das protenas canis de fons ellares 1989 - QUIMICA: Sidney Altman ¢ Thomas Cech pela descober- lade RNA com propriedadecatalica, oss - QUIMICA: Johann Deiscrhote, Robert Hubor ¢ Hamu (Che pea dterminapzo da estrtura tr-dimeasional do ceato da reapdofotossnttica [085- MEDICINA: Michael S, Brown e Joseph L. Goldssin pela Asscobera de regulasdo do metabolism do colestero. [984 - MEDICINA: Nici K. Jem, Georges JF. Kabler ¢ César Milstin pla descoberts do contole do sistema inane, 1982 - MEDICINA: Sune K. Bergstrom, Bengt L. Samucksson © Jonh R. Vane pela descoberta das prostaglandinas, 1982 - QUIMICA: Aaron Klug pelo dewseavolvimento de seni- «cas de microscopa eletrbnica por enstalografia para elcid int= ragbesprateinas/eidosmuclicos 1980 - QUIMICA: Paul Berg polos estudos de DNA recombinate «Waller Gilbert ¢ Frederik Sager por seus estos de sequenci= ‘mento de DNA. [078 - MEDICINA: Wemer Arber, Daniel Nathanse Hamiton 0, Smith pla descoberta dat enrimas de resto. 978 - QUIMICA: Peter D. Mitchel pela formulaglo da eora quimiosmdtica para asintese do ATP 977 » Roger Gullomin, Andrew V. Schally ¢ Rosalyn Yalow pela descoberta da produ de horGnios pepidcos crebas, 1975 - QUIMICA: Jonk Warcup Confort e ViadimirPrelog pelo estudo da estereoquimica de reagesenzinstias, 072 = MEDICINA: Gerald M, Edsiman e Rodaey R. Porte pla Aescoberta da estrtura protic dos anticopos. 972 ~ QUIMICA: Christian B. Anfinsen, Stanford Moore © ‘Willan H. Stein pelos estados na enzima ribonuclease [971 - MEDICINA: Fart W. J. Sutherland pela descorbera do ‘mecanismo deapto ds horméaios 971 = QUIMICA: Gerhard Herberg pelo estado da estat sletnieae geomerce dos radicais ives. 1970 - QUIMICA: Luis F. Leloir por estos na biossntese de sarboidrtos 1968 - MEDICINA: Robert W. Holley, Har Gobind Khorana e “Marshall W. Nirenberg pela intrprotasto do céigo genitice © @ sintese prota 1964 - QUIMICA: Dorothy Crowfoot Hodgkin pela eragto de ttonias de Raios-X para estabelecer a estutura de composts b- quimicos. 1064 - MEDICINA: Konrad Bloch e Feodor Lynen pela dsscobera do. mecanisme ¢ reguasio do metabolisme, do ‘lesterol edeos graxos 1962 - MEDICINA: Francis Hany Compton Crick, James Dewey ‘Watson e Maurice Hugh Frederick Wilks pela descobena da e+ trutura do DNA, 062 = QUIMICA: Max Ferdinand Perutz © John Cowdery Ken drew pelo estudo ds estaura de protenas globules 1961 = QUIMICA: Melvin Calvin polo eslaecimento da foto: sins. 1958 - QUIMICA: Frederick Sanger pela determinagdo da est tara da insli 1959 = MEDICINA: Severo Ochas © Anhur Komberg pela der ‘oberta da biosinese de DNA e RNA 1987 - QUIMICA: Alexander R. Todd pelo usbalho com nucleo tides co-enzimas 1985 - MEDICINA: Axel Hugo Theodor Thotll pla descobors a natureznoxidativa de enzimas 1985 - QUIMICA: Vincent Du Vigneaud pela sniese horn ios polipetdeos 1953 - MEDICINA: Hans Adolf Krebs Fnte Albert Lipman pela descoberts do ciclo do feidaeitica ¢ do papel da vena Ricardo Vieira Fundamentos de Bioquimica - Capitulo 1 ~ 0 que Estuda a Bioguimica? 2 1954 - QUIMICA: Linus Cat Pasting peo estudo as ligasies sguimieas de biomeéculs 1950 = MEDICINA: Edward Calvin Kendal, Tadeus Reichstin « Philp Showalter ela descabera dos horminios dh rex a= feral 1983 = MEDICINA: Henrik Cs Doisy pela descoberta da Vitamins K 1948 - QUINMICA: Ame Wilhclm Kaun Tscis pele posguiss em cltoforese de proeinas plastics. 1987 - QUIMICA: Robert Robison pelo estado de bioguinica excl Ios? ~ MEDICINA: Cas Ferdinand Cori, Gesty Theresa Cori © Bemardo Alberto Houssay pla pesquisa no metabolism do slicogénioe da glicose. T9d6 - QUIMICA: James Batchller Sumner, Joo Howard [Northrop © Wendell Meredith Stanley pelos emudos em coz 1939 = QUIMICA: Adolf Fricich Johann Butera pelo Esnido dos horminios soxuas ¢ Leopold Ruzicka pelo etude A terpenosepolimetienss 1988 = QUIMICA: Richard Khun pela pesquisa com carotenbi- dese vitamins, 1937 = MEDICINA: Alber Szent-Gydrgyi. Von Nagyrapolt pela derobera do metaboisieenergtin cellar, 1936 - MEDICINA: Illlert Dale e Oto Loew pla dessobers {a trasnisso guimica do impulo nervoso. 1937 = QUIMICA: Walter Norn Haworth © Paul Karr pelo trabalho com carboidratos,earteabides,vilahinas A, B2 ec, 1981 - MEDICINA: Otto Heinrich Warburg pela descobenta da atureza da ado das enzimas respira 1930 - QUIMICA: Hans Fisher pela pesquisa dos grpamentos rmedlicos da hemoglobin eclorfil 929 = QUIMICA: Arthur Harden, Hans Kael August Von EulerChelpin pelo estado das enzimas fermentadoras de age 1929 - MEDICINA: Christiaan Fijkman e Fredrick Gowlans Hopkins pelo estudo com vitamins. 1928 - QUIMICA: Adolf Oto Reinhold Windaus pelo estado de vitainas, 1927 QUIMICA: Heinrich Oto Wielind pelo estado do consitugSo dos deids bias 1023 - MEDICINA: Frederick Grant © John Jamce Richard Macleod pela descober da insulin. 1922 - MEDICINA: Archibald Vivin Hil ¢ Oto Fnte Meye ‘of por estas do melabolismno masculit 91s - QUIMICA: Richard Martin Walter pela pesquisa com cloratila 910 - MEDICINA: Albrecht Kosssl por seu trabalho em Dioguimies celular com proteinase substinclasnucéicas. 1907 QUIMICA: Bduard Buckner pela descoberta da ferment. so celular 902 - QUIMICA: Hermann Emil Fisher pela pesquisa em sintse de carbodratose purines 1901 = QUIMICA: Jacobus Henricus Van Hoff pola lei de Pressio osmstica, Dam © ward Adelbert Para testar seus conhecimentos 1, O que estuda a Bioquimica? Qual a composigio quimica dos seres vivos? Que so biomoléculas? 3. Quais as fungdes das biomoléculas? 4. Quantos aminodidos sio verdadeiramente essenci- ais © ndo-essenciais? Justifique sua resposta 5. Qual 0 destino dos aminoécidos no metabolismo hepatico? 6. Organize um quadro com as formas de exerego do nitrogénio protéico nas diversas classes de animais. 7. Comente sobre a importincia da lactose como fonte de energia em mamiferos? 8. © quo. hipere hipoglicemia? 9. Porque ha redugo do peso compéreo quando restrin- ge-se 0 consumo de carboidrato? 10, Porque um paciente diabético assemelha-se a um paciente em jejum prolongado, no que diz respeito a0 metabolismo energstico? 11. Quais dos ganhadores (ou seus trabalhos) do Prémio Nobel de Quimica e Medicina que trabalharam com modelos bioguimicos, vocé jé tinha ouvido falar? Qual a moléeula que mais prémios deu a seus pes quisadores? Para navegar na Internet HomePage do Prof. Ricardo Vi hitp://www.fundamentosdebioquimica.hpg.com.br ‘The World Wide Web Virtual Library: Biosciences: bitp://golgi.harvard.edwbiopages/all.html Revista Brasileira de Anilises Clinic: btp://www.terravista.paguaalto/1207/boyle.himl AllChemy Web- Quimica e Cigneias afins: bttp:allehemy.iquusp.br! ‘The Nobel Prize Oficial Site: butp:/iwww.nobelsef A Brief History of Biochemistry: hitpsiwaew.wwe.edulacademies/departments/chemistry/caurses ‘chema3I/lectares/introleet htm Biomai bttp://vww.biomania.com.br/mapasite/map.him Biochemistry On-Lin bttp:/Avww.biochemist,com/home:him, Bioquimica y Biologia Molecular en Ia Red: hip: wow. yi com/home/PerdigueroEuscbiolbioguimica html snee: hitp:/intlseiencemag.org/ Nature: hitp:/iwww.nature.conv Ricardo Vieira Capitulo 2 Bioquimica dos Alimentos A evolugdo das espécies sempre se apoiou em novas maneiras de se obter energia das mais variadas fontes para assim melhor aproveitar as matérias primas que a natureza oferece aos seres vivos. Seres mais sofistica- dos na forma de obter energia, tém-se mostra~ do superiores nesta escala evolutiva e seus descendentes impdem-se na pirdmide evoluti- va. ‘Um grupo numeroso de seres vivos especializou-se em captar a energia luminosa ¢ converté-la em energia quimica para sintetizar algumas moléculas energéticas: sio os auté- trofos. As matérias-primas bases para essa sintese de alimentos eram compostos abundan- tes na atmosfera primitiva, como gas carbé- nico (CO;), aménia (NHs), 4gua (H:0). Com a ajuda de energia proveniente das radiagdes luminosas do sol, por fotossintese, comecou- se a acumular um composto até entdo escasso na atmosfera: o oxigénio (02) que era expelido pelos organismos fotossintéticos como dejeto metabslico. nhgiepe BAMOSrERA es planes inragSee de Gaper precedous ‘ites Acontece que os compostos alimenta- res so sintetizados em tamanha quantidade que esses seres se viram obrigados a armaze- nar parte de dele e excretar 0 excesso junto com oxigénio (sem divida, um “lixo de tuxo” deste processo metabélico). Entretanto, o apa- recimento de oxigénio livre na atmosfera de- morou cerca de um bilho de anos desde 0 aparecimento dos primeiros organismos fotos- sintéticos, as cianobactérias, como pode ob- servar nos registros geoldgicos. Somente apés esse longo perfodo outro grupo de seres vivos, especializou-se em obter a energia necessaria para suas reagdes organi- cas alimentando-se dos nutrientes produzidos pelos organismos autétrofos € 0 O2 da atmos- fera: so os heterétrofos. As formas primitivas cram, entretanto, unicelulares, sendo necessi- rio mais um bilho de anos para a organizacao em seres multicelulares mais complexos (Figu- ra2-1), rial olakas ‘atina mubloearss iseviagie auboioa mere deceminada clin eseaess TeuPo undies peanos) Figura 2-1 ~ A idade da terra é estimada em cerca de 4,5 bilhdes de anos, sendo proposto que por volta do primeiro bi- Ihdo tenha surgido as primeiras células fotossintéticas autdtrofas, No entanto, o O; atmosférico necessério para o surgi- ‘mento dos aut6trofas s6 toma-se disponivel cerca de 2 bilhdes de anos depois, devido a absorsao do oxigénio produzido pelo ferro da superficie da terra, fato comprovado pela existéncia de enormes depésitos de éxido de ferro nos sedimen- 10s mais antigos do planeta. Os seres muticelulares demoraram cerca de 3 bilhdes para surgirem, 0 que mostra a dificul- dade da organizagdo celular parcialmente possibilitada pelo metabolismo aerdbio. (Adaptado de Biologia Molecular da Célula - Albert B. et al, p.16, 1997.) Fundamentos de Bioquimica - Capitulo 2 - Alimentos Desta forma, comega-se a desenhar a complexa rede de relacionamento ecolégico entre produtores © consumidores, havendo total harmonia entre eles, uma vez que os compostos nitrogenados produtos da degrada- G40 dos heterétrofos eliminados para 0 meio (aménia, uréia, nitritos, nitratos) juntamente com 0 CO» produto das oxidagdes bioldgicas, passam a ser a principal fonte de matéria- prima para a fotossintese. Uma série de organismos especializou- se em reciclar os dejetos metabdlicos desses organismos (p.ex.: fezes e urina), assim como os seus corpos apés a sua morte: os decompo- sitores) 14 Forma-se, entio, um elo importante entre os seres vivos, construindo a complexa teia alimentar que faz com que a Terra funcio- ne como um gigantesco ser vivo e prossiga, Jentamente, seus passos evolutivos. O relacionamento entre consumidores € produtores esta ligado a disponibilizagdo de carbono 0 oxigénio para os processos metabé- licos, enquanto que os decompositores forne- cem, principalmente, 0 nitrogénio reciclado dos tecidos mortos e dejetos, apesar de 0 ciclo dos nitrogénio, carbono ¢ oxigénio ser comum para todos os seres vivos, de certa forma ( gura 2-2). Alimentacao, O, + Alimentos Fotossintese bh \ A Energia Veueals! PRODUTORES / térmica para as reagies, celulares: Figura 2-2: 0 ciclo do carbono entre produtores (vegetal), consumidores (animal) e decompositores (fungos e bactérias). Consumidotes ¢ produtores trocam entre si, principalmente, carbono ¢ oxigénio enquanto que os decompositores reciclam © nitrogénio. Reciclagem do nitrogénio Ricardo Vieira Fundamentos de Bioquimica - Capitulo 2 - Alimentos O ser humano, objeto de nosso estudo, posiciona-se no topo desta teia alimentar, che- gando a mudar 0 ecossistema em prol de sua sobrevivéncia, na procura da matéria-prima para suas reagdes metabélicas. A despeito da discussio ecolégica, 0 conhecimento da estru- tura ¢ funcionamento do corpo humano é ne- cessirio para poder adaptar-se melhor as ad- versidades impostas pela evolugdo e, como tem feito, impor sua soberania entre as espé- cies, sob o preco, infelizmente, da devastagao do ambiente ¢ a extingdo de varias espécies Desta forma, o ato de obter substratos para as reagdes orginicas basicas que ocorrem no interior das células do organismo, em suma, constitui o ato da alimentacao. Basicamente, os nutrientes de origem alimentar sio forn dos pelos carboidratos (actcares), lipidios (gorduras) e proteinas e possuem fungo pri- mordial a produgdo de energia celular. Entre- tanto, essa concepgao, puramente energética, pode cometer alguns equivocos uma vez que muitas outras moléculas so requeridas para 0 funcionamento celular ou mesmo para propor- cionar a absoredo adequada dos nutrientes nao esto envolvidas diretamente no processo de produgio de energia. Assim sendo Agua, eletrdlitos ¢ vita- minas, que nao possuem uma funcio energéti- ca direta, so alimentos indispensaveis para 0 ser humano; precisam estar presentes na dicta para suprir as necessidades didrias do orga- nismo nas reagdes orginicas uma vez que nao so sintetizados pelo organismo (a agua pro- duzida nas reagdes orginicas supre apenas cerca de 5% das necessidades didrias do ser humano), De maneira semelhante, as fibras vege- tais, que ndo possuem digestdo intestinal nao sendo absorvidas, so indispensaveis na ali- mentagdo por manter a forma do bolo fecal, facilitando a absorcdo dos demais alimentos. Somente algumas bactérias e protozodrios, presentes no sistema digestivo de ruminantes e cupins, conseguem digerir as fibras vegetais (feitas, principalmente, de celulose) sendo, nestes animais, a principal fonte energética. O conceito classico de alimento varia de acordo com 0 ponto de vista, como, por exemplo: “A matéria prima para a fabricagao dos materiais de renovagéio do organismo” 1s (Vioult & Juliet); “Substancias, em geral natu- rais e complexas, que associadas as de outros alimentos em proporcées convenientes, sdo capazes de assegurar 0 ciclo regular da vida de um individuo e persisténcia da espécie a qual ele pertence” (Randon & Simonet); “As matérias, qualquer que seja a natureza, que servem habitualmente ou podem servir é nu- trigdo” (Littré); “Substancias necessdrias & manutencdo dos fenémenos do organismo sa- dio e & reparacao de partes que se faz cons- tantemente” (Claude Berard); “Substancia que, incorporada ou néo ao organismo, nele exerce funcdo de nutrigéo” (Escudero). Entretanto, o termo alimento possui significado bastante complexo que ultrapassa 05 limites da bioquimica devendo ser estudado com um cardter multidisciplinar, uma vez que envolve a quimica, biologia, agronomia, vete- rindria, nutrigdo, além das ciéneias da sade. Desta forma, a abordagem a ser realizada neste capitulo, diz respeito ao estudo da composi¢a0 quimica dos alimentos e da forma como ¢ a- presentado para o metabolismo humano. Den- tro deste ponto de vista, a digestio dos ali- mentos sera abordada neste capitulo por se tratar de uma fase fisiolgica adaptada as pro- priedades dos alimentos. Nos capitulos corres- pondentes aos estudos de cada biomolécula, serdio abordadas peculiaridades de cada pro- cesso digestivo de interesse para 0 metabolis- mo da biomolécula em questio. Classificagéo dos alimentos Do ponto de vista biolégico, os alimen- tos se agrupam em trés classes: a) Energéticos: so 0s que fornecem substra- tos para a manutengo da temperatura cor- pérea, liberando energia térmica necessiria para as reagdes bioquimicas. S4o os carboi- dratos, lipidios e proteinas. Os carboidratos sio os alimentos energéticos por exceléncia, pois so diretamente produzidos na fotos- sintese dos autétrofos e degradados em to- dos os organismos vivos, sem excecdo, a partir de enzimas especificas. Os lipfidios as proteinas, apesar de possuirem poder e- nergético superior ou igual aos carboidratos (Tabela 2-1), tém fungSes outras no orga- nismo, possuindo digestio e absorgo len- Ricardo Vieira Fundamentos de Bioquimica - Capitulo 2 - Alimentos tas, sendo utilizados secundariamente como produtores de energia. Tabela 2-1: Calor de combustdo ¢ energia disponiveis nas fontes de alimentos mais importantes. Calor de Combus- |_ Oxidagio tho in vio | humana (in (bomba calorimé- | vivo) em trica) em keal/ keall Profeinas Sa 41% Lipidios 93, 93 Carboidratos 4d a Etanal al 7d * Oxidagdo das proteinas comigidas pela perda dos aminoiidos exeretados na urina, Fonte: Harper, 1994, p. 608, A capacidade energética dos alimentos da se devido ao alto calor de combustao das li gages C-C (cerca de 54 kcal). No capitulo 3 sobre Bioenergética, serio abordados te- mas relativos ao poder calérico das biomo- Iéeulas. b) Plasticos ow estruturais: atuam no cresci- mento, desenvolvimento e reparagdo de te- cidos lesados, mantendo a forma ou prote- gendo o corpo. Novamente, proteinas, lipi- dios e carboidratos so os principais repre- sentantes, estando presentes na membrana celular e regido intersticial. Em vegetais, 0 carboidrato celulose (um polimero de glico- se) representa o principal composto da pa- rede celular que garante a forma da célula vegetal, mesmo em periodos de excesso ou escassez de agua. O depésito cumulativo de celulose em algumas arvores apresenta re- sisténcia comparada aos metais resistentes como o ferro. A quitina ¢ um polimero muitissimo parecido com a celulose (a ex- cegdo de um grupamento -OH substituido por um NH; no C2) e que confere extrema resisténcia ao exoesqueleto dos artrépodes. ‘A gua e os sais minerais representam os componentes da alimentago que nfo sio exclusivos de organismos vivos, mais pos- suem fungées estruturais importantissimas. ©) Reguladores: aceleram os processos orga- nicos, sendo indispensaveis ao ser humano. Sdo as vitaminas, gua, sais minerais ¢ fi- bras vegetais. Favorecem a dindmica celular como catalisadores (vitaminas) ou propor- 16 cionando a concentragdo exata dos substra- tos (4gua), bem como agentes estabilizado- res de varias enzimas ou mesmo regulando a quantidade de 4gua intracelular ou a exci- tabilidade da membrana (minerais). Apesar de nio serem digeridas ou absorvidas, as fi- bras vegetais desempenham fungo impor- tante no processo digestivo, como sera visto ainda neste capitulo. Necessidade de alimentos organismo requer nutrientes suficien- tes para proporcionar energia livre correspon- dente as necessidades didrias. A manutencao do peso corporal constante é 0 melhor indica- dor de que existe energia suficiente na dieta e cada grupo alimentar fornece energia propria & sua composigdo quimica, com as necessidades individuais de energia dependendo de varios fatores préprios do alimento ¢ outros fatores inerentes de quem se alimenta. A ingestdo dos nutrientes deve ser feita de forma balanceada de modo a permitir a ab- sorgiio sem caréncias ou excessos, pois caso isso ndo seja observado, sobrevém a desnuti. gio ¢ a obesidade, respectivamente, que sio distirbios patolégicos oriundos da alimentaga0 inadequada seja qualitativa ou quantitativa- mente. A desnutrigao constitui-se um grave distirbio alimenticio inerente a ingestio de quantidades insuficientes para manter 0 met bolismo basal. As substancias de reserva séo rapidamente esgotadas e os subprodutos meta- Dilicos acarretam varios distirbios que podem deixar seqiielas graves, apesar de, na maioria dos casos, o restabelecimento da dieta normal, promove a volta as condigGes de normalidade metabélica do individuo. Sdo comuns doengas nutricionais em criangas (principalmente por um fator social, tipico de paises do terceiro mundo) e em adul- tos em processo de emagrecimento espontinco realizado por meio de dietas que levam em considerago simplesmente a privagao da ali- mentagdo calérica Na ocorréncia de desnutrigdo calérica associada a caréncia de proteinas, estabel cem-se as sindromes de mé-nutrigo conheci: das como kwashiakor e marasmo. Ricardo Vieira

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