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Após a definição dessas coleções, foram realizados dois processos de

interpolação linear8, que resultaram no total de vinte e uma coleções de notas. É

importante notar que durante a fase de modelagem do espaço composicional algumas

coleções foram descartadas por apresentarem materiais muito semelhantes. A primeira

interpolação foi feita entre o conjunto I e o conjunto III, resultando em uma filtragem

gradual no número de notas de cada coleção. A segunda interpolação, realizada entre os

conjuntos III e II, reverte o processo anterior de filtragem, causando uma adição gradual

de notas. A figura 4.6 mostra o conjunto resultante do processo de interpolações com as

coleções pivôs circuladas; o conjunto III apresenta a repetição da nota lá sustenido apenas

para facilitar o cálculo das interpolações.

Fig.3.4: Conjunto resultante do processo de interpolações

8
Essas operações foram realizadas utilizando a biblioteca de funções Profile, do programa de auxílio à
composição OpenMusic.

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Além desses conjuntos de notas, foi utilizado um pequeno grupo de multifônicos,

tendo como fundamentais as notas fá, lá e si bemol. Esses multifônicos foram articulados

de diversas maneiras produzindo sonoridades complexas e dinâmicas. Os multifônicos

representam um “mergulho” dentro do som do instrumento, como se fosse possível, por

meio de um “microscópio sonoro”, tornar audível o som latente da flauta, presente no

corpo do instrumento antes de o intérprete iniciar a sua execução.

3.4 - Modelagem do espaço composicional

A composição de cada uma das sete seções do grupo denominado A foi realizada

de modo independente; cada seção foi composta como uma pequena peça isolada. Para

cada uma das seções foram selecionados diferentes materiais musicais e características

expressivas. As seções de curta duração, de números 1, 2 e 3, utilizam diferentes modos

de articulação de multifônicos. O grupo de seções 4 consiste em uma seqüência de notas

executada continuamente e o mais rápido possível, resultando em um efeito

caleidoscópico. As seções 5 possuem como características o uso de trinados e figuras

ornamentadas. Nas seções 6, são alternados pequenos fragmentos melódicos separados

por pausas, seqüências de notas repetidas e arpejos ascendentes e/ou descendentes. As

seções 7 são compostas de frases longas e melancólicas, interrompidas por figuras curtas

e muito rápidas no registro superagudo da flauta baixo.

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As seções 1A, 2A e 3A foram compostas utilizando o conjunto de multifônicos e

interferências de movimentos escalares quasi-glissando. Essas interferências quasi-

glissando foram notadas na partitura fazendo uso das notas da escala de dó maior, por ser

esse o conjunto de posições mais simples, possibilitando, assim, a execução de

movimentos escalares muito rápidos em que o contorno melódico é percebido quasse

como um glissando. Em função de suas durações serem curtas, essas seções foram

aglutinadas em uma única. Das seções utilizadas na abertura, foram derivadas as

seguintes: 1C, 1D, 2C, 3C e as seções 3B, 2B, 1B, que foram agrupadas para a criação da

parte final da peça. Nessas sete seções foram utilizados os mesmos multifônicos das

denominadas 1A, 2A e 3A, explorando diferentes modos de articulação.

Seção 1A

Seção 1C

36
Seção 1D

Fig.3.6: Seção 1A e as derivações, 1C e 1D

A seção 4A foi composta utilizando as notas dó sustenido, sol, mi, sol sustenido,

si e ré, sendo esse grupo de alturas parte do décimo nono conjunto resultante do processo

de interpolação, mostrado na figura 3.4. A organização seqüencial de permutações

randômicas das notas, somada à intervenção do computador multiplicando a parte flauta

por meio de delays com diferentes tempos de espera, criou uma textura polifônica densa

da qual emergem figurações rítmicas complexas, como mostra a figura 3.7.

Fig.3.7: Parte executada pelo intérprete e duas possibilidades de padrões rítmicos (início do segundo
sistema, pág.4)

As seções derivadas de 4A - 4B e 4C foram compostas usando o mesmo

procedimento de permutação randômica. Na seção 4B o grupo de alturas utilizado nas

permutações foi o décimo quarto conjunto de notas – fá, lá, si, ré e fá sustenido – , sendo

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as notas lá e fá sustenido substituídas pelas notas lá sustenido e sol, respectivamente. A

substituição dessas notas deu-se por sugestão da flautista Luciane Cuervo, tornando a

escrita mais idiomática para o instrumento. Nesta seção há um movimento de

adensamento da textura, da flauta-solo em pianíssimo à flauta em fortíssimo com o

computador, como na seção A4. A 4C foi composta em três módulos: o primeiro é uma

repetição do início da seção 4B; o segundo módulo foi composto utilizando a

transposição de uma segunda maior acima do conjunto de notas da seção 4B; o terceiro

foi composto fazendo uso de um conjunto de alturas derivado dos usados nos módulos

anteriores. Esse conjunto foi formado por duas notas - si e ré -, do usado no primeiro

módulo; e três do segundo módulo – dó sustenido (ré bemol), mi e sol. A textura da seção

4C é a mais densa de Spells, em que o computador ativa os cinco dispositivos de

transformação, simultaneamente à execução em fortíssimo da parte da flauta.

O grupo de seções 5A, 5B e 5C foram compostos tendo como elementos

estruturais três tipos de gestos musicais: trinados, trêmolos e apogiaturas. Esses gestos

foram utilizados individualmente e combinados. Os trêmolos, além de seu uso tradicional

(frulato), foram usados como transição entre nota e ruído. Esse gesto de transição foi

construído pela repetição de uma mesma nota em uma pequena seqüência de semi-fusas

em um crescendo súbito de dinâmica, acompanhado de um aumento de pressão do ar na

embocadura da flauta, figura 3.8. As apogiaturas foram modelo para a criação de

desenhos melódicos rápidos com ritmos de curta duração, figura 3.9.

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Fig.3.8: Gesto de transição entre nota e ruído. Terceiro compasso da seção 5A, página 6

Fig3.9: Desenho melódico rápido derivado da apogiatura

As seções 6A e 6B foram compostas com um algorítimo desenvolvido pelo

compositor, denominado Granulus29. Esse algoritmo utiliza um procedimento semelhante

ao usado pela técnica de síntese granular, para derivar seqüências musicais a partir de um

excerto musical selecionado previamente. A figura 3.9 ilustra o funcionamento de

Granulus2.

9
Esse algoritimo faz parte da biblioteca de funções de auxílio à composição OM-Modeling, que vem sendo
desenvolvida e programada em linguagem LISP pelo compositor. OM-Modeling está sendo implementada
como uma biblioteca de extensão nos ambientes de Composição Assistida por Computador OpenMusic e
Common Music.

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Fig.3.9: Processo de trabalho do algoritmo Granulus2

O material gerador utilizado foi extraído das seções 5A e 5C, sendo o algoritmo

empregado cinco vezes para cada seção. O resultado foi impresso e revisado

manualmente, tornando as seqüências “frias”, construídas pelo algoritmo, em frases

musicais expressivas. A figura 3.10 mostra o primeiro compasso da seção 6B, gerado por

granulus2, e a versão final, primeira página na partitura, último compasso.

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Fig.3.10a: Compasso gerado por Granulus2

Fig.3.10b: Versão final, como consta na partitura de Spells

As seções 7A e B, para flauta baixo, foram compostas como uma única seção e,

após estar concluída, foi dividida em duas. Nessas seções o discurso musical da flauta foi

dividido em dois níveis de atividades. O primeiro é a melodia lenta e tranqüila executada

no registro grave-médio da flauta baixo. Para a construção rítmica do primeiro nível foi

estabelecido um grupo de sete compassos organizados na seguinte ordem: 6/8 6/8 7/8 7/8 6/8

7 4
/8 /8. Estes foram preenchidos por grupos de impulsos assimétricos obedecendo à

mesma ordenação númerica dos pulsos de cada compasso, resultando nas figurações

rítmicas mostradas na figura 3.11a. A segunda parte da estrutura rítmica, referente à

seção 7B, foi composta com uma permutação dos compassos da primeira parte, figura

3.11b. As alturas derivam do décimo primeiro e décimo segundo conjunto do espaço

composicional, figura 3.4, previlegiando os movimentos cromáticos.

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Fig.3.11a: Figurações rítmicas referentes à seção 7A

Fig.3.11b: Figurações rítmicas referentes à seção 7B

O segundo nível de atividade é formado pelas intervenções na região superaguda.

Essas intervenções são fragmentos melódicos, executados o mais rápido possível, que

têm como função criar interrupções, ou “ruídos”, desestabilizando gradualmente o

discurso musical lento e estável das seções 7A e 7B. Fazendo uso dos conjuntos oito e

nove do espaço composicional e evitando a repetição de intervalos entre as notas,

construí uma seqüência melódica contendo quarenta notas, distribuídas em grupos, de

acordo com a série numérica 3,5,7,5,5,7,5,3. Os grupos foram organizados

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temporalmente, de modo a criar um acúmulo gradual de interrupções na melodia

realizada no registro grave. A figura 3.12 mostra a seqüência melódica já dividida em

grupos.

Fig.3.12: Seqüência melódica dividida em grupos, de acordo com a série numérica 3,5,7,5,5,7,5,3

Utilização do computador

Em Spells, o computador é tratado como um instrumento musical, sendo exigido

do operador uma interação camerística com o flautista. Considerando o computador como

instrumento de interpretação musical, foi criado e desenvolvido o aplicativo Wizard-DSP.

Esse software é constituído de uma série de cinco dispositivos de transformação do som

da flauta e um “disparador” de seqüências de áudio pré-gravadas. Esses dispositivos

possuem parâmetros com valores a serem definidos pelo intérprete, permitindo inclusive

a variação dinâmica dos valores durante a performance da peça. Assim, com o controle

desses parâmetros deixado a cargo do intérprete, a partitura indica apenas quando deve

ser iniciado e terminado cada dispositivo de transformação. Desse modo, Wizard-DSP

possibilita ao intérprete um controle dinâmico do computador como instrumento de

realização e expressão musical. Os dispositivos de transformação, denominados EFX-01,

EFX-02, EFX-03,EFX-04 e EFX-05, foram desenhados da seguinte forma:

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EFX-01: Conjunto de cinco unidades de Delay, com tempos variados entre 200 e
2000 milissegundos;
EFX-02: Conjunto de dez unidades de Delay, com tempos variados entre 500 e
7000 milissegundos;
EFX-03: Conjunto de duas unidades de flanger, com freqüência e profundidade
variadas (freqüência entre 3 e 10 Hz e profundidade entre 0.3 e 1.0) e uma unidade de
reverberação;
EFX-04: Conjunto de uma unidade de modulação em anel (ring modulation) e
uma unidade de pitch shift;
EFX-05: Conjunto de três unidades de delay, com tempos variados entre 250 e
1000 ms.; mais uma unidade de flanger, uma de phaser e um filtro (low pass).

Além dos dispositivos de transformação em tempo real, foram usadas também

quatro seqüências de áudio pré-gravadas, identificadas na partitura como sound-01,

sound-02, sound-03 e sound-final. Para a composição dessas passagens, alguns excertos

da parte da flauta10 foram gravados direto no computador e transformados digitalmente,

utilizando-se técnicas variadas de filtragem espectral e de síntese granular. Os arquivos

sonoros gerados, sound-01, sound-02 e sound-03 foram utilizados nas transições entre as

seções 7A -> 1D, 4B -> 2C, 6A -> 7B, 7B -> 5C. O arquivo sound-final foi utilizado na

parte final da peça, levando-a à sua conclusão.

Os dispositivos de transformação em tempo real e o “disparo” dos arquivos de

áudio pré-gravados são controlados por uma interface gráfica, desenhada para ser operada

pelo do uso de um mouse ou de teclado alfa-numérico. Wizard-DSP foi criado para a

10
Foram registradas, tendo Luciane Cuervo como intérprete, as seções 1A, 2A, 3A, 6B, 3B, 2B, 1B.

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peça Spells, mas, como qualquer instrumento musical, pode ser utilizado em futuras

composições, bem como por outros compositores interessados.

Em Spells busquei ir além da experiência de O Jardim dos Caminhos que se

Bifurcam levando o uso dos meios eletrônicos para a performance, utilizando o

computador como um instrumento musical que possibilita realizar a parte eletrônica

durante a execução da peça. Esse modo de realização possui um ponto positivo

importante que é possibilitar uma interação camerística entre o intérprete e os meios

eletrônicos, na qual, a performance não está constrita pela rigidez cronométrica. Por outro

lado, a dependência de uma tecnologia em constante processo de mutação dificulta, por

vezes, a manutenção da peça no repertório dos intérpretes, considerando que ainda é mais

comum encontrarmos CD players do que computadores nas salas de concerto.

Durante a composição de Spells adaptei a etapa que Malt chama de fase de

modelagem, denominado-a de modelagem do espaço composicional. Malt considera esta

a fase em que são definidos modelos que permitem adaptar os conceitos abstratos à

realidade musical. Diferente de Malt, denomino esta etapa de modelagem do espaço

composicional por ser esta a fase, na qual, manipulando o material delimitado como

espaço composicional, são compostas as seções da peça.

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Spells foi publicada em CD, tendo por intérpretes Luciane Cuervo nas flautas-

doces e o compositor no computador. A estréia ocorreu no concerto de lançamento do CD

Sonetos de Amor e Morte, nos dias 19 e 20 de outubro de 2002, no Salão Mourisco da

Biblioteca Pública do Estado do Rio Grande do Sul, e foi reapresentada no recital de

mestrado realizado dia 12 de dezembro do mesmo ano. Ambas as apresentações foram

realizadas por Luciane Cuervo e o compositor.

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4 - DANÇAS & INTERMEZZI

4.1- Impulso gerador

O impulso gerador de Danças & Intermezzi surgiu com a solicitação da pianista

Catarina Domenici de uma peça para piano e sons eletrônicos, baseada em uma dança

contemporânea. Motivado pelas possibilidades expressivas surgidas no planejamento da

peça, optei pela expansão do projeto, concebendo assim um ciclo de três danças

compostas para piano e sons eletrônicos, intercaladas por dois intermezzi para piano-solo.

As peças para piano e sons eletrônicos Meta-funk, Dança de Inverno e Círculos de Fogo

foram compostas a partir de duas danças e de uma canção oriundas de diferentes culturas

musicais.

A influência das fontes originais no resultado de cada uma das três peças dá-se em

diferentes níveis do discurso musical. Em Meta-funk, o espaço composicional foi

derivado de um excerto da gravação do funk Get it Together, realizada pelo grupo norte-

americano Jackson Five. Para a Dança de Inverno, o acompanhamento rítmico da

baguala, tipo de canção pertencente ao folclore do norte da Argentina, serviu de

referência para a criação da figuração rítmica utilizada na parte eletrônica. Na peça

Círculos de fogo, o padrão rítmico cíclico do Ponto de Iansã, dança ritual de religiões

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afro-brasileiras, além de seu uso literal em alguns momentos, também guiou a intenção

expressiva da peça.

A relação do piano com a parte eletrônica ocorre de modo diferenciado em cada

uma das danças. Na primeira, o piano e os sons eletrônicos disputam a liderança do

discurso musical. Essa disputa dá-se pela alternância entre momentos que o piano conduz

o discurso musical e partes conduzidas pelos sons eletrônicos, terminando ambos em

igualdade de importância. Na segunda, Dança de Inverno, a escrita do piano consiste em

um contraponto a duas vozes, ritmicamente independentes e sobrepostas ao padrão

rítmico derivado da baguala, utilizado na parte eletrônica. Essas três linhas rítmicas,

apesar de independentes, possuem pontos de convergência, criando, assim, movimentos

cíclicos de aproximação e afastamento e desenvolvendo uma relação de

tensão/relaxamento entre as duas vozes do piano e a parte eletrônica. Na última dança,

Círculos de Fogo, o piano e a parte eletrônica foram compostos separadamente, obtendo-

se, desse modo, dois discursos simultâneos. A justaposição da estrutura cíclica da parte

do piano às densas seções da parte eletrônica criam um acúmulo de tensão que determina

o caráter expressivo extático da peça. O caráter expressivo alude à tensão hipnótica

gerada pelos cantos e acompanhamento rítmico característicos do momento que antecede

o êxtase do médium nos rituais afro-brasileiros.

Os intermezzi para piano-solo foram compostos como comentários poéticos sobre

as danças que os antecedem, bem como preparação para a que vem depois. A concepção

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estrutural dos Intermezzi foi motivada pelas múltiplas possibilidades de reflexão de

espelhos. As imagens refletidas se formam com diferentes graus de distorção,

dependendo da textura da superfíce do espelho, de sua forma e do ângulo de projeção do

objeto. As múltiplas possibilidades de criação de novas imagens pelos diferentes reflexos

de um objeto serviram como metáfora para a composição dos Intermezzi.

Danças & Intermezzi foi concebida para ser executada integralmente. No entanto,

as danças podem ser apresentadas como peças independentes, e os intermezzi, se

apresentados fora do ciclo, devem ser interpretados conjuntamente.

4.2 – Meta-funk

Estruturação formal

Meta-Funk foi organizada em oito pequenas seções caracterizadas por diferentes

interações entre o piano e a parte eletrônica. Foram definidas quatro possibilidades de

interação entre piano e sons eletrônicos: sons eletrônicos com intervenções do piano;

piano e parte eletrônica em igualdade hierárquica; piano-solo; e sons eletrônicos-solo.

Para cada uma das seções foi estabelecido um único modo de interação entre a parte

eletrônica e a do piano. A estrutura formal de Meta-funk ficou organizada do seguinte

modo:

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Seções Compassos Modo de interação
1 1-6 Eletrônicos/interv.piano
2 7-16 Piano-solo
3 17 Sons eletrônicos-solo
4 18-24 Piano = sons eletrônicos
5 25 Sons eletrônicos-solo
6 26-29 Piano-solo
7 30-34 Eletrônicos/interv.piano
8 35-49 Piano = sons eletrônicos

Delimitação e Modelagem do Espaço Composicional

A delimitação do espaço composicional de Meta-funk partiu da análise espectral

de um excerto da gravação do funk Get it Together, realizada pelo grupo Jackson Five.

O resultado da análise espectral foi transcrito para a notação musical tradicional com o

auxílio do programa OpenMusic. Como a quantidade de parciais era excessiva, foi feita a

opção pelo uso dos parciais graves, chegando por fim à seqüência de notas mi bemol, dó,

ré bemol, ré natural. Essa seqüência serviu de reservatório de notas e intervalos com o

qual foi composta a parte do piano.

Fig.4.1: Espaço Composicional da parte do piano, resultante da análise espectral

50
O espaço composicional da parte eletrônica se resume ao próprio sample,

utilizado como fonte geradora para o conjunto de notas da parte do piano. Para os sons

eletrônicos, essa amostra serviu de matriz, sendo submetida a diversas transformações

digitais durante a modelagem do espaço composicional.

A modelagem do espaço composicional foi realizada primeiramente pela criação e

organização temporal dos trechos eletrônicos. Tendo a parte eletrônica como estrutura

fundamental, a do piano foi composta sem um planejamento detalhado, de forma quase

improvisada.

Utilizando as notas definidas no espaço composicional, primeiramente foi criada

uma figura melódica sincopada, tendo como referência a linha de acompanhamento do

contrabaixo elétrico nos grupos de funk, figura 4.2. Dessa figura melódica foram

derivadas seqüências de acordes e figurações rítmicas utilizadas para compor as seções 2

e 6. A seção 4 foi composta como um grande arpejo do acorde [ré bemol, lá bemol, si, e

sol] por vários registros do piano. Esse acorde foi construído sobre o ré bemol, utilizando

notas que não pertenciam ao espaço composicional, criando, dessa forma, um contraste

harmônico maior com as outras seções. A peça termina com o piano executando

constantemente a figura melódica da figura 4.2.

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Fig.4.2: Figura melódica alusiva ao acompanhamento do contrabaixo elétrico dos grupos de funk

4.3 – Intermezzo I: Espelho de Areia

Estruturação formal

Intermezzo I: Espelho de Areia foi dividida em quatro seções: seção 1, compassos

1-12; seção 2, comp.13-24; seção 3, comp.25-35; e seção 4, comp.36-48, organizadas de

modo semelhante à forma Tema e Variação. A primeira seção foi a matriz geradora, ou

“tema”, da qual as seções subseqüentes foram derivadas.

Delimitação e Modelagem do Espaço Composicional

O espaço composicional delimitado teve como conjunto inicial a coleção de notas

PcA[5,4,0,7,8,2,1,3]. Esta serviu como um reservatório de notas e intervalos para a

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composição da primeira seção. As seções 2-5 foram derivadas da primeira pelo uso de

transformações aqui denominadas de “reflexos distorcidos”11.

œ œ
&œ œ bœ œ bœ bœ
Fig.4.3:Coleção de notas que formam o espaço composicional de Espelho de Areia

A primeira seção de Intermezzo I: Espelho de Areia foi composta sem

planejamento pré-composicional. O primeiro compasso apresenta em sua forma original a

coleção de notas, definida como espaço composicional. Os compassos seguintes [2-12]

foram compostos priorizando os intervalos inerentes ao espaço composicional.

Após sua conclusão, a primeira seção foi “refletida” três vezes, gerando assim as

seções 2-4. As reflexões foram projetadas temporalmente, segundo o modelo seguinte,

onde “A” é a linha melódica superior; “B”, a linha inferior; e “R”, o retrógrado.

Fig.4.4: Esquema para projeção temporal das reflexões da primeira seção

Para a composição da segunda seção, as linhas melódicas foram utilizadas em

sentido retrógrado; na terceira seção, os retrógrados foram invertidos; na última, os

11
Em alusão à metáfora dos espelhos, descrita na seção 4.1 deste capítulo.

53

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