Professional Documents
Culture Documents
RESUMO
Este artigo tem a intenção de ajudar na reflexão do tema educação, que em nossa sociedade
serve e sempre serviu para concretizar um sistema ideológico. Na escola, sendo ela parte
integrante deste processo, ajuda a perceber sua função de reproduzir e a concretizar as
desigualdades sociais. Inicia expondo brevemente o pensamento marxista com relação ao
ensino, sua ligação com as diferenças sociais e a possibilidade, pela educação omnilateral, de
tornar o capitalismo mais humano. A educação omnilateral é apresentada como a que leva o
indivíduo multifacetado à humanização tendo no horizonte a totalidade intelectual, física,
corpórea e sensível com a finalidade da emancipação humana. Em seguida faz uma
abordagem de alguns autores marxistas, como Adorno, que fala em evitar a barbárie; Freinet,
com a educação centrada na criança; Gramsci, que concilia trabalho manual e intelectual;
Makárenko, com a disciplina formadora da personalidade do indivíduo, em vista de sua
felicidade; Pistrak, com uma educação de compreensão marxista da realidade; e Suchodolski,
que coloca a cultura como a maneira da consciência ascender ao pleno sentido da existência.
Com estes autores demonstra a preocupações em apontar uma saída para o conturbado sistema
social e educacional. Finaliza apontando a educação omnilateral como a possível saída para
resolver o problema das desigualdades sociais e lembra que a educação deve ser uma
ferramenta de união entre a escola e a comunidade, para que a forma de educar da família e na
escola seja a mesma.
*Licenciado em Filosofia pela Universidade Católica de Pelotas, Técnico em Artes Gráficas e futuro
mestrando em Educação na Universidade Federal de Pelotas, E-mail: jhbordin@hotmail.com
INTRODUÇÃO
*Licenciado em Filosofia pela Universidade Católica de Pelotas, Técnico em Artes Gráficas e futuro
mestrando em Educação na Universidade Federal de Pelotas, E-mail: jhbordin@hotmail.com
1
O Capital é a mais importante obra de Marx e verdadeiro método dialético, pois
simultaneamente faz a explanação do sistema e através desta realiza a sua crítica. Sua
metodologia inicia com a pesquisa que “[...] tem de captar detalhadamente a matéria, analisar
as suas várias formas de evolução e rastrear sua conexão íntima. Só depois de concluído esse
trabalho é que se pode expor adequadamente o movimento real” (Marx, 1996, p.140). Desta
forma tem-se uma visão adequada da realidade do capital e a possibilidade de superar sua fria
existência ou conscientemente aceitá-lo. Um processo educativo só se define com a
compreensão de toda a estrutura da sociedade.
2
Marx, como poderia ser uma escola, uma sociedade e seus indivíduos se o ensino tomasse por
base a formação em sua omnilateralidade e em sua totalidade.
ADORNO
Para superar a barbárie Adorno concebe uma educação que ajude o indivíduo a
pensar com a própria cabeça, para isso a família e a escola devem andar juntas e levar o aluno
a formar sua maioridade, ou sua emancipação. Esta autonomia só é alcançada através do
“esclarecimento”, tema que retoma de Kant e que sempre é atual, pois é a “[...] falta de
decisão e de coragem de servir-se do entendimento sem a orientação de outrem” (Adorno,
1995, p.169), que o indivíduo permanece alienado e o “esclarecimento é a saída dos homens
de sua auto-inculpável menoridade” (Adorno, 1995, p.169). Isto pressupõe que o indivíduo
tenha vontade própria e coragem para fazer uso do próprio entendimento
3
concebida sem professores e muito menos sem sua autoridade, “[...] mas que, por sua vez, o
professor precisa ter clareza quanto a que sua tarefa principal consiste em se tornar supérfluo”
(Adorno, 1995, p.177). Esta posição do professor faz com que o aluno sinta o apoio
autoritário e ao mesmo tempo a necessidade de se emancipar, pensar com a própria cabeça.
Adorno afirma que a “[...] emancipação precisa ser acompanhada por certa firmeza e
unidade do eu” (Adorno, 1995, p.180), para que possa formar uma representação sólida de sua
personalidade e da própria profissão. Por isso “[...] a única concretização efetiva da
emancipação consiste em que aquelas poucas pessoas interessadas nesta direção orientem toda
a sua energia para que a educação seja uma educação para a contradição e para a resistência”
(Adorno, 1995, p.183), a começar pela formação da consciência do aluno, da situação real da
sociedade em que vive e de todas suas manobras para acostumá-lo em sua precária situação.
FREINET
O frances Célestin Freinet (1896-1966) que em sua obra “Para uma Escola do Povo”
questiona a escola da época que até então tinha sido mais ou menos perfeita na “[...]
adaptação do indivíduo ao âmbito estreito de seu novo destino econômico” (Freinet, 1996, p
2), mas que já está ultrapassada e alguns do povo tomam consciência da necessidade de
mudança na escola. Neste livro afirma que no século XX a criança necessita de “[...] uma
educação que corresponda às necessidades individuais, sociais, intelectuais, técnicas e morais
da vida do povo na era da eletricidade, da aviação, do cinema, do rádio, do jornal, da
imprensa, do telefone, num mundo que esperamos não tardará a ser o do socialismo
triunfante” (Freinet, 1996, p.7). Como o mundo está em constante mudança, e no capitalismo
a tecnologia avança dia a dia, a educação necessita a todo o momento se atualizar para não
ficar aquém das necessidades que vão surgindo.
Para Freinet a educação não pode ser apenas uma “[...] instrução suficiente para
enfrentar os exames, ocupar cargos cobiçados, ingressar em determinada escola ou em
determinada administração” (Freinet, 1996, p.8), como a maioria dos pais desejam para seus
filhos e estes se esforçam para atingir este objetivo. Para isso a escola de amanhã, como
costumava designar o novo modelo de educação pretendido, precisa estar “[...] centrada na
criança enquanto membro da comunidade” (Freinet, 1996, p.9), estas deveriam satisfazer,
reciprocamente, suas necessidades e possibilitar “[...] à criança alcançar, com uma pujança
máxima, seu destino de homem” (Freinet, 1996, p.9). Isto requer mais que centrar a atenção
4
na matéria a ser ensinada e estabelecer o que é essencial e necessário para o desenvolvimento
manual e intelectual e atender as necessidades individuais e da comunidade.
GRAMSCI
Para Gramsci todos os homens são intelectuais e racionais, mas, nem todos exercem
este papel. Intelectual não é só o letrado, mas, os diretores e organizadores na construção da
sociedade. Desta forma “[...] a escola unitária significa o início de novas relações entre
trabalho intelectual e trabalho industrial não apenas na escola, mas em toda a vida social”
(Gramsci, 2006, p.40) e que desmistifica os intelectuais tradicionais, aqueles que se vêem
como uma classe a parte da sociedade, para, junto com os intelectuais orgânicos, grupo de
pensadores produzidos por cada classe social, articular o senso comum e a filosofia
propriamente dita, a cultura de massa e a erudita. Desta forma as idéias hegemônicas a
prevalecer não seriam as de um grupo social dominante, mas, do conjunto das classes sociais.
5
estabelecidas e que se tornaram senso comum e atribuíram hegemonia a todo um grupo social.
Isto requer a criação de uma nova camada de intelectuais, com a consciência de que “[...]
existem graus diversos de atividade especificamente intelectual [...] não se pode separar o
homo faber do homo sapiens” (Gramsci, 2006, p. 52 e 53).
MAKÁRENKO
6
visto que ambos, e em conjunto com a comunidade local, defendem os mesmos interesses e
isto faz com que se desencadeie uma luta coletiva para manter o que a todos pertence.
Este processo educacional não se limitava a escola, mas comportava toda a vida da
coletividade local e familiar com reuniões constantes entre pais, alunos e professores, para
juntos decidirem os principais rumos a serem seguidos. Com este modo de organizar a
educação Makárenko disciplina não só os alunos, mas toda a coletividade. Como ele mesmo
afirma “la disciplina en la coletividad es la defesa completa, la seguridad plena de su derecho,
de las vias y possibilidades que precisamente existen para cada indivíduo” (Makárenko,
Moscú/URSS, p.53). Esta preocupação de resguardar os direitos individuais e coletivos dá
respaldo para que a disciplina seja aceita por todos, não uma disciplina de agressão corporal
ou moral, mas de fazer o infrator sentir, sendo colocado diante da infração, que com esta
atitude está contrariando toda a coletividade. A coletividade resguarda os direitos de cada um
e “[...] la disciplina ensalza a la soletividad” (Makárenko, Moscu/URSS, p.60), desta modo há
uma cumplicidade recíproca entre individual e coletivo que garante o êxito do processo
educacional socialista.
PISTRAK
A escola do trabalho, apresentada por Pistrak, deve fazer uso da ciência “[...] apenas
como meio de conhecer e de transformar a realidade de acordo com os objetivos gerais da
escola” (Pistrak, 2003, p.119), que ensina apenas o que pode ser útil mais tarde e oferece ao
aluno conhecimentos que não sejam esquecidos, mas, cientificamente lhe sirvam em suas
7
necessidades no trabalho e na vida social. Para isso a escola deve ser organizada de maneira
que “[...] nenhuma disciplina escolar tem e pode ter uma finalidade em si mesma[...] ”
(Pistrak, 2003, p.145), cada disciplina tem uma parte da verdade e só tem sentido sua
existência no conjunto com as demais e subordinadas aos objetivos gerais da escola.
Mais que programas de estudos o ensino, para Pistrak, é um “plano de vida escolar”
que envolve todas as situações do dia a dia e o sistema de complexos estabelece “[...] que
cada disciplina escolar analisa uma parte determinada de uma matéria geral concreta,
propondo, antes de tudo, a dar ao aluno o domínio dos métodos experimentais próprios das
ciências” (Pistrak, 2003, p.153), assim o papel do complexo é treinar a criança no método
dialético. Para que isto atinja seu objetivo, a compreensão marxista da vida moderna, faz-se
necessário que toda a vida escolar, todo o trabalho e atividade das crianças tenha uma
concepção comum a fim de atribuir unidade a toda a produção social.
SNYDERS
O frances Georges Snyders (1917-...) que em nos mostrar que é possível que haja
alegria na escola e satisfação na aprendizagem, nos apresenta, em sua obra “Escola, classe e
luta de classes”, o monopólio da classe dominante para que a escola lhe sirva para manter o
poder estabelecido. Neste sentido “[...] a escola acaba por participar na manutenção das
relações de classe; reflete as divisões sociais existentes, tende a perpetuá-las, até a acentuá-
las; da mesma forma como tende a perpetuar o poder da classe dominante” (Snyders, 1981,
p101), isto é notado quando a escola tem uma posição de domínio sobre os alunos, para
perpetuar o poder da classe dominante de certos docentes, ou quando deixa a educação a deus
dará, dividindo os alunos e professores segundo interesses pessoais e negligenciando o
convívio social e a boa educação.
8
numa escola, por ele reivindicada, “[...] realmente aberta a todos; a sensibilidade às injustiças
da escola agudizá-se paralelamente com a convicção de que é possível uma outra sociedade”
(Snyders, 1981, p104). Neste sentido é de suma importância que o social, como um todo,
participe de todo seu desenvolvimento, respeitando as diferenças, mas na busca do bem
comum. Os professores, os alunos e os pais precisam dialogar a respeito do que pensam da
educação juntos construir um processo educacional com vistas ao bem comum.
SUCHODOLSKI
9
Suchodolski no que se refere ao avanço tecnológico, mas as artimanhas do capital
permanecem as mesmas.
Para chegar a uma realidade social concreta no estilo marxista, segundo Suchodolski,
o homem deve superar-se criativamente superando o desenvolvimento histórico e não limitar-
se a simples repetição dos fatos. Na época contemporânea, os indivíduos e o mundo criado
por eles enfrentam um problema filosófico e que vem a ser o mesmo da educação. A saber:
“?es que y em qué sentido el hombre contemporâneo puede acceder a la conciencia del pleno
sentido y valor de la existência y de qué manera há de integrarse em una actividad em la cual
se encuentre a si mismo y cómo y hasta qué punto sabrá estabalecer los contactos sociales
com la comunidad de los demás indivíduos?”(Suchodolski, 1977, p.84). A ascensão da
consciência ao pleno sentido e valor da existência está na relação concreta que o indivíduo
mantém consigo mesmo, com sua atividade e com o outro. São os três estágios da mesma
consciência, ou seja, a consciência subjetiva, objetiva e coletiva.
A resolução deste dilema, para Suchodolski, bem como em Marx, só é possível com
uma sociedade sem classes em que nesta “[...] surgen las possibilidades de una vida en la que
el hombre real se convierta en un hombre verdadero, y el hombre verdadero en un hombre
real; entances surgen asimismos las condiciones necessárias para educar a unos hombres
plenos y concretos, puesto que es posible liquidar y superar los factores que constituyen la
fuente de la esclavitud humana y es posible asimismo solventar realmente los problemas de la
liberdad humana que hasta la fecha se han venido solucionado de un modo
10
mitológico”(Suchodolski, 1977, p.90). Portanto, na atual sociedade capitalista dividida em
classes, em que uma domina as outras, a solução parece ser impossível, pelo menos enquanto
a educação estiver a serviço da ideologia dominante, a menos que, dentro do próprio sistema
do capital, encontre o modo de superá-lo e talvez a solução seja a de formar educadores mais
que simples transmissores de conhecimento.
Adorno apresenta uma educação que evite a barbárie, ou a não violência, e emancipe
o homem, ou levá-lo a pensar com a própria cabeça; Freinet uma educação centrada na
criança enquanto membro da comunidade; Gramsci uma escola que concilie trabalho manual
e intelectual; Makárenko uma educação em vista da felicidade da criança com disciplina
formadora da personalidade; Pistrak uma educação que seja a soma de conhecimentos, hábitos
e técnicas que conduzam a compreensão marxista da vida moderna; Snyders uma educação
reivindicada pelo trabalhador e que comunique alegria àquilo que ensina; Suchodolski uma
educação do estilo marxista, questionadora, com base na cultura do povo e que ascenda a
consciência ao pleno sentido da existência. Todas estas maneiras diferentes de conceber a
educação sintetizam-se na educação omnilateral que leve o indivíduo multifacetado à
humanização tendo no horizonte a totalidade intelectual, física, corpórea e sensível com a
finalidade de construir uma nova sociedade.
11
Esta nova concepção do mundo é o de uma sociedade sem classes, mas não se pode
esperar este momento acontecer, visto que jamais acontecerá no atual sistema do capital. No
entanto, aqui e agora é possível começar a revolução intelectual, devolvendo ao povo o livre
pensar e ajudando-o a organizar sua cultura de forma que ele mesmo seja criador e construtor
de sua história. Para dar início a este processo é preciso que os docentes que assim pensam se
empenhem o máximo para, em sua escola, começar uma silenciosa revolução e de escola em
escola garantir a mudança, primeiramente no sistema educacional e depois certamente
acontecerá, pacificamente, a revolução social.
Referência bibliográfica
FREINET, Célestin. Para uma Escola do Povo. São Paulo. Martins Fontes. 1996.
MARX E ENGELS - Textos sobre Educação e Ensino. 5ª Ed. São Paulo. Centauro, 2006
PISTRAK, M.M. Fundamentos da Escola do Trabalho. São Paulo. Expressão Popular. 2003
SNYDERS, Georges. Escola, classe e luta de classes. 2ª ed. Lisboa-Portugal. Moraes, 1981.
12