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Espírito Conservador – IV
Conservadores do Brasil
Brasil, outubro de 2017
Vinde, Espírito Santo, enchei os corações dos Vossos fiéis e acendei neles o
fogo do Vosso Amor.
Enviai, Senhor, o Vosso Espírito e tudo será criado e renovareis a face da
terra.
Ó Deus, que instruístes os corações dos Vossos fiéis com a luz do Espírito
Santo, fazei que apreciemos retamente todas as coisas segundo este mesmo
Espírito e gozemos sempre de Sua consolação.
Por Cristo, Senhor nosso
Amém
EDITORIAL

O quarto volume da Coleção Espírito Conservador desponta como o


primeiro resultado obtido pela análise de comentários e diálogos travados
com leitores dos nossos volumes anteriores.
Muito aprendemos com essa troca de ideias, que nos faz repensar e
estudar, enquanto também nos revigora para prosseguirmos na honrosa e
difícil batalha de redescobrir o conservadorismo brasileiro.
Nessa edição, toma forma um singelo esboço em prol da recuperação da
história do país, além de reflexões sobre Estado, verdade e valores.
É a nossa modesta parcela de contribuição no resgate do povo brasileiro
das garras imorais, corruptas, autoritárias e desumanas dos movimentos
revolucionários que empesteiam esta sofrida pátria.
ÍNDICE
1. Breves biografias de negros notáveis – Parte I. É claro que o
preconceito racial existe no Brasil, em diferentes graus. Contudo, este é
contido o suficiente para se render à impoluta lista de notáveis recuperada
neste ensaio. Por Reno Martins.

2. Pelo fim da separação entre Igreja e Estado. Desprovido da moral


cristã, o Estado se tornou vulnerável ao relativismo dos revolucionários; das
guilhotinas da Revolução Francesa aos campos de extermínio socialistas, o
Estado apartado da Fé se banha no sangue infindável dos inocentes. Por
Marcelo Hipólito.

3. Verdade e linguagem. A verdade sobrevive somente no Discurso


Divino, com a qual a linguagem humana, que a traduz em pensamento e a
reproduz em conhecimento, deve se manter em profunda comunhão. Por
Reno Martins.

4. O bom cristão. Como o orgulho e a soberba podem afastar até as


melhores almas da verdadeira caridade da Santa Igreja. Por Marcelo Hipólito.

5. Os autores. Breves biografias: Marcelo Hipólito e Reno Martins.


I
Breves biografias de negros notáveis – Parte I
Reno Martins
Consta datar de 1968, durante o governo do Marechal Costa e Silva, o
primeiro registro brasileiro em torno do que hoje se costuma chamar ações
afirmativas em favor da população negra. Na ocasião, técnicos do Ministério
do Trabalho e do Tribunal Superior do Trabalho manifestaram-se favoráveis
à criação de uma lei que obrigasse empresas privadas a manter uma
percentagem mínima de “empregados de cor”[1]. Mas a consolidação efetiva
dessas ações só ocorreria trinta e cinco anos depois, em 2003, com a adoção,
pela UFRJ, de cotas reservadas para alunos negros. Um conjunto de
iniciativas desse tipo passou a ser implantado posteriormente no país,
havendo delas amplo registro.
Este artigo pretende apresentar uma coletânea sucinta e não exaustiva
de conterrâneos negros notáveis, cujo reconhecimento social tenha ocorrido
antes da implantação de ações afirmativas no Brasil, em 2003, ou ainda, antes
do reputado início do debate público sobre o tema, em 1968. Sendo sabido
que, no início da história do Brasil, a população de ascendência africana, por
força da vigência do escravismo, teve menos acesso às letras que a população
de origem europeia, não é irrelevante observar que vários deles se destacaram
não apenas como músicos e esportistas, espaços imbatíveis de
reconhecimento e glória, mas, também, entre fidalgos, escritores, sacerdotes,
engenheiros, juristas, diplomatas, empresários, militares e políticos, inclusive
(e notavelmente) durante os períodos Colonial e Imperial.
As biografias foram organizadas de forma crescente pelo ano de
reconhecimento público da pessoa em questão: data destacada em negrito no
respectivo texto.
Para fins de contextualização, quatro outras datas devem ser ressaltadas:
1850 – quando, em 4 de setembro, a Lei Imperial nº 581
estabeleceu medidas à repressão do trafico de africanos no Brasil,
reduzindo a zero a entrada de novos negros no intervalo de apenas
três anos.
1871 – quando, em 28 de setembro, a Lei imperial nº 2.040 tornou
livres todos os filhos de mulheres escravas nascidos a partir dali.
1885 – quando, em 28 de setembro, a Lei Imperial 3.270 promulgou
garantida liberdade aos negros escravos com mais de sessenta e
cinco anos.
1888 – quando, em 13 de maio, a Lei Imperial nº 3.353 aboliu
definitivamente a escravidão no Brasil.
Alguns, certamente, encontrarão razão de racismo no fato de muitos dos
nomes aqui citados serem pouco conhecidos. Julgamos, contudo, ser esse
muito mais um problema generalizado de desconhecimento histórico (grave
sintoma da falência do nosso sistema de ensino) do que propriamente
preconceito. Sem embargos, aqueles que desconhecem nosso primeiro negro
biografado, Henrique Dias, provavelmente são alheios também ao lendário
Filipe Camarão, nativo; João Fernandes Vieira, senhor de engenho; ou André
Vidal, militar e político, todos homenageados ainda em vida como líderes e
heróis da Insurreição Pernambucana, na luta contra as invasões holandesas. O
mesmo cabe a incontáveis outros personagens importantes de nossa história,
independentemente da cor de sua pele.
É evidente que, por ter nossa pátria sido fundada num momento em que
vigia o escravismo, não se pode assumir a inexistência de preconceitos entre
nós.
Existem, certamente, em diferentes graus.
Entretanto, a despeito de tudo que pessoas mal intencionadas fazem
para nos dividir, é possível afirmar com total segurança que o grau de
preconceito em nossa sociedade é baixo o suficiente para podermos contar,
em meio a uma infinidade de outras figuras, a história dos ilustres brasileiros
aqui listados.
---
Henrique Dias (-1662) – Fidalgo e militar brasileiro. Um dos líderes e heróis
da Batalha dos Guararapes. Não se sabe quando nasceu, nem se era escravo
ou liberto[2]. Foi agraciado pelo Rei D. João IV com a comenda do Moinho de
Soure, da Ordem de Cristo. Em 1656, viajou a Lisboa para “pedir satisfação
de seus serviços feitos nas guerras do Brasil”. Apesar da oposição do
Procurador da Fazenda e de alguma discussão sobre o valor das pensões,
quase todas as suas demandas foram deferidas pela rainha regente, D. Luiza
de Gusmão, incluindo uma pensão e a transferência das comendas das Ordens
Militares que recebera para os genros. Ainda em Lisboa, recebeu oficialmente
a patente de Mestre de Campo, tendo aberto mão de receber pessoalmente as
duas condecorações das Ordens Militares com que fora prestigiado[3].
Chica da Silva (1732-1796) – Escrava que foi alforriada e atingiu uma
posição de grande destaque na sociedade onde hoje é a cidade de
Diamantina-MG. Depois de liberta, passou a viver como casada com o
contador de diamantes João Fernandes de Oliveira, com o qual teve treze
filhos, todos recebendo o sobrenome do pai e boa educação. Após 15 anos de
união, em 1770, João Fernandes retornou a Portugal para resolver questões de
herança, levando consigo os quatro filhos homens do casal, que lá adquiriram
educação superior e postos de nobreza. Ela e as filhas passaram a conviver
com a elite, inclusive obtendo grande número de escravos. Doou parte de
seus bens às irmandades religiosas do Carmo e de São Francisco, até então
exclusivas de brancos, e às das Mercês, exclusivas dos mestiços e do Rosário
dos Pretos, reservada aos negros. Faleceu em 1796, sendo sepultada na
irmandade de São Francisco de Assis, deixando o cemitério de ser exclusivo
de brancos. Segundo a historiadora Júnia Furtado, longe de ser uma mulher
“à frente de seu tempo”, Chica estava alinhada às ideias da sua época, uma
vez que mais da metade das chefes de domicilio na sua cidade eram ex-
escravas[4].
Aleijadinho (1738-1814) – Artista e empresário de Ouro Preto-MG. Filho de
escrava, historiadores ainda discutem se ele foi o autor de todas as obras
maravilhosas atribuídas ao seu nome, ou se coordenou um atelier com vários
funcionários. Reconhecido em vida, realizou projetos de grande monta já em
1790[5].
Tebas (1721-1811)[6] – Joaquim Pinto de Oliveira, nascido em Santos-SP, foi
responsável pela construção de diversas obras arquitetônicas importantes para
a cidade, como a torre da primeira Catedral da Sé, o frontispício da Igreja da
Ordem Terceira do Carmo e o Chafariz da Misericórdia, tendo ainda talhado
a pedra de fundação do Mosteiro de São Bento. Em 1808, obteve o título de
Juiz de Ofício, posição destacada, tradicionalmente conferida a portugueses.
Foi tema do samba enredo composto por Geraldo Filme para a escola
Paulistano da Glória, em 1974[7]. Quando alguém é muito bom em algo, é
chamado de Pelé. Antes de Pelé, era chamado de Tebas[8].
NS da Conceição Aparecida (1717-) – Padroeira do Brasil. Durante uma
pescaria importante e infrutívera, pescadores do Vale do Paraíba clamaram
pela intercessão da Virgem Maria, surpreendendo-se ao içar das águas do rio
o corpo de uma imagem com pele negra. Em outro lançamento, pescando a
cabeça, reconheceram a Santa Virgem. Depois disso, apanharam tantos
peixes que, para não afundar os barcos, foram forçados a retornar ao porto.
Vários outros milagres, ainda hoje, são atribuídos à NS através da Santa
Aparecida. A imagem foi visitada em 1822 pelo Príncipe Regente do Brasil
Dom Pedro I, em 1868 pela Princesa Isabel e, novamente por ela, em 1888,
quando, em pagamento de uma promessa, presenteou a Santa com a coroa de
ouro e o manto azul tradicionais. Venerada pela totalidade dos católicos
brasileiros como intercessora de graças junto a NS Jesus Cristo, NS
Aparecida foi oficialmente reconhecida como padroeira do país em 1930,
pelo papa Pio XI[9].
Francisco Gê Acaiaba Montezuma (1791-1870) – Advogado, político,
diplomata, ministro de Estado, senador do Império e fidalgo natural de
Salvador-BA. Batizado Francisco Gomes Brandão, era filho de pai português
e mãe negra. Sua família ansiava para que se tornasse padre, porém, optou
pelo direito. No período da independência, adotou os sobrenomes de origem
africana, tupi e asteca. Foi eleito deputado da Assembleia Geral Constituinte
e Legislativa em 1823. Foi ministro da Justiça em 1837, ministro dos
Estrangeiros de 1837 a 1840, voltou à Câmara em 1838, e proclamado
ministro plenipotenciário em Londres, em 1840. Tornou-se presidente
honorário da OAB em 1848, foi nomeado membro do Conselho de Estado em
1850, eleito senador em 1851 e recebeu o título de Visconde de
Jequitinhonha em 1854. Considerado um dos grandes oradores de seu tempo,
seria um dos fundadores e o primeiro presidente do Instituto dos Advogados
Brasileiros, em 1843[10].
Beato Padre Victor (1827-1905) – Sacerdote de Três Pontas-MG. Foi
ordenado pela Igreja em 1851, apenas um ano depois de extinto o tráfego
negreiro. Atuando em pleno exercício do regime escravista, sofreu grandes
dificuldades, mas sua vocação era tamanha que, com o tempo, conquistou até
mesmo aqueles que antes o perseguiam, passando a ser conhecido como o
“lendário padre negro de Três Pontas”. Até hoje é alvo de grande devoção
popular[11].
Luís Gama (1830-1882) – Rábula, orador, jornalista e escritor de Salvador-
BA. Ex-escravo, batizado Luís Gonzaga Pinto da Gama, permaneceu
analfabeto até os 17 anos. Em 1859, aos vinte e nove anos, já era autor
consagrado, considerado "o maior abolicionista do Brasil". Muito popular,
advogava para os pobres, escravos e pela causa republicana. Era conhecido
como o “amigo de todos” e seu enterro foi seguido por imenso cortejo, com
pessoas de todas as classes, parando a cidade de São Paulo[12].
Maria Firmina dos Reis (1825-1917) – Poetisa, escritora, folclorista e
professora de São Luís-MA. Publicou romances, contos e poemas, sendo o
primeiro deles “Úrsula”, de 1859. Também colaborou intensamente para a
imprensa local, lançando poesias, ficções, crônicas, e até enigmas e
charadas[13].
Cândido da Fonseca Galvão (1845-1890) – Fidalgo e militar de Lençóis-
BA, também conhecido como D. Obá II d'África. Alistou-se voluntariamente
para lutar na Guerra do Paraguai, sendo condecorado por bravura como
oficial honorário do Exército Brasileiro em 1870. Depois da Guerra, fixou-se
no Rio de Janeiro, tornando-se pessoa extremamente conhecida da sociedade
carioca. Defensor da monarquia, abolicionista e amigo do Imperador D.
Pedro II, após o golpe republicano seria perseguido, tendo cassado seu posto
de alferes. Morreu logo depois[14].
André Rebouças (1838-1998) – Engenheiro, inventor, deputado, nascido em
Cachoeira-BA. Filho de escrava, suas pesquisas militares o levaram a
inventar o torpedo[15]. Conselheiro pessoal do Imperador D. Pedro II, em
1871, ele e seu irmão, Antônio, apresentaram-lhe o projeto da estrada de ferro
que ligaria Curitiba-PR ao litoral, obra que até hoje se destaca pela ousadia de
sua concepção[16]. Após o golpe republicano, exilou-se voluntariamente do
país. Ambos os irmãos são hoje homenageados no nome de conhecidos
marcos viários em São Paulo e Rio de Janeiro.
Machado de Assis (1838-1908) – Escritor, jornalista, político e crítico
literário nascido no Morro do Livramento-RJ. De família pobre, filho de pai
negro e mãe branca, mal estudou em escolas públicas e nunca frequentou a
universidade. É considerado um dos maiores, senão o maior, nome da
literatura brasileira. Assumiu diversos cargos públicos, como o Ministério da
Agricultura, do Comércio e das Obras Públicas, e conseguiu precoce
notoriedade em jornais, onde publicou suas primeiras poesias e crônicas.
Usufruiu de grande prestígio em vida, fato raro para um escritor na época. Os
direitos autorais por suas publicações e crônicas em jornais e revistas,
acrescido da promoção que recebera da Princesa Isabel, em 1876, como chefe
de seção, permitiu-lhe gozar de prestígio e estabilidade. Na maturidade,
reunido colegas próximos, fundou a Academia Brasileira de Letras, da qual
seria o primeiro presidente, por unanimidade[17].
Theodoro Sampaio (1855-1937) – Engenheiro e empresário de Santo Amaro
da Purificação-BA. Formou-se engenheiro civil em 1876, na segunda turma
da Escola Politécnica do Rio de Janeiro, mas iniciou sua vida profissional
ainda estudante, como professor e desenhista no Museu Nacional. Formado,
amparou a mãe e comprou a alforria de três irmãos. Obteve sucesso
profissional cedo, graças à sua capacidade como cartógrafo, desenhista de
engenharia e também ao domínio da língua e do conhecimento técnico e
científico. Afirmou-se em São Paulo e depois em Salvador como engenheiro
e construtor, abrindo firmas para executar grandes obras que projetou, como a
rede de abastecimento de água e coleta de esgoto de Salvador. Trabalhou por
60 anos como engenheiro e escreveu livros e artigos relacionados à
Engenharia, Geografia, Etnologia e História[18].
Tranquilino Bastos (1850-1935) – Maestro, músico, compositor, arranjador,
professor e empresário de Cachoeira-BA. Filho de pai português e mãe negra
alforriada, ainda menor de idade, passou a integrar a Banda Marcial São
Benedito, composta por músicos negros. Sua fama chegou ao Velho Mundo,
onde suas composições foram aplaudidas por plateias eruditas. Foi, durante
muito tempo, o representante na Bahia de fábricas francesas de instrumentos
musicais, como a Casa Sax e a Besson. Espírita, fundou, em 1877, a
Sociedade Espírita Cachoeirana[19].
José do Patrocínio (1853-1905) – Jornalista, orador, poeta, romancista e
ativista político natural de Campos-RJ[20]. Filho de uma escrava alforriada e
um cônego, em 1867 ingressou na Escola de Medicina do Rio de Janeiro,
desistindo do curso e formando-se em farmácia, em 1874. Em 1877,
ingressou na redação de "A Gazeta de Notícias”, ganhando fama como
abolicionista e republicano[21]. Em 1881, com ajuda do sogro, adquiriu o
jornal “Gazeta da Tarde”. Seu prestígio, imenso durante os últimos anos do
Império, decaiu após o advento da República quando, sem participação no
governo, opôs-se abertamente ao ditador Floriano Peixoto em 1891, sendo
perseguido e desterrado para Cucuí-AM.
Chiquinha Gonzaga (1847-1935) – Maestrina, musicista e compositora do
Rio de Janeiro-RJ. Francisca Edwiges Neves Gonzaga era filha de José
Basileu Neves Gonzaga, militar ilustre do Império e a negraRosa, filha de
escrava. Educada para ser dama de salão, aos 16 anos casou com o promissor
empresário Jacinto Ribeiro do Amaral, escolhido por seu pai. Estreou
dirigindo uma ópera no Teatro Príncipe Imperial em 1885. Seu trabalho foi
reconhecido em vida, sendo festejada por público e crítica[22].
Francisco Glicério Cerqueira Leite (1846-1916) – Jornalista, professor,
advogado, político, ministro de Estado e general honorário do Exército
Brasileiro, natural de Campinas-SP. Maçom, republicano e abolicionista, foi
o único líder republicano paulista presente na corte no dia da proclamação da
república em 1889[23]. Foi Ministro da Agricultura no governo Deodoro da
Fonseca.
Nilo Peçanha (1867-1924) – Senador, governador e Presidente da República
nascido em Campos dos Goytacazes -RJ. Com pai negro e mãe branca de
uma família de políticos fluminenses, foi eleito para a Assembleia
Constituinte republicana de 1890. Em 1903 foi eleito sucessivamente senador
e presidente do estado do Rio de Janeiro, permanecendo no cargo até 1906
quando foi eleito vice-presidente de Afonso Pena. Com a morte de Afonso,
assumiu a presidência da República, de 15 de novembro de 1906 a 14 de
junho de 1909[24].

(Continua no volume V da Coleção Espírito Conservador)


II
Pelo fim da separação entre Igreja e Estado
Marcelo Hipólito
A hecatombe de sangue e terror da Revolução Francesa não anunciou
somente a loucura assassina de Robespierre e a tirania absolutista de
Bonaparte, prelúdios à primeira guerra total da humanidade (as campanhas
napoleônicas voltadas à conquista da Europa e do restante do mundo),
antecessora das grandes matanças que se seguiriam: a Guerra Civil
Americana, a Primeira e a Segunda Guerra Mundial. Esta revolução maldita,
fomentada pelo furor jacobino (os bolcheviques do século XVIII) abriu as
porteiras da civilização ao totalitarismo e aos massacres revolucionários que
se estendem aos dias atuais, em pleno século XXI. O poder destrutivo
liberado em solo francês naquele já distante e sombrio ano de 1789 nutriu-se
da mais marcante característica da Revolução Francesa: seu caráter
eminentemente anticristão.
A Coroa e a Igreja eram as instituições fundadoras da França, sobre as
quais se assentavam a prosperidade da nação, seus costumes e tradições, o
motor que a tornara essa secular nação a maior das potências europeias de sua
época.
Em sua demência revolucionária, os jacobinos decapitaram não apenas
o rei, mas perseguiram a igreja da França às portas da aniquilação. Sacerdotes
foram executados; as propriedades sagradas, roubadas e vandalizadas. Esse
ataque à Igreja, a alma do povo francês, não se deu, obviamente, por mero
capricho revolucionário. Toda revolução para triunfar precisa se erigir sobre
as cinzas do passado. E cinzas e sangue os jacobinos colheram em profusão,
numa escala jamais prevista, mesmo nos pesadelos de um louco. A destruição
do cristianismo provou-se a pedra fundamental do seu movimento. A
instituição de um Estado relativista e amoral, desprovido dos ensinamentos
de Cristo, depende da instituição de uma nova práxis, radical e terrorista,
forjada pela depravação moral dos intelectuais, muitos dos quais viriam a ser
tragados pela própria marcha extremista na qual se engajaram; outro
fenômeno comum às revoluções modernas.
O Estado anticristão é uma invenção revolucionária das elites
intelectuais contra a população, suas tradições e costumes, que tanto
desprezam como “arcaicos” ou “ignorantes”.
Existem teorias sobre as distinções entre o Estado laico e o Estado ateu.
O primeiro se expressaria, por exemplo, no caráter liberal da Revolução
Americana, cuja constituição separa Estado e religião em prol da liberdade de
culto e dos valores democráticos. Já o ateísmo teria suas raízes na Revolução
Francesa, precursora dos pavorosos Estados socialistas, as imensas máquinas
de matar que a seguiriam.
Realmente, laicismo e ateísmo possuem suas peculiaridades, porém, a
velha expressão marxista de que “O caminho do inferno está pavimentado de
boas intenções” aplica-se com precisão ao projeto do Estado laico. Afinal, no
longo prazo, o laicismo e o ateísmo conduzem à mesma ruína: a degeneração
moral da sociedade.
Em terras brasileiras, é sintomática uma das primeiras medidas adotadas
pelos golpistas instauradores da ditatura laica e republicana que derrubou a
monarquia cristã do Brasil: a separação forçada entre a Igreja e o Estado. Até
então, um conceito de imenso apreço popular, assentado legalmente nos
termos do Art. 5º da constituição imperial de 1824, dispositivo garantidor
ainda da liberdade de culto às demais religiões no país, contudo, sem abrir
mão da precedência do cristianismo, indistinguível da própria cultural
nacional.
Um Estado roubado dos seus princípios judaico-cristãos constitutivos
torna-se vulnerável à promoção de crimes antes inimagináveis, como:
campos de concentração, guerras irrestritas, holocaustos, controle estatal
absoluto. Não é à toa o caráter ateu ou anticristão dos Estados socialista,
fascista, nazista ou positivista. Essas ideologias extremistas, amorais e letais
só se tornam possíveis de chocar sob um Estado anticlerical, uma vez que o
cristianismo é um freio moral natural contra as mais diversas formas de
radicalismo.
O combate aberto ou velado ao cristianismo é um projeto revolucionário
em si mesmo, já que somente ele permite, verdadeiramente, avançar as
ideologias transformadoras da natureza humana, gestadas pelas elites para
subverter, solapar e destruir as crenças e práticas populares, eminentemente
cristãs no Ocidente, de forma a escravizar esse mesmo povo sob um modelo
de Estado totalitário.
Nesse contexto, Israel desponta como um estudo de caso interessante.
Poucos países são mais odiados pelo movimento revolucionário. O
Estado judeu não é laico por concepção, já que se assume como o bastião de
uma religião, povo e cultura: o judaísmo, base do sistema de tradições, fé, leis
e moral que permeiam o conjunto de nações chamado Ocidente.
A despeito de se distinguir do secularismo fanático adotado nos países
cristãos, pós-Revolução Francesa, Israel permanece a única democracia do
Oriente Médio onde existe plena garantia de culto a outras religiões, inclusive
resguardando várias delas da perseguição sistemática, homicida e autoritária
dos movimentos islamitas, bem como imune ao avanço político da extrema-
esquerda local, rejeitada, em geral, pela população.
Imbuído da defesa das crenças e tradições do judaísmo, Israel mostra-se
resiliente a qualquer penetração significativa no seu tecido social por parte de
ideologias revolucionárias.
Conforme G. K. Chesterton alertava, ainda no século XIX: “Quando um
homem já não crê em Deus, não é que ele não acredite em mais nada: ele
acredita em tudo”. Ao remover Deus do Estado, o movimento revolucionário
avançou no coração da sociedade ocidental como uma pandemia, buscando
corrompê-la com seu discurso relativista, controlador e autoritário.
O Estado afastado da Igreja é o primeiro e indispensável estágio à
escravização do homem comum.
Ao extirpar o cristianismo do Estado (supremo detentor do emprego da
violência na sociedade moderna), o extremista remove a contenção moral
exercida pela graça de Deus sobre a bestialidade humana, substituindo-a pelo
culto profano ao líder maior do movimento revolucionário. A religião civil da
Revolução, sua ideologia, suplanta então a fé em Cristo, fundadora da
sociedade e da democracia ocidentais. O amor a Deus é trocado pela
veneração ao soberano materialista, secular e anticristão.
Não é à toa que Benito Mussolini professava: “Tudo no Estado, nada
contra o Estado, e nada fora do Estado”. A religião é dominada ou perseguida
pelo Estado totalitário.
Destarte, o Estado laico ou ateu sucumbe como instrumento promotor
da paz social, conforme se apresentava na sua versão originária – quando
seus piores potenciais se achavam restringidos pelas amarras morais do
cristianismo –, para se assumir como um fim em si mesmo, remate último de
opressão absoluta, num nível jamais imaginado por qualquer tirano anterior
ao terror jacobino.
Restaurar um Estado cristão no Brasil, em uma versão atualizada e
generosa das disposições originais da constituição imperial, desponta como
um dever inadiável dos conservadores brasileiros, caso se pretenda conter a
infestação revolucionária em nossas terras, de forma a debelar sua ofensiva
persistente contra a saúde moral e religiosa da nação.
III
Verdade e linguagem
Reno Martins
Como em algumas outras tradições, os cristãos entendem a realidade
inteira como a manifestação do Discurso Divino. Os desejos de Deus não
repousam como acontecimentos potenciais, mas se manifestam em ato, de
modo contínuo e inexorável, como maravilhas e mistérios, a despeito de
quaisquer outras conveniências.
Assim, tendo sua origem e sustentação em uma mesma fonte, a
realidade possui uma harmonia implacável e integrada. Descrever as coisas
em conformidade com a realidade é o que chamamos “Verdade”. Na
civilização ocidental, tal concepção não ecoa apenas na teologia, mas também
nas ciências, pela premissa seminal de que o funcionamento do mundo pode
ser reduzido a regras universais, mesmo não sendo essas regras
necessariamente discerníveis ou alcançáveis.
O livre-arbítrio humano, obtido como graça pela criação divina à
imagem e semelhança de Deus, expressa a libertação da sua vontade,
imaginação e criatividade das restrições do entorno. Contudo, sendo o
homem criatura, tais faculdades não se manifestam imediatamente na forma
de ato, mas subsistem como potência mais ou menos remota, estando sua
realização condicionada à adesão e submissão às possibilidades determinadas
pelo Discurso Divido.
Procurar entender a vontade de Deus, alinhando-se à Verdade, é um dos
desdobramentos centrais do cristianismo. Ame o Senhor seu Deus de todo o
seu coração, de toda a sua alma e de todo o seu entendimento, disse NS Jesus
Cristo (Mt 22:37). O Espírito Santo é o Espírito da Verdade, esclarece-nos o
discípulo que Jesus amava (Jo 16:13). Separar-se da Verdade é separar-se de
Deus. Desprezá-la de todo coração, alma e entendimento é pecado mortal
contra o Espírito Santo, que não será perdoado (Mt 12:31-2). Raciocinar é
identificar relações válidas entre conceitos. Inteligir é a capacidade de
identificar o quanto um raciocínio é verdadeiro, ou seja, o quanto um
raciocínio é aderente à realidade incontingente do Discurso Divino. Um
raciocínio pode ser válido, porém não verdadeiro, quando apresenta
consistência, mas não tem correspondência com a realidade.
O desencontro entre o discurso humano e o Divino é chamado
“engano”, “falsidade” ou mentira”, cuja disfunção permeia a cultura
ocidental. Para ilustrar, em uma de suas viagens, Guliver – de Swift –
demonstra embaraço para explicar o que seria mentira ao seu amo
Houyhnhnm, algo que o povo deste só conhecia vagamente e chamava “coisa
que não é”. Após a explanação, o protagonista recebe a seguinte resposta:
A utilidade da fala é fazer-nos compreender uns aos outros e receber
informação a respeito dos fatos. Ora, se alguém disser a “coisa que
não é”, esses objetivos não são atingidos, pois nesse caso não estou
realmente entendendo a outra pessoa nem sendo informado como
convém.
A disfunção, contudo, transcende em muito a comunicação trivial, como
pode levar a crer uma leitura descuidada do trecho. Não é intenção, aqui,
abordar os meandros da retórica ou da erística, em que as técnicas de
discursos podem ser usadas para transmitir ou evitar que se transmita uma
mensagem. Também não é nossa intenção discutir a conveniência na
assunção metodológica de premissas ou regras simplificadas, propositalmente
não aderentes à realidade, com a intenção de realçar determinado aspecto
dela[25]. Busca-se, isso sim, concentrar-se no aspecto, potencialmente mais
danoso, em que o raciocínio e o discurso humano não são usados como
instrumentos ou suportes, mas como substitutos da realidade.
Essa semente do mal tem longa data. Foi por confundir o discurso da
Serpente com a realidade que o gênero humano caiu do Paraíso[26].
Talvez o paradoxo mais famoso descoberto pelos filósofos gregos seja
o do “mentiroso”. Um cretense diz que todos os cretenses são
mentirosos: se o que ele diz é verdadeiro, então é falso. Simplificando,
considere: “Esta frase é falsa.” Se for verdadeira é falsa, se falsa,
verdadeira. Os antigos levavam a sério esse paradoxo, pois se o
conceito de verdade é intrinsecamente contraditório, como o paradoxo
implica, então todo o discurso, todo o argumento, toda a tomada de
decisão racional ocorre em um vazio. Um filósofo antigo, Filitas de
Cos, em seu desespero na busca de uma solução, cometeu suicídio.
Mais recentemente, o grande lógico Alfred Tarski usou o paradoxo
para argumentar que a verdade pode ser definida em uma linguagem
somente através de uma “meta-linguagem” com um ponto de vista
externo. Na visão de Tarski “Esta frase é falsa” não é uma frase
possível. Mas eu acabei de escrevê-la![27]
O Discurso Divino não possui paradoxos. Deparamo-nos com eles
apenas devido ao nosso limitado entendimento ou ao fato de se confundir
realidade com a validade de um raciocínio. O desespero de Filitas de Cos
decorre do seu infortúnio em não conseguir distinguir a Verdade de um
discurso. A existência da fala não implica na existência do que se fala. O
“esta frase é falsa” não é um paradoxo da realidade, mas um paradoxo do
discurso. Não obstante, é possível inteligir na realidade as referências
“elefante cinza”, “depois de amanhã” ou “E=mc2”; mas, jamais, “esta frase é
falsa”[28]. Nesse aspecto, Alfred Tarski prova-se inteiramente certo: “esta
frase é falsa” não é algo possível na realidade, pois só pode ocorrer no
raciocínio.
Hoje temos milhares de discursos racionalmente coesos que se
apresentam como “leituras alternativas”, mas não refletem de modo
consistente o que a realidade condiz. Alguns não explicam coisa alguma, mas
querem fazer crer que explicam algo; outros explicam pequena parte dos
acontecimentos, mas se propõem explicar uma parte maior que aquela a que
se aplica; outros explicam grande parte das coisas, mas se julgam capazes de
explicar a totalidade delas.
A igualdade biológica entre homens e mulheres, o aborto como método
contraceptivo[29], o governo como gestor eficiente, o comunismo como
alternativa democrática, a república como venturosa para o Brasil e o Islã
como religião da paz são alguns poucos exemplos.
A realidade é o Discurso Divino. O homem tem liberdade e arbítrio no
seu discurso e raciocínio, e pode aproxima-los ou distancia-los de Deus. Os
loucos optaram por abolir a Verdade, os com juízo a perseguem e se agarrem
a ela com todas as forças. Devemos filtrar nossos discursos e raciocínios pela
realidade. Só assim, é possível saber o valor e lugar de cada um deles. A
alternativa é a confusão, a frustação e o desespero de Filitas.
IV
O bom cristão
Marcelo Hipólito
“Conheces teu inimigo e conhece-te a ti mesmo”
– Sun Tzu
Recentemente, participei de um debate muito interessante com outros
conservadores, no qual um indivíduo em particular levantou a acusação de
gnosticismo contra os célebres intelectuais cristãos J. R. R. Tolkien e C. S.
Lewis, notadamente em suas obras ficcionais.
Nessa discussão, externei minha contrariedade à alegação lançada a
autores amplamente reconhecidos pela sua fé, hábeis em empregarem mitos
pagãos no avanço da mensagem cristã. Uma inspiração ecoada na tradição
dos clérigos medievais, que acolhiam e evangelizavam as culturas pagãs
europeias valendo-se de elementos do folclore local, integrados à doutrina
cristã. Desse trabalho, por exemplo, despontou a releitura de importantes
mitos pagãos, como a versão cristã de Beowulf e Papai Noel.
Imbuído de sua visão rígida, o pretenso direitista chegou a defender
abertamente a vedação à leitura dos mencionados autores, argumentando que,
pela salvação das nossas almas, deveríamos evitá-los por completo, já que,
impregnados pelo gnosticismo dos tempos modernos, seríamos incapazes de
apreciá-los sem nos impregnar em seus vícios. Somente uns poucos
privilegiados, dotados de uma capacidade superior de interpretação da
Doutrina estariam capacitados a acessá-las imunes em relação às suas
influências enganosas.
Essa defesa enfática da reintrodução do Index, obviamente, despreza
séculos de extensos debates no seio da Santa Igreja, estudos relevantes da
intelectualidade cristã perante o poder do mito (como as considerações de G.
K. Chesterton sobre a Elfolândia no livro Ortodoxia) e até ponderações
consagradas sobre o uso da literatura pagã, tais quais as contidas na Carta
aos Jovens Sobre a Utilidade da Literatura Pagã, de São Basílio de Cesárea,
dentre outras graves contradições, emanadas dessa proposição radical; cito,
por exemplo:
Como separar a Escolástica de São Tomaz de Aquino da
filosofia pagã de Aristóteles?
Ou, ainda, desconsiderar a relevância de Platão para Santo
Agostinho?
Seria possível o surgimento da Patrística desprovida do
classicismo grego?
Existem esses pequenos e barulhentos grupos católicos,
autoproclamados defensores das verdadeiras tradições da Igreja, opositores
ferrenhos do que chamam “doutrinas modernistas” do Concílio Vaticano II.
Um posicionamento compreensível e, por vezes, louvável, porém, o
qual, se levado a extremos, assenta uma trajetória perigosa a mentes incautas.
Desde tempos imemoriais, a Igreja exibe duas qualidades marcantes:
um intenso e qualificado debate doutrinário interno e uma autoridade central
representada pelo Trono de Pedro.
Já esses grupos ou movimentos caracterizados por um afetado
dogmatismo de pretensões tradicionalistas muitas vezes portam-se de forma
desafiadora a essa autoridade sagrada, uma vez que incapazes de fazerem
prevalecer suas teses nas discussões intramuros da Santa Sé.
Essa postura provocadora, por vezes, descamba em comportamentos
lamentáveis. Destes, as acusações públicas formuladas contra outros fiéis
permanece um dos seus ecos mais deletérios.
Aqui mesmo no Brasil, já foram vilipendiados como gnósticos, infiéis e
heréticos cristãos praticantes como o filósofo Olavo de Carvalho. Por vezes, a
única peça acusatória é o fato de o indivíduo debruçar-se no estudo de tópicos
exteriores ao cristianismo. No caso de Olavo, citam-se, com frequência, seu
conhecimento sobre a obra de René Guénon, o islamismo ou a astrologia,
dentre outros.
O ataque à fé e ao pensamento de Olavo impõe uma severa inquietação:
a preocupação do inquisidor se concentra na salvação da alma do acusado, ou
na execração pública de um renomado cristão? Na busca da propaganda fácil
direcionada ao avanço de uma agenda político-religiosa própria, ou seu
motivo reside no nobre despertar de uma consciência confusa?
De fato, ao acusador deve se impor o cuidado e a precaução caridosa de,
primeiramente, abordar com discrição o alvo da sua suspeita, antes de lhe
enxovalhar a reputação aos quatro ventos. A prudência e a civilidade clamam
por nada menos: uma conversa prévia, respeitosa, ajuizada sobre as supostas
falhas do pecador, buscando resgatá-lo ao amor de Deus, se for o caso.
Atacar irmãos em Cristo em nome de uma suposta superioridade moral
ou intelectual pode sinalizar, em vez disso, uma soberba pecaminosa. O vício
de quem se julga melhor do que a própria Igreja a interpretar as Escrituras e a
Doutrina, renegando uma tradição milenar intrínseca ao cristianismo: o rigor
intelectual do seu vigoroso debate interno.
Destarte, deve-se cuidar para que uma leitura particular – pretensamente
superior – da Doutrina, porém, uma não sancionada pela Igreja, perca-se, por
isso mesmo, na vaidade intelectual irresponsável, a qual pode descambar em
macabra heresia. Somente uma alma confusa, encapsulada por seu próprio
orgulho, avocaria para si a censura pública a outros cristãos sem o devido
endosso de Roma.
Sejam as posições da Igreja mais ou menos afetadas pela chamada
“modernidade”, isso não valida, por si só, leituras avulsas da Doutrina.
Interpretações particularizadas não são sagradas apenas por se voltarem ao
passado. O critério de Verdade não reside nesse tipo de prisão mental, nem
em se evitar seu fórum apropriado: o seio da Igreja.
O Concílio Vaticano II não é desculpa para um questionamento
arbitrário ou caprichoso. Ambições intelectuais ou interpretativas não devem
prosperar desprovidas da amplitude conservadora da prudência, humildade e
recolhimento. Do contrário, cai-se, uma vez mais, na armadilha do
Savonarolismo, vazio, herético, radical. Afinal, mesmo a leitura mais
tradicionalista pode naufragar no vício, sutil ou não.
Por isso, desconfie dos caminhos não endossados por Roma, dos
autoproclamados donos da razão, os quais, concidentemente ou não, rendem-
se à polêmica fácil, em vez de detidos na abordagem discreta, no
convencimento sereno do altruísmo cristão. Melhor a caridade do que a
censura pública, a evangelização do que o confronto, o amor do que o
escárnio.
De outra forma, balcaniza-se, ainda mais, o cristianismo, lançando
irmão contra irmão, numa disputa tola e dispensável pela primazia da
Verdade.
De fato, não confundam nossa fé com a trevosa ignorância. A Palavra
Sagrada merece melhor tratamento e maior respeito, devoção e serenidade.
V
Autores

Marcelo Hipólito é um escritor brasileiro,


nascido em São Paulo. Residente em Brasília, pai de dois filhos, é autor de
três romances diversos contos, sendo coautor de diversos contos publicados
em língua inglesa, nos EUA, Reino Unido e Espanha, tendo um deles sido
indicado para melhor conto nos EUA, em 2003. Também realiza palestras em
eventos, foi diretor de três filmes de curta-metragem de ficção, roteirista de
cinema e produtor de teatro. Integra o Instituto Conservador de Brasília.
Reno Martins, nascido no Rio Grande do
Norte, é católico, mestre em economia e professor. Casado, pai de dois filhos
e chefe escoteiro, Reno desenvolve estudos nas áreas de filosofia politica e
religião, com especial atenção para guerra cultural e tradição cristã no Brasil.
Além disso, dedica-se à prosa poética e assuntos pouco usuais, tais como
ufologia e alquimia.
[1]
Sabrina Moehlecke. Ação Afirmativa: História e Debates No Brasil. São Paulo: USP, Cadernos de Pesquisa, n. 117,
p. 197-217, novembro/ 2002.
[2]
José Antonio Gonsalves de MelLo. Henrique Dias: governador dos crioulos, negros e mulatos do Brasil. Recife:
Fundaj, Ed. Massangana, 1988. Apud Fundação Joaquim Nabuco, com acesso em 25/07/2017.
[3]
Hebe Mattos. Da guerra preta às hierarquias de cor no Atlântico português. Associação Nacional de História –
ANPUH, XXIV SIMPÓSIO NACIONAL DE HISTÓRIA - 2007. Disponível em XXIX Simpósio Nacional de
História, com acesso em 23/07/2017.
[4]
Júnia Ferreira Furtado. Chica da Silva e o Contratador dos Diamantes. São Paulo: Companhia das Letras, 2003.
Apud Portal Brasil. com aceso em 25/07/2017.
[5]
Ver Museu Aleijadinho. Acesso idem.
[6]
Ver Jornada do Patrimônio (Cidade de São Paulo). Acesso idem.
[7]
Lígia Nassif Conti. A Memória do Samba na Capital do Trabalho: os sambistas paulistanos e a construção de uma
singularidade para o samba de São Paulo (1968-1991). USP, Departamento de História: Tese de Doutorado, 2015. pp
171-172.
[8]
Ver Negros Geniais de Rogério de Moura. Acesso em 25/07/2017.
[9]
Ver Wikipédia. Acesso idem.
[10]
Ver Geledés. Acesso idem.
[11]
Ver Associação Padre Victor. Acesso em 12/07/2017.
[12]
Ver Wikipédia. Acesso em 25/07/2017.
[13]
Ver Negros Geniais de Rogério de Moura. Acesso idem.
[14]
Ver: Eduardo Silva. “ Um príncipe negro nas ruas do Rio”, em Folha Online. Acesso em 12/06/2017.
[15]
Ver Black Inventors. Acesso em 25/07/2017.
[16]
Ver Wikipédia. Acesso idem.
[17]
Ver Wikipédia. Acesso idem.
[18]
Ver Portal da Cultura Negra e Wikipédia. Acessos em 25/07/2017.
[19]
Ver Negros Geniais de Rogério de Moura. Acesso idem.
[20]
Ver Academia Brasileira de Letras. Acesso idem.
[21]
Ver UOL Educação. Acesso idem.
[22]
Ver ChiquinhaGonzaga.com. Acesso idem.
[23]
Ver Negros Geniais de Rogério de Moura e Wikipédia. Acesso idem.
[24]
Ver História Blog e Wikipédia. Acessos em 23/06/2017 e 25/07/2017, respectivamente.
[25]
Para saber algo disso, estude o debate sobre a não necessidade de realismo das hipóteses, por Milton Friedman.
[26]
Obrigado, Professor Olavo de Carvalho!
[27]
Trecho de A maneira russa de mentir: uma perspectiva filosófica sobre a propaganda pós-soviética, de Roger
Scruton (The Spectator, 23 de Março de 2017). Tradução: Guilherme Pradi Adam, Revisão: Rodrigo Carmo.
http://tradutoresdedireita.org, acesso em 15/08/2017.
[28]
Para esclarecer: paradoxos como o “Ovo e a Galinha” e “Hércules e a Tartaruga” pertencem à categoria diferente,
pois são inteligíveis à realidade. Seus embaraços derivam de nosso limitado entendimento.
[29]
De fato, essa sequer consistência racional tem, pois o ato do aborto ocorre necessariamente depois do ato da
concepção.

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