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CU ie Cr PREMIO NOBEL 2013 ‘Transporte intracelular ‘odos os seres vivos so compostos T par células, que representam suas unidades estruturais e funcionais Uma importante caracteristica adquirida durante a evolucdo — e que distingue os organismos procariotos (bactérias) dos eucariotos(fungos, plantas e animais) — 6 que, nestes dltimos, as células sao com- partimentalizadas: tm seu espago interno subdivididoem ‘ambientes’delimitados por membrana, as chamadas organelas, As organelas criaram uma safisticada organizagao intracelular, permitindo a concentrapéa de substancias especificas e mantendo condiges fisico-quimicas ot- mmizadas. nos diferentes compartimentos, para favorecer reagies bioquimicas intra- celulates. Em uma mesma oélula,reacoes quimicas que poderiam ser contrapradu- centes (por exemplo, a sintese e degra~ MAQUINARIA DO TRAFEGO VESICULAR Ussones (2 (es) ; § a DCimpen te NOCLEO dado de certa biomolécula) séo execu- tadas de forma eficiente entre os diferen- ‘tes compartimentos. Mas, embora vantajo- sa, essa complexa organizacdo intracelular trouxe consigo novos desafis. Muitas vezes, a sintese de uma biomo- lécula (proteinas, carboidratos, gorduras etc.) envolve diferentes organelas, as quais podem nao ser 0 local onde esse produto final exercera sua fungdo. Assim, essas biomoléculas sao transportadas, como em uma linha de producdo, entre ‘estagdes de trabalho’, antes de atingirem seu destina final (uma organela ou o exterior da célula). Mas quais s800s veiculos usados nes- se transporte? Como essa distribuicao & regulada espacial e temporalmente? Por que a troca constante de materiais nao compramete o tamanho e a composicaa os diferentes compartimentos? O Nobel de Fisiologia ou Medicina des- te ano foi dado a trés pesquisadores que ccontribuiram, de forma impar, para 0 en- tendimenta dessas questées. James Roth- man, Randy Schekman e Thomas Sidhof foram reconhecidos “por suas descober- tas sobre a maquinaria que regula o tré- fego vesicular, um importante sistema de transporte em nossas células”. Atéa década de 1970, o conhecimento sobre @ organizagao dos comparlimentas intracelulares era bem limitado. 0 rome- no George Palade (1912-2008) —Nabel de Fisiologia ou Medicina em 1974 ~e cola- boradores haviam demonstrado que pro- teinas secretadas pela célula passavam Por organelas especificas, de forma se- uencial, antes de atingirem a supertici celular: comegavam pelo reticulo endo- plasmatica, dirigiam-se ao complexo de - Membrana plasmatica Compartimenta de destina ae Processo de fusd0_ Compartimento partis (1) Asprotenas da via seoretora so fabricadssparribossomes, aderidos& face etna do retculoendoplasmdtico,(21Nortiul endoplasmic, a protinas so obradase montaas [1A vesiculas, que brotam doreticuo endopasmstic, funcionam carn vagies que levam a maoria das potenas até o complex de Gog (4)Aa ating uma membrana-ara, uma vescula se funde com ea. (51No comple de Gos, sproteinas sao enderecadas para outros destnos na clula—algumas retornam 20 ‘etc ul endplas matic, endo também transportadas por wesculas.[6] As vesiculas podem Ivara prateinas. do compexa de ol para os lsossomos, para ‘membrana plastica ou para o exterior da cul, Parte das potenas pode também permanecer nos grénuls de ecrepo,&esperade sina para salem da lla 12) €1ENCIANONE 310; VOL 52 Golgi, para, entéo, chegar aos grénulos de seoregao. No inicio da década seguinte, Rothman e Schekman queriam entender 0s mecanismas moleculares envolvidos nesse transporte intracelular Rothman desenvolveu, entao, um mé- tado inovador para reconstituir artificial mente o processo de transferéncia de pro- teinas na oélula, Seu grupo isolou, em tu- bos de ensaio, porgdes do complexo de Golgi de duas populagées distintas de cé- lulas animais: uma das populagdes era saudével, a outra, infectada por um v rus que usa os compartimentos celulares para produit suas proteinasviais. Controlando o transporte de uma pro- tena viral docomplexo de Golgi das células, infectadas para aquele das células sadias, Rothman conseguiu identificar os princi- pais componentes celulares necessérios para essa transferéncia. Pde ainda isolar um grupo espectfco de vesiculas (peque- nas estruturas citculares envolvidas por uma membrana) que funcionam como vagées para o transporte da proteina en- treos compartimentos. Schekman adotou estratégia diferente Decidiv usar a levedura empregada na produgao de paes e cerveja, A introdugao de mutagées ao acaso no genoma desse mmicro-organismo, de facil manipulagéo genética, permitiu isolar leveduras com defeitos tanto na secrecao de proteinas quanto em organelas da ‘via secretora’ identificada por Palade, Algumas levedu- ras, por exemplo, tinham o retfculo endo- plasmatico alargado, sugerindo um defei- to-na saida de material dessa organela, enquanto outras apresentavam um aci- mulo anormal de vesiculas no citoplasma, sugerindo defeitos na fusdo dessas vesi- culas com a organela de destino, em uma etapa posterior da via O estudo dessas leveduras mutantes permitiu descobrir23 genes envolvidos nos processos de transporte vesicular—Schek- man os chamou ‘genes de secregao’. Al- guns desses genes coditicavam proteinas correspondentes as descobertas por Roth- man, revelando a surpreendente conser- vagao das maquinarias de transporte ve- sicular em organismos tao distintos como animaisefungos, Sidhof dedicou-se a um aspecto espe- cifico do transporte intracelular: libera- \ FISIOLOG OU MEDICINA James Edward Rothman * Nasceu em Haverhill (EUA), em 1950. Graduou-se (fisica) na Universidade Yale, em 1971, e completou o doutorado (quimica biolégica) na Univer- sidade Harvard, em 1976. Lecionou na Universidade de Princeton, liderou um laboratério no Centro Sloan-Ket- ‘tering de Cancer (Nova York) e, em 2003, tornou-se Professor na Universidade Colimbia, onde ainda atua. ‘ene ner Randy Wayne Schekman © Nasceu em Saint Paul (EUA), ‘em 1948. Bidlogo molecular (1971) pela Universidade da (Califérnia (Los Angeles) e doutor (1975) pela Universida- de Stanford. Foi editor-chefe do periddico Proceedings of the National Academy of Sciences. hoje edita a revis- ‘ta eletrénica elife. E, desde 1991, pesquisador da Uni- versidade da Califérnia (Berkeley) e do Instituto Médico Howard Hughes. evo an arma ‘Thomas Christian Siidhof © Nasceu em Géttingen (Alema- nha), em 1955. Estudou medicina nas Universidades RWTH ‘Aachen, Harvard e de Géttingen, e obteve o doutorado no Instituto Max Planck de Quimica Biofisica, em 1982. Foi para os EUA em 1983. Foi pesquisadar do Instituto Méd ‘co Howard Hughes e, desde 2008, leciona na Universida- de Stanford. cdo regulada de neurotransmissores por vesiculas especializadas (sindpticas) em neurénios ~ mecanismo essencial para 0 funcionamento adequado do cérebro. Ele identificou proteinas que controlam a fusdo dessas vesiculas com a membrana plas- matica dos neurdnios, regulando o local ¢ momento que ela deve acontecer. Desco- briu, por exemplo, como o aumento do Céleio intracelular dispara a fusdo, atuan- do como um sinal que informa ao neur- noo momento certo de iberar neuratrans- missores e estimular outros neurénios. Juntas, as descobertas dos trés ga- ‘thadores tiveram um impacto sem prece- dentes no entendimento de como células eucariéticas controlam o transporte de biomoléculas para locais precisos dentro e fora da célula. Essas descobertas suscita- ram novas questées e tém ajudada a en- tender o funcionamento de processos im- portantes, desde 0 armazenamento de nu- trientes nas sementes de plantas ea libe- racdo controlaca de insulina pelas células do pancreas até como o HIV usa células hhumanas para fabricar novos virus. O sucesso desses trabalhos também ‘os ensina uma ligdo: a importéncia de estimular a ciéncia biomédica basica, cujos resultados ndo vislumbram a cura imediata de doengas ou a geragdo de um produto de apelo comercial, mas, sim, 0 entendimento dos mecanismos que go- vernam 0 funcionamento de eélulas e or- anismos, bem como suas interacdes com ‘o meio que os rodeia, LUIS LAMBERTI PINTO DA SILVA DEPARTAMENTO DE BIOLOGIA CELULAR, FACULDADE DE MEDICINA DE RIBEIRRO PRETO, LUNVERSIOADE DE Sko PAULO CHENCIAHOJE| 310 DEZEWBRO 2013113

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