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Segurança Pública: Governo

decreta intervenção federal no


estado do Rio de Janeiro
Por Carolina Cunha, da Novelo Comunicação
27/02/2018 14h42

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Danilo Verpa/Folhapress

O presidente Michel Temer assinou no dia 16 de fevereiro, um decreto para realizar


uma intervenção federal no estado do Rio de Janeiro. A medida também foi
aprovada pela Câmara dos Deputados e pelo Senado tem como objetivo “pôr termo
a um grave comprometimento da ordem pública no Estado”.

A decisão foi tomada em meio a uma onda de escalada da violência na capital


carioca. “O crime organizado praticamente tomou o controle da cidade”, defendeu
Temer.

Segundo ele, o problema ameaça a tranquilidade de toda a população. “As polícias


e as Forças Armadas estarão nas ruas, nas avenidas, nas comunidades e, unidas,
combaterão, enfrentarão e vencerão naturalmente, aqueles que sequestram do
povo as nossas cidades”, finalizou o presidente.

O decreto legislativo tem validade imediata e autoriza a União a intervir diretamente


no Rio de Janeiro até o dia 31 de dezembro de 2018.  Durante esse período, as
Forças Armadas podem realizar uma série de ações para coibir o crime organizado
e promover a segurança na capital, na Região Metropolitana e no interior do Estado
do Rio. 

O general do Exército Walter Braga Netto, do Comando Militar do Leste, foi


nomeado como interventor do estado para assumir o controle da Segurança
Pública. Sua função será administrativa e ele terá plenos poderes sobre as polícias
Militar, Civil e Bombeiros. O militar não poderá intervir em questões que não
estejam ligadas à segurança.

O que diz a Constituição Federal

O que é uma intervenção federal? Essa é uma medida do governo federal para
debelar momentos de crises institucionais. O instrumento está previsto no artigo 34
da Constituição Federal e prevê um poder excepcional para a União intervir nos
Estados ou no Distrito Federal como uma medida emergencial.
A intervenção só se justifica em casos graves, pois se configura como uma violação
política e administrativa na autonomia dos estados. Ela é considerada uma medida
extrema, porém menos grave do que o Estado de Defesa e o Estado de Sítio.

A Constituição prevê o uso do instrumento de intervenção nas seguintes situações:


para manter a integridade nacional, para repelir invasão estrangeira ou de uma
unidade federativa em outra, para pôr termo a um grave comprometimento da
ordem pública (caso do Rio) e para reorganizar as finanças de uma cidade.

Isso quer dizer que o Rio teve uma intervenção militar? Há quem comparasse a
operação no Rio com o golpe militar de 1964. Mas a origem da recente intervenção
é de um governo civil. Neste caso, a União passa a ser responsável por todos os
atos feitos pelo interventor designado, um general do Exército, que terá poderes
dentro da segurança pública. "Não há nenhum risco à democracia quando [o ato] se
dá a partir da Constituição. Pelo contrário: nós temos o reforço da democracia",
afirmou o ministro da Defesa, Raul Jungmann.

O decreto de Temer é a primeira intervenção na área de segurança que ocorre no


Brasil desde 1988, com a vigência da atual Constituição Federal. Antes disso, o
governo militar de Castelo Branco interveio no estado de Goiás (1964) e Alagoas
(1966), ações que tiveram o aval dos parlamentares. 

Apesar do ineditismo da intervenção federal, a presença das Forças Armadas no


Rio de Janeiro não é uma novidade. A cidade já foi ocupada militarmente por tropas
federais diversas vezes. Desde 1992, o Rio já foi alvo de 36 operações das Forças
Armadas.

Como consequência da Intervenção, o decreto terá impacto na tramitação de


propostas de emenda à Constituição (PECs). A lei diz que não pode haver alteração
da constituição enquanto durar a intervenção federal. Esse mecanismo serve para
coibir alterações da Carta Magna em períodos de anormalidade ou instabilidade no
país. 

Aumento da criminalidade no Rio de Janeiro

Nos últimos meses, os cariocas presenciaram um aumento nos índices de


criminalidade.  A sensação de insegurança é grande. De janeiro de 2017 a janeiro
de 2018, o número de tiroteios na região metropolitana aumentou em 117%. Em
2017, o número de mortes violentas no estado chega a 6.731, um aumento de 44%
em apenas cinco anos.

Principal destino turístico do país, o Rio foi criticado pelo carnaval deste ano,
marcado pela violência. Foram registrados arrastões, saques e assaltos em
importantes pontos da cidade. Segundo o governo, o evento foi o estopim para a
decisão de realizar a intervenção, que já estava sendo planejada há alguns meses.

O maior problema da cidade é a disputa das facções pelo controle de drogas.


Grupos armados como o Comando Vermelho e o Terceiro Comando da Capital
possuem alto poder de fogo e realizam uma verdadeira guerra do tráfico. Existe
ainda uma expansão da atuação de milícias pelo controle de territórios.

A recente crise fiscal agravou o cenário. O Rio de Janeiro viveu um colapso fiscal
em 2017, o que acarretou na precarização dos serviços públicos em geral. Policiais
trabalham com salários atrasados, equipes desfalcadas, equipamento obsoleto e
carros em más condições.

Os problemas também foram amplificados pela crise política. O estado foi vítima de
um esquema de corrupção que derrubou a cúpula do governo local e levou para o
presídio o ex-governador Sérgio Cabral e o deputado estadual Jorge Picciani,
presos pela Operação Lava Jato.

Outro sinal de alerta é o fracasso da política de Unidades de Polícia Pacificadora


(UPPs), que buscava retomar o controle de território em comunidades dominadas
pelo tráfico.  Em outubro de 2017, José Beltrame, então secretário de Segurança do
Rio e implementador do projeto, pediu demissão do cargo após afirmar que os
esforços não eram suficientes para resolver a situação da criminalidade.

A intervenção resolveria o problema da criminalidade?

Especialistas acreditam que a intervenção possa ter algum resultado prático, mas
sem reforma estrutural, pode ser apenas uma medida paliativa. Para atacar a raiz
do problema, seriam necessárias ações de longo prazo como aumentar o efetivo de
policiais, aprimorar o trabalho de investigação e a ocupação das áreas de baixa
renda com serviços públicos e ações sociais.

A intervenção federal também é criticada pela curta duração do processo, de


apenas dez meses. Para o diretor-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança,
Renato Sérgio de Lima, o decreto é "igual a um anestésico para ajudar a limpar a
ferida, mas a ferida não será cicatrizada com essa medida".  Existe ainda o temor
de que acuada, a criminalidade possa migrar progressivamente para regiões
vizinhas, como a Baixada Fluminense e os estados de Minas Gerais e Espírito
Santo.

"Essa intervenção atua, como não pode deixar de ser, nas consequências, e não
nas causas desse caos. É, portanto, uma ação paliativa. Além da intervenção
federal, é fundamental reformar as polícias, rever conceitos e metodologias.
Segurança Pública 'boa e barata' não existe", acredita o inspetor Francisco Chao,
ex-presidente do Sindicato dos Policiais Civis do RJ.

Os partidos de oposição a Temer acreditam que a intervenção seja uma manobra


política em ano eleitoral. A ação seria eficiente para aumentar a popularidade do
presidente e angariar a simpatia de um determinado eleitorado que pede medidas
mais rígidas para a segurança.

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso, também


acredita que a criminalidade no Rio de Janeiro não será resolvida com uma
intervenção federal. “Você precisa de inteligência, planejamento e ocupação social
dos espaços que o Estado perdeu. Portanto, se alguém imaginar que uma
intervenção de três, seis ou nove meses pode resolver o problema do Rio, está
totalmente enganado. O problema do Rio tem que ser um programa patriótico e
suprapartidário de enfrentamento do que hoje é o total descontrole na segurança
pública”. 

Segundo o Instituto Sou da Paz, é necessário um investimento na boa gestão da


polícia e no sistema como um todo. “Apesar de o governo federal seguir insistindo
na estratégia do uso das Forças Armadas para combater o crime, acreditamos que
a forma mais eficaz de combater a metástase da violência continua sendo a
promoção da boa gestão, robusta e prioritária, de políticas públicas de segurança e
do sistema de justiça criminal. Enquanto o fuzil for a única resposta do governo
federal para os problemas de segurança pública, que vão muito além do Rio de
Janeiro, dificilmente o Brasil verá solução para o mal do crime e da violência”, diz a
nota.

O perigo da violação de Direitos Humanos

O cerco a comunidades levanta o medo de que as operações cometam abusos e


violência contra a população, viole direitos garantidos pela Constituição e infrinja a
legislação estadual.
Após o anúncio da intervenção federal, diversas instituições ligadas a direitos se
pronunciaram.  O Conselho de Direitos Humanos, entidade ligada ao Ministério dos
Direitos Humanos, o decreto "concede uma espécie de 'licença para matar' aos
militares”.

A Procuradoria-Geral da República (PGR) cobrou um detalhamento do decreto


presidencial e reprova a possibilidade de flexibilização de direitos, como mandados
de busca e apreensão sem especificação de destinatários, afirmando que se trata
de ilegalidade.

O Ministério Público também questionou se as operações seguirão as leis.


"Mandados em branco, conferindo salvo conduto para prender, apreender e
ingressar em domicílios atentam contra inúmeras garantias individuais, tais como a
proibição de violação da intimidade, do domicílio, bem como do dever de
fundamentação das decisões judicial", diz a nota da Procuradoria Federal dos
Direitos do Cidadão e a Câmara Criminal do MPF.

Para acompanhar as ações militares no Rio, o Ministério dos Direitos Humanos


criou o Observatório de Direitos Humanos da Intervenção Federal na Segurança
Pública do Estado do Rio de Janeiro (ObservaRIO). O objetivo do observatório é
"acompanhar as ações e medidas executadas durante a intervenção federal”.

Por Carolina Cunha, da Novelo Comunicação

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