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[uJ Estrategia CONCURSOS Aula 02 Criminologia p/ Policia Federal 2017 (Delegado) Professor: Renan Araujo cal Auta 02 CRIMINOLOGIA, POLITICA CRIMINAL E DIREITO PENAL. MODELOs TEORICOS DA CRIMINOLOGIA. TEORIAS SOCIOLOGICAS, PREVENGAO DA INFRAGAO PENAL NO. ESTADO DEMOCRATICO DE DIREITO. MODELOS DE REAGAO AO CRIME. inologia cienti Teorias bioantropolégicas, psicodinamicas e psicopsicolégicas. © homem delinquente 0s 1.3 Teorias soci 134 Criminologia do consenso. 13.4.4 Escola de Chicago. 1.3.1.2 Teoria da associacéo diferencial (aprendizagem social ou social learning)... 10 13.1.3 Teoria das subculturas delinquentes..... 11 1.3.1.4 Teoria da anomia .... eevee at 1.3.2 Criminologia do conflito ...s.sssssssssssssssssssssssesssssssssssnsssssssssessesesacsesestecesnecesenenne 12. 1.3.2.1 Teoria do etiquetamento ou labeling approach 12 1.3.2.2 Garantismo, minimalismo e abolicionismo penal .. 14 1.4 Aprevencio penal no Estado Democratico de Direito. 16 14.4 Prevencdo primaria ... 17 1.4.2 Prevengio secundéria 18 14.3 Prevencdo terciéria. 18 14.3.1 Teoria absoluta da pena .. 18 1.4.3.2 Teoria relativa e sua finalidade preventiva .. 18 1.4.3.3 Teoria Mista (unfcadora ou ecldtica ou unitria) e sua dupla finalidade 19 1.4.4 Programas de prevengao de infragdes penais..... 19 2 CRIMINOLOGIA E POLITICA CRIMINAL. CRIMINOLOGIA E CIENCIAS CRIMINAIS 22 2.1 MODELOS DE REACAO AO CRIME. 22 214 Classico ou dissuasério. 23 2.41.2 Ressocializador. 2.13 Restaurador ... 3 RESUMO 4 EXERCICIOS DA AULA. 5 EXERCICIOS COMENTADOS. 6 GABARITO .. | Prof. Renan Ara www.estrategiaconcursos.com.br ide 59 Ola, meus amigos! Hoje, finalizando nosso pequeno curso, vamos falar sobre diversos temas importantes da criminologi Modelos teéricos, teorias sociolégicas, minimalismo penal, abo mo penal, etc. Prof. Renan Araujo ESL £4. eee Prof. Renan Araujo www.estrategiaconcursos.com.br 2de 59 1 MODELOS TEORICOS 1.1 Criminologia cientifica e seus modelos teéricos A criminologia enquanto ciéncia sé surge no final do século XIX, e apesar de romper com o modelo criminolégico pré-cientifico, se valeu de algumas contribuigdes destas “pseudociéncias” para seu desenvolvimento. Pré-cientificamente podemos citar a: DEMONOLOGIA Explica o crime por meio da exist&ncia do deménio. Focava muito nos doentes mentais, pois eram confundidos com possuidos e endemoniados FISIONOMIA Foi a pseudociéncia que mais se aproximou da criminologia positivista (ou positivismo criminolégico) do final do século XIX. Busca explicar o crime com base na aparéncia do individuo, na sua fisionomia, fazendo uma ligag&o entre o fisico e 0 psiquico. Por meio das caracteristicas fisicas seria possivel determinar se 0 individuo era “bom” ou “mal” e, portanto, menos ou mais propenso pratica de delitos. Tem em DELLA PORTA 0 seu maior expoente (embora o precursor mais rudimentar tenha sido SAO JERONIMO). Curiosamente, a repercussao de tal pseudociéncia foi téo grande que chegou-se até mesmo ao conhecido “EDITO DE VALERIO". FRENOLOGIA Os frenélogos se valem da contribuigéo da fisionomia para desenvolver sua teoria. Contudo, para esta teoria, o comportamento delitivo poderia ser explicado por meio da andlise do cranio, especificamente. Foi fundada e difundida por FRANCOIS JOSEPH GALL. Para GALL 0 formato do cranio ird influenciar a atividade cerebral, podendo, pela andlise externa da caixa craniana, saber quais faculdades cerebrais séo mais ou menos desenvolvidas e, assim, determinar as caracteristicas psicolégicas da’ pessoa (agressividade, coragem, etc.), 0 que culmina na possibilidade de afirmar a propensdo a pratica de delitos. PSIQUIATRIA Surge com o francés PHILIPPE PINEL. Sua grande contribuicéo foi a diferenciacio entre criminoso e enfermo mental * “Quando se tem d intre dois presumidos culpados, condena-se o mais feio” (VIANA, Eduardo, CRIMINOLOGIA, 20 ed. 2014. Ed. Juspodivm. Pag. 24.) Prof. Renan Araujo www.estrategiaconcursos.com.br 3de 59 Tal diferenciagéo possibilitou o desenvolvimento da ideia de imputabilidade penal e de criagéo de estabelecimentos distintos para cada um (doente mental e criminoso). Ultrapassada esta fase pré-cientifica, a criminologia passa a tentar explicar o fenémeno do crime e 0 comportamento criminal de forma mais cientifica, utilizando-se do empirismo como ponto de partida. Seus PRINCIPAIS MODELOS TEORICOS FORAM: CRIMINOLOGIA Tinham como ponto central de seu trabalho o LIVRE CLASSICA E| ARBITRIO. Para este modelo, o homem é LIVRE para NEOCLASSICA fazer suas escolhas, inclusive para cometer delitos. Nega completamente a influéncia de fatores externos, como a condig&o econémico-social, etc. CRIMINOLOGIA Rompe com a ideia de que 0 homem “delinque” POSITIVISTA porque quer delinquir. Para este modelo teérico, compreender o fenémeno criminal é uma tarefa que demanda a anélise de fatores causais-explicativos, ou seja, deve-se buscar as causas do delito (0 que se pode chamar de “paradigma etiolégico”). Contudo, as “causas” do delito poderiam se de diversas ordens (biolégicas, psicolégicas, sociais, etc.). SOCIOLOGIA Enquanto a criminologia positivista vé o crime como CRIMINAL uma consequéncia de determinados fatores (diversos), a Sociologia criminal rompe com a ideia de “causas do crime” e parte para a ideia da teoria da criminalizagéo. Com uma forte influéncia marxista, tal modelo entende que n&o importa tanto a “causa” de determinado comportamento criminoso, e mais o “porqué” de se considerar criminoso determinado comportamento, ou seja, quais os interesses esto por tras da criminalizacao de determinadas condutas. A teoria da REACAO SOCIAL € 0 principal marco deste modelo. Também & conhecida como teoria da rotulagdo social ou do etiquetamento (labelling proach). LUIZ FLAVIO GOMES e ANTONIO GARCIA-PABLOS DE MOLINA ainda acrescentam um QUARTO modelo teérico, que seria representado por diversas correntes criminolégicas contemporaneas (como a teoria do curso da vida, @ teoria das trajetérias criminais, etc.), que tentam explicar o fenémeno delituoso Prof. Renan Araujo www.estrategiaconcursos.com.br 4 de 59 por meio de uma andlise dinamica dos padrées de comportamento do individuo ao longo da vida (e suas diversas variaveis). 1.2 Teorias bioantropolégicas, psicodinamicas e psicopsicolégicas. O homem delinquente Embora na atualidade a classificagéo dos criminosos em determinados “grupos”, de acordo com suas caracteristicas biolégicas, psicolégicas, etc., tenha perdido bastante de sua relevancia, ainda gozam de algum prestigio em determinados setores. Vamos estudar as principais classificagdes do “homem delinquente”: Classificagao de HILARIO VEIGA DE CARVALHO BIOCRIMINOSOS PUROS|Sao criminosos apenas por fatores (pseudocriminosos) biolégicos, de forma que se nega a estes o livre arbitrio (6 0 caso dos doentes mentais) BIOCRIMINOSOS Possuem uma tendéncia biolégica ao delito, PREPONDERANTES e acabam por delinquir ao ceder a estimulos (criminosos de dificil | externos. Aqui ha alguma dose de livre correcao) arbitrio BIOMESOCRIMINOSOS Sofrem influéncias de fatores bioldgicos e (criminosos de — correcdo| externos, néo sendo possivel definir qual possivel) destes fatores prepondera. A reincidéncia, aqui, é ocasional. MESOCRIMINOSOS Possuem personalidade fraca, sofrendo (criminosos de — correcao| grande influéncia do meio, Sao os classicos provavel ou esperada) ‘Maria vai com as outras”, nas palavras do préprio mestre HILARIO. MESOCRIMINOSOS —_PUROS | Sao considerados “vitimas” do meio. Agem (criminosos ambientais) de forma antissocial apenas em razéio de fatores externos. E 0 caso do holandés que vem ao Brasil e acende um cigarro de maconha. Em seu seio social tal conduta é permitida. No Brasil, trata-se de conduta criminosa (posse de droga para uso proprio). Para esta classificag&o os ‘PUROS” (mesocriminosos puros e biocriminosos puros) sao considerados “pseudocriminosos”, pois n&o possuem todos os elementos necessérios ao delito. Prof. Renan Araujo www.estrategiaconcursos.com.br Sde59 Em relagdo aos Ultimos faltaria a consciéncia da ilicitude, nao possuindo a intengéio de violar a Lei. Em relacéio aos primeiros faltaria a possibilidade de autodeterminacao. Classificacao sequndo LOMBROSO, FERRI e GAROFALO ‘ago de LOMBROSO NATOS Um degenerado, por fatores biolégicos (cabeca pequena ou deformada, sobrancelhas salientes, etc.). Um selvagem sem corregio. Loucos Perverso, louco moral, alienado mental. Deve permanecer fora da sociedade, segregado em manicémio ou similar. DE OCASIAO Possuem predisposicfo0 —hereditdria. e sao influenciados pelo meio, ou seja, sao criminosos em azo das circunsténcias ("A ocasiéo faz o ladrao”. POR PAIXAO S80 inconsequentes, irrefletidos, _impulsivos, exaltados. acgéo de ENRICO FERRI Possui as mesmas caracteristicas do criminoso nato de LOMBROSO. Louco Inclui, além dos alienados completos, os semiloucos (ou fronteirigos). OCASIONAL O individuo que ndo se dedica ao crime habitualmente, mas acaba por cometer delitos de forma ocasional, inclusive em raz&o das circunstancias momentéaneas. Pode ser associado ao criminoso “de ocasiao” de LOMBROSO. HABITUAL Faz do crime seu meio de vida. Poderia comegar como ocasional € “se desenvolver” para o criminoso habitual. PASSIONAL Semelhante ao criminoso “por paixao” de LOMBROSO. E impetuoso, inconsequente, etc. Classificagdo de GAROFALO ASSASSINOS So instintivos, egoistas, aproximando-se dos seres selvagens e das criancas. Prof. Renan Araujo www.estrategiaconcursos.com.br 6 de 59 ENERGICOS OU | Possuem senso moral, mas Ihes falta compaixdo. VIOLENTOS LADRGES _ OU | Falta a estes criminosos a ideia de honestidade, de NEURASTENICOS probidade, embora néo Ihes falte o senso moral. Percebam que as classificagées destes trés expoentes do POSITIVISMO criminolégico séo bem semelhantes. As classificagdes de FERRI e LOMBROSO, ent&o, sao praticamente idénticas. Classificag’o de ODON RAMOS MARANHAO. OCASIONAL Sua personalidade é normal, mas em decorréncia de algum fator poderoso (externo ou interno) ha um rompimento transitério dos mecanismos de contengo impulsos. SINTOMATICO Seus atos est&o mais vinculados a predisposicéo criminosa decorrente de uma doenga do que a existéncia de um fato desencadeante. CARACTEROLOGICO —_| A delinquéncia, aqui, deriva de falha na formacao do caréter, havendo pouca ou nenhuma influéncia de um fator desencadeante. Classificacgéo para GUIDO ARTURO PALOMBA IMPETUOSOS Seus atos so frutos de “amnésia momentanea do senso critico”. Sao similares aos criminosos passionais de FERRI. OCASIONAIS N&o se dedicam 4 atividade criminosa, cometendo crimes esporadicamente, em razéio’ de fatores internos e externos. HABITUAIS Segundo o professor, séo “incapazes de readquirir uma existéncia honesta”. Fazem do crime seu meio de vida. E 0 chamado “criminosos contumaz”. FRONTEIRICOS Apresentam deformidades permanentes em seu senso moral, com distuirbios de afeto e sensibilidade. Tais alteragdes psiquicas os conduzem ao crime. LOUCOS CRIMINOSOS | Dois tipos: (i) Agem mediante um processo lento e reflexivo; (ii) Agem por impulso. Prof. Renan Araujo www.estrategiaconcursos.com.br 7059 ‘Como vocés podem perceber, a bem da verdade, existem diversas classificagées que acabam por dizer, se ndo a mesma coisa, quase a mesma coisa, com pequenas varidveis. Assim, podemos resumir as teorias BIOANTROPOLOGICAS como aquelas que buscam explicar o criminoso com base em fatores biolégicos. Para esta teoria, existe o “criminoso” e “nao criminoso”. As teorias PSICODINAMICAS também entendem haver o “criminoso” e o “no criminoso”, mas ao invés de considerar tal distingéo com base em fatores biolégicos, enxergam a diferenca entre eles como decorréncia de falhas no processo de aprendizado e socializacao do individuo. Por fim, as teorias PSICOSOCIOLOGICAS verificam a existéncia de predominancia dos fatores sociais sobre o fenémeno do crime, em detrimento de fatores ligados a personalidade do criminoso. 1.3 Teorias sociolégicas Sociedade criminégena é, por definigdo, uma sociedade que PRODUZ CRIME. Essa ideia de que a sociedade produz o criminoso e, por consequéncia, o crime, possibilitou o surgimento de diversas teorias calcadas na ideia de que 0 centro da analise do fenémeno delitivo nado é o criminoso, e sim a sociedade (embora aquele também merega atencao). Assim, desloca-se o centro do estudo para o meio (a sociedade), criando-se 0 que se convencionou chamar de SOCIOLOGIA CRIMINAL. Dentro deste quadro sociolégico, dois grandes grupos tedricos se desenvolveram: A TEORIA DO CONSENSO e a TEORIA DO CONFLITO Ateoria do consenso ou “criminologia do consenso” parte da premissa de que a sociedade é formada por uma séria de valores fundamentais consensuais, que devem ser protegidos e promovidos por todos. Assim, 0 Direito Penal nada mais seria que uma ferramenta para a defesa destes valores comuns a todos os individuos. Inserem-se nesta ideia as teorias desenvolvidas pela ESCOLA DE CHICAGO, ANOMIA E ASSOCIAGAO DIFERENCIAL. A ccriminologia do conflito, por sua vez, verifica a sociedade ndo como um todo coeso e harmGnico, fundado em valores comuns a todos os individuos, e sim um campo de batalha entre classe dominante e dominada, Partindo deste vies matxista, as teorias decorrentes desta ideia vao estabelecer que 0 Direito Penal nada mais é que uma ferramenta a servico da classe dominante, de forma a garantir a manutencao do status quo, coagindo a classe dominada a “andar na linha’. Para tanto, o Direito Penal seria absolutamente seletivo na escolha das condutas que seriam criminalizadas, optando por uma criminalizag’o priméria voltada as condutas geralmente praticadas pelos _individuos pertencentes a classe dominada (furto seria mais grave que condutas lesivas 4 ordem econémica, por exemplo). Prof. Renan Araujo www.estrategiaconcursos.com.br Bde 59 Feita essa distincdo, vamos a anélise das principals teorias relativas a sociologia criminal. 1.3.1 Criminologia do consenso 1.3.1.1 Escola de Chicago A Escola de CHICAGO e sua explicagao ECOLOGICA do crime talvez seja a principal escola criminolégica moderna. PARK foi o principal expoente desta Escola. Este autor analisou o crescimento populacional na cidade de Chicago no comeco do século XX e, com suas observacées, a Escola de Chicago chegou a conclus&o de que o fenémeno delitivo estava relacionado diretamente ao conglomerado urbano e suas caracteristicas (multiculturais, étnicas, etc.). Assim, a CIDADE (mais especificamente do que a “sociedade” genericamente considerada) seria o foco principal da atengdo da criminologia. Para os teéricos desta Escola, a CIDADE, ou seja, 0 meio urbano produz a criminalidade (crescimento populacional, crescimento desordenado, etc.). A Escola de Chicago também chegou & conclusao de que a delinquéncia era mais concentrada em determinadas areas, e tal concentracdo seria fruto, dentre outras coisas, da desorganizacao social destas areas. Sao oriundas da Escola de Chicago as teorias ECOLOGICA, ESPACIAL, DAS JANELAS QUEBRADAS e DA TOLERANCIA ZERO. Vejamos sinteticamente cada uma delas: ECOLOGICA __ | Para esta teoria o progresso leva a criminalidade aos (DESORGANIZAGAO | grandes centros urbanos. Propde que a estabilidade e a SOCIAL) integragdo contribuem para a ordem social, enquanto a desordem social e a auséncia de integragao entre os individuos contribuem para indices mais elevados de criminalidade. A deteriorag30 de nticleos primérios (familia, igreja, etc.), a superficializag3o das relagdes sociais, tudo isso cria um meio desorganizado e potencialmente crimindgeno”. ESPACIAL Defendia a reestruturag&o arquiteténica das cidades como forma de prevencéio do delito, inclusive como forma de permitir maior controle sobre as pessoas. Teve em OSCAR NEWMAN seu maior expoente. JANELAS Tem suas raizes na obra dos estadunidenses JAMES QUEBRADAS WILSON e GEORGE KELLING. Para esta teoria a 2 GARCIA -PABLOS DE MOLINA, Antonio. GOMES, Lulz Flavio. Criminologia. Ed. Revista dos Tribunais. 8° ed. P. 344, Prof. Renan Araujo www.estrategiaconcursos.com.br side 59 represséo dos menores delitos é ABSOLUTAMENTE INDISPENSAVEL para inibir a pratica dos delitos mais graves. Tem este nome em razdo de um experimento de PHILIP ZIMBARDO. 0 citado psicdlogo deixou um carro estacionado na rua em um bairro de classe alta da cidade de Palo Alto, Califérnia. Durante a primeira semana, © carro permaneceu intacto. Apés, o pesquisador quebrou uma das janelas do veiculo eo deixou mais uma semana parado na rua. Ao final desta segunda semana o veiculo foi completamente destruido e furtado por vandalos. Dai a ideia de que um “pequeno” dano a sociedade, se néo consertado, gera a sensacéo de que “tudo € permitido”, estimulando a pratica de delitos. TOLERANCIA ZERO | A teoria’da tolerancia zero (neorretribucionismo) decorre naturalmente da ideia defendida pela teoria das janelas quebradas. Trata-se de uma_ politica criminal de repressdo a toda e qualquer conduta desviante, por menor que seja, como forma de reafirmar 0 poder do Estado e a necessidade de respeito @ Lei. Surgiu em Nova York, no comeco dos anos 90. Trata-se de decorréncia do como “Movimento Lei e Ordem” (Law and Order), que pugna pela expansio do Direito Penal, um seja, um incremento da resposta formal do Estado. 1.3.1.2 Teoria da associag&o diferencial (aprendizagem social ou social learning) Difundida por Edwin Sutherland, tendo como base as ideias de Gabriel TARDE (e suas “Leis da Imitacao”). SUTHERLAND focou seus estudos sobre os crimes de colarinho Branco, nos Estados Unidos da América, mais especificamente em Chicago. Para Sutherland, as explicagées fornecidas pelas diversas teorias criminolégicas até entao no seriam capazes de responder de forma adequada a questao dos crimes de colarinho branco, jé que todas (ou quase todas) viam nas mazelas sociais (desorganizacao social, pobreza, etc.) a génese do crime, de forma que se distanciavam da realidade dos crimes de colarinho branco (White colar crimes). Para Sutherland, ninguém nasce criminoso, mas APRENDE a se tornar um, ou seja, o crime € mero resultado de um processo inadequado ou falho de socializagao do individuo. Segundo esta teoria o individuo se tornaria criminoso ao observar outras condutas criminosas e INTERAGIR com outras pessoas, notadamente aquelas que se dedicam ao delito. Prof. Renan Araujo www.estrategiaconcursos.com.br 10 de 59 Assim, a pessoa se tornaria delinquente por estar mais submetida a modelos de comportamento delitivo do que a modelos de comportamento néo delitivos. A cultura criminosa existe e, a depender do nivel de atuacéo do Estado em determinados grupos sociais, ela predomina em relagdo a cultura legal. 1.3.1.3 Teoria das subculturas delinquentes Tal teoria acaba defende que a conduta delitiva nao seria um reflexo negativo da desorganizaco social e outras mazelas da sociedade contempordnea. Para esta teoria todo agrupamento humano é dotado de subculturas, com uma filosofia de vida e regras préprias. Assim, a existéncia de subculturas corresponde, naturalmente, existéncia de valores distintos daqueles pregados pela cultura dominante. Desta forma, é possivel que algumas destas subculturas possuam valores que se contraponham aos valores da cultura dominante e, em razéo disso, 0 delito nao derivaria de uma predisposicao 4 violacao da Lei, e sim um mero reflexo destas diferencas culturais. 1.3.1.4 Teoria da anomia Denominada por alguns de “estrutural-funcionalista”, teve como principais expoentes ROBERT MERTON e TALCOTT PARSONS, que se valeu das ideias de DURKHEIN, para desenvolver sua teoria. Para esta teoria, o crime 6 um fenémeno “natural”, inerente a sociedade, de forma que seriam invalidas as ideias de criminoso como anormal, bem como as tentativas de explicar o crime com base em aspectos sociolégicos. DURKHEIM, talvez o principal nome desta teoria, entendia que o crime era algo “normal” na sociedade, pois uma sociedade sem crime seria absolutamente inviavel, e que patologia social nao seria a existéncia de crime, mas a sua auséncia. Para DURKHEIM, o crime era o fenémeno o social que permitia a reafirmacao da ordem social, pois toda vez que um crime era praticado surgia a possibilidade de reafirmacao e legitimacéo dos vinculos estruturais e estruturantes da sociedade. Tal Teoria no prega a desvinculaco entre crime e ambiente social, apenas entende que o crime € decorréncia natural do meio social, e néo uma anormalidade. Para esta teoria a sociedade impée objetivos e metas inalcangaveis paraam dos individuos (sucesso, poder, status), e como tais metas sido inatingiveis, a dissociagao entre os objetivos e os instrumentos para seu alcance geraria a ANOMIA, que seria uma situac&o de rentincia as normas sociais. Esta teoria elenca diversos modelos de adaptagéo do individuo & sociedade. Prof. Renan Araujo www.estrategiaconcursos.com.br Ai de 59 Primeiro temos 0 individuo que aceita as metas sociais e os meios @ sua disposicio. Depois temos 0 individuo que, ao perceber que os meios no sdo habeis & obtencdo das finalidades, continua aceitando as metas sociais, mas no os meios colocades a sua disposicao. Ou seja, aqui ele passa a buscar um “atalho” para alcangar as metas sociais. Outro modelo € 0 do ritualismo. 0 individuo renuncia as metas sociais, aos objetivos culturais, mas permanece apegado as normas da sociedade. Ha, também, 0 modelo evasivo (retraimento). Neste grupo se incluem os bébados habituais, mendigos, drogados crénicos, etc. Tais individuos se conformam e buscam mecanismos de fuga. Por fim, hd 0 modelo da rebelio. Aqui o individuo rejeita completamente as metas culturais e os meios sua disposicdo (institucionalmente falando). Este individuo passa a se dedicar a luta pela criac&o de novos paradigmas sociais, de uma nova ordem. 1.3.2 Criminologia do conflito 1.3.2.1 Teoria do etiquetamento ou /abeling approach No_seio da crim nolo critica au a TEORIA DO LABELING A teoria do etiquetamento vai dizer, basicamente, que o crime nao é um dado ontoldgico, ou seja, nao existem condutas que sdo, por sua prépria natureza, criminosas. © que existem s&o condutas, simplesmente, condutas. A qualidade de “criminosa” a uma conduta é o que revela o carater de “etiquetamento” do Direito Penal, ou seja, as condutas, em seu estado natural, néo sao criminosas, até que surge um dado novo, de cunho normativo, que Ihes confere tal “estigma”. Tal teoria tem, em grande parte, fundamento na ideia de “interacionismo simbélico”. A expresséio “interacéo simbélica” se refere aos processos de relacionamento interpessoal entre os individuos, de forma que a nogdo de crime surge da relagdo entre os individuos e da eleicdo dos valores que devem ser protegidos, ou seja, o rétulo de “crime” a uma conduta é dado pela sociedade, e ndo pela natureza. Isto posto, temos uma corrente criminolégica que sustenta que ndo se deve buscar entender por que alguém vira criminoso, mas porque a sociedade rotula tal conduta cromo criminosa (ou tal pessoa como criminosa). Prof. Renan Araujo www.estrategiaconcursos.com.br 12 de 59 EXEMPLO: A conduta criminosa prevista no art. 169, § Unico, II do CP, que estabelece o crime de “apropriag&o de coisa achada”. Vejamos a redagao: Art. 169 - Apropriar-se alguém de coisa alheia vinda ao seu poder por erro, caso fortuito ou forca da natureza: Pena - detenco, de um més a um ano, ou multa. Parégrafo Unico - Na mesma pena incorre: Ge) Apropriagao de coisa achada II - quem acha coisa alheia perdida e dela se apropria, total ou parcialmente, deixando de restitui-la 20 dono ou legitimo possuidor ou de entrega-la 4 autoridade competente, dentro no prazo de 15 (quinze) dias. Vejam, assim, que a conduta de “apropriar-se de coisa achada” nao é, por si s6, crime. Ela passa a ser crime quando a norma penal assim estabelece. Qual é a grande sacada desta teoria? Ela desmistifica a ideia de criminoso. Imagine que a ideia de criminoso esteja centrada sobre aquele que furta. Se amanhi surgir nova lei dizendo que furto nao é crime, aquela pessoa “deixaria de ser criminoso” e todos os estudos referentes ao crime e suas causas iriam por agua abaixo. Além disso, seguindo a linha da teoria do conflito, a teoria do etiquetamento entende que o Direito Penal procede a “rotulagéo” de condutas nao em razéio da persecucao de um fim legitimo e a defesa de valores comuns aos cidadéos, mas tendo como objetivo supremo a perpetuacéo da estrutura social dividida em classes. Desta forma, o Estado se vale do Direito Penal para rotular como “criminosas” as condutas praticadas com maior frequéncia pelos membros das classes mais baixas, bem como impée a elas penas mais severas. Com relag&o as condutas praticadas com maior frequéncia pelas classes altas, ou nao séo rotuladas como criminosas ou, quando 0 s&o, recebem penas brandas Para esta teoria, portanto, o crime nao seria um fenémeno social, mas um fenémeno normativo, ou seja, o Estado rotula como crime as condutas que ele pretende sejam consideradas como criminosas. Assim, nao existiria um crime “por natureza”, mas apenas “condutas”, que recebem o rétulo de criminosas de acordo com os interesses do Estado (que nem sempre protegem por igual os interesses dos mais diversos grupos sociais, tendendo a conferir maior protecdo aos bens de interesse da classe dominante).* Além disso, n&o seriam apenas as condutas (isoladamente consideradas) que influenciariam na resposta do Estado, mas também a pessoa do individuo e sua posigo social. Portanto, ao desviar o foco do desviante para o processo de criminalizag&o (e suas seletivas escolhas), a teoria da reacéo social coloca em xeque os > HASSEMER, Winfied. MUNOZ CONDE, Francisco, Introducién a la Criminologia y al Derecho Penal. Ed Tirant lo blanch. Valéncia, 1969, p. 18 Prof. Renan Araujo www.estrategiaconcursos.com.br 13 de 59 repressores, a0 argumento de que o desviante ¢ mero produto das instancias formais de controle na sociedade punitiva. Teve como p! ais expoentes GOFFMAN, LEMERT e BECKER. 1.3.2.2 Garantismo, minimalismo e abolicionismo penal © principal papel da criminologia num Estado Democratico de Direito é pugnar pelo desenvolvimento de um sistema juridico-penal que respeite os direitos e garantias fundamentais. Um modelo, portanto, GARANTISTA. FERRAJOLI’ foi o maior expoente do Garantismo penal, que para ele pode ser definido segundo trés prismas: + Modelo normativo Juridica Nas palavras de FERRAJOLI: “Segundo um primeiro significado, "garantismo" designa um modelo normativo de direito: precisamente, no que diz respeito ao direito penal, 0 modelo de "estrita legalidade, proprio do Estado de direito, que sob o plano epistemologico se caracteriza como um sistema cognitivo ou de poder minimo, sob o plano politico se caracteriza como uma técnica de tutela idénea a minimizar a violéncia e a maxima liberdade e, sob 0 plano juridico, como um sistema de vinculos impostos & func&o punitiva do Estado em garantia dos direitos dos cidados. E, consequentemente, "garantista" todo sistema penal que se conforma normativamente com tal modelo e que o satisfaz efetivamente. (a) Em um segundo significado, "garantismo" designa uma teoria juridica da "validade" e da “efetividade” como categorias distintas nao s6 entre si mas, também, pela “existéncia” ou "vigor" das normas. Neste sentido, a palavra garantismo exprime uma aproximacgo tedrica que mantém separados o "ser" e 0 "dever ser” no direito; e, alids, pe como questio tedrica central, a divergencia existente nos ordenamentos complexos entre modelos normativos (tendentemente garantistas) e praticas operacionais (tendentemente antigarantistas), interpretando-a com a antinomia - dentro de certos limites fisiolégica e fora destes patolégica - que subsiste entre validade (e ndo efetividade) dos primeiros e efetividade (e invalidade) das segundas. () Segundo um terceiro significado, por fim, "garantismo" designa uma filosofia politica que requer do direito e do Estado 0 onus da justificacso externa com base nos bens e nos interesses dos quais a tutela ou a garantia constituem a finalidade. Neste ultimo sentido 0 Garantismo (pressupée) a doutrina laica da separacdo entre direito moral, entre validade e justica, entre ponto de vista interno e ponto de vista externo na valoracao do ordenamento, ou mesmo entre o "ser" e 0 “dever ser” do direito, E * 0 Garantismo penal foi bem desenvolvido por FERRAJOLI, professor da Universidade de Camerino, na Italia. Para um aprofundamento maior: FERRAJOLI, LUIGI. Direito e razéo: teoria do garantismo penal. S80 Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002, p. 683 e seguintes, Prof. Renan Araujo www.estrategiaconcursos.com.br 14 de 59 equivale 3 assuncao, para os fins da legitimacdo e da perda da legitimacao ético- politica do direito e do Estado, do ponto de vista exclusivamente extemo. Um Estado democratico de Direito deve, portanto, buscar a adogao de um sistema penal garantista, ndo apenas no que tange as previsées normativas, mas também no que se refere ao efetivo respeito ao modelo normativamente adotado, a fim de que seja respeitado pelas instancias de controle (Policia, Judiciario, etc.). Assim, um modelo baseado no “Direito Penal do Inimigo”, por exemplo, nao pode, de forma alguma, ser admitido num Estado democratico de Direito. Mas 0 que seria 0 “Direito Penal do Inimigo”? Trata-se de um modelo que pressupée a existéncia de um Direito Penal que mitigue as garantias constitucionais aos criminosos considerados “contumazes”, ou seja, aqueles que fazem do crime seu meio de vida.” Assim, haveria um “Direito Penal do Cidadéo” (garantista), no qual séo observados os direitos e garantias fundamentais do acusado, e um “Direito Penal do Inimigo”, no qual estas garantias poderiam ser flexibilizadas ou afastadas, ja que n&o se estaria diante de alguém que merecesse qualquer considerac&o por parte do Estado. Este tipo de teoria é inadi el num Estado Democratico de Di O por, inicialmente, violar o principio da isonomia. Num segundo plano, nao menos importante, violaria, ainda, a ideia de que o Direito Penal pune as pessoas pelo que elas FAZEM e néo pelo que elas SAO. Da mesma forma, num Estado Democratico de Direito o ser humano é o centro, o fim tiltimo de toda e qualquer aco do Estado. Desta maneira, a pena deve ter por finalidade no apenas castigar o infrator, tampouco servir apenas a uma esperada “prevengSo especial”, mas também, e principalmente, ressocializar 0 infrator. © MINIMALISMO penal, por sua vez, prega a redugdo do raio de abrangéncia do Direito Penal, que deve ser reservado apenas aquelas condutas absolutamente incompativeis com a vida em sociedade, e apenas para a protecao dos bens juridicos mais valiosos (Direito Penal minimo). O minimalismo tem em FERRAJOLI e BARATTA dois de seus maiores expoentes. A logica do minimalismo é clara: se o Direito Penal é o instrumento mais invasivo de regulac3o social, s6 deve ser utilizado em Ultimo caso (ultima ratio). Além da redug&o do raio de abrangéncia do Direito Penal, o minimalismo prega, ainda a reduc&o da aplicacao da pena privativa de liberdade, que deve, sempre que possivel, ser substituida por sangdes alternativas. 5 Este termo fol desenvolvido de maneira aprofundada pelo professor alemio, da Universidade de Bonn, Giinther Jakobs. JAKOBS, Gunther. La normativizacién de la dogmética juridico-penal. Trad, Manuel Cancio Melié e Bernardo Feljé Sdnchez. 1. ed. Madrid: Ed. Thomson Civitas, 2003, p. 57 e seguintes. Prof. Renan Araujo www.estrategiaconcursos.com.br 15 de 59 Por fim, 0 ABOLICIONISMO PENAL prega a supressao do Sistema Penal, seja porque se nega legitimidade ético-politica a essa forma de controle social, desde seu surgimento, seja porque é visto, na pratica, como mais danoso que vantajoso. Os fundamentos do abolicionismo sao: Anomia do sistema penal - Apesar de existir, o Direito Penal nao consegue regular a vida em sociedade. Seletividade do sistema penal - O Direito penal nao tutela de maneira uniforme a vida em sociedade, mas seleciona, cuidadosamente, os destinatarios de sua atuagao. O Direito Penal estigmatiza o condenado - Ao invés de ressocializar 0 apenado, 0 Direito Penal funciona como uma marca negativa para aqueles que foram condenados, privando-os, perpetuamente, do retorno a vida social. 0 Direito Penal marginaliza a vitima - © Estado, por meio do Direito Penal, expropria o problema (que, a principio, se da entre dois individuos), castiga o infrator (quando consegue), mas nao se preocupa com a vitima. Ha, basicamente, duas grandes vertentes abolicionistas: Abolicionismo imediato - Defendido, dentre outros, por LOUCK HULSMAN, prega a imediata supressdo do Direito Penal. Isso ndo significa que esses doutrinadores pregam a auséncia total de controle formal do Estado sobre as condutas lesivas 4 sociedade, mas a substituigdo imediata do Direito Penal por outros métodos de solug&o de conflitos (composigao civil dos danos, etc. Abolicionismo mediato - Também conhecido come minimalismo radical, prega que 0 ideal seria a aboligéo do Direito Penal, mas a realidade impée a manutengao de tal sistema, jé que seria impossivel sua supresséo sem que houvesse um abalo social considerdvel, com possivel transmutag&o da violéncia estatal para a vinganca privada sem qualquer regulamentagdo estatal. Dentre os defensores do Abolicionismo mediato podemos citar THOMAS MATHIESEN como o principal expoente. 1.4 A prevencao penal no Estado Democratico de Direito © principal papel da criminologia num Estado Democratico de Direito é pugnar pelo desenvolvimento de um sistema juridico-penal que respeite os direitos e garantias fundamentais. Assim, um modelo criminolégico baseado no “Direito Penal do Inimigo”®, por exemplo, nao pode ser admitido, j4 que pressupée a existéncia de um 76 ° A teoria do Direito Penal do inimigo foi melhor desenvolvida por Ginther Jakobs. Para 0 autor, © Direito Penal deve separar as pessoas dos inimigos. As pessoas seriam aquelas que, Prof. Renan Araujo www.estrategiaconcursos.com.br 16 de 59 Direito Penal que mitigue as garantias constitucionais aos criminosos considerados “contumazes”, ou seja, aqueles que fazem do crime seu meio de vida. Assim, haveria um “Direito Penal do Cidad&o”, no qual séo observados os direitos e garantias fundamentais do acusado, e um “Direito Penal do Inimigo”, no qual estas garantias poderiam ser flexibilizadas ou afastadas, j4 que nao se estaria diante de alguém que merecesse qualquer consideracdo por parte do Estado. Este tipo de teoria é inadmissivel num Estado Democratico de Direito por, inicialmente, violar o principio da isonomia. Num segundo plano, néo menos importante, violaria, ainda, a ideia de que o Direito Penal pune as pessoas pelo que elas FAZEM e néo pelo que elas SAO. Da mesma forma, num Estado Democratico de Direito o ser humano é 0 centro, o fim ultimo de toda e qualquer acéo do Estado. Desta maneira, a pena deve ter por finalidade no apenas castigar o infrator, tampouco servir apenas a uma esperada “prevenco especial”, mas também, e principalmente, ressocializar 0 infrator. Mais especificamente no que tange a prevengdo, podemos estabelecer a prevengao do delito, no Estado Democratico de Direito, como: + MEDIDAS DIRETAS DE PREVENGAO - Atuam diretamente sobre 0 delito, como a pena, a tipificag3o de condutas, etc. + MEDIDAS INDIRETAS DE PREVENGAO DE DELITOS - Atuam nas causas da criminalidade (melhorias na condicéo de vida da populacdo, educacao, satide, emprego, moradia, etc.) Por outra classificag&o, podemos ter a prevenc&o nos seguintes moldes: + Prevengdo primaria + Prevengao secundaria + Prevengao terciaria Vejamos cada uma delas: 1.4.1 Prevencao primaria Programas cuja finalidade é atacar a causa da criminalidade, ou seja, a origem do problema (desigualdade social, pobreza, desemprego, etc.). Trata-se, eventualmente, cometeram algum delito, mas que nao se dedicam a atividades criminosas. Para estes, o Direito Penal preservaria toda o sistema de garantias processuais. De outro lado, aqueles que praticam crimes de forma reiterada perderiam a condicéo de “pessoa”, sendo considerados inimigos da sociedade e, portanto, estaria autorizada uma flexibilizaco no sistema de garantias, (JAKOBS, Ginnther. La normativizacién de la dogmitica juridico-penal. Trad. Manuel Cancio Melié e Bernardo Feljéo Sanchez. Ed. Thomson civitas, primera edicién. Madrid, 2003, p. 57-59) Prof. Renan Araujo www.estrategiaconcursos.com.br 17 de 59 portanto, de uma forma de prevencdo que busca atingir as estruturas do sistema. Temos, aqui, os métodos preventivos com resultado de médio a longo prazo. 1.4.2 Prevenc&o secundaria Momento posterior ao delito ou na iminéncia de sua ocorréncia. Aqui 0 foco da prevencao recai sobre os setores sociais em que a criminalidade mais se manifesta, ou seja, recai sobre os grupos que apresentam determinadas caracteristicas que os tornam mais propensos a praticar ou sofrer delitos. Apresentam resultados de curto a médio prazo. A prevencéo secundaria ocorre, por exemplo, por meio da criminalizagéo de condutas, da aco policial, etc. 1.4.3 Prevencéo tercidria Aqui a prevencdo recai sobre o condenado, ou seja, visa a evitar a reincidéncia. Pode se dar por meio da escolha da pena mais apropriada, pela progressao de regime, que possibilita 0 reencontro paulatino do preso com a sociedade, etc. A prevenciio tercidria é materializada por meio da pena, ou seja, a pena 60 instrumento utilizado pelo Estado para alcangar prevengao tercidria, de forma a evitar a reincidéncia Para a melhor compreensaéo do tema, necessdria se faz uma breve sintese das finalidades atribuidas 4 pena criminal, de acordo com as diversas teorias: 1.4.3.1 Teoria absoluta da pena Para esta teoria, pune-se o agente simplesmente porque ele cometeu uma transgress&o a ordem estabelecida e deve ser castigado por isso. Néo hé nenhuma finalidade educacional de reinser¢o do individuo a vida social. A pena & mero instrumento para a realizacdo da vinganca estatal. Trata-se de um imperativo categérico de Justiga ou de Moral (se delinquiu, deve ser punido, independentemente de qualquer outra finalidade).’ 1.4.3.2 Teoria relativa e sua finalidade preventiva Pune-se o agente ndo para castigé-lo, mas para prevenir a pratica de novos crimes. Essa prevengao pode ser: 7 BACIGALUPO, Enrique. Manual de Derecho penal. Ed. Temis S.A., tercera reimpressién. Bogoté, 1996, p. 12 Prof. Renan Araujo www.estrategiaconcursos.com.br 18 de 59 PrevencSo Geral - Busca controlar a violéncia social, de forma a despertar na sociedade o desejo de se manter conforme o Direito. Pode ser negativa’, quando busca criar um sentimento de medo perante a Lei penal, ou positiva, quando simplesmente se busca reafirmar a vigéncia da Lei penal. Prevencdo especial - Nao se destina 4 sociedade, mas ao infrator, de forma a prevenir a pratica da reincidéncia. Também pode ser negativa, quando busca intimidar 0 condenado, de forma a que ele ndo cometa novos delitos por medo, ou positiva, quando a preocupacdo esta voltada a ressocializagdio do condenado (Infelizmente, nao ha uma preocupagéio com isto na pratica). IMPORTANTE! FRANZ VON LISZT foi um dos mais conceituados expoentes da “Escola Moderna Alema”. Buscou enxergar a pena como meio de ressocializac&o do individio, muito além da mera punic&o pelo ato cometido. Para tanto, defendia que a pena deveria ter finalidade preventiva, mas apenas em relac&o aos criminosos corrigiveis. Para ele, os criminosos poderiam ser divididos em = Habituais - Sem chance de ressocializac&o. A pena nao teria, aqui, finalidade preventiva especial. = Iniciantes - Estes poderiam ser ressocializados, de maneira que a pena teria, em relaco a estes, finalidade preventiva especial = Ocasionais - Estes no necessitariam de ressocializacdo, pois apenas cometeram um desvio pontual. Tais pensamentos ficaram conhecidos como "Programa dé Marburgo”. 1.4.3.3 Teoria Mista (unificadora ou eclética ou unitdria) e sua dupla finalidade Aqui, entende-se que a pena deve servir como castigo (puniggo) ao infrator, mas também como medida de prevencao, tanto em relac&o a sociedade quanto ao préprio infrator (prevengdo geral e especial). Além de consagrada na maioria dos paises ocidentais’, foi a adotada pelo art. 59 do CP." 1.4.4 Programas de prevenco de infracdes penais Podemos elencar como principais programas os seguintes: ® ROXIN, Claus. Derecho penal, parte general. Madrid: Civitas, 1997. tomo I, p. 91. ° DOS SANTOS, Juarez Cirino. Direito Penal, Parte Geral. Curitiba: Ed. Lumen Juris, 2008, p. 470 10 Art. 59 - O juiz, atendendo a culpabilidade, aos antecedentes, 4 conduta social, 4 personalidade do agente, aos motives, as circunsténcias e consequéncias do crime, bem como a0 comportamento da vitima, estabelecerd, conforme seja necessario e suficiente para reprovacso © prevencao do crime: (Redagao dada pela Lei n° 7.209, de 11.7.1984) Prof. Renan Araujo www.estrategiaconcursos.com.br 19 de 59 = PROGRAMAS DE PREVENCAO SOBRE DETERMINADAS “AREAS GEOGRAFICAS" - Trata-se da prevenciio “dirigida”. Tem como premissa a existéncia de um determinado espaco, geografica e socialmente delimitado, em praticamente todos os centros urbanos, que concentra os mais elevados indices de criminalidade. Séo dreas geralmente muito pobres, deterioradas, esquecidas pelo Poder Publico e com alta desorganizagSo social. > PREVENCAO DO DELITO POR MEIO DO DESENHO ARQUITETONICO E URBANISTICO - Visam a reestruturac&o urbana e se valem do desenho arquiteténico, de forma a neutralizar o elevado risco de influéncias que favorecem o comportamento criminoso, existente em certos espacos. Somente desloca o delito para outras 4reas menos protegidas, mas n&o atinge as bases do problema criminal. = PROGRAMAS DE PREVENGAO VITIMAL - Orientada para as vitimas, parte de uma perspectiva de que o risco de se tornar vitima nao se distribuir de forma isonémica na populago nem é produto do acaso: O risco de se tornar vitima é possivel de ser calculado de forma estatistica, tendo como base inuimeras varidveis, todas relacionadas com a prépria vitima (idade, personalidade, classe social, etc.) > PROGRAMAS DE PREVENCAO POLITICO-SOCIAL - Sao programas de prevencdo “priméria”, auténtica prevencdo. Uma sociedade que assegura a todos os seus membros um acesso efetivo aos mecanismos para o alcance dos fins que Ihe so exigidos, reduz, consequentemente, a possibilidade de que 0 individuo recorra a instrumentos paralelos para a obteng&o destes fins, o que contribui para a queda nas taxas de criminalidade. + PROGRAMAS DE PREVENCAO DA CRIMINALIDADE DE ORIENTACAO COGNITIVA - Fundamenta-se na premissa de que a aquisicéo. de determinadas habilidades (positivas) é uma técnica reintegradora com alto potencial de sucesso, porque afasta o criminoso de influéncias negativas, substituindo-as por boas influéncias, no que se pode conceber como um ataque as “subculturas criminais”. . + PROGRAMAS DE PREVENCAO A REINCIDENCIA - Sao programas de prevencdo tercidria, pois aqui o crime jé ocorreu, de forma que se buscaré evitar sua nova ocorréncia. Na verdade, estes programas estdo mais relacionados a intervengao (sobre o delinquente) do que a prevencéo (para evitar que haja delinquéncia). Um dos maiores problemas no que tange a profilaxia criminal é a diferenca entre a criminalidade real e a criminalidade registrada pelas agéncias de controle, a denominada de Prof. Renan Araujo www.estrategiaconcursos.com.br 20 de 59 Assim, temos como “cifra negra” o numero de delitos que, por qualquer razo, ndo chegam ao conhecimento das agéncias formais de controle. PILGRAN assevera que a existéncia de “cifra negra”, bem como da impunidade, decorre de um processo de filtragem que envolve as vitimas, as testemunhas, 0 Judiciério, a Policia, o legislador e o MP. Para ele, o legislador falha ao: alizar * Criminalizar de forma lacunosa + Criminalizar excessivamente No mesmo sentido, a vitima também contribui para a impunidade e, neste particular, para a cifra negra, ao ndo proceder a comunicagéo da ocorréncia do delito (notitia criminis). A Policia, por sua vez, contribuiria para a impunidade ao ndo proceder a abertura da investigacao (por falta de estrutura, conhecimentos técnicos, corrupc&o, etc.), bem como ao proceder a uma investigacdo deficiente, defeituosa. O MP contribuiria quando nao procede & abertura dos processos, seja porque oferece dentincia inepta, seja porque requer o arquivamento, etc. O Judiciario também seria um fator determinante, quando: + Apresenta falhas na comprovagio do delito + Quando néo se obtém prova cabal para a condenacio, devendo ser aplicado o principio do in dubio pro reo. + Quando a morosidade do Judiciario conduz a prescrigao. + Quando falha na efetiva execugao da pena Por fim, importante destacar o que se convencionou chamar de cifra dourada, cifra cinza e cifra amarela: CIFRA DOURADA E um subtipo da cifra negra. Contudo, esté atrelada aos crimes praticados _pelas consideradas “elites”, como os crimes contra a ordem tributaria, sonegacao fiscal, crimes contra o sistema financeiro, etc. E a chamada_ “criminalidade do colarinho branco”. Trata-se, aqui, de uma impunidade “proposital”, ou seja, o Estado é conivente com tais praticas, notadamente em razéo da influéncia do criminoso. CIFRA CINZA Consiste nos delitos que sao registrados perante os érgéos publicos, mas cuja solugdo € encontrada na prépria delegacia, n&o__havendo _instauragéo_de _processo Prof. Renan Araujo www.estrategiaconcursos.com.br 21 de 59 judicial (Ex.: auséncia de representagdo nos crimes de ago penal publica). CIFRA AMARELA A cifra amarela também é uma espécie de cifra negra. Contudo, aqui estamos diante de delitos praticados pela prépria policia contra o individuo que, por medo de futuras represélias, acaba por nao registrar o fato. 2 CRIMINOLOGIA E POLITICA CRIMINA CRIMINOLOGIA E CIENCIAS CRIMINAIS Inicialmente, devemos entender as diferengas entre criminologia e suas areas correlatas (politica criminal e ciéncias criminais). A Criminologia é a ciéncia que empirica, interdisciplinar, que se ocupa do estudo do crime, do criminoso, da vitima e da sociedade, conforme nés ja vimos. A Politica Criminal, por sua vez, é 0 ramo que estuda os meios de prevencio e repressdo a criminalidade. Ou seja, a politica criminal se vale da criminologia para tracar estratégias de controle penal, seja pela ampliacdo ou restrig&o de condutas incriminadas, estabelecimento das penas adequadas, etc. As ciéncias criminais, por seu turno, englobam: + CRIMINOLOGIA + POLITICA CRIMINAL + DIREITO PENAL Este ultimo é a materializacao dos dois primeiros, por meio da conversio de suas conclusées em termos juridicos. Com relagio ao sistema de Justica Criminal, ele pode ser conceituado como 0 aparato desenvolvido pelo Estado para que seja realizado o controle punitivo: Voltando ao estudo da Politica Criminal, n&o podemos deixar de atrelar suas proposigées ao Sistema de Justica Criminal, j4 que este Ultimo, ao fim e ao cabo, também atua na prevengo e repressdo ao delito. Embora a atuacdo se dé com muito maior énfase na repressdo ao delito, o cardter preventivo também & encontrado quando entendemos que a pena também possui carater preventivo. Assim, qualquer atuago do sistema de Justica Criminal sobre determinada violacdo 4 norma penal seré, ao mesmo tempo, repressdo e prevencao, j4 que adotada a teoria eclética da pena por nosso sistema juridico-penal. 2.1 MODELOS DE REACGAO AO CRIME A Doutrina elenca os chamados MODELOS DE REACAO AO CRIME, assim definidos: Prof. Renan Araujo www.estrategiaconcursos.com.br 22 de 59 2.1.1 Classico ou dissuasdério Tem por finalidade INTIMIDAR © delinquente (ou o potencial delinquente), por meio da ameaca da pena, de forma que pratique a conduta delituosa ou, caso tenha praticado, ndo torne a delinquir Este modelo se vale da finalidade de prevencdo negativa da pena, ou seja, a prevencéo do delito por meio a ameaca, de maneira que dependerd, naturalmente, de diversos fatores, como a gravidade da sancdo prevista, a maior ou menor probabilidade de sua imposicao, etc. © problema deste modelo é que ele pressupée que o potencial criminoso iré refletir seriamente antes de praticar o delito e, apds muita discussdo interna, adotaré a conduta que tenha o melhor custo-beneficio, de forma que a pena deve ser severa, a fim de que nesse raciocinio o potencial criminoso chegue a concluséo de que o “crime nao compensa”. 2.1.2 Ressocializador De cardter mais “humanizado”, busca interferir na vida do delinquente, Ppromovendo sua reinsergdo social. Assim, 0 modelo ressocializar esta calcado numa finalidade de preveng’o positiva da pena, ou seja, a pena como instrumento de transformagao social. 2.1.3 Restaurador E considerado um modelo integrador, pois busca reparar 0 dano causado a vitima, restabelecendo o status quo ante, bem como reparar o “dano social” causado pelo delito. Nao se preocupa tanto com o castigo, nem com a transformagao do infrator, mas volta sua visdo para a figura da vitima, de forma que o dano a ela provocado seja reparado, jé que os dois modelos anteriores acabam por negligenciar a figura do ofendido. Para finalizar 0 estudo da materia, trazemos um resumo dos principais aspectos estudados ao longo da aula. Nossa sugestéo € a de que esse resumo seja estudado sempre previamente ao inicio da aula seguinte, como forma de “refrescar” a meméria. Além disso, segundo a organizagao de estudos de vocés, a cada ciclo de estudos é fundamental retomar esses resumos. Caso encontrem dificuldade em compreender alguma informagao, nao deixem de retornar a aula. Prof. Renan Ara www.estrategiaconcursos.com.br 23 de 59 Criminologia cientifica - A criminologia enquanto ciéncia so surge no final do século XIX, e apesar de romper com o modelo criminolégico pré-cientifico, se valeu de algumas contribuigdes destas “pseudociéncias” para seu desenvolvimento Pré-cientificamente: ~ DEMONOLOGIA = FISIONOMIA > FRENOLOGIA = PSIQUIATRIA Método da criminologia cientifica - A criminologia passa a tentar explicar 0 fenédmeno do crime e o comportamento criminal utilizando-se do empirismo como ponto de partida. Principais modelos teéricos: CRIMINOLOGIA CLASSICA E NEOCLASSICA - Tinham como ponto central de seu trabalho o LIVRE ARBITRIO. Para este modelo, o homem é LIVRE para fazer suas escolhas, inclusive para cometer delitos. CRIMINOLOGIA POSITIVISTA - Rompe com a ideia de que o homem “delinque” porque quer delinquir. Para este modelo teérico, compreender o fendmeno criminal é uma tarefa que demanda a andlise de fatores causais- explicativos, ou seja, deve-se buscar as causas do delito (paradigma etiolégico). SOCIOLOGIA CRIMINAL - Abandona a ideia de “causas do crime" e parte para a ideia da teoria da criminalizag&o. Com uma forte influéncia marxista, tal modelo entende que nao importa tanto a “causa” de determinado comportamento criminoso, @ mais o “porqué” de se considerar criminoso determinado comportamento, ou seja, quais os interesses esto por tras da criminalizago de determinadas condutas Teoria sociolégicas Sociedade criminégena - Uma sociedade que PRODUZ CRIME. Teoria do consenso ou “criminologia do consenso” - Parte da premissa de que a sociedade é formada por uma séria de valores fundamentais consensuais, que devem ser protegidos e promovidos por todos. Assim, 0 Direito Penal nada mais seria que uma ferramenta para a defesa destes valores comuns a todos os individuos. Teoria do conflito ou “criminologia do conflito” - A criminologia do conflito, por sua vez, verifica a sociedade néo como um todo coeso e harménico, fundado em valores comuns a todos os individuos, e sim um campo de batalha entre classe dominante e dominada, Paltindo destelviés marxista, as teorias decorrentes desta ideia vao estabelecer que o Direito Penal nada mais é que uma ferramenta a servico da classe dominante, de forma a garantir a manuteng3o do status quo, coagindo a classe dominada a “andar na linha”. Denuncia a seletividade do Sistema Penal. Prof. Renan Araujo www.estrategiaconcursos.com.br 24 de 59

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