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CARACTERÍSTICAS FÍSICAS E

MINERALÓGICAS DO ESTÉRIL DA
MINERAÇÃO DE GIPSITA DO ARARIPE, PE
Taís Saraiva de Melo Pinheiro1, Sheila Maria Bretas Bittar2, Ygor Jacques Agra Bezerra da Silva3, Felipe
Gusmão Didier de Moraes4 e Monaliza Alves dos Santos5

Introdução Jorge/Ouricuri-PE, que tem por objetivo tornar o estéril


(material que recobre a camada de gipsita) num substrato
Na Chapada do Araripe, semi-árido nordestino, a
adequado à implantação de vegetação, visando a
cerca de 700 Km da capital Recife, existe o Pólo
reabilitação das áreas de bota fora da mineração com
Gesseiro do Araripe. Este constitui num importante
espécies florestais nativas, para a produção de lenha a ser
Arranjo Produtivo Local, o APL-Gesso. O mesmo é
utilizada no processo de calcinação do gesso e a
abriga a segunda reserva mundial de gipsita, estimada
recomposição da paisagem, promovendo assim a
em mais de um bilhão de toneladas, sendo responsável
recuperação ambiental, a sustentabilidade do APL-Gesso e
por cerca de 95% da produção nacional [1]. São mais
a melhoria das condições sócio-econômicas da região.
de 12.800 empregos diretos e 64.000 indiretos e o
O presente trabalho apresenta aspectos mineralógicos e
faturamento anual do APL-Gesso é de cerca de R$ 300
físicos, antes e durante a condução do experimento
milhões [2].
realizado em casa de vegetação no Campus Dois Irmãos da
A maior área do APL-Gesso se encontra no Estado
UFRPE.
de Pernambuco, onde a atividade de mineração tem
preocupado o governo com relação à preservação do
ecossistema. Dentre os problemas ambientais mais Material e Métodos
relevantes destaca-se: o desmatamento descontrolado O estéril foi coletado aleatoriamente em um bota-fora
da caatinga para obtenção de carvão a ser utilizado na da Mineradora São Jorge. Este material foi peneirado (4
calcinação do gesso; o abandono das cavas após a mm) e homogeneizado para a retirada de uma amostra
mineração da gipsita; e a formação de pilhas de rejeitos composta. Parte desta foi enviada aos laboratórios de Física
da extração, designados “bota fora”. Entre outras e de Mineralogia do Solo da UFRPE, para realização das
consequências tem-se a perda da biodiversidade, a análises iniciais. O restante do material foi utilizado em um
mudança dramática da paisagem, mudança da dinâmica experimento em casa de vegetação. O estéril recebeu 4
superficial e sub-superficial e a insustentabilidade do tratamentos, (estéril + esterco de ave, estéril + esterco de
processo produtivo. boi, estéril + esterco de cabra e controle), foi colocado em
Preocupado com essa problemática no Estado, vasos sem drenagem e durante 30 dias foi mantida a
uma equipe de técnicos da Companhia Pernambucana umidade de 70% da capacidade de pote dos mesmos.
do Meio Ambiente (CPRH) tem sido a responsável por Posteriormente, foi retirada uma amostra composta
debater questões relativas aos cuidados com a natureza referente a cada tratamento e novas análises físicas foram
na região, por meio do Plano Nacional de Meio realizadas.
Ambiente [3]. Porém, a escassez de pesquisas
elaboradas no tocante à gestão e recuperação destas A. Análises Físicas
áreas e de estudos que viabilizem o aproveitamento dos Foram realizadas as seguintes análises físicas no estéril
resíduos gerados por essa atividade dificultam a inicial e nos tratamentos após 30 dias: densidade de
implantação de políticas que minimizem os impactos partículas (balão volumétrico), densidade global (cilindro
gerados e promovam um desenvolvimento sustentável de compactação), e estabilidade de agregados (método
para a região. indireto de peneiramento a seco). Todos os ensaios
Visando mitigar os impactos associados a esta seguiram os métodos propostos pela EMBRAPA [4].
atividade está sendo desenvolvido o projeto de
pesquisa “Utilização do estéril da mineração da gipsita B. Análises Mineralógicas
da região do Araripe-PE para recuperação ambiental e Foram realizadas análises mineralógicas das frações
produção de energia renovável”, numa parceria entre a areia (grossa e fina) e da fração argila. As frações grossas
UFRPE, a UOGuelph/Canadá e a Mineradora São foram estudadas sob lupa binocular e envolveram:

1. Primeira Autora é Aluna de Engenharia Agrícola e Ambiental, Departamento de Tecnologia Rural, Universidade Federal Rural de Pernambuco,
s/n, Av. Dom Manuel de Medeiros, s/n, Dois Irmãos, Recife, PE, CEP 52171-900. E-mail: tais.smp@gmail.com
2. Segunda Autora é Professora Associada do Departamento de Agronomia, Universidade Federal Rural de Pernambuco, Av. Dom Manuel de
Medeiros, s/n, Dois Irmãos, Recife, PE, CEP 52171-900. E-mail: schulze@depa.ufrpe.br
3. Terceiro Autor é Aluno de Agronomia, Departamento de Agronomia, Universidade Federal Rural de Pernambuco, Av. Dom Manuel de
Medeiros, s/n, Dois Irmãos, Recife, PE, CEP 52171-900. E-mail: ygorufrpe@yahoo.com.br
4. Quarta Autor é Aluno de Engenharia Florestal, Departamento de Engenharia Florestal, Universidade Federal Rural de Pernambuco, Av. Dom
Manuel de Medeiros, s/n, Dois Irmãos, Recife, PE, CEP 52171-900. E-mail: mictlantecuhtli_mictlan@yahoo.com.br
5. Quinta autora é Monitora bolsista da disciplina de Física do Solo, Aluna de Agronomia, Departamento de Agronomia, Universidade Federal
Rural de Pernambuco, Av. Dom Manuel de Medeiros, s/n, Dois Irmãos, Recife, PE, CEP 52171-900. E-mail: alves.monaliza@yahoo.com.br
quarteamento da amostra, colocação desta sobre placa os 2% restante da amostra de: fragmentos de rochas
de petri, observação das propriedades físicas dos (argilito/siltito); agregados ferrosos, irregulares, de cor
minerais [5], realização de microtestes físicos e marrom avermelhado, pouco friável, alguns com forte
químicos, e estimativa semi-quantitativa dos magnetismo (maghemita); agregados manganosos, de cor
constituintes presentes [6]. preta, friável e que efervescem em contato com H2O2 a
A mineralogia da fração argila foi determinada 10% a frio; mica, hábito foliáceo e cor castanho-
através de um Difratômetro de Raios X, da marca esverdeado a verde (clorita e/ou vermiculita); pirita
Shimatzu, operando com uma tensão de 40 kv e limonitizada, hábito cúbico, cor castalho avermelhado; e
corrente de 20 mA, radiação de CuKα, com microfósseis de ostracóides; além de fragmentos orgânicos
monocromador de grafite, com uma amplitude de (tecido vegetal e sementes).
leitura (2) entre 3° e 70° e/ou 50° e velocidade de Na fração areia fina são descritos: quartzo (85%), com
registro de 2° 2 min-1. As análises e interpretações características semelhantes às observadas na areia grossa;
basearam-se nos métodos propostos por Grim [7], gipsita (2%); agregados carbonáticos (3%); agregados
Jackson [8], Dixon [9], Whittig & Allardice [10] e argilosos (3%); agregados ferrosos (2%); agregados
Moore & Reynolds [11]. Foram analisadas as seguintes manganosos (2%); e traços (3%): micas; turmalina, cor
amostras orientadas da fração argila: “argila natural” e verde musgo, brilho vítreo, em grãos arredondados a sub-
de argila com pré-tratamentos para eliminação dos arredondados; zircão, prismático bipiramidal, transparente
carbonatos e cátions divalentes, matéria orgânica e e brilho vítreo; epidoto, cor verde característica, brilho
óxidos de ferro. Desta última foram realizadas quatro vítreo e sem clivagem; microfósseis; e fragmentos
leituras: argila saturada com cloreto de K e analisada a orgânicos.
25°C; argila saturada com cloreto de K e analisada A fração argila é constituída por: caulinita, definida
após aquecimento durante 2 horas a 550°C; argila pelos picos de 0,7, 0,35 e 0,39 nm, que colapsam quando a
saturada com cloreto e acetato de Mg e argila saturada amostra é aquecida a 550º C; quartzo (picos de 0,42 e 0,33
com Mg e solvatadas com glicerol, ambas as últimas nm, observados em todos os difratogramas); ilita (picos de
analisadas a 25°C. A interpretação dos difratogramas 10,1, 0,50 e 0,33 nm); e um argilomineral 2:1 expansivo,
foi realizada por meio do espaçamento interplanar (d), identificado pela presença do pico de 14,48 nm no
forma, largura e intensidade dos picos nos difratograma da argila natural. Este argilomineral,
difratogramas e comportamento nos tratamentos. provavelmente, é um interestratificado, ilita/esmectita,
devido ao comportamento frente aos demais tratamentos
Resultados utilizados: no difratograma de argila saturada em K, se
observa o pico de 12,81 nm; no difratograma de argila
A. Caracterização Física saturada em Mg, ocorre expansão e presença do pico de
Os dados físicos do estéril inicial e dos tratamentos 15,78 nm; e quando esta amostra é solvatada com glicerol o
após 30 dias estão expressos na Tabela 1. pico chega a 18,8 nm [12]. Além dos minerais citados, se
O estéril é um material argiloso, com densidade observa no difratograma da argila natural, picos que
global de 1,42 g cm-3, densidade da partícula de 2,40 g sugerem a presença de óxidos, dentre os quais destacamos
cm-3 e porosidade de 41%. Após 30 dias de condução a presença de goethita (0,41, 0,27 e 0,17 nm).
de experimento, pode-se observar uma diminuição da
densidade do solo e, por conseguinte da sua porosidade
que passou a ser de 52%; 48,1%; 52,4% e 51,3%,
Discussão
O estéril é um material argiloso de densidade
respectivamente, para o controle e tratamentos com
relativamente alta quando comparada à de solos argilosos
esterco de ave, boi e cabra.
comuns [13]. A densidade da partícula (2,40g cm-3) e a
Inicialmente, o estéril apresenta diâmetro médio
porosidade são coerentes com a textura e composição
ponderado (DMP) de 1,648 e diâmetro médio
mineralógica do material. O DMP (1,648) é compatível
geométrico (DMG) de 1,000. Após 30 dias, os valores
com a mineralogia da fração argila que predomina na
de DMP são de 2,762; 2,384; 2,699; e 2,240; e DMG
constituição do estéril, e com a quantidade relativamente
de 1,004; 1,003; 1,004; e 1,003, para o controle e
alta de cátions de Ca2+ e Mg2+, que propiciam a formação
tratamentos com esterco de ave, boi e cabra,
de agregados, mas não a estabilidade dos mesmos.
respectivamente.
Após 30 dias de experimento se observa, em todos os
tratamentos, a diminuição da densidade do solo, com o
C. Caracterização Mineralógica
conseqüente aumento da porosidade, isto não é reflexo da
A fração areia grossa é constituída por: quartzo
adição de matéria orgânica, uma vez que o controle
(92%), em grãos individuais ou como agregados
também mostrou este comportamento. Os aumentos nos
policristalinos, arredondados a bem arredondados, em
DMP e DMG, também observados em todos os
geral hialinos ou brancos, por vezes mostrando cor
tratamentos, indicam que a estabilidade de agregados
avermelhada, devido a incrustações de óxidos de ferro;
melhorou. Estes dados devem estar refletindo a
gipsita (2%), com hábitos granular, fibroso ou placoso
precipitação de minerais, provavelmente, carbonatos de Ca
e cores branca, bege e hialina; agregados carbonáticos
e Mg, que possuem densidade baixa quando comparado a
(2%), irregulares e mais raramente oólitos, com cores
dos silicatos, e devem estar promovendo a agregação e
que variadas (branco, bege e amarelo), que reagem em
estabilização das partículas.
contato com o HCl a 10% a frio; agregados argilosos
A mineralogia da fração areia é constituída
(2%), irregulares, friáveis, com cores que variam do
predominantemente por quartzo (>85%), com presença de
bege, cinza e marrom claro; além de traços que somam
gipsita e agregados carbonáticos, argilosos, ferrosos e
manganosos. A fração argila é constituída por [4] EMPRESA BRASILEIRA DE PESQUISA AGROPECUÁRIA
(EMBRAPA). Centro Nacional de Pesquisa de Solos (Rio de
caulinita, quartzo, ilita e argilomineral 2:1 expansivo,
Janeiro, RJ). Manual de métodos de análise do solo.2. ed. Rio de
provavelmente um interestratificado de ilita/esmectita, Janeiro, 1997. 212 p.
além de goethita. Segundo Dixon [9] nos sedimentos, [5] KLEIN, C.; HURLBUT Jr, C.S. Manual of Mineralogy. 21ed./after
normalmente, a ilita não é pura. Está sendo realizada a James Dana. New York: John Wiley & Sons Inc, 1999. 681p.
[6] TERRY, R. D.; CHILINGAR, G.V. Comparison charts for visual
concentração de óxidos na fração argila para se
estimation of percentage composition. Journal Sedimentare
verificar a presença de outros óxidos, tais como: Petrology, Los Angeles, v.25, n.3, p.299-234, 1995
manganita (0,34, 0,26, 2,4 e 1,6nm) e anatásio (0,35, [7] GRIM, R.E. Clay mineralogy. 2.ed. New York, McGraw-Hill, 1968.
0,19 e 0,17nm). 596p.
[8] JACKSON, M.L. Soil chemical analysis: Advanced course. 29.ed.
Madison, 1975. 895p.
Agradecimentos [9] DIXON, J.B. Minerals in soil environments. 2.ed. Madison, Soil
Science Society of America, 1977. 244p.
Agradeçemos à UFRPE; a Kinross Canada-Brazil [10] WHITTIG, L.D. & ALLARDICE, W.R. X-ray diffraction
Network for Advanced Education and Research in techniques for mineral identification and mineralogical
Land Resource Management, a Mineradora São Jorge e composition. In: BLACK, C.A., ed. Methods of soil analysis.. 4.ed.
CNPq. Madison, Americam Society of Agronomy, 1976. Part 1. p.671-698.
[11] MOORE, D.M. & REYNOLDS, R.C. X-ray diffraction and
identification and analysis of clay minerals. Oxford, Oxford
Referências University Press, 1989. 332p.
[1] DEPARTAMENTO NACIONAL DA PRODUÇÃO [12] ESLINGER, E. & PEAVER, D. Clay Minerals: for petroleum
MINERAL (DNPM). Sumário Mineral. Gipsita. 80-81, 2003. geologist and engineers. Oklaroma, USA. Soc. Econ Paleont. And
[2] SINDUSGESSO, 2008, http://www.sindusgesso.org.br/. Minen. 1988. 315p.
Acesso: 16 de setembro de 2008. [13] CAMARGO, O.A.; ALLEONI, L.R.F. Compactação do solo e o
[3] COMPANHIA PERNAMBUCANA DO MEIO AMBIENTE desenvolvimento das plantas. Piracicaba, 1997. 132p
(CPRH). Diagnóstico Sócio-Ambiental e Mapeamento das
Potencialidades e Restrições de Uso do Litoral Norte de
Pernambuco. Recife: CPRH/GERCO, 2001.

Tabela 1. Resumo das propriedades físicas estudadas.


Controle Ave Boi Cabra
Densidade do Solo Inicial 1,42 - - -
3
(g/cm ) 30 Dias 1,15 1,25 1,14 1,17
Densidade da Partícula
2,40 - - -
(g/cm3)
Porosidade Inicial 40,8% - - -
(%) 30 Dias 52,0% 48,1% 52,4% 51,3%
Textura Inicial Areia 17,7% - - -
Silte 25,0% - - -
Argila 57,3% - - -
Estabilidade de Agregados DMP Inicial 1,648 - - -
30 dias 2,762 2,384 2,699 2,240
DMG Inicial 1,000 - - -
30 dias 1,004 1,003 1,004 1,003

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