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NORBERTO BOBBIO LIBERALISMO E DEMOCRACIA Traducio: Marco Aurétio Nogueira editora brasiliense Corgi © ty Fraco Rage ibs. ale Mone 106 Nis, “Tania: seroma edemveracia oper © da roto rain aor aise S.A Next pte des pbc pode er grav “amen sifemas leis ftocopods ‘ipod por cos menos 982 ash" rte prvi edo, Mot! Bao i 22 = Tae CePusatenib= Sto Paso “5? Tne: (ha) 2081088 ea biel om “Wore etorebeatens com Br indice ee I ‘Aliberdade ds antigns dos modernos see 7 ‘Os direitos dohomem ....-2eeeeeseescrreeee HH stimites do poder de Estado v 1) Liberdade contra podér .. 2 %, antagonism & feeundd «. 2 6. Demogracia dos antiges € dos modernos . 31 © Democracia c igualdade - a wee OT 'S. Oencontroentec liberatismoe democracia ....+ 42 +), Individualismo ¢ organicismo « 45 10. Liberais e demoeratas no século XIX . . UL Atirania da maioria | Liberalisme e utiitarigmo .- A democracia representativa : ‘Liberatismo e democracia na {tétia «- ‘A democracia diante do sodialismo «. 16, Onova liberatismo . 17. Democracia ¢ ingovernabilidade Bibliogratia 1. A liberdade dos antigos e dos modernos ‘sesisténcia atual de regimes denominades Hiberal- siemexitieas ou de democrasa iberal eva a err que fe trratimo e democracia seam interdependentes. No et to, problema das relagbseatee eles extremtamente evo, e tudo menos linear. Na acepedo mals comum lermos, por tlberalisna™ entendese uma de terninada eoncepeto de Estado, na qual o Estado tem orderey e fungSes limitedas, ¢ como tal se contrapde tan- 1 ao Estado absoluto quanto ao Estado que hoje cha. tram de social por joemoeracia”entende-se uma das tori formas de gover, em particular aquelas om que Chnalr ndo esti.nas mios de aim 38 au de povees, mas tits, ow melhor, da mor parte, como tl se contra rvs formas autocrties, como a eoanrguiae ai rarsuia|Um Estado liberal nfo é necessariamente demo- “ratio ao contri, ealiza-ehistoricamente em socie- nas uals a partsipagdo no governo bastante res iia imtada clases possuidoras, Um gorerno demo- tritico nao dh rida necesaramente am Estado liberal no contri, Esta iberal asic fi posto em ese ‘ NORBERTO BOBBIO pelo progressive provesso de democratizacio produzide pela gradual ampliagio do sufrigio até 0 sufrégio uni- versal. Sob a forma da contraposigao entre Hiberdade dos ‘modemos ¢ iberdade dos antigos, a antitese entre libera- lismo ¢ demecracia foi enunciads e sutilmente defendida ‘pot Benjamin Constant (1767-1830) no célebre diseurso pronunciado no Ateneu Real de Paris em 1818, do qual € possivel fazer comegar a historia das difieeis e controver- ‘das relagSes entre as duas exigencias fundamentais de que nasceram os Estados contemporéneos nos paises ‘econiémica esocialmente mais desenvolvidos: a exigéncia, deur Jado, delimitar o poder e, de outro, de distribul-lo. © objetivo dos antigos — esereve ele — era a disiri- buigHe do poder politico entre todos os cidadies de ‘uma mesma patria: era isso que eles chamavam de liverdade. O objetivo dos modernos é a seguranca nas fruigdes privadas: cles chamam de liberdade as ‘garantias acordadas pelas instituigdes para aquelas, Iruigoes." ‘Come liberal sincero, Constant considerava que es: ‘ses dois objetivos estavam em conteaste entre si. A part Gipacio direta nas decisies coletivas termina por subme- ter oindividuo a autoridade do todo e por torné-lo nao li- ‘vre como privado; eisso enquanto & liberdade do privado é precisamente aquilo que 0 cidadio exige hoje do poder ‘piblico. Concluia: §) Denn Consus De bre er cts Competed celle aes Mtr 1819), n Calton Competes Outage, vl pate 7 Pans Bechet Lies, 120, 3 (ea hn Be Constant, node € ‘wade de Umer Cron Roma, Soa eS, 95, e252 LIBERALISMO E OBMOCRACIA ° Nao podemos mais usuirir da liberdade dos antigns, ‘que era constituida pela participagio ativa © cons- ante mo poder coletivo. A nosss liberdade deve, a0 contrario, ser constituida pela fruigao pacifica da in- dependéncia privada.? Constant citava os antigos, mas tinha diante de si 1m alvo bern mais préximo: Jean-Jacques Rousseau. De {a10, 6 autor do Contrato Social havia inventado, 380 se fortes sugestdes dos pensadores cléssicos, uma re- pribliea aa qual o poder soberano, uina ver insitwido pels eoncordada vontade de todos, toma-se inalivel ¢ w precisa dar garantias 20s sites, pois € impossivel <0 enrpo queira ofender a todos 0s seus membros".* ow que Rousscau tenka levado o principio da vontade sstal as ponto de desconhecer a necessidade de limitar © pple do Estado: atrbuir a ele « paternidade da “demo- totalitéria” € uma potémica to generalizada tate errbnea, Embora susientando que 0 pacto social «ls au corpo politico um poder absolute, Rousseau tam- ‘ven sustenta-que'“o corpo soberauo, da sua parte, nto tule wbrecagrexar 0s sites com nenhumna cadein que sejh intl & comunidade” Mas € certo que esses Ie inites*nig $80 pré-constivefdos a0 nascimento do Es- tuto, como quet a doutrina dos direitos natura, ave presenta 0 niileo dautrinal do Estado fiberal. De fato Jwora adimitindo que “tudo aquilo awe, com 0 pacto 1, eada um aliona de seu poder... é unicamente & parte de tudo aquilo dijo uso € importante para a co- 2 Taaiciige BD () 11 Rowse De Cort Soci 1.7 a. 3, Rees, Scio Mie.) Fa. Olt 10.139. Gh Tea cp w NORRERFO BORBIO ‘munidade”, Reuyseau conclu que “o tinico corpo sobe- rano €juiz dessa impoctiincia” * 2. Os direitos do homem [0 pressuposto filositico do Estado liberal, enten lo como Estado fimitado em contraposigao 20 Estado absoluto, ¢ a doutrina dos direitos do homem elaborada pola escola do direito natural (ou jusnaturalismo): dou- 1 segundo a qual © homem, todos os homens, iadis- erinainadamente, tém por natureza, portanto, indepen- sntemente de sua propria vontade, ¢ menos ainda da ‘vantade de alguns poucos ou de apenas um, cerios dix vitos fandamentsis, como direito & vida, & fiberdade, & inca, 4 feticidade — discitos esses que o Estado, ou ‘nals coneretamente aqueles que num determinado mo- Ww histérico detém 0 poder legitimo de exercer a for- «ca para obter a obediéneia a scus comandes dever res- peilar. ¢ portanto no invadir, ¢ ao mesmo tempo prote, wx contra toda possivel invasio por parte dos outros. Abibuir @ alguém um dizeito signifies reconhecer cue cle tom a faculdade de fazer ou ndo fazer algo contorme ‘seu desejo e também 0 poder de resistir, recorrendo, em ‘iltima instaneia, a forga (propria ou dos outros), contra 0 cventual transgressor, © qual tem em conseqiiéncia o de- (9 Trad 0.8 » NORBERTO BOBRIO. ver (ou a obrigagdo) de se abster de qualquer ato que possa de algum modo interferir naqucla faculdade de fa zer ow no fazer. “Direito” e “dever” so duas nogdes pertencentes 4 finguagem prescritiva, ¢ enquanto tais ressupSem a existéncia de uma norma ou rogra de con- duta que atribui a um sujeito a faculdade de fazer ow nido fazer alguma coisa ae mesmo tempo em que impse ‘quem quer que seja a abstencdo de toda ago capa de impedir, sea por que mado for, o exercicio daquela fa culdade, Pode-se definir o jusnaturalism como a dou- trina senda a qual esistem kis Ado postas pela vontade, hhumaria — que por isso mesino precedem a formagio de {todo grupo social ¢ sio reconheciveis através da pesquisa racional — das quais derivam, como em toda e qualquer lei moral ow juridica, direitos e deveres que so, pelo ‘proprio fato de serem derivados de uma lei natural, direi= tose deveres naturais. Falou-se do jusnaturafismo como pressuposto “filoséfico” do liberalismo porque ele serve para fundar os mites do poder & base de uma concepeo geral e hipotética da natureza do homem que prescinde de toda verificagio mpirica e de toda prova histories. Nocapitulo Il do Segundo Tratado sobre o Governo, Lo- ccke, um das pais do liberalismo moderno, parte do.esta- ‘do de natureza deserito como am estado de pereta i ‘Gerdade ¢ igualdadé, governado por uma lei da natureza que censina a tados os homens, desde que descjem con- suléta, que, sendo todos iguais e independentes, ainguém deve provocar danos aos demais no que se refere a vida, & satide, a liberdade ou is posses." (69 hi Lhe, Pw Frater of Coverament 490) Uy 6 (it 1 arena Tut, Ute, 381980973 -RALISMO E DEMOCRACTA u ssa descrietle € fruto da reconstrugao fantastica de van presumivel estado origindrio do homem, cnjo tinico bjctivo € 0 de advzir uma boa razio para justificar os linvites do poder do Estado, A doutrina dos direitos nata- ras, de fato, esti na base das Declaragdes dos Direitos ‘prvekamadas nos Estados Unidos da América do Norte (a ‘eompecar de 1776) e na Franca revolucionsria (a comegar te 1789), através das quais se afirma 0 principio funda- 1 lo Estado liberal como Estado limitado: ‘0 objetivo de toda associagdo polities & a conserva ‘vio dos direitos naturais ¢ no preseritiveis do ho- ‘mewn (art. 2° da Declaracio dos Direitos do Homem, edly Cidadao, 1789). Unauanto teoria diversificadamente elaborada por iwofo, tedlogos & juristas, « doutrina dos direitos do hhanwns pode ser considerada como a racionalizagzo pos- 1 do estado de coisas a que conduziu, especialmente iu tnglalerra e muitos séculos antes, a luta entre a mo- uwia © as outras Forgas sociais. que se concluiu com & soneessio da Magna Carta por parie de Jodo Sem Terra 11215), quando as faculdades @ 05 poderes que nos séeu- ws futures serie chamados de “direitos do homem” si0 syeonhecides sob © nome de “Iherdade” (libertares, Irinwhives, freedom), ou seja, como esteras. individuais se posse de dens protegides perante © poder ‘glive ida cet, Embora esta e as sucessivas eartas.tenham uruliva de eoncessSes soberanas, elas sto de fa- tado de um verdadeiro pacto entre partes con tos direitos e deveres reci- nove ua relagdo politica, isto €, na relacdo entre dever (por parte do soberano) e dever de obedién- «4s (rio qual eonsiste a assim chamada “obrigacdo politi 14 por parte do sidito), comumente chamado de pac- 4 ‘NORBERTO BOBPIO| tum subiectionis. Numa carta das “liberdades” 0 objeto principal do acordo so as formas ¢ 0s limites da ebe~ Uiéncia, ou seja, a obrigagdo olitiea, e cocrelativamente fs formas e os limites do direito de comandar. Essas an- sfiges cartes, como de resto as cartas constitucionais ac- ‘tropées* das monarqvias constitucionais da idade da res- tauragio e depois (entre as qnais o estatato alberto de 1848), tem a figura juridiea da concessio, que é um ato unilateral, embora sejam de fato. resultado de um acor- Ui bilateral. So por isso uma tipies forma de fees ju- fidiea, que ter por objetivo salvaguardar o prinefpio da Sunervoridade do rei, e portanto assegurar a permanén- tia da forma de governo mondrquica, nie obstante a Seortida limitagho dos poderes tradicionais do detentor do poder supremo. ‘Naturalmente, mesmo nesse eas0, 0 cuss bistirion ‘que dé origem a urna determinada ordenasto juridica & tua justifeagio racional apresentam-se com os termes invertidos{ historicarente, © Estado liberal nasce de tne goutinva e progressive erasan do poder xbsoluto do gn petiodos histricos de erse mas aguda, de wma juptura revoluciondria exemplares 0: casos da Legler Fo dp silo XVI e da Franca do fim do steulo XVID: Tacionalmente, o Estado liberal € justificade como 0 re resultado de vm acordo entre individuos i simenite li- tres que covvensionam estabelecer os vinewlos estrte- frente necessarios a uiba convivencia paeffica € dra dours:Ienquanto o curso histirico procede de um estado {nicial-de serviddo a estados sucessives de conquista de teapagos de liberdade por parie dhs sujeitos, através de ‘um processo de gradval liberalizagao, & doutrina pereor eo caminho inverso, na medida em que parte da hipste~ Se de um estado inicial de liberdade, e apenas enquanto 6) Bo franco ns ons outspici.1N.T) LIBERALISMO E DEMOCRACIA 1s Jbe.0 homem como naturalmente livre é que conse~ ue construir a sociedade politiea como uma sociedade cotn soberania limitada. Em substincia, a doutrina, es- pecialmente a doutrins dos direitos naturais, inverte © ‘midamento do cursa histérico, colocando no inicio como nidamento, e partanto como prius, aquilo que é histori= inygute 0 resultado, o posterius. ‘Mirmagao dos direiios naturais ¢ teoria do contrat soul, ou contratualisiao, esto estreitamente ligades. A Gia de que o exercicie de poder poiitico apenas é lesi- fimo se fundado sobre o sonsenso dagueles sobre os ‘quais deve ser exercido (também esta é uma tese lockea- ana, c portante sobre um acordo entre aqueles que deci- submeter-se a um poder superior e com aqueles taucin esse poder é contiado, 6 uma idéia que deriva da ‘nressuporigde de que os individuos tém direitos que nto Alepestem da instituigdo de um soberano e que a institu ‘sno do soberano tem a principal fungao de permitir a explicitagao desses direitos compativel com & ans secial{ © gue une a doutrina dos diteitos do ilismo € & eomuin concepsao indivie clade, 4 concepeao segundo & qual pri- c-xinle 6 individo singular com seus interesses.c ccarimetas, que tomas forma de diteitos en sks assuncio de una hipotética lel de natareza, ¢ wis «Sociedade, e ndo vice-versa como sustenta 0 or- iy em todas as suas formas, segundo 0 qual a te € anterior aos individuos ou, conforme a for ia destinada ater éxito ao longo dos sécu- his, a hnla anterior as partes.O contratuaiismo moder- pesenta uma verdadeia Feviravolta na historia do (politico dominado pelo organicismo na me- dluls em que, subvertendo as relagies entre individuo & -weivlade, far da sociedade no mais um fato natural, a crislir independentemente da vontade dos individuos, 1 NORRERTO BOBRIO. mas um gorpe artificial, eriado pelos individuos & sua imagem e semethanca ¢ pata a satisfacao de seus interes- ses ecaréncias © 0 mais ample exercicio de seus direitos | Por sua vez, 0 acordo que dit origem ao Estado passive! porque, segundo a teoria do direito natural, existe na natureza uma lei que atribui e todos os individuos alguns iireitos fundamentais de que o individuo apenas pode s¢ ddespir voluntariamente, dentro dos limites em que esta rentincia, concordada com a aniloga rentncia de todos ‘0s outros, permita a composigao de uma livre e ordenada convivéncia Sem essa verdadeira revolucio copernicana, a base 4a qual o problema do Estado passou a ser visto mio mais da parte do poder soberano mas da parte dos sii- tos, no seria possivel a doutrina do Estado liberal, que & in primis a dovtrina das limites juridicos do poder esta tallSem individualismo nao ha libereismo.} 3. Os limites do poder do Estado Valow-se até aqui genericamente de Estado limitado swe Tiies do Estado, Deve-se agora precsar que esa ‘annexin compreende dois aspectos diversos do proble ti npectos que nets sempre so bem distingoidos: ‘us limites dos poderes; b) 0s limites das func6es do Esta~ {iu.'A deutrina Tiberal commpreende 2 ambos, embora tuna te ot ratedosseparadamente, um excivind 0 Minna libertigmo ema doutstaa do Estado imitado Tengo respsto gs seus poderes goapto as nas fun- pina corrente que serve para representa 0 i inendle raat de diret; 4 nog eorrente para fepre- stntas senda € Estado maine SEmbora o eras: thane ¢ Estado tanto cnno Esiad de deta auan- > Vstido mien, pode oerrer um Esisdo de d sia minim (por exemple, © Estado soeat ineo} © pode-se também conceber um Estado coats respeito & eslera econdmica, 0 Leviata hobbesiano, tiue€ an mesine tempo absolute fio mais pleno sentido da valayra ¢ liberal em economia). Enquanto 0 Estado de NORBEKTO BOBBIO. He os NORKERTO BoBBIO artida numa teoria econdmica, da democracia, que & uma teoria politica, e atribuinde a liberdade individuat (da qual a Herdade econdmica setia a primeira condi 40) um valor intrinseco e & democracia unicamente um valor instrumental, Hayek admite que, nas iutas passa. das contra o poder absoluto, liberalism & democracia uderam proceder no mesmo passo e confundir-se um na utra. Mas agora tal confusdo nfo deveria mais set poss! vel, pois acabamos por nos dar conta — subretudo obser. vando @ que conseqdiéncias nao-libersis pode conduzit, € de fato conduzit, 0 proceso de democratizagio — de ue liberalismo e democracia respondem a problemas di, ‘ersos: 0 liberalismo ao problemas das funces do gover- ‘no ¢ em particular A limitagdo de seus poderes: a demo. cracia 20 problema de quem deve governar e com quais Procedimentos, 0 Tiberalismo exige que todo poder — e, portanto, também o da maioria — seja submetido a limites. A democracia, ao coutratio, chega a considerar a epinido da maioria come o tiniea limite aos poderes overnatives. A diversidade entre of dois principios ‘emerge do modo mais claro ao se atemtar aos respec: tives opostos: para a democracia, 0 governo autori- ‘ério; para o liberalism, o totalitarismo. Naturalmente, também o termo “liberalismo", como todos os termos da linguagem politica, conhecey diversos significados, mais ou menos amplos. Porém, o ensamento de von Hayek, exposto em namerosas obras ‘que podem muito berm ser eonsideradas como a summa a doutrina liberal contemporinea, representa uma no- (68) Frisch ay Roma, teetoe [LIRERALISMO DEMOCRACIA » {vel eonfirmago daquilo que foi o ndcleo origindrio do {iberalismo classico; uma teoria dos limites do poder do Estado, detivades da pressuposico de direitos ou inte- esses do individuo, precedemtes a formacao do poder politico, entre os guais iio pode estar ausente o direito ‘de propriedade individual. Tais limites valem para quem quer que detenha o poder politico, inelusive para o go- vero popular, isto é, inclusive para um regime demo- ‘ration em que tordos os cidadiics tm o direito de parti- cipar mesmo que indireiamente da tomada das grandes decisbes, e cuja regra é a regra da maioria. Até onde se estendem 0s poderes do Estadio e até onde os direitos dos individuos, ow a esfera da assim chamada. liberdade ne- gativa, € algo que nio pode ser estabelecido de uma vez Para sempre: porém, & principio constapte ¢ catacteris- tico da doutrina liberal em toda a sua tradigao, especial- mente a anglo-saxa, que 0 Estado 6 tao mais liberal ‘quanto mais reduzides sto esses poderes e, correlativa- ‘mente, quanto mais ampla é a esfera da liberdade nega- tiva. A diferenca entre liberalismo ¢ autoritarismo (mie Ihor que totalitarismo) esta na diversa conotagio positiva ‘ou negativa dos dois termos opostes, poder ¢ liberdade, e das conseqiiéncias que disso derivam. O liberalismo € a outrina na qual s conotagdo pasitiva cabe ao termo “li berdade”, com a conseqiiéncia de que uma sociedade & tanto melhor quanto mais extensa 6 esfera da liberdade cerestrita a do poder. ‘Na formulagao hoje mais corrente, o liberalismo é a doutrina do “Estado minim” (0 minimal state dos an- glo-saxdes). Ao contririo dos anarquistas, para quem 0 Estado € um mal absolute e deve, pois, ser eliminado, para o liberal « Usiado € sempre um mal, mas & neces: shrio, devenclo, portanto, ser conservado embora dentro de limites os wisis resiritos possiveis. Precisamente com, base na éxitw da formula “Estado minimo” explica-se a » [NORBERTO RoBBIO vastidio do debate travado em torno so livro de Robert Nozick, Anarauia, Estado e Utopia, surgido em 1974." A obra de Nozick move-se contra duss frentes: contra o Estado miximo dos defensores do “Estado ée justiga” 0 qual slo atribuidas fungGes de redistribuigio’ da i ueza, mas também contra a total eliminacao do Estado Proposta pelos anarquistas. Embora com argumentos novos, Nozick retoma e defende a tese liberal clissica do Estado como organizagao monopolista da forga cujo linleo Himitado objetivo ¢ proteger os direitos indivi

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