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AS MIGRACOES PALEOLITICAS E AS INSCRICOES RUPESTRES DA AMERICA TH. POMPEU SOBRINHO Os mais conspicuos autores que estudaram a pré-historia ameri- cana informam que: 1) Provindos da Sibéria, hA cérca de 30 a 20 mil anos, homens de uma espécie nova, perseguindo a caga de mami- feros de grande porte, atravessaram o entéo istmo de BERING e se estabeleceram em certas regiées do Alasca e do norte do Canada, nfo atingidas pelos gelos polares. 2) Eram seres de um tipo antropolégico desde muito desaparecido, mas, sobremodo afim do atual australiano, pelo que, nesta noticia, os chamamos de AUSTRALOIDES PRIMITI- VOS ou simplesmente AUSTRALOIDES, Conquanto, pelos caractéres antropolégicos, nao diferissem dos que especializam a atual espécie do género humano, ofereciam somatologia, em alguns pontos especiais, que permitiu uma divisio taxionémica capaz de merecer a denominagao particular de HOMO SAPIENS FOS- SILIS, paralela a do HOMO que, nos nossos dias, povoa a superficie da terra, o HOMO SAPIENS RECENS. As diferencas nao sio fundamen- tais; quando muito, valem pelas que separam as trés grandes racas pri- mitivas da atualidade Os seus principals caracteres fisicos eram: cabeca muito longa ou acentuada dolicocefalia, e néo menos notavel hipsicrania bem como a elevada estatura Sob 0 aspecto cultural, ainda que rastejassem no nivel mais baixo, praticavam j& atos de expresséo religiosa que Ihes impunham, ao lado de outras fatéres, uma moral rudimentar, mas suficiente para as suas necessidades sociais. A economia coletora pouco ascendia a dos gran- des antropoides contemporineos, mas néo ficava muito abaixo da dos 6 REVISTA DO INSTITUTO DO CEARA australianos modernos. Tal como éstes, ndo conheciam o arco, a fle- cha, 0 propulsor, a cerfmica e a agricultura. Usavam a langa de arre- mésso com ponta de pedra mais ou menos grosseiramente talhada e tal- vez um machado de pedra muito tésco. Possivelmente fabricavam vasilhas de couro cozido e deviam tecer céstos e esteiras de cipé e de palha. Cagavam os grandes mamiferos, muitos dos quais desde milé- nios extintos, ¢ colhiam no campo frutos, brotos e tubérculos comesti- veis, rizomas e félhas carnudas de vegetais, insetos e larvas ao lado da caca, pequena, ratos, sdurios e ofidios. Esta cultura paleolitica primaria distinguia as levas dos primeiros imigrantes americanos e dos seus descendentes durante centenas de séculos, pelo menos enquanto durou o primeiro processo de dissemina- Ao dessa gente no Novo Continente. Ainda agora, pela sua incrivel persisténcia, constitui um carater distintivo de utilizago corrente. tee A segunda sub glaciagio wurmiana, correspondente ao TAZA WELL-CARY, do iiltimo periodo do Pleistoceno, culminou faz eérea de 36 milénios. EntSo, as 4guas dos oceanos, em grandes camadas acumu- ladas sob a forma de gélo nas calotes polares e nas geleiras das altas montanhas, diminuidas, deram lugar a uma considerdvel queda do ni- vel dos mares, transformando estreitos em istmos, ou fazendo ilhas unindo-as, alterando o contérno dos continentes, sem gue, entretanto, se modificassem os tragos gerais das grandes massas de terras emergi- das, apenas ligeiramente acrescidas de um rebordo mais ou menos largo. Grandes mamiferos asidticos da época, que fugiam dos gelos avas- soladores da Eurasia acharam o caminho da América e se embrenharam pelos terrenos relvosos do vale do rio Yukon, no Alasea, e regiées ciz- cunvizinhas livres de gelos. Os homens que se alimentavam da sua carne seguiram-Ihes as pégadas e atravessaram a pé enxuto a ligacio eventual intercontinental. Mais tarde, com a declinacdo glacial que preparava o advento de um periodo cdlido, o estreito restabeleceu-se € os australoides que ti- _nbam passado da Asia para a América j4 néo mais podiam regressar sua patria de origem. Mas, em compensacio, mamiferos e homens, es- treitamente encantonados no Alasca durante muitos séculos, acharam um caminho livre na dirego do sul, aberto entre os gelos que se der- retiam com o calor do “interglacial”, pelos sibios americanos chama- do TWO-CREECK. A regressio dos gelos dos grandes centros polares do Labrador e do Hudson, a leste, e das geleiras das montanhas rocho- sas a ceste, abriu um corredor através do Canadd e do norte dos Esta- _ REVISTA _DO_INSTITUTO DO CEARA 7 dos Unidos, dando acesso as grandes planicies americanas, situadas entre o rio Mississipe e aquelas altas cordilheiras. Povoou-se assim aquéle enorme trato virgem do territério estadu- dinense, dominado pelas magnificas pradarias, até entio, opimas e sos~ segados habitats de grandes rebanhos de bisdes selvagens. Com uma nova e ultima reerudescéncia glacial, que culminou ai pelo curso do 25° milénio, o sub-periodo frio conhecido por MANKATO, de novo alargaram-se e espessaram-se as camadas de gélo dos focos ou centros de glaciagio, e, conseqientemente, abriu-se ainda uma vez 0 caminho terrestre da Sibéria, fechando-se, como era de esperar, 0. que ligava as regiées 4rticas com as “Grandes Planicies”. Esta cireunstincia permitiu que outras levas de velhos cacadores asiéticos penetrassem no territério americano do Alasca. Mas, ia agora a espécie humana comecava a modificar-se somati- camente sob 0 imputso de varios fatéres externos e internos de diferen- ciagdo étnica. Preparava-se 0 cadinho de onde surgiriam as atuais ra- gas primitivas da nossa humanidade. Os recentes imigrantes eram ainda dolicoides, mas a cabeca nao se conservara to alta como a dos seus predecessores. Em vez de gran- de estatura, 0 porte era mais modesto que o dos homens da primeira corrente. Os ddvenas chegavam com um equipamento cultural apenas pouco menos primitivo; ainda rudimentarissimo no setor da economia, que continuava com todos os elementos préprios de puros cacadores e co- letores. Mas, ao que se supée, traziam melhores instrumentos de pedra Jascada, porventura conduziam armas bumerangoides e 0 propulsor do tipo mais primitive bem como celtas mais eficientes. aan © MANKATO nfo foi muito duradoiro; com poucos milénios co- megou a declinar pela regressio dos gelos aos seus centros normais, 0 que importava no restabelecimento definitive do caminho do norte. Qs novos prisioneiros do Alasea, apés a caga grande que perseguiam, enveredaram pelo corredor reaberto no sentido do sul, e, logo adiante, vencendo muitas jornadas, depararam com os descendentes da primeira entrada nas “Grandes Planicies”. fstes, j4 afeitos & terra, se tinham difundido por todo o semi continente do norte livre de gelos, e cami- 8 REVISTA DO INSTITUTO DO CEARA nhavam em busea da América do Sul pelo istmo do Panam, ainda des- provido da sua luxuriante vegetacéo holocénica, © POST GLACIAL estabilizava as suas caracteristicas climicas, bem semelhantes as atuais, diferenciando a flora e a fauna conforme as regiées meteorolégicas e edaficas de cada regio. Os homens das duas correntes miscegenavam-se por téda parte onde entravam em contato. De acérdo com as regras mendelianas, um tipo misto, dolicoide, desenvolvia-se com a sua estatura mediana e cabeca moderadamente baixa. Contudo, alguns nucleos humanos se segrega- vam, conservando praticamente imunes a somatologia primitiva, ao passo que das populacées mestigas brotavam homozigoticos que concor- riam para uma marcada persisténcia étnica que se devia conservar ain- da por muito tempo, preservando as fontes iniciais. Ao que parece, os Australoides que aleancaram a América do Sul, taivez ai pelo meado do “Post-glacial”, deviam ser portadores quase exclusivos de genes cruzados. eae Na parte meridional do continente, s6 acidentalmente aparecem tipos puros da primeira corrente entre os invasores que se espalharam primitivamente pela amplitude das terras virgens. Esta gente desceu pela cordilheira andina, perlongando-a para o sul, mas um ramo acom- panhou de perto onde possivel o litoral do Pacifico; outro, atraves- sando a montanha, derivou para leste e sudeste, penetrando nas bacias dos rios Amazonas e Orenoco. Ainda outro ramo, mais ao sul, procurou © divisor das Aguas das bacias do Amazonas e do Paraguai, indo domi- nar o “Planalto Central” do Brasil, a0 mesmo tempo que levas impor- tantes chegavam as planicies chaquenhas. As florestas dridtieas regadas por, caudalosos cursos digua e os pé- ramos frios das montanhas nfo agradavam a éstes héspedes, habitua~ dos as planuras temperadas ou quentes, abertas, largas, claras, com abundancia de caca facilmente perceptivel e acessivel as suas armas rudimentares de limitado alcance. No escuro da mata virgem ou nas dobras sombrias, nos sacos recénditos, nos recessos, angusturas é es- conderijos das serras acidentadas, tudo Thes embaragava a regular aqui- sigio da subsisténcia. Por isto mesmo, s6 acidentalmente demoravam nas montanhas ou no seio das florestas extensas; procuravam sair, logo que possivel, de tais lugares onde se tinham embrenhado incidentemen- te no seu movimento migratério. Buscavam a sozlheira das savanas, das grandes plan{cies e dos pampas abertos, claros, féceis de percorrer e onde se podia alongar a vista dentro de amplos horizontes. REVISTA DO INSTITUTO DO CEARA 9 No entanto, remanescentes, aqui e ali, se adaptaram a certas re- gides mais ou menos agrestes dos Andes e das arenosas e 4ridas cos- tas do Pacifico, ou mesmo, mais raramente ainda, aos bosques menos agressivos das planicies amazénicas. Do “Planalto Central” brasileiro, a expanséo dos australoides, de- pois de larga estada se £2 principalmente no sentido de leste e de su- deste. Os descendentes déstes invasores povoaram as terras aridas de Mato Grosso e Goiés, as planicies do Maranhio, do Piaui e do rio So Francisco, donde passaram as adustas caatingas do Nordeste. Po- voaram as chapadas arenosas e os sertdes pedregosos desta regido, os carrascos, os prados os altiplanos aren{ticos do Brasil a0 longo das costas atlinticas, mais ou menos distantes do mar. Em geral no esti- mavam as praias maritimas; nfo tinham meios praticos de explorar o mar, de que apenas se aproveitavam de alguns moluscos e crusticeos e raros peixes. Evitando as mantonhas mais sombrias e acidentadas, es- tenderam-se por fim do Maranhao a0 Rio Grande do Sul e certas re- gides platinas. Ali, porventura teriam encontrado ramos de povos co- irmGos derivades dos pampas. Séculos depois, premidos por vagas humanas de origens diversas, foram compelidos a estender seu habitat mais para o sul, para as fri- gidas regides da Patagonia meridional e 0 extremo inhéspito do conti- nente. Motivos semelhantes, supée-se, obrigaram-nos a viver nos mais Sridos rincdes e pobres cantingas nordestinas do nosso pais, lutando con- tra a falta de caca e até de 4gua para beber. eae Algumas provas e muitos indicios podem ser apresentados para de- monstrar esta dispersio pré-histérica dos primeiros habitantes do Novo Mundo. Quanto a origem de tais pioneiros, ja se ndo discute a procedén- cia siberiana e a entrada pelo estreito de Bering. Gente de cultura tao rudimentar, decerto, néo teria entio outros meios de acesso. O tipo primitivo da espécie, o australoide que veio, ha tantos milénios, habitar © Novo Mundo, somatica e culturaimente parece ter constituido o fundo étnico da atual espécie humana; {6ra o substrato comum da nossa hu- manidade. Dispersou-se por todo 0 mundo entio acessivel as suas pa- cfficas investidas. Vestigios da constituic&o organica e dos seus ele- mentos de civilizagio colecionam-se cada dia mais numerosos e mais 10 REVISTA DO INSTITUTO DO CEARA expressivos da Europa.a Tasmania, da Sibéria a Africa do Sul, da india a Patagénia. Era como um tronco robusto da arvore da espécie que mais tarde se foi diferenciando em racas e sub-racas, em tipos e sub- tipos étnicos. Arvore cuja copa sombreou a face do globo terrestre s0- bre que estendeu os seus ramos. Enquanto éste fenémeno se processa- va, um outro de grande importancia também ocorria: a extingao de quantas outras espécies se tinham criado em térno do G@NERO HU- MANO. eas Assinalam o itinerdrio das migragées americanas primitivas balizas inconfundiveis e numerosas. Umas mais tipicas, outras menos sugesti- vas, mas nunea destituidas de aprecidvel valor. Dentre aqueles marcos e balizas algumas caracterfsticas antropolé- gicas que nos legaram povos, pelos etnégrafos surpreendidos ainda num estdgio inferior de vida, se enfileiram no primeiro plano; elementos de cultura por demais arcaicos que se conservaram através de milharesde anos e resistiram quase incélumes aos contatos de outras culturas mais evoluidas representam provas vivas, testemunhos brilhantes do passa- do pré-histérico. Aqui esté uma tribo importante e vultosa que nunca praticou a agricultura e usou ceramica de qualquer espécie; ali, outra que desco- nhecia 0 arco e a flecha. De ndo menor valor demonstrativo figuram os mitos e os ritos, as ceriménias religiosas que os selvagens executam com © méximo respeito e solenidade, traduzindo os mais antigos sen- timentos das épocas da criagdo do mundo, e por cujo contexto se apre- cia muita vez, com rigorosa certeza, origens étnicas de variados povos, inclusive dos cacadores primitivos. E, ao lado disto, af esto as pre- ciosas colecdes de objetos paleoliticos que pejam os muscus, proveni- entes das mais estranhas e remotas paragens. . Entretanto, ainda uma outra ordem de provas existe que deseja- mos acentuar aqui de modo especial. Importa fazé-lo com tanto mais énfase quanto € certo que jamais, ou muito raramente, foram invoca~ das, ao menos com o apréco que merecem. Sobretudo, naquele baliza- mento de caminhos e de estagdes pré-histéricas, sem duivida os mais ar- caicos déste continente, destacam-se as inscrigées rupestres auténticas que os primitivos tracaram com inerivel trabalho e canseiras na super- ficie das rochas mais duras, expressando sentiments religiosos talvez ainda para propiciar as suas divindades. stes monumentos se escalonam através da América do extremo norte ao extremo sul, da Sibéria ou do Alasca a Patagénia, irradiando- se dessa cadeia dorsal para todos os lados, em tédas as direcées, oblite- REVISTA DO INSTITUTO DO CEARA i rados, rareando ou distanciando-se em certos lugares, mas concentran- do-se noutros. Esta mesma disposigiio é indicativa de fatos curiosos que investigagdes judiciosas poderiam esclarecer com muito proveito para a ciéncia. Pode-se supor que por ali, onde as lit6glifos se distan- ciam, as levas migratérias passaram mais rapidamente, e que, por aqui, onde éles se acumulam, elas estacionaram longo tempo. ‘As discriminagées de estilos e definigdes de sinais especiais ofere- cem um campo vasto, quase infinito, para o exercicio perquiridor dos sabies. H4 muito que explorar néste setor da pré-histéria americana, quia mesmo da pré-histéria do VELHO MUNDO. eee Possuimos duas preciosas inscrigées rupestres siberianas de estilo geométrico puro; uma composta de elementos retilineos e outra de si- nais especialmente curvilineos. Ambas copiadas de rochedos de IRYTCH por Spassky e reproduzidas por Jaques Morgan na sua célebre obra “L'Humanité Préhistorique” 4 pagina 276, da edico de 1924. De maneira altamente impressionante, inscrighes semelhantes, do mesmo estilo e tipo, se reproduzem em penhas e cavernas das provin- cias ocidentais dos Fstados Unidos da América do Norte. O mesmo se verifica também em certas regides da Colémbia e do Brasil, do Uruguai, dos Pampas argentinos e da Patagonia, No nosso pais se acumulam nos penhascos e grutas ou lapas do “Planalto Centra!” e particularmente no Nordeste, em os estados do Ceara, Rio Grande do Norte, Paraiba, Piaui Pernambuco; mas néo faltam em certos sitios da bacia do Amazénas, do rio Séo Francisco e do Parané e Paraguai. Encontram-se com facies tipico onde quer que os australoides primitivos e seus primeiros des- cendentes se instalaram no solo americano. Constituem mesmo um in- dice relativamente seguro da presenca pré-histérica dessa gente num pais do Novo-Mundo. Outros estilos podem caracterizar outros elementos étnicos de di- ferentes origens, mas 0 estilo geométrico puro ou mesmo com certos elementos realisticos bem conhecidos indicam atividades religiosas dos paleoliticos americanos, pioneiros e seus descendentes, do povoamento cesta parte da superficie terrestre, nos ultimos estagios do Pieistoceno pelo Post-glacial afora. Até mesmo em épocas relativamente recen- tes, em algumas escusas regides do Globo, remanescentes daquele povo gravavam ou pintavam simbolos sacros nas pedras ou conservavam re- ligiosamente os que os seus maiores lhes legaram, reavivando-os cui- dadosamente no curso de solenes ceriménias. Nao se permite hoje duvidar da origem religiosa das itiscricées ru- 2 REVISTA DO INSTITUTO DO CEARA pestres auténticas. As relagdes agora conhecidas entre religiio primi- tiva, mito, rito e inscrigdes so numerosas e de carater positivo; tio ex- pressivas que impéem aquele asserto. Pensamos que as inscri¢bes nfo 0 foram inventadas para fins religio- sos. Os primeiros ensaios realizados nas areias imidas das praias ou pintados nas cascas das arvores ou outros lugares de facil acesso ¢ tra~ to comum nio passavam de jogos ou divertimento infantil, senéo mes- mo de recreaco de adulto em raros momentos de folga, em circuns- tAncias especiais. Por vézes teriam caréter comunicativo efémero. Sd- mente mais tarde descobriram os primitivos que éstes desenhos ofere- ciam um modélo util para o registo ou representacio de fendmenos re- ligiosos, asstnto que tanto os preocipava e a que davam o melhor das suas atividades espirituais. Desde entéo, de brinquedo efémero passaram as inscricées a fins mais sérios; adquiriram real e profundo valor de expressio. Mas, para um tal objetivo, j4 nao bastavam as figu- racées passageiras, que 0s ventos ou as chuvas desmanchavam. Torna- ra-se preciso dar estabilidade, durabilidade apreci4vel, eternidade aos simbolos sagrados. Dai, as verdadeiras ou auténticas inscrigdes rupestres da pré-his- téria. stes extraordinérios monumentos que desafiam o desgaste das intempéries por milénios e custaram aos seus autores sacriffcios incri- veis, ainda hoje se apresentam & nossa apreciacio e admiracdo, por quase todos os recantos do mundo outrora habitado pelos australoides primitivos os seus descendentes aes © exame atento de tédas as inscrigdes arcaicas do Velho como do Novo Mundo, aquelas que se reconhecem como auténticas criagdes dos primitives, revela insofismavelmente certos carteres comuns, siste- miticos e significativos. Mostram que foram executadas obedecendo a um sistema de inspiragio transcendente, visando determinados e andlo- gos fins. Quando os colonizadores europeus, nos séculos XVI e XVII entra~ Tam em contato com remanescentes australoides, as tribos puramente eacadoras, em qualquer regio do continente americano, éles, em geral, 34 ndo gravavam nem mesmo conservavam ou reavivavam as velhas inscrigdes; nada sabiam a respelto da sua significago. Para alguns eram as inscriedes rupestres obra de suas divindades em os tempos pri- mitivos e por isto mereciam veneracéo; para outros, inspiravam terror e delas se afastavam supersticiosamente; enfim, para um grande ni- mero pareciam indiferentes. Investigagées modernas revelaram entre- REVISTA DO INSTITUTO DO CEARA 13 tanto que em alguns lugares raros alnda os indigenas em certas ¢ deter- minadas circunstancias desenhavam carateres especiais nas rochas. No interior da Austrélia, viajantes recentemente surpreenderam os mais afastados grupos de primitives gravando em rochedos especials simbo- Jos sagrados ou reavivando velhos sinais de grande significacao para ales. Na América como no Velho-Mundo, os petrégrafos perderam com- pletamente a sua significacio primitiva, fossilizaram-se. De instru- mento de expresséo resultaram com o perpassar dos séculos em simples curiosidades pré-histéricas a desafiar a perspicécia dos sébios. & de supor que em alguns lugares, antes de atingir a extinco da sua signi- fieagdo primitiva, hajam degenerado, vindo a ter com o tempo signifi- cacées diferentes, porventura de caréter utilitério. De algumas destas, em pontos diferentes e raros, parece, teriam resultado as pictografias cursivas e destas as escritas antigas e modernas. eee A inscrigdo n. 1, siberiana, (fig. 1), caracteriza-se: 1°) pelo com- plexo de figuras geométricas retangulares, retingulos bissectados; 2°) austneia de friangulos; 3°) retangulos em forma de grelha, simples ou duplos; 4°) retngulos divididos em cruz; 5°) setas e linhas farpadas, ¢ finalmente, 6°) por uma fila de pequenas retas paralelas. A inscrigéo If, (figura 1) earacteriza-se: 1°) pelo seu estilo geomé- trico curvilineo; 20) pelas elipses divididas em cruz segundo os seus eixos; 30) pelas setas; 4°) pela fila de pequenas linhas retas paralelas; e finalmente, 5°) por um figura escutiforme, dividida por uma reta ho- rizontal, sdbre que caem verticalmente duas outras, uma da parte su- perior e outra da parte inferior, sem se corresponderem. Somente nos estados da California, Nevada, Utah e Arizona do oeste dos Estados Unidos da América do Norte, o Sr. J. H. Steward colecionou centenas de inscrigées rupestres semelhantes, mais ou me- nos intimamente aparentadas com aquelas. Dessa preciosa colegso con- amos nunca menos de 170 que apresentam grelhas retangulares como se vé na n° I de Srytch, e outras tantas de grelhas de cont6rno curvo, circular ou elipsoidal. O mimero de inscricées com retangulos misseta- dos é ali, também avultado e muito comuns as que encerram elipses cortadas em cruz pelos seus eixos. As filas de pequenas retas paralelas, tal como se encontram nas inscrigdes siberianas, sio freqilentes n0 este norte americano; ndo séo raras as setas simples ou linhas farpa- Gas, e até mesmo aquéle sinal singular em forma de escudo do petré- grafo n° II, aparece com aspecto grosseiramente semelhante na regifo 14 REVISTA DO INSTITUTO DO CEARA considerada. Encontramo-lo com aspecto relativamente bem aproxi- mado em picto-litéglifos do vale Owens, na Califérnia, bem como na tegido de Sao Bernardino (Eegle Pass), numa gruta, em Santa Barbara e em poucos outros sitios. see No sul do México e principalmente na regido do istmo as inscrigdes rupestres do tipo puramente geométrico rareiam. Aquem, no territério colombiano reaparecem mais ou menos freqlientes e carateristicas. Conquanto nas inscrigdes da Colémbia néo se encontrem comu- mente os reténgulos subdivididos ou em forma de grelha simples ou dupla, aparecem os quadrados e retangulos simples ou indivisos de varlos tipos e outros sinais deixando claro que os antigos petrégrafos désse recanto sul americano oferecem o mesmo estilo dos litéglifos si- berianos ou norte americanos do oeste. Como exemplos interessantes apresentamos os sinais retangulares da “Pedra do Matrimdnio", con- soante as cépias publicadas por Miguel Friana, em 1920 na revista “El Gr&fico” de Bogoté. Outro exemplo esté nas gravuras das “Piedras de Pandi, onde se acham retangulos subdivididos por linha longitudinal recortada por varias retas horizontais. Aqui a semelhanca é impressio- nante, e maior seria se ndo féra-um indicio de evolugo ave se nota na feitura da inseri¢do em geral, mas, especialmente acentuada em certos detalhes. Assim é que se observam os retangulos secundrios frequen- temente cheios de figuras ou desenhos uniformes, e ndo vazios como aparecem nas inscricdes da Sibéria e do Oeste norte americano. Retangulos e quadrados figuram ainda nas areaicas inscrigdes da fazenda “El Vinculo”, na “Pedra da Leda”, nas penhas de “Corrales” onde os hé particularmente iguais aos siberianos, na “Pedra de El Am~ bucal” e nas “Pedras de Cali”. Nesta ultima séo comuns os retangulos bissectados conforme documentam as eépias publicadas em 1922 por Miguel Triana, na sua curiosa obra “La Civilizacion Chibcha”. O territério colombiano foi primitivamente um centro de conver- géncia e logo depois de dispersio humana. Ali chegavam os descen- dentes dos siberianos das duas primeiras correntes migratérias; milé- nios depois outros imigrantes asiaticos, pré-malaios € proto-polinésios, por via paramaritima ou maritima; aqueles, talvez vindos do istmo onde teriam chegado porventura apés um longo perlongar de costas na América do Norte e éstes diretamente através do oceano. Os primeiros advenas de cultura paleolitica simples nfo se adaptavam as regides montanhosas e em geral pouco por ali demoravam na sua marcha para © sul ou para o leste. A evolugao observada nos pictégrafos ou litégli- fos da Colombia em relagdo aos tipos mais primitivos da Sibéria ou do REVISTA DO INSTITUTO DO CEARA 15 ceste norte americano, traduzida num melhor acabamento das figuras, mais acurada imaginacio e em certos enfeites muito rudimentares dei- xa, efetivamente, a impressio de que sio relativamente mais modernos do que os acima referidos ¢ muitos outros do centro e leste brasileiros, dos Pampas e da Patagénia. Ao que parece, a Colémbia era para éstes primitivos apenas uma passagem obrigatoria, onde a demora devia ser t&o breve quanto possivel, pois a natureza geografica da regio contra- riaya rudemente ao seu sistema de vida. S6 um pouco mais tarde re- manescentes déstes elementos das primeiras correntes de australoides que se habituaram mercé de circunstancias especiais de dificil previsio, A terra montuosa e fria, insereveram nos rochedos e lapas os seus sim- polos religiosos, os quais, ndo obstante o decurso dos tempos, guardam ‘0s mesmos modelos caracteristicos dos que gravaram os seus maiores, antes ou contemporaneamente em outras regides distantes. Na sua marcha para o sul, os australoides primitivos, de etapa em etapa, alcancaram 0 NW da Repiblica Argentina, e em seguida, sucessi- vamente, 03 Pampas, a Patagdnia e a Terra do Fogo. Para leste e su- leste foram ter ao Brasil Central ¢ dali passaram ao Brasil Oriental, des- cendo paralelamente a costa até 0 Uruguai. Nas rogides onde mais cédo se instalaram, as inscrigdes rupestres sio mais numerosas e apre- sentam um expressive facies de arcaismo ou antes de verdadeiro pri- mitivismo, que as fazem rivalizar de perto com as do Oeste norte ame- ricano ¢ da Sibéria. Isto, sem dirvida, resulta do fato de que, a0 por ali chegarem, traziam ainda bem vivas as suas tradigées religiosas pri- mitivas. Comprova-se a assercio notando-se que os retngulos caracteristi- cos se apresentam com notavel freaiiéneia ao lado das elipses subdivi- didas, das séries de pequenas retas paralelas, de setas e linhas farpa- das @ mesmo de escudos ou figuras escutiformes com campo tetradivi- ido mais ou menos irregularmente. No Noroeste da Reptiblica Argentina e nos Pampas em geral as inserigdes rupestres puramente geométricas avultam em nimero ao indo de outras muito mais modernas, de estilo inconfundivel, evidente- mente de origens diferentes. . No lugar “Cerro Colorado”, no NW. da Argentina, Gardner, em 1931, colheu entre outras uma inscrigdo em que se observam varios re- 1angulos subdivididos e outras figuras lineares do puro tipo siberiano. Igual ocorréneia se apresenta também mais ao sul, como, por exemplo, na “Piedra Pintada”, situada 4 margem do riacho “Vaca Mala”, jf em territorio da Patagénia. Normalmente, nas inscrigées rupestres desta afastada regiéo sul americana, verdadeiro fundo de saco do continente, néo faltam os retangulos e as séries de pequenas retas paralelas. 16 REVISTA DO INSTITUTO DO CEARA Depois déste breve escérco pelos dominios petrograficos da regiio ocidental da América do Sul, h4 que examinar os lito-pictégrafos bra- sileiros em face de suas semelhangas com os siberianos indicados e os do oeste norte americano. No estudo das inscrigdes brasileiras, importa sobretudo comparar as da regio nordestina, particularmente rica em simbolos primitivos de estilo puramente geométrico. No “Planalto Central”, que se admite teria sido o primeiro largo pouso brasileiro dos australoides, encontram-se inscrigées rupestres tipieas, do mesmfssimo estilo das siberianas ou norte americanas. No litéglifo da “Praia da Loja”, por exemplo, & margem do rio To- cantins, (Goids), deparam-se, além do estilo geométrico caracteristico, a elipse dividida pela cruz axial, tal como na inscrig&o n° II, de Iryteh, Nos litéglifos de “Belo Horizonte”, “Sio Gongalo” e “Nazaré”, em ro- chedos nas margens do rio Xingu, achamos retangulos concéntricos, bissectados e divididos em cruz; no litéglifo da ilha dos “Martirios”, no rio Araguaia, na altura aproximada de 6° 22° de lat. sul, ainda nos de- paramos com elipses daquéle mesmo género e retangulos subdivididos. ‘Nas pedras da cachoeira de “Itamaracé”, no rio Xingu, existe uma in- teressante inscrigdo, copiada por Ferreira Pena e depois por H. Cou- dreau em 1897, em que estéo desenhados numerosos reténgulos e uma figura que lembra a elipse subdividida pelos seus eixos. No nordeste do Brasil, as inscricées rupestres de estilo geométrico no 56 existem em nimero avultado como também oferecem um grau de semelhanga mais acentuado com as de Irytch e, especialmente, com as norte americanas dos estados ocidentais. Elas deixam supor que a passagem ou antes a estada dos descendentes dos australoides que pri- meiramente penetraram na América do Sul fora demorada nesta regifo , ainda que, éstes teriam sido parte integrante dos primeiros ramos que se dispersaram ao transpor 0 istmo do Panamd4. As migracées sé se reallzavam lentamente. Um ramo que se destacava da Colombia, ou de regio mais ao sul, para alcangar o “Planalto Central” do Brasil preci- sava de alguns séculos; para chegar ao nordeste brasileiro, carecia de outros tantos, 0 que significa que nesse percurso as geragées se suce- diam. ‘A impressionante similitude dos picto-litéglifos observada acima sugere que as levas que chegaram aos sertées entre os rios Séo Fran- cisco ¢ Parnaiba o fizeram alguns milénios AC, Blas traziam ainda im- pressGes muito vivas dos seus complexos culturais primitives. Qs imigrantes pioneiros do Nordeste, principalmente os que se es- REVISTA DO INSTITUTO DO CEARA 17 tabeleceram na Paratba e Cearé, abriram e pintaram inscrigdes que trazem o estilo criado na sua patria original, no Velho Mundo, com al- guns simbolos expressivos bem conservados através de milénios, sim- bolos que, pela sua estabilidade extraordindria, deviam ter uma alta significacdo religiosa. As nossas inscricdes niio sdmente encerram ésses earacteres fundamentais ou de base, complexo comum da estirpe, como se devem ressentir naturalmente, das influéncias modificadoras ou aci- dentais experimentadas, néste setor especial da cultura, através do longo percurso extra e inter continental. Inspiragées introspectivas, es- {imulos da variedade e singularidades de mesologia césmica, decerto, agiram na morfologia e significacia das inscrigdes antes que estas se fossilizassem, estado em que as encontraram os colonizadores europeus. © estudo analitico déstes monumentos pré-histéricos ha de ter em consideracao tais circunstancias. Importa definir aquéle fundo comum, @ mais arcaico, € caracterizé-lo, Cumpre determinar com suticiente precisio as alteragées evolucionais, as suas causas e valor. Disto néo se cogita aqui. No Ceard, as pictografias do planalto dos Inhamuns, especialmente, concentradas no angulo norte-oriental do municipio de Taué, oferecem © mesmo estilo e até, comumente, os mesmos tracos e figuras principais das inscrigées do ocidente norte-americano e a comovente impressio de quase identidade com as da Sibéria. Em 25 das 38 inscricées do Inhamuns que conhecemos encontram- se retfingulos simples, bissectados, divididos em cruz, em greiha sim- ples ou dupla, unidos de varias maneiras como os que se observam nas duas inserigdes asidticas. # interessante consignar que o tipo bissectado da inscricio siberia- na n® 1, ocorre em 11 € 0 tipo subdividido por uma cruz aparece em 5 Porém, ainda mais notével € 0 caso do sinal retangular em grelha que encontramos 5 vézes reproduzido na insericio siberiana e se repete em 8 das cearenses, sendo que nestas também vemo-lo algumas vézes figurando na mesma pictografia. As séries ou filas de pequenas linhas retas paralelas aparecem em 21 daqueles petrégrafos dos Inhamuns; ¢ as setas bem como as linhas com farpas sfio comuns em algumas. Verifica-se que todos os sinais importantes da inscrigéo siberia- na n® 1 se encontram nas do planalto dos Inhamuns. Relativamente a outra inscricio siberiana, de estilo geométrico curvilineo, as semethancas e certas identidades também s&o impressio- nantes. Ocorrem elipses em 11 das nossas inserigdes, sendo que em uma Gestas a elipse estd dividida em cruz pelos eixos, como naquela. Jé 18 REVISTA DO INSTITUTO DO CEARA vimos que sio comuns aqui também as pontas de flecha ou setas ¢ ag linhas com farpas, assim como, igualmente, a série de pequenas retas paralelas. Passando ao estudo comparativo de outros lito-pictogra- fos nordestinos continuamos a encontrar ainda curiosas semelhancas e identidades. No interessante grupo de litéglifos do médio Banabuit nos deparamos com caracteres numerosos idénticos ou mais ou menos comparaveis. Os retangulos bissectados e divididos em cruz aparecem nas inscrigdes do “Giqui”, no rio Quixeramobim e nos de Caicarinha, Rinaré e Fonséca do rio Banabuit. Os retangulos em grelha ocorrem n&o sdmente no “Giqui”, especialmente num grupo que copiamos no interior de um grande caldeirdo, ainda como em Caicarinha, Cruxutu. e Rinaré. Numa pictografia da serra do Urucu (municipio de Quixad&) estéo desenhados retangulos bissectados, e 0 mesmo ocorre nas inscri¢des do rio Pirangi, nos lugares conhecidos por Vaca-Morta ¢ Quinxinxé. Séo ainda estas figuras observadas nas inscrigdes do rio Aracati-acu, nas do baixo Jaguaribe e do norte do Estado, nos litoglifos de Itacoatiara (municipio de Coreaa), etc. Os retangulos partidos em cruz e sobretu- do as grethas retangulares simples e duplas sio mais comuns. Vemo- Jas no baixo e médio Jaguaribe nas inscrigdes de “Dois Serrotes”, “Bar- rinha”, “Lagoa das Pedras Pintadas” e no norte do Estado, nas inscri- des do “Aracati-acu", de Ubatuba, no lugar “Pirapora” e varios outros sitios. No Estado do Rio Grande do Norte, na Paraiba e em Pernambuco abundam inscrigdes de estilo geométrico e nelas ocorrem aquéles si- nais caracteristicos das inscrigdes siberianas. Os retangulos simples, bissectados, divididos em cruz ou em forma de grelha aparecem nos lit6glifos de “Pedra Lavrada (Sabogi), na pictografia da “Gruta do Letreiro” (Catanduba), na de “Pedra Ferrada” (Porta Alegre), na do “Poco das Caraibeiras” (Serid6), na de “Solidade” (Apodi), tédas no Rio Grande do Norte. Na Paraiba e Pernambuco, éstes sinais se apre- sentam nas inserigdes de “Belém”, “Vinagre”, “Fechado” do municipio de Brejo do Cruz, no litéglifo de “Ingé” (Paraiba); no petréglifo de “Limoeiro” e do “Caldeirio” (Pernambuco). As filas de pequenas retas paralelas mostram-se muitas vézes nos estados referidos, mormente nas inscrigdes paraibanas das proximida- des de Cabaceiras. As elipses simples ou divididas pelos seus dois dia- metros, to caracteristicas da inscricio n° II de Iryteh, também apare- cem nos trés Estados com relativa freqiiéncia. Observa-se um sina} singular, tinico da inscricfo n° II, de Irytch. % a figura de contérno escutiforme, cortado transversalmente por uma reta mediana horizontel, sdbre a qual caem verticalmente duas outras, _ REVISTA DO INSTITUTO DO CEARA 19 uma 4 direita na parte superior e outra a esquerda na parte inferior a que ja nos referimos. fste simbolo é muito curioso e raro, sobretudo com 0 aspecto idéntico do que vimos de descrever. Exatamente nestas condigées nfo aparece no este norte americano nem na Colémbia ‘Vamos encontré-lo com impressionante semelhanga no Ceara em duas ou trés inscrigées da regiio do médio Banabuii, particularmente ex- pressivo num dos litéglifos do riacho “Fonséca” Em cérca de 300 inscrigdes da América do Norte que examinamos nao achamos éste sinal com a forma precisamente original. Entretanto, no nordeste do Brasil encontra-se com sensivel semelhanga, tendo a forma de escudo, mais ou menos grosseiramente circular ou elipsoidal, deixando supor que existe um intimo parentesco entre o tipo desta re- ido eo siberiano. No Ceard, as formas mais préximas do elemento ori- ginal siberiano se encontram nos lit6glifos do Cruxatu, do Fonseca e do Giqui. Também aparece, mais ou menos ligeiramente modificado, na pictografia do “Senegal”, nos litéglifos de “Vaca Brava” do Pirangi e nas inserie¢des do municfpio do Brejo do Cruz, na Paraiba. Fora do nordeste brasileiro, em qualquer outra regiao do Pais, ou mesmo continente sul americano, éste simbolo rupestre, se existe, deve ser muito rare. Em mais de 500 insericées que temos examinado nada encontramos de andlogo ou capaz de uma comparacao de razofvel seme- Thanca, Nao sabemos entretanto se o simbolo das nossas inscrigées é © resultado de um enorme salto através do espago tio grande ou se nfo passa de uma mera coincidéncia, nao encerrando valor maior do que qualquer dos elementos de Ambito regional. Quem esta habituado a comparar inscrigées de Areas muito vastas reconhece que um certo ntimero de sinais tem freqiiéncia universal, constitui um fundo comum as inscrigées auténticas de origem paleo- Utiea. Outros sinais sio de dominio mais reduzido, embora, ainda muito extenso; ha porém os de cunho regional, de Ambito relativamente redu- zido e, decerto, alguns podem ser locais, porventura, mesmo, individuais. O estudo das inscrigdes antigas ou ainda mais modernas como as de origem neolitica, seria rico de revelacdes curiosas, como pequenos ensaios o tém demonstrado. Investigacées cientificas de largo porte, de caréter universal ou mesmo continental, deixam supor que rfeste sentido se permite esperar resultados de grande valor interpretativo, sendo que, ainda, poderfo trazer sob certo Angulo preciosa contribui- edo & histéria da cultura primitiva da humanidade. © estudo da distribuicdo dos sinais para reconhecer os de dominio universal ¢ a reparticio espacial dos de expansio menos vasta, com o auxilio de mapas geogréficos, poderia facilitar o estabelecimento de 20 REVISTA DO INSTITUTO DO CEARA bases s6lidas para uma interessante classificacio dos elementos é ainda, 0 que é bem mais valioso, a discrimig’o de areas em que domi- nam determinados simbolos. Por éste caminho, chegar-se-ia a fixar provavelmente com sensivel aproximacio, os centros de irradiagéo de importantes elementos inscritivos e quicA também poderia nos trazer @ compreensao de migragées de povos ou tribos na longa noite da pré- histéria. Esclarecimentos relativos ao conhecimento de estratificagdes de povos ou de culturas resultariam igualmente claras de semelhante labor cientifico.

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