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OS MILITARES NA POLÍTICA

EXTE A BRASILEIRA:
1964-1984

Williams da Silva Gonçalves e


Shiguenoli Miyamoto

ne a política externa como "o conjunto


Introdução de medidas adotadas pelos diferentes
setores do governo do Estado em rela­
1. Política externa e processo ção com outras entidades que também
decisório atuam na arena internacional, com a
finalidade de promover os objetivos
permanentes dos indivíduos aos quais
política externa é uma das di-
o Estado representa".4
ensões da vida do Estado. E
-

A positiva particularidade desta últi­


por meio dela que o Estado se relacio­
ma definição é não se deter diante do
na com os demais Estados, projetando
clássico par topográfico dentro/fom. Isto
sua imagem e explorando as possibili­
é , não obstante os fundamentos realistas
dades que se oferecem à satisfação das
de sua reflexão, segundo os quais as re­
necessidades da nação.l Para Schle­
singer, Jr., a política externa de todos lações internacionais são ad litreram re­
lações inte"..tatais, Reynolds enfrenta a
os Estados persegue objetivos comuns:
"a defesa da própria integridade e a complexa qU<J6tão da passagem da for­
,, 2 mulação à execução da política externa.
proteção dos próprios interesses ; o
A mais freqüente crítica dirigida aos
,

que difere são as peculiaridades nacio­


nais, JXlis são estas que determinam a realistas, a saber, quem determina os
maneira pela qual o ''Estado concebe e objetivos nacionais, Reynolds respon­
conduz a sua política externa".3 Sem de remetendo ao processo decisório que
contraditar o núcleo dessa idéia, Rey­ se desenrola na arena interna: cada
nolds a amplia e avança sobre algu­ segmento organizado da sociedade e os
mas delicadas questões, quando defi- órgãos da burocracia do Estado (prin-

Estudos Hist6rieos, Rio de Joneiro, vai. 6. ll. 12. 1993, p. 211·246.


212 ESTUDOS HISTÓRICOS - 1993/12

cipalmente OS especializados: diploma­ dos papéis e que agem no contexto de


cia e forças armadas) tem sua própria determinados valores, costumes e
política externa; a partir de sua avalia­ procedimentos com u m grau maior
ção do quadro internacional e de seus ou menor de flexibilidade. As diver­
interesses específicos, cada qual busca sas políticas são influenciadas pelo
maximizar sua parlicipação no proces­ sistema de recrutamento dessas pes-
so de destilação que resulta no ato final 5095 e pela natureza do sistema em

de elaboração da política externa. que elas desempenham seus pa-


,. ,,5
Contudo, uma vez decidida a linha de pelS .
atuação do EJ.tado no sistema internacio­
nal, esta passa a se desenvolver de modo Ou seja, o procroso decisório depende
autônomo. O êxito ou o fracasso de deter­ . da ideologia dos elementos que consti­
minada política externa em alcançar os tuem os segmentos que se fazem repre­
objetivos nacionais ficam a depender não, sentar e d a natureza do regime político
apenas da sua consistência e da coerên­ em que esses segmentos se inscrevem.
cia com que é executada, mas também e Nos regimes democráticos, há abertura
sobretudo da ressonância que obtA;mjun­ à participação de todos os segmentos
to ao sistema internacional na sua tota­ sociais com inter33Se5 na fOimulação da
lidade e junto aos EJ.tados com os quais política externa; a tendência é a plurali­
se estabelecem relações diretas. O cará­ dade de posturas polítõcas e de percep­
ter anárquico das relações internacio­ ções da evolução do sistema internacio­
nais, onde as relações de poder consti­ nal. A existência das liberdades funda­
tuem o aspecto dominante, faz com que mentaia - opinião e organização - posai·
o bom andamento da linha política esta­ bilita a auscultação da opinião pública
belecida depeooa da disponibilidade de por parte daqueles que dela dependem
recursos do EJ.tado. para continuar a atuar na arena política.
A inf01mação é o maior capital que os No sistema político aberto, portanto, o
setores que participam da fo..mulação da proceB.SO funciona com base no diálogo e
política externa possuem, para influen­ na luta política, de acordo com regras
ciar 08 demais e impor 6U9S concepçóffi fiXAS e previamente estabelecidas. O
no processo de elaboração da política grau de influência de cada parte depen­
externa. Por meio da infOl'liIação é pos­ de do valor de S.ISS infol'luaÇÕEe, da ca­
sível analjsar o sistema internacional, pacidade de convertA;-las em políticas
determinar os objetivos prioritários a vãlidas e de persuadir e reverter as pro­
serem perseguidos, eleger os aliados e os posições contrárias. A possibilidade de
adversários e, enfl11l, propor a estratA;gia que uma posição prevaleça de modo ab­
para se alcançar os objetivos. São pois os soluto sobre as demais é eempre muito
setoJ'e5 que têm acesso à maior.quanti­ remota; as inclinações mais fortes são
dade e à melhor qualidade de infonna­ sempre no sentido da composição e do
ções 06 mais aptos a produzir um progra­ consenso. Os objetiv06 nacionais assim
ma de política externa mais co nseqüente apurados aproximam as posições de to­
e, também, mais afinado com o que cem­ dos que, intensa ou episodicamente, par­
sideram ser os ínterccse5 nacionais. ticipam do processo.
Sobre o processo de tomada de deci­ Evidentemente e.a-as características
são, diz Reynolds: referem-6e a urna situação ideal. Em ca­
sos de crise aguda ou de guella, o espaço
liAs decisões são fOl'muladas por pes­ e, principalmente, o tempo do proce<so
soas que desempenham detellllina- são drasticamente reduzidos. De outro
OS MILITARES NA POLfTICA EXTERNA BRASILEIRA 2 13

lado, há as diferenças de fOi1II8S de regi­ poder moderador dos militares e inaugu­


me, que tanto pode ser presidencialista rou uma nova fase, em que estes passa ­
como de gabinete. Neste, o proc..,.;o é ram a exen:er efetivamente o poder de
conduzido pela maioria parlamentar, Estado.6
que é a principal 6adora do governo. Amotivação para0 golpe fundou se na
Naquele, a responsabilidade pela condu­ suposta esquerdização do governo do
ção do proCEiSSO é do presidente, como presidente João Golllart. A quebra da
também é sua a decisão final. De todo hieratti'Jia entre os militares e o surgi­
modo, supõese que SUAS decisões sejam mento de lideranças partidárias, sindi­
tomadas conforme O programa aprovado cais e estudantis, que se desenvolveram
pelos que o elegeram e coneOlme a posi­ à margem do sistema partidário erguido
ção das forças partidárias que o susten­ em 1946, levaram as elites conservado­
tam politicamente. ras a recear a total perda do controle da
Nos regimes autoritários o proc.esso vida política do país. Nesse sentido, o
decisório desenrola-6e num espaço exí­ golpe militar preencbeu as expectativas
guo. Há mais forte ideologização dos ato­ de todos os seto,es que se sentiam impo­
res e tende a prevalecer a posição das tentes para restabelecer o equilíbrio po­
forças que detêm o monopólio do poder lítico, dentro doe Dl8J'0)6 constitucionais
de Estado. A falta de representação e a então vigentes.
censura impedem a influência da opi­ Por outro lado, o que diferenciou esse
nião pública. Nos regimes fechados, os golpe das intervenções almadas anterio­
objetivos nacionais emanam diretamen­ res foi o seu caráter calculista. Conquan­
te dos que manipulam as rédeas do p0- to não houvesse lima estimativa do tem·
der, 06 quais sobrepõem sua pel'repção e po neceasário para concluir a interven·
seus interesses exclusivos 80e interesses çãO, as elites militares contavam com um
gerais da nação. Embora não haja a proglBma de ação, concebido e amadure­
priori relação direta entre o êxíto ou o cido com anteoedência. Dispu nham de
fracasso da política externa e o regime um dispositivo teórico-dou trinário, a par­
que a pratica, nos regimes autoritários a tir do qual tencionavam liquidar a luta
distáncia que separa o centro decisório entre capital e trabalho e promover o
da opinião pública põe em risco a COEsão desenvolvimento do país.
nacional em tempos de crise. Nesses A execução dc","" programa supunha
casos, a crise externa tende a transfor­ a promoção de uma guinada igualmente
mar«! em crise interna, na medida em radical na política externa. A nova orien­
que os opositores do regime enconbaro tação político-diplomática pautaree ia
na arena externa aliados potenciais con­ pelas idéias urdidas no interior da Esco­
tra aqueles que os oprimem. la Superior de Guena, onde Golbery do
Couto e Silva destacava..... como princi­
2. Os militares e a política externa pal articulador teórico. As linhà.s cen­
brasileira trais de seu pensamento achavam-"" ex­
postas numa série de ensaios, escritoe
O golpe desfechado contra as institui­ em finais doa anos 50 e reunidoe num
ções em 1964 encel'l"Ou o breve ciclo de­ volume Geopolítica do Brasil.. A idéia
-

mocrático iniciado em 1946 e alçou a maler de seu dispositivo teórico-doutri­


instituição militar à condição de força nário era a transfOJmação do Brasil em
tutelar do Estado brasileiro. Para o his­ grande potência mundial
toriador Hélio Silva, o movimento de 64 Ainda que esta idéia constituísse um
marcou o fnn do papel tradicional de solo comum a tod08 os ma tizes do pen·
214 ES11JDQS IIISTORlCOS 1993/12

samento militar, as teses geop:>líticas de Unidos reforçado o território sul-ameri­


Golbery rompiam com as defendidas p:>r cano contra os inimigos externos e inter­
Mário Trav85S06 e Everardo Bakheuser n08 e, ao mesmo tempo, protegido o A·
,

nas décadas de 1930 e 1940. A mal"" de tlântico Sul e a Africa Meridional, outro
sua intervenção verificava� em LIês ponto vulnerável da estratégia global do
p:>ntos principais: 1) no plano teórico, Ocidente.
denunciava a geop:>lítica de matri2 ger­ A marca registrada dessa reflexão era
mânica e esp:>sava uma geop:>lítica pro­ a rigidez que imputava à bip:>lariZJIção
cessada nos Estados Unidos, que se des­ do sistema internacionaL Sob essa ótica
tacava pela forte influência realista de maniqueísta, rejeitava a possibilidade
Morgenthau, a qual ele adicionou a te0- de uma opção fora do Ocidente (ciência,
ria cíclico-elitista da história de Arnold democracia e cristianismo) e do mundo
'Ibynbee; 2) S"AS reflexões eram atra­ comunista (totalitarismo e ateísmo). O
vessadas de alto a baixo pela disputa bloco afro-asiático e os não-alinhados na­
ideológica da guerra fria, revelando um da mais representavam do que opções
radical anticomurusmo; e 3) 51135 teses ainda hesitantee pelo comunismo.
geop:>líticas projetavam o Brasil no ce­
Semelhante leitura da estrutura do
nário mundial e não mais apenas no
sistema internacional impunha a idéia
continental, conquanto se mantivesse
da inelutabilidade do reconhecimento
perfilado com Travassos no tocante à
da necessária hegemonia norte·ameri·
necessidade do exercício da supremacia
cana sobre o hemisfério. Ainda que tal
continental.
reconhecimento não devesse significar
Seu projeto geop:>lítico objetivava in­
completa sujeição aos interesses norte­
serir positivamente o Brasil na estraté­
americanos, a natural assimetria das·
gia de defesa do Ocidente. Buscava de­
sas relações deveria ser deslocada em
monstrar que, ao contrário do que se
favor do Brasil, tornando-<l o aliado
pensava em Washington, o Brasil não
preferencial e, em decorrência, o pólo
era uma área completamente imune à
hegemônico regional.
guerra total que se travava no sistema
No que diz respeito à postulação de
internacional. A fragilidade das suas es­
truturas internas tornava-o pelmeável uma cooperação mais substantiva p:>r

à propaganda proveniente do eixo Mos­ parte dos Estados Unidos no desenvolvi­


oou·Pequim. E, como expressou em O mento do país, a intervenção de Golbery
Brasil e a ck(esa do Ocidente, não seria não chegava a constituir novidade no
com discursos sobre as virtudes do livre­ universo conservador brasileiro. Sua ori·
cambismo que as lideranças norte-ame­ ginalidade leside noutro ponto, qual seja,
ricanas iriam solucionar nossos princi­ no fato de procurar demonstrar junto aos
pais problemas. Antee de tudo, essas Estados Unidos a grande serventia es­
lideranças teriam de adlnitir a grande tratégica que o Brasil p:>deria ter, deade
imp:>rtância do Brasil para a estratégia que bem apetrechado militaImente e in­
de confronto com o mundo comunista. serido num programa desenvolvimentis­
Admitida essa imp:>rtância, deveriam os ta de co-responsabilidade norle-america-·
Estados Unidos cooperar no sentido de na. Para melhor dizer, tratava-se de evi­

promover o fortalecimento da economia denciar o im prrr;cindivel ganho estraté­


nacional e, também e principalmente, gico que os Estados Unidos poderiam
preencher as enonll€6 carências nacio-­ obter, ao reforçar"" I!"tencialidades geo­
nais de instrumentos de defesa. Cumpri­ p:>líticas do Brasil. E essa fOl'malização
do esse programa, teriam os Estados geop:>lítica que interpretamos como uma
OS MILITARES NA POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA 215

inserção positiva na estratégia norte­ independente que vinha sendo desen­


americana no período da guelra fria. volvida desde a posse do presidente
O caráter autoritário do regime mili­ Jânio Quadros, em janeiro de 1961.
tar pel'mitiu que esse programa fosse Não há dúvida de que seria pecar por
levado a efeito até que se esgotassem as exagero afilmar que o quadro político
suas possibilidades. A partir do momen­ interno distendeu-se até a ruptura por
to em que ficou configurado que as con­ callsa da política externa independente;
tradições e os deslocamentos na con"la­ até mesmo porque esta foi muito mais
ção de forças do sistema internacional espetacular e traumática para as cor­
tornaram este programa de desenvolvi­ rentes políticas conservadoras no breve
mento incompatível com o objetivo de período do governo Jânio Quadros do
fazer do Brasil uma grande poténcia,
que no período um pouco mais longo de
procedeu-se a uma maior abertura do
João Goulart. Exemplo disso foram as
espaço no interior do qual se processa­
relações com os Estados Unidos, que
vam as decisões.
Goulart procurou sempre conduzir com
A crise internacional que inteJ'Jom­
moderação, certamente para não açular
peu o crescimento acelerado da econo­
ainda mais a hostilidade dos opositores
mia brasileira, portanto, não só obrigou
do seu governo e, também, para evitar
a inauguração de um p rocesso de aber­
um provável bloqueio econômico como
tura do sistema político, como também
retaliação.
detelminou uma participação mais efe­
Por outro lado, não é inconeto dizer
tiva da diplomacia e do empresariado, o
que a encarniçada luta política interna,
que, fmalmente. rompeu com o monopó­
agravada no período final do governo
lio até entáo exen:ido pelos militares no
processo decisório. Goulart, foi fortemente influenciada pe­

Sumariando essas considerações in­ los rumos tomados pela política externa.

bodutórias, devemos esclarecer que este Da mesma fOl'ma que a sociedade brasi­
ensaio não objetiva uma análise comple­ leira se dividiu perante as opções de
ta de todos os aspectos da política externa organização política e sócio-«x>nômica
no período dos governos militares. Nos­ que as duas correntes polítõcas antagô­
sas pretensões são mais modestas. Pre­
nicas ofereciam, dividiu--se em relação às
tendemos táo-somente abordar o desen­ propostas de política internacional. As
volvimento da política externa no la!"o pre missas que i nfOllla
l vam as percep­
de tempo referido, destacando a percep­ ções do sistema internacional e, conse­
ção e a ação política diretamente ligada qüentemente, as definições a respeito
ás linhas estratégicas fixadas pelos mili­ dos aliados e adversários pareciam, aos
tares brasileiros. olhos das duas forças políticas oponen­
tes, mutuamente excludentes. Assim,
política interna e política externa, na­
quele momento de confronto, achavam­
1. Governo Castelo Branco: a se indissoluvelmente ligadas; haja vista
vitória dos círculos concêntricos a incruenta batalha travada em torno
das relações diplomáticas com o entáo
A política externa brasileira inau­ jovem regime socialista cubano,7 que
gurada em abril de 1 964, portanto no funcionou como um verdadeiro divisor
início do ciclo dos governos militares, de águas para os defensores da política
representou uma agressiva e radical externa independente e seus inconfor­
guinada em relação à política externa mados adversários.
216 ESTUDOS 1�ISTÓR1COS - 1993lt2

Devido a essa polarização de concep­ em 31 de julho de 1964, no Instituto Rio


çõee de política externa, adensada por Branco:
lima intensíssima e inédita participação
da opinião pública, os primeiros passoo I�O presente contexto de uma con­
empreendidas peloe elaborado"", e exe­ frontação de poder bipolar, com radi­
cutol"" da política externa do primeiro caI divórcio político-ideológico entre
governo militar foram marcados por um 08 dois respectivos centt08, a preser­
tom acentuadamente emocional. No en­ vação da independência pressupõe a
tanto, passa da a ressaca do golpe e de­ aceitação de um certo grau de inter­
monstrada aas adeptoe da nova ordem a dependência, quer no campo militar,
disposição de rejeitar tudo que lembras­ quer no econômico, quer no IX>lítico."
se a política externa do antigo regime, o
emocionali.smo cedeu lugar a uma pos. Mais adiante, acrescentou:
tura mais racional de defesa dos inteles·
ses nacionais. Além do que, havia a pre­ "O interesse do Brasil coincide, em
mente necffiSidade de se apagar todos os muitos casos, em círculos concêntri­
vestígios deixados pela experiência an­ cos, com o da América l.s.tina, do
terior, para que o programa de política continente americano e da comuni­
econômica concebido por Otávio Gou­ dade ocidental. Sendo independen­
veia de Bulhões e Roberto Campos, mi­ tes, não teremos medo de ser solidá­
nistroo da Fazenda e do Planejamento, rios. Dentro dessa independência e
pudesse surtir o efeito desejado. Nesse dessa solidariedade, a política exte­
sentido, a reaproxima ção com os Esta­ rior será ativa, atual e adaptada às
doe Unidos foi cercada de hiperl>ólicas condições de nosso tempo bem como
declaraçõee de fidelidade irrestrita ao aos problemas de nossos dias. Será
bloco ocidental, de reconhecimento da esta a política externa da Revolu-
insubstituível hegemonia norte-ameri­ - ,I!
çao.
cana e de condenação a todo e qualquer
tipo de abordagem soviética aos países Isto equivale a dizer que a política de
do continente. feitio nasserista (nãcralinhada) pratica­
Em sintese, com a instauração do da por Quadros e Goulart foi prontamen­
governo Castelo Branco criaram-se, fi· te substituída por uma outra que situava
nalmente, as condiçõee que possibilita­ o conflito I..es te-Oes te como eixo central
vam a oficialização das diretrizes de p0- do sistema internacional de poder.
lítica externa concebidas e recomenda­ A luz dessa incontornável disjuntiva
,

das pelos teóricos da Escola Superior de - bloco ocidental (capitalismo, democra­


GueJ'ra desde a década de 1950. A partir cia, cristianismo) versus bloco comunista
de então, as decisões governamentais (comunismo, totalitarismo, ateísmo)-o
referentes à política externa passaram a novo governo lançou-se à aplicação de
ser tomadas no espaço restrito do Con­ sua estratégia de segurança e desenvol-
selho de Segurança Nacional8 Os seg­ . 10 . ,- que .
vunento, o par de concelLU:) VInCOU
mentos sociais organizados e a opinião o ideário do regime recém-instalado.
pública, ao terem sua participação no A ordem da expos ição doe telmas que
procCbso de decisão confLSCado, torna­ IbSumiam a estratégia internacional, se­
ram se meIos espectadores da política gurança em prime iro lugar, desnudava o
externa nacional. ângulo de visão atravês do qual oe mili­
Essas diretrizes foram assim expri­ tares brasileiros avaliavam as principais
midas pelo presidente Castelo Branco tendências do sistema internacional e o
OS MILITARES NA pOLinCA EXTERNA BRASILEIRA 2 17

papel que o Brasil nele deveria d"""mpe­ das tensões do tDpo para a base do siste­
nhar. Nessa ótica, a corrida armamentllr ma, que transfOlIll8va o Thn::ei ro Mundo
ta e o empate nuclear entre os Estados em área e veículo do confronto.
Unidos e a União Soviética evidenciavam NaAmérica Latina, a inquietação era
a inanidade de lIma estl-atégia de defcs� provocada pela gradativa consolidação
centrada no conceitD de independência da posição de Fidel Castro. O compro­
inastrita. Semelhante concepção estaria misso que 08 noJte..american06 ass umi­
reservada apenas aos Estados que dispu­ ram com os soviéticos, de reoonhecer a
sessem de um dispositivo nuclear. Aos legitimidade do regime cubano, criava o
demais, não nuclearizadas, nada lustava risco de fazer de Cuba um pólo gerador
senão resignarse e admitir a ne<R�ida­ de instabilidade no continente sul-ame­
de de operar uma flexibilização do con­ ricano. Esse desconforto aumentou con­
ceitD de independência, de modo a me­ sideravelmente quando Fidel Castro fez
lhor capacitar-se para lespooder ao de­ a convocação da III Conferencia de Soli-
, ,

safio "da força subversiva e expansionis­ dariedade dos Povos da Africa, Aeia e
ta do mundo comunista". Ajustando as América Latina, a denominada Confe­
noções e conceitDs da esfera diplomático­ rencia Tricontinental de Havana, em ja­
estratégica à realidade de completa in­ neiro de 1966, com o objetivo de definir
terdependência da econOlnia capitalista, a agenda da luta revolucionária no Ter­
impunha-se, como um imperativo cate­ ceiro Mundo.
górico, o conceitD de segurança coletiva. No plano extra-continental, a intran­
Assim, dispondo-se a <xx>perar com a es­ qüilidade resultava da incapacidade oor­
tratégia de defesa hemisférica coordena­ te-americana de concluir com rapidez a
da pelos Estados Unidos e, em contrapar­ gueI'l'B no Vietnã.
tida, acomodandose ao abrigo de seu Daí porque a decisâo do presidente
guarda-chuva nuclear, o Brasil poderia Castelo Branco de romper relações di­
ficar imune à agJEssão das forças inimi­ plomáticas com Cuba, em 13 de maio
gas. A segurança coletiva era, pois, con­ de 1964. Logo a seguir a essa medida
siderada a condição previa, indispensá­ de impactD, anunciou-se a disposição
vel, para se caminhar na direção do de­ da administração norte-americana de
senvolvimentD. O fortalecimentD do p0- Lyndon Johnson de reiniciar o fluxo de
der nacional e, por conseguinte, a am­ transferência de capitais para o Brasil,
pliação da margem de independência, que havia sido interrompido em 1963.
para atuar confol'me a estratégia maior Na área compreendida pelo primeiro
de defesa dos vaiaras ocidentais , estavam círculo concêntrico, a estratégia governa­
condicionados a essa assimétrica relação mental previa lima politica de maior a­
de poder com os Estados Unidos. proximação e fortalecimentD dos laços
Aparentemente tal percepção enca­ diplomátiros. Segundo palavras de Cas­
minhava a politica externa brasileira no telo Branco, o governo atribuía particu­
sentido contrário ao das tendências do lar importância à integração latino-ame­
sistema internacional IstD é, enquantD ricana. Em seu discurso no lnstitutD Rio
os fOImuladOl"" brasileu06 trabalhavam Branco, anunciou que a orientação con·
com uma perspectiva de acirramentD da sistia em:
guel'Ia Cria, no cimo da hierarquia as
dlJQB superpotências encenavam a crise "estreitar em todos 05 campos as re­
dos mísseis com a abertura de lIm amplo lações com todos os países, pelo aper­
diálogo. Porem, o que agitava o sono feiçoamento da convivência econômi­
desses formuladores era o deslocamentD ca e cultural. No que diz respeitD aos
218 ESTUDOS HISTORICOS 1903/12

países limítrofes, esforçar-se para viais entre os dois países e a adequar os


aumentar seus sistemas de comuni­ inter""-SeS do comércio bilateral.
cações e de transportes, de tal modo Mas as relações mais promissoras fo­
que as fronteiras passem a unir-nos ram as estabelecidas com o Paraguai.
efetivamente. li
.. Após o incidente de Porto Coronel Rena­
to, em junho de 1965, quando tropas do
EMa atenção para com os vizinhos do Exército brasileiro se concentraram na.
cone sul traduziu",", no programa de va­ fronteira sob o pre texto de combater o
lorização das potencialidades da ALALC contrabando e supostos guerrilheiros pa­
e na aproximação, via projetos de interes­ raguaios, as relaÇÕES evoluíram no senti­
ses mútuos, com a Bolívia e o Paraguai. do da convergência de interesses. O paSSQ
O primeiro ponto do programa -inte­ decisivo para o bom relacionamento, não
gração latino-americana - não foi bem­ obstante a agitação promovida pela im­
sucedido. Como aBnna Carlos Estevarn prensa paraguaia, foi o acerto final para
Martins, a recusa brasileira a participar a demarcação das fronteiras da região de
de um programa integracionista que ti­ Sete Quedas. Para o sucesso dessa deli­
vesse um escopo estritamente pan-ame­ cada negociação diplomática o governo
ricano, tal como o preconizado pelos for­ brasileiro recol'leu aos bons ofícios do
muladores da política externa indepen­ general Golbery, conhecido como "muito
13
dente, suscitava desconf18nça entre 06 relacionado no Paraguai".
demais governos sul-americanos. As afi­ Superadas as divergências sobre a
nidades então existentes entre os Esta­ questão das fronteiras, assistiu se a um
dos Unidos e o Brasil, e a insistência do aprofundamento das relações brasileiro­
segundo numa convivência interameri­ paraguaias, cujo p:mto culminante oon­
cana, levantavam suspeitas quanto às sistiu nos encontros de chance leres em
possíveis intenções hegemônicas do Bra­ Foz do Iguaçu e em Porto Presidente
sil. As maiores resistências ao projeto Stroess ner, nos dias 21 e 22 de junho de
brasileiro vinham da parte da Argentina 1966, quando então foi assinado o docu­
12
e do Chile. mento Ata das Cataratas. O documento
Com a Bolívia o entendimento fruti­ selava o compromisso de ambos os go­
ficou. Em 23 de julho de 1964, o gover­ vernos de proceder a um levantamento
no brasileiro entregou ao governo boli­ das potencialidades econômicas da re­
viano o trecho da ferrovia Corumbá­ gião do Salto de Sete Quedas, particular­
Santa Cruz de la Sierra situado em mente dos recursos hidráulicos, com a
território boliviano. No ato de entrega finalidade de revertê-Ias em benefício
foi assinado o protocolo adicional ao dos dois países em regime de condomí­
tratado sobre a ligação ferroviária de nio. Com a Ata das Cataratas a diploma­
1938, o qual constituiu o último ato cia brasileira iniciava uma verdadeira
referente ao Tratado de Petrópolis, de intervenção cirúrgica no cone sul, de
novembro de 1903, que resolveu o lití­ largo alcance político, cimentando uma
gio do Acre. definitiva aliança com o Estado para-
gualO.

Depois de um período de expectativa,


que se seguiu ao golpe que resultou na No perímetro do segundo círculo con­
deposição de Paz Estensoro, as negocia­ cêntrico, ou seja, do sistema interameri­
ções retornaram ao ponto que interessa­ cano em sua totalidade, afora as discuti­
va ao Brasil. E, em 1966, foram assina­ das relações bilaterais com os Estados
dos protocolos destinados a aperfeiçoar Unidos, a questão que concentrou todas
a rede de comunicações t.el'Jcstres e nu- as atenções foi a adesão brasileira à
OS MILITARES NAPOÚTICA EXTERNA BRASILEIRA 219

Fo.... Interamericana de paz que inter­ estava ocol'lendo em São Domingw po.
veio na República Dominicana. deria OCOIler em algum país vizinho do
A guel'la civil em São Domingos te­ Brasil, no Uruguai por exemplo, onde o
ve inicio em 24 de abril de 1965, quan­ ambiente político estava conturbado e
do militares partidários do ex-presi­ encontravam",*, exilados importantes lí­
dente Juan D. Bosch, deposto pelos delas brasileu06 depostos pelo golpe mi­
militares em 1963, após sete meses no litar de 1964.
plder, iniciaram um levante para re5� No entanto, apesarda posição de proa
tituir-lhe o cargo. do Brasil na defesa da doutrina Johnson,
Sob o argumento de que se tratava de o governo norte-americano rejeitou a i­
uma conspiração urdida por elementos déia da revisão do Tratado lnterameri­
a serviço do movimento comunista e de cano deA.ssisténcia Recíproca e da Carta
Fidel Castro, o presidente norte-ameri­ de 1948, preferindo uma política prag­
cano 4'ndon Johnson ordenou o desem­ mática em face da conveniência de futu­
barque de fuzileiros navais no pais. A ras intervenções miJitale5, l'6Sguardan­
partir daí a crise adquiriu dimensões do assim seu privilégio de decisão unHa­
continentais e mundiais. temi.
Seguindo os Jl8SSOS da diplomacia dos Paralelamente às negociações com o
Estados Unidos, a diplomacia brasileira Brasil relativas à questão de São Domin­
não só apoiou a intervenção militar, como gos, o plwidente Johnson trooou uma
também procurou assumir a liderança ininterrupta coI"lwpondência com o pre­
da intervenção no âmbito da América sidente Castelo Branco, a quem manti­
Latina. Respaldado pelos votos favorá­ nha informado sobre os desdobramentos
veis da Câmara e do Senado, o governo da guena do Vietnã. &;sa consideração
brasileiro comprometeu",*, a enviar for­ em manter o aliado do sul bem-informa­
ças armadas para integrarem uma Fo .... do a I""peito dos problemas estratégico-
mjlitares norte-americanos naAsia atin-
-

lnteramericana de Paz, comandada pelo


general Hugo Panasco Alvim, com o fun giu o clímax quando, em dezembro de
de restabelecer a ordem em São Domin­ 1965, Johnson sugeriu, por inteJ'médio
gos e afastar a ameaça da constituição de do embaixador Lincoln Gordon, que o
uma nova Cuba na região. Brasil enviasse efetivos militares para
Ao mesmo tempo, o chanceler Vasco combater no Vietnã, com a flnalidade de
Leitão da Cunha envidou esforços no contribuir mais positivamente para o es­
sentido de refol'mar a Carta de Bogotã, forço norte-americano de pacillcação da­
criando uma Fo.... Inte.ramericana de quele país. Certamente para manter·.,.,
Paz perruanente. Segundo teóricos da coerente com as prioridades de defesa do
F.scola Superior de Guena,14 tal medida Brasil, estabelecidas pelos estrategistas
se fazia necessária para evitar que os da ESG, ''Castelo jamais admitiu a hipó­
Estados Unidos perpetuassem a prática tese,limitando se à remessa de provisões
1 6
de ações diplomãtico-militaras unilate­ para a população sul-vietnamita".
rais. A fo.... imaginada pelos estrategis­ No círculo mais amplo da estratégia
tas brasileiros, de acordo com essa visão, de defesa do Brasil, a glande preocu­
transferiria a '....ponsabilidade de deci­ pação relacionava-se ao Atlântico Sul
e à costa ocidental da Africa.
-

sões semelhantes àquela para um foro


multilateral, a OEA. Argumentaram O maior receio de nossos estrategis­
também, a despeito de todos os protestos tas era uma possível instalação de regi­
da opinião pública,15 que a intervenção mes hostis ao mundo ocidental naquela
era necessá ria e inarredáveL pois o que parte do continente africano, ameaçan-
220 ESTUDOS HISTÓRICOS -1093112

do a segurança brasileira na sua imensa sultadoe da Aliança para o Progresso,


fronteira leste. Para demonstrar a exe­ aplesentadoe na N Reunião Anual Ex­
qüibilidade dessa hipótese, recorriam à traordinária do Conselho Interamerica­
experiência histórica da Segunda Guer­ no Econômico Social (eIES). A partir daí,
ra Mundial, quando as forças aliadas as diretrizes da política exte rna revolu­
utilizaram-se do litoral nordestino como cio nária paSSAram a ser flexibilizadas,
cabeça-de-ponte para alcançar o norte gerando sentido desapontamento entre
da Africa, palco de decisivos combates no os defensor"" da rigidez ortodoxa com
,

confronto com as forças do Eixo. que foram aplicadas pelo governo Caste­
Objetivando guarnecer esse flanco de­ lo Branco.
fensivo, reverteuse a orientação política A conclusão fundamental a que che­
desenvolvida pelo governo anterior de garam os técnicos brasileiros sobre os
afastar o país do regime português de resultadoe obtidos pela Aliança para o
Salazar, devido à sua obstinação em Progresso foi a de que 05 números apu­
manter o império colonial a salvo do pro­ rados eram de uma espantosa inex­
Cl'F� de descolonização. Movido pelo in­ pressividade; não se havia sequer atin­
telC6Se geopolítico de assegurar o arqui­ gido o modesto percentual de 2,5% de.
pélago de Cabo Verde e Angola adstrita; aumento da renda per capita no con­
ao bloco ocidental, o governo Castelo junto da América Latina, conforme o
Branco buscou a reaproximação com o previsto na Ca rta de Punta deI Este.
governo português. Após as visitas mú­ Por outro lado, medrou entre os estra­
Plas do chanceler português Franco No­ tegistas brasileu<l6 a decepção a ",speito
gueira e do chanceler brasileiro Juracy da desenvoltura com que evoluía o diálo­
Magalhães, foi mstabelecido o status Cf/UJ go e o entendimento entre Estados Uni­
ante, o que proporCionou ao Brasil, em dos e União Soviética, confinnando coin­
tu".. de seu apoio ao sistema colonial de cidências de pontos-de-vista e convergên­
Portugal, a assinatura de um tratado de cia de posições. Não obstante a guellB do
comércio pelo qual se lhe abriram 08 VIetnã e a crise do Oriente Médio, os
portos coloniais. Nas palavras de Luis observadores oficiais brasileiros pelce­
VIana Filho: biam que as contradições ideológicas en­
tre as duas superpotências perturbavam
'�, para coroar, uma esquadra brasi­ cada vez menos Bllas relações. Em lugar
leira visitou São Paulo de Luanda, da animosidade de outrora, prevaleciam,
em cujas ruas desfliaram nossos ma­ além do tradicional comércio, o fluxo de
rinheiros. Repetia-se o ocorrido tIês capitais e a transferência de tecnologia.
séculos antes, quando outI<l6 solda­ Por outras palavras, davamse conta de
dos brasileiros ali haviam desembar­ que, enquanto os aliadoe menos bem­
cado com Salvador Corn,ia de Sá".17 aquinhoados, como o próprio Brasil, per­
maneciam fielmente impermeáveis a
qualquer envolvimento mais conseqüen­
te com o mundo comunista, o líder do
2. Governo Costa e Silva: a mundo livre, a pretexto do indispensável
diplomacia da prosperidade comportamento realista em face do ini­
migo, usufruía de todas as vantagens que
A passagem da faixa presidencial pa­ esse relacionamento lhe proporcionava
ra o marechal Artur da Costa e Silva em tellllOS de maximização de poder.
deu se no período em que os técnicos do Posta; diante do quadro do sistema inter­
governo procediam à avaliação dos re- nacional e doe insípidos números da aju-
OS MILITARES NA POLíTICA EXTERNA BRASILEIRA 221

da norte-americana para o desenvolvi­ História nos ensina que um povo não


mento, os fOimuladoli>6 brasileiros sofre­ poclerá viver em um clima de segu­
ram um verdadeiro desencantamento rança enquanto sufocado pelo subde­
com o mundo. Afinal, a a nálise deGSe senvolvimento e inquieto pelo futuro.
quadro evidenciava, de maneira inequí­ Não há tampouco lugar para segu­
voca, que a concepção de defesa integlS­ rança coletiva em um mundo em que
da dos blocos, antes prevalecente, estava cada vez mais se acentua o contraste
dando lugar às prioridades nacionais. entre a riqueza de poucos e a pobreza
Essa pronunciada tendência à fragmen­ de mUl'tos."
tação dos blocos manifestava se tanto no
lado ocidental como no mundo comtmis­ Mais adiante:
ta. No Ocidente, as contradições desen­
volvemm se no seio mesmo do seu disp>­ "Daremos, assim, prioridade aos pro­
sitivo militar. A fulta de consenso acerca blemas do desenvolvimento. A ação
da questão da proliferação dos artetatos diplomática de meu Governo visará,
nucleares deu oportunidade à emergên­ em todos os planos bilaterais, ou mul­
cia da politica gaullista de auto-suficiên­ tilaterais, à ampliação dos mercados
cia nuclear {O/oe de frappe e à conse
- -

externos, à obtenção de p reços justos


qüente defecção do comando integlado e estáveis para nossos produtos, à
da arAN; uma política nacionalista que atração de capitais e de ajuda técni­
se somava ao veto ao pedido do governo ca, e - de particular importância -
trabalhista de inglesso da Grã-Bre tanha à cooperação necessária à rápida nu­
na CEE. No mundo comunista, o bloco clearização pacífica do país.
rachou separando Pequim de Moscou. O (...) Ante o esmaecimento da con­
desencadeamento da revolução cultural trovérsia Leste-Oeste, náo faz senti­
na República Popular da China, após a do falar em neutralismo nem em
denúncia de revisionismo e hegemonis­ coincidências e op:>siçóe6 automáti­
mo por parte da cúpula dirigente soviéti­ cas. Só nos poderá guiar o interesse
ca pelos lidelw cruneses, encerI'OU a UIÚ­ nacional, fundamento permanente
dade e aprofundou a disputa pela lide­ ,,18
1 lea externa 50berana.
d e uma pol-tO
rança ideológica junto aos demais paises
comunistas. Enfim, a irn;primível ten­
Como se pode ver, a prioridade havia
dência à diluição dos blOC(>! impunha
passado para o desenvolvimento. Inver­
uma inadiável revisão de curso da políti­
tia se portanto a posição dos termos do
ca' externa brasileira.
binômio com o qual se havia iniciado a
Refletindo a preocupação de adequar política externa revolucionária em 1964.
05 inte resses nacionais brasileiros às
Não mais se condicionava o desenvolvi­
mudanças por que passav a o sistema mento à segurança coletiva. Agora a se­
internacional, o presidente Costa e Silva gurança era vista como um produto do
assim apresentou a orientação que pIe desenvolvimento. E, mais ainda, desa­
tendia imprimir à política externa do creditado o projeto de desenvolvimento
país, chamada por ele próprio de "diple>- como resultado da ajuda externa, este
.
maCia da prospet;l'dade": passou a ser pensado como fruto de um
processo endógeno. N esse sentido, a po­
''Estamos convencidos de que a solu­ lítica exterior deveria consistir, confotme
ção do desenvolvimento condiciona o chanceler Magalhães Pinto, "na cons­
em última análise a segurança inter­ tante e acurada avaliação da dinâmica
na e a própria paz internacional. A internacional, a fim de identíficar e pro-
222 ESTUDOS HlSTÓruCOS - I 09311 2

curar remover os obstáculos externos a expansão da base econômica do Estado


que se opõem e �em vir a opor-6e ao deveria ser acompanhada de urna inter­
,, 19
projeto nacional venção mais positiva nos foros multilate­
Dentre os obstáculos identificados rais, em que se teciam as articulações
pela diplomacia brasileira à escalada confol'lIIsdoras do sistema internacional,
do desenvolvimento nacional, consta­ deu oportunidade a que o embaixador
vam como mais importantes: 1) as pre­ Araújo Castro, chefe da m issão brasileira
tensões monopolizadoras das gmndes junto às Nações UlÚdas de 1968 a 1971,
potências sobre as tecnologias de pon­ desenvolvesse lima densa e penetrante
ta, especialmente sobre a da energia reflexão a respeito da estrutura hierár­
nuclear; e 2) a estrutura do comércio quica e dos influxos e interações do siste­
internacional, favorável aos países de­ ma internacional, a qual instrumentou
senvolvidos e desfavorável aos países conceitualmente as ações brasileiras no
subdesenvolvidos. Outros mais eram: campo internacional.
3) a expansão do comunismo; 4) as O núcleo da argumentação esgrimida
pressões internacionais para que os por Araújo Castro era que a evolução
subdesenvolvidos adotassem políticas histórica do sistema internacional havia
de controle da natalidade; 5) as tenta­ conduzido as Nações UlÚdas ao umbral
tivas das grandes potências de mono­ de uma crise. Isto porque, sempre mais
polizar a exploração do espaço cósmico lÚtidamente, tornava-se visível a des­
e do fundo dos oceanos; e 6) o desejo das proporção de poder e privilégios entre os
corporações multinacionais de domi­ cinco membros efetivos do Conselho de
nar o mercado latino-americano. Segurança e os demais Estados aftlia­
A atuação diplomática brasileira pau­ dos. Uma vez que a estrutura jurídica
tou BC portanto, por uma linha de con­
, erguida em São Francisco em junho de
duta cuja essência era constituída pela 1945 havia condicionado a reforma da
busca da afIrmação da soberalÚa e pela Carta ao voto convergente dos Cinco
promoção do desenvolvimento, síntese Grandes, havia uma indisfarçada ten­
das duas grandes prioridades. Daí que a dência ao congelamento do poder mun­
inserção do Brasil no sistema internacio­ djal.
nal pl"OCE6S0Use no sentido da assimila­
ção das teses consagradas na Confe­ "(".) E quando falamos de poder, não
rencia dos Países em Desenvolvimento, falamos apenas do poder militar, mas
quando então se criou a UNCI'AD e se também de poder político, poder eco­
fOlmou o Grupo dos 77. A bem dizer, a nômico, poder científico e tecnológi­
crescente descaracterização do conflito ,,20
co.
J..este.t.Oes e fez assoma, na elite dirigen­
te brasileira a clivagem entre o Norte Isto é, considerando que as relações
.
desenvolvido e o Sul subdesenvolvido c0- .InternaclOnaLS
. pl"OCf'i'3.SAmi3e num campo
mo o mais forte entrave para o robuste­ energizado pelas relações de poder, a ló­
cimento do poder nacional gica dete.núna que, ao invés de esperar
EMa consciência de que as relações que os que detêm o poder abram máo'
Norte-Sul atingiam mais diretamente OS desse poder, pelo contrário, os que não o
intemsses vitais do Estado brasileiro do detêm procurem acumulá-lo. Segundo
que as relações Leste-Oeste consubstan­ Araújo Castro, enfim, para que o Brasil
ciouse na política brasileira referente ao pudesse cumprir seu destino de grande-
, .
dmallllamento e fortalecimento da segu­ za, 18Z1B.BC necnssano uma polít"lca mter-
, .
rança internacional. A conclusão de que nacional audacilWl, cujo objetivo priori-
OS MILITARES NA POLíTICA Exn:n:NA Dfl:A.� ILEIHA 223

tário deveria ser remover todos os entra· No plano bilateral, as relações com os
ves que limitavam seu poder nacional. Estados Unidos foram as que exigiram
Foi dessa orientação estratégica que maior atenção por parte da diplomacia.
se destilou a política de nuclearização do Em virtude da desilllsão provocada pe­
Estado brasileiro. Por considerar que a los magros frutos da cooperação econô­
nuclearização pacífica constituía um di­ mica e da percepção brasileira de que a
reito inalienável e que a renúncia a esse estratégia da segurança coletiva afasta­
direito contribuía para: a cristalização do va o país dos centros decisórios interna·
poder condominial das poténcias já nu­ cionais, perpetuando o desenvolvimento
clearizadas, foi que o governo Costa e e alienando o sistema defensivo, a ten·
Silva reCUSOU-5e a Assinar o Tratado de déncia foi a do progressivo esfriamento.
Não-Proliferação Nuclear. Tal posição Da mesma forma que já não convinha
em face do TNP estribava-se na justifi­ mais aos Estados Unidos manter um
cativa de que o tratado tinha um caráter grau de cooperação tão elevado como nos
claramente excludente, na medida em
tempos de Vasco Leitão da Cunha e Ju-
que traçava urna fronteira tecnológica Ma !há 21 .
racy ga e5, COl151'derado exceSSI·
entre os Estados e, apesar disso, não
vo pelo novo embaixador noJ1.e..america·
assegurava a paz mundial.
no no Brasil John C. 'futhill, também
Os planos do governo no tocante à não agradava ao governo dos Estados
matéria consistiam em prosseguir no
Unidos a desinibição com que o chance­
caminho da cooperação com a França,
ler Magalhães Pinto afirmava a necessi­
Israel e Estados Unidos, para romper
dade de o Brasil perseguir mais resolu­
o monopólio do poder mundial.
ta e autonomamente o desenvolvimento
O instrumento utilizado pelo gover­ econômico e tecnológico, sobretudo no
no brasileiro para resistir às pressões
sensível setor da tecnologia nuclear. O
internacionais, devido à recusa em as·
saldo dessa reversão de expectativas de
sinar o TNP, foi sua assinatura do Tra­
parte a parte foi a proliferação de desa­
tado do México (Tlatelolco), em feverei­
cordos envolvendo os respectivos inte-
ro de 1967. Por meio dele a diplomacia
resses naCIonaiS.
• •

brasileira afirm ava sua boa vontade


Os assuntos econômicos constituíram
em cooperar para a não-proliferação de
o foco dessas controvérsias. As díficulda­
artefatos sem, no entanto, deixar de
dee que nos Estados Unidos se criavam
investir na tecnologia nuclear. De acor­
para a comercialização dos produtos bra­
do com o Ministério das Relaçóes Exte­
sileiros tais como café solúvel, têxteis de
riores, a adesão ao Tratado do México
algodão, cacau e açúcar, além da luta
em nada feria a posição oficial brasilei­
ra, dado o fato de o tratado incluir trés travada pelos norte-americanos para
itens considerados fundamentais e in­ continuarem assenhoreando-se do mo·
dispensáveis, que eram: 1 ) a garantia nopólio dos fretes do comércio marítimo,
de que todos os países latino-america­ no entanto, não chegaram a comprome·
nos assinariam o tratado;.2) a inclllsáo ter mais seriamente as tão amplas e
dos territórios não·autônomos da Amé· complexas relações entre 05 dois Estados.
rica Latina na ãrea circunscrita pelo Pl� dessa natureza eram vistas co­
tratado; e 3) o compromisso formal de mo naturais, na medida que compunham
todas as poténcias nuclearizadas de o repertório norte-americaoo de medidas
que garantiriam a inviolabilidade da para conter o ímpeto daqueles países
região ante ataque ou ameaça de ata­ que, aos seus olhos, m06trava.m<ie dema·
que com armas nucleares. siadamente afoitos em marcar uma posi·
224 ESTUDOS HISTÓRICOS -.1903/12

ção de independência em face do seu nacional, ignorando e reprimindo as ins­


. 22
poder hegemoruco. tituições que, num Estado democrático,
,

Com Portugal o Brasil manteve a p<>­ deveriam expressar a vontade popular.


sição reassumida por Castelo Branco de Nesse sentido, a princípio, pelo menos, a
estreitamento dos vinculos e apoio à Ie sucessão de Costa e Silva nâo deveria ser
pressão aos movimentos nacionalistas muito diferente da de Castelo Branco e,
que, nas colônias, lutavam pela inde­ em seguida, da de Mêdici e assim por
pendência. Quanto a essa questão, a di­ diante. Porém, devido ao fato de o período
plomacia brasileim persistia na tese de fmal do governo Costa e Silva ter sido
que nos territórios colonizados por Por­ cercado de uma violenta crise político­
tugal o aspecto principal da guel"la era a ideológica, que repercutiu fundo no seio
luta do mundo ocidental contra a expan­ da instituição milital', a escolha de Mêdici
são comunista. representou, segundo Alfred Stepan,25
um grande esforço para a preservação da
unidade dos militares, que constituia o
principal "patrimônio político do governo
3. Governo Médici: a diplomacia militar".
do interesse nacional Sendo pois um governo de união dos
militales, o governo Médici gozou da
legitimidade por eles próprios conferida
,

A mudança de governo em 1969 levou


a algumas alterações na forill" de se para perseguir com mais tenacidade o
conduzir a política externa do pais. Não objetivo comum a todas as tendências,
há dúvida de que dois fatores, em espe­ de transformar o Brasil numa grande
cial, conCOlleram para que isso aconte-­ poténcia mundial. Evidentemente a em­
cesse:a luta intramilitar que defIniu a preitada do projeto "Brasil poténcia" só
escolha de Gal"lastazu Mêdici como su­ pode ser vislumbrada como algo palpá­
cessor de Costa e Silva e os elevados vel na medida em que a tecnoburocracia,
índices de CIesoimento do PIE verificados fIrmemente plantada nesse período, ga­
logo no inicio de seu mandato presiden­ rantia que os 11,2% de crescimento do
cial: 1969, 10,0%; 1970, 8,8%; 1971, PIE, regiatrados em 1968, manter-se­
13,3%; 1972, 11,7%; e 1973, 14,0%.23 Fo- iam como índice padrão de crescimento
ram alterações que, no entanto, não che­ da economia do país. Em suma, a con­
garam a representar uma revisão da es­ tenção das divisões internas ao regime,
tratégia geral. Constituíram, antes, re­ aliada ao êxito do "milagre brasileiro",
sultados dos recursos que se haviam acu­ gerou a confiança de que o pais encurta­
mulado. va rapidamente a distáncia que o sepa­
Há, de modo geral, grande diflculdade rava dos países capitalistas desenvolvi­
em se analisar a vinculação (contestada dos, habilitando""" a saltar da condição
por muitos) entre a dinâmica da política de potência mêdia à de grande potência.
interna e a dinâmica da política exter­ Seguindo.se a linha interpretativa
24 26
na. Dificuldade que aumenta conside­ proposta por Estevam Martins, po­
ravelmente quando os governos que pro­ de-se afIrmar que o principal efeito·
tagonizam as duas esferas da vida políti­ desses condicionantes sobre a política
ca são infel'lSOS a regl'as claras e consen­ externa foi que, à convicção da diplo­
suais de sucessão, ou, mais especifica­ macia de que o desenvolvimento era o
mente, como no caSO aqui apreciado, resultado exclusivo da interação dos
quando um grupo restrito (os militales) fatores internos, acrescentou-se a idéia
se autoconstituem os árbit.us da vida de que o caminho do desenvolvimento
OS MILITARES NA POLillCA EXTERNA BRASILEIRA 225

era para ser percorrido individualmen­ mento de ampliação da distáncia que


te. Se, antes, a "diplomacia da prospee separa as nações ricas das nações po­
ridade" divisava a luta conjunta dos bres; implica, ao contrário, a mudança
países subdesenvolvidos como o meio das regras do comércio internacional e
mais eficaz de resistir e superar 05 a alteração do mecanismo de distribui­
obstáculos que lhes opunham os de­ ção mundial do progresso científico e
senvolvidos, a "diplomacia do interesse tecnológico, pois não há verdadeira paz
nacional" passou a priorizar as rela­ sem desenvolvimento;
ções bilaterais como as mais conve­ 4) nossa posição é, portanto, de ativa
nientes para se alcançar o mesmo fim. solidariedade com 05 países em desen­
A definição dessa orientação política volvimento, competindo à nossa diplo­
coadunava-se com a consciência ad­ macia estreitar o entendimento com os
quirida pelas elites dirigentes de que povos que travam conosco a dura bata­
não só o trajeto para o desenvolvimen­
lha do progresso;
to estava pontilhado de barreiras es­
5) nossa jXllítica externa deve ser
truturais, como também as teses favo­
global, de íntima c09J?ração com os
ráveis a um sistema internacional or­
países desenvolvidos.
ganizado na base do equilíbrio de po­
der, então em processo de estrutura­
A reação latino-americana a essa po­
ção, só prejudicavam países como o
05
lítica de "potência ouvida no concerto dos
Brasil que, destacando-se dos demais .28
fortes e respeitada naquele dos fracos'
subdesenvolvidos pelos invejáveis ín­
foi um generalizado sentimento de des­
dices de crescimento econômico, alme­
confiança. Sobretudo pela ênfase atri­
javam compartilhar conl as grandes
potências as decisões mundiais. buida à necess idade de ocupação efetiva

Mário Gibson Barbosa, nlÍnistro das do território nacional, entendida como


Relações Exteriores, assim resumia as requisito indispensável para o fortaleci­

linhas mestras da "diplomacia do inte­ mento do poder nacional. A execução de


resse nacional": projetos de colonização e aproveitamen­
to econômico dos recursos existentes na
bacia Amazônica e na bacia do Prata foi
1 ) o Brasil defende a mudança das
vista como a consumação das velhas te­
regras de convivência internacional, é
contra a cristalização de posições de ses geopolíticas defendidas pelos milita­

jXlder e se recusa a crer que a história res brasileiros e como prova das preten­
se desenrole necessariamente em be­ sões sub imperialistas dos setores inter­
nefício de uns e prejuízo de outros paí­ nacionalizados da burguesia brasileira.
ses·, 1bdavia, a verdadeira razão para o
2) consideramos que, à medida que estado de penuanente tensão que domi­
unl país cresce, cabe-lhe uma parcela nou as relações do Brasil com 05 demais
de decisão cada vez maior dentro da paises sul-americanos foi a eleição para
conlunidade internacional, e não de­ presidente do Chile de Salvador Allende,
venlOS deixar de usá-la em favor dos candidato da Unidade Popular, em se­
jXlvos que, como o nosso, aspiram ao tembro de 1 970. Pois, tanto para os nor­

progresso; te-americanos como para os conservado­


3) a verdadeira paz não pode ser res latino-americanos, a ascensão de um
identificada como a simples manuten­ governo marxista na região representa­
ção do status quo, como resultado do va séria ameaça à estabilidade e à segu­
equilíbrio de poder, nem ser instru- rança do henlÍSfério.
226 ESTIJOOS HISTÔRICOS - 1993112

o relatório sobre as eleições remetido aos Estados Unidos em 1971 a convite


para Washington pelo embaixador nor­ de Nixon, ocasião em que este último
te-americano no Chile, Edward Kony, declarou que "we know that as Brazil
traduzia com fidelidade a decepção que goes, so will go the rest of that Latin
temou conte de todos aqueles compro­ American continent.,,31
metidos coma manutenção do status quo A inauguração de uma conjuntura
neste parte do mundo. Nas palavras do externa marcada pela expectativa bra­
embaixador: "Isto terá a mais profunda sileira dos possíveis desdobramentos
repercussão sobre a América Latina e externos do novo regime chileno, com·
até mesmo sobre outros pa�; sofremos binada com o poder absoluto de que os
uma penosa deltota. As conseqüências militares passaram a desfrutar a par­
serão internas e internacionais.,,29 tir do fim do governo Costa e Silva,
Para Heruy Kissinger, fOl'lllulador da projetaram a imagem de um Brasil
política internacional de Richard Nixon, ávido de assumir o poder hegemônico
a eleição de um governo socialista no regional. Seu desengajamento dos pro­
Chile afigurava"" como um desastre de gramas integracionistas e sua opção
grandes proporções para 06 interesses pela diplomacia bilateralista, ancora­
norle-americanos e de seus aliados na da no otimismo provocado pelo ''mila-
- gre econornlca , geraram a percepçao
regulo.
. a •
•• _

entre os países vizinhos de que o Bra­


''Sabíamos que (o Chile) não tardaria sil, com o beneplácito dos Estados Uni­
em adotar uma política anti-norte­ dos, havia se convertido no gendarme
americana, em quebrar a solidarie­ da América La tina.
dade do hemisfério, em fazer ca1lsa Acentuando as linhas desse perftl po­
comum com Cuba e cedo ou tarde líticoestratégico, denunciou se a exis­
estabelecer estreitas relações com a tência de planos militares - Operação
.
U ruaa "t'lea...30
- SQVle Trinta Horas - que teriam por objetivo
ocupar o Uruguai, de modo a evitar que
Essa era a avaliação de todos os este caísse nas mãos da oposição anua­
3
governos, especialmente do brasileiro, da. 2 Apesar dos desmentid05 do gover­
que viam o erguimento de governos no brasileiro, o fato é que houve concen­
socialistas como um sucesso a mais da tração de tropas na fronteira sul do país
estratégia expansionista soviética. Daí e apoio por parte de órgã06 da imprensa
porque os militares brasileiros entra­ para o que se considerou uma medida
ram em estado de alerta, temendo que nt>ressária de proteção da soberania na­
da instabilidade política que assolava cional. Ademais, 06 estad05-maiores da
alguns dos países vizinhos, particular­ vizinhança passaram a trabalhar com a
mente Uruguai e Bolívia, resultassem plausibilidade da hipótese de interven­
governos influenciados pelo êxito dos ção brasileira.
socialistas chilenos. Por seu turno, for­ Além da crispação com a situação da
twcou-se nesses países e na Argentina política interna uruguaia, acusou-se o
- esta preocupada com o equilíbrio de governo militar brasileiro de participa­
poder na região - a idéia de que o ção no golpe de Estado na Bolívia que,
Brasil, apoiado pelos Estados Unidos, em 1971, colocou o general Hugo Ban­
talvez se aventurasse a praticar inter­ zer na presidência do país,'13 Não há
venções armadas com fins preventivos. dúvida de que a súbita mudança de
Uma suspeita que aumentou de inten­ governo beneficiou a estratégia brasi­
sidade com a ida de Garrastazu Médici leira para a área, JX>is reinseriu a Bo-
OS MILITARES NA POÚTICA EXTERNA BRASILEIRA 227

lívia na sua órbita de influência, neu­ gentes. As tarefas priori târias da diplo­
tralizando portanto um país considera­ macia consistiram em negociar a abertu­
do de suma importância no tabuleiro ra de novos men:ados pera a produção
político regionaL A partir desse reen­ nacional e aproxirnar--se mais dos países
contro, iniciou-se um amplo programa fomecedoles de tecnologia e de matérias­
de cooperação econômica entre ambos_ primos indispensáveis para O funciona­
E, por fim, os milita",,, e diplomatas mento do parque industrial brasileiro.
brasileuos foram aonsados de ter parti­ Datam deste período a instalação das
cipado também da conspiração, seguida embaixadas no Iraque, Kwait, Arábia
de golpe, que derrubou o governo socia­ Saudita e Llbia, peíses que se haviam
lista chileno em selembrode 1973. Ainda tornado extremamente relevantes pera
que todo o ônus externo do golpe tenha n065llS relsçee exteriOl1l8 em virtude
Iecaído sobre o governo none-america­ das e.levadas quantidades de petrólw
no, foram feitas denúncias de uma arti­ que deles iJnportâvamos, trocados por
culação envolvendo militam" brasileiros produtos como açúcar, café e manufatu­
e chilenos. O ativismo dos militales bra­ rados em geral. Simultaneamente, in­
sileiros nesta e nas mobilizações antena-. tensificaram-se os contatos com Israel,
res teria sido movido pela estratégia de objetivando incluir no programa geral de
impedir a formalização de uma frentede cooperação técnico-científica, em anda­
Estados socialistas hostis ao Brasil. mento, a cooperação no campo da pesqui­
A contraprova das ambições gWJXllí­ sa nuclear.

ticas bras.iIeiras foi dada pelo estreita­ O continente africano foi outra região
mento das relações com o ParagUAi. le­ do globo a m�recer atenção da diploma­
vando a bom te.mo os estudos previsto. cia brasileira. Nesta parte, 06 intereS5e8
na Ata das Cataratas, de 1966, os gover­ econômicos e estratégicos achavam-se
nos brasileiro e paraguaio assinaram, inextricavelmente ligados. Por um lado,
em abril de 1 973, o Tratado de ltaipu. O pretendeu se inaugurar e incrementar
acordo previa o aproveitamento hidrelé­ canais de comércio com os países situa­
trico do rio Paraná, por meio da constru­ dos na faixa tropicaL Acreditava se que,
ção de uma usina em regime de consór­ pela tecnologia de porta médio de n05506
cio. Tal decisão de âmbito bilateral con­ produtos manufaturados e, também e
fU'lIlou as suspeitas argentinas, de que o sobretudo, pejos vinculos históricos e
culturais que unem o Brasil à Mrica,
-

empreendimento conjunto ma.is não era


do que uma decisão tomada pelos estra­ tínhamos condições de cultivar um apre­
tegistas brasileiros de selar uma aliança ciável mercado para exportação. Emba­
defmitiva com seu vizinho, com vistas a lado por essa expectativa positiva, o mi­
alterar o equilíbrio político regionaL A nistro das Relações Exteriores, Mario
promulgação do tratado pelas duas per­ Gibson Barbosa, efetuou em 1972 um
tes fhm antes deu irúcio a um proce.'\SO p'rograma de visitas a nove países da
deCricção política entre argentinos e bra­ Mrica subsaaria na: Senegal, Costa do
sileiros, só encerrado seis anos mais tar­ Marfim, Gana, 1bgo, Daomé, Nigéria,
.
de, quando o governo brasileiro cedeu à Camarões, Gabâo e Zaire.
reivindicação argentina de dialogar a De outro lado, esse inte.,sse brasileiro
-

respeito do projeto hidrelétrico. pela Africa derivava da concepção geopo-


No plano extra�ntinental a política lítica de que o Atlântico Sul é vital pera
internacional brasileira ASSUmiu contor­ a segurança do Estado brasileiro. Para
nos claramente ag n""ivos, refletindo os 11m peís que nutria a aspiração de em
' teI
lD ';SSQA econOlDlco-m' dustna'-""
" emer· breve tempo ingl(6S8r no rol das grandes
• .
228

ESTUDOS HISTORICOS - 199311 2

potências, o controle da fronteira leste tuguesa, almirante Américo Thomaz, co­


parecia estrategicamente fundamental; mo parte das comemorações do Sesqui­
tratava-se, pois, de fazer do Atlântico Sul centenário da Independência do Brasil.
um verdadeiro mare nostn.un .
Para tal A decisão tomada no sentido de pôr
propósito, considerou·se imprescindivel em prática políticas que demonstJ'8ssem
um bom relacionamento diplomático
-
queo Atlântico Sul era visto pelo governo
com Portugal e Africa do Sul. Conquanto brasileiro como parte integrante de seu
o primeirojá evidenciasse sinais de esg0- sistema de defesa levou a que, em 1970,
tamento, devido à sua incapacidade de a diplomacia brasileira decre tasse a am­
decidir a guel'la colonial a seu favor, e a pliação do limite do mar territorial para
segunda se enconbasse estigmati7ada 200 milhas. 34 Não obstante o fato de que
pela comunidade internacional, em fun­ a estratégia brasileira de exercer o domí­
çãoda política de apwtheid desenvolvida nio sobre o Atlântico Sul estivesse se
pela minoria branca dominante, predo­ desenvolvendo mediante laços de alian­
minava ainda entre os estrategistas bra­ ça com qualificados representantes do
sileiros a idéia de que o eixo central do Mundo Ocidental - Portugal, membro

sisteum internacional de poder era o con� fundador da arAN, e Mrica do Sul,


llito Leste-Oeste e que os movimentos de incondicional aliada dos Estados Uni­
libertação nacional nas colônias portu­ dos, Inglatel'lll eAlemanha-, tal medida
guesas e o movimento anti-apwtheid dos sofreu a oposição dos Estados Unidos. A
sul-africanos negltJS, na realidade, ser­ argumentação brasileira de que a am­
viam como peões do expa nsionismo so­ pliação do mar territorial tinha em vista
viético. Por essas razões, na;sos estrate­ apenas proteger os depósitos de petróleo,
gistas acreditavam que a única fOima virtualmente existentes na plataforma
possível de viabilizar uma política de continental, e proteger igualmente os
defesa do Atlântico Sul e, ao mesmo tem­ interesses pesqueiros brasileiros, não
po, desfrutar das potencialidades que o convencia; a percepção norte-americana

mercado da Africa Austral oferecia, era a era de que se tratava de uma política de
que passava pelo fortalecimento da co-

poder. Apesar de a decisão brasileira
munidade luso-brasileira. Com a Africa não implicar uma imediata alteração na
do Sul as relações foram preponderante­ correlação de forças, devido à falta de
mente caracterizadas pelo viés econômi· recursos bélicos para exercer um efetivo
co, tendo constituído a inauguração da controle aerornarítimo sobre o oceano,
linha aérea da Souili Mrican Airlines nem tampouco um desafio aberto à he­
para o Brasil o maior sinlbolo dessa liga­ gemonia hemisférica norte-americana,
ção. Com Portugal as relações foram indiscutivelmente denotava a vontade
mais profundas; envolveram visitas mú­ de aumentar o grau de independência
tuas de personalidades oficiais dos dois nacional no contexto do sistema interna­
governos, incluindo memblus das f01'Ç9S cional.
aimadris; a assinatura de vários acordos A criação dessa nova área de atrito
e convenções, dentre as mais imPlrlan­ com os Estados Unidos vinha adicio­
tes a Convenção sobre Igualdade e Deve­ nar-se a algumas já existentes que re­
n:s entre Brasileiros e Portugueses; e, montavam ao período presidencial an­
enfim, o mais expressivo de todos 05 ges­ terior. A recusa do Brasil em assinar o
tos de amizade nlaia uma vez renovada: TNP, ao mesmo tempo em que tentava
a trasladação para o Brasil, em
1972, dos avançar no campo da pesquisa nuclear,
restos mortais de dom Pedro I, trazidos e os problemas econômicos decorrentes
pelo próprio presidente da República por- dos empecillios postos à expansão das

I)S MI LlTAnr.5 NA POLlTICA EXTERNA IJrtASILEIRA 229

exportações de café solúvel para os Es­ torno gradual ao estado democrático,


lados Unidos, sob o pretexto de que as sem a perda do controle político. Enfim,
autoridades brasileiras estavam a pra­ à centralização do poder deveria suceder
ticar dumping. constituíam sérios pro­ uma lenta descentralização, em que per­
blemas que a lradicional relõrica bra­ cela ponderável desse poder pennane­
sileira de unidade de pontos-de-vista e cesse retido nas mãos de aliados confiá·

de objetivos dos dois países não conse­ velS.


guia mais iludir. Tornava-se cada vez No plano internacional, a relativa


mais visível que o nacionalismo dos estabilidade diplomá tico-eslra têgica
mil itares brasileiros, ao buscar pata­ do sistema, assegurada pelo diálogo
mares mais elevados de desenvolvi­ das duas superpotências desde a crise
mento e independência , tendia a deslo­ dos mísseis, começava a se deteriorar,
car o padrão de relacionamento entre provocando instabilidade e desequilí­
Brasil e Estados Unidos para bases brio. Essas alterações traduziam·se no
mais realistas e competitivas. deslocamento do centro de gravidade
do sistema internacional do conflito
Leste-Oeste para o connito Norte-Sul.
Os acontecimentos mais salientes
4. G overno Geisel: o dessa conjunlura que principiava fo­
pragmatismo responsável ram os Acordos de Paris, dejaneiro de
1973, e a guerra árabe-israelense, de
Ascircunstãncias quecercarama pos­ outubro/novembro do mesmo ano. O
se do presidente Ernesto Geisel, em mar­ resultado dos primeiros indicou o declí­
ço de 1974, foram bem dislintas das que nio relalivo do poder imperial norte­
cercaram a de seu antecessor. O otimis­ americano, fruto da fracassada tenta·
mo quanto às possibilidades de um cres­ tiva de impor sua ordem no Vietnã. O
cimento econômico acelerado, que trans­ resultado da segunda projetou os inte­
fonnaria o país numa grande potência resses comuns ao Thrceiro Mundo no
mundial num espaço curto de tempo, âmago do sistema internacional, ao de·
achava-se agora seriamente ameaçado monstrar que a manipulação dos pre·
pelos novos rumos do sistema internaeio-­ ços das matérias·primas sensíveis aos
n..�J e pelo acillamento das contradições interesses das grandes potências pode­
internas. Dessa maneira, as dificuldades ria converter�se numa poderosa arma
internas e externas que encell'avam o política. O Terceiro Mundo, cuja forma­
"milagre brasileiro" conlribuíram decisi­ ção iniciara-se em Bandung e comple­
vamente para a moldagem do projeto tara·se com a descolonização africana
governamental do novo presidente. In­ e com a formação do Grupo dos 77,
ternamente, o projeto político foi sinteti­ deixava de ser apenas um conceito ex�
zado na fórmula oficial "continuidade cludente para tornar-se um verdadeiro
sem imobilidade", mais conhecida por pólo de forças políticas convergentes.
"política de distensão". ·Tratava..... de Os efeitos dessas mudanças interna�
um proglUma de medidas de liberaliza­ cionais, sobretudo o choque do petróleo,
ção cuidadosamente conlrolada (...), que atingiram ponlos vitais dos intemsses
pretendia constituir um pesso adiante na nacionais brasilehoo, forçando o governo
liberalização prolm'ssiva, pera um retor- a uma profunda revisãodesua estratêgia
no a , democraClB.,.\5 Por OU ..'-
. lao:)- pa Iavras , políticodiplomática. AJJ tornar ostensiva
projetava..... uma ampliação da basecon­ nossa debilidade na área energética -
sensual do regime, com vistas a um re- produzíamos apenas 28%do petróleo uti-
230 ESTUDOS HISTÓRICOS - 1003/12

lizado - e nossa impossibilidade de ace& fúgios. Queremos que o Governo bra­


50 às engrenagens dos centIt):) decisórios sileiro possa cumprir a vocação ecu­
do sistema financeiro internacional-que mênica de seu povo, aberto à comu­
elevou os juros da dívida externa -, a nicação desinibida e franca. Quere­
crise fez com que os estrategistas perce­ mos explorar todas as vias do enten­
bessem não só que ainda era grande a dimento, por acreditarmos, funda­
distância que separava o Brasil dos paí­ mentalmente, que a cooperação é
sre ricos, como também que a insistência mais eficaz do que o antagonismo e
no bilateralismo diplomátioo oonduziria que o respeito mútuo é mais criador
a um inevitável isolamento internacio­ do que as ambições de preponderân-
nal. Urgia, portanto, substituir o indivi­

C18.

dualismo típico do período Médici por Nossa oonduta, para alcançar esses
uma aproximação com o Thrceiro Mundo. objetivos, é pragmática e responsá­
Urna política que poderia proporcionar vel. Pragmática, na medida em que
ao Brasil uma exploração mais ampla buscamos a eficácia e estamos dis­
das possibilidades oferecidas pelo merea­ }X>stos a procurar, onde quer que nos
do mundial e, simultaneamente, engros­ movam os interesses nacionais bra­
saro coro que exigia a estruturação de sileiros, as áreas de convergência e as
uma nova ordem econômica internacio­ faixas de coincidência com os interes­
nal, de modo a introduzir mais justiça ses nacionais de outros povos. Res­
equitativa na distribuição e usufruto da ponsável, porque agiremos sempre
riqueza mundial. Semelhante revisão de na moldura do ético e exclusivamen­
conteúdo da política externa, por sua vez, te em função de objetivos claramente
implicava necessariamente imp:>rtantes identificados e aceitos pelo povo bra­
36
e fundamentais reavaliações do quadro sileiro.u
de alianças e da postura do Estado bra­
sileiro em face das novas situações en­
Ainda que a posterwri afigure-se-nos
gendradas pela evolução do sistema in­
clara a inevitabilidade da mudança de
ternacional. Enfim, tratava-,;e de desvin­
orientação da política externa brasileira
cular os interesses nacionais brasileiros
naquela conjuntura, tal percepção não
da doutrina das fronteiras ideológicas,
era comum a todos os segmentos milita­
adequando-os à cambiante conjuntura
res e civis que participavam do processo
internacional.
decisório e sustentavam politicamente o
A nova estratégia brasileira, traça­ regime. Na verdade, toda política que
da para fazer frente aos desafios inter­
parecesse a esses setores não-alinhada
nacionais e para dar continuidade ao
ou antiocidental era logo assimilada co­
processo de fortalecimento do poder
mo simpática às teses comunistas, dan­
nacional, foi definida pelo presidente do lugar a protestos e rejeição. Por outro
Geisel como uma política externa prag­
lado, parece igualmente evidente que
mática e responsável. esses mesmos setores achavam-ee inca­
Ao apresentar as novas diretrizes à pacitados, em virtude da vincada rigidez
Assembléia Geral das Nações Unidas, de 5\1as concepções, para apresentar
o chanceler Azeredo da Silveira assim uma alternativa estratégica que conci­
se expressou: liasse suas convicções, fOljadas no itúcio
da guerra fria, com as novas tendências
"Queremos que a nossa linguagem, à multipolarização e à desideologização
no plano internacional, seja direta e do sistema internacional de poder. Pois,
simples, sem ambigüidades e sub ter- identificados os fatores que intercepta-
OS M1LITARES NA POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA 231

. .
vem a re al'lzaçao dos
- mlA::
, -r;:;:'>fL�
nacI<r ceiro Mundo constituía um cam!Xl !Xllí­
nais, não bastava simplesmente vetar tico e que seu par antagônico era fOl'loa­
procedimentos considerados estranhos e do pelos dois poderes hegemônicos. Se­
incompatíveis com idéias caras e conso-­ gundo essa sisu.matização, a prática !Xl­
lidadas; era necessário, mais que isso, lítica dos países em desenvolvimento de­
contra!Xlr idéias de execução viável, que veria consistir em cimentar uma sólida
resultassem em soluções positivas. E es­ aliança entre si e buscar a cooperação
tas. ao que tudo indica, nunca existiram; construtiva com o Segundo Mundo, para
daí !Xlrque o antes Wdo IXJderoso Conse­ encaminhar um processo de democlati­
lho de Segurança Nacional, ao qual ca­ zação das relações inu.rnBcionais.
bia flitrar as decisões presidenciais, gra­ Embora não se possa afirmar a ade­
dativamente esvaziou-se, até tomar-se são integlal da diplomacia brasileira à
um dócil ratificador das medidas elabo­ proposta chinesa, não se pode negar,
radas e propostas pelo ltamarati à pre­ contudo, que em boa parte a prática
sidência. politico--diplomática brasileira cones­
Exemplo dessa secundarização do pondeu a essas coordenadas teóricas.
CSN frenu. ao lta marati foi o restabele­ O ato oficia! de reatamento diplomá­
cimento das relações diplomáticas com a tico, no Palácio do ltamarati, refletiu o
República Popular da China, a primeira entusiasmo que tomou conta das duas
das medidas de grande impacto produ­ representações, constituindo uma verda­
zidas se§Jmdo o novo enfoque governa­ deira celebração u.rceiro-mundista, que
mental. transparece nas palavras proferidas pelo
A im!Xlrtãncia dessa decisão foi ex­ vice-ministro do Comércio Ext..rior da
traordinária, por duas razões. Primeiro, RPC, Chen Chieh:
devido ao peso especifico da república
chinesa no sisu.ma inu.rnacional. Após liA China e o Brasil são dois países em
sua aproximação com os Estados Unidos vias de desenvolvimento, enfrentan·
- obra da diplomacia realista de Kissin­ do hoje em dia a mesma tarefa de
ger - e seu inglCSSO no Conselho de defender a soberania estatal, desen­
Segurança das Nações Unidas, em outu­ volver a economia nacional, cons·
bro de 1971, o grande país asiático não truir seus próprios países, e a mesma
poderia continuar sendo ignorado pelo luta contra o hegemonismo e o F er
Brasil. A segunda razão foi de ordem de força das superpotências.'.:!
simbólica e, !Xlr isso, talvez mais signifi­
cativa: quatro meses antes do reatamen­ A segunda medida de grande impac­
to diplomático, em 10 de abril de 1974, o to produzida pela chancelaria brasilei­
chefe da delegação da RPC na Sessão ra foi o reconhecimento de Angola como
Extraordinária da Assembléia Geral da Estado independenu., em janeiro de
ONU, Deng Siao-Pim, pronunciara con­ 1975. Uma decisão que surpreendeu
tundenu. discurso em defesa do Terceiro pela ousadia e que contribuiu para si­
Mundo e contra o hegemonismo das tuar o Brasil numa posição de desta­
duas superpotências, o qual passou a ser que no Terceiro Mundo.
conhecido como a Teoria dos Três Mun­ Não obsta nU. o governo brasileirojã
dos. tivesse reconhecido a independência
Evidenu.menu. a divisão hierárqui­ da Guiné-Bissau em julho de 1974,
co-trinãria do sisu.ma inu.rnacional não antes mesmo que Portugal o tivesse
era nova. O que de novo os chineses feito, o fato é que a questão angolana
apresentavam era a visão de que o Ter- revestia-se de singularidades excep-
ESTUDOS HISTORICOS - 1 993/12

232

cionalmente graves. A primeira, e fun­ ça com Cuba e União Soviética. Daí a


damental, dizia respeito às condições importãncia da guinada promovida pela
políticAs internas de Angola. Os três diplomacia brasileira. Porque, desse mo­
movimentos de libertação nacional an­ mento em diante, nossa política externa
golanos (MPLA, FNLA, UNITA) que, para a região passava a se chocar fron­
mediante o Acordo de Alvor, haviam talmente com a política dos Estados Uni­
negociado juntos a independência com dos: enquanto estes haviam apoiado
Portugal, estavam separados pelas op­ uma solução pró-ocidentaJ (FNLA) em
ções ideológicas, por políticas diferen­ Angola e lideravam o apoio ocidental à
tes e rivalidades pessoais. A convicção Africa do Sul, o Brasil apoiara a solução
o

da diplomacia brasileira do sucesso fi­ pró-ooviético-cubana e condenava aber­


nal do MPLA representou um risco, tamente o regime segregacionista do
embora bem calculado, que poderia ter apartheid.
gerado alguns sérios embaraços.39 'Ih­ Com efeito, independentemente da
davia, a vitória alcançada pelo MPLA matriz ideológica que passava a soldar a
na luta armada havida entre 05 três sociedade angolana e as demais ex-oolô­
movimentos propiciou a mudança da ruas portuguesas, 05 fatores que pesa­
imagem do Estado brasileiro na Africa ram na decisão governamental brasilei­
e, em particular, na parte austral do ra, de estabelecer relações diplomáticas
continente. Até então, sua imagem es­ tão prontamente, foram a oportunidade
tivera associada ao Estado Novo portu­ de se recuperar um passado de alienação
guês e a Pretória; a partir daí, passou em face da questão colonial e a primazia
a estar associada aos países de linha de dada pelo binômio "desenvolvimento e
frente e à luta contra o apartheid. segurança" à defesa da fronteira leste.
A nova política africana do Brasil re­ Numa conjuntura em que Portugal fi­
plcscntav8, ASS im, uma ruptura oom o nalmente perdia o controle sobre seu
passado. Pois, apesar de o governo ante- império ultramarino, surgia a oporturu­
rior ter se voltado pera a Africa, sua dade do Brasil, na condição de maior
o

atuação orientara-se para objetivos de país de expressão portuguesa, tornar-se


ordem estritamente econômico-comer­ o mais credenciado porta-voz das aspira­
ciais; 811aB alianças na área perll.anece­ ções desses povos de atingir o desenvol­
ram atreladas ao figurino das fronteiras vimento e a autonomia, E, ao lado disso,
ideológicas. E verdade que o interesse a presença militar soviéti"?,,,ubana no

econômico continuava a permear as � Atlàntico Sul, obrigando a Africa do Sul


lações, pois, além da perspectiva de gt>­ a uma posição defensiva, para preservar
mr os beneficios de um mercado que se sua estrutura social e seu domíruo sobre
acreditava de grandes potencialidades, a Namíbia, criava a ameaça'de um alas­
próximo e fo,,"ado por povos de expres· tramento do conflito do Atlãntico Norte
são portuguesa, Angola, particularmen­ para esta parte. Por essa razão, mais do
te, apresentava como contrapartida um que nunca, o Brasil necess itava manter
território rico em matérias-primas vege­ boas relações com os países do outro lado
tais e minerais, entre elas, muito espe­ do oceano, de Cabo Verde para o sul, de
cialmente, o petróleo. Porém, o aspecto modo a fazer sentir sua ploscnça e, even­
político era o que tinha mais relevo nesse tualmente, participar das negociações
novo contexto, sobretudo se se levar em que viessem alterar a ordem estabeleci­
conta que o Estado angolano nascia sob da. Consideradas essas questões, a hipó­
o signo do socialismo de inspiração mar­ tese de se acompanhar a política norte­
xista-leninista e da incondicional alian- americana para a área afigurava-se co-
os MILITARES NA POLlTICA EXTERNA BRASILEIRA

233

mo inteiramente oposta aos interesses suscitasse s11as desconfianças, foi a deci­


nacionais brasileil"05. são brasileira de ass inar o acordo de
O fosso que se abria entre a política cooperação nuclear com a República Fe­
externa pragmática e h::sponsável brasi­ deral da Alemanha, em novembro de
leira e 05 po5tulados essenciais da políti­ 1975, que estendeu bruscamente a fran­
ca internacional norte-americana tendia ja de litígio com a superpoténcia norte­
a ampliar-se na mesma prop:>I''Ção em americana. Os dois primeiros processos
que se diversificavam os interesses ear foram vislDs como desdobramenlDs ine­
nômicos e aumentava a margem de inde-­ vitáveis da projeção de uma poténcia
pendência política do Brasil no sistema média que buscava dar vazão às slIas
internacionaL Essa líberdade de eleger potencialidades; e, para conté-las nos
os aliados vistos como os mais convenien­ limites do tolerável, bastava empregar
tes aos seus interesses manifestara--se

as reglU. dojogo bruto da competitivida­
em relação à Africa e pronunciava...se, de do sistema econômico-financeiro in­
igualmente, em relação ao Oriente Mé­ ternacional. Porém, a terceira interação
dio, uma área até então situada fora do da política externa brasileira afetava, na
círculo das preocupações da chancelaria avaliação norte-americana, o ponto ne­
brasileira. A par das crescentes exporta­ vrálgico de sua política para a América
ções de manufuturados, que beneficia­ Latina, que era perpetuar seu próprio
vam a balança de pagmnenlDs ao reduzir poder hegemônico. Ao romper o acordo
as compras do exterior, principalmente com a ftrma norte-americana Westing­
de material bélico produzido pelas em­ house para fornecimento de urânio enri­
presas estatais IMBEL e EMBRAER, o quecido, e voltar-se para a cooperação
governo brasileiro redefmiu suas alian­ com a Alemanha, a diplomacia brasilei­
ças na região, apoiando com seu voto nas ra demonstrava sua fidelidade ao prin­
Nações Unidas a reivindicação palestina cípio de que as constrangimentos imJX>5-
de construção de seu Estado-Nacional, e lDs pelas superpoténcias àqueles países
condenando o sionismo como uma mani­ que perseguiam a nuclearização consti­
festação de racismo. tuíam um inaceitável desejo de manter
congelado o poder mundial. Ao perseve­
"O voto brasileiro não é, nem pode­ rar nessa linha, nossa diplomacia consi­
ria ser, em qualquer hipótese, in­ derava que, nas palavras do ministro
terpretado como hostil aos judeus Azeredo da Silveira:
ou aojudaísmo. O Brasil reconhece
plenamente a valiosa contribuição "No mundo de hoje, somente a cora­
dada pelos judeus que, nascidos ou gem· de inovar e de ousar permite
não em nosso País, vivem em nossa romper o círculo vicioso que condena
comunidade. O povo brasileiro é as nações a uma estratificação social
completamente avesso ao racismo internacional, com seu séquito de
por sua própria formação e seus problemas crescentes e de inevitá­
AO .41
princípios morais., veis perigos:

Por mais que a participação do capital Aargumentaçãodesenvolvida pela di­


estatal brasileiro estivesse atingindo os plomacia brasileira para defender o acor­
interesses das empresas de capital nor­ do e o projeto nuclear nacional estava
te-americano e por mais que a exporta­ submetida a uma ótica estritamente tec­
ção de material bélico para áreas de nológica. Enquanto 05 op05itores do pro­
concentração de seus interesses políticas jeto - externos mas internos também -
234
,

ESTUDOS mSTORICOS - ln93/12

investiam contra a presumida delibera­ Desapontada com os resultados da


ção de produzir anuas nucleares, nossa política republicana de Nixon-Kissin­
43
diplomacia retorquia afirmando inten­ ger, que, segundo as lideranças demo­
ções pacíficas. Segundo ela, a grande cli­ cratas, havia pellllitido a expansão do
vagem existente entre países desenvolvi­ poder soviético, a nova administração
dos e países em desenvolvimento era de pretendia minar, a partir de dentro, o
natureza tecnológica, Portanto, a renún­ consenso estabelecido pelo PCUS, 1bda­
cia à pesquisa no campo nuclear equiva­ via, a credibilidade dos fins morais de
leria à renúncia à própria expectativa de semelhante política exigia a universali­
se alcançar a autonomia tecnológica e, zação do discurso ofIciaL Além da pró­
conseguintemente, à resignação a um pria sociedade norte-americana, a cam­
estado de pel'Illanente subdesenvolvi­ panha deveria refletir-se sobre todos os
mento. Desvinculavam-seassimosbene­ governos autoritários, de esquerda e de
licios pacíficos proporcionáveis pela tec­ direita, indistintamente,
nologia nuclear dos artefatos bélicos, A No que dizia respeito ao Brasil, a
discussão sobre as aJ'mas deveria ser política dos "direitos humanos" atingia
travada dentro dos organismos interna­ o flanco mais vulnerável do governo
cionais destinados a """' fIm. Gmsidera­ G..iseL Ela criava para a oposição bra­
va-se, além do mais, que a Iesponsabili­ sileira um clima internacional propício
para reivindicar junto ao governo uma
dade maior pela pacificação mundial es­
aceleração na execução do programa
tava depositada nas mãos das grandes
de retorno ao estado de direito,
}X>tências; caso estas estivessem real­
mente intel'fSSadÇlS em eliminar os rÍSC08 Diante dessas pressões externas, que
de uma conflagração nuclear, deveriam estimulavam as plessões internas, o go­
dar o passo decisivo dissolvendo seus verno brasileiro reagiu considerando-as
como uma intervenção nos seus assun­
próprios arsenais, Enfim, apIesentava­
tos domésticos, As pressões nor!e-ame­
se a adesão ao Tratado do México como
ricanas, corporificadas nos mensageiros
prova do compromisso brasileiro de não
oficiais, ganharam uma maior dimensão
produzir aImas nucleares; tudo o mais
quando o presidente Carter decidiu
era interpretado como uma violação do
adiar sua visita ao Brasil, enviando em
princípio da não--intervenção nos assun­
42 seu lugar a esposa Rosalynn, e quando o
tos internos dos oulIos paises,
Senado norte-americano resolveu condi­
As pressões norte-americanas sobre o
cionar a ajuda militar ao Brasil ao exa­
governo brasileiro, no entanto, só se fize­
me do relatório sobre a situação dos
ram sentir efetivamente durante o man­
direitos humanos no país, Tendo consi­
dato presidencial de Jimmy Carter, elei­ derado o exame do relatórío pelos con­
to em 1976, Tais ple5SÓes vieram sob o glf!ssistas norte-americanos como uma
envoltório da ''política de direitos huma­ afronta inadmissível, e buscando tornar
nos", A campanha dos direitos humanos explícito e contundente seu desagrado, o
foi deslanchada por Carter e Brzezinski governo brasileiro procedeu à denúncia
em 1977, ano em que os soviéticos come­ dos acordos militares entre os dois paí­
moravam o sexagésimo aniversário da ses, em setembro de 1977, Conquanto a
' - 44
revolução. Seu alvo eram os dissidentes declSao C81eoeose de elel
" tos pra-t'1005,
soviéticos - "our friends, the Souiet dis­ pois a indústria nacional já supria par­
sicknts" que, divididos em vários gru­
-
cela majoritária das encomendas das
pos, reclamavam por liberdades demo­ forças armadas, era grande o efeito sim­
cráticas. bólico; representava a mais cabal ruptu-

OS MILITARES NA P0L111CA EXTERNA BRASILEIRA 235

ra com a política das fronteiras ideológi- resultados positivos imediatos na Amé­


CAB. rica lAtina com a mesma eficiência oom
o.. desacordos com os Estados Unidos que o logrou em outras áreas. A principal
não eram só políticos, mas também ec0- dificuldade com que a diplomacia brasi­
nômicos. Aliás, estes últimos passaram leira se defrontava era a referente à
a caracterizar as relações dos dois fBíses carga histórica. que pesava sobre esSRS
desde que o Brasil iniciou o avanço no relações. Afronteira comiIm com a maio­
caminho da industrialização. A tranqüi­ ria das nações do continente obrigava a
la complementaridade deu lugar ao con­ que a mudança de política se desse de
tencioso quando os manufaturados bra­ maneira mais criteriosa. Sobretudo por­
sileÍl'08 começaram a penetrar no mer­ que a imagem projetada no decurso dos
cado interno norte-americano . Contudo, governos militares era a de um Brasil
o aMsf:amento econômico, longe de levar movido por apetites hegemônicos. A re­
o Brasil ao isolamento, conduziu-o a um versão desse quadro de dificuldades de­
maior entrosamento com os países da pendia tanto da habilidade diplomática
Europa Ocidental e com o Japão. Em em apresentar uma agenda que contem­
sintonia com as diretrizes do pragmatis­ plasse interesses mútuos, como do go­
mo lffiponsável e ecumênico fortalece verno brasileiro em definir objetivamen­
mmse os vínculos com o Segundo Mun­ te seus próprios interesses. Pois, como
do. Tanto o ministro Azeredo da Silveira afirmam Gerson Moura e Maria Regina,
como o PI€5idente Geisel foram recepci<>­
nados nas principais capitais européias "embora a politica brasileira se
e em Tóquio como reprESentantes da pautasse por um comportamento
vanguarda dos países em desenvolvi­ independente e pragmático nas re­
mento. lações fora do hemisfério, no caso
Ao expor, em Londres, o conteúdo da da América Latina as posições de
política externa brasileira, o chanceler Brasília eram guiadas por uma in­
brasileiro a traduziu nestes termos: teração mais complexa entre 05 ob­
jetivos pragmáticos do ltamarati e
''São de especial importância as rela­ as definições de segurança do esta­
ções que mantemos com as nações da belecimento milit&r".46
CEE, que tomadas em coI\iunto, são
hoje o principal supridor de nosSBS A despeito da secundarização das
importações e o nosso principal clien­ instáncias militares brasileiras no pro­
te. Com essas nações, o Brasil se cesso decisório da política externa, fru­
esforça por desenvolver uma relação to da obsolescência da tese das frontei­
baseada no princípio do beneficio ras ideológiCAS, o fato é que no tocante
mútuo, suscetível de criar as condi­ à América LatinA SIJAS posições ainda
ções para uma verdadeira interde­ eram consideradas válidas. A preocu­
pendência horizontal, distinta da pação com uma possível expansão do
vertical, que prevalece hoje na maior socialismo no continente havia prati­
parte do mundo e se caracteriza pelo camente sido eliminada com o golpe
modelo de dominação, remanescente militar no Chile em 1973, permanecen­
. ,.45
dos SIStemas
· coIOnIaIS. do apenas a prevenção contra o regime
.

cubano. Porém, a preocupação com a


A ação diplomática orientada para o segurança das fronteiras e com o equi­
estreitamento das mencionadas rela­ líbrio político-militar no continente
ções horizontais não conseguiu colher constitui a própria razão de ser da
236 F.STUDOS I I ISTÓnlCOS - I !}93/12

instituição militar. Tratava-se, acima Junto com a Africa esta era considerada
de tudo, de conciliar a defesa da sobe­ uma prioridade pela chancelaria brasi­
rania nacional com a vontade de coope­ leira. A defesa da tese da necess idade de
ração e entendimento com os vizinhos seoperar mudanças na ordem econômica
continentais. internacional, tornando-a menos opres­
A dualidade intrínseca à posição bra­ siva para com os paises do Thrceiro Mun­
sileira se revelava com inteira nitidez do, supunha um impn:scindível consenso
nas .relações com a Argentina. De um continental. Desse modo, impunha""" o
lado, o fi)me propósito de não ceder às esforço para se aparar as arestas even­
pressões para rever o projeto de ltaipu à tualmente existentes, para se alcançar
luz dos interesses nacionais argentinos; uma articulação regional à altura dos
de outro, a cautela em conduzir o dificil fins visados. Ademais, a desinc"Ompatibi­
diálogo denlro dos limites do tolerável }ização com a política hemisférica norte-
.
americana requena., como cornpensaçao,
.

para ambas as partes, evitando� assim


-

a aproximação do ponto de ruptura. a implementação do projeto de unidade


Para os nlilitare5 argentinos chega­ continental, para legitimar a orientação
dos ao poder em 1976, o projeto de ltaipu seguida no contexto internacional.
mais não era senão a consubstanciação O Tratado de Cooperação Multilate­
do velho progJama geopolítico brasileiro ral na Amazônia, assinado em Brasília
de dominar a bacia do Prata. As excelen­ em 3 de julho de 1978, figurou como um
tes relações com a Bolívia, lastreadas êxito dessa política. Reunindo Bolívia,
por intensas atividades econômicas con­ Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suri­
juntas, e a Íntima vinculação ao Para­ name, Venezuela e o próprio Brasil, o
guai, caracterizavam 06 propósitos bra­ tratado previa urn esforço coordenado
sileiros de isolar a Argentina, reduzindo para o desenvolvimento e sobrevivência
ao mínimo sua mobilidade na região. Daí da Amazônia.
sua resposta ao Brasil sob a forma do Ao discursar na solenidade de aber­
projeto hidrelétrico de Corpus, em asso­ tura, o presidente brasileiro assim in­
ciação com o mesmo Paraguai; ao mes­ terpretou o tralado:
mo tempo que forçava o Brasil a um
diálogo mais franco, devido aos proble­ ''Contra os ensaios de internacionali­
mas técnicos levantados pela coordena­ zação, sob a forma abrupta do passa­
ção dos dois projetos, impedia a conside­ do ou da interferência sulil do pre­
rada total satelitização do Paraguai pelo sente, o melhor antídoto é a regiona­
Brasil. lização da proteção da área. Na Ama­
De modo geral, podese dizer que as zônia, repito, compete aos países que
negociações para a compatibilização dos a partilham, e a eles SÓ, a responsa­
interesses do Brasil, Paraguai e Argenti­ bilidade exclusiva pelo seu desenvol­
,A7
na arrastaram-se ao longo de todo o man­ vimento.
dato presidencial do general Geisel. S0-
mente em outubro de 1979, no período do Portanto, ao mesmo tempo que en­
general Figueiredo, as negociações che­ tendia o tratado como um instrumento
garam a bom terlllO, mediante o Acordo capaz de proporcionar uma integração
Multilateral Corpus-ltaipu. do Brasil com os paises que compõem a
No concernente às suas relações com geografia da Ama zônia, respondia às ini­
as demais nações latino-americanas, a ciativas tomadas no exterior de transfor­
polílica externa brasileira encaminhou­ mar a região numa questão internacio­
se para a efetivação do mullilateralismo. nal. Segundo a ótica da diplomacia bra-
os M1LlTARES NA POL.ITICA EXTEnNA BRASIlEIRA 237

sileira, n ação conjunta oonfoTlilava um Segundo o chanceler Saraiva Guenei­


passo significativo no sentido da barIUo­ ro, a linha básica da política externa sob
nização dos interesses do hemisfério seu comando seria o universalismo, com­
contra a ação subjugndora do hemisfério plementado pela dignidade e pela boa
Norte. convivência. Por universalismo enten­
dia se a adaptação da política externa
brasileira à il'l'efreável tendência à mun­
5. Governo Figueiredo: a política dialização do sistema internacional. Tal
universalis!a adaptação era vista como necessária e
premente, em virtude do singular perfil
o governo Figueiredo, iniciado em do Estado brasileiro, em que a ambiva­
março de 1979, estava destinado a ser o lência constitui o traço mais destacável.
último dos governos militares do ciclo Ou seja, enquanto de um lado integra o
iniciado em 1964. Sob seu mandato de­ Thrceiro Mundo, de outro insereiSe no
ver·se-ia processar a etapa final da aber­ Ocidente desenvolvido; neste último, por
tura política. Em seu discurso de posse , compartilliar seus valores e aspirações.
o novo presidente deu particular ênfase Essa bifacética identidade nãol'Omporta­
ao seu compromisso com os ideaisderno­ ria, portanto, excllJsão nem de um nem
cráticos. jurando solenemente 'fazer de outro lado; detenninava, �10 contrá­
deste país uma democracia". Na sua as· rio, Uln diálogo pennanenle e universa­
sessoria política, o presidente Figueire­ lizante que refletisse a posição do Bmsil
do contava com o mais importante estra­ como nação-sintese e elo de ligação des­
tegista do regime, general Golbery do ses dois complexos culturais.
Couto e Silva, especialmente designado
para acompanhar pari--passlt os desdI>­ "O universalismo é componente in­
bramenLos da descompressão . terno aos objetivos de paz, que orien­
A marcha da redemocratização pC>­ tam a política externa brasileira. Um
rém nâo foi linear. A crise econômica perfil universalista, pa.ra não ser um
interna, acentuada pelo quadro recessi­ artmcio, deve part.ir da aceitação da
vo externo, atiçando a impaciência da diversidade. Deve admitir a diferen­
sociedade pelas refonnas, condicionou o ça de tendências, e entender que os
surgimento de sérios percalços. Oscilan­ laços sólidos entTe países sâo cons­
do de acordo com o movimento cruzado truídos na plena percepção dessa di­
das coJ'l'entes pró e contra abertura, pro­ ferença e. em certos casos, até com
w
curou cumprir seu jUI-amento sem con­ base nelas."
frontar-se com os elementos de seu cír­
culo castrense. A América Latina como um todo e a
O novo governo não propôs nenhuma Argentin.:'l em particular const.ituíram a
mudança de curso da política externa. primeira prioridade da polít.ica universa­
Na interpretação de Sônia de Camargo, lista brasileira. Realizando intenso pro­
"o que houve, talvez, foi uma mudança grama de viagens e encontl"05 com os

de estilo - unIa diplomacia menos secre­ representantes governamentais da re­


ta e com um diálogo mais aberto com o gião, o governo brasileiro garantiu a con­
Congresso Nacional". 4� Na realidade a tinuidade da aplicaÇ'do das diretrizes an­
ruptura já havia sido realizada. O que teriormente estabelecidas. A criação da
antes fora apresentado como pragmat.is­ ALAD!, a entrada em vigor da Coopera­
mo agora consolidava-se como uma es­ ção Amazô nica e a cooperação energética
tratégia articulada e coerente. através da B lADE confirma ram o em-
238 ES11JDOS HISTÓRICOS - 1 993/12

penho brasileiro em protagonizar a inte­ sócio-econômica e militar. Instrumental,


gração latino-americana, para melhor "pela falta de apropriado equipamento
enfrenter as imposiÇÕffi dos peises de­ moderno (como submarinos e mísse is
50
senvolvidos. autodirigíveisY'. Sócio�nômica, "em
Entrementes, a clara consciência a virtude de seus baixíSSUn08 índices de
respeito da clivagem entre o Norte e o integração social, de assumir sacrifici06
Sul no sistema internacional eviden­ coletivos e enfrentar, consistentemente,
ciou-se, na América Latina e no Brasil, uma séria contingência nacional", e c'pe.
com a guerra das Malvinas. O que até la total dependência do país de supri­
então manifestava.,se sob a forilla de mentos externos de petróleo que, por sua
práticas econômicas de efeitos perver­ vez, dadas as DOSRB6 condições, depen­
, 51
sos, assumiu sua face político-militar dem do sistema financeiro ocidental' .
quando o governo militar argentino de­ Impotência militar, "pelo despreparo de
cidiu-se a recuperar a soberania sobre nossas Forças Armadas, que há vários
as ilhas Malvinas. anos foram conduzidas a se concentrar
A ação desencadeada pela Argentina em funções policiais de contra-insurgên­
surpreendeu seus cálculos e expectati­ eia com sacrificio de suas verdadeiras
52
vas, obrigando-a a empreender uma funÇÕffi de defesa nacional". Atendo­
guel'1'8 para a qual não se achava devi­ nos exclusivamente ao último aspecto
damente preperada. Ao supor que a a­ apontado por Jaguaribe, podemos afll'­
liança anticomunista que os ligava aos mar que a guell'B das Malvinas nada
Estados Unidos os colocaria a salvo do mais fez do que expor as conseqüências
confronto armado com a Inglaten8, os da doutrina das fronteiras ideológicas.
militares argentinos tardiamente desco­ Pois, mudadas as diretrizes básicas da
briram que os laços que uniam os dois política externa brasileira e as tendên­
Estados da afAN estavam acima de cias do sistema internacional, verifica­
quaisquer contigenciais identificações va-se quão equivocada havia sido a polí­
com reíses do hemisfério sul. Ademais, tica de priorizar as forças teJ"l'estres em
tornou BC evidente também que os ins­ desfavor das fOIçaS aeronavais. Desfeita
trumentos jurídicos, políticos e militares a ilusão da defesa continental com o aval
que comprometiam os Estados Unidos norte-americano, aflorava a falta de
com a América Latina (TIAR e OEA) uma proteção do Atlântico Sul à altura
eram inoperantes contra p:>tências que da importância que lhe era atribuída
não se encaixavam no perftl desenhado pelos próprios militares.
por seus signatários, em 1947 e 1948. Isto Esses problemas porém não esgota­
é, com a exclusão de um ataque da perte vam o repertório. Outros novos passa­
da União Soviética e de seus aliados, a ram a integrar a agenda político-diplo­
segurança coletiva do continente ficava mática brasileira. A luta pela preserva­
inteiramente à mercê das oonveniências ção da OEA passava a ser um dos mais
políticas norte-americanas. relevantes. Rejeitando a tendência que
O desenvolvimento das operaÇÕffi ae­ tomou conta nalguns Estados latino­
ronavais no sul do continente suscitou americanos, de considerar a organiza­
questões diplomático-estratêgicas ex­ ção como um foro inútil e ultrapassado,
traordinariamente relevantes pera o devido à sua paralisia em face da crise
Brasil. Segundo Hélio Jaguaribe, a crise das Malvin85, a diplomacia brasileira
das Malvinas deixara evidenciado o as· arrogou-se o dever de reerguê-la.
tado de impotência em que o país se Ao assumir o cargo de secretário-ge­
encontrava: impotência instrumental, raI da OEA, o embaixador Baena Soa-
OS MILITARES NA POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA 239

res, discursando sobre os problemas mo e a União Soviética (o Império do


que desafiavam sua gestão, afirmou Mal) no centro das preocupações inter­
que: nacionais para, ass im, legitimar a luta
norte-americana de reconquista da lide­
''O maior deles estará na manuten­ rança do mundo ocidental. Para tanto,
ção de vínculos mais profundos entre apoiou--se internamente no fundarnen­
05 países americanos, vínculos que talismo puritano e no liberalismo orto­
favoreçam o convívio igualitário e r& doxo. Ancorado nesses princípios, não
ciprocamente vantajoso entre as na­ hesitou em ficar ao lado do conservado­
ções em desenvolvimento da América rismo britãnico contra a Argentina, em
Latina e do Caribe, e entre essas e os ameaçar a América Central de invasão
,s3 militar, em pn:ssionar para a criação da
Estados Unidos da América.'
Organização do 'Iratado do Atlântico Sul
Por outras palavras, não apenas de­ e em intervir militaJ"mente em Granada,
fendia a relevância da entidade para a em 1983.
América Latina e o Caribe, como tam­ Evidentemente essa orientação da po­
bém afinnava a importância e a necessi­ lítica dos Estados Unidos representava
dade de se manter a filiação norte-ame­ profundo golpe nas expectativas deposi­
ricana. Só mediante a conservação de seu tadas no diálogo Norte-Sul. O retorno à
vínculo com a organização poderiam os gueI"l's fria representava uma reafil"lua­
demais países subdesenvolvidos zelar ção do bipolarismo e, por conseguinte, a
para que os Estados Unidos respeitas­ desqualificação política do Terceiro Mun­
sem os princípios por ela consagrados. do. Tal quadro repercutiu negativamente
Caso contrário, liv""s de qualquer com­ junto ao governo brasileiro, resultando,
promjffiO fOimal, sentir-se-iam liberados como na tural reflexo, numa ação mais
para, mais desinibidamente, praticar hallllônica entre militares e diplomatas.
uma politicade puro poder no hemisfério. Os primeiros ressentiam-se das ban"i­
A preocupação com o comportamento ras que se erguiam para o prosseguimen­
futuro dos Estados Unidos justificava-se to da disc1lssão de uma nova ordem eco­
pela nova orientação de sua politica in­ nômica internacional. Os segundos, de­
ternacional. A ''política dos direitos hu­ cepcionavam� com o de."5C9so com que a
manos" do governo Carter havia redun­ estratégia hegemonista norte-america­
dado em fracasso. Os dissidentes sovié­ na contemplava seus projetos de poten­
ticos não promoveram mudanças assi­ ciação do poder nacional. This problemas,
naláveis e, em contrapartida, a União somados às pendências econônlicas e às
Soviética ocupou militarmente o Afega­ da tecnologia nuclear, contribuíram para
nistão. Por outro lado, foram apeados do manter as relações entre os dois Estados
poder importantes al.iados dos Estados frias e distantes.
Unidos no Irá e na Nicarágua, ao mesmo Como conseqüência desse enrijeci­
tempo em que a Coréia do Sul e a África mento das relações com os Estados
do Sul entravam numa fase de turbulên­ Unidos, a diplomacia brasileira agiu
cia. Para contra-arrestar essa perda de mais detenninadamente no sentido de
substância da estratégia global norte­ promover uma sólida cooperação com
americana, o presidente republicano !lo­ os países da América Latina, com vis­
nald Reagan, eleito em 1980, iniciou vi­ tas à fOl"mação de um anteparo consis­
gorosa campanha anticomurusta que fez tente à politica ofensiva de Reagan.
lembrar a guella fria nos anos 50. Sua O primeiro passo para a concretização
politica objetivava recolocar'o comurus- dessa nova prioridade política brasileira
240 ESTUDOS I IISTÓRlCOS - 1903/12

consumou-se com a redefinição das rela· tava da situação do governo brasileiro


ções com a Argentina. Embora a decisão de exportador de material bélico para
54
isolada dos militares argentinos de reco­ a região. Neste caso, teríamos proce­
brar a soberania das ilhas Malvinas ti­ dido como uma grande potência: de um
VffiSe preocupado a diplomacia brasilei­ lado, propugnando o arbitramento ju­
ra, na medida em que abria um perigoso rídico-político para a solução dos pro­
precedente que poderia reacendervelhos blemas, de outro, obtendo lucros com o
e esquecidos litígios de fronteira em todo prosseguimento do conflito. Contudo, a
o continente; o comportamento diplomá­ ação da diplomacia brasileira não se
tico brasileiro pautou-se pela neutralida­ afastou de suas diretrizes gerais. Ao se
de (positiva em relação à Argentina) e formar a comissão de países mediado­
pela tentativa de levar os dois Estados res em janeiro de 1982 - Grupo de
beligerantes a negociarem a questão nos Contadora (México, Panamá, Colôm­
foros apropriados. Daí por diante, o rela­ bia e Venezuela) -, o governo brasileiro
cionamento Brasil-Argentina caminhou garantiu seu apoio às negociações.
,

rapidamente no sentido do bom entendi­ As pressões norte-americanas para a


mento, sobretudo após o ano de 1983, formação da Organização do Tratado do
quando OS militares argentinos deixa­ Atlântico Sul (OTAS), o governo brasilei­
ram o poder e o presidente eleito Raul ro respondeu negativamente. O tratado,
Alfonsin passou a comandar o processo que previa a participação da Argentina,
,

de redemocratização do país. A coinci­ dos Estados Unidos e da Africa do Sul,


dência de propósitos democráticos apro­ contrariava frontalmente a estratêgia
ximou Brasília de Buenos Aires e propi­ brasileira de defesa do Atlântico Sul.
ciou a tomada de consciência por parte de Após as independências das colônias
ambos 05 governos de que a melhor ma­ portuguesas, seguidas do imediato reco­
neira de enfrentar 05 problemas comuns nhecimento brasileiro, verificou-se uma
era abandona r as históricas desavenças reversão do quadro de nossas alianças
e perseguirjuntos alternativas viáveis de na região; as bases de BJXlio haviam
desenvolvimento. deixado de ser Lisboa e Pretória. Depois
Para a América Central. convulsio­ dessas mudança, tornara-se claro que a
nada pela queda do ditador Somoza e estratêgia brasileira passara a apoiar-se
pela guerra civil em EI Salvador, a exclusivamente nos países que integranl
política brasileira foi a de encarar as seu cenário geoestratêgico. 0ffiSe modo,
pressões norle-americanas como mais o projeto norte-americano era indeseja­
um capítulo do conflito Norte-Sul e de, do porque contrariava nossa decisão de
,

por conseguinte, apoiar-se no primado priorizar o relaciona,mento com a Arrica.


jurídico da náo-intervenção. Ultrapas­ Além disso, já náo fazia mais sentido
sada a fase da estratégia da segurança uma aliança de caráter anticomunista .
coletiva - que, em 1 965, conduziu o A principal preocupação brasileira con­
Brasil à participação na FIP -, a Amé­ sistia agora em cultivar lnercados con­
rica Central figurava agora como um sumidores e livrar a rota do Cabo de
cenário distante. Por isso, a atuação bloqueios que pudessem cat1sar prejuízo
brasileira caracterizou-se pela discri­ para o consumo nacional de petróleo.
ção diplomática. Por questão de princí­ Por outro lado, a hipótese de assinatu­
pio, aceitava-se qualquer solução polí­ ra do tratado foi defmitivamenteabando­
tica para a região, desde que decidida nada após a guena das Mal vinas . Pois,
pelos próprios povos envolvidos na cri­ afina l, esta evidenciara que a internacio­
se. Em boa medida, tal cautela resul- nalização do Atlântico Sul determinaria,
í
OS MlUTARES NA pOL nCA EXTERNA BRASILEIRA 241

inevitavelmente, wna ainda maior vul­ ses angolanos revelou se tão acentuada
nerabilidade da defesa marítima brasi­ que, em 1981, por ocasião de mais uma
leira, sobretudo enquanto se mantiv"""" dessas incursões sul-africanas, O chan­
a carência de um di.spa3itivo nuclear. O celer brasileiro aventou a hipótEse de
governo &rgentino de Raul Alfonsin teve deslocar tropas brasileiras para defen­
a me·)W3 percepção e, para impedir que der a soberania angolana. Consoante
a idéia fcwe avante, rompeu relaçóee
o
esta política, reconheceuee também a
diplomáticas com a Africa do Sul, a qual SWAPO como legítima representante do
havia prastado apoio logístico à 8I1118da povo namíbio.
britânica na gueJ'JB. Desta vez, inversa­ A vertente terceiro-mundista do uni­
mente ao ocorrido no início da década de versalismo diplomático do Brasil esten­
1960 com a política externa independen­ deu-se também ao Oriente Médio e à
o

te, diplomatas e militares atribuíam o Asia. No Oriente Médio fortificaram-se


mesmo grau de importância à política as relações com aqueles paises produto­
o

brasileira para a Africa. O ÚJÚco senão res de petróleo e clientes do equipamen­


era a presença militar cubana em AIlgrr to bélico de produção nacional; neste
la, problema que só foi resolvido quando conjunto destacaram .... as relações com
o presidente José Sarney ""tabeleceu o Iraque e o Irã.
o

relações diplomáticas com Cuba, em Na Asia, o universalismo adquiriu


1986. sua melhor expressão. Pois do mesmo
A política africana do governo Figuei­ modo que aumentavam as identificações
redo não só deu continuidade à do gover­ políticas e cresciam o comércio e a coo­
no Geisel, como também a aprofundou. peração técnico·dentíflca com a Repú­
Conforme J. M. Nun� Pereira, em blica Popular da China, o Brasil reafir­
"1974 0 Brasil tinha somente 12 embai- mava suas boas relações com o Japão.
-

xadas residentes na Africa, dez anoe Atuando conforme o mesmo diapa­


depois, contava com 21, cobrindo 45 paí­ são, buscou-se o estreitamento das re­
ses".65 Acrescente-se ainda a viagem do lações diplomática,s com a Europa Oci­
Plwidente ao continente africano, a pri­ dental e um maior diálogo com os paí­
meira do gênero feita por um estadista ses da Europa Oriental.
sul-americano. Na OCAsião o presidente Ao apresentar o balanço da política
visitou a Nigêria, Senegal, Guiné-Bis­ externa brasileira sob seu comando, na
sau, Cabo-Verde e Argêlia, complemen-' Escola Superior de Guena, em agosto
tando as visitas realizadas pelo chance­ de 1984, o chanceler Saraiva Guerreiro
ler Saraiva Guerreiro em 1980, quando assim interpretou nossas relações com
este esteve em Moçambique, Angola, o Ocidente desenvolvido, a outra ver­
Tanrnnia e Zinbabue. O efeito político tente do universalismo:
d"""" estreitamento de relações dipl<>-
o

máticas com a Afriea foi um maior en- "Com o Ocidente desenvolvido (... )
volvimento do Brasil com 05 problemas dois objetivos foram alcançados: as
do continente. FÀ;sa atenção concentrou­ relações são hoje claramente iguais e
se principalmente na parte austral, onde conversamos e nos entendemos com
a Africa do Sul constantemente fustiga­ nossos parceiros desenvolvidos de
va o território angolano com interven­ fOfllla franca, oom base no respeito
ções militares e com ajuda à UNlTA, mútuo, sobre qualquer tema do rela­
que do sul do território esforçava-se por cionamento, demos passos adiante
desestabilizar o governo do MPLA. A significativos no que tange à consulta
identificação brasileira com os interes- política, e a troca de infOImações e
242 ESTUDOS HISTÓRICOS - 1993/12

diagnósticos se faz sem restrições e tura. No raM, dada a posição periférica


com franqueza. Assim esvaziou-se o do Brasil no sistemA internacional, sua
conteúdo do relacionamento com as política externa tende sempre a orien­
potências ocidentais de qualquer tar-se no sentido da adequação à coqjun­
sentido de condescendência, de con­ tura, com vistas a promover o desenvol­
selho paternalista. Temos o que dizer vimento nacional. O que varia, obvia­
e contribuir. h linbas de coincidên­ mente, é a estratégia usada para atingir
cia, que tocam temas essenciais do essa finalidade.
.

relacionamento internacional, são No concernente aoe governos milita­


apresentadas e discutidas a partir da res, o objetivo perseguido foi rigorosa­
aceitação de IlO6S06 valores e de noe- mente o mesmo: fazer do Brasil uma
. ,_IC5Se5...56
B06 lnu::: grande potência mundial. As mudan­
ças internas e aquelas por que passou
o sistema internacional, porém, deter·
minaram que o governo Geisel :rompee­
Conclusão se com a eetratégia aplicada deede o
governo Castelo Branco. Com efeito,
Como conch1são de nosso estudo, não podemos afitlllar que do ponto de vista
podemos deixar de nos manifestar a res· estratégico a política externa dos go­
peito de uma questão sempre ap,,,,n ,,, ­ vernos militares dividiu-se em dois pe­
tada: realmente houve uma política ex­ ríodos, marcadamente distintos: um,
terna específica doe governos militares que começou com Castelo Branco e ee­
ou, pelo contrário, cada governo execu· tendeu...e até o governo Médici; e, ou­
tou sua própria política externa, ao sabor tro, que se iIÚciou com Geisel e só foi
das necessidades e possibilidades do mo­ encel"lado no fim do governo José Sar·
mento? ney, após concluído o ciclo dos governos
Antes de dar uma resposta, é indis­ militares.
pensável que se faça algumAS brevee O núcleo da estratégia do primeiro
observações. A primeira refere-se à pri­ período foi formado pela ideologia das
mazia da estratégia sobre as ações po­ fronteiras ideológiras. Na percepção dos
lítico-diplomáticas correntes. Porque, elaboradores nacionais, o eixo do siste­
para se avaliar a natureza e o êxito ou ma internacional estava oonstituídopelo
o fracasso de determinada política, conflito Leste-Oeste. A visão de que se
cumpre inicialmente eeclarecer quais devia fortalecer o poder nacional me­
06 objetivos, 06 recursos disponíveis e diante uma atuação político.diplomática
oe meioe utilizadoe por quem elabora e independente do bloco ocidental (não­
executa a política externa. Somente alinhada) em entendida como idealista.
com essas referências essenciais é que O único caminho possível à projeção in­
se pode apreender o sentido das múlti­ ternacional do Brasil era aquele alicer­
plas ações político-diplomáticaB desen­ çado numa leitura realista do sistema

volvidas pelos órgãos do Estado. internacional. E, de acordo com A3SC re-


A segunda observação diz respeito à alismo, qualquer orientação que incluís­
inserção do Brasil nas relações de poder se um agrnvamento das teIlSÕe6 com os
mundiais. Pois como Raymond Aron Estadoe UIÚdoe estaria deetinada ao
afiJ'lUS em paz e guerra entre as nações, frara8S0. Para ter êxito o Brasil devia se
as grandes potências moldam a conjun­ subordinar à incontornável liderança
tum internacional, enquanto os demais hegemônica noJie..americana no hemis­
Estados procuram ajustar se à conjun- fério e, por meio dessa subordinação,
OS MILITARES NA POLll1CA EXTERNA BRASILEIRA

243

explorar toda. as pcw;sibilidadee que se 106 Estad06 Unidos, que receavam ver
ofereceesem à oonsecução do objetivo fi­ surgir um novo pólo de poder no conti­
nal. nente. O grande dilema dos elaborado­
Convém notar, portanto, que o cha­ res da eetratêgia nacional então tradu­
mado "alinhamento automático" da p0- zia se em aceitar o papel l'i;,servado ao
lítica externa sob Castelo Branco na re­ Brasil pelas grandee potências, de se
alidade não existiu. AB boas relações manter como o mais pobre e o mais fraco
com 06 Estados Unidos constituíam, na dentre os maia ricoe e 06 mais forte:s, ou
verdade, apenas um aspecto de uma enfrentar o despfio de questionar a ee;­
estratégia de projeção internacional ee­ trutura de poder mundial para realizar
treitamente vinculada à clara opção pelo o objetivo de tornar..... uma grande po­
blooo ocidental. Consideramos igual­ tência.
mente inexistente a política externa Todavia, a decisão de aceitar o desa­
''terceiro-mundista'' de Costa e Silva. fio não foi irrefletida. Ela se adequava
Sua orientação manteve se a mesma, à nova tendência do sistema interna­
não obstante a recusa em acompanhar cional, marcada pelo movimento diri­
as posições norte-americanas que lesa­ gido por outros grandes Estad06 do
vam 05 objetivos nacionais antee estabe­ Terceiro Mundo de democratizar as re­
lecidos. lações internacionais, de modo a rom­
Por outras palavras, ambas as polí­ per uma ordem que beneficiava apenas
ticas externas situavam-se no meslIlO 05 interesses das gIandes ]X>tências e

quadro estratégico; ambas situavam o excluía os interesses das pltências mé­


Brasil como um ator do campo ociden­ dips e emergentes e do conjunto do
tal. Seu objetivo era o mesmo: promo­ Terceiro Mundo.
ver o desenvolvimento e bloquear o Conquanto a matriz teórica da nova
avanço do comunismo. AB diferenças es
..
sttratégia fusse a mesma da política ex­
ra
de ênfase em seu processo de imple­ terna independente, as oondições de re­
mentação deveram-se à.prápria evolu­ alização eram substancialmente diferen­
ção dos inte resses nacionais e aos obs­ tee . Nos anos 60 o Brasil apenas iniciava
táculos resultantes dessa evolução. seu Pl'fK)fiSBO de indlLShialização. A bipo­
O segundo período caracterizou....e larização do sistema internacional era
pelo rompimento com a ideologia das rígida, e a posição brasileira favorável à
fronteiras ideológicas. Para essa rup­ deeoolonização visava, antee de tudo, a
tura concotieram dois fatores: a trans­ eliminar a oonoollência desleal dos pro­
formação do Brasil em poténcia média dutos primári06 das oolôn;as africanas
e o deslocamento do eixo do sistema no mel'CS.do mundial. Na segunda Ii&eta·
internacional de Leste-Oeste para de dos anos 70, o Brasil havia se oonver­
Norte-Sul. tido num exportador de manufaturadoe
Após uma fase de cH!scimento econô­ e oonoorria no setor agríoola e no setor de
mioo vertiginoso, o Brasil viu esgotadas serviços. A guerra fria descaracterizara­
Sllas pcw;sibilidadee de cl'eec imento e de se oomo oonllito ideológioo, e em seu lugar
expa nsão no campo ocidental. A passa­ havia tão somente uma luta entre gran­
gem de país subdesenvolvido para país des potências para manter á l'Eas de in­
em deeenvolvimento, que antee fora fluência. E, enfim, ao lado do Brasil ÍIgu­
saudada oomo a consagração das virtu­ ravam outroo grandes Estados oomo a
,

des do capitalismo ocidental, começou a China e a India, que igualmente acha-


ser perU!bida oomo uma ameaça pelas vam-6e tolhidas pela estrutura oligárqui­
grandee potências, particularmente pe- ca do poder mundial
244 ESTUDOS HISTÓRICOS - 1993112

plOOCUpaçáo rom o De!!en volvimento, no ter­


Notas reno da poütica externa, me pai : e funda­
_

mental e tendente a evitar muitos doa


1. Raymond Aron divide 08 Estadoe em mal-entendidce que reou1tam da aplicação
dupe categorias: as gra.ndee potêooa8 e 08 Ul.strita do Desenvolvimentismo aoque,afi.-
nal de rontaa, é pssencial à poütica. externa:

pequeI1ce Estado. /vJ pimeiras, em virtude


de seus lGt.'UfIIlW s
uperiorES, têm a capacidae o fator polftico". Meira Penna, "Oriente-Oci­
de de moldar a oorUunturB. intemeooDplj 011 denta:.a polarização do mundo e a pceição do
_._
Be5 �-, de'��-
u.a_ v
.wu a ' carenaa .
' de 1e..,JnK)8" l'mJ_ Brasil", Revista Brasileira de Estudos PolUi­
.

tam-ee a tentar adequarS 8 à Wlijuntura. coo, UFMG, nO 19,julho de 1965.

Raymond Non, paz e guerra entre as n<JI'leB 11. PlOsidente Castelo Branoo, disourao
(Bra.jJja, UNB 1979), p.124.
, cit.
2. Arthur M. Schl..inger, Jr., Os ciclos da 12. "Quando o presidente do Chile,
hWéria americana (Rio de Janeiro, Civiliza· Eduardo Frei, aprf3�ntou, em 1965, o seu
ção Brasileira, 1992), p.57. plano para a criação de um mercado co­
3. Idem, ib. mlJm latino-americano, defront.ou-se, co­
mo era previsível, com a firme oposição do
4. P. A. Reynolds, InJ:roduccWn al esl1.uüo
. governo brasileiro. Essa reação negativa
deÚJ8 relacWnes in ( Madri, Thc-
compaginava-se perfeitamente bem com
nce, 1977), p.58.
nossas posições políticas fundamentais".
5. Idem, ib., p.l24.
Carlos EstevaID Martins,"A evolução da
6. Hélio Silva, O poder militCU' (porto Ale· política ""terior brasileira na década 64-
gre, LPM, 1984), p.349. 74", E8tudo8 CEB RAP, nO 12, abril-maio­
7. Para 11m melhor entendjmento acerca junho, 1975, p.64.
da importância da revolução ""bona nodebe· 13. Adcacrição do pro SO de negociaçêrR
....R
ta sobre a política externa independente, ver com o Paraguai enoontta-se em lA.ús Viana
'Iània Quintaneiro, Cuba e Brasil da revolu· Filho, O governo Castelo Bronco (ruo de Ja­
ção ao golpe (1959-1964) (Belo Horizonte, neiro, José Olympio, 1975), p.445446.
UFMG, 1988).
14. Meira Penna, op. cit.
8. A propósito do fioc_SSQ de tomeda de 15. A lospeito das repercussões provo­
ckasáo noagovemos mi!it&res, ver Walderde
cadas pela decisão do governo brasileiro na
Oós', O Brasil do general Geite1 (Rio de Ja­
opinião pública e doe pontos-de-vista da
neiro, Nova Fronteira, 1978).
intelectualidade, ver Política Externa 1",
9. Diacumo JrOferido pelo ..'Údente c
... ·
dependente, n" l, 2, 3, de maio/1965, agoo­
telo Bra""" em 31 de julho de 1964 no Inati­ to/1965 e janeiro/1966, respectivamente.
tuto Rio Branoo, em solenidade de fonnatura 16. Luís Viana Filho, op. cit., p.443.
de diplomatas.
17. Idem, ib., p.448. .
10. Explicando as razões da pc dênda
18. Discurso pronunciado pelo marechal
da segurança sobre O desenvolvimento, AMim.
Artur da Costa e Silva no Palácio do Itama­
se EULf4En ou o embaixador Meira Perma:
rati, em BrasOja, em 5 de abril de 1967.
"A política externa é wn fator subaidiário
19. "A política externa do Brasil". Confe­
do Dmenvolvimento, para o qual contriblÚ
rência pronunciada. pelo ministro Magalhães
em setoree: especiais, roma oomércio exterior,
Pinto na Fscola de Aperfeiçosmento de Ofi­
manutenção de preç<>e de produtos primá­
ciais do Exército em 29 de novembro de 1968.
nO!, oondiçõee de ppsistênoa e investimentos
eetrangeiroo, etc. A Segurança, pelo contrá­ 20. Rodrigo Amado (org. e notas), Araújo
rio, tem a sua pESCrvaçãO garantida, em Castro (Brasilia, UNB 1982), p.200.
,

primeiro lugar, pela polftica externa, quer 21. ''O suc...oor de Gordon, Jolm C. 'lUt­
através do instrumento da diplomacia, quer hill, que foi embaixador norte-americano
pelo 11SO da força arntada. Ee..,a f4ooominân­ de 1966 a 1969, não compartilhava com
cia da preocupação com a Segurança sobre a aquele seu interesse profundo pelo Brasil.
OS MlLlTARES NA POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA 245

'futhill considerava que 08 Estados Unidos 36. Discurso do cbanoeler brasileiro, An­
'haviam tido um papel operacional dema­ tônio F. Azeredo da Silveira, na abertura da
siado amplo no Brasil', particularmente no XXIX A"'!!embléia Geral da Org,mizeção das
que respeita ao programa de ajuda. Por Na,;OOo Unidas, em Nova York, em 23 de
outro lado, o novo embaixador tinha a im­ setembro de 1974.
'pres8ão de que Costa e Silva, ao contrário 37. Walder de G6Es, op. cit., p.32.
de Castelo Branco, mantinha-se relativa­
38. Discurso do vice-ministro do Comér­
mente independente dos Estados Unidos."
cio Exterior da República Popular da China,
Pedro Fernando Castro Martinez , Expan­
Chen Chieh, durante o almoço oferecido ao
sionismo y geopolitica en el Brasil contem­
repi(!entante do governo chinês no Paláci.o
porâneo (Mexico, Siglo XXI , 1980), p.128.
do Itamarati, em 8 de agosto de 1974.
22. Aeste respeito, consideramos indis­
39. Walder de Góes, op. cit., p.38.
pensável a leitura da obra que estabeleceu
40. Declaração de voto do chefe da delega­
as glandes linhas estratégicas da poütica
ção do Brasil à XXX Sa?tNo da Assembléia
dos Estados Undi08 para a América Latina
Geral das Nações Unidas, embaixador Sérgio
após a Segunda Ou.na Mundial: Nicholas
Corrêa da Costa, feita em 10 de novembro de
J. Spyk.man, America's strawgy in world
1975, sobre dois projetos de ,"solução refe­
po/itios (1942).
rentee à Questão da Palestina.
23. Apud Maria Helena Moreira AI....,
41. Discurso do chanoeler Azeredo da
E8uu/o e opooição r", Brasü (1964-1984) (pe­
Silveira durante o banquete que ofereceu
tropolis, Vozes, 1984), p.145.
ao ministro das Relações Exteriores da
24. Sobre a disolssão teórica a respeitodos República Federal da Alemanha, Hans­
VÚlculos entre política interna e política ex­ Dietrich Genscher, no Palácio do ltamara­
terna, ver Mareei Merle, La politiqlle étrYUl­ ti, em Brasilia, em 18 de novembro de
gére (paris, PUF, 1984). 1975.
25. AJfred Stepan, Os militares napolilicn; 42. Essa argwnentação foi apresentada.
(18 mudanças de padrões na vida brasileira na entrevista do pt.sident.e Ernesto Geisel à
(Rio de Janeiro, Arte Nova, 1975), p.l98. CBS,dos Estad08 Unid08, em 27 deIllllrÇO de
26. Carlos E. Martins, op. cit., p.83. 1978, a propósito da visita do presidente nor­
27. Brasil, Ministério das Relações Ex­ teamericano, Jimmy Carter, ao Brasil.

teriores, RelaJ6,-io 1972/M.R.E. (Brasilia, 43. Ver George F. Kennan, Samuel Pisar
MRE/CDO, 1972). et al., Délenle or débâcle: rommo" sense il&
28. Oliveiras S. Ferreira, ''Política externa US-Souiet re/a,;OTiS (NewYork, W W Norton,
a servil}> de lIma idéia messiânica", OEstado 1979).
rk S. Pcuoo, 31/03/1974. 44. Moniz Bandeira, op. cit., p,236.
29. Henry Kissinger,A laMaiso" Bla1lche, 45. Discurso do chanoeler Azeredo da
1968-1973, vol. 1 (paris, Fayard, l979), p.677. Silveira no Royal lnstitute ofInternational
Affairs (Chattam House). em Londres, em
30. Idem, ib., p.678.
21 de outubro de 1975.
31. Apud Moniz Bandeira,Br"lUlil-Estados
46. Maria Regina SOBres de Lima e Ger­
U"iJos: rivalidade emerger"" (I 950. 1988)
a
son Moura, "A !.n\jetória do pragmatismo:
(Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1989),
uma análise da política externa brasileira",
p.206.
Dados , vo1. 25, nO 3, 1982, p.359.
32. o. detalhes da Operação Trinta Horas •

47. Discurso do P'eaidente Ernesto Geisel


acham-se d"";tos em Paulo Schilling, O
por ocasião da solenidade de assinatura do
expansionismo brasileiro (São Paulo, Global,
Tratado de Cooperação Multilateral na Ama­
1981).
zônia, em 3 de julho de 1978.
33. Idem, ib. 48, Sônia de Camargo e J. M. Vasquez
34. Moniz Bandeira, op. cit., p.280. Ocampo,AlLtoritarisn1.O e denlOCracia 1WAr­
35. Maria Helena M. Alves, op. cit., p.l86. ge1ltina e Bra8il (/una décadn. rk política
246 ESllJDOS HISTÓRlCOS - 1993il2

exterior, 1973-1984) (São Paulo, Convívio, 55. Jcsé Maria Nunes Pereira, ''Brasil-
-

1988), p.125. Africa no governo Figueiredo: um balanço",


49. Conferência do miIÚStro de Estado das eontextc InleJnncioll.al, IRI/PUC-RJ, nO 2,
Relações Exteriores, Ramiro Saraiva Guer­ julho-dezembro 1985, p.86.
reiro, na. F&mla Superior de Guerra do Rio de 56. Conferência do mirústro de Estado das
Janeiro, em 13 de julho de 1979. Relações Exteriores, Remira Saraiva Guer­
reiro, na Eosrola Superior de Guerra, no Rio
50. HélioJaguaribe,Novoo,,"ário iI,temev
de Janeiro, em 31 de agosto de 1964.
cional (Rio de Janeiro, Guanabara, 1988),
p.222.
(Recebido para publicaçãc em. março ck 1993)
51. Idem, ih.

52. Idem, ih.

53. Discun;o do embaixador João Clemen· Williams da Silva Gonçalves é professor


te Baena Soares em Washington, em 20 de adjunto do Departamento de História da
junho de 1984, ao MSumir o cargo de se·'etá­ UFF e professor associado do Programa de
rio-geral da Organização dos Estados Ameri­ Estudos Americanos do lFCS-UFRJ.
canos -OEA. Shiguenoli Miyamoto é professor do De­
partamento de Ciência Política da
54. SôIÚa de Camargo, op. cit., p.15!. Universidade de Campinas.

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