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Supremo Tribunal Federal

Ementa e Acórdão
DJe 29/11/2011
Inteiro Teor do Acórdão - Página 1 de 14

08/11/2011 SEGUNDA TURMA

HABEAS CORPUS 110.132 SÃO PAULO

RELATOR : MIN. RICARDO LEWANDOWSKI


PACTE.(S) : VALDECIR CARDOZO
IMPTE.(S) : VALDECIR CARDOZO
COATOR(A/S)(ES) : SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

EMENTA: HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. PRISÃO EM


FLAGRANTE POR TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇÃO PARA O
TRÁFICO. INDEFERIMENTO DE LIBERDADE PROVISÓRIA.
AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. ORDEM CONCEDIDA.
I – A prisão, antes da condenação definitiva, pode ser decretada
segundo o prudente arbítrio do magistrado, quando evidenciada a
materialidade delitiva e desde que presentes indícios suficientes de
autoria. Mas ela deve guardar relação direta com fatos concretos que a
justifiquem, sob pena de se mostrar ilegal.
II – No caso sob exame, o indeferimento do pedido de liberdade
provisória fundou-se na necessidade de se preservar a ordem pública em
razão da gravidade abstrata dos delitos e por conveniência da instrução
criminal, fazendo-se alusão ao potencial intimidador em crimes dessa
natureza, fundamentos insuficientes para se manter o paciente na prisão.
III – Segundo remansosa jurisprudência desta Suprema Corte, não
basta a gravidade do crime e a afirmação abstrata de que os réus
oferecem perigo à sociedade e à saúde pública para justificar a imposição
da prisão cautelar. Assim, o STF vem repelindo a prisão preventiva
baseada apenas na gravidade do delito, na comoção social ou em
eventual indignação popular dele decorrente, a exemplo do que se
decidiu no HC 80.719/SP, relatado pelo Ministro Celso de Mello.
IV – Não obstante a vedação prevista no art. 44 da Lei 11.343/2006,
esta Segunda Turma, desde o julgamento do HC 93.115/BA, Rel. Min.
Eros Grau, e do HC 100.185/PA, Rel. Min. Gilmar Mendes, passou a
admitir a possibilidade de concessão de liberdade provisória em se
tratando de delito de tráfico de substância entorpecente, devendo o
magistrado processante, para manter a prisão, analisar, no caso concreto,

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se estão presentes os requisitos do art. 312 do Código de Processo Penal, o


que não ocorre no caso sob exame.
V – Ordem concedida para colocar o paciente em liberdade
provisória, devendo ser expedido o respectivo alvará de soltura somente
se por outro motivo não estiver preso.

AC ÓRDÃ O

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da


Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do
Senhor Ministro Celso de Mello, na conformidade da ata de julgamentos
e das notas taquigráficas, por votação unânime, deferir o pedido de
habeas corpus, para conceder, ao paciente, liberdade provisória,
relativamente ao Processo 165/2010 da 2ª Vara da Comarca de Santa Fé do
Sul/SP, sem prejuízo de que o magistrado de primeiro grau, caso entenda
necessário, aplique, de forma fundamentada, isolada ou
cumulativamente, qualquer das medidas cautelares previstas no art. 319
do Código de Processo Penal (na redação conferida pela Lei 12.403/2011),
expedindo-se alvará de soltura se por outro motivo não estiver preso o
paciente, nos termos do voto do Relator. Ausentes, justificadamente, os
Senhores Ministros Ayres Britto e Joaquim Barbosa.

Brasília, 8 de novembro de 2011.

RICARDO LEWANDOWSKI – RELATOR

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08/11/2011 SEGUNDA TURMA

HABEAS CORPUS 110.132 SÃO PAULO

RELATOR : MIN. RICARDO LEWANDOWSKI


PACTE.(S) : VALDECIR CARDOZO
IMPTE.(S) : VALDECIR CARDOZO
COATOR(A/S)(ES) : SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

RE LAT Ó RI O

O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI (RELATOR): Trata-se de


habeas corpus, com pedido de medida liminar, impetrado por VALDECIR
CARDOZO, em nome próprio, contra acórdão da Quinta Turma do
Superior Tribunal de Justiça, que denegou a ordem no HC 194.455/SP, Rel.
Min. Laurita Vaz.

O impetrante/paciente afirma, inicialmente, que é advogado


devidamente inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil, Seção de São
Paulo – OAB/SP, e responde a ação penal, com outros dois corréus, no
Juízo da 2ª Vara Criminal da Comarca de Santa Fé do Sul/SP, por ter sido
preso em flagrante pela suposta prática dos crimes de tráfico de drogas e
associação para o tráfico (arts. 33 e 35 da Lei 11.343/2006).

Diz, em seguida, que a defesa formulou pedido de liberdade


provisória, tendo o magistrado de primeiro grau indeferido o pleito, “em
decisão totalmente genérica e lacônica (…), argumentando que os crimes
imputados ao paciente são de natureza gravíssima e inafiançáveis,
equiparados a hediondos, revelando forte repercussão social” (grifos no
original).

Relata, ademais, que, insistindo na concessão do referido benefício,


manejou habeas corpus no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo e,

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posteriormente, outro no Superior Tribunal de Justiça, sendo a ordem


denegada em ambas as impetrações.

É contra a decisão do STJ que se insurge o impetrante/paciente.

Alega, de início, que não desconhece a jurisprudência formada pela


Quinta Turma do STJ e Primeira Turma desta Suprema Corte, no sentido
de que a impossibilidade de liberdade provisória advém da própria
Constituição Federal, que impõe a inafiançabilidade dos referidos delitos
(art. 5º, LXVI), bem como a vedação legal do art. 44 da Lei 11.343/2006.

Alerta que, no entanto, ao indeferir o pedido de liberdade


provisória, o juízo processante não fez qualquer alusão a esses
fundamentos, não podendo as instâncias posteriores acrescentá-los para
denegar os habeas corpus.

Argumenta, também, que o juiz de primeira instância e o Tribunal


de Justiça bandeirante não conseguiram demonstrar, de forma
circunstanciada e concreta, os requisitos autorizadores da prisão cautelar
do paciente, conforme exige o art. 312 do Código de Processo Penal, em
flagrante violação do art. 93, IX, da Constituição Federal.

Requer, ao final, depois de prestadas as informações, seja concedida


a medida liminar para garantir, cautelarmente, a sua liberdade provisória.
No mérito, pede a confirmação da medida cautelar, até o trânsito em
julgado de eventual sentença penal condenatória.

Em 30/8/2011, indeferi a medida liminar, solicitei informações ao


Juízo da 2ª Vara Criminal da Comarca de Santa Fé do Sul/SP e determinei,
na sequência, fosse ouvido o Procurador-Geral da República.

As informações foram prestadas em 18/10/2011.

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O Ministério Público Federal, em parecer da lavra do


Subprocurador-Geral da República Mario José Gisi, manifestou-se pela
denegação da ordem.

É o relatório.

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HABEAS CORPUS 110.132 SÃO PAULO

VOTO

O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI (RELATOR): Bem


examinados os autos, tenho que o caso é de concessão da ordem.
O acórdão ora questionado possui a seguinte ementa:

“HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO


DE DROGAS. LIBERDADE PROVISÓRIA. VEDAÇÃO
EXPRESSA CONTIDA NA LEI Nº 11.343/2006.
FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA E SUFICIENTE PARA
JUSTIFICAR O INDEFERIMENTO DO PLEITO. ORDEM
DENEGADA.
1. O Paciente foi preso em flagrante com 485,3 gramas de crack,
no dia 20 de maio de 2010, tendo sido autuado pela prática dos crimes
dos arts. 33 e 35 da Lei nº 11.343/06.
2. A teor da orientação firmada pela Quinta Turma deste
Superior Tribunal de Justiça, a vedação expressa do benefício da
liberdade provisória aos crimes de tráfico ilícito de entorpecentes é, por
si só, motivo suficiente para impedir a concessão da benesse ao réu
preso em flagrante por crime hediondo ou equiparado, nos termos do
disposto no art. 5º, inciso LXIII, da Constituição Federal, que impõe a
inafiançabilidade das referidas infrações penais. Precedentes desta
Corte e do Supremo Tribunal Federal.
3. O Magistrado Singular justificou a constrição cautelar do
Paciente com base em fundamentação idônea, uma vez que apontou
fatos suficientes para demonstrar o abalo à ordem pública, a
necessidade de assegurar a aplicação da lei penal e a conveniência da
instrução criminal. Ressalte-se a qualidade, bem como a expressiva
quantidade da substância apreendida.
4. Ordem denegada”.

Neste writ, o impetrante/paciente postula o reconhecimento do

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direito de aguardar em liberdade o trânsito em julgado da ação penal, ao


fundamento de que o juízo de primeiro grau teria indeferido o pedido de
liberdade provisória, sem demonstrar, concretamente, os requisitos do
art. 312 do Código de Processo Penal.

A pretensão merece acolhida.

Isso porque o indeferimento do pedido de liberdade provisória


fundou-se na necessidade de se preservar a ordem pública em razão da
gravidade abstrata dos delitos e por conveniência da instrução criminal,
fazendo-se alusão ao potencial intimidador em crimes dessa natureza,
fundamentos, a meu ver, insuficientes para se manter o paciente na
prisão. Eis o trecho desse decisum, reproduzido no voto da Ministra
Relatora do STJ:

"(...)
Também o expediente de interceptação telefônica
instaurado pela Autoridade Policial Federal e deferido por este
Juízo, representa fonte indiciária da atuação de cada um dos
autuados em flagrante, inclusive do ora requerente, de forma
que a prisão, tal e qual formalizada, preenche os requisitos
legais. Determino o apensamento a estes autos daquele
expediente de interceptação telefônica, assim que ultimados os
atos processuais a serem nele praticados.
Mantenho, pois, o flagrante.
De outra banda, melhor sorte não socorre o requerente no
pedido de liberdade provisória.
Com efeito, a segregação processual tem por base, além dos
indícios da autoria e a prova da materialidade do delito, a
garantia da ordem pública, bem assim a conveniência da
instrução criminal e a segurança da aplicação da lei penal.
Como se vê, imputa-se ao acusado os crimes de
associação e tráfico, que, como bem anotado pelo Dr.
Promotor de Justiça, são de natureza gravíssima e
inafiançáveis, equiparados a crime hediondo, revelando

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forte repercussão no meio social, servindo a prisão como


garantia da ordem pública.
No que tange à garantia da ordem pública Júlio Fabbrini
Mirabete explica:
'Mas o conceito de ordem pública não se limita a prevenir
a reprodução de fatos criminosos, mas também acautelar o meio
social e a própria credibilidade da justiça em face da gravidade
do crime e sua repercussão. A conveniência da medida, como já
decidiu o STF, deve ser regulada pela sensibilidade do juiz à
reação do meio ambiente à ação criminosa' (in Processo Penal,
12. ed., São Paulo: Saraiva, p. 386).
E ainda, como preleciona Fernando Capez:
'Garantia da ordem pública: a prisão cautelar é decretada
com a finalidade de impedir que o agente, solto, continue a
delinquir, ou de acautelar o meio social, garantindo a
credibilidade da justiça, em crimes que provoquem grande
clamor popular'.
(...)
A manutenção da prisão cautelar faz-se necessária
também com fundamento na conveniência da instrução
criminal, pois não se desconhece o potencial intimidador em
crimes dessa natureza.
Júlio Fabbrini Mirabete ensina acerca da conveniência da
instrução criminal:
'Também pode ser decretada a prisão preventiva por
conveniência da instrução criminal, ou seja, para assegurar a
prova processual contra a ação do criminoso, que pode fazer
desaparecer provas do crime, apagando vestígios, subornando,
aliciando ou ameaçando testemunhas etc.' (in Código de
Processo Penal, 11. Ed., São Paulo: Atlas, 2006, p. 811).
Saliente-se, por oportuno, que residência fixa e ocupação ilícita
são elementos que podem e devem ser considerados pelo Magistrado ao
apreciar a necessidade da custódia cautelar, mas não representam óbice
ao reconhecimento de seu cabimento, como se verificou no presente
caso.
Por esses fundamentos, fica indeferido, também, o pedido

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de liberdade provisória" (grifos meus).

Ressalto, ainda, que, segundo remansosa jurisprudência desta


Suprema Corte, não basta a gravidade do crime e a afirmação abstrata de
que os réus oferecem perigo à sociedade e à saúde pública para justificar
a imposição da prisão cautelar. Assim, o STF vem repelindo a prisão
preventiva baseada apenas na gravidade do delito, na comoção social ou
em eventual indignação popular dele decorrente, a exemplo do que se
decidiu no HC 80.719/SP, relatado pelo Ministro Celso de Mello, do qual
extraio o seguinte trecho:

“A prisão preventiva - que não deve ser confundida com a prisão


penal - não objetiva infligir punição àquele que sofre a sua decretação,
mas destina-se, considerada a função cautelar que lhe é inerente, a
atuar em benefício da atividade estatal desenvolvida no processo penal.
O CLAMOR PÚBLICO, AINDA QUE SE TRATE DE CRIME
HEDIONDO, NÃO CONSTITUI FATOR DE LEGITIMAÇÃO DA
PRIVAÇÃO CAUTELAR DA LIBERDADE. - O estado de comoção
social e de eventual indignação popular, motivado pela repercussão da
prática da infração penal, não pode justificar, só por si, a decretação da
prisão cautelar do suposto autor do comportamento delituoso, sob
pena de completa e grave aniquilação do postulado fundamental da
liberdade. O clamor público - precisamente por não constituir causa
legal de justificação da prisão processual (CPP, art. 312) - não se
qualifica como fator de legitimação da privação cautelar da liberdade
do indiciado ou do réu, não sendo lícito pretender-se, nessa matéria,
por incabível, a aplicação analógica do que se contém no art. 323, V, do
CPP, que concerne, exclusivamente, ao tema da fiança criminal”
(grifos no original).

No caso sob exame, verifico que o decreto prisional está lastreado,


tão somente, em suposições e fundamentos genéricos que serviriam para
qualquer acusado em qualquer processo por tráfico de drogas.

O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, por sua vez, além de

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fazer referência aos argumentos do juízo de primeiro grau, acrescentou a


vedação legal do art. 44 da Lei 11.343/2006, nos seguintes termos:

"(...)
Não há nulidades ou vícios no auto de prisão em flagrante e a
decisão que indeferiu o pedido de liberdade provisória está
fundamentada na existência de indícios de autoria e materialidade,
garantia da ordem pública, conveniência da instrução criminal e
segurança da aplicação penal. Primariedade, idoneidade, residência
fixa e atividade lícita, por si sós, não bastam para assegurar a
liberdade provisória, quando presentes os fundamentos que alicerçam
a prisão preventiva.
Ademais, anote-se que nos moldes do art. 44, da Lei nº
11.343/06, o delito de tráfico ilícito de entorpecentes é
inafiançável e insuscetível de liberdade provisória e, aliás, a
vedação de tal benesse encontra eco na jurisprudência do
Colendo Supremo Tribunal Federal, como v.g. anotado no HC
83.468-ES, Relator o Eminente Ministro SEPÚLVEDA
PERTENCE, ao tratar o benefício do artigo 310, parágrafo
único, do CPP (...)" (grifos meus).

A vedação legal do art. 44 da Lei 11.343/2006, de fato, num primeiro


momento, obteve o aval de ambas as Turmas desta Corte, que firmaram
entendimento no sentido de que era vedada a liberdade provisória aos
crimes de tráfico de entorpecentes. Contudo, esta Segunda Turma, no
julgamento do HC 93.115/BA, Rel. Min. Eros Grau, e do HC 100.185/PA,
Rel. Min. Gilmar Mendes, posicionou-se em sentido contrário para
admitir a possibilidade de concessão de liberdade provisória em se
tratando de delito de tráfico de substância entorpecente, devendo o
magistrado processante, para manter a prisão, analisar, no caso concreto,
se estão presentes os requisitos do art. 312 do Código de Processo Penal, o
que não ocorre no caso sob exame.

Eis a ementa desses julgados:

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“HABEAS CORPUS. PENAL, PROCESSUAL PENAL E


CONSTITUCIONAL. TRÁFICO DE ENTORPECENTES.
SEGREGAÇÃO CAUTELAR. GARANTIA DA ORDEM
PÚBLICA. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DE SITUAÇÃO
FÁTICA. LIBERDADE PROVISÓRIA INDEFERIDA COM
FUNDAMENTO NO ART. 44 DA LEI N. 11.343.
INCONSTITUCIONALIDADE: NECESSIDADE DE
ADEQUAÇÃO DESSE PRECEITO AOS ARTIGOS 1º, INCISO
III, E 5º, INCISOS LIV E LVII, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL.
ORDEM CONCEDIDA.
1. Liberdade provisória indeferida com fundamento na vedação
contida no art. 44 da Lei n. 11.343/06, sem indicação de situação
fática vinculada a qualquer das hipóteses do artigo 312 do Código de
Processo Penal.
2. Entendimento respaldado na inafiançabilidade do crime de
tráfico de entorpecentes, estabelecida no artigo 5º, inciso XLIII, da
Constituição do Brasil. Afronta escancarada aos princípios da
presunção de inocência, do devido processo legal e da dignidade da
pessoa humana.
3. Inexistência de antinomias na Constituição. Necessidade de
adequação, a esses princípios, da norma infraconstitucional e da
veiculada no artigo 5º, inciso XLIII, da Constituição do Brasil. A
regra estabelecida na Constituição, bem assim na legislação
infraconstitucional, é a liberdade. A prisão faz exceção a essa regra, de
modo que, a admitir-se que o artigo 5º, inciso XLIII, estabelece, além
das restrições nele contidas, vedação à liberdade provisória, o conflito
entre normas estaria instalado.
4. A inafiançabilidade não pode e não deve --- considerados os
princípios da presunção de inocência, da dignidade da pessoa humana,
da ampla defesa e do devido processo legal --- constituir causa
impeditiva da liberdade provisória.
5. Não se nega a acentuada nocividade da conduta do traficante
de entorpecentes. Nocividade aferível pelos malefícios provocados no
que concerne à saúde pública, exposta a sociedade a danos concretos e
a riscos iminentes. Não obstante, a regra consagrada no ordenamento
jurídico brasileiro é a liberdade; a prisão, a exceção. A regra cede a ela

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em situações marcadas pela demonstração cabal da necessidade da


segregação ante tempus. Impõe-se, porém, ao juiz o dever de explicitar
as razões pelas quais alguém deva ser preso, ou assim mantido
cautelarmente.
Ordem concedida a fim de que o paciente seja posto em
liberdade, se por al não estiver preso” (HC 93.115/BA, Rel. Min.
Eros Grau).

“Habeas Corpus. 2. Tráfico de drogas. Prisão em flagrante.


Liberdade provisória. Vedação expressa (Lei 11.343/2006, art. 44). 3.
Constrição cautelar mantida somente com base na proibição legal. 4.
Necessidade de análise dos requisitos do art. 312 do CPP.
Fundamentação inidônea. 5. Ordem concedida para tornar definitiva a
liminar” (HC 100.185/PA, Rel. Min. Gilmar Mendes).
Portanto, sem me manifestar, ainda, sobre a validade da vedação
legal do art. 44 da Lei 11.343/2006, que se encontra em julgamento no
Plenário desta Suprema Corte, tenho que, no caso sob exame, a
necessidade de garantia da ordem pública não foi concretamente
demonstrada no decisum de primeiro grau.
Nos termos de remansosa jurisprudência desta Corte, o decreto
de prisão processual há de fundar-se em elementos fáticos concretos,
suficientes a demonstrar a necessidade da medida constritiva.
A prisão, antes da condenação definitiva, como se sabe, pode,
sim, ser decretada, segundo o prudente arbítrio do magistrado, quando
evidenciada a materialidade delitiva e desde que presentes indícios
suficientes de autoria. Mas ela deve guardar relação direta com fatos
concretos que a justifiquem, sob pena de se mostrar ilegal.
Ademais, embora a quantidade de droga apreendida não possa
ser considerada irrelevante, tenho que esse fator deverá ser levado em
conta no momento da dosimetria da pena, mas não justifica a
mantença do paciente no cárcere, sem decisão condenatória transitada
em julgado.
Aliás, em consulta ao sítio eletrônico do Tribunal de Justiça do
Estado de São Paulo, é possível verificar que foi prolatada sentença
penal condenatória, sendo aplicada ao paciente uma reprimenda total
de 18 anos e 8 meses de reclusão, em regime fechado. Contudo, o

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decreto condenatório não trouxe uma linha sequer acerca da


necessidade da manutenção da custódia cautelar, limitando-se a
determinar: 'Recomende-se os réus na prisão em que se
encontrarem'”.

Ante esse quadro, concedo a ordem para colocar o paciente em


liberdade provisória, relativamente ao Processo 165/2010 da 2ª Vara da
Comarca de Santa Fé do Sul/SP, sem prejuízo de que o magistrado de
primeiro grau, caso entenda necessário, fixe, de forma fundamentada,
uma ou mais de uma das medidas cautelares previstas no art. 319 do
Código de Processo Penal (na redação conferida pela Lei 12.403/2011),
devendo ser expedido o respectivo alvará de soltura somente se por outro
motivo não estiver preso o paciente.

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Decisão de Julgamento

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SEGUNDA TURMA
EXTRATO DE ATA

HABEAS CORPUS 110.132


PROCED. : SÃO PAULO
RELATOR : MIN. RICARDO LEWANDOWSKI
PACTE.(S) : VALDECIR CARDOZO
IMPTE.(S) : VALDECIR CARDOZO
COATOR(A/S)(ES) : SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Decisão: a Turma, por votação unânime, deferiu o pedido de


habeas corpus, para conceder, ao paciente, liberdade provisória,
relativamente ao Processo 165/2010 da 2ª Vara da Comarca de Santa
Fé do Sul/SP, sem prejuízo de que o magistrado de primeiro grau,
caso entenda necessário, aplique, de forma fundamentada, isolada
ou cumulativamente, qualquer das medidas cautelares previstas no
art. 319 do Código de Processo Penal (na redação conferida pela
Lei 12.403/2011), expedindo-se alvará de soltura se por outro
motivo não estiver preso o paciente, nos termos do voto do
Relator. Ausentes, justificadamente, os Senhores Ministros Ayres
Britto e Joaquim Barbosa. Presidiu, este julgamento, o Senhor
Ministro Celso de Mello. 2ª Turma, 08.11.2011.

Presidência do Senhor Ministro Ayres Britto. Presentes à


sessão os Senhores Ministros Celso de Mello, Gilmar Mendes,
Joaquim Barbosa e Ricardo Lewandowski.

Subprocurador-Geral da República, Dr. Francisco de Assis


Vieira Sanseverino.

Karima Batista Kassab


Coordenadora

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