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FACULDADE DE DIREITO DA UNIVERSIDADE NOVA DE LISBOA

FREDERICO DE LACERDA DA COSTA PINTO

DIREITO PENAL II
(ano lectivo 2003/2004)
Tópicos e indicações metodológicas para a resolução do “caso 77”
(in Casos Práticos de Direito Penal I, AAFDL, Lisboa, 1989)

Enquadramento prévio: o/a aluno/a deve realizar esta primeira análise do caso numa folha de
apontamentos e não na folha de exame.
a) Análise da matéria de facto e das relações entre os agentes
1) D--A--C--(E)--B
2) C--(antídoto) – B; C revela-lhe o plano, B sofre um acidente cerebral e fica semi-paralisado.
3) F bebe veneno destinado a B e morre.
b) Qualificação indiciária e provisória dos factos: tipos de crime aplicáveis e figuras da comparticipação.

TÓPICOS DE RESOLUÇÃO
Segue-se um conjunto de “tópicos” (mais desenvolvidos quanto a E e C e mais lacónicos quanto a A e D) sobre os
principais problemas suscitados pelo caso. Não se trata de uma resolução integral do caso prático, mas apenas
de um guia de resolução que identifica os aspectos essenciais que devem ser analisados e resolvidos.

I. RESPONSABILIDADE DE ERNESTINA

A) Responsabilidade de E pelo facto praticado contra B

1. Autoria material de uma tentativa impossível de homicídio qualificado na pessoa de B ?


a) Facto: Ernestina levou a B um copo de leite para este beber. A bebida foi preparado por Caetano,
que nela colocou sais de frutos, pensado que estava a usar veneno, para provocar a morte de B. Estamos
perante um comportamento dominado pelo agente que revela materialidade suficiente para violar a
norma típica de conduta.
b) Tipicidade (arts.131.º, 132º, nº 2, al. h); 26º, primeira parte, 22º e 23º, nº 3 e 14.º CP):
i) Tipo objectivo: o facto praticado pelo agente traduz-se em levar uma bebida supostamente
envenenada à vítima, com intenção de lhe provocar a morte, aspecto que, no entanto, é
desconhecido de E. Como por lapso não foi colocado veneno na bebida, contrariamente ao planeado
por Caetano, mas sim sais de frutos, a bebida em causa é um meio inidóneo para provocar a morte.
Por isso o facto não corresponde a uma tentativa (idónea) de homicídio, mas sim a uma tentativa
inidónea de homicídio (art. 23.º, n.º3, conjugado com o art. 22.º e com o art. 132.º, n.º 1 e 2, al. h) do
CP), por inaptidão do meio usado. Inaptidão essa que no momento da conduta não é evidente e só se
revela posteriormente. Nesse sentido, antecipando o critério de punibilidade da tentativa inidónea,
seria a mesma púnivel neste caso, à luz da teoria da impressão, consagrada no art. 23.º, n.º 3 do CP. O
facto é materialmente executado por E que exerce o domínio da acção, embora – como se verá ao
nível do tipo subjectivo – sem domínio do facto, por se encontrar em erro sobre elementos do facto.
ii) Tipo subjectivo: a tentativa – idónea ou inidónea - exige dolo do agente, como resulta do art.
22.º, n.º 1. O dolo é, genericamente, o conhecimento e a vontade de praticar o facto típico. Nos
crimes materiais de lesão de forma livre, como acontece com o homicídio, a idoneidade lesiva do

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meio usado e o processo causal fazem parte do tipo, porque só assim teremos uma acção adequada a
produzir o resultado (art. 22.º, n.º 2) e só deste modo se consegue estabelecer a relação de imputação
entre o resultado e tal conduta. Sendo a idoneidade da conduta e o processo causal elementos do
facto típico eles têm de ser objecto do dolo (art. 14.º), para se garantir a congruência plena entre o
ilícito objectivo e o ilícito subjectivo. No presente caso, estamos perante uma situação de ignorância
por parte de Ernestina do meio letal e do processo causal que Caetano pretendeu desencadear. Esta
ignorância da situação planeada por Caetano faz com que Ernestina esteja em erro sobre um
elemento do facto típico (art. 16.º, n.º 1, primeira parte) que exclui a responsabilidade a título doloso.
Sendo assim, o facto materialmente executado por Ernestina não pode ser uma tentativa (art. 22.º) de
homicídio, nem sequer uma tentativa inidónea (art. 23.º, n.º 3), porque a existência do erro relevante
sobre o facto típico exclui o dolo que é elemento essencial quer de uma, quer de outra modalilidade
de tentativa (pois a estrutura da tentativa inidónea é também aquela referida no art. 22.º). A existência
de uma situação de erro relevante faz ainda com que Ernestina tendo o domínio da acção, não tenha
contudo o domínio da vontade de praticar o facto típico, o que será relevante para a análise da
responsabilidade de Caetano que executa o plano. Faltando o tipo subjectivo, o facto tentado do
agente não é típico e, por isso, não se analisam as categorias subsequentes do acto punível. Resta
saber se poderá existir responsabilidade a título de negligência, o que se deve averiguar por força do
disposto no art. 16.º, n.º 3 do CP.

2. Responsabilidade por homicídio negligente tentado ?


a) Facto: o mesmo facto descrito no número anterior.
b) Tipicidade (arts. 137º, 22.º e 15º ex vi art. 16º, n.º 3 CP):
i) Tipo objectivo: o art. 16.º, n.º 3 ressalva a responsabilidade do agente a título de negligência sempre
que se verifica um erro relevante que exclui o dolo. Contudo, o art. 16.º, n.º 3 do CP não é um tipo
incriminador autónomo. Para tanto é necessário que exista um tipo incriminador negligente e que se
verifiquem os demais elementos do facto negligente. Verifica-se que existe um tipo de homicídio
negligente (art. 137.º CP), mas que contempla um crime consumado. Ora, no presente caso a morte da
vítima não se verificou como consequência do perigo criado, tendo a agressão ficado pela fase da
tentativa (que ademais seria inidónea). Acontece que o “tipo da tentativa” exige sempre o dolo, como
resulta do art. 22.º, n.º 1 e não se basta com a negligência. Além disso, existe uma incompatibilidade
entre o facto tentado e a imputação negligente. O disposto no art. 22º, nº1 (“crime que decidiu
cometer” ) é incompatível com a simples negligência, pois exige uma direcionalidade da vontade do
agente que não se verifica na mera negligência. Assim sendo, falta um tipo objectivo que, sendo
aplicável, possa valorar esta situação. Sem realização dum tipo não há responsabilidade penal,
tornando-se desnecessário prosseguir a análise da responsabilidade criminal de E.
B) Conclusão: ausência de responsabilidade penal de Ernestina pelos fundamentos expostos.

II. RESPONSABILIDADE DE CAETANO


A) Responsabilidade de C pela tentativa de homicídio contra B
1. Autor mediato de uma tentativa impossível de homicídio qualificado contra B?
a) Facto: C, embriagado, mistura sais de frutos no leite que será servido por E a B, pensado que está a
envenenar a bebida com estricnina, tendo o propósito de provocar a morte de B. Apesar da embriaguez,
o comportamento de C é dominado pela sua vontade (quer no momento em que aceita a proposta de A,
em que não estava embriagado, quer quando executa o plano), pelo que tem materialidade suficiente para
violar a norma de conduta que proibe o homicídio.

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b) Tipicidade (arts. 131.º, 132º, nº 2, als.b), c), h) e i); também al. a) ex vi art. 28º, nº 1; art. 26º, 2ª prop.,
arts. 22º e 23º nº 1, 2 e 3, todos do CP):
i) Tipo objectivo: o comportamento de C consubstancia uma tentativa inidónea de homicídio
qualificado praticada com dolo directo e usando E como instrumento do plano criminoso. Na
verdade, C está na posse de estricnica, que lhe foi fornecida por A, para executar o plano homicida.
Por inabilidade, nervosismo e perturbação provocada pelo alcóol troca o veneno, que tem já em seu
poder, por sais de frutos. Quando coloca a substância no leite, C pensa que a bebida tem o veneno
que lhe tinha sido fornecido para o efeito e essa convicção subsiste até ao momento em que E leva a
bebida a B e este a ingere. A inidoneidade do meio só se vem a descobrir posteriormente. Até aí o
agente continua convicto de que envenenou a bebida e essa impressão de perigo subsiste para
qualquer observador porque não é manifesta a inaptidão do meio durante a execução do plano.
Aliás, pode inclusivamente defender-se – embora de forma não isenta de dúvidas – que a tentativa
em causa começa por ser uma tentativa idónea: o acto de preparação da bebida envenenada não é
um mero acto preparatório (não punível) mas um acto de execução do homicídio, à luz do disposto
no art. 22.º, n.º 2 al. c) do CP e, neste momento, em que adultera a bebida, o agente tem em seu
poder o veneno real. É já durante a execução do facto que o agente troca o veneno por sais de
frutos. A execução do plano passa pela instrumentalização de E que deverá levar a bebida
envenenada até à vítima, através da indução em erro relevante do executor material (art. 16.º, 1)
como se viu atrás. C actua assim como autor mediato (art. 26.º, 2.º prop.) duma tentativa de
homicídio inidónea mas punível (art. 22.º, n.º 2, al. b) e 23.º, n.º 3), tendo o domínio do facto por
exercer um domínio sobre a vontade do executor material (que está em erro relevante sobre o
processo causal). Esse domínio advém-lhe de estar a par de todos os passos do plano homicida e
poder prever o evoluir dos acontecimentos em função da regularidade do comportamento do
instrumento (E). O tipo incriminador que o autor mediato visa realizar com o seu facto é um
homicídio qualificado, que fica pela fase da tentativa já que B não morre, por verificação simultânea
das agravantes da al. b) vulnerabilidade da vítima em razão da idade, al. h), uso de veneno, al. i)
reflexão sobre os meios empregados, al. d) avidez (por aceitar praticar o facto para obter um
proveito económico) do art. 132.º, n.º 1 e 2 do CP. Além disso é ainda aplicável, por força do art.
28.º, n.º 1, a agravante de parentesco com a vítima (132.º, 2 a)) que existe num participante (A) e
cujo grau de ilicitude se estende do participante ao autor mediato (inversão da acessoriedade). A
pena abstracta para o facto do agente é determinada nos termos dos arts. 23.º, n.º 2 e 73.º do CP.
ii) Tipo subjectivo: O agente actua inequivocamente com dolo directo (art. 14.º, n.º 1 do CP), isto
é, representa um facto que preenche um tipo de crime, o homicídio, e actua de uma forma
intencional, adequando os meios aos fins que pretende atingir (art. 22.º, 1 e 2, al. c) e b)).
c) Ilicitude: não existem indícios de causas de exclusão da ilicitude pelo que se confirma ilicitude do
facto indiciada pelo preechimento integral do tipo. Existe desvalor da acção, existe um desvalor de perigo
para o bem jurídico tutelado, mas não chega a verificar-se o desvalor do resultado pretendido pelo agente
d) Culpa: A culpa é um juízo de censura feito sobre o agente, mas mediado pelo facto praticado. O
facto tem de poder ser pessoalmente censurado ao agente como um acontecimento pelo qual ele pode e
deve responder porque se encontrava numa situação em que lhe era exigível que actuasse dum modo
conforme ao Direito, à luz de padrões socio-normativos (conceito social de culpa). O juízo de culpa só
se pode formular se o agente for “capaz de culpa” isto é, se tiver a idade mínima que o sistema exige para
que possa responder pelos seus actos (art. 19.º do CP), que no caso em apreço se verifica como resulta
do estatuto profissional do agente, e se, além disso, não se encontrar numa situação de pertubação
psíquica em função da qual possa ficar privado da capacidade de motivação pelas exigências do sistema
penal. Importa, quanto a este último ponto, indagar se o estado de embriaguez em que C se encontra

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pode ou não corresponder a uma situação de inimputabilidade, prevista no art. 20.º, n.º 1 do CP. O
preceito apenas prevê a inimputabilidade por anomalia psíquica, o que pode ser interpretando num
sentido mais restrito de doença do foro psíquico ou, de forma mais ampla, como uma situação de
perturbação psíquica que não se deva a um estado clínico patológico, mas sim e também à ingestão de
substâncias que perturbem o processo de avaliação do facto e de formação da vontade do agente. O
facto de o n.º 4 do art. 20.º prever as situações de anomalia psíquica provocadas intencionalmente pelo
agente permite demonstrar que no n.º 1 o conceito de anomalia psíquica deve ser interpretado no sentido
mais amplo que abrange quer a embriaguez, quer a intoxicação com outros produtos, desde que o
resultado seja uma pertubação do processo intelectual e volitivo do agente que o pode tornar incapaz de
avaliar normalmente a situação em que se encontra. No caso em apreço, a hipótese não nos diz se o
agente se encontrava alcoolizado ao ponto de o seu estado poder ser equiparado a uma anomalia
psíquica, para efeitos do n.º 1 do art. 20.º, nem nos diz se o agente se colocou intencionalmente nesse
estado para praticar o crime, o que legitimaria a invocação da excepção do n.º 4 do art. 20.º. Contudo, o
agente revelou luzidez suficiente para se arrepender e tentar evitar o crime o que constitui um indício de
que o nível de alcoolemia em que se encontrava não equivaleria a uma situação de incapacidade de avaliar
a situação. Neste termos, o agente deve ser considerado imputável e capaz de culpa, sendo o facto
praticado pessoalmente censurável. O juízo de censura é reforçado pelo facto de posssuir laços
profissionais antigos com a vítima que poderiam e deveriam ter constribuído para o desmotivar de
praticar o facto.
e) Punibilidade: O agente procurou evitar a morte de B, revelando todo o plano e fornecendo um
antídoto à vítima para impedir a progressão do veneno. Trata-se de um comportamento activo de
desistência que surge durante a fase da tentativa e antes de o crime estar materialmente consumado. A
desistência do autor mediato deve ser valorada à luz do art. 24.º e não do art. 25.º (assim, FCP), pois o
autor mediato exerce sozinho o domínio do facto e, por isso, pode-lhe ser exigido que impeça
efectivamente a consumação do crime que iniciou (princípio da simetria entre o domínio do facto e a
desistência). A desistência do autor mediato para ser relevante exige (1) uma conduta do desistente, (2) a
voluntariedade da mesma e (3) um certo resultado que consiste em paralizar a execução ou impedir a
lesão do bem jurídico tutelado. No caso em apreço, a tentativa era inidónea pelo que se coloca o
problema de saber se esta modalidade de tentativa admite desistência quando se sabe que é um facto que
não pode progredir para a lesão do bem jurídico. A resposta deve ser afirmativa (FCP): enquanto não se
revelar a inidoneidade da tentativa ela deve ser tratada como uma tentativa pura e simples. A partir do
momento em que se revele (para o agente) a inidoneidade da tentativa deixa de ser possível a desistência.
Acontece que a tentativa inidónea não pode progredir para a consumação pelo que o sucesso da
desistência (ausência e consumação) se dará por facto independente da conduta do desistente. A situação
está prevista no n.º 2 do art. 24.º, bastando para o efeito que o agente se esforce seriamente por impedir
a consumação do facto. Um “esforço sério” é um comportamento de defesa do bem jurídico que na
altura se revela o mais idóneo para evitar a consumação ou, não sendo o mais idóneo, possui idoneidade
sem inutilizar formas mais eficazes de tutelar o bem jurídico. No caso em apreço o antídoto dado à
vítima seria o meio mais idóneo de evitar a morte, pelo que o agente teve um esforço sério para impedir
a consumação. Esforço esse que é voluntário: partiu de uma decisão própria, não imposta ou controlada
por outrem, nem determinada por uma maior exposição a um risco que poderia exluir a liberdade de
decisão. Donde, a desistência é relevante e pode produzir o efeito isentador da pena. O que está de
acordo com os fins de prevenção geral e especial da pena estatal.
2. Conclusão : anulação da pena por força do art. 24º, nº 2, relativamente à punibilidade da tentativa praticada.
Este instituto tem efeitos exclusivamente pessoais. Contudo, os efeitos do art. 24º não se estendem aos
crimes que se consumarem durante o iter criminis. Por isso há ainda que ponderar as lesões na integridade
física sofridas por B.
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B) Responsabilidade de C pelas ofensas graves sofridas por B quando lhe revela o que se passou

1. Ofensas corporais graves contra B em autoria material (quando C revela a B tudo o que se passou :
art.144º, al. b) e c) + 26º, 1ª proposição) ?
a) Acção, tipicidade (reflectir sobre os seguintes tópicos):
* O comportamento de C é causal em relação às lesões de B?
* Relevância do comportamento que visa diminuir o risco; atipicidade da conduta; não
preenchimento do tipo objectivo do art.144º, al. b) ou c) por referência ao princípio da
diminuição do risco; não se pode tão pouco afirmar qualquer juízo de adequação.
b) Será a ofensa corporal grave um resultado que corresponde a um desvio não essencial no plano?
* Resposta negativa: não é a concretização do acto de envenenamento, mas de um comportamento
posterior atípico.
c) Outra forma de analisar a questão: será o comportamento de C um processo causal atípico que
realiza, dessa forma, o tipo do art. 144º?
2. Conclusão quanto ao problema da imputação das ofensas corporais sofridas por B: não são concretização do
envenenamento, mas o resultado dum comportamento posterior atípico que não gera responsabilidade penal.

C) Responsabilidade pela C pela morte de F (que bebeu o líquido envenenado)

a) Produção do resultado morte de F (reflectir sobre os seguintes tópicos):


Tipicidade objectiva (art. 10º, 1): relação de “causalidade”: existe previsibilidade de o evento ocorrer.
Tipicidade subjectiva: ausência de dolo. Existência de um tipo de homicídio negligente (art. 137º).
Existirá negligência (art. 15º)? Resposta afirmativa por referência à violação dum dever de cuidado
(deixou o veneno num local acessível a outras pessoas que o poderiam confundir com um
medicamento); problema da negligência quando interfiram comportamentos da própria vítima.
Princípio da confiança. Existe negligência inconsciente (art. 15.º, al. b).
b) Ponderação das restantes categorias analíticas da teoria do facto punível.
Conclusão quanto a este ponto: C é responsável por homicídio negligente na pessoa de F ( arts. 137º e 15º)

D) Conclusão final quanto à reponsabilidade criminal de C.


C será apenas responsável por um homicídio negligente (art. 137º e art. 15º) na pessoa de F.

III. RESPONSABILIDADE DE ADALBERTO

1. Instigador duma tentativa impossível de homicídio qualificado (arts. 132º, 2, a), b), d), h), i); art.26,
quarta prop. + 28º, nº1 )? Reflectir sobre os seguintes tópicos:

a) Conduta de A no quadro do sistema comparticipativo: a instigação de um autor mediato será uma


figura típica? Resposta afirmativa: o facto do executor material é imputado ao autor mediato como
uma execução que é obra sua. Isto permite dizer que o facto do autor mediato realiza a exigência do
art. 26.º quando este preceito condiciona a relevância da instigação à execução do facto.

b) Comportamento do autor de que depende a punibilidade do participante: remissão para o exposto a


propósito da responsabilidade do autor mediato (art.26º, in fine).

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c) Referência à questão da inversão da acessoriedade por força do artigo 28º, nº 1.
d) Os efeitos exclusivamente pessoais da causa de anulação da pena (art. 24º) não beneficiam A.
2. As lesões graves (art. 144º, b) ou c) do CP) na pessoa de Bartolomeu são imputáveis ao instigador?
Resposta negativa: encontram-se claramente fora do plano; são a decorrência de uma conduta atípica do
autor mediato e duma iniciativa sua estranha ao plano. São um resultado que não é querido pelo
instigador.
3. A morte de F será imputável a Adalberto? Problema dos limites da imputação aos participantes quando
existem actuações erradas, imprevistas ou fora do plano por parte do autor. Resposta negativa, pois caso
contrário estaríamos perante uma solução de versari in re illicita (que é incompatível com o princípio da
culpa e da responsabilidade pessoal - v. art. 30.º, n.º 3 da CRP).
Conclusão: Adalberto é instigador de uma tentativa impossível de homicídio qualificado que é punível (arts.
131, 132º, 2, a), b), d), h) i); art. 26º, 4ª prop.; 28º, nº 1 e 23º, 1, 2, e 3).

IV. RESPONSABILIDADE DE DAVID


1. D actua como cúmplice material. Questão fundamental: D é cúmplice do facto de A ? Ou cúmplice do facto de C ?
a) Qualificação da conduta de D como cumplicidade material (art. 27º, 1) num homicidio qualificado, na
forma tentada.
b) Inexistência de "participação na participação" como uma forma típica de envolvimento
comparticipativo. É exactamente isto que resulta da parte final do art. 26º e do art. 27º, 1, do princípio da
acessoriedade e do facto de as normas de comparticipação serem tipos de ilícito que alargam a tipicidade
das normas da Parte Especial.
c) Só é possível responsabilizar D como cúmplice material por referência ao facto do autor mediato:
seria então um caso de cumplicidade indirecta, em que a colaboração no facto executado (pelo autor) é
intermediada por A (o instigador).
d) Pode afirmar-se que o contributo prestado teve repercussão causal no facto quando o autor mediato
se engana e não utiliza o contributo do cúmplice? Não.
Mas ficará D impune? A resposta depende da tese aceite quanto ao início da tentativa do autor mediato: se o
acto de C de preparar o leite, supostamente envenenado, for qualificado como uma tentativa, então a
resposta quanto à responsabilidade de D é positiv - . D será cúmplice material do facto praticado por C;
se não for ainda um acto de execução, D não será responsabilizado.
A solução mais correcta, face à interpretação defendida para a alínea c) do artigo 22º, n.º 2, é a de que o
acto de preparar o leite envenenado é já um acto de execução (proximidade com a vítima e imediação
cronológica em relação aos actos subsequentes).
e) Aplicação do artigo 28º, nº 1 que poderá permitir fazer funcionar a agravante do parentesco (art.
132.º, n.º 2 al. a), comunicando o grau de ilicitude do facto dum participante para outro participante. O
que é possível porque D conhece os planos de A e, portanto, a relação de parentesco em causa.

Conclusão: D é cúmplice material duma tentativa de homicídio executada (em autoria mediata) por C.

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