33 Burke

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Edmund Burke primeira tradugio inglesado tratado Dosubiime, do Pseu- do-Longino (que data provavelmente do século I), havia sido pu- bicada em 1682. Mas esse ivr se tornaria conhecido sobretudo pela tradugéo francesa de Boileau de 1674, Rlido através cas ca- tegarias do pensamento eldssico, ele rd exercer uma influéncia consideravel sobre 0s debates estéicos da sequnda metade do sé culo XVI e sobretudo do século XV. Segundo Longino, o sublime £ dotado de uma forga irresistivel;sempre se manifesta com estar~ dalhage e fulmina como um rao. No final de seu precio, Boileau escreve: E preciso saber que parsublime Longina no entende 0 que os oradores enterdem or estilo sublime, mas sim aquele ex- traordinéri, aquele maravilhoso que impressionam na narratva, que fazem com que uma obra arrebate, encante, transporte”. Para Boileau, o exemplo perfito do s.bime &0 Fiat ux do Genesis ~ Faga-se a ua": "Esse ato extraoiinério de expresso [.] € ver~ dadeiramente sublime, possi alco de divino". 05 teéricos do classicism se mostrardo receptivos a di io, introduzida pela andlise de Longino, entre efito do sul me € 0 efeito da graga ou da beleza. Ela correspond, de fato, 0 uma distingZo conhecida, aquela que Cicero fizera entre as duas, finalidades 6a arte: delectre, 2ajadar, e movere, comover. Mas & solretudo no século XVIII que a rocéo de sublime se tora uma ‘categoria dominante ra reflexdo estética,afinando-se com as no- vas formas de sensibilidade da énocs. Coube a Kant, na Critica do julzo,contere um estatuto realmente flosifico ao conceito de su~ blime,integrando-o & problematice do infnito eda iberdade. Com isso, Kant representou para 0 romantismo © mesmo que Plato havia representado para o cassicismo Em Reflexdes criticas sobre « poesia e o pintura, Du Bos ja havia sublinhado a natureza paradoxal do efeto estétic, “esse prazer que mais se parece com aaflgdo ecujos sintomas por ve- 2es vim a ser os mesmos que os da mais intensa dor’. E este pra- zer paradoxal que Burke se propte 2 analisar, mostrando que cle € um efeito proprio do sublime: Tudo o que trata de obletoster- fives, tudo 0 que age de mancira andloga a0 terror, é uma fonte a apd em de nassas idtias do belo do sublime’, esereve. O sublime, portanto, nada tem a ver cam 0 belo. Ele ndo se baseia na prozorcio e sim na desproporedo; ele ‘io remete 8 ordem e & clareza, mas a desordem e @ escuridao; a0 contrario do belo, que € objeto de um prazer calmo e sereno, de uma satisfagéo dos olhos eda alma, o sublime langa o sujeito para fora de si ao suscitar ume emogo violenta. Todas essas tingdes serdo retomadas ¢ sistematizadas por Kant, que definiré 0 sentimenta da sublime como um sentimenta de desprazer, um prazer negativo, em opasi¢fo 30 prazer positivo do belo. Dessas anlises, Burke trai uma série de conseqléncias no que diz respeito as artes. Para ele, o sublime pertence essencial- mente ao dmbito da poesia. Sendo a pintura ume arte do olhar, dificmente ela pode represertar assuntas sublimes sem cair no feio ou, pia, no ridiculo: “Todos os quadros de santo AntOnio que | vi, escreve, “longe de me causar uma impressdo stra, me pa- receram concepgoes rdiculas eexcessivamente extravagantes".€ precisamente esse argumento, como se pode verficarno texto que segle ode Burke neste volume, que Lessing utiliza no Leacoonte, para definir a ciferenga entre pintura e poesia. Bibliograia: Nicolas Boles, Trité da Sublie, ou Du mer- veils dans le dicows,tadusidlo do grego de [pseudo] Lon jn, iN. Boileau, Sewers comple, Pats, Gallimard, co. Le Pléades Emmanvel Kant, Crisigne da laf de juger, fs por Ferdinand Alqui, Paris, Gallimard, coh Folio, 1985; Oberon: sur lesentiment da Baa i Subl- ‘me (1764), Pars, Vin, 1988 Parte I Secao 7 — Do sublime © que quer que seja de alguma maneira adequado a excitar as idéias de dor e petigo, quer dizer, o que quet que 9 Edmund Burke seja de alguma maneira terrivel ou que verse sobre objetos, terriveis, ou opere de maneira andloga ao tereor, é uma fonte isto é, produz a emogdo mais forte que a men- te & capaz de sentir, Digo a emogaio mais forte porque es- tou certo de que as idéias de dor si0 muito mais poderosas que as que entram na rea de prazer. Sem divida alguma, 6 tormentos que nos podem fazer sofrer sio m res em seu efeito no corpo e aa mente que quaisquer pra- zetes que o mais entendido em volipias poderia sugerir ou que a imaginagio mais viva eo corpo mais saudével e refi- nadamente sensivel poderian: desfrutar. Parte I Secao 1 — Da paisio causada pelo sublime ‘A paixo causada pelo grande ¢ pelo sublime na na- cureza, onde essas causas operam de modo mais forte, € 0 espanto; €0 espanto éaquele estado de alma no qual todos ‘0s movimentos ficam suspensos, com um certo grau de hor- ror. Nesse caso, a mente est o inteiramente cheia de seu. fe ndo pode se entre:er com outro nem, por con- segui cinar sobre aquele que a ocupa. Daf provém o grande poder do sublime, que, longe de ser produzido por cles, antecipa nossos raciocfrios e arrebata-nos com uma miragio, a reveréncia e 0 respeito. Seco 2— Terror Nenhuma paixio priva com tanta eficécia a mente de todos os seus poderes de ago e raciocinio quanto 0 medo. Pois sendo o medo uma apreensio da dor ou da morte, ele opera de uma maneira que se assemelha a dor real. O que quer que seja, portanto, tertivel em relacio a visio, € ram- bbém sublime, seja essa causa do terror dotada de grandeza, de dimensSes ou nao: pois é impossivel algo que pode ser perigoso ser visto como insignificante ou desprezivel. Ha que, apesar de estarem longe de ser gran- des, sio mesmo assim capazes de suscitar idéias de sublime por serem considerados objetos de terror, como as serpen- tes-¢ animais venenosos de quase todas as espécies. E, se ide s6ria de terror, elas se cornam incomparavelmente maiores. ie uniforme de vasta extensio nao ¢, cerramen- pequena; a visio de tal planicie pode ser tao extensa quanto uma vista do oceano; mas poder ela preen- cher a mente com algo tao grande quanto o préprio ocea- Isso se deve a diversas causas, mas principalmente a0 grande terror que 0 oceano inspira. O terror é mesmo, em todos os casos, le maneira aberta ou latente, o principio re- gulador do sublime, Diversas Kinguas dio fortes testemu- nhos da afinidade dessas as. Elas muitas vezes usam a mesma palayra para significar indiferentemente os modos de espanto ou admiragdo e os de terror. Qamzor em grego significa tanto medo quanto maravilhamento; deinoz € tx el ou respeitével; aidew, reverenciar ou temer. Vereor em \e aidew & em grego. Os romanos usavam 0 verbo stupeo, cermo que assinala fortemente o estado de uum homem espantado, para =xprimiro efeito tanto do. ples medo cotno do espante; a palavra attonitus (aténito) € igualmente expressiva da ligagio dessas idélas; ¢ o fran- cés étonnement e 0 inglés astonishment ¢ amazement, nao estariam também a apontar claramente a afinidade das ‘emoges que acompanham o medo ¢ o maravilhamento? Aqueles que tém um conhecimento mais geral das Iinguas Edmund Burke poderiam produzir, sem diivida, muitos outros exemplos igualmente impactantes Segéio 3 — Para tornar alguma cois: obscuridade parece em geral ser necessiria. Quando conhecemos qual- quer perigo em sua total extensio, quando podemos acos- tumar nossos olhos a ele, uma grande parte da apreensio desaparece. Serd sensivel a isso quem considerar como a aumenta o nosso medo, em todos os casos de perigo, ia de fantasmas e deménios, sobre os quais um consegue formar idéias claras, feta as mentes que dio crédito a contos populares sobre tais tipos de seres. Os governos despéticos, que sao fundados nas paixées dos ho- mens, ¢ principalmes to quanto po: ler longe do olho publico. A po tica tem sido freqiientemente a mesma no tocante as re gides. Quase todos os templos pagios eram escuros. Mes- ‘mo nos templos barbaros dos americanos de ho} m seu {dolo em uma parte escura da cabana consagrada a adoragdo. Também os druidas realizavam todas as suas mais escuras € son bbra dos mais velhos e amplos carvalhos. Ninguém parece ter compreendido melhor do que Milton o segredo de am- ficar as coisas terri las, se posso usar es- Paraiso perdide| é admiravelmente concebida; é espantoso com que pompa sombria, com que significante e expressi- va incerteza de tragos e colorido ele executou o retrato do rei dos terrores, O our fantasma, em que néo é possteel Distinguir as fires, julgar dos membros, Substicia informe, escurecida sombra, Tem o aspecto da Noite, 0 horror do Inferno, De Pirias dez oenta a feridade, Pronto para 0 bsandir wm dardo empunha, Ena altura masr, que inculea fonte, De coroa real ciagido se afigura. Nessa descrigio tudo € escuro, incerto, confuso, ter- Seco 1 —Da beleza Proponho-me a considerar a beleza como di ime e, no decurso desta investigagio, examinar até que ponto eles so coerentes entre si. Mas, antes disso, repasse- mos rapidamente as opiniées normalmente langadas sobre essa qualidade, as quais penso que dificilmente podem ser reduzidas a prinefpios fios, porque os homens estao habi- tuados a falar da beleza de maneira figurativa, isto & de uma ‘maneita extremamente incerta e indeterminada. Por bele- 2a refiro-me Aquela qualidade ou aquelas qualidades dos compos que causam 0 amor ou alguma paixio similar a cle. ra do. Limito essa definigio as cualidades meramente sensiveis das de preserver a méxima simplicidade em um cema que muitas vezes nos distrai quando admitimos aque las diversas causas de sinspatia que nos ligam a certas pes- soas ou coisas por consideragies secundsrias e nfo pela fora direta que eles tém mersmente em fungio de seu aspecto. Igualmente distingo o amor, pelo que entendo a satisfago

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