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Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ

Faculdade Nacional de Direito – FND

CADERNO DE DIREITO CIVIL VI


2017.1

Curso de Graduação: Direito


Disciplina: Direito Civil VI
Professora: Lívia Zamarian
Aluno: Jefferson Rosa

Rio de Janeiro
1º Semestre de 2017
I. NOÇÕES DE DIREITOS REAIS

Há duas teorias que tentam explicar a natureza jurídica dos direitos reais: teoria clássica
ou realista (majoritária) e teoria personalista.
A teoria clássica ou realista defende que os direitos reais referem-se à relação entre um
particular e uma coisa. Direito real é aquele que rege a relação entre uma pessoa e uma coisa.
A teoria personalista argumenta que não pode haver relação jurídica com uma coisa, mas
somente com pessoas, com a coletividade. Assim, para essa teoria, o direito real refere-se à
relação entre um particular (que detém o poder sobre uma coisa) e a coletividade que deve
respeitar esse poder. Há uma relação jurídica entre pessoas, muito embora ela seja intermediada
por uma coisa.

1. Terminologia

Direitos reais refere-se a uma terminologia mais restrita que indica uma conjunto de
categorias relacionadas à propriedade, descritas no art. 1.225, CC. É o conteúdo principal do
direito das coisas, porém o direito das coisas tem outros conteúdos que não se limitam aos
direitos reais, como, por exemplo, a posse, que possui um título próprio no Código Civil.
Direito das coisas refere-se a uma relação de domínio dentre pessoas e coisas
determinadas ou determináveis (apropriáveis, sob a ótica de Carlos Roberto Gonçalves). É uma
expressão mais apropriada para a matéria, uma vez que abrange a posse e os direitos reais.
Para Clovis Beviláqua, o direito das coisas é o complexo das normas reguladoras das
relações jurídicas referentes aos bens suscetíveis de apropriação pelo homem.

2. Características

Entre as características dos direitos reais, pode-se destacar:


a) Absolutos (princípio do absolutismo) – Oponibilidade erga omnes
Os direitos reais são absolutos (princípio do absolutismo), ou seja, há uma oponiblidade
erga omnes.
b) Objeto = bem material suscetível de valoração
c) Direito de sequela
d) Direito de preferência

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Se há um concurso de credores, aqueles que possuem direitos reais terão preferência em
relação aos que possuem direitos obrigacionais.
e) Numerus clausus (rol taxativo – princípio da tipicidade dos direitos reais)
f) Caráter duradouro/permanente
g) Publicidade dos atos
h) Possibilidade de renúncia (e de abandono dos direitos reais)
i) Viabilidade de incorporação da coisa por meio da posse
j) Possibilidade de aquisição por usucapião
l) Elasticidade (Orlando Gomes)
Os quatros atributos da propriedade (gozar, reivindicar, usar e dispor) funcionam como
um elástico. O proprietário não perde o vínculo com a propriedade ao ceder alguns desses
atributos para outra pessoa.
É essa característica que permite a existência dos direitos reais sobre coisa alheia.

3. Classificação

O direito real por excelência é o direito real de propriedade, o qual possui quatro atributos
(GRUD):
– Gozar ou fruir
– Reivindicar
– Usar
– Dispor
O direito real ilimitado é aquele que concentra os atributos da propriedade (gozar,
reivindicar, usar e dispor) em uma única pessoa. Um exemplo direito real ilimitado é a
propriedade.
Quando se transmite alguns desses direitos para terceiro, configura-se um direito
limitado. Os direitos reais limitados são aqueles que não possuem todos os atributos da
propriedade. Os direitos reais limitados são os direitos reais sobre coisas alheias.
Os direitos reais sobre coisas alheias são: direitos reais de gozo e fruição (superfície,
enfiteuse, servidão, usufruto, uso, habitação, concessão de uso especial para fins de moradia,
concessão de direito real de uso, laje), direitos reais de garantia (hipoteca, penhor, anticrese) e
direito real à aquisição (compromisso de compra e venda registrado). Ademais, há a alienação
fiduciária que alguns autores classificam como direito real de garantia.

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II. DIREITOS REAIS DE FRUIÇÃO/GOZO

1. Características gerais

Os direitos reais de gozo ou fruição são aqueles em que há a transmissão do atributo de


gozar ou fruir, tendo maior ou menor amplitude dependendo do tipo direito real de gozo.
Fruição ou gozo refere-se à exploração da coisa, sendo diferente do uso, o qual se refere
ao uso próprio da coisa.
Nos direitos reais de gozo ou fruição, há uma relação tríplice. Há uma relação entre o
titular do direito real e o objeto (o móvel ou imóvel sobre o qual ele exercerá a relação de
domínio). Além disso, há duas relações obrigacionais: a relação entre o titular do direito real e o
proprietário que lhe outorgou a titularidade (conservar a coisa, pagar); a relação do titular do
direito real com o sujeito passivo universal (a coletividade), que remete à oponibilidade erga
omnes e aos deveres do titular para com a coletividade (exemplo: função social, direito de
vizinhança).

2. Superfície (art. 1.369 a 1.377, CC)

O direito de superfície foi uma inovação do Código Civil de 2002 para substituir a
enfiteuse, sendo que esse instituto já era previsto no Estatuto da Cidade (art. 21 a 24, da Lei
10.254/2001).
A superfície é direito real de fruição com o objetivo de plantação ou construção sobre
área de terceira pessoa.
Ela recai sobre bem imóvel. O proprietário pode ceder o imóvel para que terceira pessoa
explore a coisa por meio de uma construção ou plantação, o que mostra que ela é importante para
dar função social para a propriedade.
A superfície é um direito sobre o qual incide despesas, visto que uma das obrigações do
direito real é o de dar publicidade, sendo que, para haver publicidade, é necessário realizar o
registro em cartório. Para ser direito real tem que se registrar.
A vantagem da superfície é que um direito mais seguro para cobrar, para entrar com
execução, etc. Além disso, ao final da superfície, a construção ou a plantação passam a pertencer
ao proprietário, em regra, sem direito à indenização.

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2.1. A antiga enfiteuse

A enfiteuse é um instituto de Código Civil de 1916, também chamada de aforamento ou


aprazamento. Historicamente, a enfiteuse é a origem remota da superfície. De origem grega, teve
grande expansão no século IV. Ela foi concebida de forma funcionalizada no Direito Romano,
mas foi muito usada no período medieval. Os senhores feudais não conseguiam explorar toda a
sua propriedade e acordavam enfiteuses com seus servos.
A enfiteuse trata-se do mais amplo direito real sobre coisa alheia, perpétuo,
oneroso, por meio do qual o proprietário de área não cultivada ou construída transfere o
domínio útil para terceira pessoa e mantém para si o domínio direto.

As partes que constituem a enfiteuse são: senhorio/enfitente e enfiteuta/foreiro.

Entre suas características, destacam-se:

a) Direito real mais amplo


Porque é perpétuo.

b) Perpétuo (art. 679, CC/16)


Ser um direito perpétuo significa que ele se transmite aos herdeiros. A perpetuidade
distingue-se da vitaliciedade, uma vez que o direito vitalício extingue-se com a morte.

c) Oneroso
Há a cobrança de foro, o qual é anual e invariável, em regra. Porém, as partes podem
negociar de forma diferente o modo de pagamento. O valor do foro é de 2% sobre o terreno (Lei
13.240/2015).

d) Direito de preferência ao senhorio


Além do foro, a criação de uma enfiteuse cria para o proprietário o direito de preferência.
Quando o enfiteuta decide que não quer mais esse direito sobre a coisa, ele pode ceder para
terceira pessoa, porém, primeiramente tem que ofertar para o proprietário por meio de uma
notificação, o qual pode consolidar para si a propriedade, ou seja, voltar a ser o proprietário
pleno.

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Para ceder a enfiteuse para terceiro, o enfiteuta tem que pagar uma parcela do valor da
cessão onerosa para o proprietário, o que é chamado de laudêmio. O laudêmio incide sobre o
valor da alienação do direito de enfiteuse, quando o proprietário não exercer o direito de
preferência. O valor do laudêmio é de 2,5% do valor da alienação, se for bem da União, o valor
é de 5%. Em Petrópolis, esse laudêmio é chamado de taxa do príncipe. Caso seja bem da União,
é necessária também uma autorização para transferência pelo Serviço de Patrimônio da União.

2.2. A substituição do instituto

Ressalta-se que a enfiteuse não foi substituída automaticamente pela superfície, pois,
apesar de o art. 2.038 do CC/2002 proibir a constituição de novas enfiteuses, as enfiteuses já
constituituídas continuam a existir.
O laudêmio é a cobrança só sobre o valor do imóvel. Não há uma cobrança sobre o valor
da alienação. Assim, o laudêmio recai só sobre o valor do terreno e não da construção.
Em regra, é proibida a subenfiteuse, somente sendo cabível a divisão, quando é recebida
por herança.
Quando comparada com a superfície a enfiteuse, percebe-se que a enfiteuse é sempre
onerosa, enquanto que a superfície pode ser gratuita ou onerosa. A enfiteuse é perpétua e a
superfície é temporária.

Observa-se que ainda há enfiteuses existentes:


a) Terrenos de marinha (Lei 13.240/2015)
De acordo com o art. 2.038, § 2º, CC, a enfiteuse dos terrenos de marinha e acrescidos
regula-se por lei especial.
b) Particulares
São as enfiteuses da família real, da Igreja Católica, etc.

As formas de extinção da enfiteuse são:

a) Consolidação
Ocorre quando o proprietário adquire para si os atributos cedidos ao enfiteuta.
Essa consolidação pode ocorrer de três formas:
– Falecimento do enfiteuta sem herdeiros

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– Confusão: proprietário e enfiteuta se tornam a mesma pessoa, exemplo: exerce direito de
preferência.
– Desapropriação: se houver desapropriação, tanto o proprietário quanto o enfiteuta têm direito
à indenização.

b) Comisso
Ocorre quando o enfiteuta fica em mora (descumprimento da obrigação) por três anos
consecutivos. O proprietário pode pedir a extinção da enfiteuse.
Assim, o comisso refere-se à possibilidade de o proprietário por meio de ação judicial
exigir a extinção da enfiteuse em razão da mora do enfiteuta no pagamento do foro por três anos
consecutivos.

c) Resgate
O direito de resgate consiste no direito potestativo do enfiteuta de, após dez anos de
aforamento, liberar o terreno aforado do ônus que o grava, mediante pagamento ao senhorio
direto de um laudêmio e dez pensões anuais (Art. 639, CC/16)
Ele permite que o enfiteuta se torne proprietário após o período de dez anos, mediante o
pagamento de dez foros e laudêmio. É direito subjetivo do enfiteuta, o proprietário não pode se
opor.

d) Deterioração do prédio aforado


A deterioração extingue a propriedade e, por conseguinte, extingue a enfiteuse.
Se for por culpa de terceira pessoa, a indenização divide-se entre proprietário e enfiteuta.

2.3. A superfície

O direito de superfície é o direito pelo qual se cede a terceira pessoa o direito de ela
gozar da propriedade basicamente com as finalidades de plantação ou construção (art.
1.369, CC).
A superfície pode ser onerosa ou gratuita e pode ser por tempo determinado ou
indeterminado. Ela surge no Estatuto da Cidade em 2001.
No Código Civil, a superfície tem que ser por tempo determinado, sendo que não há
previsão legal de qual seria o prazo máximo.

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Independentemente do valor, para constituir superfície é preciso escritura pública,
assim, não se segue a observação quanto ao valor de 30 salários mínimos do art. 108, CC.
A escritura por si só não confere oponibilidade erga omnes. Se um indivíduo faz uma
superfície por escritura pública e não registra, ela tem validade, mas não como um direito. Ela
terá validade inter partes, ou seja, funcionará como um direito obrigacional. Assim, para ser
direito real tem que ter escritura pública mais registro no RGI.

As partes que compõe a relação superficiária são:


– Construtor ou plantador/superficiário: aquele que recebe o direito de plantar ou construir.
– Proprietário concedente/fundieiro/cedente: aquele que cede o direito de plantar ou construir.

São deveres do superficiário:

a) Não construir no subsolo (excecão: art. 1.369, p. ún., CC)


O direito real de superfície não implica o direito de construir no subsolo. Em regra, se
não foi convencionado, não pode ser usado o subsolo.
Não há presunção de que se pode usar o subsolo, a não ser que o porte da obra faça
presumir o uso do subsolo, exemplo: construção de um prédio de 15 andares.

b) Pagamento do canon superficiário/solarium


Pode ser anual, semestral, mensal, etc.

c) Encargos e tributos do imóvel (art. 1.371, CC)

d) Preferência (direitos e deveres)


O direito de superfície pode ser cedido para terceiro, porém, antes de ceder para terceira
pessoa tem que ver se o proprietário tem interesse. A cessão deve ser por escritura pública e
registrada no imóvel. O direito de preferência é ao mesmo tempo um direito e um dever.

Quanto à vantagem da superfície, destaca-se que o superficiário pode fazer as


modificações como bem entender. Quanto à desvantagem, ressalta-se o custo de registro da
superfície.

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As características principais do direito de superfície (art. 1.369, CC) são:

a) Impessoalidade
É uma relação com o imóvel. Ela não veda a alienação para terceiras pessoas, quando não
tem previsão entre as partes.

b) Temporariedade
A superfície é por tempo determinado pelo Código Civil.

c) Divisibilidade
O direito real de superfície é um direito passível de ser dividido. É possível que haja
superfícies sobre frações ideais da propriedade. Pode existir mais de uma superfície sobre
determinado imóvel.

Esse instituto pode ser constituído por:

a) Ato inter vivos (requer registro)


Cria-se a superfície por meio de escritura pública, a qual tem que ser registrada no
cartório de registro de imóveis.

b) Ato causa mortis (testamento)


A doutrina vislumbra a possibilidade de se deixar um direito de superfície por meio de
testamento, de modo que se dispensa a escritura pública, todavia, não se dispensa o registro. Não
há previsão legal, mas também não há proibição legal. É uma construção doutrinária.

Existem algumas questões polêmicas em relação à superfície. A primeira delas é sobre a


possibilidade de se hipotecar o direito de superfície, o que, de acordo com a doutrina, é
perfeitamente possível.
Destaca-se que o proprietário pode hipotecar o imóvel cedido em superfície, bem como o
superficiário pode dar o direito de superfície em garantia (obviamente, que este não pode dar o
imóvel em garantia).
A segunda questão refere-se à aquisição da superfície por usucapião. Cabe, em
primeiro lugar, ressaltar que durante a vigência da superfície, o superficiário não pode adquirir o

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imóvel por usucapião, uma vez que não há o animus domini. Assim, o que se discute é a
aquisição da superfície (e não da propriedade) por usucapião. A primeira corrente (Maria Helena
Diniz, Roberto Gonçalves) diz que não é possível a aquisição do direito de superfície por
usucapião, tendo em vista que, por determinação do art. 1.369, CC, é imprescindível a escritura
pública, a qual é inexistente em um pedido de usucapião. Ademais, o CC é omisso nessa
possibilidade, além de impor um prazo determinado, o que não existiria na usucapião. A segunda
corrente (STF, Cristiano Chaves, Nelson Rosenvald, Joel Dias Figueiredo) defende que é cabível
a usucapião do direito de superfície, quando cumpridos os requisitos da usucapião ordinária
(justo título e boa-fé), já que houve o exercício do direito real de superfície pelo prazo
determinado e tendo em vista que não há óbice legal, desde que comprovado o animus de
superficiário. A crítica a essa corrente envolve a possibilidade de existir a superfície por tempo
indeterminado, conforme o Estatuto da Cidade (vide quadro abaixo).

Código Civil/2002 Estatuto da Cidade


Imóvel rural ou urbano Imóvel urbano
Prazo determinado Prazo determinado ou indeterminado (é
assegurado ao proprietário denunciar essa
superfície, porém, é necessário que se tenha
havido um prazo razoável para o superficiário
reaver o investimento)
Plantação/construção Mais abrangente (exemplo: estacionamento)

Cabe lembrar que prazo indeterminado não é a mesma coisa que perpétuo. Na
perpetuidade, o direito é transmitido para os sucessores. O prazo indeterminado do Estatuto da
Cidade é no sentido de que é assegurado ao proprietário a qualquer tempo denunciar esta
superfície. Denunciar significa pedir a rescisão unilateral. Assim, o prazo não é determinado de
antemão, mas ele é determinável. Observa-se que é direito do proprietário denunciar, porém, é
necessário que tenha havido prazo razoável para que o superficiário tenha reavido os
investimentos feitos. O prazo tem que respeitar o tempo necessário para que o superficiário tenha
recuperado os investimentos realizados.
A terceira polêmica relaciona-se com a possibilidade de constituição do direito de
superfície por cisão. Cisão é a superfície constituída sobre imóvel já construído ou
plantado. A primeira corrente (Carlos Roberto Gonçalves) diz que não é possível a constituição
do direito de superfície por cisão, pois direito de superfície é para que a pessoa plante ou
construa, se já há plantação ou construção é incompatível com o objetivo da superficie. Para essa
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corrente, isso seria uma forma de burlar uma locação, por exemplo. A segunda corrente
(majoritária) defende que é possível a criação de um direito de superfície por cisão, conforme o
Enunciado 250, III Jornada de Direito Civil (Enun. 250, III JDC). Muito embora já haja uma
construção, desde que se exija que o superficiário realize obras de um vulto maior, é possível a
superfície por cisão, até porque não há uma proibição. Assim, justifica-se a permissão da
superfície por cisão pela utilidade e pela ausência de proibição legal. Ressalta-se ainda que
não existe ação renovatória no direito de superficie constituído por cisão.
Por fim, a última polêmica envolvia o chamado direito de superfície de 2º grau, em que
o proprietário cedia a superfície da construção já existente para o superficiário explorar. O
argumento favorável era de que se poderia ceder a exploração do espaço aéreo. Todavia, esse
direito de superfície em 2º grau virou o direito de laje, incluído no art. 1.225, CC, como
direito real, por meio da Medida Provisória 759/2016. O reconhecimento desse direito permite a
escritura pública e o registro da laje (art. 1.510-A, MP 759/2016).

Quanto às formas de extinção da superfície, cita-se:

a) Termo final
A superfície se extingue quando acaba o prazo. Ocorre ao término do prazo, se a
superfície for por prazo determinado, ou por denúncia, se o prazo for indeterminado.

b) Destinação diversa (art. 1.374, CC)


Ocorre quando o superficiário descumpre os seus deveres, como, por exemplo, ao se dar
destinação diversa da pactuada (era para plantação e não se realizou a plantação, era para a
construção de imóvel comercial e foi usado para a construção de imóvel residencial, etc.).
Para desfazer a superfície é necessário entrar com uma ação judicial, pedindo o
reconhecimento de que foi dada destinação diversa e reconhecendo a extinção da superfície. Essa
decisão judicial deve ser levada para registro no RGI para poder cancelar a superfície.

c) Desapropriação
O ente desapropriante fica com o direito pleno sobre a propriedade, o que significa que a
superficie deixa de existir. A indenização deve ser paga tanto para o proprietário como para o
superficiário, na medida de seu proveito econômico.

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Por último, destaca-se a distinção entre superfície e locação:

Superfície Locação
Natureza jurídica Direito real Direito obrigacional, muito embora
possa se dar efeitos de direito real
quando se registra na matrícula do
imóvel.
Forma de transmissão Pode haver alienação para Em regra, não se pode transferir o
terceiro (impessoalidade). Para contrato de locação, salvo
ceder para outra pessoa, deve autorização do proprietário, uma
se respeitar o direito de vez que a locação é pessoal.
preferência.
Onerosidade Pode ser onerosa ou gratuita Sempre onerosa, senão é comodato
Prazo Determinado ou indeterminado Fixação de prazos (mensal)
(permite a denúncia a qualquer
tempo).
Qualquer periodicidade.
Encargos e tributos Pertencem ao superficiário Pertencem ao proprietário (locador)
Efeito perante terceiro Oponibilidade erga omnes Inter partes, só terá efeito erga
omnes se registrar a locação na
matrícula do imóvel
Direito de preferência Há direito de preferência, se Há direito de preferência, caso não
não for disponibilizado, o seja oportunizado, o locatário tem
superficiário pode exercer o direito à indenização por perdas e
direito de sequela (anular a danos.
venda e reaver o bem para si).
O direito de preferência
também existe do superficiário
para o proprietário, quando o
superficiário quiser ceder seu
direito de superfície.
Medida judicial Quando o superficiário não sai Quando o locatário não sai do
do imóvel após o término do imóvel após o término do contrato
prazo do direito de superficie, ou quando há inadimplemento, a
a medida cabível é ação de medida judicial cabível é ação de
reintegração de posse. No caso despejo. No caso contrário, se o
contrário, se o proprietário proprietário quiser que o locatário
quiser que o superficiário saia saia da locação antes do término do
antes do término da superfície, contrato, cabe ação de reintegração
este pode ajuizar uma ação de de posse, em caso de esbulho. Em
reintegração de posse, em caso caso de turbação, cabe ação de
de esbulho. Em caso de manutenção de posse. Em caso de
turbação, cabe ação de mera ameaça, a ação cabível é o
manutenção de posse. Em caso interdito proibitório. Reintegração

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de mera ameaça, a ação cabível de posse, manutenção de posse e
é o interdito proibitório. interdito proibitório são as ações
Reintegração de posse, possessórias típicas também
manutenção de posse e chamadas de interditos
interdito proibitório são as possessórios.
ações possessórias típicas
também chamadas de interditos
possessórios.
Construções e benfeitorias Pertencem ao proprietário Benfeitorias úteis e necessárias de
boa-fé tem direito à restituição e
retenção do imóvel. Benfeitorias
voluptuárias tem o direito de
levantar, lembrando que se pode
limitar a realização dessas
benfeitorias.
Benfeitorias necessárias são aquelas
imprescindíveis para manutenção
do bem (telhado caindo, curto
circuito na rede elétrica), quem tem
que custear essas benfeitorias é o
proprietário, se o locatário custear
ele tem direito de restituição,
enquanto ele não for restituído, ele
tem direito de retenção da coisa.
Benfeitorias úteis são aquelas que
aumentam a utilização do bem,
aumentam o proveito do bem
(exemplo: troca de uma porta
pequena por uma porta acessível
para cadeirante). Tanto na útil como
na voluptuária ocorrem acréscimos,
a diferença da útil para a
voluptuária, é que a voluptuária será
considerada um acréscimo luxuoso.
O caso concreto é que vai mostrar
se é útil ou voluptuária (exemplo:
acrescentar uma piscina em uma
escola de natação é útil, construir
uma piscina em uma casa é
voluptuária). Bem feitoria útil deve
ser custeada pelo proprietário, caso
o locatário pague, ele passa a
possuir o direito de retenção.
Porém, nos contratos de locação,
geralmente há uma restrição de que
as úteis só poderão ser feitas com a
autorização do proprietário. As
voluptuárias se forem feitas sem

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qualquer autorização, quem tem que
custear é o locatário, o qual não terá
direito ao reembolso, nem à
retenção. O único direito que ele
terá é de levantar essas benfeitorias,
caso seja possível. É preciso deixar
o imóvel nas mesmas condições em
que ele foi alugado.

2.4. Direito de laje

O direito de laje foi incluído no art. 1.225, CC, como direito real, por meio da Medida
Provisória 759/2016.

Art. 1.225. São direitos reais:


I - a propriedade;
II - a superfície;
III - as servidões;
IV - o usufruto;
V - o uso;
VI - a habitação;
VII - o direito do promitente comprador do imóvel;
VIII - o penhor;
IX - a hipoteca;
X - a anticrese.
XI - a concessão de uso especial para fins de moradia;
XII - a concessão de direito real de uso; e
XIII - a laje.

O reconhecimento desse direito permite a escritura pública e o registro da laje (art. 1.510-
A, MP 759/2016):

Art. 1.510-A. O direito real de laje consiste na possibilidade de coexistência de


unidades imobiliárias autônomas de titularidades distintas situadas em uma
mesma área, de maneira a permitir que o proprietário ceda a superfície de sua
construção a fim de que terceiro edifique unidade distinta daquela originalmente
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construída sobre o solo.
§ 1º O direito real de laje somente se aplica quando se constatar a
impossibilidade de individualização de lotes, a sobreposição ou a solidariedade
de edificações ou terrenos.
§ 2º O direito real de laje contempla o espaço aéreo ou o subsolo de terrenos
públicos ou privados, tomados em projeção vertical, como unidade imobiliária
autônoma, não contemplando as demais áreas edificadas ou não pertencentes ao
proprietário do imóvel original.
§ 3º Consideram-se unidades imobiliárias autônomas aquelas que possuam
isolamento funcional e acesso independente, qualquer que seja o seu uso,
devendo ser aberta matrícula própria para cada uma das referidas unidades.
§ 4º O titular do direito real de laje responderá pelos encargos e tributos que
incidirem sobre a sua unidade.
§ 5º As unidades autônomas constituídas em matrícula própria poderão ser
alienadas e gravadas livremente por seus titulares, não podendo o adquirente
instituir sobrelevações sucessivas, observadas as posturas previstas em
legislação local.
§ 6º A instituição do direito real de laje não implica atribuição de fração ideal
de terreno ao beneficiário ou participação proporcional em áreas já edificadas.
§ 7º O disposto neste artigo não se aplica às edificações ou aos conjuntos de
edificações, de um ou mais pavimentos, construídos sob a forma de unidades
isoladas entre si, destinadas a fins residenciais ou não, nos termos deste Código
Civil e da legislação específica de condomínios.
§ 8º Os Municípios e o Distrito Federal poderão dispor sobre posturas edilícias
e urbanísticas associadas ao direito real de laje.

O direito de laje é o direito real sobre a unidade imobiliária autônoma erigida sobre a
propriedade de outrem.
Importante lembrar que laje não pode ser confundida com condomínio. No condomínio
edilício, coexistem propriedades plenas em plano horizontal, com direito à fração ideal do solo e
das áreas de uso comum. Na laje, precisa existir áreas autônomas, isolamento funcional e acesso
independente.
Antes da MP 759, a possibilidade de sobrelevação, como um direito inerente ao direito de
superfície, já existia no art. 21, § 1º, da Lei 10.257/01). Além disso, já havia o reconhecimento
dessa possibilidade pela doutrina, conforme Enunc. 568, da VI JDC/CJF.

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Cabe ressaltar que as principais críticas do direito de laje são:
a) A positivação de um direito real novo cujo objeto já estava inserido em um direito real
preexistente;
b) O abandono de uma expressão consagrada e precisa por outra de uso informal;
c) O problema topológico de se estabelecer a abertura de matrícula e a dispensa de atribuição de
fração ideal apenas para a superficie por sobrelevação ou direito de laje, quando as regras
deveriam se aplicar a todo e qualquer direito de superfície.

3. Servidões (art. 1.378 a 1.389, CC)

O CC de 1916 falava de servidão de pessoas no caso do uso, usufruto, por exemplo, e de


servidão de imóveis, sendo este último o que se conhece propriamente como servidão (CC,
2002). A terminologia de servidão de pessoas por remeter à coisificação/objetificação do ser
humano é incompatível com a ideia de dignidade da pessoa humana. Atualmente, esse termo não
é mais utilizado no direito civil brasileiro. Assim, só existe servidão sobre bens imóveis.
Um ponto importante é diferenciar servidão de passagem e direito à passagem
forçada. No direito à passagem forçada, há um imóvel encravado que não tem outro meio de
acesso, é obrigação do proprietário ceder a passagem através do seu imóvel por decorrência do
direito de vizinhança. É uma obrigação legal, é imposto por lei. Já a servidão de passagem
relaciona-se com uma concessão facultativa. Essa servidão faz com que um imóvel sirva a outro
imóvel de forma voluntária. É uma relação entre imóveis: imóvel serviente e imóvel dominante.
Servidão de passagem Direito à passagem forçada
Direito real Direito de vizinhança. Para alguns autores é
uma obrigação propter rem, ela acompanha a
propriedade.
Voluntária, em regra. Pode haver determinação Determinação legal/obrigação legal. A
judicial e usucapião. constituição é automática.
Imóveis vizinhos, o que não significa imóveis Imóvel encravado
contíguos, ou seja, tem que estar na redondeza,
na vizinhança. Assim, não precisa ser contíguo
e não precisa estar encravado.
Escritura pública acima de trinta salários Não é obrigatório RGI
mínimos mais regisgro no cartório de imóves –
RGI (Registro Geral de Imóveis), prevalece a
regra do art. 108.
Gratuita ou onerosa Gratuito

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Historicamente, a servidão surgiu em Roma. Após um incêndio que devastou a cidade, as
pessoas começaram a reconstruir suas casas de maneira totalmente desordenada, o que fez surgir
situações de imóveis que não tinham acesso à rua, à agua potável, não tinham pastagem, não
tinham luz (o imóvel da frente tampava a luz do sol), etc.
Servidão é o direito real de gozo sobre imóvel alheio, constituído de forma limitada e
imediata, que impõe certo encargo ao prédio serviente em proveito do prédio dominante.

As principais características da servidão são as seguintes:

a) Perpetuidade
É um direito que pode ser criado de maneira perpétua, uma vez que não limita todo uso e
gozo da propriedade. A servidão não retira todo uso e gozo útil da propriedade.
Isso não impede que os proprietários realizem uma servidão por tempo determinado.

b) Acessoriedade
O direito de servidão é acessório à propriedade, ou seja, ele segue a propriedade. Segue o
princípio da gravitação jurídica.

c) Atipicidade
Pode se criar diferentes tipos de servidões conforme o proveito que for necessário,
obviamente desde que não seja nada ilícito ou que viole a dignidade das pessoas envolvidas. Não
há um rol típico de servidões.

d) Indivisibilidade
O direito de servidão é indivisível. Mesmo que o imóvel seja dividido, a servidão
continua na íntegra para todos os imóveis. A servidão não pode ser dividida porque, se for
dividida, ela perde sua função de ser. O direito de servidão é exercido por completo.

e) Inalienabilidade
A servidão pode ser onerosa quando é constituída, mas ela não pode ser alienada pelo
proprietário do prédio dominante. Ela é inalienável para terceiros. Em suma, ela pode ser
cobrada para ser constituída, mas depois de constituída não pode ser vendida para terceiro.

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Quando à classificação, destaca-se:

a) Em relação à natureza dos prédios envolvidos:


– Servidão urbana: incide em imóveis urbanos
– Servidão rústica: as servidões rústicas incidem sobre imóveis rurais

b) Quanto à conduta das partes:


– Servidão positiva: exercida por ato positivo ou comissivo por parte do proprietário do prédio
dominante. Exemplo: servidão de passagem ou trânsito.
– Servidão negativa: decorre de ato omissivo ou abstenção do prédio serviente. Exemplo:
servidão de não construir edificação no terreno.

c) Em relação ao modo de exercício:


– Servidão contínua: aquela que é exercida indepedentemente de ato humano. Exemplo:
gasoduto, servidão de passagem de som, de imagem, de energia, de luz.
– Servidão descontínua: aquela que depende da atuação humana de foma sequencial, com
intervalos. Exemplo: servidão de passagem ou trânsito de pessoas, servidão para tirar água de
terreno alheio, servidão de pastagem.

d) Quanto à forma de exteriorização:


– Servidão aparente: é aquela que pode ser visualizada por obras exteriores. Há obras que
tornam a servidão visível para terceiros. A servidão aparente está evidenciada no plano real e
concreto, havendo sinal exterior (visível a olho nu). Exemplos: servidão de passagem ou trânsito,
servidão de imagem, servião de vista (através da janela).
– Servidão não aparente: é aquela que não tem obras externas visíveis. É aquela que não se
revela no plano exterior, não perceptível a olho nu. Exemplo: servidão de não construir, servidão
de não passar por determinada via, servidão de não abrir janela, servidão de caminho.

A importância das duas últimas classificações relaciona-se com a Súmula 415, STF:
servidão que depende de ato humano (servidão descontínua), se deixa de ser usada por dez anos,
perde-se por desuso, ou seja, pode se extinguir. A extinção não é automática, é necessário ajuizar
uma ação judicial. O juiz deve declarar o desuso e, com a sentença, deve-se ir no cartório para
registrar a extinção da servidão da matrícula do imóvel. Só na servidão descontinua que é

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possível pedir a a extinção por desuso.
Ainda de acordo com a mesma súmula, servidão de trânsito não titulada, mas tornada
permanente, sobretudo pela natureza das obras realizadas, considera-se aparente, conferindo
direito à proteção possessória.
Assim, uma servidão de trânsito ou servidão de passagem, mesmo que não tenha registro,
mas possua obras (ou seja, uma servidão aparente), dá direito à proteção possessória. Logo, se as
pessoas que utilizam essa servidão, se elas forem obstadas pelo dono do terreno, elas tem direito
àquelas ações possessórias (reintegração de posse, manutenção de posse e interdito proibitório).
Também dependendo do prazo decorrido, terão direito, inclusive, à usucapião.

Além dessas classificações, existe também a chamada servidão administrativa, que é


um direito real de gozo de natureza pública e que possui características especiais, como, por
exemplo, a necessidade de um decreto de utilidade pública para ser constituída. Para Di Pietro, a
servidão administrativa é um direito real de gozo, de natureza pública, instituído sobre imóvel de
propriedade alheia, com base em lei, por entidade pública ou por seus delegados, em face de um
serviço público ou de um bem afetado a fim de utilidade pública.

Quanto ao exercício das servidões, ou seja, como elas funcionam na prática, destaca-se:

– Obras necessárias à conservação e custos: em regra, quem custeia a despesa da servidão é o


proprietário do prédio dominante. Pode se dispor de maneira contrária, pois é uma mera
liberalidade das partes.

– Abandono liberatório: se o proprietário do prédio serviente assumir a responsabilidade pelas


obras necessárias à conservação e custos do imóvel e deixar de cumprir essas obrigações,
configura-se o chamado abandono liberatório. Isso quer dizer que quando o proprietário do
prédio serviente assume para si a responsabilidade de manutenção da servidão e deixa de arcar
com essas despesas, presume-se que ele abandonou a propriedade em favor do proprietário do
prédio dominante. Se o proprietário do prédio dominante começar a custear essas despesas, ele
pode pedir judicialmente que área da servidão passe a ser de sua propriedade.

– Vedação de embaraço: é proibido ao dono do prédio serviente embaraçar o exercício da


servidão depois de constituída, por exemplo, colocar limitação de horários para passagem. Se

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proprietário do prédio serviente obstruir a passagem cabe, inclusive, o ajuizamento de ações
possessórias.

– Possibilidade de mudança: é possível desde que não prejudique o outro proprietário e deve
ser feita sob às custas do proprietário do prédio serviente.

– Princípio da menor onerosidade ao imóvel serviente: a servidão é regida pelo princípio da


menor onerosidade ao imóvel serviente, ou seja, essa servidão tem que ser feita de maneira
menos gravosa para o prédio serviente.

– Princípio da indivisibilidade: mesmo que haja a divisão do imóvel dominante, cada


proprietário dos novos imóveis dominantes terão direito integral sobre aquela servidão.

No direito brasileiro, há vários meios processuais de defesa das servidões:

a) Ação confessária
É a ação para pedir o reconhecimento da existência de uma servidão quando o
proprietário do prédio serviente nega sua existência. Essa ação serve para declarar a existência da
servidão, ou seja, ela possui natureza declatória. Essa ação pode ser cumulada com uma
obrigação de fazer ou de não fazer. A legimitidade ativa é do proprietário do prédio dominante.

b) Ação negatória
É quando o proprietário do prédio serviente quer uma declaração de que não existe
servidão. Ele quer que seja reconhecida a inexistência de uma servidão. A legimitidade ativa é
do proprietário do prédio serviente.

c) Ações possessórias
São as ações de reintegração da posse para esbulho, de manutenção de posse para
turbação e de interdito proibitório para ameaça.

d)Ação de nunciação de obra nova


É a ação utilizada para embargar uma determinada obra durante sua construção. A obra
não pode estar finalizada. Se a obra já tiver sido construída, cabe ação demolitória.

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e) Ação de usucapião
A usucapião de servidão se for ordinária, ou seja, se tiver o justo título, possui o prazo
idêntico da usucapião ordinária da propriedade: dez anos.
A usucapião de servidão se for extraordinária, ou seja, se não houver justo título, o
prazo é de quinze anos. O Código Civil fala de um prazo de vinte anos, porém, a doutrina
(Enunc. 251, I JDC) e a jurisprudência pacificaram que o prazo é de quinze anos, pois não
haveria sentido que o prazo para usucapir servidão fosse maior que o prazo para usucapir a
propriedade. Aplica-se analogicamente o prazo da usucapião extraordinária de propriedade para
servidão. Importante ressaltar que, em uma prova objetiva, se no enunciado falar do prazo para
usucapião de servidão de acordo com o Código Civil, tem que se responder vinte anos.

Em relação à constituição das servidões, ressalta-se que ela pode ser criada por:

a) Ato inter vivos


É realizada por meio de escritura pública e de seu registro na matrícula do imóvel.
Lembrando que imóveis até trinta salários mínimos não necessita de escritura pública, basta
somente o contrato particular, o qual terá que ser levado para registro.

b) Testamento
A servidão pode ser constituída por testamento, porém, esse testamento tem que ser
levado para registro.

c) Sentença
É criada por determinação judicial por meio de uma sentença de divisão de terras, ou seja,
no caso das ações demarcatórias (art. 596, CPC/2015). Sendo igualmente possível nas ações
confessárias.

d) Usucapião
De acordo com o art. 1.379, CC, pode haver constituição de servidão por usucapião,
desde que a servidão seja aparente.
A servidão, em regra, é perpétua. Se não há prazo, ela perdura perpetuamente. Ela é um
acessório, se o imóvel for alienado, ela segue o imóvel.

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Quanto às formas de extinção das servidões, ressalta-se:

a) Desapropriação
O ente desapropriante adquire a propriedade plena, ou seja, extingue qualquer ônus que
gravava a propriedade. Cabe indenização tanto para o prédio serviente como para o prédio
dominante na medida de utilização de cada um.

b) Cancelamento de registro
Há um pedido de cancelamento do registro de servidão. Para extinguir, é necessário que
as partes compareçam ao imóvel e peçam de comum acordo o levantamento dessa servidão. Ele
pode ser feito de três maneiras:
– Renúncia: quando o proprietário do prédio dominante renuncia expressamente, por não ter
mais interesse na servidão. O proprietário do prédio dominante abre mão da servidão.
– Fim do objeto da servidão: a servidão se torna inútil, ou seja, perdeu a finalidade. Quando
não se utiliza mais o objeto da servidão. Exemplo: não se usa mais a passagem, gasoduto
desativado.
– Resgate da servidão: o resgate é quando as partes acordam que uma delas vai pagar o preço
da servidão. O prédio serviente adquire novamente a propriedade plena.

c) Confusão real
Ocorre quando o proprietário do prédio serviente também é proprietário do prédio
dominante.

d) Supressão das obras por efeito de contrato


A manutenção das obras fica sob a responsabilidade do prédio dominante, se ele não
realiza essas obras, ele fere um dos deveres enquanto titular dessa servidão. Assim, pode se pedir
judicialmente o fim da servidão por falta de cumprimento de um dos deveres.

e) Desuso por 10 anos (inutilidade presumida)


Quando se deixa de exercer a servidão por mais de dez anos (no caso das servidões
descontinuas), o CC entende como uma inutilidade presumida. Então, pode se pedir
judicialmente o reconhecimento da inutilidade daquela servidão, bem como o seu levantamento.

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4. Usufruto (art. 1.390 a 1.411, CC)

Trata-se de direito real de fruição sobre coisa alheia em que o nu-proprietário


transfere ao usufrutuário o direito de usar e fruir do bem por determinado período, com a
obrigação de restitui-lo ao final.
O usufruto é considerado o direito real sobre coisa alheia por excelência. Ele contempla
metade dos atributos da propriedade e concede o direito total de uso e de gozo.
O usufrutuário é aquele que fará o uso e gozo da propriedade. É aquele que recebe os
atributos de uso e gozo da propriedade. Ele possui o domínio útil da propriedade.
A outra parte é o nu-proprietário, que é aquele que possui a propriedade despida de toda
utilização. Ele possui os atributos de reaver e dispor.
O usufrutuário pode alugar a propriedade, pois ele tem direito de usar e fruir da coisa.
Ele também pode usar medidas possessórias contra o nu-proprietário.
Em relação à terceiros, tanto o usufrutuário quanto o nu-proprietário podem mover ações
possessórias para defender a sua posse contra terceiros.
O nu-proprietário pode vender a propriedade, porém, o comprador terá que respeitar o
prazo de usufruto. Ele também pode dar o imóvel em garantia.
O usufrutuário não pode alienar o usufruto, nem pode dá-lo em garantia. A concessão de
usufruto é um relação personalíssima, ou seja, o usufrutuário não pode ceder o direito de
usufruto para terceiro, o que pode ser cedido é a exploração da coisa para terceiro. Assim, o
usufrutuário pode locar, emprestar, arrendar a propriedade, todavia, ele permanece com o direito
do usufruto. Por óbvio, que o nu-proprietário não pode locar o imóvel, pois não possui o direito
de gozar a coisa, porém, o usufrutuário pode locar, como já foi dito, inclusive, para o nu-
proprietário, por exemplo. O rendimento do usufruto pode ser penhorado.
Quanto ao objeto, destaca-se que tanto bens corpóreos como bens incorpóreos (direitos
autorais) podem ser dados em usufruto. Se o bem dado em usufruto for bem imóvel precisa de
registro, se for bem móvel (infungível e inconsumível) basta a escritura ou o contrato entre as
partes. Os bens precisam ser infungíveis e inconsumíveis, uma vez que após o término do prazo,
tem que ser devolvido exatamente o bem dado usufruto. Nelson Rosenvald e Cristiano Chaves
denominam de usufruto impróprio, quando se dá um bem fungível em usufruto, porque
tecnicamente não é um usufruto. Aliás, a maioria da doutrina nem chama isso de usufruto, mas
sim, de mútuo.

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Entre as características do usufruto, pode se destacar:

a) Direito real
Se é um direito real tem que ter registro na matrícula do imóvel e se for bem móvel não
precisa.

b) Inalienabilidade
O direito de usufruto não pode ser alienado, embora o exercício dos frutos possam ser
alienados, tendo em vista a questão da “expressão econômica imediata” (RESP 925687).
O direito de usufruto é inalienável, mas se pode ceder para terceira pessoa o seu exercício
(art. 1.393, CC).
Observa-se que embora não se possa vender o direito de usufruto para terceiro, pode se
ofertar para o próprio proprietário, o que gera a consolidação da propriedade (art. 1410, I, CC).

c) Intransmissibilidade do usufruto
Se o usufruto é inalienável, por consequência lógica, ele também é intransmissível.
Ocorrendo a morte do usufrutuário, o usufruto se extingue e seus herdeiros não podem assumir o
usufruto, tendo em vista seu caráter personalíssimo (intuitu personae).

d) Impenhorável
O direito de usufruto não pode ser penhorado, visto que uma das consequências da
penhora é a expropriação do bem.. Como o direito de usufruto não pode ser transmitido, por
conseguinte, também não pode ser penhorado. O usufrutuário só pode penhorar os frutos diretos,
os lucros diretos, que aquele bem gerar, conforme a ideia de “expressão econômica imediata”
(RESP 925687).

e) Temporariedade
O usufruto tem que ser temporário no sentido de que não pode ser perpétuo. O direito de
usufruto não se prolonga eternamente. Há possibilidade de haver direito de usufruto de forma
vitalícia, ou seja, que se extingue com a morte do usufrutuário. Para pessoa física, o limite
temporal máximo para o usufruto é até a morte da pessoa. Para pessoa jurídica, o prazo máximo
é de 30 anos. Após 30 anos, pode ser renovado. Se não houver previsão, presume-se o prazo de
30 anos.

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Cabe lembrar que se o nu-proprietário falece, os herdeiros recebem a propriedade, mas o
usufruto não extingue, de modo que eles devem respeitar esse direito real, que é oponível erga
omnes.

Em relação à classificação do usufruto, destaca-se:

a) Quanto ao conjunto de bens abrangidos


– Universal: usufruto sobre todo um conjunto de bens, sobre uma universalidade de bens.
– Particular: usufruto sobre um único bem específico.

b) Quanto à natureza dos bens


– Próprio: quando o usufruto for de bens infungíveis e inconsumíveis
– Impróprio (art. 1.392, § 1º): quando o usufruto for sobre bens fungíveis. Nesse caso, aplica-se
as regras do mútuo. Observa-se que parte da doutrina chama o usufruto impróprio de quase
usufruto.

c) Quantos aos poderes dos usufrutuários


– Total/pleno: cede-se poderes totais em relação ao uso e gozo
– Restrito/parcial: o usufruto é dado com algum tipo de limitação nos atributos de uso e gozo

d) Quanto à duração
– Temporário: tem prazo determinado. Ressalta-se que quando se trata de pessoa jurídica o
prazo máximo do usufruto é de trinta anos.
– Vitalício: quando vai até o fim da pessoa física. Extingue-se apenas com a morte do
usufrutuário.

e) Quanto ao modo de constituição


Em relação ao modo de constituição, o usufruto pode ser legal, voluntário, misto e
judicial.

– Legal
Refere-se às hipóteses em que o usufruto é criado por lei. O usufruto será legal quando
decorre da norma jurídica e não da vontade das partes, sendo desnecessário o seu registro no

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Cartório de Registro de Imóveis, conforme art. 167, I, n.7, da Lei 6.015. Trata-se de exceção à
regra do registro imobiliário (art. 1.391, CC). Exemplos: o cônjuge possui usufruto dos bens
particulares do outro cônjuge, o cônjuge tem direito de usufruto sobre os bens particulares do
outro cônjuge (art. 1.652, I, CC); os pais têm direito ao usufruto em relação aos bens dos filhos
menores (art. 1.689, I, CC).

– Voluntário (por alienação ou por retenção/deducto)


O usufruto voluntário é aquele que decorre do exercício da autonomia privada, podendo
ter origem em testamento (ato causa mortis) ou em contrato (ato inter vivos), como é o caso da
doação.
O usufruto voluntário decorrente de contrato pode ser de duas formas: por alienação ou
por retenção.
O usufruto voluntário por alienação ocorre quando o proprietário concede o direito de
usufruto para terceiro, mas conserva para si sua nua propriedade.
O usufruto voluntário por retenção/deducto ocore quando o proprietário do bem
transfere a nua propriedade para terceiro, mas reserva para si o direito de usufruto sobre a
propriedade. É muito utilizado em planejamento sucessório, por exemplo, o pai doa o imóvel
para os filhos, mas reserva para si o direito de usufruto.

– Misto (por usucapião, art. 1.391, CC)


Quando é criado por meio do reconhecimento de usucapião. Aplicam-se os prazos para a
usucapião ordinária (10 anos) e para a usucapião extraordinária (15 anos).

– Judicial (art. 867 a 869, CPC/2015)


É o usufruto fixado pelo juiz da execução. No novo CPC, o usufruto judicial foi extinto,
porém, ele ainda subsiste no art. 21 da Lei de Divórcio (Lei 8.971/94). O STJ também entende
que o usufruto judicial ainda subsiste (RESP 8555693), porém é muito raro aparecer tal hipótese.

f) Usufruto indígena (CF, art. 231, § 2º)


As terras indígenas pertencem a União e as pessoas indígenas possuem o direito de
usufruto sobre essas terras. Eles tem o direito de uso e gozo pleno sobre essas terras. Esse
usufruto prescinde de registro.

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No que tange aos principais direitos do usufrutuário, destaca-se:

– Art. 1.394 e 1.395, CC


Durante a vigência do usufruto, todos os bens colhidos pertencem ao usufrutuário,
inclusive, os frutos pendentes, sem a necessidade de indenizar o proprietário.

– Frutos pendentes, independentes das despesas de produção (art. 1.396, CC)


Após o encerramento do usufruto, os frutos pendentes pertencem ao proprietário, sem
necessidade de indenização. O máximo que pode acontecer é o reembolso dos valores que foram
gastos para produção, a fim de evitar o enriquecimento ilícito.

– Compensação legal (art. 1.397, CC)


Os bezerros pertencem ao usufrutuário. Porém, a lei impõe que os bezerros sejam
compensados com os animais que faleceram.

– Frutos civis (art. 1.398, CC)


Os frutos civis (aluguéis, por exemplo) vencidos durante o usufruto pertencem ao
usufrutuário, após o término, pertencem ao proprietário.

– Mudança de destinação (art. 1.399, CC)


Somente pode ser mudada a destinação prevista em contrato, se tiver autorização do
proprietário.

Quanto aos deveres do usufrutuário (arts. 1.400 a 1.409, CC), ressalta-se:

– Caução usufrutuária (art. 1.400, CC)


É possível que seja exigida uma caução usufrutuária, como uma forma de o nu-
proprietário resguardar-se de eventuais inadimplementos. Na hipótese de usufruto voluntário por
retenção, cabe a dispensa de caução. Se o usufrutuário não tiver condições de dar essa caução, o
proprietário pode nomear um administrador para coisa, ou seja, o usufrutuário perde o direito de
administração.

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– Despesas de uso + tributos + seguro (art. 1.407, CC)
O usufrutuário é responsável pelo pagamento de todas as despesas de uso, dos tributos,
do seguro e das despesas normais de manutenção. Porém, o CC faz a seguinte ressalva, se ele
tiver de gastar com a manutenção da coisa algo muito acima (despesas não módicas), ele pode
repassar esse custo para o proprietário. O preço alto é o valor superior a dois terços do
rendimento líquido da coisa em um ano.

– Dever de informação
Qualquer informação, alteração, problema, relacionado ao bem, o usufrutuário tem o
dever de informar ao proprietário. O proprietário pode a qualquer tempo também pedir
informações sobre o bem e, até mesmo, fiscalizar se os deveres estão sendo cumpridos.

– Perda do bem
Se o bem se perder sem culpa do usufrutuário (art. .1408, CC), o proprietário arca com o
prejuízo. Se o usufrutuário tiver culpa, ele tem que restituir o valor da coisa acrescido de perdas e
danos (art. 1.409, CC).

Quanto à extinção de usufruto, destacam-se os arts. 1.410 e 1.411, CC:

Art. 1.410. O usufruto extingue-se, cancelando-se o registro no Cartório de


Registro de Imóveis:

Assim, desde que seja usufruto voluntário, para se extinguir o usufruto é necessário
realizar o cancelamento do registro no Cartório de Registro de Imóveis, a fim de dar efeito erga
omnes, ocorrendo a extinção nas seguintes hipóteses:

I - pela renúncia ou morte do usufrutuário;

Havendo morte do usufrutuário, leva-se a certidão de óbito para ser averbada na


matrícula do imóvel e faz o levantamento.
Em relação à renúncia, ela tem de ser realizada por meio de escritura pública (acima de
trinta salários) e registrada na matrícula do imóvel.

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II - pelo termo de sua duração;

Morte e término do prazo (termo de sua duração) não precisa de sentença judicial para
extinguir o usufruto. Nas demais hipóteses, precisa-se de ação judicial para cancelamento do
usufruto.

III - pela extinção da pessoa jurídica, em favor de quem o usufruto foi


constituído, ou, se ela perdurar, pelo decurso de trinta anos da data em que se
começou a exercer;
IV - pela cessação do motivo de que se origina;
V - pela destruição da coisa, guardadas as disposições dos arts. 1.407, 1.408, 2ª
parte, e 1.409;
VI - pela consolidação;
VII - por culpa do usufrutuário, quando aliena, deteriora, ou deixa arruinar os
bens, não lhes acudindo com os reparos de conservação, ou quando, no usufruto
de títulos de crédito, não dá às importâncias recebidas a aplicação prevista no
parágrafo único do art. 1.395;
VIII - Pelo não uso, ou não fruição, da coisa em que o usufruto recai (arts. 1.390
e 1.399).

Quanto à extinção, merece também atenção o art. 1.411, CC:

Art. 1.411. Constituído o usufruto em favor de duas ou mais pessoas, extinguir-


se-á a parte em relação a cada uma das que falecerem, salvo se, por estipulação
expressa, o quinhão desses couber ao sobrevivente.

O art. 1411, CC, trata do usufruto simultâneo ou contínuo. A porção ideal de usufruto
extinta volta para o proprietário, devido a intransmissibilidade do usufruto. Em relação à parte do
usufrutuário que faleceu, há uma consolidação do proprietário. No entanto, deve-se lembrar que
as partes podem acordar em sentindo diverso. Por exemplo, pode se acordar que havendo a morte
de um dos usufrutuários, o usufruto extingue-se completamente; ou que havendo a morte de um
dos usufrutuários, o usufrutuário terá o usufruto total do imóvel.
O usufruto é uma divisão equânime dos atributos da propriedade. O uso, a habitação e as
concessões especiais são formas muito semelhantes ao usufruto só que com atributos cada vez

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mais restritos.
O usufruto é cedido para outra pessoa para que ela faça o uso e gozo. Se houver a cessão
da propriedade somente para uso, cria-se o direito de uso. Se a cessão desse uso for
especificamente para que a pessoa habite, configura-se o direito de habitação.

5. Uso (art. 1.412 a 1.413)

O uso é o direito real sobre coisa alheia em que se concede para terceira pessoa o
direito de usar determinado bem. As partes que compõem o uso são proprietário e usuário.
Como características, observa-se que o uso pode ser gratuito ou oneroso. Também é
personalíssimo, ou seja, não pode ser cedido, alienado, transferido ou penhorado. Ele se refere à
cessão do atributo de usar a coisa e possui como objeto bem móvel ou imóvel. Parte da doutrina
chama o uso de usufruto anão, porque há uma cessão reduzido do atributo de usar a coisa.
Usar um bem significa colocá-lo para proveito próprio. A pessoa que recebe o bem
para uso, em regra, é só é para uso próprio, o que inclui não apenas a pessoa que recebeu, mas
também o uso necessário para a sua família. Exemplo: normalmente, os jazigos públicos são
feitos por meio de concessão de uso.
Quanto ao conceito de família, inclui-se cônjuge, filhos, companheiro. Ademais, uma
pessoa pode ser família (família unipessoal), conforme o STJ. Contudo, o conceito de família
presente nos arts. 1.412 e 1.1413, CC, é ainda mais alargado, pois incluem as pessoas que
trabalham na residência, por exemplo, os empregados domésticos, e outros familiares que
eventualmente residam nela (tio, primo,...). É um conceito amplíssimo de família.
Há uma exceção no STJ que permite a exploração econômica por meio do uso.
Quando, por algum motivo superveniente, durante o uso, o usufrutuário é transferido para outra
cidade, é possível que se alugue o imóvel recebido, a fim de se pagar outro imóvel, desde que o
bem locado seja equivalente ao outro bem da nova moradia. Os bens têm que ser
correspondentes.
Em relação à regulamentação legal, aplica-se, por analogia, as mesmas regras do
usufruto, no que for compatível (art. 1.413, CC), bem como as mesmas hipóteses de extinção
(art. 1.410, CC).
O prazo de uso é o mesmo do usufruto, no caso do jazigo público, o direito de uso volta
para o Município. Para viabilizar a prática, o Município cria um novo uso para os herdeiros. O
ideal seria realizar o direito de superfície, porque ele é transmissível.

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6. Habitação (art. 1.414 e 1.415, CC)

O direito de habitação refere-se ao uso específico para habitação e necessariamente


tem que ser gratuito. Ele possui como partes proprietário e habitante.

Entre suas características, destaca-se:

a) Origem: legal ou convencional


O direito real de habitação pode se constituir de duas formas: legal ou convencional. É
convencional quando as partes criam o direito de habitação por vontade própria através de um
instrumento público. Existe também uma previsão de criação do direito real de habitação quando
se fala em regime sucessório, em que a lei determina o direito real de habitação para o cônjuge
sobrevivente. Não precisa de registro para isso. Assim, direito real de habitação legal é aquele
criado pelo direito das sucessões para o cônjuge sobrevivente quando o único imóvel do casal ou
do cônjuge falecido é de cunho residencial e se comunica com outros herdeiros. Ele visa a
garantir o direito de moradia do cônjuge sobrevivente. Lembrando que se estende esse direito
para o companheiro também.

b) Gratuito (art. 1.414, CC) e habitação simultânea (art. 1.415, CC)


Tem que ser gratuito. Além disso, é possível a entrega para habitação simultânea para
mais de uma pessoa (art. 1.415, CC).

c) Personalíssimo (intuitu personae)


Quando a parte falece o direito de uso para habitação volta para o proprietário. Por ser
personalíssimo, qualquer cessão realizada é considerada uma nulidade virtual por
descumprimento de norma de ordem pública (art. 166, VII, 2ª parte, CC).
Ele pode ser concedido tanto para bem imóvel como para bem móvel, como navio, casa
flutuante. Não há vedação do direito de uso para bens móveis, sendo que, embora haja esse
conceito ampliado de casa, necessariamente tem que ser usada para moradia.
No que tange à regulamentação legal, há a aplicação, por analogia, das mesmas regras do
usufruto, no que for compatível (art. 1.416, CC) e das mesmas hipóteses de extinção (art. 1.410,
CC).

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7. Concessões especiais para uso e moradia (Lei 11.481/2007)

As concessões especiais para uso e moradia não são constituídas de forma voluntária
e possuem como objetivo a regularização jurídica de áreas favelizadas. Geralmente, as áreas
favelizadas encontram-se em áreas públicas, que não são passíveis de usucapião (art. 183, §3º, e
art. 191, p. ún., CF), de modo que para solucionar isso, o poder público, por meio dessas
concessões especiais, cede essas áreas para as pessoas que as ocupam.
A concessão do direito real de uso foi reconhecido pelo CC como direito real, mas foi
criada pelo Decreto-lei 271/1967, arts. 7º e 8º. De acordo com esse decreto, a concessão de uso é
um direito real resolúvel, para fins específicos de regularização fundiária de interesse social,
urbanização, industrialização, edificação, cultivo da terra, aproveitamento sustentável das
várzeas, preservação das comunidades tradicionais e seus meios de subsistência ou outras
modalidades de interesse social em áreas urbanas:

Art. 7º - É instituída a concessão de uso de terrenos públicos ou particulares


remunerada ou gratuita, por tempo certo ou indeterminado, como direito real
resolúvel, para fins específicos de regularização fundiária de interesse social,
urbanização, industrialização, edificação, cultivo da terra, aproveitamento
sustentável das várzeas, preservação das comunidades tradicionais e seus meios
de subsistência ou outras modalidades de interesse social em áreas urbanas.
Art 8º - É permitida a concessão de uso do espaço aéreo sôbre a superfície de
terrenos públicos ou particulares, tomada em projeção vertical, nos têrmos e
para os fins do artigo anterior e na forma que fôr regulamentada.

Ademais, no art. 1º da MP 2220/2001, dispõe-se sobre a concessão de uso especial para


fins de moradia:

Art. 1º Aquele que, até 22 de dezembro de 2016, possuiu como seu, por cinco
anos, ininterruptamente e sem oposição, até duzentos e cinquenta metros
quadrados de imóvel público situado em área com características e finalidade
urbana, e que o utilize para sua moradia ou de sua família, tem o direito à
concessão de uso especial para fins de moradia em relação ao bem objeto da
posse, desde que não seja proprietário ou concessionário, a qualquer título, de
outro imóvel urbano ou rural.

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Observa-se que se fosse bem particular haveria usucapião, porém, como se trata de bem
público é hipótese de concessão de uso.
Para Maria Sylvia Zanella Di Pietro, as concessões especiais para uso e moradia deixm de
ser um direito discricionário, ou seja, não remete à análise de conveniência e oportunidade da
Administração. Elas se configuram como um direito real subjetivo, sendo, portanto, um ato
administrativo não discricionário.
A diferença em relação ao direito real de laje é que o direito real de laje é o direito real
sobre imóveis particulares, enquanto que a concessão especial de uso e moradia opera-se sobre
bens públicos.

III. DIREITO REAL DE AQUISIÇÃO

Relaciona-se ao atributo de dispor do bem. Só há um direito real de aquisição: a


promessa de compra e venda registrada.
Quando se faz uma promessa de compra e venda por meio de um contrato particular, ela é
um direito obrigacional. Se a promessa de compra e venda for registrada na matrícula do imóvel,
ela se torna um direito real. Limita-se o direito do proprietário de vender para quem ele quiser e
cede-se o direito de adquirir a coisa para o promitente comprador.

1. Normas Gerais do CC

Art. 1.417. Mediante promessa de compra e venda, em que se não pactuou


arrependimento, celebrada por instrumento público ou particular, e registrada no
Cartório de Registro de Imóveis, adquire o promitente comprador direito real à
aquisição do imóvel.
Art. 1.418. O promitente comprador, titular de direito real, pode exigir do
promitente vendedor, ou de terceiros, a quem os direitos deste forem cedidos, a
outorga da escritura definitiva de compra e venda, conforme o disposto no
instrumento preliminar; e, se houver recusa, requerer ao juiz a adjudicação do
imóvel.

São requisitos para que essa promessa de compra e venda se configure como um direito
real:
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a) Cláusula de irrevogabilidade
Tem que ser uma promessa de compra e venda irretratável, ou seja, tem que haver a
chamada cláusula de irrevogabilidade.
Nos contratos de promessa de compra e venda, geralmente, existe a previsão de arras ou
sinal, que é uma garantia de pagamento. Os contratos que tem a previsão de uma arras ou sinal
irrepetível (previsão de que este valor não será devolvido, caso o negócio seja cancelado) torna o
negócio irretratável, porque ele já se constitui como uma multa. A Jurisprudência entende que se
no contrato houver o pagamento de arras ou sinal sem devolução, há uma presunção de
irrevogabilidade.
A promessa de compra e venda registrada não admite cláusula de arrependimento, que
deve ser considerada nula.

b) Registro imobiliário
Por meio do registro, a promessa de compra e venda adquire oponibilidade erga omnes e
passa a existir o direito de sequela.

c) Preço concluído
Tem que haver o pagamento do preço concluído, ou seja, o pagamento do valor
negociado.

2. Contrato preliminar: promessa de compra e venda

Deve-se lembrar que o contrato preliminar de promessa de compra e venda é fonte de


obrigações e pode ser público ou privado.

Entre suas caracteríticas, nota-se:


a) Bilateral
Tem obrigação para ambas as partes.
b) Oneroso
c) Comutativo
d) Pessoal
Não pode ser transmitido.
e) Paritário (em regra), mas pode ser de adesão

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No contrato de adesão, pode se revisar eventuais cláusulas abusivas. Se houver cláusulas
contraditórias, a interpretação é a favor de quem não escreveu o contrato.
f) Solene

Os requisitos do contrato de promessa de compra e venda são três: res (coisa) + pretium
(preço) + consensus (consenso)
Se houver arras irrepetíveis, enquadra-se no caso de irretratabilidade.
Cabe lembrar que as arras/sinal podem ser feitas de duas formas:
– Arras confirmatórias (art. 417 a 419, CC)
É aquele sinal que é utilizado como princípio de pagamento. O valor pago é parte do
pagamento, o que sinaliza que o negócio é irretratável, pois já se está começando a pagar o
objeto de negociação. Caso o negócio não se concretize, esse valor se perde. Se por culpa do
promitente comprador, o negócio não se realiza, ele perde esse valor. Como é um negócio
irretratável, os eventuais prejuízos que o promitente vendedor tenha, ele tem o direito de cobrar
indenização.
Assim, se houver a desistência do negócio, o promitente comprador perde a arras, além
de ter que pagar perdas e danos. Se houver a concretização do negócio, abate-se a arras do preço
total.
– Arras indenizatórias (art. 420, CC)
As arras indenizatórias são desvinculadas do valor do negócio, elas já são fixadas com o
objetivo mesmo de arrependimento. É um valor que se paga como uma multa antecipada. Assim,
fixa um valor para o caso de a parte se arrepender do negócio, o que exclui pedidos adicionais de
perdas e danos, porque ela já um valor antecipado para perdas e danos. Se o contrato for
concretizado, o valor das arras indenizatórias tem que ser devolvido, ou seja, ele presume
arrependimento, o que impede a existência de um direito real de aquisição.

3. Direito real de aquisição do promitente comprador

Esse direito real traz ao promitente comprador o direito de exigir a escritura


definitiva. A ação cabível pode ser de obrigação de fazer, que é genérica, ou de adjudicação
compulsória do imóvel, que é uma ação específica (art. 1.418, CC c/c art. 876 e ss,
CPC/2015).
Esse direito do promitente comprador de exigir a escritura definitiva pode ser feito tanto

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em face do promitente vendedor como de terceiros.
Esse instrumento, sem cláusula de arrependimento e registrado no CRI, é título hábil para
embasar a ação reivindicatória (ação petitória) em que se exige o reconhecimento de que se é o
legítimo proprietário.
O instrumento particular serve para as partes e o STJ entende que o instrumento
particular é um instrumento hábil para as ações de posse. Assim, o promitente comprador tem
legitimidade para atuar em uma ação reivindicatória – que é uma ação de transmissão de domínio
– e também para opor embargos de terceiro, caso o imóvel seja adjudicado ou constrito em uma
outra execução.

IV. DIREITOS REAIS DE GARANTIA

1. Normas gerais do CC

O Código Civil prevê dois tipos de garantias: pessoais/fidejussórias e garantias reais. A


garantia visa a dar preferência de recebimento para o credor. Os credores sem direito de
preferência são chamados de credores quirografários.
Acima dos direitos reais de garantia, encontram-se os créditos trabalhistas (art. 83, Lei
11.101/2005), as cotas condominiais (Súmula 478, STJ) e outras determinadas em lei (art.
1.421,CC). Assim, o credor hipotecário, pignoratício ou anticrético possui preferência sobre os
credores quirografários.
A garantia tem o condão de dar uma segurança no recebimento do crédito. As garantias
pessoais/fidejussórias tratam de uma responsabilidade pessoal, como o aval e a fiança. Já as
garantias reais são aquelas em que se oferece um bem móvel ou imóvel para garantir o
cumprimento da obrigação, como a hipoteca, o penhor e anticrese. Além disso, há alienação
fiduciária.
Os direitos reais de garantia estão ligadas ao atributo de disposição do bem. São
modalidades de direitos reais de garantia a hipoteca (imóvel), o penhor (móvel) e a anticrese
(frutos – não se permite a excussão judicial). Essas três modalidades são direitos reais sobre
coisa alheia.
A alienação fiduciária é garantia real sobre coisa própria. É comumente utilizada para
aquisição de veículos.

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São efeitos dos direitos reais de garantia:

– Preferência
O direito de preferência confere ao credor que recebeu a garantia uma preferência no
pagamento perante outros credores no caso de alienação judicial do bem (art. 1.422, CC), ou
seja, o credor que recebeu a garantia possui um direito de preferência no recebimento do
crédito.
No parágrafo único do mesmo artigo, encontram-se as exceções desse direito de
preferência: dívidas trabalhistas até 150 salários mínimos (em falências); cota condominial,
primeiramente são pagas as dívidas condominiais, etc.

– Indivisibilidade
Essas garantias operam-se de maneira indivisível. A garantia só pode ser levantada
quando houver o cumprimento integral das obrigações. A coisa é dada em garantia de uma
obrigação e só será liberada do ônus com o adimplemento total, ou seja, o pagamento parcial
mantém a garantia incólume (art. 1.421, CC). A garantia incide sobre todos os bens dados em
garantia.
Nos casos de empreendimentos imobiliários, por se tratar de relação de consumo, houve
uma decisão do STJ no sentido de que é possível não repassar essa hipoteca para o consumidor,
em respeito aos direitos constitucionais do consumidor e à boa-fé.

– Sequela
O ônus da garantia segue o bem onde e com quem ele estiver e permite ao credor
perseguir o bem. O credor da garantia tem o direito de exigir a coisa de quem quer que a
detenha.

– Excussão
Excussão vem de excutir, executar, alienar judicialmente o bem dado em garantia. É o
direito de levar o bem para uma alienação judicial. O requisito é que a dívida esteja vencida. A
partir do momento em que a dívida estiver vencida, o credor pode pedir a alienação
judicial do bem. O credor recebe o fruto da alienação do bem, ou seja, ele não fica com o bem
para si.
Considera-se vencida a dívida quando ocorre o seu termo, mas há hipóteses em que se

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permite o vencimento antecipado da dívida (art. 1.425, CC).

Art. 1.425. A dívida considera-se vencida:


I - se, deteriorando-se, ou depreciando-se o bem dado em segurança, desfalcar a
garantia, e o devedor, intimado, não a reforçar ou substituir;
II - se o devedor cair em insolvência ou falir;
III - se as prestações não forem pontualmente pagas, toda vez que deste modo se
achar estipulado o pagamento. Neste caso, o recebimento posterior da prestação
atrasada importa renúncia do credor ao seu direito de execução imediata;
IV - se perecer o bem dado em garantia, e não for substituído;
V - se se desapropriar o bem dado em garantia, hipótese na qual se depositará a
parte do preço que for necessária para o pagamento integral do credor.

Em todas essas hipóteses, considera-se a dívida vencida e se pode levar o bem para
excussão judicial.
Em regra, a parte credora não pode ficar com a coisa, a qual tem que ser alienada
judicialmente. Assim, o chamado pacto comissório é considerado nulo (art. 1.428, CC). O
pacto comissório refere-se às cláusulas que preveem a possibilidade de o credor ficar com a coisa
dada em garantia se houver o inadimplemento da obrigação.
O devedor, depois que a dívida estiver vencida, pode até oferecer o bem para o credor,
mas esse oferecimento tem que ser posterior. As cláusulas que preveem o direito de o credor
escolher ficar com a coisa dada em garantia são nulas, a fim de evitar o abuso de direito e o
exercício arbitrário das próprias razões.
O direito de excussão só existe na hipoteca e no penhor, quando a dívida está vencida, o
que inclui o vencimento antecipado da dívida. Na anticrese, não há o direito de excussão, pois
não se pode alienar a coisa, o credor poderá apenas usar e gozar dela.

– Remição
Alguns autores também falam da existência de um direito ou efeito de remição, que é o
direito de resgatar a coisa dada em garantia após o pagamento (adimplemento) total da
obrigação (art. 1.429, CC). O devedor tem assegurado o direito de levantar a garantia quando
efetuado o pagamento total da obrigação.

Em relação à constituição da garantia, existem requisitos objetivos (referente ao objeto)


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e subjetivos (referente aos sujeitos).

Os requisitos objetivos são a consuntibilidade jurídica e a especialização:

a) Consuntibilidade jurídica
O objeto dado em garantia precisa ser juridicamente consumível, no sentido de ser
passível de alienação. O bem não pode ter cláusula de inalienabilidade.
Não é juridicamente alienável o bem de família nos termos do art. 1.711, CC.
O bem de família foi uma criação da Lei 8009/90, a qual visa a proteger o mínimo
existencial. O artigo 1º da referida lei dispõe sobre o que se considera bem de família:

Art. 1º O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é


impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial,
fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos
pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses
previstas nesta lei.
Parágrafo único. A impenhorabilidade compreende o imóvel sobre o qual se
assentam a construção, as plantações, as benfeitorias de qualquer natureza e
todos os equipamentos, inclusive os de uso profissional, ou móveis que
guarnecem a casa, desde que quitados.

Para essa proteção da Lei 8.009, não se precisa fazer nada, basta que se demonstre que o
bem faz parte do mínimo existencial. O imóvel considerado bem de família é aquele que é o
único imóvel utilizado para residência da família. É o chamado bem de família legal.
A segunda forma de se criar o bem de família encontra-se no art. 1.711, CC. No caso de
mais de um bem, pode se determinar qual é o bem de família por meio de registro, desde que seja
residencial e que esse bem corresponda até 1/3 do valor total do patrimônio líquido. É o chamado
bem de família convencional.
Existem algumas exceções para a impenhorabilidade do bem de família: obrigações
propter rem (obrigações decorrentes da própria coisa, por exemplo, dívida de IPTU, de
condomínio, etc.), pensão alimentícia (também permite a penhora), entre outras hipóteses
encontradas no art. 3º da Lei 8.009:

Art. 3º A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil,


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fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido:
II - pelo titular do crédito decorrente do financiamento destinado à construção
ou à aquisição do imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em
função do respectivo contrato;
III – pelo credor da pensão alimentícia, resguardados os direitos, sobre o bem,
do seu coproprietário que, com o devedor, integre união estável ou conjugal,
observadas as hipóteses em que ambos responderão pela dívida;
IV - para cobrança de impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições
devidas em função do imóvel familiar;
V - para execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo
casal ou pela entidade familiar;
VI - por ter sido adquirido com produto de crime ou para execução de sentença
penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens.
VII - por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.

A diferenciação dos dois tipos de bem de família é importante, pois o bem de família do
art. 1.711, CC, não pode ser dado em garantia devido à cláusula de inalienabilidade. É um bem
fora do comércio, que não pode ser vendido, em outras palavras, é um bem inconsumível
juridicamente. Já o bem de família nos termos da Lei 8.009 pode ser dado em garantia.

b) Especialização
A especialização importa na descrição pormenorizada do bem, conforme dispõe o
art. 1.424, CC. O bem tem que estar bem detalhado/especificado.

Art. 1.424. Os contratos de penhor, anticrese ou hipoteca declararão, sob pena


de não terem eficácia:
I - o valor do crédito, sua estimação, ou valor máximo;
II - o prazo fixado para pagamento;
III - a taxa dos juros, se houver;
IV - o bem dado em garantia com as suas especificações.

A especialização do bem imóvel tem que ser seguida pelo registro do contrato no RGI. Se
for bem móvel, o registro ocorre no Cartório de Títulos e Documentos, para dar publicidade e
oponibilidade erga omnes.

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Em relação aos requisitos subjetivos, ressalta-se:

a) Capacidade civil
Se for relativamente incapaz tem que estar assistido e se for absolutamente incapaz tem
ser representado.

b) Capacidade para alienar


Tem capacidade para alienar um determinado bem aquele que é o seu proprietário ou que
possui a autorização deste para fazer a alienação. Quanto a esse requisito, deve se observar:

→ Convalidação por superveniência de domínio (art. 1.420, § 1º, CC)


Se a pessoa, no momento em que deu o bem em garantia, não for a proprietária, mas
posteriormente se tornar proprietária desse bem, a garantia é convalidada.

→ Anulabilidade

– Necessidade de outorga uxória


É anulável a garantia dada sem a devida outorga do cônjuge, salvo se o regime adotado
for o de separação total de bens.

– Hipoteca em favor de descendente


Hipoteca em favor de descendente é anulável se não houver a autorização dos demais
descendentes.

→ Nulidade

– Parte indivisa (co-propriedade)


Se um indivíduo é co-proprietário de um bem, ele não pode vender o bem sem a
autorização do outro proprietário, se for coisa indivisa. Exemplo: cavalo de raça, cessão de
herança não dividida.

– Falta de autorização legislativa (Pessoa Jurídica de Direito Público)


A garantia dada por pessoa jurídica de direito público sem autorização legislativa é nula.

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2. Penhor (art. 1.431 a 1.472, CC)

O penhor é uma forma de dar o bem em garantia para terceira pessoa, tendo como
objeto principal, normalmente, bens móveis. Além disso, há a transferência da posse direta
do bem para o credor pignoratício.
Não se pode confundir penhor e penhora. A penhora é uma constrição/apreensão
judicial de bens. Ela advém de uma ordem judicial. O penhor é uma garantia extrajudicial.
Quando se dá um bem em penhor, ele é empenhado. Quando se dá uma bem em penhora,
ele é penhorado.
A hipótese mais comum de penhor é o penhor de joias da Caixa Econômica.

As partes da relação de penhor são o credor pignoratício e o devedor pignoratício.

O penhor pode ser constituído das seguintes formas:

a) Penhor legal
São hipóteses de penhor criadas pelo legislador. Exemplo: retenção de bagagens em hotel
em caso de inadimplemento.

b) Penhor convencional
Ele pode se criado de modo convencional por meio de um contrato real (o contrato que só
se aperfeiçoa com a entrega da coisa), solene (porque tem que ser registrado no Cartório de
Título e Documentos) e pode ser feito através de instrumento público ou particular.
Importante ressaltar que existem exceções para essas regras gerais, especificamente, no
caso de penhor especial.

Quanto ao credor pignoratício, são seus direitos (art. 1.433 e 1.434, CC):
a) Investir-se na posse (direta/indireta) da coisa;
b) Retenção do objeto até total adimplemento;
O credor possui o direito de reter o bem dado em garantia se a dívida não for paga. O
bem só é devolvido quando houver o pagamento total da dívida.
c) Cobrar despesas de manutenção/conservação (com direito de retenção inclusive);
O credor que está na posse direta do bem possui o dever de cuidar da coisa, porém, todas

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as despesas que ele tiver podem ser cobradas. O credor tem direito de reembolso pelas despesas
realizadas para manutenção ou conservação da coisa.
d) Fazer a venda direta, se autorizada (art. 1.433, IV, CC);
e) Fazer a venda antecipada se houver risco de deterioração da coisa;
É decorrência do dever de cuidado da coisa. O valor da venda servirá de garantia para o
credor.
f) Ressarcimento do prejuízo pelo vício da coisa;
g) Apropriação dos frutos da coisa;
O credor se apropria dos frutos como garantia.
h) Usar a coisa, se autorizado pelo devedor;
i) Receber o crédito com preferência.

São deveres do credor do pignoratício (art.1.435):


a) Custódia da coisa
b) Defesa da posse da coisa
Tem direito, inclusive, de ajuizar ações possessórias, desde que se comunique ao
proprietário.
c) Imputação do valor dos frutos
d) Restituição da coisa
O credor deve restituir o bem dado em garantia quando houver o pagamento.
e) Entregar a diferença do preço
Se a coisa for alienada por um valor superior ao valor da dívida, deve-se pagar o
acréscimo ao devedor.

As formas de extinção do penhor encontram-se no art.1.436:

a) Extinção da dívida/obrigação principal


Quando a dívida for paga.

b) Perecimento do objeto
Em caso de perecimento do objeto, tem-se a obrigação de complementar o valor, se o
devedor não complementar, configura-se o vencimento antecipado da dívida (art. 1.425, CC).

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c) Renúncia da garantia
O credor abre mão da garantia. Essa renúncia pode ser expressa ou presumida.
Há presunção quando o credor:
– Consentir na venda da coisa sem reserva de preço
– Restituir a posse ao devedor
– Aceitar substituição por outra garantia: extingue-se a primeira garantia e cria-se uma nova
garantia.

d) Confusão
Ocorre quando as figuras do credor e devedor recaem sobre a mesma pessoa.

e) Adjudicação judicial, remição ou venda da coisa pelo credor.


A adjudicação judicial ocorre quando o bem é levado para excussão.
A remição refere-se à extinção da garantia pelo pagamento da dívida. Antes de
adjudicados ou alienados os bens, o executado pode, a todo tempo, remir a execução, pagando ou
consignando a importância atualizada da dívida, acrescida de juros, custas e honorários
advocatícios.
A venda da coisa pelo credor refere-se à venda da coisa, que pode ser judicial ou
extrajudicial, gerando o desaparecimento do objeto da garantia real e, por conseguinte, a sua
extinção.

2.1.Penhor legal

O penhor legal decorre de imposição da norma jurídica. Encontra-se previsto nos art.
1.467 a 1.472, CC. Trata-se, claramente, de formas de exercício de autotutela.
Possuem legitimidade para o penhor legal:
a) Hospedeiros
Se um hóspede de hotel não pagar a conta, os funcionários podem reter os seus bens
como um forma de garantia pelo não pagamento.
b) Fornecedores de alimentos
Se o cliente de um restaurante não pagar a conta, os funcionários podem reter os bens
móveis do devedor para dar em garantia.
c) Dono do prédio locado (rústico ou urbano)

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Aquele que deixa de pagar o aluguel mensal pode ser impedido pelo locador de retirar os
bens que se encontram no imóvel. O locador segura, leva para homologação judicial e,
posteriormente, inicia a execução da dívida, caso não haja o pagamento.

Os requisitos do penhor legal são:


a) Perigo da demora (art. 1.470, CC)
b) Rito de homologação de penhor legal (art. 1.471, CC)
Para evitar o exercício arbitrário das próprias razões, após a retenção do objeto, o
hospedeiro, o fornecedor ou o dono do prédio locado, tão logo deve levar para homologação
judicial. Deve-se atentar para que não haja cobrança vexatória.
c) Bens penhoráveis e impenhoráveis

A crítica que se faz ao penhor legal é que ele pode ocasionar cobrança vexatória e lesão
a bens íntimos.
Quanto à cobrança vexatória, ela pode expor o devedor, o que é incompatível com o art.
42, CDC. Em relação aos bens que guarnecem o imóvel locado, eles possuem proteção na Lei
8.009/90, que diz que bem de família é o imóvel usado para a família residir, bem como os
móveis que o guarnecem. Assim, haveria uma ofensa ao bem de família ao se permitir que o
credor retenha os bens de uso pessoal.

2.2. Penhor convencional civil

O penhor convencional civil é aquele em que há entrega do bem móvel para o credor, o
qual passa a possuir a posse direta do bem. O proprietário não deixa de ser proprietário, mas
fica apenas com a posse indireta, em quanto o credor fica com a posse direta.
Tratra-se da entrega voluntária da coisa a ser depositada.

2.3. Penhor convencional especial

A posse direta da coisa fica com o próprio devedor. O devedor dá o bem em garantia,
mas continua com a posse direta da coisa.
Como o devedor fica na posse direta, ele se assemelha ao depositário da coisa.
Antigamente, se o devedor sumisse com o bem, aplicava-se a mesma punição que era aplicada ao

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depositário infiel: a prisão civil. Porém, a partir da Súmula 25, STF, a prisão civil por dívida não
existe mais, de modo que alguns doutrinadores defendem que o instituto ficou esvaziado.
Apesar disso, o penhor convencional especial é muito utilizado nos casos em que o
Estado quer estimular o crédito, para isso, ele faz um empréstimo ao indivíduo, o qual
permanece com o bem para ter condições de produzir.
São espécies do penhor convencional especial:
a) Rural: pecuário ou agrícola
b) Industrial e Mercantil
c) Direitos e títulos de crédito
d) Veículos

2.3.1. Penhor rural

a) Requer forma escrita – instrumento público ou particular + registro no Cartório de Registro de


Imóveis (art. 1.438)
O instrumento público ou particular tem que ser registrado no RGI onde está localizada a
propriedade rural na qual será desenvolvida a atividade agrícola ou pecuária.
b) Pode gerar cédula rural pignoratícia (caso o pagamento seja prometido em dinheiro)
As cédulas rurais pignoratícias são títulos que demonstram a existência do penhor, caso o
pagamento seja prometido em dinheiro. Elas funcionam como títulos de crédito.
c) Não podem ser convencionados por prazos superiores aos das obrigações garantidas
O prazo do penhor é o prazo para o pagamento da obrigação principal. O penhor sem pre
tem que ter o prazo máximo coincidente com o prazo da obrigação principal.
d) Prorrogação deve ser averbada na margem do registro (art. 1.439, §2º)
Qualquer prorrogação tem que ser averbada no RGI.
e) Prédio já hipotecado não impede penhor rural, mas preferência é do hipotecante (art. 1.440)
f) Bens não são entregues ao credor, mas este tem direito de conferência (art. 1.441, CC)
O credor pode fiscalizar a existência e a integridade dos bens a qualquer tempo.

O penhor rural é o gênero que possui duas espécies:

a) Penhor agrícola
– Art. 1.441 a 1.443, CC

46
– Lei 2666/55; Decreto-lei 492/37
O penhor agrícola refere-se à própria plantação, bem como ao bens utilizados para
a produção agrícola, os chamados acessórios.
Para ser considerado penhor agrícola, tem-se como objeto os acessórios e as próprias
culturas (cultivos, plantações).
A legislação que trata do penhor agrícola, permite que se dê bens móveis e imóveis em
garantia, aqueles que são imóveis por acessão artificial, ou seja, aqueles em houve uma acessão
por ação humana (por exemplo, plantação, construção). Logo, penhor não é sempre de bem
móvel, há exceções nas formas especiais de penhor.

b) Penhor pecuário
– Art. 1.444 a 1.446, CC
– Lei 494/37; Lei 6.015/73; Decreto-lei 167/67
– Objeto: animais que integram a atividade pastoril, agrícola ou de laticínios.
O penhor pecuário envolve os instrumentos utilizados para o exercício da atividade
pecuária, bem como os animais que integram a atividade pecuária.

2.3.2. Penhor industrial e mercantil

O penhor industrial e mercantil:


a) Não exige a tradição
Não há tradição, porque o bem continua com o devedor.
b) Tem como função: incentivar o crédito para a indústria e o comércio
c) Emissão de cédula
d) Registro no CRI

a) Penhor industrial
– Art. 1.447, CC; Decreto-lei 1.721/39; Decreto-lei 3.169/41; Decreto-lei 1.697/39
– Máquinas e equipamentos
– Registro em CRI
O penhor industrial pode incidir sobre todo o maquinário e sobre os equipamentos
que são utilizados para atividade industrial.

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b) Penhor mercantil
– Art. 1.448, CC; Decreto-lei 1.102/1903; Lei 24.427/34
– Estoques e equipamentos
– Registro em CRI
O penhor mercantil refere-se à atividade comercial e pode incidir sobre os estoques e
equipamentos usados na atividade comercial.

2.3.3. Penhor de direitos e títulos de crédito

Encontra-se nos art. 1.451 a 1.460, CC e possui previsão na Lei 6.404/76; no art. 19, do
Decreto-lei 2.063/40; e no art. 13, do Decreto-lei 36/66
O penhor de direitos e títulos de créditos deve ser registrado no Cartório de Títulos e
Documentos.
Ele possui como objeto: as coisas móveis passíveis de cessão (direitos autorais,
hereditários, patente, ações, etc.) e títulos de crédito (cheque, nota promissória, etc.).

2.3.4. Penhor de veículos

O penhor de veículos encontra-se previsto do art. 1.461 ao 1.466, CC. Ele é cabível
apenas para veículos utilizados para prática comercial. Trata-se de veículos empregados em
qualquer espécie de transporte ou condução.
O penhor de veículos é feito por meio de instrumento público ou particular, que tem que
ser levado para registro no cartório de títulos. Além disso, deve ser realizada a anotação no
certificado de propriedade, o que é feito no DETRAN.
O prazo máximo do penhor de veículos é de 2 anos (prorrogáveis por igual período),
conforme disposição do art. 1.466, CC, sendo admitida no máximo uma prorrogação.
Como a utilização do veículo pode gerar algum dano é necessário a realização de seguro
de furto, avaria, perecimento e danos a terceiros (art. 1.463, CC)

3. Hipoteca

A hipoteca é o direito real de garantia sobre coisa alheia que recai sobre bens imóveis,
como regra, em que não há a transmissão da posse da coisa entre as partes.

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Ela tem basicamente como objeto bens imóveis, mas também pode ter como objeto bens
móveis como navios e aeronaves. Quanto as navios, o registro é feito no Cartório de Registro
Marítimo (Decreto-lei 22.826/33 e Lei 9.774/1998). Já as aeronaves são resgistradas no Cartório
de Imóveis, em regra, no cartório do lugar em que ela foi fabricada, se for aeronave fabricada no
exterior, realiza-se o registro no local onde ela primeiro pousou no Brasil. Observa-se que ocorre
essa preferência de utilizar a hipoteca e, não o penhor, no caso de navios e aeronaves, porque, na
hipoteca, não se transfere a posse direta ao credor hipotecário.
De acordo com o art. 1.473, CC, podem ser objeto de hipoteca:

I - os imóveis e os acessórios dos imóveis conjuntamente com eles;


II - o domínio direto;
III - o domínio útil;
IV - as estradas de ferro;
V - os recursos naturais a que se refere o art. 1.230, independentemente do solo
onde se acham;
VI - os navios;
VII - as aeronaves.
VIII - o direito de uso especial para fins de moradia;
IX - o direito real de uso; (limitado à duração do direito real de uso)
X - a propriedade superficiária. (limitado à duração da superfície)

Também podem ser objeto da hipoteca as acessões, melhoramentos ou construções do


imóvel.
A hipoteca tem natureza civil, ou seja, ela é feita para bens particulares. Ademais, ela não
implica na transmissão da posse ao credor.
São partes da relação hipotecária o credor hipotecário e o devedor hipotecante

A hipoteca possui as seguintes características:

a) Indivisível (art. 1.488, CC)


Só há o levantamento da hipoteca quando há o pagamento total.
É importante observar que existe a possibilidade de ocorrer o desmembramento de um
bem dado em garantia. Por exemplo, quando um imóvel de grande extensão com número de
matrícula registrado é hipotecado e, posteriormente, é desmembrado em várias unidades
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autônomas que passam a ter matrículas próprias. Nesse caso, a despeito de a hipoteca ser
indivisível, a lei autoriza que a hipoteca seja registrada em fração ideal em cada uma dessas
matrículas novas. Todavia, essa hipoteca só será levantada, quando for pago o seu valor total.
Esse desmembramento pode gerar problemas no caso de vendas de imóveis por
construtoras. Exemplificando, se um indivíduo comprou um apartamento de uma construtora que
hipotecou toda a construção, o referido apartamento possui uma fração ideal dessa hipoteca.
Logo, se a construtora não pagar a hipoteca, a instituição financeira em tese tem o direito de
alienar judicialmente toda a construção (o que inclui todos os apartamentos). Todavia, o STJ
reconheceu a prevalência do direito do consumidor de boa-fé sobre a hipoteca. Assim, a
instituição financeira deve tentar ressacir seus danos diretamente com a construtora ou, caso
ainda haja parcelas sendo pagas pelos adquirentes das unidades autônomas, o juiz pode
determinar que as parcelas remanescentes sejam pagas para a instituição financeira e não para a
construtora.

b) Acessório
O bem principal é o imóvel, se o imóvel for vendido, a hipoteca segue junto com ele.
Aplica-se o princípio da gravitação jurídica, que dispõe que o acessório segue o principal.
Quem compra um imóvel hipotecado tem que estar ciente que a hipoteca gera o direito de
sequela, ou seja, se hipoteca não for paga, o credor hipotecário pode executá-la e pode exigir o
bem para alienação judicial (excussão), em regra, e, excepcionalmente para alienação direta
(extrajudicial). A alienação direta pode decorrer de lei ou de acordo entre as partes.

c) Convencional ou determinada por lei

d) Especificada (requisito)

e) Por escritura pública (requisito)

f) Publicidade (requisito)
A publicidade é dada por meio de registro. Exceção: para imóveis financiados pelo
Sistema Financeiro de Habitação (SFH), em que o credor hipotecário é uma instituição
financeira, para validade dessa hipoteca, a lei dispensa o RGI. O simples contrato por si só já
vale.

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g) Prazo máximo de 30 anos (art. 1.485, CC)
A lei determina que o prazo máximo da hipoteca é de 30 anos. Terminado este prazo, a
garantia deixa de existir, mas a dívida continua. Tem que se renovar a hipoteca.

Em relação aos seus efeitos, pode-se ressaltar:

a) O devedor não pode praticar atos que desvalorizem a coisa.


O devedor, que está na posse do bem, não pode praticar qualquer ato que desvalorize o
bem. Quando ocorre a desvalorização da coisa, diminui-se o valor da garantia, o que pode
ensejar a extinção da referida garantia.

b) Pode haver proibição de sub-hipotecas


É possível existir mais de uma hipoteca sobre o mesmo bem. As hipotecas estarão
registradas na matrícula do imóvel em ordem sucessiva. Em geral, o limite é o valor do bem.
Caso um imóvel possua, por exemplo, duas hipotecas, a segunda hipoteca só poderá ser
executada se a primeira já estiver vencida e tiver sido executada, ou seja, há prevalência da
primeira hipoteca registrada.
Ressalta-se que o credor hipotecário pode proibir que sejam feitas outras hipotecas sobre
o mesmo bem, porém, isso tem que estar previsto no contrato.
Pode ocorrer de o credor da segunda hipoteca levar a sua hipoteca para registro antes do
credor da primeira hipoteca. Nesse caso, quando há hipotecas secundárias que são levadas para
registro antes da hipoteca anterior, a lei prevê que o cartorário pode segurar por 30 dias para
fazer prenotação (art. 1.495, CC), a fim de possibilitar que o primeiro credor hipotecário faça o
registro, visto que quem registra primeiro tem prioridade. Se em 30 dias a primeira não for
registrada, a segunda será registrada primeiramente.
Após o vencimento da dívida, o credor hipotecário pode pedir a alienação do bem, só que
se houver alguma hipoteca anterior, tem que esperar aquela hipoteca estar vencida. Se ela já
estiver vencida e o credor não tiver tomado nenhuma providência, o segundo credor hipotecário
pode notificar o primeiro para que ele tome os procedimentos para alienação. Se o primeiro
credor hipotecário permanecer inerte, o segundo pode assumir a alienação, de modo a entrar com
o processo de alienação, porém, quando for vendido quem recebe primeiro é o primeiro credor
hipotecário.
Ressalta-se que quando há alienação de um bem hipotecado pelo credor que tem

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prevalência, a lei exige que os outros credores hipotecários sejam notificados, pois estes podem
pedir a substituição da garantia ou a reserva do valor da alienação se houver sobrado, por
exemplo. Importante lembrar que o caso de não substituição da garantia enseja vencimento
antecipado da dívida.
Além disso, o segundo credor hipotecário pode pagar o valor da primeira hipoteca,
ficando com o direito de alienar o bem, ou seja, ele sub-roga-se nos direitos do primeiro credor
hipotecário.
A ordem de vencimento encontra-se no art. 1.477, CC, e a sub-rogação está prevista no
art. 1.478, CC.

c) Não impede a alienação do imóvel (nulidade, art. 1.475, CC)


De acordo com o art. 1.475, CC, é vedado cláusula que impeça a venda do bem
hipotecado, ou seja, qualquer cláusula no contrato de hipoteca que proíba a alienação é
nula.
Em relação àquele que adquiriu o imóvel hipotecado, é possível que ele abandone o bem
caso não tenha mais interesse. O abandono do imóvel pelo adquirente possui previsão nos art.
1.479 e 1.480, CC. Destaca-se que o prazo para abandonar o imóvel é de 24 horas e que o
adquirente tem direito de regresso contra o antigo proprietário.

Quanto às modalidades, a hipoteca classifica-se em:

a) Convencional
É aquela acordada entre as partes.

b) Legal
A hipoteca é constituída por hipóteses previstas em lei.

Art. 1.489. A lei confere hipoteca:


I - às pessoas de direito público interno (art. 41) sobre os imóveis pertencentes
aos encarregados da cobrança, guarda ou administração dos respectivos fundos
e rendas;

Essa hipótese está em desuso, pois não há mais a figura dos coletores de impostos. Como

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eles recebiam um valor muito grande de impostos, o Estado hipotecava os bens desses coletores,
a fim de evitar o desvio desses valores recebidos pelos coletores.

II - aos filhos, sobre os imóveis do pai ou da mãe que passar a outras núpcias,
antes de fazer o inventário do casal anterior;

Existe independentemente de registro.

III - ao ofendido, ou aos seus herdeiros, sobre os imóveis do delinqüente, para


satisfação do dano causado pelo delito e pagamento das despesas judiciais;
IV - ao co-herdeiro, para garantia do seu quinhão ou torna da partilha, sobre o
imóvel adjudicado ao herdeiro reponente;
V - ao credor sobre o imóvel arrematado, para garantia do pagamento do
restante do preço da arrematação.

Para dar oponibilidade erga omnes, a hipoteca requer registro. Porém, o registro não é
requisito de existência dessas hipotecas legais. Além disso, a garantia pode ser substituída (art.
1.490 e 1.491, CC).

c) Judicial (art. 495, CPC)


O juiz pode autorizar a hipoteca quando há uma sentença transitada em julgado sem valor
líquido. O pedido de penhora só pode ser feito quando há um valor líquido, todavia, a partir do
momento que se tem uma sentença transitada em julgado e ela é ilíquida, o credor pode pedir a
hipoteca desses bens para que eles fiquem em garantia.

Art. 495. A decisão que condenar o réu ao pagamento de prestação consistente


em dinheiro e a que determinar a conversão de prestação de fazer, de não fazer
ou de dar coisa em prestação pecuniária valerão como título constitutivo de
hipoteca judiciária.
§ 1o A decisão produz a hipoteca judiciária:
I - embora a condenação seja genérica;
II - ainda que o credor possa promover o cumprimento provisório da sentença
ou esteja pendente arresto sobre bem do devedor;
III - mesmo que impugnada por recurso dotado de efeito suspensivo.
§ 2o A hipoteca judiciária poderá ser realizada mediante apresentação de cópia
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da sentença perante o cartório de registro imobiliário, independentemente de
ordem judicial, de declaração expressa do juiz ou de demonstração de urgência.
§ 3o No prazo de até 15 (quinze) dias da data de realização da hipoteca, a parte
informá-la-á ao juízo da causa, que determinará a intimação da outra parte para
que tome ciência do ato.
§ 4o A hipoteca judiciária, uma vez constituída, implicará, para o credor
hipotecário, o direito de preferência, quanto ao pagamento, em relação a outros
credores, observada a prioridade no registro.
§ 5o Sobrevindo a reforma ou a invalidação da decisão que impôs o pagamento
de quantia, a parte responderá, independentemente de culpa, pelos danos que a
outra parte tiver sofrido em razão da constituição da garantia, devendo o valor
da indenização ser liquidado e executado nos próprios autos.

3.1. Hipoteca de vias férreas

As vias férreas são consideradas bem imóvel e podem ser dadas em garantia. A hipoteca
de vias férreas possui duas peculiaridades. A primeira relaciona-se com o registro, o qual inclui
os trilhos e todos os materais de uso. A hipoteca pode ser feita no Cartório do início da linha ou
pode ser feito o registro em cada uma das estações intermediárias, ou seja, pode ser feito por
ramais.
A hipoteca será circunscrita às linhas especificadas na escritura, bem como ao respectivo
material e exploração, no estado em que se encontrarem ao tempo de execução.
A segunda peculiaridade é que a lei exige a comunicação à União ou ao Estado de que a
hipoteca será executada, porque a União e o Estado tem a preferência para a aquisição da
referida linha férrea.

Art. 1.505. Na execução das hipotecas será intimado o representante da União


ou do Estado, para, dentro em quinze dias, remir a estrada de ferro hipotecada,
pagando o preço da arrematação ou da adjudicação.

3.2. Extinção da hipoteca

Art. 1.499. A hipoteca extingue-se:


I - pela extinção da obrigação principal;
II - pelo perecimento da coisa;
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III - pela resolução da propriedade;
IV - pela renúncia do credor;
V - pela remição (pagamento);
VI - pela arrematação ou adjudicação.
Art. 1.500. Extingue-se ainda a hipoteca com a averbação, no Registro de
Imóveis, do cancelamento do registro, à vista da respectiva prova.
Art. 1.501. Não extinguirá a hipoteca, devidamente registrada, a arrematação ou
adjudicação, sem que tenham sido notificados judicialmente os respectivos
credores hipotecários, que não forem de qualquer modo partes na execução.

3.3. Formas de excussão

a) Judicial
A judicial é consequência de um cumprimento de sentença. Ocorre a execução
hipotecária.

b) Extrajudicial
Encontra-se no Decreto-lei 70/66 e refere-se à autorização de o agente financeiro alienar
o bem, sem a necessidade de ajuizamento de uma ação judicial.
– Garantia celebrada com agente financeiro ou SFH
– Praticada por leiloeiros particulares, credenciados na Junta e autorizados pelos credores
– Banco (cerca de 50-60% do valor do bem)
– Rito:
a) Credor comunica o agente fiduciário
b) Agente notifica o devedor em 10 dias para purgar a mora, tendo o devedor o prazo de 20 dias
para fazer o pagamento
c) Não purgada a mora, o agente realiza leilão público em 15 dias do 1º edital
Assim, se em 20 dias não for realizado o pagamento, o agente fiduciario tem autorização
para realizar o leilão do bem.

4. Anticrese (art. 1.506 a 1.510, CC)

Anticrese é a modalidade de garantia real que recai sobre bem imóvel, cuja posse é
transmitida ao credor, para que perceba frutos e quaisquer outros rendimentos da coisa,
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em compensação da dívida.
Na anticrese, não se dá em garantia a propriedade do imóvel, dá-se em garantia os frutos
e os rendimentos do imóvel. Anticrese significa uso contrário da coisa.
São partes o credor anticrético (art. 1.508, CC) e o devedor anticrético.
Para se instituir a anticrese é necessário fazer escritura e levá-la para registro no RI.
Os efeitos da anticrese encontram-se no art. 1.509, CC:

Art. 1.509. O credor anticrético pode vindicar os seus direitos contra o


adquirente dos bens, os credores quirografários e os hipotecários posteriores ao
registro da anticrese.

Na anticrese, em caso de não pagamento, não se pode levar o imóvel para alienação. O
credor anticrético tem o direito de levar o imóvel para exploração.
Há muitas críticas em relação à anticrese, visto que nela a garantia é menor e que há
necesidade de registro tanto para constituir como para extinguir a anticrese, o que dificulta o seu
cancelamento.
Quanto à sua extinção, ocorre:
– Quando há satisfação da dívida (art. 1.510, CC)
– Com prazo determinado (art. 1.423, CC)
A anticree também se extingue quando termina o prazo determinado no contrato.
Ressalta-se que a anticrese possui o prazo máximo de 15 anos e que pode ser renovada, porém,
nesse caso, tem que ser feito outro registro.

V. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA

1. Alienação fiduciária em garantia (trust/enajenación fiduciaria/fideicomisso)

Na alienação fiduciária, o bem que se apresenta é transferido para a instituição financeira,


que fica com a propriedade. Ela passa a ser proprietária do bem por um prazo determinado.
Trata-se de uma propriedade resolúvel porque ela possui uma condição para o seu término: o
adimplemento da obrigação. Se não houver pagamento, ajuiza-se uma ação de busca e
apreensão, porque o banco já é proprietário, o que torna o procedimento mais célere. Se não for
purgada a mora, o banco pode levar a leilão extrajudicial.

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A alienação fiduciária é uma forma muito semelhante de garantia, embora ela não seja
tecnicamente uma garantia, pois há a transferência da propriedade do bem para o credor, a qual,
constitui-se como uma propriedade resolúvel, visto que ela se extingue com o pagamento da
dívida. Ela não é uma garantia propriamente dita porque ela é uma garantia sobre coisa própria.
Não é uma garantia sobre coisa alheia.
Pode se definir a alienação fiduciária em garantia como o negócio jurídico pelo qual o
devedor fiduciante aliena o bem adquirido a um terceiro, o credor fiduciário, que paga o
preço ao alienante originário. Constata-se que o credor fiduciário é o proprietário da coisa,
tendo, ainda, um direito real sobre a coisa que lhe é própria. Com o pagamento de todos
todos os valores devidos, o devedor fiduciante adquire a propriedade, o que traz a
conclusão de que a propriedade do credor fiduciário é resolúvel.
Quanto à sua natureza jurídica, trata-se de um direito real de garantia sobre coisa
própria, que pode ser um bem móvel ou imóvel. A propriedade fiduciária é modalidade de
propriedade resolúvel.

2. Legislação de Regência

a) Regras gerais: art. 1361 a 1.368-B (propriedade fiduciária) mais capítulo I do título X do
Livro III da Parte Especial (disposições gerais de hipoteca, penhor e anticrese)

Art. 1.361. Considera-se fiduciária a propriedade resolúvel de coisa móvel


infungível que o devedor, com escopo de garantia, transfere ao credor.

b) Bens móveis: Lei 4.278/65 (Lei de Mercado de Capitais), art. 66-B

c) Bens imóveis: Lei 9.541/97

d) Aspectos processuais: Decreto-lei 911/69 (alteração pela Lei 13.043/2014)


O procedimento da alienação funciona basicamente da seguinte forma: o indivíduo vai a
uma agência financeira (ou outra pessoa jurídica) que faz a contratação da alienação. Em
seguida, essa alienação é registrada no RI (se for bem imóvel) ou no Cartório de Títulos e
Documentos (se for bem móvel) ou no Certificado do Veículo (se for veículo). Caso haja o
pagamento das prestações, a propriedade volta para o fiduciante. Caso não sejam pagas as

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prestações, ocorre a cobrança e a execução. Basta comunicar a dívida, visto que a mora já existe
a partir do momento do não pagamento. Não há necessidade de protesto.
No caso de bens imóveis, a lei abre a possibilidade de se purgar a mora em 15 dias. No
caso de bens móveis, entra-se com a ação de busca e apreensão para localizar o bem e ter a posse
direta do bem. Quando recebe a notificação de busca e apreensão, o devedor tem até 5 dias para
purgar a mora.
O devedor tem que pagar o valor da dívida que é apresentada pela instituição financeira.
Se ele não consegue pagar o valor da mora, a lei ainda concede um prazo de 15 dias para
apresentar defesa.
A purgação da mora visa a assegurar que esse bem não será alienado.
Se a busca e a apreensão for indevida, a lei prevê que o juiz aplicará uma multa de 50%
do valor financiado acrescido de perdas e danos.
Por fim, ressalta-se que a ação revisional não obsta a busca e a apreensão do bem.

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