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1. Agradecemos
aos beiradeiros de
Montanha e Mangabal
e aos Munduruku de
Sawre Muybu pela
hospitalidade, ajuda
A
e ensinamentos.
Agradecemos a
arqueologia é, por natureza, ao longo do trecho encachoeirado Francisco Noelli,
Fernando Almeida e
um dos campos de investiga- do rio Tapajós e seus tributários,
Francisco Pugliese pelas
ção mais profícuos para estu- como os rios Rato e Jamanxim, e cuidadosas leituras,
darmos o passado, particularmente seus formadores, os rios Juruena sugestões e críticas.
Erros são de nossa
de sociedades ágrafas; no Brasil, ela e Teles Pires, a partir dos registros responsabilidade.
também nos fornece indícios para existentes2. Além da arqueologia, Agradecemos à
Coordenação de
contemplar interações de diversos fontes históricas e a memória oral
Aperfeiçoamento
tipos entre sociedades ameríndias nos informam sobre o passado – fre- de Pessoal de Nível
e as maneiras como esses povos al- quentemente turbulento – da bacia Superior (Capes) por
apoiar a pesquisa
teraram a paisagem, imbuindo-a de do Tapajós após a conquista portu- doutoral de Bruna
significados e tornando o ambiente guesa (Menéndez, 1981/1982, 2006 Cigaran da Rocha.
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3. Ver, por exemplo, drelétrico do Tapajós (CHT) – e con- povoamento ameríndio das áreas
Abdala (2012), em que
trastando com a ideia promovida de interflúvio na bacia. Antigas ocu-
Maurício Tolmasquin,
presidente da Empresa pelo discurso oficial, de que a área pações ceramistas foram identifica-
de Pesquisa Energética em questão é vazia e sem história3 –, das em Parauá, uma área de terra
(EPE), defende o
conceito de usinas-
apresentamos aqui evidências que firme localizada a oeste da margem
plataforma para o apontam para a riqueza e a singula- esquerda do baixo curso do rio (Go-
Tapajós como uma
ridade do patrimônio arqueológico mes, 2008). Isso chama a atenção
alternativa verde para a
área, “onde não há ali existente. Longe de se situarem ao fato de que, além dos vestígios
ocupação humana. em uma floresta virgem, o Tapajós de ocupações ao longo da calha
‘Praticamente
não tem impacto e seus afluentes banham uma área dos rios, existem centenas de sítios
ambiental porque vai antropizada há milhares de anos. arqueológicos nas áreas de terra
se reflorestar tudo
As pesquisas arqueológicas no firme, algo que também tem sido
em volta e vai ficar a
hidrelétrica no meio da rio Tapajós têm se concentrado no comprovado a leste do rio Tapajós
floresta. A ideia é não baixo curso do rio (e.g. Gomes, 2001; (Martins, 2012; Stenborg et al. 2012;
ter cidades em volta.
Temos que criar essas Guapindaia, 1993; Kroeber, 1942; Perota, 1979, 1982).
inovações para usar MacDonald, 1972; Palmatary, 1960;
nossos recursos’, disse”
(grifo nosso).
Roosevelt et al., 1991); artefatos cerâ- Primeiros habitantes
micos típicos da área hoje se encon- Os primeiros grupos humanos na
tram espalhados em museus do Bra- região viveram em um ambiente
4. O etnólogo, linguista sil e exterior4. Em parte, isso se deve mais semelhante às matas de cerra-
e arqueólogo Curt
à maior facilidade de acesso ao baixo do atuais que à floresta amazônica
Nimuendajú (1953,
2004) foi o primeiro Tapajós, que é facilmente navegável. (Rossetti et al., 2004). Esses grupos
a compreender a Todavia, lembramos a observação de nômades, de tamanho reduzido,
magnitude dos
sítios arqueológicos Almeida, segundo o qual, iniciaram processos de modificação
depositados no do ambiente com o uso do fogo e
local e adjacências,
As cachoeiras são áreas-chave para geraram “ilhas de recursos”, fei-
e relacioná-los com
os Tapajó, que então a compreensão do período pré-co- ções fitogeográficas resultantes de
dominavam boa parte lonial da Amazônia. Tratam-se de restos vegetais e de sementes con-
da região.
lugares que durante milênios foram centradas em seus acampamentos e
ocupados de maneira persistente trilhas, a exemplo do que foi veri-
por grupos indígenas, que transfor- ficado entre os caçadores-coletores
maram tais lugares (entre outros) Nukak, na Amazônia colombiana
em entroncamentos de redes de (Politis, 1996).
contato (2013: 354). É possível que tenham sido es-
ses primeiros habitantes que nos
Nesse sentido, há ainda dados legaram a arte rupestre encontra-
que apontam para a antiguidade do da no Tapajós, em seus afluentes e
Fontes históricas
Devido ao embargo à navegação do
rio Tapajós pela Coroa portuguesa
até meados do século XVIII – sendo
que, pelo Tratado de Tordesilhas,
boa parte do curso do rio ainda per-
Imagens 3 e 4. Amazônia no período pós-conquista tencia à Espanha –, possuímos pou-
Aquarelas do pintor
francês Hércules
(Posey, 1987). As enfermidades fo- cos registros escritos para a região15
Florence retratando ram facilmente propagadas através anteriores ao Tratado de Madri, assi-
índios Munduruku
das antigas rotas comerciais ame- nado em 1750, que deslocou as fron-
em 1828. Fonte: Centro
Cultural Banco do Brasil ríndias (Myers, 1988). teiras luso-castelhanas para o oeste.
(2010). Situados próximo à margem di- Isso resultou em um desconheci-
reita do rio Amazonas, entre os rios mento quase total acerca dos povos
15. Uma das exceções Tapajós e Madeira, os Tupinambá – ameríndios que até então viviam
notáveis é a “Relação”
que até então se encontravam em na região. Com a instalação do Di-
de Jacinto de Carvalho,
de 1719 (apud Porro, pleno processo de expansão – dei- retório Pombalino, as fontes escri-
2012). xaram de ser referidos como etnia tas passaram a ser produzidas pri-
já em 1690 (Menéndez, 1981/1982). meiramente por administradores
Os Tapajó encontrariam destino ou militares (Porro, 2006); mesmo