SEDUFSM JORNAL DA

Publicação mensal da Seção Sindical dos Docentes da UFSM / ANDES - Outubro a Dezembro de 2018 ISSN 2177-9988

Após um pleito presidencial povoado de mentiras e

polêmicas, o meio de campo começa a ser limpo e, agora, já
é possível ter mais clareza sobre o real projeto de Jair
Bolsonaro para o Brasil. Infelizmente a previsão é de que o
novo governo eleito deva realmente tentar levar a cabo um
projeto contingenciado, produtivista e antidemocrático de
universidade. Especial, págs. 4 e 5.

IVAN LAUTERT

20 anos de ações
afirmativas na UFSM
Cerca de 4 mil estudantes autodeclarados
pretos e pardos ingressaram na UFSM desde
2008, via ações afirmativas. Educação,
pág. 7.

Ainda nesta edição:

Professora coordena projeto que visa garantir segurança
alimentar às crianças que não recebem leite materno.
Perfil, pág. 8

Dicas para incentivar o gosto pela leitura nos pequenos.

Cultura, pág. 8

ACO M PAN H E A SED U FSM N A IN TERN ET

w w w . se d u fsm . o rg . b r tw itte r. co m / se d u fsm fa cebook.com / sedufsm

 02 OUTUBRO A DEZEMBRO DE 2018 Publicação da Seção Sindical dos Docentes da UFSM / ANDES

PAINEL

Escola sem Mordaça é JURÍDICO

derrubada na Câmara
O movimento sindical e estudantil pode dar um respiro neste final de ano. O projeto de lei (PL) nº 7180/14, conhecido

Sedufsm apoia
como 'Escola sem Partido', só pode voltar à pauta em 1º de fevereiro de 2019, quando a nova legislatura é empossada
na Câmara dos Deputados. O enterro (por ora) do projeto considerado pela oposição como uma mordaça na boca dos
professores foi efetivado pelo presidente da comissão especial que analisa o tema na Câmara, Marcos Rogério (DEM-
RO). A decisão foi tomada por ele devido à falta de quórum e à agenda apertada de final de ano, mas não deve ser
desprezado o poder de mobilização de sindicatos, movimentos e partidos de esquerda durante todo o tempo em que o docentes
investigados
projeto esteve em discussão

ANDES-SN orienta docentes contra agressões

Diante do cenário atual, em que professores (as)
vêm sendo agredidos moral e, em alguns casos, até
fisicamente, o ANDES-SN publicou, em suas redes
sociais, uma série de orientações aos (às) professores
(as) que se sentirem em risco. Veja alguns dos
principais pontos:
1 – Em caso de ameaça física ou verbal direta
e/ou por meios de comunicação impressa e/ou
eletrônica, registre fotografando,
filmando, gravando e salvando
documentos, se possível na
presença de testemunhas;
2 – A entrada de pessoas
estranhas na sala de aula
somente pode ocorrer com
autorização do (a) professor (a);
3 – Acaso ocorra o ingresso de
pessoas não autorizadas em sala de
aula, chame imediatamente a
coordenação imediata de sua
instituição de ensino e informe
oficialmente, por escrito, à direção da instituição de
ensino;
4 – A utilização de celular e/ou outro equipamento
que permita a gravação em sala de aula somente
poderá ocorrer com autorização do (a) professor (a).
Caso a gravação ocorra sem esse consentimento,
sendo utilizada para outros fins, isso pode ensejar
medidas judiciais cíveis e criminais contra o (a) autor
(a) das ameaças e/ou ofensas. Importante: Faça
prova do fato e procure a assessoria jurídica de sua
seção sindical para orientação imediatamente.
Sugerimos que já seja explicitado no programa do
em PAD
curso, entregue no início do semestre, a proibição Professores da UFSM que integravam o
para gravar e fotografar as aulas; Conselho Universitário (Consu) entre mea-
5 – Denuncie sempre qualquer tipo de ameaça, dos de 2005/2006 e votaram favoravelmente
inclusive para a mídia que a está divulgando e para a ao reenquadramento de técnico-administra-
sua instituição de ensino. A maioria das mídias tivos aposentados no plano de carreira
impressas e eletrônicas dispõe de mecanismos para (PCCTAE) implementado à época estão
realizar denúncias; sendo investigados em Processo Adminis-
6 – Não aja sozinho, procure
trativo Disciplinar (PAD). O objetivo do voto
preferencialmente o apoio jurí-
favorável dos então conselheiros era não
dico de sua seção sindical e/ou de
instituições públicas e/ou privadas cometer injustiças com os servidores apo-
de defesa dos direitos do/a sentados, que decairiam na carreira, caso
cidadão/a, como o Ministério Públi- não fossem realocados.
co, Defensoria Pública, Ordem dos A Sedufsm tem se reunido com os profes-
Advogados do Brasil e outras no seu sores afetados pelo PAD para prestar amparo
estado; político e jurídico. Segundo o assessor jurídi-
7 – Cuidado com modelos de co do sindicato, Héverton Padilha, o pro-
petições que circulam na internet e cesso está em fase de instrução, na qual são
no whatsapp. Antes de tomar anexados documentos e informações, não
qualquer medida, procure a
havendo ainda definição de prazos para que
assessoria jurídica da sua seção sindical;
os docentes notificados iniciem seus depoi-
8 – Caso seja necessário ir à delegacia de polícia
para registro de boletim de ocorrência, vá sempre mentos.
acompanhado, preferencialmente de um (a) advo- Para o presidente da Sedufsm, professor
gado (a); Júlio Quevedo, a comissão do PAD, formada
9 – Cuidado com as fake news, elas ajudam a por dois membros da UFSM e um membro do
disseminar o pânico. Caso receba alguma mensagem, Ministério da Educação, fere a autonomia
cheque a confiabilidade da fonte e a veracidade da universitária e traz insegurança aos atuais e
informação antes de repassar. Caso não consiga essa futuros conselheiros, passíveis de serem
confirmação, encaminhe para o conhecimento de sua investigados por seus posicionamentos nes-
seção sindical e não envie adiante. ta instância.
Durante a reunião, alguns dos docentes,

Santa Maria tem Frente ex-conselheiros, aproveitaram para desaba-

BRUNA HOMRICH

far. Há preocupação sobre o futuro dos con-

Única contra retrocessos selhos superiores, tendo em vista que essa

investigação parece cercear a autonomia dos
Coletivos, sindicatos e demais entidades do movimento social vêm se membros do Consu. “Qual a segurança para
organizando em uma Frente Única de mobilização em Santa Maria. O atuar nos conselhos daqui por diante”, ques-
objetivo é elaborar ações coesas para enfrentar os projetos já em curso e
tionou um professor. Uma das ex-integrantes
aqueles possivelmente encabeçados pelo governo Bolsonaro a partir de
do Consu argumentou que estão sendo
2019, e em cuja essência está a retirada de direitos sociais e trabalhistas.
investigados apenas os que votaram a favor
Primeira reunião da Frente, em 6 de novembro.
do reenquadramento, ou seja, para ela, o
que está em jogo é a “qualidade do voto”.
Sindicato tem A Sedufsm estabeleceu parceria com o plano de saúde
'Agemed', de forma que agora os (as) docentes sindicalizados (as)
Todos os professores que tenham seus

novo plano podem escolher entre a já conhecida 'Unimed' e o novo plano. Mais nomes incluídos no PAD podem buscar a
informações podem ser buscadas no site www.agemed.com.br ou Sedufsm e sua assessoria jurídica para obter
de saúde no fone (055) 3033.8333. informações.

EXPEDIENTE
A diretoria da SEDUFSM é composta por: Presidente: Júlio Ricardo Quevedo dos Santos; Vice-Presidente: João Carlos Gilli Martins; Secretária-Geral: Maristela da Silva Souza; Primeira
Secretária: Leila Regina Wolff; Tesoureiro-Geral: Gihad Mohamad; Primeiro Tesoureiro: Carlos Alberto da Fonseca Pires; Primeira Suplente: Valeska Fortes de Oliveira; Segunda
Suplente: Adriana Graciela Desire Zecca; Terceira Suplente: Roselene Moreira Gomes Pommer.
Jornalista responsável: Bruna Homrich Vasconcellos (MTb nº 17487) Equipe jornalismo: Fritz R. Nunes, Ivan Lautert e Rafael Balbueno
Equipe de Relações Públicas: Fernanda Brusius e Vilma Ochoa Demais funcionários: Dirleia Balensiefer, Maria Helena Ravazzi, Paulo Marafiga e Rossana Siega
Diagramação e projeto gráfico: J. Adams Propaganda Ilustração: Rafael Balbueno Impressão: Gráfica Pale, Vera Cruz (RS). Tiragem: 1.500 exemplares.
Obs: As opiniões contidas neste jornal são da inteira responsabilidade de quem as assina. Sugestões, críticas e opiniões podem ser enviadas via fone (55) 3222-5765 ou pelo email
sedufsm@terra.com.br
Informações também podem ser buscadas no site do sindicato: www.sedufsm.org.br A SEDUFSM funciona na André Marques, 665, cep 97010-041, em Santa Maria (RS).
 Publicação da Seção Sindical dos Docentes da UFSM / ANDES OUTUBRO A DEZEMBRO DE 2018 03

SEDUFSM
Fotos: RAFAEL BALBUENO

Sindicato visita unidades

com debate sobre assédio
Durante o mês de outubro, a Sedufsm promoveu
uma série de debates sobre assédio. No dia 17 de
outubro, data que marca o combate ao assédio moral
e sexual no país, o vice-presidente do sindicato, João
Gilli Martins, acompanhado do assessor jurídico da
entidade, Heverton Padilha, e do professor aposen-
tado da UFPR e ex-dirigente do ANDES-SN, João
Negrão, deslocou-se até os campi da UFSM em Frede-
rico Westphalen e Palmeira das Missões. No dia 18, a
atividade foi realizada no campus de Santa Maria.
Segundo Padilha, uma pessoa é vítima de assédio
quando se torna alvo de práticas repetidas e
reiteradas de constrangimento e violência (mesmo a
simbólica). Embora possa ocorrer em todos os
âmbitos da vida, o assessor jurídico enfatizou a
problemática do assédio no ambiente de trabalho,
visto que denúncias desta natureza são comuns entre
a categoria docente.
Se o assédio sexual é reprimido por uma legislação
específica, o mesmo não ocorre com o assédio
moral, carente de leis que o barrem e criminalizem.
Contudo, o fato de não haver lei específica sobre o
assédio moral não impede que este seja
denunciado.
“Se nós pegarmos a legislação que nós temos Debate em Frederico Westphalen...
hoje, basicamente os dispositivos do artigo 116,
117 e 132, nós vamos ver que conseguimos
encaixar perfeitamente o assédio moral em várias
das hipóteses: tratar as pessoas com humanidade,
prezar pela moralidade, não ser desidioso, respeitar
a instituição a qual trabalha. Uma série de
dispositivos nos quais pode se enquadrar, sim, o
agente assediador, mesmo sem ter a tipificação
expressa do assédio moral no regime jurídico
único”, apontou o advogado.
Não esqueça: o sindicato existe para
acolher os professores. Então, se estiver
sendo vítima, não hesite em nos procurar. ... e também em Palmeira das Missões

Noite de festa 38º Congresso do ANDES-SN vem aí

O 38º Congresso do ANDES-SN ocorrerá entre os dias 28 de janeiro e 2 de
fevereiro de 2019, em Belém (PA). Este ano, o congresso traz como tema: “Por
Democracia, Educação, Ciência, Tecnologia e Serviços Públicos: em defesa do
trabalho e da carreira docente, pela revogação da EC/95”. Os (as) professores
(as) eleitos em assembleia para representar a Sedufsm no evento são: Júlio
Quevedo (dpto. História/presidente), Maristela Souza (dpto. Desportos
Individuais/diretora), Gihad Mohamad (dpto. Estrutura e Construção
Civil/diretor), Nará Quadros (Ctism/GTSSA), Luciana Carvalho (dpto. Ciências
da Comunicação da UFSM em Frederico Westphalen/Conselho de
Representantes e GTCA), João Gilli Martins (aposentado/diretor), Hugo Blois
Filho (dpto. Arquitetura e Urbanismo/Conselho de Representantes).
BRUNA HOMRICH

Revista

IVAN LAUTERT
O jantar baile em homenagem ao Dia do Professor, promovido anualmente
pela Sedufsm, foi novamente um sucesso. No dia 6 de outubro, quase 400 sobre
pessoas – dentre docentes, amigos e familiares – confraternizaram no salão
do Avenida Tênis Clube, ao som da banda Charm's. serviço
público
29 anos é lançada
IVAN LAUTERT

Professor Francisco Freitas, integrante do GTSSA

No dia 7 de novembro, a Sedufsm completou 29 anos de existência. Para
marcar a data, foi realizado um ato simbólico no auditório Suze Scalcon da
Sedufsm, seguido da exibição e debate sobre o filme “A Onda” (disponível no
Youtube), que problematiza os regimes totalitários.
Já está para download no site da Sedufsm a revista intitulada 'Servidor
Público: um peso para a sociedade?”. Elaborada pela Assessoria de
Imprensa da seção sindical, com apoio do Grupo de Trabalho de Seguridade
Social e Assuntos de Aposentadoria (GTSSA), a publicação leva o mesmo
nome do seminário promovido em abril de 2018, em Santa Maria. Dentre os
assuntos estão entrevistas com pesquisadores, dirigentes e advogados, que
alertam para projetos cujo foco é desestruturar a carreira, a aposentadoria e
os direitos dos servidores públicos. No dia 7 de novembro, ocorreu um ato
simbólico de lançamento da revista, para o qual foram
impressos alguns exemplares. O link para acesso à
revista digital está lá em www.sedufsm.org.br.
 04 OUTUBRO A DEZEMBRO DE 2018
COM A PALAVRA ESPECIAL
Quando Ricardo Rossato chegou à UFSM, em
1978, recém-pós-graduado pela Universidade de
Sorbonne (Paris), o clima político do país ainda era
duro e reverberava nas universidades. As reitorias
tinham como administradores nomes indicados
pelo ministro da Educação ou pelo próprio
presidente da República. Os conselhos superiores,
por sua vez, eram compostos majoritariamente de
membros indicados pelo reitor, num circuito
concatenado de alinhamento ideológico e
hostilidade para com o diferente. “Durante o
governo militar, nem se consultava a comunidade.
Os conselhos se reuniam e indicavam os seis
nomes [lista sêxtupla enviada ao ministro da
Educação para que este escolhesse um dos
nomes], evidentemente todos ligados ao
pensamento militar”, lembra Rossato.
Aos poucos foram se conquistando espaços
decisórios um pouco mais democráticos dentro das
instituições de ensino superior. Uma das primeiras
conquistas foi a eleição direta para reitor da UFSM,
em 1985, quando o professor Gilberto Aquino
Benetti [falecido em 2008], que havia obtido a
maioria dos votos entre os estudantes, técnicos e
professores, foi efetivamente nomeado pelo então
ministro da Educação, Marco Maciel. E o primeiro
ato realizado por Benetti à frente da reitoria, ainda
no dia de sua posse, foi a extinção da Assessoria
Especial de Segurança e Informação (Aesi). “Era a
presença do DOPS [Departamento Estadual de
Ordem Política e Social] dentro da universidade, e
mesmo assim houve professores que se
manifestaram de forma contrária à extinção da
Aesi. Era grande a presença das forças
conservadoras dentro da universidade”, lembra
Rossato.
Diferente de hoje, em que o reitor e o vice são
eleitos na mesma chapa, em fins da década de 80
os pleitos eram separados, de forma que Rossato
fora escolhido pela comunidade
BRUNA HOMRICH
acadêmica para ser vice de Benetti
no ano de 1987, sendo o primeiro
vice-reitor a ser nomeado pelo
próprio reitor, ao invés de pelo
ministro da Educação, como o era
até então.
Fechamento
(Entretítulo) Fechamento
Desde a redemocratização, as
universidades realizam consulta
paritária (igualitária entre estudan-
tes, docentes e técnico-administr-
ativos em educação) para escolha do
reitor. Após o pleito, o resultado é
encaminhado ao Conselho Universi-
tário, que na maioria das vezes
referenda a consulta e encaminha a
lista tríplice [três candidatos mais
votados] ao Ministério da Educação.
O ministro da Educação nomeia o
candidato que teve mais votos na
comunidade acadêmica, respeitan-
do, assim, a autonomia e democra-
Publicação da Seção Sindical dos Docentes da UFSM / ANDES Publicação da Seção Sindical dos Docentes da UFSM / ANDES OUTUBRO A DEZEMBRO DE 2018 05
Universidades
cia universitárias. eleições para Reitor. Isso fortemente com o combate ao que chama de
Agora, sob a justifica- poderá mudar imedia- “doutrinação” nas escolas e universidades. Estas
tiva de que é preciso tamente, pois não últimas, na concepção do presidente eleito, devem
barrar pensamentos depende de mu- ter como finalidade central o desenvolvimento de
NA M RA
ideológicos e esquerdis- dança da legislação”, produtos e avanços técnicos que visem aumentar
tas, a equipe de Jair comenta Rondinel. “a riqueza, a produtividade e o bem-estar da
Bolsonaro (PSL) teria Se ainda não anunciou população”. As pesquisas devem ser realizadas
aconselhado o presidente cortes, Bolsonaro já sinalizou mediante parcerias público-privadas, uma vez que
eleito a não nomear, claramente que não irá o setor de ciência e tecnologia estaria “totalmente
necessariamente, o incrementar o investimento esgotado” por depender “exclusivamente de
nome mais votado na Educação. No plano de recursos públicos”.
entre a comunidade. governo intitulado “O Se de um lado o documento defende a
Para Rossato, que caminho da prosperi- implantação de modelos de produção científica e
participou da pri- dade”, ele e sua tecnológica referenciados em países como Estados
meira eleição equipe avaliam que Unidos, Israel, Taiwan, Coréia do Sul e Japão, por
direta para reitor tanto a Saúde como outro reivindica o fomento do empreendedorismo
de Bolsonaro
da UFSM, tal a Educação já conhe- nas universidades, a fim de que “o jovem saia da
aconselhament cem investimentos sufi- universidade já pensando em abrir uma empresa”.
o representa cientes, de forma que a Rossato, longe de desconsiderar a importância
um retrocesso. precariedade dos sistemas do desenvolvimento científico e tecnológico,
“Voltaremos à centrali- de saúde e educação questiona: “esta sociedade produtiva e tecnológica
zação e à ideologização do pder. deve-se exclusiva- está a serviço de quem?”. Para ele, o excessivo
Provavelmente teremos um gover- mente a problemas encantamento com a ciência e tecnologia advoga
no mais conservador que vai de gestão. “A educa- contra as ciências sociais e humanas. “Nós
escolher um dos nomes da lista. ção deveria ser me- precisamos de técnicos, sim, mas também
Isso é preocupante. Aquela ideia
de que estamos sempre avan- O que esperar da educação superior lhor com o valor que o
Brasil já gasta. É possível
precisamos de pessoas que proponham. As
ciências humanas servem ao processo de
nos próximos quatro anos?
çando não é verdade. Vivemos fazer muito mais com os humanização das pessoas e, para tal, é preciso
um momento de retrocesso, atuais recursos”, aponta o liberdade de pensamento. O tempo de hoje é
em que não temos a conquista documento. relativamente pobre em utopias e projetos para a
de novas liberdades e direitos. O plano de governo defende, inclusive, sociedade”, inquieta-se.
Avança-se econômica e a inversão da atual pirâmide de investimento na educação. Segundo o plano de governo de Bolsonaro,
tecnologicamente, mas não sociologicamente”, opina. Hoje 30% [maior fatia] do orçamento da Educação é destinado ao Ensino essa carência de projetos alternativos ao instituído
Tendo acompanhado o período de abertura democrática no Superior. Conforme o presidente eleito, a prioridade será a educação básica tende a se agravar. Num movimento que direciona
país, o primeiro vice-reitor eleito pela comunidade da UFSM sugere que e o ensino médio e técnico. a visão tecnicista e empreendedora tanto às
ninguém imaginava uma eleição tão “conservadora e reacionária” como a que se universidades quanto às escolas básicas, o
desenrolou em 2018. Enquanto, em fins dos anos 1980, “sentíamos que estávamos avançando e que (Entretítulo) Mensalidades Mensalidades documento aponta que é preciso “revisar e
toda a sociedade caminhava para a democratização”, hoje “o clima é de fechamento”. modernizar” o conteúdo lecionado nas escolas
Um documento intitulado “Panorama Fiscal Brasileiro” foi entregue pelo Ministério da Fazenda à brasileiras, “expurgando a ideologia de Paulo Freire
Cortes orçamentários
(Entretítulo) Cortes orçamentários equipe de transição do governo Bolsonaro. O objetivo era e mudando a BNCC [Base Nacional
ARQIVO SEDUFSM
sugerir ao novo governo uma série de medidas para aumentar Comum Curricular]”.
As dificuldades a serem trazidas pelo governo de a arrecadação, dentre essas a cobrança de mensalidades nas
Bolsonaro não se restringem às liberdades democráticas, universidades, bem como o aumento da alíquota de (Entretítulo – com mais ênfase que
observa Rossato, para quem o estrangulamento orçamentário
das universidades também será a tônica do novo presidente.
contribuição previdenciária dos servidores públicos federais
de 11% para 14%. Outra sugestão foi a correção do salário
Unificar
os outros) Unificar para resistir
“Seguramente vamos ter cortes significativos no
orçamento, no setor de ciência e tecnologia, na
mínimo apenas pela inflação, o que, na prática,
acabaria com os aumentos reais. Segundo o
para
pesquisa”, antecipa o docente aposentado do
departamento de Fundamentos da Educação. Rondinel:
documento, a instituição de mensalidades nas
universidades federais traria aos cofres públicos
resistir
Diante desse cenário, o
A previsão de Rossato é reforçada pelo Próximo passo R$1 bilhão em 2019, R$2 bilhões em 2020, R$3
ANDES-SN vem incentivando
professor do departamento de Economia e pode ser cortar bilhões em 2021 e R$4 bilhões em 2022.
suas seções sindicais a se
Relações Internacionais da UFSM, Ricardo Para a 2ª vice-presidente do ANDES-SN,
Rondinel, para quem as universidades brasileiras,
as progressões Sônia Meire, cobrar mensalidades em
envolverem em frentes e
funcionais fóruns em defesa da educação
sofrendo com o contingenciamento desde o universidade públicas é retirar o caráter público
pública, dos direitos e das
ajuste fiscal de 2014, não têm mais de onde cortar da educação. “Isso retira, mais uma vez, a
liberdades democráticas. O
e estão “quase no mínimo para sobrevivência”. importância do Estado de assumir sua
presidente da entidade,
Diz o economista que, “quanto aos salários, responsabilidade com a educação pública. Ela não
Antônio Gonçalves, defende
para 2019 não há previsão de reposição salarial da inflação. é uma mercadoria. O ANDES-SN tem que continuar reagindo
“unidade de ação para
Talvez o próximo passo seja cortar as progressões funcionais a essas medidas, principalmente se o futuro governo
derrotar ataques”.
docentes. Existe uma questão ideológica, porque o governo continuar acenando para esse projeto”, ressalta.
pensa que as universidades são centro de propagação de
ideologia. Por isso, a proposta de educação sem partido. Universidade produtivista
(Entretítulo) Universidade produtivista
Ricardo Rossato foi eleito vice-reitor Também se fala em mudar os critérios de nomeação dos Ricardo Rondinel diz que universidades
pela comunidade acadêmica em 1987 dirigentes. Sempre foi escolhido o primeiro da lista tríplice nas No plano de governo, Bolsonaro compromete-se não têm mais de onde cortar
 06 OUTUBRO A DEZEMBRO DE 2018 Publicação da Seção Sindical dos Docentes da UFSM / ANDES

COM A PALAVRA

RODRIGO VIEIRA DE ÁVILA

Para sair da crise,

FRITZ NUNES
governo precisa
auditar dívida
No dia 3 de outubro, a Assessoria de Imprensa da Sedufsm
realizou entrevista com o economista da Auditoria Cidadã da
Dívida, Rodrigo Vieira de Ávila. Naquele momento, o país ainda
não conhecia o nome que assumiria a presidência da República nos
próximos quatro anos (2019-2022). Contudo, o economista
comentou sobre a impossibilidade de qualquer governo,
independente da legenda e orientação, implementar projetos
sociais e reavivar a economia sendo refém do sistema da dívida –
alimentado por mecanismos opacos e relações questionáveis
entre banqueiros e organismos internacionais, que fazem
aumentar os juros de uma dívida que em nada contribui para o
desenvolvimento social dos países que a pagam.
Leia a íntegra abaixo.

Sedufsm - Como está a situação
da dívida pública no país?
Ávila - Hoje a dívida pública consome
40% do orçamento federal, em termos de
juros e amortizações. Isso é dez vezes o
que se gasta com saúde, por exemplo. E a
dívida vem aumentando por conta de
vários aspectos, mas o principal são as
altas taxas de juros, bastante questioná-
veis porque são formadas em processos
completamente viciados, dominados por
representantes de bancos. De 1995 a
2015, essa dívida saltou de R$ 86 bilhões
de reais para R$ 4 trilhões de reais. Ou
seja, aumentou mais de 40 vezes, mesmo
que nesse período tenha sido feito um
superávit primário de um trilhão de reais.
Foram arrecadados um trilhão de reais a
mais em tributos do que se gastou nas
áreas sociais e a dívida, ainda assim,
multiplicou. Não é verdade esse argu-
mento de que a dívida cresce porque o
governo gasta demais com a previdência
do servidor. A dívida cresce por conta de
altíssimas taxas de juros e outros meca-
nismos financeiros que não têm nada a
ver com o gasto social. Por exemplo,
operações de mercado aberto, operações
de Swap [troca de riscos entre duas
partes], nomes complicados que em bom
português significam: dívida para o povo
pagar, sem contrapartida em termos de
investimento social.
Sedufsm - Nesse recente período
eleitoral, choveram propostas de
projetos sociais. Porém, como
viabilizar tais projetos num cená-
rio em que a crise só aumenta?
Ávila - Nós, da Auditoria Cidadã da Dívi-
da, enviamos aos presidenciáveis uma
carta aberta propondo a auditoria da
dívida como condição para que se possam
fazer investimentos sociais no país.
Porque gastando 40% do orçamento
federal com juros e amortizações da essa dívida vai continuar crescendo, Sedufsm - Qual seria o impacto da
dívida realmente é complicado viabilizar porque ela cresce em função dos juros auditoria da dívida para um
projetos. Se o governo futuro não en- absurdos e de esquemas financeiros, futuro governo?
frentar essa questão, vamos continuar como operações em que o Banco Ávila - Interessante relembrar o caso do
patinando, a crise continuará, pois sem Central gera dívidas simplesmente para Equador, que em 2007 criou uma
investimento social não dá para gerar beneficiar o setor financeiro. auditoria por decreto presidencial. E com
emprego, não dá para gerar cresci- Sedufsm - A questão da dívida isso se descobriu grandes ilegitimidades
mento econômico com distribuição de pública parece distante do desta dívida, juros sobre juros, dívidas da
renda. A auditoria da dívida é funda- cotidiano, parecendo um ditadura, muito parecido com a situação
mental. Qualquer que seja o presidente assunto a ser debatido apenas brasileira. O governo divulgou essas
eleito, se ele não enfrentar isso, daqui a por especialistas. Qual a conclusões em cadeia nacional de rádio. A
quatro anos vamos estar de novo nesta importância de popularizar população entendeu, e o resultado foi
discussão da crise e do que fazer. este debate? bem diferente do que dizem os
Sedufsm - Que relações pode- Ávila - É muito importante que a defensores do sistema da dívida atual, de
mos estabelecer en- população possa discutir, que uma auditoria geraria uma grande
tre a Emenda Cons- pois todo mundo é afetado crise, que prejudicaria toda a economia.
titucional (EC) 95 e o “Governo pela dívida, todo mundo No Equador mostrou-se que não. O
pagamento da dívi- tem R$ 1 paga essa dívida. É claro resultado foi que os banqueiros
da? que as pessoas têm começaram a ajoelhar diante do governo
Ávila - Essa emenda foi trilhão capacidade de discutir. Mas pedindo 'eu quero negociar a dívida'. O
aprovada no final de 2016 congelado a grande mídia e o governo governo foi até bonzinho, dizendo que
com a justificativa de que o sempre usam termos pagava até 30%, e que se os banqueiros
governo gasta demais com
em caixa” técnicos muito complexos quisessem receber os outros 70%,
a previdência, com o para tentar dizer que o deveriam entrar na justiça, porém seriam
servidor público, com as áreas sociais. processo [da dívida] é bem feito, que as rebatidos pelas provas da auditoria.
Este sempre foi o argumento, de que a taxas de juros têm que ser altas para se Resultado: todos os banqueiros
dívida explode por causa disso e aí, para combater a inflação. Tem todo um aceitaram prontamente receber o 30%
controlar a dívida pública, se faria essa palavreado que tenta justificar essas dessa dívida. O próprio governo do
EC, que congela os gastos sociais por 20 altíssimas taxas de juros sob a Getúlio Vargas, nos anos 30, embora
anos, o que é um absurdo. Fizemos um justificativa de que se as taxas de juros questionável sobre vários outros
trilhão de superávit primário. Boa parte fossem menores, a inflação estaria aspectos, fez a auditoria e diminuiu a
desse um trilhão está lá no caixa do comendo solta. É tudo uma grande dívida. Ou seja, é uma política que pode
tesouro. Se a gente olhar o caixa do mentira, porque as verdadeiras causas realmente reduzir a dívida e permitir que
governo hoje, tem mais de um trilhão da inflação no Brasil são os preços o governo se torne independente da
para o governo gastar, ou seja, não é administrados pelo próprio governo. chantagem diária dos mercados. Hoje em
verdade que o governo está quebrado, Preços como combustível, energia, dia, se o governo quer, por exemplo, fazer
só que não usa esse um trilhão justa- telefonia, planos de saúde. O grande um controle sobre o fluxo de capitais para
mente por conta da EC de congelamen- problema é que esse assunto é colocado impedir a farra do dólar, tributar o capital
to dos gastos sociais. Essa emenda é pela grande imprensa como um tabu, financeiro ou reduzir as taxas de juros, ele
exatamente para que, nos próximos 20 não se pode questionar nem discutir. não pode porque qualquer coisa que o
anos, todo o aumento da arrecadação Mas quando a gente começa a entender governo faz, os banqueiros dizem que
se destine para o pagamento da dívida. o processo, vemos vários outros não emprestam mais dinheiro. É uma
Só que se está atacando a causa errada. caminhos possíveis, como a auditoria da chantagem diária. Uma auditoria
Mesmo congelando os gastos sociais, dívida. romperia esse círculo vicioso.
 Publicação da Seção Sindical dos Docentes da UFSM / ANDES OUTUBRO A DEZEMBRO DE 2018 07

EDUCAÇÃO
IVAN LAUTERT

UFSM,21/03/18: Manifestação no Dia Internacional de Luta contra a Discriminação Racial

Uma década de ações afirmativas na UFSM

Só no quesito cotas raciais, já foram cerca de 4 mil ingressantes
Cerca de quatro mil estudantes autodeclarados turno, para autodeclarados pretos, pardos e lugar de todos e todas”.
pretos e pardos ingressaram na UFSM via ações indígenas. Essas previsões também valem para a “As ações afirmativas tornaram a universidade mais
afirmativas. A estimativa tem como ponto de partida o oferta de vagas no ensino técnico de nível médio. rica, diversa, plural. E todos nós crescemos muito com
ano de 2008, primeira edição dos processos seletivos Rosane, chefe do Núcleo de Ações Afirmativas isso. Essas diferentes culturas têm que se refletirem
sob a vigência da Resolução nº 011 de 2007, que Sociais, Étnico-raciais e Indígenas da Coordenadoria também nos currículos”, comenta Rosane.
instituiu o Programa de Ações Afirmativas de Inclusão de Ações Educacionais (CAED/UFSM), acompanha,
Racial e Social. desde 2011, esse processo. Punições
(Entretítulo) brandas
Punições brandas
Esta resolução estabeleceu que, pelos 10 anos “As ações afirmativas trazem a Arquivo Pessoal
subsequentes, a universidade disponibilizasse de 10 a possibilidade de democratização do Kelara Menezes da Silva é formada
15% das vagas ofertadas em seus processos seletivos acesso ao ensino superior, e por isso em Educação Especial pela UFSM,
para estudantes afro-brasileiros [pretos e pardos]. são fundamentais. Aqui no Brasil, nós tendo entrado via resolução nº 011.
Esta mesma resolução determinava a reserva de 20% acreditamos durante muito tempo no Atualmente é graduanda no curso de
das vagas nos processos seletivos para estudantes mito da democracia racial, de que Pedagogia, no qual ingressou via Lei nº
advindos de escolas públicas, em cada um dos cursos somos todos iguais. Mas não é assim, 12.711, pós-graduanda em Gestão
de graduação ofertados. Além de outros artigos que a distribuição é desigual. Sempre que Educacional e bolsista na CAED. Para
determinam a reserva de vagas [em percentuais me questionam sobre as ações ela, crimes de racismo, embora
diferenciados] para pessoas com deficiência e afirmativas eu pergunto de volta: inafiançáveis por lei, são punidos de
indígenas, a resolução 011/2007 também se quantos (as) professores (as) negros forma branda no Brasil. “A não punição
compromissava com a criação de um programa (as) você teve? Quantos (as) colegas cria esse conforto para que as coisas
permanente para acompanhar a implementação das negros (as) você teve? Com quantos aconteçam. Já viu alguém sendo preso
ações afirmativas e conceder apoio sócio-pedagógico (as) médicos (as) negros (as) você Kelara da Silva é estudante por racismo?”, questiona a estudante.
aos estudantes cotistas. consultou? Na história cotista e bolsista na CAED “Dizer que somos todos iguais é
Arquivo Pessoal
Em 2012, a UFSM adere à Lei nº de nosso país a esquecer de todos os anos de
12.711, que estabeleceu a reserva de abolição da escravidão não veio escravidão. Foi só na Constituição de 1988, 100 anos
no mínimo 50% das vagas ofertadas acompanhada de políticas públicas depois da abolição, que a gente foi lembrado. A
pela instituição em seus processos para os (as) negros (as). Eles (as) universidade era extremamente elitizada, e hoje já é
seletivos para estudantes que tenham permaneceram sem políticas públicas um pouco mais democrática, com o Sisu e as cotas. As
concluído seu ensino médio integral- por muito tempo, até chegar a nossa pessoas não conseguem perceber que têm
mente em escola pública. Dessas Constituição Federal de 1988, que privilégios”, diz Kelara.
vagas, pelo menos 50% deveriam ser mesmo assim não atendeu a todas as Se o racismo ainda não recebe as sanções que
reservadas a estudantes com renda necessidades dessa população”, deveria no Brasil, ela diz que dar visibilidade aos
familiar bruta igual ou inferior a 1,5 reflete Rosane. crimes e ameaças já fortalece a população negra. “ É
salário mínimo per capta. Para ela, é preciso que a preciso cobrar das instituições [como Brigada Militar,
Ainda estava prevista a reserva de universidade abra-se ainda mais, indo Polícia Civil, Polícia Federal] e lutar para que os crimes
vagas no mínimo em proporção igual à até comunidades e escolas a fim de sejam denunciados e as pessoas punidas”.
soma de pretos, pardos e indígenas na Rosane Mello é chefe do orientar os jovens sobre os processos
Núcleo de Ações Afirmativas
população da unidade da federação do seletivos de ingresso a ensino superior
Sociais, Étnico-raciais e
local de oferta de vagas, por curso e Indígenas da CAED e mostrar que “aqui [universidade] é
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PERFIL
Segurança alimentar e HIV
As pessoas que possuem o HIV ainda
sofrem com o preconceito. Embora o tra-
tamento antirretroviral tenha avançado a
ponto de garantir uma vida longeva e de
qualidade, muitos ainda temem a desco-
berta de sua condição sorológica por ami-
gos, companheiros ou familiares. Assim,
as redes de apoio tendem a ser frágeis e
restritas.
“O estigma vem lá do início da epide-
mia, quando se falava em 'grupos de risco'
e se considerava a AIDS como a doença
do outro, muito longe de mim. Com o
decorrer dos casos notificados, deixou-se
de falar em 'grupos de risco' e passou a se
falar de vulnerabilidade. Somos, qualquer
um de nós, vulneráveis a se infectar pelo
HIV. E essa vulnerabilidade não depende
só do meu comportamento, mas de uma
dimensão social e também política (inves-
timentos, informações oferecidas, capaci-
tação dos profissionais)”, explica Cristiane
Cardoso de Paula, docente do departa-
mento de Enfermagem da UFSM.
Professora desde 2004 na instituição,
ela, cuja formação é de enfermeira pedia-
tra, tem sua atuação mais focalizada nas
áreas de Saúde da Criança e do Adoles-
cente. E, dentro dessa esfera, seus estu-
dos concentram-se na promoção de
segurança alimentar e nutricional às
crianças expostas mais diretamente ao
HIV. Cristiane esclarece que a transmis-
são vertical pode se dar da mãe para o
filho durante a gestação, o trabalho de
parto, o parto propriamente dito ou o
processo de aleitamento. E é aí que reside
o centro do projeto que, coordenado por
Cristiane, ganhou o primeiro lugar em
edital lançado pela WFP [World Food
Programme], vinculado à ONU, na cate-
goria 'Projetos'. A docente foi convidada
para receber o prêmio durante o
Congresso Mundial de Alimentação, em
2017, no Canadá.
O projeto, coordenado por Cristiane,
porém construído por diversos profis-
sionais, estudantes e setores da UFSM,
propunha a elaboração de uma tecnologia
educativa cujo objetivo seria orientar as
CULTURA
FRITZ NUNES
Publicação da Seção Sindical dos Docentes da UFSM / ANDES
mães infectadas pelo HIV e demais
familiares a, além de não amamentar a
criança, preparar corretamente a fórmula
BRUNA HOMRICH
láctea até os quatro ou seis meses e,
posteriormente, introduzir a alimentação
complementar até os dois anos de idade.
“Se por um lado o aleitamento materno
é o melhor alimento para qualquer recém-
nascido - até os 2 anos -, quando a mãe é
infectada pelo HIV, o aleitamento mater-
no expõe essa criança ao vírus. Então a
recomendação é de que essa criança não
receba o leite materno”, salienta Cristina.
No Brasil existem políticas públicas que
garantem o fornecimento da fórmula
láctea para as crianças cujas mães são
infectadas pelo HIV. Contudo, o Grupo de
Pesquisa Cuidado à Saúde das Pessoas,
Famílias e Sociedade (GP-PEFAS), inte-
grado por Cristiane desde 1998, ano de
fundação do grupo e também ano de seu
ingresso como graduanda em Enferma-
gem na UFSM, percebeu, no contato com
os pacientes acompanhados no Ambula-
tório de Infectologia Pediátrica do Hospi-
tal Universitário de Santa Maria (HUSM),
que diversas mães e demais cuidadores
tinham dúvidas sobre como preparar a
fórmula láctea, muitas vezes diluindo o
alimento de forma errada ou cometendo
outros equívocos que expunham as crian-
ças à insegurança alimentar. Cristiane de Paula, premiada por projeto desenvolvido para orientar mães com HIV
Foi a partir do contato com os próprios tecnologia, além de exemplares impres- não recebem o leite materno.
familiares das crianças que surgiu a ideia sos para serem distribuídos entre os Embora o índice de infecção vertical já
do projeto premiado pela ONU. As mães – familiares que estiveram participando tenha diminuído no país, a ideia é
maioria das cuidadoras – solicitaram aos desde o início da pesquisa, também será erradicá-lo, diz Cristiane. E para isso, é
membros do GP-PEFAS uma espécie de disponibilizada uma versão digital. Assim, preciso que as mães infectadas pelo HIV
revista ou cartilha, que pudesse ser fo- outras pessoas e inclusive órgãos do recebam acompanhamento desde o pré-
lheada em casa sempre que houvesse governo podem acessar o material. Para natal. “Quando o bebê nasce, a mãe
dúvidas quanto à forma de alimentar as contemplar as demandas de acessibi- precisa receber o outro leite e compre-
crianças. Hoje o projeto – denominado lidade, o conteúdo da tecnologia também ender como preparar a alimentação desta
tecnologia educativa – está em constru- terá uma versão em áudio – provavel- criança, de forma a não expô-la à insegu-
ção, tendo participação de uma equipe mente podcast. rança alimentar (como desnutrição, desi-
multidisciplinar e também de familiares Uma curiosidade é que, devido a trocas dratação e anemia)”, defende Cristiane.
dos pacientes. de ideias realizadas durante o Congresso E por que esse período é tão importante
Aprovado o conteúdo, a última etapa de Mundial de Alimentação, esta tecnologia na vida da criança? “Porque os primeiros
criação da tecnologia será realizada junto foi, agora, ampliada, atendendo não só às 1000 dias de vida – desde a gestação até
ao Núcleo de Tecnologia Educacional demandas das crianças cujas mães são os dois anos - é o período de ouro, em que
(NTE) da UFSM, responsável pela parte infectadas pelo HIV, mas a todas as todo o investimento e estímulo repercu-
gráfica – design e formato. Concluída a crianças que, por um motivo ou outro, tem na vida adulta desta criança”, conclui.
Para crianças
Meu conhecimento de literatura infantil vem de duas fontes. Meu gosto pessoal e um filhote, hoje com 9
anos, que busquei cercar de livros mesmo antes de nascer. Criamos juntos rotinas, como longas visitas
a livrarias e muitas e muitas leituras compartilhadas. Essas últimas são um ritual de amor e diversão. Já
lemos muitos livros e coleções inteiras juntos. Vamos nos adaptando aos textos e compartindo e
debatendo o que eles trazem. Há uns dois anos investi em uma coleção de quatro livros do selo Boitatá
da Editora Boitempo. O texto simples e bem articulado se tornou um dos primeiros a ser lido
exclusivamente por ele nos caminhos da alfabetização. Ao longo desse ano, com a movimentação das
eleições, lá se foi o guri a buscar os livros e trazer para a cabeceira da cama. Era um esforço dele em
compreender o que ele ouvia os adultos conversarem. Os livros são: A Democracia pode ser assim; O
que são classes Sociais?; As mulheres e os Homens e A Ditadura é assim. De forma lúdica e clara, os
textos, publicados pela primeira vez na Espanha na década de 1970, encanta crianças curiosas em
saber e entender o mundo.
*Por Nikelen Witter, departamento de História/UFSM