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547 15. MopeLos DE ATENCAO A SAUDE NO BrasiL Jairnilson Silva Paim Um sistema de servigos de satide € formado por componentes € ngoes principais: infra-estrutura, organizacio, gestéo, financiamento ¢ prestagao da atencdo (Kleczkowski, Roemer & Werf, 1984). Neste tltimo componente, abrigam-se as nodes de modelo de atengao ou modelo € a0 cuidado, & assisténcia, & intervengao, as agdes ou As praticas de satide. Sem pretender distinguir modelos assistenciais e odelos de atencdo. este capitulo tem como propésito destacar a dimensao técnica ou tecnolégica das praticas de satide, ainda que considerando o desenvolvimento histérico das politicas e da organizacao dos servigos correspondentes. A preocupagao central € com o ‘contetido’ do sistema de servigos de satide (praticas de satide) ¢ nao com o seu ‘continente’ -estrutura, organizacao, gestéo e financiamento), abordado nos capitulos 3, 12 e 13. fu ssistencial, referindo-s infr Inicialmente, sao discutidos os significados do termo ‘modelo’ no senso comum € no campo cientifico, ressaltando-se a relevancia de identificar os tragos fundamentais dos modelos de atengao a satde predominantes no Brasil e certas racionalidades que orientam algumas propostas alternativas. No tépico seguinte, procura-se contextualizar a reflexio sobre modelos empreendida pela savide coletiva. A partir dai, realiza-se uma revisio critica das concepgdes sobre modelos de atencdo, nclusive de certas propostas alternativas identificadas na literatura, do algumas conclusées provisorias. ea TI Diversos textos técnicos, documentos oficiais e publicagées cientificas tém utilizado as nogdes modelos de atengéo ou modelos assistenciais de forma variada, a partir da década de 1980, sem uma preocupagao com o que significam. Embora nao seja intencao produzir uma elaborac&o conceitual neste capitulo, faz-se necessario discutir algumas concepgées presentes nessas nogdes no sentido de facilitar a comunicacao. A consulta aos diciondrios nao é suficiente para esclarecer os significados. A palavra ‘modelo’, por exemplo, tem acepcdes diversas na lingua portuguesa, assumindo diferentes conotages na ciéncia em geral e na area da satide, em particular. Modelo, nos dias atuais, faz lembrar mogas e rapazes que langam moda nas passarelas. No passado, pode-se recordar o livro Fazenda Modelo, no qual Chico Buarque ironizava o ‘milagre econdmico’ da ditadura a partir de um boi reprodutor que teria alcancado grande produtividade, servindo de exemplo, padrao ou referéncia para outros bovinos, fazendas € paises. Assim, 2 palavra modelo insinua algo exemplar a ser seguido como uma norma ou forma, a ponto de os costureiros iniciarem seu aprendizado desenhando e recortando o papel que serve de referéncia para a confecc4o da roupa do cliente. E as criangas, ao serem levadas a brincar com massa de modelar, criam diferentes objetos através de formas que procuram imitar. Conseqiientemente, esta carga semantica da palavra modelo como algo exemplar, norma, padrao, referéncia ou forma é muito forte ¢ tende a estar presente no entendimento das expresses modelos assistenciais ou modelos de atengao. Todavia, essa compreensio traz uma armadilha: insinua enquadramento, normatizag4o ou padronizagao, fazendo-se necessério alertar ou, se possivel, evitar. Na ciéncia, © termo modelo muitas vezes se confunde com paradigma. Este, por sua vez, também apresenta uma polissemia, ou seja, varias conotagdes. Mas, de um modo geral, significa uma representagao simplificada da realidade onde se retém e€ se destacam seus tragos fundamentais. Modelo é uma espécie de esquema sempre parcial e mai ou menos convencional, posto que se ignora a maior parte das variagdes individuais (Bunge, 1972). Pode ser um desenho (modelo pictérico), um conjunto articulado de conceitos (modelo tedrico ou modelo teorético) ou uma formula (modelo matemético). Justamente esta representacao esquemética e simplificada de um sistema de satide, no que tange a prestacdo da atengao, pode ser entendida como modelo de atengao ou modelo assistencial. Nao como algo exemplar, uma norma ou um padrao que todos devem seguir, mas a identificagao de seus tragos principais, seus fundamentos, suas légicas, enfim, sua razao de ser ou as racionalidades que Ihe informam. SS Modelos de Atencio 2 Sade no Brasil 549 Portanto, quando a reflexao sobre modelos de atengao se desloca do senso comum para o campo técnico-cientifico, impée-se buscar certa preciso conceitual para facilitar a compreensao ¢ orientar as escolhas técnicas e decisdes politicas na satide. Nessa perspectiva, importa identificar os tracos fundamentais e as racionalidades que caracterizam modelos de atencao existentes, bem como as propostas alternativas. ONTEXTUALIZACAO Como se procurou argumentar, modelo de atengao A satide nado significa algo exemplar e tinico, tal como apresentado em alguns documentos ¢ discursos, como “o modelo de atenc4o do SUS deve ser a ade da familia” ou “o modelo assistencial do Brasil € hospitalocéntrico” Entendendo o termo modelo como uma representagao da realidade de aide, se procurara destacar as racionalidades que orientam as aces de satide, conduzindo a adocao de uma dada combinacdo de tecnologias ou de meios de trabalho em cada situacao concreta. Ao se ultrapassar a idéia de que cada doenca teria uma causa, tal como fora difundido no final do século XIX, o modelo agente-hospedeiro- ambiente fundamentou muitas acdes de satide, reforcando a concepgao de multicausalidade, Desse modo, as medidas de controle das doengas, Jém de intervirem sobre o agente e sobre o hospedeiro, ampliariam a sua para 0 ambiente (fisico, biolégico e sociocultural), sendo este ambém conhecido como modelo ecolégico. atua esquema A partir das influéncias da medicina preventiva, foi difundido o modelo da hist6ria natural das doengas estabelecendo cinco niveis de prevengio, cujas medidas poderiam ser aplicadas de forma integral em distintos momentos do proceso satide-doenca. Medicina preventiva A medicina preventiva utilizava conceitos como processo satide/doenga, hist6ria natural das doencas, multicausalidade, integracio, resisténcia, inculcagio € mudanca. Articulava um conjunto de medidas de prevencéo que resultariam em condutas substitutas de uma atitude ausente da pratica médica, ou seja, a atitude preventiva € social. Apontava para a possibilidade da redefinicao das responsabilidades médicas através de mudancas na educagéo, mantendo a onganizacdo de servicos de satide na perspectiva da medicina liberal. Fonte: Arouca. 2003 Na primeira fase de prevengao, perfodo pré-patogénico, haveria a ‘bilidade de um desequilibrio entre o agente, o hospedeiro e 0 ambiente, eee

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