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Didática e Prática de Ensino na relação com a Formação de Professores

A DIDÁTICA NA DOCÊNCIA SUPERIOR NA VOZ DE LICENCIANDOS DO


CURSO DE PEDAGOGIA DA UECE: LIMITES E POSSIBILIDADES

Hamilton Perninck Vieira, Secretaria Municipal de Educação de Fortaleza (SME)


Jacques Therrien, Universidade Estadual do Ceará (UECE)
Resumo
A sociedade capitalista na qual vivemos, tem sido marcada por um processo de
desumanização em que as estruturas são mais importantes que as pessoas. Assim, a
educação que se materializa na prática didático-pedagógica das instituições formativas,
ora serve para consolidar a hegemonia dominante ou fomentar a libertação da
consciência pela consciência. Sendo assim, nosso problema de pesquisa é: na voz de
licenciandos do curso de Pedagogia da UECE, a Didática em contexto de Docência no
Ensino Superior aponta em direção à (re)significação do fazer docente na
Universidade? Para tanto, temos como objetivo refletir sobre Didática no Ensino
Superior tendo como base a voz de licenciandos em Pedagogia, na tentativa de
ressignificar o “ensinar” do educador nas licenciaturas mediante os caminhos do
“aprender” do educando. A metodologia de trabalho utilizada foi à pesquisa de campo
com abordagem qualitativa e instrumentalizada por questionários abertos e
semiestruturados. Diante disso, nossos achados de pesquisa apontam, de um lado, para
a necessidade de se construir debates em torno da reflexão sobre a prática pedagógica
dos professores, na busca de um projeto de formação continuada sobre os saberes da
Docência no Ensino Superior. De outro lado, inferimos que a educação superior precisa
transitar pelos saberes de mediação pedagógica baseada na dialogicidade, no
reconhecimento do erro, na identificação com a docência, no saber experiencial, na
pesquisa, no conhecimento profundo das disciplinas e nas práticas professorais
centradas na ética profissional.

Palavras-chave: Pedagogia; Didática; Docência no Ensino Superior.

Introdução
A sociedade na qual vivemos, tem sido marcada por um processo de
desumanização em que as estruturas são mais importantes que as pessoas, o poder
aquisitivo maior que o diálogo que negocia, e pela corrupção que está estabelecida
como a superação da honestidade. Neste contexto, entendendo que “[...] educar é o
processo de constituição e de reconstituição criativa de si e do mundo social com quem
convive o ser humano” (THERRIEN,2010,p.6); em contraponto, a educação
formalizada se tornou um mecanismo de cerceamento social fazendo como que na
sociedade capitalista subsista em tom de retroalimentação de classes estratificadas: a
miséria e alienação dos dominados e o poder e a iluminação dos dominadores. Por
assim dizer, concluímos que é através da prática didático-pedagógica materializada nas
instituições formativas que percebemos se a educação proposta é para consolidar a

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hegemonia dominante (MARX;ENGELS,2011) ou fomentar a libertação da consciência


pela consciência (FREIRE,1996).
Este enfoque situa a questão-problema deste estudo: na voz de licenciandos do
curso de Pedagogia da UECE, a Didática em contexto de Docência no Ensino Superior
aponta em direção à (re)significação do fazer docente na Universidade? Posto dessa
maneira, nosso objetivo de investigação é refletir sobre a didática em contexto de
docência na universidade, no intuito de ressignificar o “ensinar” do educador mediante
os caminhos do “aprender” do educando no âmbito das licenciaturas.
Sendo assim, propomos abordar a epistemologia que fundamenta a Didática no
Ensino Superior considerando concepções e autores de referência que dão suporte às
práticas de ensino. O Curso de Pedagogia da UECE, a partir de uma amostragem do
Campus Itaperi, constitui o lócus da pesquisa. Na sequência faremos a caracterização da
pesquisa e a apresentação da metodologia utilizada para o acesso e a análise dos dados.
Assim, para este estudo, trabalharemos com as ideias de Freire (1996) Boufleuer (2001),
Pimenta e Anastasiou (2002), Tardif (2002), Franco (2003), D´Ávila & Veiga (2012),
Pimenta (2008) e Therrien (2010,2012).

Ideias e autores
Inicialmente, faz-se necessário pontuar o aporte teórico que nos permitirá olhar a
realidade empírica, objeto de nossa análise neste artigo. Sendo assim, fazendo jus ao
nosso tema, discutiremos as ideias e autores a fim de delinear o arcabouço teórico da
pesquisa, na busca de “cercar” nosso objeto de investigação e fundamentar a análise
empírica.
Em primeiro lugar, compreendemos que historicamente a Didática nasce com
Comenius (1593-1670), que segundo Suchodolski (1984, p. 31), foi o “criador de um
sistema pedagógico dependente da natureza”, trazendo transformações relevantes para
os “programas e métodos de ensino”. Assim, entendemos que “enquanto área da
pedagogia a didática tem no ensino seu objeto de investigação. [...] As novas
possibilidades da didática estão emergindo das investigações sobre o ensino enquanto
prática social viva” (PIMENTA,2008,p.53 – grifos do autor).
Neste sentido, temos ciência de que toda prática didática não pode ser neutra
(FREIRE,1996), mas está carregada de uma postura epistemológica e de uma
racionalidade que a configura. Logo, “o foco epistemológico possibilita à didática novos
vôos, se interrogando sobre a ordem e as maneiras de ensinar” (PIMENTA,2008,p.57).

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Tal racionalidade científica que define uma postura epistemológica, ou seja, a visão de
ciência que um professor constitui; na perspectiva de Therrien (2012), uma
“racionalidade pedagógica”, de forma que:
A racionalidade que fundamenta o campo pedagógico requer a
intersubjetividade de um movimento de coletividade em que a
comunicação busca a construção do entendimento intersubjetivo pela
dialogicidade, pela argumentação na busca de consensos, na
convergência de sentidos e significados, enfim, da sociabilidade. A
racionalidade pedagógica integra uma gama de fatores diversos que
incluem desde hábitos e elementos afetivos até elementos da razão
instrumental/normativa, tendo como matriz fundante a razão
comunicativa, interativa e argumentativa (p. 121).
Sendo assim, de um lado, podemos inferir que um professor que sustenta sua
prática numa racionalidade instrumental/normativa, pautará seu trabalho na visão linear
e fragmentada da Ciência, e por consequência, estabelecerá uma relação pedagógica
vertical fundada no monólogo com os alunos. Por outro lado, uma prática docente
ancorada na racionalidade comunicativa, interativa e comunicativa, será construída na
relação de totalidade integrativa do conhecimento, e, por conseguinte, sua atuação junto
aos alunos será mediada pelo diálogo intersubjetivo e multirreferencial. Dessa forma,
em síntese,
A racionalidade instrumental deve ficar restrita ao âmbito da
integração sistêmica. Já a racionalidade comunicativa, que se
encontra encarnada nos processos de reprodução simbólica do mundo
da vida, deve prevalecer no âmbito da integração social
(BOUFLEUER,2001,p.16 – grifos nossos).
Podemos dizer, portanto, que “a natureza de uma determinada área do saber, por
sua vez, determina o método de ensinar” (PIMENTA,2008,p.54). Dessa forma, é a
natureza do objeto cognoscível quem determina a mediação didática do educador junto
aos sujeitos cognoscentes. Sendo a Didática a teorização dos fenômenos da prática
docente, “[...] ensinar não é transmitir conhecimento, mas criar as possibilidades para
a sua produção ou a sua construção” (p.22) – (Grifo do autor) e “aprender para nós é
construir, reconstruir, constatar para mudar, o que não se faz sem nenhuma abertura
ao risco e à aventura do espírito (p.69)” – (Grifos do autor).

Compreendemos que saber não equivale, a „saber ensinar‟. Assim, o exercício da


docência em qualquer nível de ensino, depende do domínio de uma área do saber e do
conhecimento de outros saberes que permitem a mediação do processo de
aprendizagem. Posto isso, concordamos com Tardif (2002) que os saberes da docência
assim se configuram: (1) Saberes da formação profissional: conhecimentos das

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ciências da educação e da pedagogia; (2) Saberes disciplinares: são conhecimentos


culturais e sociais sobre um campo do saber; (3) Saberes curriculares: estão
relacionados aos discursos, objetivos, conteúdos e métodos a partir dos quais a
instituição escolar categoriza e apresenta os saberes sociais; e (4) Saberes de
experiência: conhecimentos construídos pelos professores na prática e pela prática
cotidiana. Eles incorporam-se individual e coletiva sob a forma de habitus e de
habilidades, de saber-fazer e de saber-ser.
Mediante esse raciocínio, compreendemos que a docência não se constitui num
saber unilateral, mas plural, multirreferencial, de tal forma que “[...] a transmissão da
matéria e a gestão das interações não constituem elementos secundários do trabalho
docente, mas o próprio cerne da profissão” (TARDIF,2002,p.219). Nessa direção,
Tardif (2002) estabelece os fundamentos do ensino que a um só tempo são existenciais,
sociais e pragmáticos. Em outras palavras, os saberes constituídos na vida do
professor, aprendidos nas mais diversas fontes (família, escola, universidade) e em
diferentes tempos (infância, escola, formação profissional, ingresso na profissão e
carreira), e (re)configurados na e pela prática do trabalho docente, delineiam o esteio
por onde passa o exercício do magistério.

Por fim, defendemos neste trabalho que a Didática, como objeto da Pedagogia e
das Ciências da Educação, é constitutiva da relação teoria e prática que visa dar conta
dos fenômenos do ensinar e do aprender. Assim, tal postura didática é oriunda de uma
cosmovisão epistemológica que está embasada numa racionalidade que a estrutura e
define uma proposta educacional nos cursos de Licenciatura. Dessa forma, acreditamos
numa Docência no Ensino Superior que se desenha no horizonte da pluralidade e
multirreferencialidade dos saberes, na perspectiva contínua da (re)construção do eu
(existenciais) mediado pelo outro (sociais) no e pelo trabalho profissional docente
(prática).

A caracterização da pesquisa
Compreendendo que toda metodologia é resultante de uma concepção
epistemológica, podemos caracterizar essa pesquisa apresentando inicialmente o lócus
de acesso aos dados, os caminhos utilizados para apreendê-los e as etapas do seu
desenvolvimento.

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Nessa direção, em primeiro lugar, o estudo constitui um recorte de nossa


experiência no Programa de Pós-Graduação em Educação na Universidade Estadual do
Ceará (PPGE-UECE), por ocasião do Estágio de Docênciai realizado na disciplina
Pedagogia de Paulo Freire em razão da sua pertinência com a nossa Dissertação de
Mestrado que tem como aporte teórico o pensamento freiriano.
Em segundo lugar, escolhemos como concepção teórico-metodológica a
pesquisa de campo instrumentalizada pela aplicação de questionários abertos e
semiestruturados, além de procedimentos de observação. Diante dessa realidade,
entendemos que essa metodologia de pesquisa “consiste na observação de fatos e
fenômenos tal como ocorrem espontaneamente, na coleta de dados a eles referentes e no
registro de variáveis que se presume relevantes, para analisá-los.” (LAKATOS;
MARCONI, 2003, p. 186). Participamos de todas as aulas, ora como aluno-estagiário,
ora como regente da turma, colaborando com as discussões e a professora responsável
pela disciplina. Os sujeitos com quem trabalhamos formavam um grupo de 52 alunos
matriculados, sendo que 3 eram do sexo masculino (6%) e 49 do sexo feminino (94%).
Apesar da disciplina ser optativa e aberta a todas as licenciaturas, verificamos que a
preocupação com a docência ainda se assenta numa relação de feminização própria da
profissão (NÓVOA,1991).
Num primeiro momento enviamos os 52 questionários por e-mail aos alunos da
disciplina, mas apenas uma aluna retornou. Diante desse impasse resolvemos levá-los
impressos à sala de aula, tendo como retorno mais 15 questionários. Ao total, de um
universo de 52 alunos, nossa investigação trabalhou com 16 questionários (31%) que
nos forneceram informações para o estudo do problema em foco. Os questionários
foram organizados em cinco aspectos: (Bloco 1) Identificação; (Bloco 2) Experiências
Acadêmicas; (Bloco 3) Experiência Profissional; (Bloco 4) Didática; (Bloco 5)
Docência no Ensino Superior.
Este trabalho científico se constitui num recorte a partir das respostas dos alunos
sobre as questões a seguir: Pergunta 1: Qual o lugar e a importância da Didática no
Ensino Superior nas licenciaturas? (Bloco 4) e Pergunta 2: Que saberes são
necessários para a Docência no Ensino Superior tendo em vista a (re)significação do
fazer docente nos cursos de licenciatura? (Bloco 5). Enfim, a título de preservação da
identidade dos sujeitos da investigação, utilizaremos a nomenclatura Licenciando,
fazendo referência numérica à fala dos alunos, estabelecendo uma interlocução entre
eles e nossos autores de referência.

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Análise dos dados da pesquisa

Achados da Pergunta 1
Em relação à Pergunta 1, „o lugar e a importância da Didática no Ensino
Superior nas licenciaturas’, nossos achados apontaram que a Didática tem um lugar de
importância na Educação Superior, pois é a expressão prática do posicionamento teórico
do professor, possibilitando a criticidade, fomentando “modelos” e “influências” para a
docência, vislumbrando caminhos para que o educando na Universidade tenha uma
aprendizagem significativa.
Sendo assim, em primeiro lugar, o resultado da análise dos dados nos mostrou
que a Prática Didático-Pedagógica de um professor carrega dentro de si, consciente ou
inconscientemente, uma teoria que a sustenta. Nesse aspecto, um aluno nos deixa claro
que ela “tem lugar de grande importância, pois a didática utilizada determina o
posicionamento defendido pelo professor e sua práxis educativa” (Licenciando 1). O
posicionamento do educador não é meramente uma teoria vazia em sua prática
pedagógica, mas configura uma maneira de ser e fazer o trabalho docente: “a didática é
muito relevante, pois demonstra a metodologia adotada pelo professor e sua linha
teórica [...]” (Licenciando 3). A didática de um docente, portanto, é a materialização de
sua racionalidade teórica, constituindo assim um modus operandi, pois quem ensina,
ensina algo a alguém com um objetivo. Dessa forma, um dos participantes explicita:
“acredito que a didática é um dos principais pilares do aprendizado, pois se não houver
nenhum método, ou estratégia, será difícil atingir algum objetivo” (Licenciando 12).
Posto isso, não é possível pensar numa docência na academia ainda assentada
numa racionalidade técnica (BOUFLEUER,2001) que ainda defenda que quem sabe,
sabe ensinar. Ademais, a Didática não é mera disciplina instrumental, mas um ramo da
Pedagogia, Ciência da Educação (PIMENTA,2008; FRANCO,2003), que teoriza sobre
o ensino, tendo em vista a não dicotomização das dimensões técnica e política do fazer
docente. Em síntese, mediante a necessidade dessa postura, verificamos na fala um dos
alunos que “[...] a didática precisa ser a base da docência. O professor precisa saber
planejar e dar uma boa aula e isso para mim é didática e falta muito essa concepção
didática na Universidade” (Licenciando 4).
Em segundo lugar, a didática permite ao professor mediar processos que
aproximam a relação professor-aluno-conhecimento na direção da educação

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problematizadora, crítica e não meramente reprodutora na Universidade. Nesse viés,


“[...] a docência universitária nas licenciaturas torna-se relevante, pois deve despertar no
aluno o senso crítico, fazendo com que este se torne ser pensante e participante das
discussões geradas na sala” (Licenciando 5). Essa fala nos remete a três elementos
fundamentais da Didática na Docência do Ensino Superior: criticidade, reflexão e
discussão. Dito dessa forma é preciso que o professor universitário entenda que seu
trabalho não é impor um posicionamento vertical a seus alunos. A aula, portanto, não é
uma exposição retórica e verborrágica, mas o encontro dialógico de educadores e
educandos na busca de conhecer melhor o que conhecem e aprenderem o que ignoram.
Em terceiro lugar, a Didática permite o estabelecimento de “modelo” e
“influência” para a docência. Assim, apesar de não existir um único modelo de
docência, não havendo receitas para determinada ação pedagógica, “[...] a didática é
muito importante [...] pois [...] muitas vezes serve de ‘modelo’ para os futuros
docentes” (Licenciando 6). Nesse aspecto, é interessante pensar que “[...] a formação de
professores começa com a aprendizagem do oficio de aluno e com a observação
quotidiana do desempenho de professores [...]” (FORMOSINHO,2009,p. 9). Por isso,
aprendemos a sermos professores, consciente ou inconscientemente, na observação da
prática pedagógica de outros professores. Neste sentido, é possível perceber que
determinados professores assumem a docência como reprodução dos modelos de seus
antigos mestres, associada à experiência de suas práticas profissionais. Na realidade, a
postura didática de um docente na academia não apenas ensina o saber científico, mas
fomenta processos de valoração que são aprendidos na relação dialógica entre
educandos e educadores. Em síntese, inferimos que “o fazer pedagógico do professor na
sala de aula universitária influencia diretamente o fazer pedagógico do licenciando em
sua sala de aula, pois o aluno entende aquela situação como a correta e a reproduz em
sua futura sala de aula [...]”(Licenciando 15).
Em quarto lugar, a Didática no Ensino Superior permite ao educador a mediação
do conhecimento a partir da aprendizagem significativa dos conteúdos. Diante disso, “o
papel do professor é de grande importância nos cursos de licenciatura, pois através deste
se dará o interesse dos licenciandos em suas determinadas disciplinas. [...] a didática
ocupa as primeiras posições no tocante a importância do papel do professor”
(Licenciando 9). Assim, o fazer didático de um docente na academia pode fomentar ou
não processos que aproximem ou distanciem os educados de aprenderem o “gosto” pelo
conhecimento de determinado conteúdo científico.

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Sendo assim, compreendendo que a palavra “saber” etimologicamente procede


do latim sapere, raíz da palavra “sabor”, a Didática no Ensino Superior viabiliza um
ambiente de construção do conhecimento pautada no “prazer” e não no mero “dever”.
Em contraposição à concepção da Universidade como espaço da ciência fria,
desumanizada, apática e sem emoção, estética e/ou boniteza, “a didática tem que estar
presente de forma significativa dentro de sala, pois desta forma o aprendizado ocorrerá
de forma prazerosa” (Licenciando 11). Mediante essas falas, é possível refletir numa
docência universitária que priorize o aprendizado baseado no prazer para além do dever,
na direção de que os educandos construam os sentidos e significados do aprendido, pois,
[...] A didática é um refazer constante porque só quando iniciei minha
prática que percebi o significado dos estudos e debates dentro da
Universidade. O curso nos cinco primeiros semestres não fazia tanto
sentido, como hoje em dia pela presença ativa da didática na prática
(Licenciando 14).
A fala desse Licenciando permite verificar que o fazer didático é quem permite
ao educador um contínuo refazer da sua prática, permitindo que a prática seja orientada
pela teoria que pode ser redefinida na ação reflexiva. Tal postura do professor evita o
engessamento do seu trabalho pedagógico, aproximando-o de uma pedagogia que
permite aos educandos a construção de sentidos e significados da aprendizagem nas
licenciaturas. Em suma, apesar da perspectiva instrumental de um licenciando quanto à
Didática, o mesmo destacou que “a didática é fundamental para repassar os conteúdos
de maneira adequada priorizando o entendimento dos alunos e a apropriação dos
conteúdos, conceitos e teorias” (Licenciando 7).

Achados da Pergunta 2
Os achados a partir da Pergunta 2, „os saberes necessários para a Docência no
Ensino Superior tendo em vista a (re)significação do fazer docente nos cursos de
licenciatura’, demonstraram que a docência superior precisa transitar pelos saberes de
mediação pedagógica baseada na dialogicidade, no reconhecimento do erro, na
identificação com a docência, no saber experiencial, na pesquisa, no conhecimento
profundo das disciplinas e nas práticas professorais centradas na ética profissional.
Dessa forma, nosso estudo reconhece o que encontramos na literatura, pois “o saber dos
professores é plural e também temporal, uma vez que, [...] é adquirido no contexto de
uma história de vida e de uma carreira profissional” (TARDIF,2002 ,p.19-20).

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Em primeiro lugar, a docência universitária precisa se voltar aos saberes de


mediação pedagógica baseada na dialogicidade e no reconhecimento do erro. Faz-se
salutar à mediação da aprendizagem que encontra nos erros do educandos uma lógica
que busca o acerto. Dessa forma, um dos sujeitos declara:
Acredito que quando o professor se assume como mediador do
conhecimento, deixando de ser o detentor do saber é a base para a
(re)significação do fazer docente nos cursos de licenciatura. A partir
da mudança desta desenvoltura esse professor começa a notar que há
aprendizado e conhecimento no erro (Licenciando 15).
Mediante essa fala, ensinar na Universidade não deve ser uma experiência de
transmissão de uma Ciência acabada, impessoal e vertical, mas um constante (re)fazer
didático que possibilita aos educandos, caminhos de acertos a partir da reflexão coletiva
e sistemática sobre os erros, mediada pelos educadores universitários. Portanto, a aula
enquanto encontro precisa partir do pressuposto que “o mínimo seria uma base didática,
planejada. Os educadores precisariam além de ter o saber, saber transmitir ou ajudar [os
educandos] a construir o conhecimento” (Licenciando 4). Obviamente que o educador
possui uma visão de mundo, ciência e de homem que delimitam seu trabalho
pedagógico, tendo o domínio daquilo que ensina, o que lhe permite uma opinião sobre
determinados assuntos e conceitos de sua área de atuação. Contudo, apesar das
hierarquias das titulações, a humildade pedagógica é o elo entre educadores e educandos
na busca do saber. Mediante essas reflexões, um dos alunos assim se posiciona:
É interessante que alguns professores revejam seu papel. No curso de
Pedagogia, que é o qual frequento, há alguns poucos, professores que
sentem-se (sic) intocáveis, inatingíveis e por isso não interagem
positivamente conosco. É importante, acima de tudo a humildade
(Licenciando 9).
Em segundo lugar, o educador precisa se reconhecer como mediador do
conhecimento na pesquisa e pela pesquisa, pois os saberes da docência universitária
permitem-no “a identificação com a docência, saber sobre sua escolha, se reconhecer
(sic) como docente. Gostar de desafios, perceber o que falta e o que se refaz na ação
docente” (Licenciando 14). Em síntese, é preciso pensar que a Didática no Ensino
Superior permite a construção de saberes docentes que se encontram na relação dialética
entre ensino e investigação científica, um lócus crítico e formativo para a docência na
Academia.
Em terceiro lugar, a docência superior deve se amparar numa postura ética
profissional. Desse jeito, um dos alunos deixou claro que para o exercício do magistério
no Ensino Superior é preciso “domínio e apropriação dos conceitos e teorias

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educacionais, bem como uma postura ética e profissional diante da opinião dos alunos,
mantendo o respeito mútuo” (Licenciando 7). Assim, a docência superior deveria se
fundar nos saberes disciplinares, profissionais, curriculares e de experiência
(TARDIF,2002), de tal forma que todos eles sejam permeados pela ética profissional.
Portanto, “o preparo científico do professor ou da professora deve coincidir com sua
retidão ética” (FREIRE,1996,p.16). Tal postura docente na academia permite ao
educador a ética que é exatamente a medida de coerência entre o seu falar e fazer ao
ensinar uma Ciência na Universidade. Em suma, o educador ao mediar o processo de
aprendizagem, para além de ensinar o que sabe, ensina se si mesmo quando é ético
consigo, com seus educandos e com a seriedade da sua profissão.

Conclusões preliminares
Diante do que o estudo permitiu destacar, é possível fazer algumas inferências
sobre os achados deste trabalho quanto aos limites e as possibilidades da Didática do
Ensino Superior na voz de licenciandos do curso de Pedagogia da UECE, tendo em
vista a (re)significação do fazer docente na Universidade. Entendemos que a análise não
esgota o assunto e não pode ser generalizada para a realidade de todos os cursos de
Licenciatura no Brasil, mas nossa reflexão aponta caminhos que dialeticamente se
encontram no vértice de suas possibilidades e seus limites.
Em primeiro lugar, o Curso de Pedagogia da UECE, campus Itaperi, apresenta
um corpo docente com larga envergadura de formação e produção científica. Contudo,
segundo os relatos dos alunos, é preciso que se construam debates em torno da reflexão
sobre a prática pedagógica dos professores do curso, na busca de um projeto de
formação continuada sobre os saberes da Docência no Ensino Superior. Esta
investigação faz-nos voltar para a necessidade de reflexão epistemológica sobre a
racionalidade pedagógica que orienta o fazer docente dos professores do Curso de
Pedagogia, à luz da prática que vêem desenvolvendo em suas aulas, grupos de pesquisa
e produções científicas. Isso porque a Didática de um professor é a expressão prática de
seu posicionamento teórico, possibilitando à criticidade, fomentando “modelos” e
“influências” para a docência, vislumbrando caminhos para que o educando na
Universidade tenha uma aprendizagem significativa.
Em segundo lugar, é preciso que os debates sobre a Pedagogia sejam acalorados
na academia, tendo em vista o estabelecimento de diálogos interdisciplinares nos cursos
de Licenciatura. Se a Pedagogia é a Ciência da Educação, ela precisa estar presente nos

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Didática e Prática de Ensino na relação com a Formação de Professores

debates sobre a construção dos Projetos-Políticos Pedagógicos das licenciaturas, bem


como ser parâmetro para discussão de um projeto de formação de professores para a
Docência no Ensino Superior. Não basta apenas saber, é preciso aprender a ensinar!
Assim, a docência superior precisa transitar pelos saberes de mediação pedagógica
baseada na dialogicidade, no reconhecimento do erro, na identificação com a docência,
no saber experiencial, na pesquisa, no conhecimento profundo das disciplinas e nas
práticas professorais centradas na ética profissional.

Referências

BOUFLEUER, José Pedro. Pedagogia da Ação Comunicativa: uma leitura de


Habermas. 3.ed. Ijuí, RS,2001.
FORMOSINHO, João. (coord.) Formação de professores: aprendizagem e acção
docente. Porto: Porto Editora, 2009 (Coleção Currículo, Políticas e práticas).
FRANCO, Maria Amélia Santoro. Pedagogia como Ciência da Educação. Campinas,
SP: Papirus,2003.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa.
34.ed. São Paulo: Paz e Terra,1996.
______. Pedagogia da Esperança: um reencontro com a Pedagogia do oprimido. 9. ed.
Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.
LAKATOS, Eva Maria; MARCONI, Maria de Andrade. Fundamentos de
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MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. Textos sobre Educação e Ensino. Campinas, SP:
Navegando, 2011.
NÓVOA, Antônio. Para o estudo sócio-histórico da gênese e desenvolvimento da
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PIMENTA, Selma Garrido; ANASTASIOU, Léa das graças Carmargos Anastasiou.
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de professores. Campinas/SP: Papirus, 2012 (Coleção Magistério: Formação e trabalho


pedagógico)
VEIGA, Ilma Passos Alencastro; SILVA, Edileuza Fernandes da.; XAVIER, Odiva
Silva; FERNANDES, Rosana C. de A. Pós-graduação: espaço de formação pedagógica
de docentes para a educação superior. In: D´ÁVILA, Cristina Maria; VEIGA, Ilma
Passos Alencastro. Didática e docência na educação superior: implicações para a
formação de professores. Campinas/SP: Papirus, 2012 (Coleção Magistério: Formação
e trabalho pedagógico).

i
Fizemos o Estágio de Docência no semestre 2013.2, carga horária de 68 horas-aula, todas as quintas-
feiras no período noturno, no Curso de Pedagogia da UECE, Campus Itaperi, tendo como responsável a
Professora Dra. Maria Margarete Sampaio de Carvalho Braga.

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