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Petição n. 0000147-22.2019.8.24.

0000, Capital
Requerente : Ministério Público do Estado de Santa Catarina
Promotora : Ângela Valença Bordini (Promotora)
Requerido : E. L. F. D.
Advogado : Ricardo Sampaio de Mara (OAB: 49338/SC)
Relatora: Desa. Subst. Bettina Maria Maresch de Moura

DECISÃO INTERLOCUTÓRIA.

Trata-se de Medida Cautelar "Criminal" deflagrada pelo representante do


Ministério Público, tencionando o efeito suspensivo a decisão proferida nos autos n.
0000568-40.2019.8.24.0023, proferida em audiência de custódia, que concedeu
liberdade provisória a ELIAN LUCAS FERREIRA DIAS e em consequência, que seja
decretada a sua prisão preventiva.
É o relato.
Ab initio, pontuo que a medida almejada pelo parquet resta autorizada, em
tese, pelo poder geral de cautela, notadamente a fim de se assegurar a utilidade e
adequação, inclusive temporal, da providência perseguida, sempre com olhos voltados
ao bem comum, segurança e tranquilidade da sociedade.
Neste sentido, elucidativa decisão desta Corte, da lavra do
Desembargador Roberto Lucas Pacheco:

(...) 1. Como é cediço, "a finalidade do processo cautelar consiste em obter


segurança que torne útil e possível a prestação jurisdicional" (LACERDA, Galeno.
Comentários ao código de processo civil. 9. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense,
2006. v. 8. t. 1. p. 12).
Não obstante o rol de provimentos específicos constante do Livro III, Título Único,
Capítulo II, do Código de Processo Civil, a total impossibilidade de previsão exaustiva de
hipóteses que possam reclamar uma tutela de urgência autoriza o uso do poder geral de
cautela (CPC, art. 798). A respeito do tema, anota Alexandre Câmara:
Instituto cuja presença em nosso ordenamento processual vigente é reconhecida
pela totalidade dos doutrinadores, o poder geral de cautela (também conhecido como
poder cautelar genérico) está consagrado no art. 798 do Código de Processo Civil,
segundo o qual, "além dos procedimentos cautelares específicos, que este Código
regula no Capítulo II deste Livro, poderá o juiz determinar as medidas provisórias que
julgar adequadas, quando houver fundado receio de que uma parte, antes do julgamento
da lide, cause ao direito da outra lesão grave e de difícil reparação".
Trata-se, como se verifica pela leitura do dispositivo legal transcrito, de uma
autorização concedida ao Estado-Juiz para que, além das medidas cautelares típicas,
previstas no próprio Código de Processo Civil (como o arresto e o sequestro), ou em
outras leis (como é o caso da medida cautelar fiscal, regulada pela Lei nº 8.397/92),
possa também conceder medidas cautelares atípicas, ou seja, medidas não descritas
abstratamente por qualquer norma jurídica, quando as medidas típicas não se revelarem
adequadas à garantia da efetividade do processo principal.
O poder geral de cautela é instituto considerado necessário em todos os
quadrantes do planeta, e decorre da óbvia impossibilidade de previsão abstrata de todas
as situações de perigo para o processo que podem vir a ocorrer em concreto. Por tal
razão, tem-se considerado necessário prever a possibilidade de o juiz conceder medidas
outras que não apenas aquelas expressamente previstas pelas leis processuais.
[...]
É de se dizer, aliás, que o poder geral de cautela é corolário da garantia
constitucional da tutela jurisdicional adequada. Como visto anteriormente, no estudo dos
princípios gerais do direito processual, a Constituição da República assegura, no art. 5º,
XXXV, a garantia de tutela jurisdicional adequada para todas as situações que sejam
deduzidas perante o Estado-Juiz. [...] Esta garantia se aplica, como é claro, não só aos
casos em que se vai a juízo buscar tutela jurisdicional satisfativa de uma posição jurídica
de vantagem, mas também nos casos em que se quer obter tutela jurisdicional de mera
segurança, destinada a proteger a efetividade da futura tutela satisfativa.
Isto porque, como salta aos olhos, a tutela cautelar, de mera segurança, precisa
ser adequada ao caso concreto, mostrando-se capaz de assegurar realmente a
efetividade do processo principal. Admitir a existência de casos para os quais não
houvesse nenhuma medida cautelar capaz de evitar um dano irreparável, ou de difícil
reparação, para a efetividade do processo seria admitir a existência de casos para os
quais não existiria nenhum meio de prestação de tutela jurisdicional adequada, o que
contrariaria a garantia constitucional (a qual, relembre-se, está posta entre as garantias
fundamentais de nosso sistema político e jurídico) (Lições de direito processual civil. 18.
ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2012. v. 3. p.45-8).
É com base nessa autorização genérica e aberta que provimentos de urgência
das mais diversas naturezas e pretensões vêm sendo ajuizados, apreciados e, por
vezes, concedidos.
Especificamente na seara recursal, tornou-se comum deparar-se com medidas
cautelares visando à concessão de efeito suspensivo a recursos especiais e
extraordinários. A tese foi encampada pelos tribunais superiores e, não raro, encontram-
se exemplos de medidas concedidas para esse fim (STF, Ação Cautelar n. 3.173, rel.
Min. Ricardo Lewandowski, Segunda Turma, j. em 9.4.2013; STF, Ação Cautelar n.
1.708, rel. Min. Dias Toffoli, Primeira Turma, j. em 21.8.2012; STJ, Medida Cautelar n.
20.401, rela. Mina. Marilza Maynard, Quinta Turma, j. em 15.4.2013; STJ, Medida
Cautelar n. 19.398, rel. Min. Humberto Martins, Segunda Turma, j. em 2.10.2012).
Sabe-se que a lei processual civil tem aplicação subsidiária ao processo penal
(CPP, art. 3.º), notadamente à vista das normas gerais de processo previstas no Código
de Processo Civil.
Com fulcro nessas premissas, não vislumbro proibição, em tese, ao manejo de
medida cautelar que vise à concessão de efeito suspensivo ao recurso criminal. (...) (In:
Medida Cautelar n. 2013.015093-4)

Examinando-se o caso com minúcia, resta flagrante a pertinência do


decreto preventivo, ressaltando-se, como na decisão alhures referida, que a situação
melhor se amolda não a suspensão do decisum mas sim, a concessão de tutela recursal
para que a preventiva seja decretada.
Consoante se observa do material coligido aos autos, o fato imputado é
de extrema gravidade, pela inescondível ofensa à tranquilidade pública, uma vez que a
hipótese diz respeito a posse ilegal de arma de fogo de uso restrito e há suspeita
de organização criminosa por vínculo com a facção PGC.
A situação, outrossim, teria sido apurada em diligente ação policial, sendo
que a materialidade e a autoria restaram apontadas no boletim de ocorrência (fls. 4/5 na
origem), nos seguintes termos:

“(...) a guarnição recebeu informação de populares de que uma residência estaria


sendo utilizada como esconderijo de armamento da facção PGC. A guarnição foi
averiguar o local e quando adentrou na rua avistaram um masculino e atitude suspeita,
que ao avistar a guarnição empreendeu fuga para a residência objeto da denúncia. Foi
feito o acompanhamento até a residência em que o masculino entrou , sendo encontrado
no interior um Fuzil plataforma Colt, 556 e 30 munições calibre 556. O masculino foi
identificado como [nome], que foi conduzido até a central para a realização dos
procedimentos cabíveis.”

No mesmo sentido, o auto de exibição e apreensão (fl. 6 na origem).


Presente o fumus comissi delicti e sendo o crime sancionado com pena
máxima superior a 4 (quatro) anos, restam satisfeitos os requisitos para a segregação
cautelar insculpidos nos artigos 312, in fine, e art. 313, I, do CPP.
Relativamente ao periculum in libertatis (art. 312 do CPP, primeira parte),
consoante antecipado adrede, verifica-se pela necessidade da garantia da ordem
pública, notadamente pela gravidade/reprovabilidade do delito imputado e risco a
sociedade como um todo, circunstância esta suficiente para, em sede de cognição
sumária, se decretar a prisão.
Em caso similar, decidiu esta Corte:

HABEAS CORPUS. CRIMES DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA, POSSE ILEGAL


DE ARMA DE FOGO DE USO RESTRITO E FAVORECIMENTO PESSOAL.
CONVERSÃO DO FLAGRANTE EM PRISÃO PREVENTIVA. DECISÃO DEVIDAMENTE
FUNDAMENTADA NA NECESSIDADE DE ACAUTELAMENTO DA ORDEM PÚBLICA.
CONSTRANGIMENTO ILEGAL INEXISTENTE. DENEGAÇÃO DO WRIT. "Se as
circunstâncias concretas da prática do crime revelam a periculosidade do agente e o
risco à ordem pública, justificada está a decretação ou a manutenção da prisão cautelar,
desde que igualmente presentes boas provas da materialidade e da autoria" (STF, HC n.
106.326/BA, Mina. Rosa Weber, j. em 17/4/2012). (Habeas Corpus n.
0002428-19.2017.8.24.0000, da Capital. Terceira Câmara Criminal. Rel. Des. Moacyr de
Moraes Lima Filho. Data do julgamento: 23.01.2018)

Portanto, considerando-se os argumentos supra, é de se deferir o


requerimento ministerial formulado nesta cautelar, liminarmente para, revogando-se a
liberdade provisória, decretar-se a prisão preventiva de ELIAN LUCAS FERREIRA
DIAS.
Ademais, no tocante ao oficiamento ao Comando Geral da Polícia
Militar, contido na decisão de primeiro grau, a ordem resta igualmente suspensa,
uma vez que razoável e plenamente justificável pelas circunstâncias do caso, a imediata
condução do indivíduo, nas condições em que este se encontrava quando do flagrante.
DETERMINO:
1. Observado o adiantado da hora e a urgência da medida a ser
implementada, em nome do bem comum, serve a presente decisão como mandado,
devendo a autoridade policial ou a quem este for apresentado EFETUAR A PRISÃO de
ELIAN LUCAS FERREIRA DIAS, do tipo preventiva, cientificando-o do motivo (incursão
no artigo 16 da Lei 10.826/03), observando-se as disposições do artigo 5º, inciso LXII,
LXIII, LXIV da Constituição Federal.
1.1 Sobrevindo o expediente forense, cadastre-se o mandado no banco
de dados do CNJ, ex vi do art. 289-A do CPP.
1.2 Contate-se a autoridade responsável ou quem a substituir, com
urgência, inclusive mediante contato telefônico.
2. Que seja: a) comunicado o Juízo de origem, bem como o procurador
constituído – Dr. Ricardo Sampaio de Mara (fls. 18/19 na origem); b) concedida vista à
Procuradoria-Geral da Justiça; c) cientificado o Comando Geral da Polícia Militar sobre a
revogação da ordem para esclarecimentos/justificativas.
Intimem-se.

Florianópolis, 20 de janeiro de 2019

Bettina Maria Maresch de Moura


Relatora, em regime de plantão

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