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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO PARANÁ


CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS
CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL

GUILHERME PEREIRA BEZRUTCHKA

PROPAGANDA NO TERCEIRO SETOR:


estudo de estratégias persuasivas em campanhas com fins sociais

CURITIBA
2007
2

GUILHERME PEREIRA BEZRUTCHKA

PROPAGANDA NO TERCEIRO SETOR:


estudo de estratégias persuasivas em campanhas com fins sociais

Monografia apresentada à disciplina de


Pesquisa em Comunicação - Produção de
Monografia como requisito parcial à
conclusão do curso de Comunicação
Social – Habilitação em Publicidade e
Propaganda, setor de Ciências Jurídicas e
Sociais da Pontifícia Universidade Católica
do Paraná.
Orientador (a): Prof.ª Cristina Lemos

CURITIBA
2007
3

Dedico este trabalho à minha tão inexperiente experiência de vida. Dedico-o a todos
que de certa forma fizeram parte do que posso chamar de minha realidade. Todos
que contribuíram em uma metade de tudo que sou. Dedico à atenção com que me
ative a esta monografia à atenção que sempre tive pelo mais profundo
conhecimento.
4

AGRADECIMENTOS

Agradeço este estudo pela oportunidade memorável, concedida pelos meus


pais, de poder concluir mais um dos muitos projetos de minha vida. Também não
poderia esquecer daqueles que de forma indireta contribuíram para o
desenvolvimento dos assuntos e disciplinas apontados aqui. Sou grato à atenção
com que minhas orientadoras Cristina Lemos e Queila Regina dedicaram-se a esse
material científico. Em especial, à minha Professora Mestra Arlene Lopes Sant’Anna
que muito contribuiu para a realização da análise semiótica de campanhas. E em
último e não por isso, desmerecido lugar, à Deus, razão de nossa existência.
5

“Vá aonde o argumento levar”


Sócrates (470 a.C. - 399 a.C.)

RESUMO
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Este trabalho monográfico tem como tema o estudo de estratégias persuasivas em


campanhas com fins sociais. Partiu-se do objetivo geral que consistia na verificação
de quais eram as principais estratégias persuasivas utilizadas em campanhas
televisivas com fins sociais, que têm como tema o combate às diferentes formas de
preconceito. Dessa forma, abordaram-se na fundamentação teórica temas
relacionados à história da comunicação e a contextualização da Publicidade e
Propaganda no Brasil, bem como sua aplicabilidade no Terceiro Setor como uma
ferramenta capaz de interferir no comportamento social. Assim, depois de realizado
o levantamento bibliográfico, realizou-se uma pesquisa de campo com aplicação do
método de análise qualitativa de conteúdo. A partir disso, analisaram-se duas
campanhas televisivas que têm como tema o combate ao preconceito contra o
homossexual e a portadores de deficiência mental. Tais campanhas foram transcritas
no documento científico e interpretadas sob as ópticas semiótica e psicanalítica.
Conclui-se, que as campanhas voltadas ao combate ao preconceito utilizam
estratégias persuasivas sensibilizadoras para mobilizar a população. Embora
apresentem também um apelo racional, o que acontece em geral é a manipulação
por tentação do público por meio de argumentos emocionais, que o faz através da
identificação, conscientizar-se de seu papel social.

Palavras-chave: publicidade e propaganda, estratégias de persuasão, Terceiro Setor,


campanhas sociais.
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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

FIGURA 1: Comparativo da categoria modal, ser/vs/parecer................................39


QUADRO 1: Decoupagem Campanha 1...............................................................44
QUADRO 2: Decoupagem Campanha 2...............................................................54
QUADRO 3: Tabela comparativa das campanhas 1 e 2 .......................................60
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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO.....................................................................................................10
2 PUBLICIDADE E PROPAGANDA .....................................................................12
2.1 Breve História das Teorias da Comunicação ..............................................12
2.2 Publicidade e Propaganda: O conceito........................................................15
2.3 A propaganda no Brasil .................................................................................17
2.4 A linguagem da Publicidade e Propaganda ................................................20
3 A COMUNICAÇÃO E A PROPAGANDA NO TERCEIRO SETOR ...................24
3.1 O Terceiro Setor no Brasil..............................................................................24
3.1.1 Classificação Jurídica das Organizações do Terceiro Setor no Brasil 27
3.1.2 Relacionamento entre os três setores .....................................................27
3.2 A comunicação no Terceiro Setor.................................................................28
3.2.1 A publicidade no Terceiro Setor.................................................................29
3.2.2.1 O processo de adoção de valores nas causas sociais .......................32
3.2.2.2 Cases de campanhas sociais .................................................................33
4 DELINEAMENTO DA PESQUISA DE CAMPO..................................................35
4.1 Critérios para Análise Semiótica ..................................................................37
4.1.1 Signos ..........................................................................................................37
4.1.2 Manipulação.................................................................................................38
4.1.3 Linguagem não-verbal ...............................................................................40
4.1.4 Figurativização ............................................................................................40
4.1.5 Intertextualidade .........................................................................................41
4.2 Critérios para Análise Psicanalítica .............................................................41
4.2.1 A estrutura tripartite da mente ..................................................................42
4.2.2 Mecanismos de Defesa ..............................................................................42
4.3 Corpus para análise do conteúdo ................................................................43
4.4 Campanha 1: Campainha...............................................................................44
4.4.1 Análise Semiótica .......................................................................................46
4.4.1.1 Manipulação .............................................................................................48
4.4.1.2 Linguagem não-verbal ............................................................................49
4.4.1.3 Figurativização .........................................................................................50
9

4.4.1.4 Intertextualidade
................................................................................................................................51
4.4.2 Análise Psicanalítica ..................................................................................51
4.5 Campanha 2: Nunca subestime um Síndrome de Down ...........................53
4.5.1 Análise Semiótica .......................................................................................56
4.5.1.1 Manipulação .............................................................................................57
4.5.1.2 Linguagem não-verbal ............................................................................58
4.5.1.3 Figurativização .........................................................................................58
4.5.1.4 Intertextualidade ......................................................................................58
4.5.2 Análise Psicanalítica ..................................................................................59
4.6 Considerações Finais ....................................................................................60
CONCLUSÃO.........................................................................................................63
REFERÊNCIAS .....................................................................................................65
APÊNDICE .............................................................................................................69
10

1 INTRODUÇÃO

A forma como a publicidade e a propaganda vêm ganhando espaço e


importância dentro das organizações instiga a curiosidade e desperta o interesse e a
motivação para o desenvolvimento desse estudo científico. Atualmente o que se
percebe é uma forte e crescente influência da comunicação na sociedade. A forma
como o próprio sistema tecnológico de comunicação é utilizado por uma elite
detentora de poder para influenciar, manipular e persuadir, mostra o quanto o ser
humano tornou-se vulnerável e suscetível ao poder da mídia. A aplicação de
estratégias persuasivas em campanhas do Terceiro Setor, mais especificamente, é
uma das formas que a propaganda usa para proporcionar mudanças de
comportamento em benefício de causas sociais. Apesar desse assunto ter um
espaço ainda limitado no meio acadêmico, existe a necessidade de uma análise e
reflexão mais profundas como forma de contribuir cientificamente com os estudos já
realizados.
O trabalho monográfico em questão se insere na linha de pesquisa
Comunicação, Educação e Cultura e busca conhecer e entender quais são as
estratégias persuasivas utilizadas em campanhas no Terceiro Setor, questão que
norteia este trabalho. Para tanto, é crucial uma análise mais direcionada às formas
de persuasão que a propaganda tem utilizado no Terceiro Setor. Busca-se
fundamentar empiricamente hipóteses de que, em geral, as campanhas publicitárias
com fins sociais comovem a sociedade através de argumentos apelativos, afetivos e
sensibilizadores, e que o público em geral é mais vulnerável a essa forma
persuasiva do que a outras mais racionais.
Pretende-se, assim, estudar diferentes tipos de estratégias persuasivas em
campanhas do Terceiro Setor, como forma de organizar o pensamento científico e
contribuir intelectualmente para uma análise mais detalhada deste assunto no
âmbito acadêmico.
A relevância prática desse projeto decorre da necessidade de conhecer os
métodos persuasivos utilizados para mobilizar a população e para desenvolver
campanhas publicitárias mais eficientes e eficazes. Para atingir os objetivos
propostos serão utilizados os métodos de levantamento bibliográfico e pesquisa
11

documental, além de análise qualitativa de peças publicitárias televisivas


veiculadas nos anos de 2002 a 2007.
Almeja-se que esse trabalho proporcione uma experiência mais analítica
diante da questão da persuasão publicitária. Nesse sentido, busca-se, portanto,
entender como maximizar o desempenho da propaganda, por meio de um maior
grau de conhecimento e domínio de suas técnicas na promoção de causas sociais.
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2 PUBLICIDADE E PROPAGANDA

2.1 Breve História das Teorias da Comunicação

O processo da comunicação ao longo da história é estudado a partir das


teorias que buscam esclarecer o passado como forma de prever o que virá a ser o
futuro. Uma abordagem complexa e multidisciplinar confere aos estudos de
comunicação um caráter empírico e epistemológico, ou seja, visando sempre à
comprovação ou fundamentação dos processos comunicacionais por meio da
certificação do conhecimento científico.
Marcondes (1996) explica, a partir de conceitos pré-existentes, como
primeiramente as teorias de comunicação apoiavam-se nos estudos sobre massas,
multidão e movimentos sociais. Segundo o autor, para o desenvolvimento desses
estudos foi necessário emprestar conceitos, teorias e informações das mais
diferentes áreas do conhecimento humano, tais como a psicologia, sociologia,
biologia, zoologia, entre outras não menos importantes. O processo comunicativo,
nessa primeira fase, era estudado com ênfase nas massas, ou seja, havia uma visão
unidirecional que traduzia um modelo social no qual se privilegiavam os interesses,
valores e ideologias da classe dominante. Considerava-se que a ação persuasiva e
a manipulação dos meios de comunicação, dominados por uma elite, criava hábitos
de consumo, ocultando e distorcendo a realidade social por meio da negação da
existência de conflitos. Dentro desse sistema persuasivo, o receptor adquiria um
caráter passivo, impedindo-o de participar da sociedade na decisão da escolha da
programação e da mensagem à qual estava sujeito.
Historicamente, as escolas funcionalistas ficaram conhecidas por sua
abordagem positivista, na qual o objeto de estudo era a mensagem na comunicação
de massa. O surgimento dessa corrente teórica data da década de 30 e sua técnica
de investigação empírica dava ênfase aos instrumentos intermediários da
comunicação, ou seja, à mensagem.
Sebeok (in RECTOR; NEIVA, 1995, p.51) revela que o funcionalismo buscava
compreender as organizações das sociedades, principalmente as mais primitivas: “A
implicação desta forma de encarar a comunicação é que a capacidade de geração
de mensagem e do consumo de mensagens, que é comumente atribuído aos
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humanos, pressupõe-se aqui que esteja presente nas formas mais humildes da
existência...”. O objetivo dos teóricos funcionalistas, portanto, era avaliar o alcance
dos meios de comunicação junto ao público, analisando a influência desses meios
no comportamento das massas, no nível da cultura de massas e na utilização
política desses meios. Buscava-se compreender o efeito do conteúdo das
mensagens nas diversas formas sociais, não deixando de lado costumes e
tradições.
Percebeu-se, entretanto, que essas teorias tinham como ênfase o emissor e
descartavam os contextos no qual o indivíduo ou a própria massa estavam inseridos.
Em seguida, atendendo a necessidades não sanadas por essa importante fase no
marco teórico das comunicações, surgem os primeiros trabalhos sobre persuasão
nos meios de comunicação.
Posteriormente a essa abordagem científica vieram os estudos que tinham
como objeto de análise o destinatário, ou seja, aquele a quem se envia a
mensagem. De acordo com Marcondes (1996, p.70), “os meios não são decisivos,
aspiram mas não conseguem facilmente manipular, instituem hábitos mais
passageiros e epidérmicos, são operados por pessoas do mesmo tipo que as que
recebem a comunicação.”. Assim, subtraía-se uma parte da importância da
autonomia do emissor e os colocavam a um nível de igualdade, já que aqueles eram
tão suscetíveis à manipulação quanto esses. Por essa razão, as principais correntes
teóricas dos estudos de recepção estavam voltadas aos estudos de comunicação de
massa, comunicação popular, à análise dos programas de informação, suas
respectivas mídias e os próprios estudos das audiências, que levavam em conta as
representações de gêneros (feminino/masculino), de classe social e de grupos
étnicos.
A Escola de Frankfurt, marco nos estudos de comunicação, teve início nos
anos 30 na Alemanha, deu importância ao sujeito histórico e se propôs a estudar o
sistema de produção em série, a exploração comercial dos bens culturais e a própria
deteriorização dos padrões culturais. O rebaixamento do nível dos bens artísticos
para adequação aos padrões da massa consumidora, e a forma como que os
produtos culturais da ideologia da classe dominante revelavam a passividade dos
receptores ao aceitarem um nível superior de cultura, também foram processos
analisados por essa corrente histórica.
Marcondes (1996), ao apontar a visão dos teóricos da época, afirma que:
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Para eles o que importava era todo o complexo expressivo da


comunicação formado pela comunicação. A lógica dominante era a dialética
e o valor básico era o sujeito histórico capaz de interferir em seu meio.
Conceitos como alienação, repressão, dominação e depois totalitarismo e
mundo administrado passaram a ser trabalhados. [...] Daí o engajamento
nas correntes de oposição para fazer com que as “massas populares”
executassem uma “contracomunicação” e assim interferissem no processo
comunicacional. (MARCONDES, 1996, p.70)

Os meios de comunicação eram considerados, portanto, a expressão das


relações de poder da qual os destinatários eram vítimas da ideologia dominante.
Passou-se a encarar o indivíduo como parte integrante de um contexto social e não
mais a partir de uma visão individualista da realidade.
No final dos anos 70 surge a Escola Evolucionista Progressista nos EUA e
Inglaterra, que passou a estudar a comunicação não mais como uma ligação entre
mundos, sociedades ou indivíduos, mas como uma indústria na qual o principal
produto é a cultura. A Revolução Industrial e conseqüentemente o aparecimento dos
primeiros meios de comunicação de massa foi o foco principal para que essas
teorias se desenvolvessem. A teoria propõe que as novas tecnologias acabaram
submetendo e inferiorizando o pensamento humano a uma realidade idealizada, ao
passo que agora não é o homem que comanda a máquina, mas a máquina que
controla o homem e seus sentidos.
Atualmente os estudos de comunicação estão voltados aos sintomas pós-
modernos que influenciam e proporcionam a comunicação unilateral. Agora,
acredita-se que os valores apreendidos pelo ser humano são aqueles propostos
pelos meios, ou seja, consumismo, conformismo, hedonismo, entre outros não
menos importantes. Como Marcondes (1996, p. 71) explica “... o excesso produz
exatamente a perda de informação.” A repetição e a redundância tornaram-se a
garantia de que a mensagem vai ser compreendida. Sob esse ponto de vista, o ser
humano doutrinado não pensa e não se comunica, apenas reproduz os comandos
que lhe são impostos. O desenvolvimento explosivo na atualidade caracteriza um
modelo social que precisa ser repensado sob o ponto de vista tecnológico. É preciso
compreender qual seria a melhor maneira para proporcionar que tais eventos sejam
menos teóricos e passem a se tornar uma prática.
Contudo, dentro de todo esse contexto comunicacional observou-se que, a
publicidade e propaganda como uma área tecnológica complexa da comunicação,
passou também por grandes transformações teóricas. Mattelart (1999) explica que, o
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domínio da comunicação na sociedade moderna implica, não somente, na


difusão da informação como também, a mercadologia de produtos. A comunicação
vista como uma rede que conecta indivíduos nas diferentes partes do mundo
construíra um esquema horizontal de persuasão. O desenvolvimento da técnica
publicitária aparece então, como conseqüência das inovações das teorias da
comunicação e da necessidade de estabelecer um sistema cognitivo humano capaz
de movimentar um sistema ainda maior que é o próprio capitalismo.

2.2 Publicidade e Propaganda: o conceito

As expressões publicidade e propaganda possuem definições conceituais


similares e em alguns casos são usados como sinônimos. Por mais que a distinção
entre os dois termos exista, na prática o que se percebe é que tanto um quanto o
outro convergem para um mesmo conceito. Entretanto, como forma de
esclarecimento, cabe aqui definir e diferenciar os dois conceitos já que são motivo
de discussões e desentendimentos entre os autores da área.
Segundo Malanga (1979), a propaganda se origina da propagação de
princípios, doutrinas religiosas e princípios políticos. Conforme o autor, é o conjunto
de esforços que tendem a influenciar o homem no campo religioso, político ou cívico.
Dessa forma, conceitua-se propaganda como “a propagação de idéias, mas sem
finalidade comercial” (MALANGA, 1979, p. 10). A propaganda, portanto, promove
uma idéia, valores ou conceitos despertando no receptor um desejo que leva a uma
ação.
Por outro lado, conforme afirma Sampaio (1997, p.11) propaganda pode ser
conceituada como “a manipulação planejada da comunicação visando, pela
persuasão, promover comportamentos em benefício do anunciante que a utiliza.”. O
autor afirma ainda que:
Geralmente, cabe à propaganda informar e despertar interesse de
compra/uso de produtos/serviços, nos consumidores, em benefício de um
anunciante (empresa, pessoa ou entidade que se utiliza da propaganda).
(SAMPAIO, 1997, p.12)

Kotler (1931, p. 409) diz que “a propaganda é um dos quatro instrumentos


pelos quais a empresa dirige as comunicações persuasivas para compradores e
públicos visados”. Sua função é facilitar a compra, fornecendo informações a
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respeito de um produto / serviço como forma de instigar o consumo,


proporcionando a preferência a produtos de determinadas empresas.
A publicidade, por sua vez, é definida como a “arte de despertar no público
o desejo da compra, levando-o à ação” (MALANGA, 1979, p. 11, grifo do autor). O
autor entende como publicidade, portanto, o conjunto de esforços em prol do
aumento das vendas de uma atividade comercial.
A visão mercadológica de Kotler (1931) aponta para três qualidades distintas
da publicidade:

1. Alto grau de veracidade. Os artigos de jornais e as reportagens parecem


aos leitores relatos autênticos, originados das pesquisas da própria mídia.
Portanto, os leitores provavelmente considerarão os artigos de jornais sobre
produtos e empresas como tendo um grau mais alto de veracidade do que
se aparecessem patrocinados por um vendedor.
2. Estar desprevenido. A publicidade pode atingir muitos compradores em
potencial que, de outra forma, evitam os vendedores e as propagandas. Isto
acontece porque a mensagem está embalada de tal maneira que o atinge
como uma notícia, em vez de uma comunicação direta de vendas.
3. Dramatização. A publicidade tem, como a propaganda, potencial para a
dramatização de uma empresa ou de um produto. (KOTLER, 1931, p.400)

Malanga (1979) faz uma diferenciação entre os termos publicidade e


propaganda e aponta similaridades. Para o autor, a propaganda possui conteúdo
ideológico, valores, conceitos, sentimentos morais, cívicos, religiosos e políticos,
dirigidos ao indivíduo. A publicidade, por outro lado, possui finalidade comercial,
instiga sentimentos de prazer, conforto, instinto de conservação e é voltada ao social
ou “à massa”, como mesmo define o autor.
No contexto do marketing, os conceitos de publicidade e propaganda são
aplicados de forma diferenciada dentro do conceito de promoção. Segundo Kotler
(1931), o marketing é dividido em quatro áreas: produto, preço, ponto de venda e
composto de promoção. Os chamados 4 P’s auxiliam no entendimento e
gerenciamento de uma organização, possibilitando uma visão mais abrangente e
operacional das atividades organizacionais. O composto de promoção, portanto, “...
é apenas uma das várias maneiras de estimular as vendas de uma empresa...”
(KOTLER, 1931, p. 401).
De acordo com o autor, a promoção pode ser considerada como forma de
potencializar e agregar valor ao sentido racional da compra. Dentro desse composto,
encontram-se ainda: promoção de vendas, vendas diretas, marketing direto,
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merchandising e comunicação social, todos colaborando para que a finalidade


maior da promoção possa ser atingida de forma eficaz e eficiente.
A publicidade e propaganda, as relações públicas e a assessoria de imprensa
são habilitações de comunicação social e interagem com o objetivo de persuadir,
divulgar a imagem desejada da organização e informar a existência de um produto
e/ou serviço que esteja à disposição no mercado. Dessa forma, percebe-se que, em
um contexto mais abrangente, publicidade e propaganda são ferramentas do
composto promocional que auxiliam na maximização de vendas e propagação de
valores e idéias.

2.3 A propaganda no Brasil

Conforme a Associação Brasileira de Propaganda (ABP, 2007), o passado da


propaganda serve de base para acompanhar a evolução de um processo de
consumo ao longo do tempo: “A história da propaganda revela não apenas a ‘ponta
final’ da cadeia produtiva, o consumo propriamente dito, mas também os modos de
vida, os valores e as formas de viver de setores da sociedade”.
De acordo com Malanga (1979), a história da propaganda no Brasil começou
em 1808, com o aparecimento do primeiro jornal brasileiro, a Gazeta do Rio de
Janeiro. Os primeiros anúncios dispunham-se a descrever e elucidar acontecimentos
da época e constituíam-se de formatos precários de reclames. O domínio sobre a
técnica publicitária era limitado e pouco profissional.
Historicamente, a Revolução Industrial veio contribuir com a expansão do
processo publicitário em vários países. A produção em massa precisava atender o
mercado consumidor e a publicidade, até então “... considerada sob aspecto
negativo, isto é, fazia propaganda quem tinha artigos que não prestavam ou que
estivessem encalhados.” (MALANGA, 1979, p.20), sofreu modificações para poder
contribuir neste processo de consumo. Assim os veículos de comunicação
passaram a atender não mais a um pequeno número de consumidores, mas sim a
uma demanda latente, ou seja, à massa. Surgiram os primeiros cartazes de rua,
panfletos e murais impressos como sinal de uma produção em massa.
Segundo Ramos (1995), as primeiras revistas começam a surgir a partir de
1900. As novas tecnologias de impressão e a importação de máquinas serviram de
apoio para uma maior divulgação desses periódicos, além da renovação dos
18

formatos que passaram a ser coloridos e ilustrativos e tinham na charge, soneto


ou crônica social a atenção necessária do público para mantê-los em circulação.
Na seqüência desses acontecimentos históricos surge no Brasil em 1922 um
novo instrumento de comunicação: o rádio. De acordo com Malanga (1979), naquela
época o rádio tinha um caráter cultural e educativo. Não se aceitava a divulgação de
anúncios e por esse motivo pode-se dizer que o rádio surgiu sem influência política e
comercial. Mas, na medida em que os programas foram se aperfeiçoando, os
recursos disponíveis se tornaram insuficientes para mantê-los. Foi preciso apoio
financeiro externo para que o rádio continuasse a manter seu padrão de qualidade. A
princípio houve algumas restrições quanto ao tipo de publicidade veiculada, mas
progressivamente os anúncios tomaram conta desse veículo, quase sempre
desconsiderando a opinião e gosto do ouvinte.
A Associação Brasileira de Propaganda (ABP, 2007) revela que no rádio:

Dez por cento de sua programação era constituído de propaganda


comercial. O alcance era imenso e o consumidor em potencial não
precisava ser letrado, como o leitor das revistas, acostumado aos longos
textos dos anúncios impressos. Esse veículo foi fundamental para a difusão
das realizações e do ideário do governo Vargas, que, já em 1931, dando
início à organização da propaganda política no plano nacional, criou o
Departamento Oficial de Publicidade, precursor do poderoso Departamento
de Imprensa e Propaganda (DIP), fundado em 1939. Nesse contexto, em
julho de 1937, foi criada a ABP – Associação Brasileira de Propaganda –,
cujos membros já tinham consciência da importância e da especificidade de
sua atividade na engrenagem da economia e da vida brasileiras. Entre seus
fundadores, jornalistas e publicitários, estavam Cícero e Eugênio Leuenroth,
Roberto Marinho e Assis Chateaubriand. Seus presidentes atuavam tanto
em agências de propaganda como em órgãos de imprensa, merecendo
menção o fato de o terceiro dirigente da entidade, Licurgo Costa, ser
oriundo dos quadros do DIP. Pode-se dizer que a ABP foi a primeira
instituição a dar um caráter associativo, profissional e político mais claro à
atividade da propaganda no Brasil.

Percebe-se que o rádio permitiu uma maior organização das atividades


publicitárias a ponto de se construir um ambiente propício à aceitação e
profissionalização dessas áreas. Também acompanhou as transformações sociais e
políticas da época, bem como se beneficiou desses acontecimentos históricos para
tornar-se um meio mais popular.
De acordo com a Associação Brasileira de Propaganda (ABP, 2007), após a
Segunda Guerra Mundial e com o avanço financeiro brasileiro, o chamado “milagre
econômico”, surge no país um novo veículo de comunicação, a televisão. Não
demorou muito para que a TV fizesse parte do ambiente familiar e em 1970 já era
19

considerada um bem efetivamente presente na vida dos brasileiros. Assim, esse


veículo proporcionou um efeito mais direto e freqüente da publicidade na vida e nos
lares dos consumidores. O avanço tecnológico daquela época também pode ser
notado pela produção de bens de consumo duráveis como automóveis e
eletrodomésticos. Nesse sentido, a televisão contribuiu para uma mudança de hábito
de consumo, proporcionando a divulgação desses bens e conseqüentemente seu
consumo. A televisão também proporcionou uma evolução no conteúdo das
mensagens, voltando-se mais ao condicionamento social do que ao individual e ao
apelo às emoções, afastando-se da linguagem e argumentação racional. Com todo
este avanço no aparato tecnológico comunicacional surgiu então a necessidade de
se instrumentalizar o setor publicitário. O Código de Defesa do Consumidor surgiu
como forma de regulamentar as atividades publicitárias e defender os direitos dos
consumidores que até então estavam sujeitos aos comandos, ordens e
manipulações da publicidade.
Ramos (1995) acrescenta que, no decorrer dos anos, a publicidade e a
propaganda tiveram uma expansão em termos de abrangência e o aperfeiçoamento
de suas técnicas foi crucial para registrar seu desenvolvimento. Hoje, o que se
percebe é que cada vez mais a propaganda se torna pontual e segmentada em suas
atuações. Novos formatos publicitários e novas mídias contribuem para que todo
esse processo forneça os subsídios necessários para a implementação de uma nova
cultura de consumo. Como define Sant’Anna (1995, p. 5) a propaganda “Tornou-se
hoje um fenômeno econômico e social capaz de influenciar e modificar os hábitos de
uma população em seu conjunto.”
Mostrou-se, assim, um resumo do trajeto e a evolução da publicidade e dos
próprios veículos de comunicação ao longo dos anos no Brasil, além da importância
da comunicação no próprio sistema econômico brasileiro como fator crucial para
impulsionar o mercado ao consumo.

2.4 A linguagem da Publicidade e Propaganda

Partindo do conceito proposto por Sebeok (in RECTOR; NEIVA,1995, p. 50)


de que “... a comunicação pode ser vista como a transmissão de qualquer influência
de uma parte do sistema vivente para outra, produzindo mudança.”, pode-se
observar que a relação entre os seres humanos constitui-se a partir da transmissão
20

de mensagens e que estas podem ser classificadas fundamentalmente como


verbais e não verbais.
As mensagens não verbais, para o homem, implicam em uma forma de
comunicação mais primitiva, decorrente da manifestação de elementos intrínsecos,
próprios ao ser humano, tais como expressões faciais que revelam o humor ou
movimentos corporais que indicam a maneira como o indivíduo se comporta em
determinados locais, entre outros fatores. Tais elementos servem de suporte à
transmissão de uma mensagem não verbal, ou seja, que não depende da linguagem
para ser compreendida pelo receptor. Já o campo das mensagens verbais é
constituído pela presença da linguagem. Esta fornece os elementos lingüísticos
necessários para que ocorra a comunicação entre seres humanos.
Segundo Carvalho (1996, p.09), a linguagem verbal e não verbal é um
importante fundamento da linguagem publicitária: “Devemos considerar que, na
realidade, a linguagem publicitária usa recursos estilísticos e argumentativos da
linguagem cotidiana, ela própria voltada para informar e manipular.” Cabe aqui
aproximar dois termos já definidos por este estudo monográfico - linguagem e
publicidade e propaganda - com o intuito de esclarecer com que freqüência, na
prática, ambos têm sido utilizados em conjunto para fomentar e sustentar a
argumentação publicitária. De acordo com o autor, a mensagem publicitária em geral
constitui-se de uma realidade fantasiosa, conciliando o princípio do prazer com a
realidade. Os argumentos dessa forma de comunicação criam na sociedade uma
cultura voltada para o consumo. E, ao mesmo tempo em que banaliza um produto, a
publicidade enfatiza a sua importância dentro de um vasto mercado de consumo.
Assim, vê-se obrigada a valorizá-lo e diferenciá-lo com a finalidade de fazer do
produto/serviço uma necessidade quase vital para o consumidor.
Nesse contexto há muito tempo a publicidade deixou de lado sua propriedade
racionalista e objetiva passando a utilizar-se da persuasão e sedução para
potencializar seu poder de manipulação. O homem passou a viver em função das
ofertas promovidas pela publicidade e, como esclarece Carvalho (1996, p. 12), “...
possuir objetos passa a ser sinônimo de alcançar a felicidade.”.
Segundo Carvalho (1996), a forma como os recursos lingüísticos são
empregados em anúncios publicitários evidenciam um argumento consolidado capaz
de influenciar o ser humano sem que este perceba o quanto está sendo manipulado.
21

O reforço do individualismo na mensagem publicitária dá ao receptor a sensação


de que é único entre um vasto universo.
Por meio de uma linguagem autoritária caracterizada pelo uso do modo verbal
no imperativo, a publicidade e propagada dá ordens sutis, nem sempre deixando
transparecer suas verdadeiras intenções. A língua, nesse caso, fornece à mensagem
todos os recursos necessários para se fazer entender diante de um grande número
de receptores. A forma como a linguagem foi trabalhada durante a elaboração de um
anúncio dão ao argumento consistência e embasamento necessários para não gerar
dúvidas na mente do consumidor no ato da compra, e a mensagem publicitária
convence o consumidor a um nível consciente e até mesmo inconsciente.
Segundo Bock; Furtado; Teixeira (1999), o cotidiano desestimulante, as
restrições e repressões de ordem moral e cultural que afetam o homem na
sociedade em que está inserido, são elementos que o fazem encarar sua rotina de
forma conformista. As vontades e desejos humanos tornam-se elementos
secundários na vida do indivíduo. Porém, tais elementos, reprimidos
conscientemente, são absorvidos pelo inconsciente, que lhe atribui sentido e valor. A
publicidade, compreendendo o contexto acima, apresenta-se como possibilidade de
realizar os desejos mais profundos do homem. O discurso publicitário oferece um
objeto de desejo imaginário e que possui relação inconsciente. Dessa forma, o
produto torna-se uma projeção tangível do desejo inconsciente, não sendo motivo de
restrições. Entretanto, o consumidor tendo consciência apenas da parte operacional
e racional da compra, deixa de lado o caráter intrínseco do anúncio, negando que
este possa exercer alguma influência sobre sua compra.
Malanga (1979) revela que a construção da mensagem na publicidade e
propaganda primeiramente tem por função chamar a atenção, para posteriormente
despertar o interesse, desejo e, finalmente, levar o receptor a uma ação de compra.
Sob outro ponto de vista, Sant’Anna (1995) diz que a publicidade, com seu
discurso, tem como finalidade influir no comportamento do consumidor. E para que
isso aconteça é necessário conhecê-lo antes, entendendo quais são suas
necessidades básicas, hábitos, cultura, desejos e ambições. Percebe-se, portanto,
que a necessidade de conhecer o receptor é uma tarefa que envolve não só um
indivíduo, mas o conjunto deles, ou seja, a massa.
Sabe-se ainda que na sociedade o comportamento humano é ditado a partir
das percepções que se têm daqueles que os antecederam, ou seja, o homem dentro
22

de uma sociedade tende a agir conforme o comportamento observado no


passado. Por essa razão é que se pode discernir um indivíduo típico ou
estereotipado incluso em um meio social. Uma vez identificado, a publicidade volta
sua mensagem a esse denominador comum que representa seu coletivo em termos
de suas necessidades e desejos. O autor também afirma que o argumento
publicitário:

• ...atua sobre a repetição. Tanto ouvimos um conceito que acabamos


acreditar em sua veracidade. Repetir é provar.
• Atua pela convicção – Quem fala com convicção, quem tem
confiança naquilo que diz, tem mais probabilidade de sugestionar. O
redator deve usar o entusiasmo para escrever.
• Atua pela atmosfera – A atmosfera que circunda um objetivo ou que
emana do anúncio é um veículo sutil de sugestão, desde que
adequada ao produto enunciado. (SANT’ANNA, 1995, p.92-93, grifo
do autor)

Observa-se que o convencimento publicitário está ligado à maneira como


envolve os consumidores e lhes convence de que devem agir de uma determinada
maneira. É preciso colocar o consumidor freqüentemente em contato com a
mensagem publicitária para que se fomente a idéia e desejo de compra e não se
tenha a sensação de que um produto está sendo oferecido.
Kotler (1985) explica que a comunicação persuasiva desenvolve seu discurso
no sentido de conseguir um retorno esperado e pré-estudado sobre um
comportamento do público visado. Nesse processo persuasivo pode-se perceber
que todos os objetivos são avaliados a partir de sua aplicação no passado. Os
modelos de comunicação mais antigos ainda têm grande influência sobre a
comunicação moderna. Avaliar e readaptar conceitos antigos são funções da
publicidade e propaganda como forma de maximizar seu poder persuasivo. Nesse
sentido a linguagem serve de base, à publicidade, para que se possa ter controle
sobre um comportamento visado.
Como define Sandmann (2001, p.12) “A linguagem da propaganda se
distingue... pela busca de recursos expressivos que chamem a atenção do leitor...
nem que para isso se infrinjam as normas da linguagem padrão...”.
23

3 A COMUNICAÇÃO E A PROPAGANDA NO TERCEIRO SETOR

3.1 O Terceiro Setor no Brasil

Conforme o relato setorial da Área de Desenvolvimento Social e Gerência de


Estudos Setoriais (AS/GESET/ BNDES, 2001), a existência de entidades sem fins
lucrativos data do final do século XIX. Nas décadas de 60 e 70 a formação e
consolidação dessas organizações permitiu que nos anos 80 e 90 seu crescimento e
visibilidade. O papel dessas organizações serviu na história para impulsionar os
movimentos e aspirações sociais e políticas da população brasileira.
Segundo a AS/GESET/BNDES (2001), as antigas organizações nacionais de
cunho social estavam mais ligadas à prática religiosa. A Igreja Católica controlava
24

as ações e as entidades que atuavam nesse setor com a ajuda e suporte do


Estado. Assim, dessa parceria entre Igreja e Estado surgiu a necessidade de uma
outra ferramenta de apoio para atender questões sociais que ainda hoje se fazem
presentes na sociedade.
A partir do século XX outras religiões passaram a desempenhar papel
semelhante ao da Igreja Católica na realização de ações sociais por considerarem a
caridade elemento crucial das atividades religiosas. Mais tarde, a industrialização, a
urbanização e o próprio desenvolvimento brasileiro influíram no aparecimento de
novas entidades, muitas ainda atreladas ao Estado, dispostas a atender a antigas e
novas necessidades sociais decorrentes desses movimentos. Posteriormente, surgiu
a necessidade de profissionalizar o setor, já que não se podia mais visualizar
totalmente sua participação e representação no âmbito social, por conta das
inúmeras organizações existentes. Por meio de uma legislação nova e própria para
o Terceiro Setor, a partir do final dos anos 90, foi possível ter maior noção da
participação dessas entidades na própria atuação direta no ambiente social.
De acordo com AS/GESET/BNDES (2001), após a ditadura militar e com a
consolidação da prática democrática no Brasil, por meio do fortalecimento de
movimentos sociais, urbanos, políticos e sociais, houve aumento na atuação e
participação mais efetiva das entidades filantrópicas no país. E, em face das
dificuldades no crescimento socioeconômico no Brasil da época, o número dessas
organizações elevou-se, principalmente em função da necessidade de novas
práticas de atuação social. Para atender a essas necessidades, que se
caracterizavam pela pluralidade de movimentos sociais, surgiram entidades
diferenciadas na forma de atuação, objetivos e na própria trajetória social. A
aprovação de uma nova Constituição em 1988, deu espaço à mobilização social e à
introdução de novos direitos na área trabalhista. Essa expansão na área social
permitiu a descentralização na promoção das políticas sociais, surgindo novas
demandas em potencial e espaço no mercado para atuação institucional de outras
organizações interessadas.
Segundo a AS/GESET/BNDES (2001), atualmente, o que se percebe é um
espaço ampliado de atuação no Terceiro Setor. A redução de recursos financeiros
advindos do exterior influenciou a busca de novos investidores e colaboradores em
função das necessidades de investimentos no aumento da profissionalização e na
capacitação institucional. A participação do setor privado ou empresarial em
25

programas e projetos sociais também surgiu como resposta às aspirações


financeiras das organizações não governamentais. A qualificação jurídica específica
para o setor e as novas relações entre essas entidades e o setor público e privado
evidenciam uma modernização da prática e gestão dessas instituições.
Teodósio (2001) revela que, para atender a atual demanda social, as
organizações do Terceiro Setor atuam cada vez mais em conjunto com as entidades
privadas e públicas. Na sua opinião, os recursos financeiros advindos dessa parceria
são melhor administrados em função das instituições de cunho social possuírem:
- Maior proximidade do cidadão, entendendo suas reais necessidades;
- Maior agilidade no mercado, pois têm estruturas organizacionais mais ágeis já que
possuem incentivos legais do Estado facilitando sua rápida adaptação no contexto
social, político e econômico;
- Melhor utilização dos recursos financeiros, possibilitando o desenvolvimento da
cidadania, envolvendo a comunidade nas causas defendidas e fazendo com que as
mesmas valorizem as soluções apontadas e contribuam para as mudanças sociais.
Dessa forma, o Terceiro Setor também gera empregos e renda, possibilitando
um maior controle dos recursos administrados pelo Estado. Além de servir como
órgão de controle do Estado, podendo inclusive cobrar a execução de políticas
públicas, influindo nos processos decisórios do Legislativo e/ou executivo.
Percebeu-se, portanto, a partir do o relato setorial da Área de
Desenvolvimento Social e Gerência de Estudos Setoriais (AS/GESET/BNDES,
2001), que com a operacionalização do Terceiro Setor, novas fontes de
investimentos surgiram, e a credibilidade e a visibilidade das suas instituições
permitiu que fossem vistas como sinônimo de transparência de ação, melhoria de
qualidade e investimento tanto privado quanto público. Hoje o que se observa é a
discussão de novas tendências em relação ao papel social e aos desafios e
potencialidades dessas organizações.
Além disso, Clemente (2006), aponta os problemas de desvios de recursos
em organizações do Terceiro Setor em função do aumento do número de instituições
que se dizem de fins sociais e de algumas que ainda nem possuem registro nos
órgãos federais. Assim, devido a esse crescimento, fica difícil estabelecer uma
fiscalização mais ativa frente a essas iniciativas sociais. A autora coloca ainda que,
o governo fiscaliza apenas a intenção das ONGS e não se elas trabalham em função
do interesse público. Clemente (2006) explica ainda que no Brasil:
26

As prestações de contas das ONGs se limitam a ser publicadas no Diário


Oficial. Nos EUA, há mais transparência. Lá, as ONGs não têm direito a sigilo
nas declarações do Imposto de Renda. Também são obrigadas a informar os
cinco maiores salários, onde aplicam os recursos e os cinco principais
contratos com fornecedores. (CLEMENTE, 2006)

Percebe-se que, a explosão crescente dessas organizações aliada a falta de


leis mais ativas no que desrespeita a fiscalização permite que a corrupção se torne
freqüente. A falta de transparência na administração das verbas destinadas à
finalidades sociais influenciam o crescente aparecimento de organizações
preocupadas em desviar recursos, fazer caixa dois de campanhas eleitorais e
aproveitar reivindicações de minorias para acusar e desmoralizar empresas.
Porém, Clemente (2006) indica o Ministério Público do Rio de Janeiro como
referência pela criação de um grupo de fiscalização de entidades do Terceiro Setor.
Embora ainda muito limitado, o trabalho do grupo já reuniu informações sobre 11
entidades suspeitas. Por conta disso, iniciaram-se reuniões em diversos estados
para esclarecer as instituições de cunho social sobre formas de prestar contas.
Acredita-se portanto, que somente a partir de novas e rigorosas medidas judiciárias
preventivas tais grupos possam adquirir autonomia no que desrespeita controle das
finanças públicas dirigidas ao Terceiro Setor.

3.1.1 Classificação Jurídica das Organizações do Terceiro Setor no Brasil

Segundo Menegasso (2001), as organizações do Terceiro Setor são


conhecidas juridicamente como entidades sem fins lucrativos e existem duas
distinções dentro dessa categoria, denominadas fundações e associações. As
fundações representam os projetos e programas ligados ao patrimônio empresarial,
físico e privado, enquanto as associações têm a sua origem na união de grupos
empresariais ou de pessoas.
O que acontece no meio jurídico, ao se tratar do Terceiro Setor, é que as
organizações podem ainda ser qualificadas como: Organizações da Sociedade Civil
e de Interesse Público (OSCIP), de Utilidade Pública (UP) e de fins Filantrópicos.
De acordo com o relato setorial da Área de Desenvolvimento Social e
Gerência de Estudos Setoriais (AS/GESET/BNDES, 2001), a classificação de OSCIP
se dá pela realização organizacional de atividades relacionadas com a assistência
27

social, atividades culturais, defesa e conservação do meio ambiente, promoção


do voluntariado, dentre outras. Já as organizações que possuem o título de Utilidade
Pública dedicam-se a fins mais imediatos, assistencialistas e projetos voltados ao
combate à fome, desnutrição, entre outros. As organizações que recebem o título de
Filantrópica, por sua vez, prestam assistência social, recebem incentivos fiscais,
imunidade tributária e isenção de pagamento de imposto de renda, desde que
apliquem seus recursos dentro do país, na manutenção da própria instituição e de
seus objetivos, não distribuindo parcela do patrimônio ou rendas como lucro.

3.1.2 Relacionamento entre os três setores

Teodósio (2001) explica que o Terceiro Setor se constitui em uma prática que
visa sanar uma necessidade da sociedade em geral, a qual não possua valor
mercadológico e da qual o governo não consiga dar conta de atender. Percebe-se,
portanto, que esse setor atua no espaço público para solucionar problemas sociais
com mais agilidade e eficiência que os outros setores da economia. Ao mesmo
tempo, o Estado, o Mercado e as entidades sem fins lucrativos e de cunho social
podem e devem também se relacionar, por meio de recursos, apoios, parcerias,
subsídios financeiros e metodologias, contribuindo e ao mesmo tempo beneficiando-
se das causas sociais defendidas. Surgem, assim, novas posturas relacionadas ao
Terceiro Setor, tais como: Responsabilidade Social, filantropia, comprometimento
social, investimento social entre outros termos.
Segundo o autor, cabe ao Terceiro Setor atuar em conjunto com o Estado
(Primeiro Setor) e/ou a iniciativa privada (Segundo Setor) para captação de
recursos, controle político, combate à corrupção, entre outras motivações. Porém, as
empresas que contribuem e colaboram na promoção dessas causas, além de
incentivos fiscais, podem atrelar à sua marca os projetos desenvolvidos em parceria
com o Terceiro Setor, como forma de agregar uma visão positiva à sua imagem.

3.2 A comunicação no Terceiro Setor

Conforme Gerzson (s/d), a comunicação no Terceiro Setor é uma importante


ferramenta para que as instituições sem fins lucrativos tornem-se públicas,
auxiliando na difusão da sua imagem institucional e ampliando o campo de atuação
28

para os próprios profissionais da área. Para que isso ocorra, é preciso haver uma
integração entre as áreas da comunicação tais como publicidade e propaganda,
assessoria de imprensa, relações públicas entre outras.
Dessa forma, Endo (s/d) afirma que a união desses esforços de comunicação
resulta em ações, estratégias e planejamentos que geram valor à marca institucional
junto ao público ou à sociedade como um todo. Assim, será facilitada a obtenção dos
objetivos organizacionais, além das instituições tornarem-se reconhecidas
socialmente pelo profissionalismo com que administram seus recursos. Porém, a
autora ainda coloca que, os profissionais de comunicação devem atuar não só em
suas especificidades ligadas a divulgação da mensagem ou imagem da instituição,
como também se envolver com o planejamento estratégico, analisando cenários,
influindo no diagnóstico e coordenando os processos organizacionais.
De acordo com Gerzson (s/d), sabe-se também que as exigências do mundo
externo à organização - mercado, políticas e culturas - são as que mais influem na
direção e andamento dos processos administrativos de uma entidade de fins sociais.
Portanto, para essas entidades de objetivos sociais garantirem uma competitividade,
acompanhar a flexibilidade e velocidade das tendências do mercado, precisam atuar
de forma rápida e eficaz. Adaptar-se ao mercado e suas exigências significa buscar
novas políticas de gestão. Nesse sentido, a informação e a comunicação aparecem
como fatores produtivos nos processos de agilidade e eficácia organizacional. A
autora ainda explica que:

As instituições do terceiro setor acompanham esta tendência e no intuito de


ter reconhecimento, de angariar o apoio da sociedade, seja para financiar
projetos, divulgar suas ações, conquistar voluntários ou patrocinadores,
buscam a comunicação para obter visibilidade e fortalecimento. A
comunicação surge como ferramenta para as ações comunitárias que
precisam fortalecer sua imagem institucional perante a opinião pública.
(GERZSON, s/d)

Observou-se, portanto, que a comunicação oferece as ferramentas


necessárias ao desenvolvimento dessas entidades, bem como o de seus projetos e
da sua própria imagem.
De acordo com Voltolini (s/d), fica então evidente, que o desenvolvimento das
atividades realizadas no Terceiro Setor só será possível a partir do momento que se
passar a adotar ferramentas de gestão, como a própria comunicação, de forma
profissional e responsável. Perceber o processo de planejamento como um conjunto
29

de peças integradas é necessário para que se desenvolvam campanhas que


realmente propiciem a mudança social.

3.2.1 A publicidade no Terceiro Setor

Segundo Tóth (2007), a questão do acesso à informação se relaciona de


forma direta com o desenvolvimento social. A comunicação nesse caso auxilia na
difusão de ideais e valores necessários para que as transformações no campo social
ocorram. Porém o autor coloca que “... apenas o acesso à informação não muda
comportamentos...” (TÓTH, 2007). É preciso que estas informações passem a
adquirir um sentido consciente para as pessoas quando se fala de uma alteração ou
mudança de comportamento. Nesse sentido, a publicidade serve de apoio às
entidades sociais, pois confere a essas informações status e importância dentro do
contexto social. Pode assim a publicidade, divulgar, promover e conscientizar
através de campanhas sociais, se bem instalada dentro do processo de gestão
organizacional. Assim, a técnica publicitária aplicada no Terceiro Setor, tem como
função a transmissão dos ideais sociais que a entidade trabalha e se esforça para
atender.
De acordo com Kotler (1992), a publicidade aplicada às organizações que não
visam lucro requer uma série de cuidados. Assim, ao se levantarem os recursos
empregados na construção da mensagem de comunicação, é preciso esclarecer
alguns objetivos que ilustram a funcionalidade do próprio ato comunicativo. As
decisões nessa primeira etapa da comunicação se limitam a responder quais são os
objetivos da comunicação a ser realizada, o que se irá comunicar e de que forma,
onde e quando será divulgado o produto/serviço em questão.
Na determinação dos objetivos de comunicação deve-se levar em conta a
campanha como mecanismo de mudança social. Sabendo-se que “O objetivo da
campanha é estimular a adoção de uma idéia, prática ou ambas, e essa adoção
pode referir-se a uma base de produto tangível ou a um produto intangível.”
(KOTLER, 1992, p. 202). O especialista deve compreender o processo
comportamental do público visado em relação ao produto promovido. Precisa-se
entender como o receptor percebe o produto social ofertado para poder direcionar
seus esforços em função das necessidades de se conscientizar, despertar interesse
e/ou posicionar-se como um produto de qualidade frente ao adotante.
30

Após definidos os objetivos de comunicação, o profissional de


comunicação precisa estabelecer e definir o que vai ser transmitido na mensagem.
Portanto, para transmitir uma relação de superioridade entre produto social e
satisfação da necessidade do público impactado é preciso levar em conta a
finalidade desse produto. Ou seja, se o produto social for novo é necessário que se
crie uma atmosfera favorável à sua aceitação ou conscientização da importância do
mesmo, para depois persuadir e envolver o receptor. Em uma outra situação,
quando um produto social causa muita repercussão e não se compreende ao certo
sua real função social a necessidade de posicioná-lo como um produto social
superior pode ser contundente as respostas aspiradas. Em último caso o produto
social pode se colocar como um substituto ao comportamento do público alvo,
servindo-lhe como base para transformações e para a própria mudança social.
Kotler (1992) explica que, depois de definido o assunto, deve-se atribuir à
mensagem sentido racional, emocional e inconsciente – elemento não-verbal – com
a finalidade de convencer, despertar o interesse e atenção do público definido como
alvo.
A execução racional da mensagem caracteriza-se por apresentá-la de forma
completa e sem subtrair informações, precavendo-se contra possíveis ruídos no
processo de transmissão e decodificação da mesma. Na execução emocional
atribui-se características afetivas como forma de envolver e impactar o receptor a
um nível de identificação e projeção de seus sentimentos em relação ao produto
social em questão. A relação de sentimentos como medo e humor com o produto
promovido, devem ser pensados levando em conta as características do produto
social e a forma a ser empregada em cada caso. Os elementos intrínsecos ou não
verbais e muitas vezes inconscientes tais como expressão da voz, expressões
faciais, movimentos do corpo, comunicação com os olhos, distância espacial entre
transmissores e receptores, aparência física, entre outros, também são elementos
influentes para compreensão, identificação e grau de envolvimento da mensagem.
Segundo Kotler (1992) a escolha dos meios de comunicação é o próximo
passo para o desenvolvimento da campanha. Cabe aqui avaliar os meios a partir do
apelo e impacto informativo e persuasivo que causa. Fontes de informação que
tenham credibilidade em relação ao público tendem a propiciar ao produto
anunciado certo status: “A mídia tem o potencial de reforçar ou enfraquecer uma
mensagem a ser comunicada.” (KOTLER, 1992, p. 210). Assim deve se levar em
31

conta o tipo do produto em relação ao tipo de mídia relacionando-os


harmonicamente.
Quando anunciar é outra questão que norteia as decisões tomadas na
definição dos objetivos da comunicação. Não existe uma regra ou modelo para o
melhor momento de promover um produto social. O que se percebe é que todos os
casos devem ser vistos de forma particular. O ideal é transmitir as mensagens
conforme se percebem alterações e mudanças favoráveis de comportamento do
público em relação às causas sociais promovidas. Outro fator a se levar em conta é
conhecer o público, saber onde está, de quais meios de comunicação ele faz uso e
em que horários, meses, semanas ou dias pode-se encontrá-lo em maior
quantidade.
Finalmente tem-se a necessidade de saber se os recursos destinados à
comunicação trouxeram retorno, isto é, se influíram de alguma forma em uma
alteração de comportamento do público impactado. Nesse caso, são vários os
métodos empregados, desde pesquisas até grupos focais e de observação. Todos
esses métodos possuem alto grau de importância para que se compreenda não
somente a aceitabilidade da campanha como também como forma de tornar mais
eficientes as campanhas relacionadas às causas sociais.

3.2.2.1 O processo de adoção de valores nas causas sociais

Segundo Kotler (1992), partindo do conceito de que a comunicação tem como


objetivo informar e persuadir uma determinada amostra da população, a fim de gerar
um comportamento favorável em relação a um produto e/ou serviço, nota-se que é
preciso diferenciar ou identificar o público visado enquanto massa ou indivíduo.
Assim, o processo e o método de desenvolvimento da comunicação voltada à área
social variam conforme a necessidade de se comunicar uma idéia e comportamento
a um determinado número de receptores. A adoção de novos valores e ideais
instigados na comunicação com fins sociais constitui um produto social que se
deseja “vender”. A comunicação de massa, a seletiva e a pessoal são canais da
difusão de uma mensagem que definem uma postura quanto à escolha do público
visado. No primeiro caso dedica-se a mensagem ao receptor enquanto integrante de
uma massa. A segunda possibilidade é concentrar-se nos consumidores enquanto
integrantes de um grupo restrito, direcionando a comunicação de forma direta e
32

objetiva. No último caso o receptor ou adotante da causa social é visto como


indivíduo capaz de influenciar e motivar as pessoas que o cercam e a comunicação
passa a ter um caráter pontual. Esses três canais de comunicação, na prática, se
reforçam mutuamente, já que em grande parte são utilizados em conjunto para
proporcionar um ambiente favorável à aceitação da mensagem.
Conforme Kotler (1992), os métodos e modelos escolhidos para fundamentar
uma campanha devem levar em conta o comportamento dos adotantes escolhidos
como alvo. A respeito do que se conhece sobre o comportamento humano, o autor
explica um modelo de hierarquia de valores. Dessa forma ao se tratar da exposição
a uma campanha, os adotantes passam a se conscientizar da importância da causa
promovida e o comunicador deve levar em conta o alcance e a freqüência
necessários para tornar seu público consciente desse processo. Uma vez
conscientizados, os adotantes se lembrarão do conteúdo da mensagem e passarão
a adotar uma imagem positiva e atitude favorável em relação ao produto
comunicado. Nesse contexto, tanto o preparo do texto da comunicação como a
própria mensagem devem explicitar de forma objetiva, clara e direta as suas
intenções para envolver o receptor e evitar que ele não consiga decodificar a
mensagem. Depois de envolvidos, conscientizados e de assumirem uma postura
favorável em relação ao produto social, os receptores podem ter a intenção de
adotar o produto comunicado. Porém apenas uma parte deles passará a
efetivamente concretizar sua intenção por meio de uma adoção tentativa. Nessa
etapa a função da promoção da adoção do produto social com o apoio da mídia e do
complexo de marketing é sustentar um ambiente favorável para que estas intenções
possam realmente se concretizar. Por fim, daqueles que fizeram a adoção tentativa
e certificarem-se da qualidade do produto social alguns tenderão a repeti-la
futuramente. Assim, cabe destacar que o grau de conscientização e lembrança
depende da eficácia da comunicação. A informação apreendida durante o processo
de comunicação e a maneira persuasiva que desperta no receptor a intenção de
buscar pelo produto social depende da forma como a mensagem foi construída
levando-se em conta o quanto se sabe sobre o público receptor.

3.2.2.2 Cases de campanhas sociais


33

De acordo com Kotler (1992) o lançamento pelo governo inglês em 1975


de um programa de economia de energia nomeado “Economize” tinha como função
informar e conscientizar os ingleses sobre formas mais eficientes de reduzir o
consumo de energia doméstico. Após algumas pesquisas aplicadas junto às famílias
inglesas constatou-se que a maioria das pessoas acreditava na importância de se
economizar energia. Porém, não se tinha uma noção clara da crise que afetava o
país já que o contexto econômico dizia-lhes justamente o contrário. A abundância de
petróleo e carvão na região, e a não constatação, por parte dos consumidores, de
cortes drásticos de energia nos últimos tempos, aliada à falta de consciência sobre a
importância de cada indivíduo na redução dos gastos com energia, em termos
gerais, faziam com que o consumidor passasse a crer que não era necessário ou de
sua responsabilidade economizar e reduzir gastos com energia. A falta de
informação sobre como poupar energia e as idéias errôneas a respeito de como,
fazendo sua parte, o consumidor poderia participar de um esforço de economia de
energia “estabeleceu a necessidade latente dos adotantes escolhidos como alvo.”
(KOTLER, 1992, p. 203)
Assim, chegou-se à conclusão de que primeiramente seria necessário
envolver o receptor em um contexto social e econômico. Dessa forma, foram
divulgadas mensagens a respeito da crise de energia, de que o comprimento do
papel de cada um era essencial para que resolvessem o problema e de quais eram
as formas fáceis e relativamente acessíveis para se economizar energia. Percebeu-
se que, envolvendo o receptor, o seu grau de conscientização seria maior, assim
como a probabilidade de que alterasse seu comportamento.
Outro case comentado pelo autor foi a campanha de marketing social do
governo sueco para adoção de novos hábitos de dirigir. A mudança da mão de
direção para o lado direito causava constantes acidentes entre os suecos que
dirigiam. A dificuldade de adaptação foi resolvida por uma campanha de
comunicação que enfatizava a superioridade de se dirigir pela mão direita. A
mensagem da campanha trabalhou a questão de que era mais seguro adotar esse
novo hábito em relação ao antigo e a população foi conscientizada de que era mais
seguro dirigir pela mão direita do que manter seus velhos hábitos de direção:
“Portanto, a mensagem da comunicação transmitiu a vantagem da segurança a
longo prazo, para o povo sueco, da adoção de outra prática. “ (KOTLER, 1992, p.
203)
34

4 DELINEAMENTO DA PESQUISA DE CAMPO

O presente estudo tem por objetivo averiguar as principais estratégias de


persuasão da propaganda televisiva, no combate às diferentes formas de
preconceito, utilizadas no Terceiro Setor. Pretende-se comprovar as hipóteses de
que, em geral, as campanhas de propaganda querem despertar, estabelecer e
organizar valores sociais e com isso buscam atingir a sociedade por meio de
estratégias de persuasão sensibilizadoras. Além disso, busca-se confirmar
empiricamente a idéia de que campanhas publicitárias mais recentes utilizam
predominantemente estratégias de persuasão racionais, através de uma abordagem
direta e consciente da mensagem comunicada, e de que o público em geral é mais
vulnerável a argumentos dionisíacos (argumentos usados pra emocionar) do que
apolíneos (argumentos racionais, objetivos e diretos) em campanhas publicitárias do
Terceiro Setor.
O tipo de pesquisa aplicada foi exploratória e qualitativa, tendo por base uma
amostra constituída de duas campanhas televisivas que abordam temas
relacionados ao combate às diferentes formas de preconceito social. Pretende-se
analisar essas duas campanhas televisivas como forma de ilustrar e apontar os
principais recursos estratégicos persuasivos utilizados em campanhas de
propaganda no Terceiro Setor. Assim, as propagandas selecionadas constituem a
base para definir e responder o que, em geral, acontece no processo de construção
da mensagem publicitária com fins sociais.
35

A análise de conteúdo foi o método de coleta e análise de dados escolhido


por sua capacidade de inferir, interpretar e relacionar dados às condições de
produção e recepção das mensagens no campo da comunicação.
De acordo com Vergara (2005), a análise de dados serve de base exploratória
ou verificação para comprovação ou não de hipóteses levantadas durante a
realização de um estudo científico. A autora explica ainda que, após definido o tema
problema da pesquisa, será levantada bibliografia referente ao problema apontado
pelo estudo e que dará suporte teórico. Na seqüência, definem-se as hipóteses que
nortearão a pesquisa e os meios utilizados para coleta de dados, salvo os casos de
pesquisa exploratória, quando as suposições podem ser definidas durante o
processo de realização da pesquisa ou ao seu final. Os meios para coleta de dados
podem ser classificados em documental ou pesquisa de campo. Observa-se que,
sendo essa pesquisa, em particular, uma análise de campanhas publicitárias,
configura-se em um tipo de pesquisa documental com análise de conteúdo, na qual
as campanhas escolhidas serão gravadas e transcritas no documento científico. Já a
pesquisa de campo ocorre a partir da aplicação de questionários e entrevistas.
Segundo Vergara (2005), quanto à análise de dados, existem três tipos de
grades a serem definidas: aberta, fechada e mista. No primeiro caso, as categorias
e/ou elementos utilizados para análise serão definidos no decorrer da pesquisa
conforme apareçam as necessidades, sendo indicada em pesquisas exploratórias
por seu caráter flexível, que permite alterações até que se chega a um conjunto final.
Na grade fechada, o pesquisador a partir do levantamento bibliográfico pertinente ao
tema aponta os elementos mais relevantes para análise antes mesmo de realizá-la.
Por ser considerada uma grade rígida e não mutável é mais aconselhada a
pesquisas do tipo explicativa e descritiva e inapropriada à exploratória.
Dessa forma, o tipo de grade escolhido para esta análise foi mista, pois
permite que mesmo definidos preliminarmente as categorias pertinentes ao objetivo
da pesquisa ainda se possa incluir elementos. Pode-se, ainda, rearranjar a estrutura
das categorias escolhidas conforme sua subdivisão, inclusão ou exclusão, deixando
que o pesquisador julgue a melhor forma de ordená-las.
Vergara (2005) explica que, depois de realizada a leitura do material referente
à problemática em questão, definem-se quais são as unidades de análise.
Dentro dessa pesquisa ficam essas limitadas ou não à:
• Análise do texto/discurso da campanha (linguagem verbal);
36

• Análise da Imagem (linguagem não verbal: cor, disposição dos objetos,


iluminação, som, voz, atuação, plano de câmera entre outras unidades).
Cabe aqui esclarecer que essas unidades serão analisadas conforme o plano
semiótico e psicanalítico, pois são os critérios mais utilizados dentre os autores da
área e que, contribuem significativamente aos estudos de comunicação.
Por intermédio dos procedimentos propostos, interpretar-se-á portanto a
forma como se constroem os argumentos persuasivos em campanhas com fins
sociais, a fim de averiguar quais são as unidades que mais se destacam no sentido
de persuadir o público impactado. Uma vez finalizados esses procedimentos,
confrontam-se as hipóteses que deram suporte à investigação com os resultados
obtidos pela pesquisa. A partir dos resultados e sua comparação com as hipóteses
pré-estabelecidas, conclui-se a mesma com um relatório descritivo dos pontos mais
relevantes encontrados durante o processo de realização.
Enfim, o procedimento de análise de dados foi descrito a partir de uma análise
qualitativa de conteúdo. Os critérios analisados nesse percurso foram observados a
partir da seleção de duas ou mais campanhas televisivas que tinham como foco o
combate a diferentes formas de preconceito. Uma vez gravadas e transcritas ao
documento científico, foram analisadas partindo das linhas semiótica e psicanalítica
pelas quais se deseja apontar os principais meios persuasivos que as campanhas
do Terceiro Setor utilizam para mobilizar a população.

4.1 Critérios para Análise Semiótica

Este estudo científico tem como base teórica a semiótica greimasiana. A linha
semiótica escolhida para análise é considerada a teoria da significação, pois enfoca
a construção de sentido nos diversos textos. Também será levada em conta a
semiótica de Peirce, que se preocupa com a investigação da natureza dos signos.
Buscaram-se assim, como referência à análise de conteúdo, os seguintes
autores: Barros (1997); Santaella (2004); Farina (2006); Sant’ Anna (2001)
Gheerbrant (2006); Fiorin (1999); Joly (2002) e Peirce (2000).
Dessa forma, pretende-se por meio dos signos, compreender de que forma
estes se relacionam em um processo de significação de Campanhas Sociais. Nos
37

itens a seguir forma mencionados os critérios utilizados para análise semiótica do


conteúdo com a finalidade de proporcionar um maior entendimento sobre o assunto.

4.1.1 Signos

De acordo com Santaella (2004, p. 8), “o signo é qualquer coisa de qualquer


espécie... que representa uma outra coisa...”. Assim, a representação de qualquer
coisa se dá pela relação do signo com seu objeto (entende-se por objeto aquilo que
o signo representa). Essa relação acontece segundo a associação de qualidades,
conexão factual ou de uma regra interpretativa internalizada pelo intérprete. Dessa
forma, têm-se 3 níveis distintos de signos podendo ser eles: ícone, índice e símbolo.
O ícone desrespeita a operação hipotética onde um signo ocupa o lugar de
outro signo para explicá-lo. Através de uma qualidade proferida ao signo sugere-se
um objeto por similaridade, ou seja, a capacidade perceptiva do ser humano
fornece-o por associação um outro objeto que se mantém em função de uma
qualidade comum que ambos possuem.
O índice, no entanto, tem como fundamento a sua existência concreta. Assim,
o signo indicial, indica um outro objeto, com o qual mantém uma conexão
existencial.
O símbolo, em última instância, é a representação de um objeto por meio de
uma regra social ou lei. Percebe-se que, o símbolo consiste em representar idéias
abstratas e culturalmente compartilhadas habituando-se a representar o que a lei
prescreve.
Observa-se também que a ação de um signo, dentro de uma mensagem
publicitária, não acontece de forma isolada, pois a partir do momento que se
articulam e funcionam em um processo de significação, dão sentido à mensagem
seja por associação e similaridade, indicação ou representação.

4.1.2 Manipulação

Segundo Barros (1997), a manipulação caracteriza-se por um contrato


estabelecido entre um destinador (idéia), que por meio da persuasão convence o
destinatário (representação do público - alvo) a aceitá-lo. A partir dessa constatação,
o sujeito da enunciação (discurso) divide-se em um enunciador (produtor) que se
38

desdobra em um destinador e um destinatário para produzir uma mensagem ao


enunciatário (target). Em uma primeira etapa no processo de manipulação, o
destinador-manipulador através da atribuição de competência semântica, ou seja, na
crença do destinatário da veracidade do discurso do destinador, permite que o
sujeito-destinatário se deixe manipular. Na segunda etapa, através da atribuição de
competência modal, ou seja, a manipulação propriamente dita, o destinador doa ao
destinatário valores modais do querer-fazer, do dever-fazer, do saber-fazer e do
poder-fazer.
Ainda de acordo com Barros (1997), existem quatro classes de manipulação:
a provocação, a sedução, a tentação e a intimidação.
• Na provocação, a competência do destinador-manipulador é revestida da
imagem negativa que esse possui em relação ao destinatário, levando a uma
alteração na competência do destinatário, ou seja, o dever-fazer.
• Na sedução, tem se por parte do destinador uma imagem positiva do destinatário
com a finalidade de levá-lo ao querer- fazer.
• Na intimidação, os valores negativos do discurso do destinador levam o
destinatário a um dever-fazer.
• Na tentação, os valores positivos relacionados à narrativa persuadem o
destinatário no sentido do querer-fazer.
Porém, essas classes de manipulação só serão bem sucedidas quando os
valores propostos por essa classificação forem compartilhados pelos dois
integrantes desse contrato, ou seja, manipulador e manipulado.
Barros (1997, p. 42), afirma que, “As relações do sujeito com os valores por
determinações modais.”. Assim, o destinatário verifica a veracidade do discurso do
destinador conforme a figura abaixo:

Figura 1: Comparativo da categoria modal, ser/vs/parecer. Greimas; Courtes (apud BARROS,


1997, p. 45).
39

Percebe-se que o sujeito da enunciação, à medida que se relaciona com seu


objeto, pode ser e parecer constituindo um discurso verídico. Nota-se também que,
quando o sujeito parece, mas não é, constitui-se em uma mentira. Se o sujeito não
parece e não é, tem-se a falsidade e, em último caso se é, mas não parece, torna-se
um segredo.
Contudo, atribui-se ao destinatário a verificação modal do objeto, como forma
de compreender de que maneira eles se relacionam.

4.1.3 Linguagem não-verbal

Entende-se por linguagem não-verbal um sistema comunicativo de ordem


visual e sonoro. Pode-se, considerar as imagens, cores, cinematografia, ruídos,
trilhas entre outros itens um importante acervo para análise, pois, articula-se em um
texto sincrético, reunindo linguagens, organizadas hierarquicamente para administrar
a produção de efeito de sentido.
De acordo com Farina (2006, p. 116), “Na realidade, a especificidade daquilo
que será anunciado tem íntima conexão com a cor empregada, quer seja para
transmitir a sensação de realidade, quer para causar impacto ou realçar um
diferencial.”. Por essa razão, irá se focar na aplicação de recursos cromáticos em
anúncios de campanhas sociais, para verificar a sua atuação valorativa na produção
de sentido imagético.
Também não se pode esquecer que as imagens constituem um recurso
simbólico capaz de decifrar ou significar uma mensagem dentro de outra. Assim,
Gheerbrant (2006) coloca que, para que se explorem os significados das imagens
em todos os sentidos é necessário compreender o poder dos símbolos em remeter
ao passado, sonhos, mitos, costumes, gestos, formas, figuras, cores e números.

4.1.4 Figurativização

Conforme Barros (1997) é a partir das figuras que se tem os temas de uma
narrativa. Assim, as figuras do conteúdo atribuem traços de revestimento sensorial à
enunciação a fim de proporcionar um efeito de realidade.
40

Também é no campo da figuração que se encontram segundo Ferreira


(1955), a figura de linguagem que atribuem significado simbólico às palavras ou ao
estilo, subjacente ao “dizer” do texto. A publicidade utiliza vários mecanismos a fim
de tornar o texto verossímil. Dessa forma, as figuras de linguagem inserem-se na
linguagem publicitária para atrair o público e conseqüentemente seu interesse e
atenção pela mensagem.

4.1.5 Intertextualidade

Segundo Fiorin (in BARROS, 1999, p. 30), “A intertextualidade é o processo


de incorporação de um texto em outro...” seja para reproduzir ou transformar o
sentido do mesmo. Dessa forma, existem três processos de intertextualidade:
citação, alusão e estilização.
A citação corresponde à confirmação ou alteração do sentido do texto citado.
Já na intertextualidade por alusão acontece a substituição de figuras nos textos,
para construir um sentido oposto entre temas e estabelecer uma relação polêmica
com as diferentes narrativas. Enquanto que, a estilização corresponde à reprodução
de um estilo existente (conjunto de planos de expressão e conteúdo que produzem
um sentido de individualização).
Percebe-se que, em função de um discurso se construir em vista de outro
discurso, constitui-se a intertextualidade em um importante critério de análise, já que
alteram o sentido da mensagem em função de outros discursos pré-existentes.

4.2 Critérios para Análise Psicanalítica

Como proposto no delineamento da pesquisa, será realizada também a


análise psicanalítica dos anúncios. Cabe aqui apontar de que forma a linha
psicanalítica será aplicada na interpretação do anúncio.
Utilizaram-se como referência para a análise autores específicos da área, tais
como: Freud (1976); Fenichel (2000) e Silva (2007). Dessa forma, evitou-se a
41

interpretação subjetiva sobre a forma como as campanhas se articulam em um


nível de inconsciência da mente humana.
Partindo da conceituação da psicanálise - como uma teoria psicológica que se
ocupa dos processos mentais inconscientes e da estrutura e funcionamento da
mente – deve-se levar em conta alguns conceitos básicos para que se entenda de
que forma se dá a sua aplicação prática nos anúncios selecionados.
Observa-se, porém, que alguns conceitos relacionados à semiótica não serão
descartados nessa fase visto que as duas análises atuam de forma complementar e
não exclusivas. Nos próximos itens serão descritos brevemente os principais
requisitos para a análise psicanalítica para que se possa compreender de forma
resumida, porém objetiva, as questões abordadas pela Psicanálise que também
serão utilizadas na análise de dados deste trabalho.

4.2.1 A estrutura tripartite da mente

Segundo Freud (1976), a estrutura do aparelho psíquico da mente humana é


dividida em três partes, sendo que a cada uma delas corresponde uma função física
da mente.
O autor ainda explica que o ID, o ego e o superego são órgãos da mente que
possuem atribuições físicas distintas, porém complementares. O ID corresponde ao
princípio do prazer e tem a função de descarregar as tensões biológicas voltadas à
preservação e propagação da vida. O ego é regido pelo princípio da realidade e tem
como objetivo ponderar entre a fantasia (prazer) e a realidade, ou seja, é a
consciência propriamente dita. O terceiro agente mental é o superego, que tem por
finalidade a censura como forma de proteção. Advém das convenções sociais e
funciona como um vigilante moral.

4.2.2 Mecanismos de defesa

De acordo com Fenichel (2000), os mecanismos de defesa são processos


que permitem à mente encontrar um solução para conflitos não resolvidos ao nível
da consciência. Tais processos decorrem em função da tendência do ID querer
manifestar seus instintos a um nível de consciência. Porém, o ego, como controlador
42

desse processo, possui uma função contrária àquela apresentada pelo ID,
censurando esse último por meio da defesa.
Tem-se então, variados mecanismos que atuam como defesa na mente
humana, porém, em função de limitações técnicas como o espaço restrito à
explicação dos conceitos de psicanálise, serão apenas levantados alguns
mecanismos de defesa, considerados os mais importantes.
• Repressão: consiste em afastar ou recalcar da consciência um afeto, uma idéia
ou apelo do instinto, é o esquecimento inconscientemente intencional. Exemplo:
Um acontecimento que por algum motivo envergonha uma pessoa pode ser
completamente esquecido e se tornar não evocável.
• Projeção: atribuição do desejo ou vontade própria a uma outra pessoa com a
finalidade de justificar a própria ação. Exemplo: O estudante ao ‘colar’ em uma
prova justifica sua ação dizendo que os outros ‘colam’ ainda mais.
• Sublimação: é a renuncia às gratificações puramente instituais por outras em
conformidade com os valores sociais. Exemplo: A religião, com seus valores
morais, substitui ou sublima a manifestação sexual instintiva do ser humano.
Dessa forma, será levada em conta na análise a relação entre esses três
agentes e os respectivos mecanismos de defesas na construção de significado na
mente humana. Fica também, como última observação, a advertência de que no
decorrer da interpretação do anúncio, conforme for se sentindo necessidade,
poderão ser acrescentados novos critérios e conceitos que não foram previamente
apontados aqui.

4.3 Corpus para análise de conteúdo

O corpus de análise é formado por duas campanhas televisivas que possuem


como tema o combate ao preconceito. Utilizou-se a campanha do Ministério da
Saúde do Brasil do ano de 2002, que tem como tema o combate ao preconceito
homossexual e o anúncio da Sociedade Síndrome de Down (s/d), que tem por
objetivo o combate ao preconceito à portadores de necessidades especiais.
Cabe também esclarecer que, a campanha governamental foi incluída nesse
estudo devido à dificuldade de se encontrar e selecionar campanhas televisivas,
com a temática preconceito, no Terceiro Setor. Procurou-se em um primeiro
43

momento levantar campanhas relacionadas à instituições de cunho social, para


isso foram enviados emails a algumas dessas organizações solicitando o acesso a
esse material. Porém, a falta de resposta e as exigências de prazo de entrega desse
estudo influíram na escolha pela campanha do Ministério da Saúde que, apesar de
não estar relacionada ao Terceiro Setor possui finalidade social por tratar o combate
ao preconceito.
Buscou-se, portanto, como tema das campanhas o preconceito em função da
sua implicação na sociedade e no indivíduo como mecanismo de discriminação,
além da forma muitas vezes violenta como vem sendo observado na prática. Além
disso, o tema preconceito aparece com mais freqüência em campanhas com
finalidade social, devido à preocupação crescente de instituições e organizações
sem fins sociais com o assunto.

4.4 Campanha 1: Campainha

O anúncio do Ministério da Saúde apresenta em seu texto sincrético um


senhor, uma senhora, uma adolescente, um rapaz e um homem jovem (visita) que
surge surpreendentemente no contexto. Trata-se de figuras que representam uma
família, suas relações e seus diálogos. É importante frisar que a narrativa apresenta
muitos planos próximos, enfatizando os atores e suas expressões. Também exibe
breves diálogos entre os integrantes da família e cores extremamente esverdeadas.

Descrição:
Data: 31/05/02
Anúncio: Ministério da Saúde- “Campainha”
Duração: 30’
Fonte: http://www.youtube.com
Palavras - chaves: Campainha, Ministério da Saúde
Quadro 1: Decoupagem Campanha 1
Planos Ordem Visual Ordem Sonora
Plano próximo Um senhor de presença marcante, Som de uma campainha.
traços fortes, lendo um livro, quando
surpreendentemente algo lhe chama a
atenção, fazendo-lhe levantar o rosto
com certo espanto.
44

01
Plano próximo Senhora aproxima-se do senhor dando a Sons de passos.
notícia.

02 Senhora: “É ele!”.
Plano Médio Garota adolescente sentada em uma
cadeira olhando para o lado vira-se e
03 passa olhar o senhor.
Plano Médio Senhor olhando para o plano de fundo Sons de passos.
levanta-se e sai de cena.
04
Plano Médio Senhor abre a porta revelando a Som de porta abrindo.
presença de um homem jovem.
Jovem homem: “Oi eu preciso
05 falar...”.
Plano conjunto Homem jovem conversa com o senhor Senhor: “Ele não quer falar
(contra plano) na porta de uma suposta casa. com você”
06
Plano próximo Senhor na porta de sua casa (contra Jovem homem: “... mas eu
(contra plano) plano) conversando com homem jovem. preciso...”.
07
Plano próximo Homem Jovem (contra plano) Jovem homem: “... falar com
(contra plano) conversando com o senhor. ele!”.

Senhor: “Não volta mais


08 aqui...”.
Plano próximo Senhor (contra plano) conversa com o Senhor: “... não!”
(contra plano) jovem homem que tenta espiar o interior
da casa sob os ombros do senhor.
09 Senhor: “Ele não...”.
Plano próximo Jovem homem (contra plano) conversa Senhor: “... vai falar com
(contra plano) com o senhor na porta da casa. você”.
10
Plano Médio Porta fechando (contra plano) até se Som de uma porta fechando.
perder a imagem do jovem homem.
11
Plano próximo Garota adolescente escrevendo levanta Som de uma porta fechando.
12 seu olhar ao senhor.
Plano conjunto e Rapaz sentado ao chão (contra plano) Rapaz: “E aí pai?...”.
câmera alta de frente à senhora, que está de braços
e pernas cruzados, percebendo a
presença do pai no plano de fundo
conversa com ele.
13
Plano próximo e Rapaz exclama ao pai. Rapaz: “... ele foi embora?”.
câmera baixa
14
Plano próximo Senhor levanta e abaixa a cabeça como
e câmera baixa um sinal de afirmação.
15
Plano próximo Senhora desvia seu olhar do pai para o Senhora: “Filho você vai
filho. encontrar um rapaz que te
mereça”

Trilha de fundo

“Usar a camisinha...” narrador


16 in off.
Plano conjunto Senhora sentada em uma cadeira “... é tão importante quanto...”
dialogando de frente com o seu filho que (narrador in off)
45

17 se senta ao chão. Trilha de fundo

Fade out Mudança de cena Trilha de fundo


18
Fade out Fundo branco com os dizeres: Ministério “...respeitar as diferenças.”
da Saúde em cor azul claro. (narrador in off)
Trilha de fundo
19
Fonte: elaboração própria

4.4.1 Análise Semiótica

O anúncio “Respeitar as diferenças é tão importante quanto usar camisinha”,


do Ministério da Saúde, inicia-se apresentando um sujeito (senhor) que fornece ao
receptor a associação de qualidades como respeito, repressão, e seriedade devido a
traços faciais fortes e marcantes, enfatizados pelo plano próximo que fornece à cena
a dramatização, a busca da intimidade e privacidade da figura masculina
representada.
A figura icônica do “senhor repressor” implica em um objeto dinâmico,
evocando a representação da figura paterna. Assim, esta ligação e relação entre
sujeito e objeto (traços faciais) permitem que o interpretante identifique-o como uma
mistificação da figura paterna em contexto familiar.
Mais tarde quando o senhor abre a porta da casa, revela-se a figura de um
novo actante. O jovem homem indica pela sua impaciência, comprovada pelo ato de
espiar o interior da casa sob os ombros do senhor, a constatação de que algo ali
dentro é o foco de sua atenção.
O diálogo que se estabelece entre o senhor e o homem jovem caracteriza-se
pela exaltação sonora e pelas interrupções entre discursos. Contudo, quando o
senhor fecha a porta, no plano 11, revela-se uma confirmação da ordem visual com
a sonora (“Ele não quer falar com você”) na qual se entende através de uma regra
social, internalizada pelo intérprete, de que não há mais diálogo.
A trama é compreendida pelo enunciatário quando o senhor, já dentro de
casa, entra em um cômodo onde se encontram um rapaz e uma senhora. O rapaz
aflito (atitude comprovada pela ordem sonora: “E aí pai? Ele já foi embora?”) indica
uma relação de proximidade com o jovem homem que supostamente o estaria
procurando nos planos anteriores. Subentende-se através de uma convenção
interpretativa que os dois rapazes possuem ou possuíam um relacionamento. O
46

senhor questionado pelo filho aflito, levanta e abaixa a cabeça como um sinal de
confirmação, permitindo que o espectador compreenda que o pai é cúmplice do
relacionamento do filho. Pode-se, então, inferir que o sinal de afirmação constitui-se
não só em uma forma não-verbal de responder a uma pergunta como também a de
estabelecer uma convenção social na qual o pai respeita e aceita a orientação
sexual do seu filho.
As figuras femininas apresentadas no anúncio aparecem em limitados
espaços de tempo em comparação com o gênero masculino. Porém, em sua
representatividade são passíveis de associações em vista da linguagem
cinematográfica que se apresenta, o que produz efeito de intimidade, tais como:
proximidade afetiva, cumplicidade, apoio e respeito.
O sujeito-senhora pode ser identificado hipoteticamente como esposa do
senhor em função da comparação de aparências físicas e pelo próprio contexto
familiar.
A senhora que no segundo plano dá a notícia (“É ele!”) ao senhor mostra-se
apreensiva e fornece espaço para apresentação de uma nova personagem. A
adolescente que aparece no plano 3 pela sua suposta idade e características físicas
é identificada como uma figura fraterna. A atuação desta actante nesse plano
fornece ao enunciatário a idéia de que estaria ela assim, como sua suposta mãe,
ansiosa com a visita, mas por discernimento sabia que quem deveria tomar alguma
atitude naquele momento era seu suposto pai, que simbolicamente representa o
poder de decisão da família. A garota aparece novamente no plano 12 levantando
seu olhar ao pai com temeridade, representa o respeito à figura paterna em vista da
câmera alta que simbolicamente representa submissão.
No plano 13, nota-se a presença da senhora e o rapaz em um cômodo da
casa. A figura feminina apresenta-se de braços e pernas cruzadas pressupõe, de
acordo com a linguagem corporal apresentada, uma postura desfavorável frente à
situação ou problemática do vídeo. Esta pressuposição se baseia pela relação dos
fatos anteriores, pois até então não se tinha conhecimento da realidade dos fatos.
Ao final do anúncio televisivo, a senhora comprova as hipóteses de que
representava a figura materna e esposa do senhor e, por conseguinte, a explicitação
da situação relacionada com a assertiva da mulher: “Filho, você vai encontrar um
rapaz que te mereça”. A partir desta assertiva explicita-se a orientação sexual do
rapaz.
47

Dessa forma, Barros (1997, p.33) coloca que “o destinador julga o sujeito
pela verificação de suas ações e os valores com que se relaciona.”. Mostrou-se que
valores relacionados à repressão, censura, respeito e cumplicidade são
compartilhados tanto pelo destinador manipulador quanto pelo destinatário
manipulado.

4.4.1.1 Manipulação

Na perspectiva da semiótica francesa, na manipulação, o destinador propõe


um contrato e exerce a persuasão para convencer o destinatário a aceitá-lo. O fazer-
persuasivo ou fazer-crer do destinador tem como contrapartida o fazer –
interpretativo ou o crer do destinatário, de que decorre a aceitação ou a recusa do
contrato. O percurso do destinador-manipulador contém duas etapas hierarquizadas:
a de atribuição de competência semântica e a de doação de competência modal. A
atribuição de competência semântica está sempre pressuposta na doação de
competência modal, pois é preciso que o destinatário-sujeito creia nos valores do
destinador, ou por ele determinados, para que se deixe manipular.
O destinador, em questão, é a AIDS e, no filme apresentado, existe a
pressuposição de que este destinador tem as atribuições de competência semântica,
pois a AIDS foi investida de negação do preconceito, uma vez que não se espera
que a família possa aceitar um filho homossexual; “Filho você vai encontrar um
rapaz que te mereça.”; como doença, pela assertiva do narrador in off que diz: “Usar
a camisinha é tão importante quanto respeitar as diferenças”; como união familiar
porque o que se vê é uma família que aceita o filho tal como ele é (com suas
orientações homossexuais).
Pode-se constatar que a manipulação é a de Tentação, pois o destinador-
AIDS está investido de valores positivos do Poder, (poder ter liberdade de diálogo
com a família, não ser discriminado, ter prevenção à doença) ou ao contrário
também, pois a AIDS representa para o senso comum o preconceito, a doença, a
morte, a exclusão. Assim, na competência do destinatário modal-família, mostra a
aceitação com a ordem da situação, ou seja, o destinador-manipulador-aids tem
uma relação de dependência com destinatário-manipulado-família, o que pode
ocasionar uma alteração na competência do enunciatário de negar o preconceito,
isto é, querer-fazer a mesma coisa. Em outras palavras, pode-se entender que a
48

manipulação Tentação sugere “Se você aceitar alguém de sua família que seja
homossexual e dar-lhe apoio, você pode ajudar a prevenir a AIDS”.
Segundo Barros (1997, p. 42) no que se refere à modalização do ser que “...
atribui existência modal ou sujeito de estado.”, percebeu-se que, a relação do
sujeito-senhor com seu objeto (traços marcantes) caracteriza-se por uma mudança
por determinação modal de valores, já que inicialmente ele é percebido como
antagonista passando ao final ser considerado uma figura protetora. Constitui-se o
pai em um parecer mas não ser, ou seja, uma mentira, que remete a idéia da
negação do preconceito na família.
Portanto, tenta-se o enunciatário a fim de fazê-lo adotar atitudes sexuais
preventivas (uso da camisinha) e reduzir o preconceito entre os familiares em
relação às diferenças sexuais. Para isso, utilizou-se um argumento de competência
lingüística dando credibilidade a narração, ou seja, sabendo que um dos objetivos da
campanha era reduzir o preconceito entre os familiares, ninguém melhor que eles
mesmos para falar do assunto.

4.4.1.2 Linguagem não-verbal

Em relação às cores do vídeo publicitário, percebeu-se que, na instalação da


cor verde esmaecida. Segundo Farina (2006) a cor verde possui as seguintes
associações:

Associação material: umidade, frescor, esperança, diafaneidade, primavera,


bosque, águas claras, folhagem, tapete de jogos, mar, verão, planície,
natureza.
Associação afetiva: adolescência, bem-estar, paz, saúde, ideal, abundância,
tranqüilidade segurança, natureza, equilíbrio, esperança, serenidade,
juventude, suavidade, crença, firmeza, coragem, desejo, descanso, liberdade,
tolerância, ciúme. (FARINA, 2006, p. 101, grifo do autor).

Dessa forma, o encontro do pai com o jovem na porta tem como apoio
cromático a cor verde que designa a regeneração, liberdade de expressão,
segurança, o que pode se pressupor a regeneração de uma relação familiar, pois
recusar a entrada do jovem para conversar com o filho, é uma regeneração de laços
protetores do pai (segurança) com relação ao filho como se pode constatar ao final.
Vale destacar, que a linguagem cromática está, juntamente, com o enfoque de
câmera, bem como a trilha, o diálogo, a expressão facial, a expressão corporal e a
49

iluminação, encarregada dos investimentos semânticos na construção do texto


sincrético. Há de se relevar a instalação do preto e branco com o objetivo de remeter
ao passado, com o que se entende que o fato em si, já aconteceu em alguma
família. Não só isso, mas a linguagem da iluminação do ambiente colaborou para
dar a sensação de intimidade familiar e o que o enunciatário precisa é se identificar
direta ou indiretamente nesta simulação do fazer do homem no mundo.
Daí a importância de se entender o texto como um todo e buscar na “escrita
fílmica” a produção de efeitos de sentido de realidade, ou de fato acabado,
acontecido, é como um relato de uma história que pode servir de exemplo ao senso
comum.

4.4.1.3 Figurativização

No nível dos discursos propriamente dito, há de se levar em conta os


revestimentos figurativos, dessa forma, as figuras instaladas proporcionarão a
extração dos temas. O que se vê, além dos actantes, é o jornal, a mobília simples,
mas confortável, o quarto do jovem, com isso, pode-se depreender os temas de
conforto (a mobília), intimidade (o jovem no seu próprio quarto), respeito e educação
(a filha estudando e o pai lendo o jornal), o que caracteriza uma família de classe
média, instruída, consciente, estruturada em termos de respeito mútuo e
compreensão.
Segundo Ferreira (1955), compreender as figuras de linguagem é
compreender o significado simbólico das palavras ou o estilo, subjacente ao “dizer”
do texto. A publicidade utiliza vários mecanismos a fim de tornar o texto verossímil.
Dessa forma, as figuras de linguagem inserem-se na linguagem publicitária para
atrair o público e conseqüentemente seu interesse e atenção pela mensagem.
Em relação ao texto da campanha do Ministério da Saúde, constatou-se a
existência das seguintes figuras de linguagem:
• Antítese

• Eufemismo

O filme publicitário apresenta, em um primeiro momento, a figura de um


senhor que possui traços faciais marcantes sugerindo uma associação de idéias na
50

mente do espectador. Portanto, constitui-se essa imagem em uma antítese,


quando inicialmente o público poderia pensar que a figura do pai poderia ser
caracterizada como paterna e repressora (antagonista). Assim os recursos estéticos
do filme como iluminação, cor, enquadramento e a própria atuação do ator, a partir
do momento em que trabalham em conjunto, fomentam a imagem estereotipada de
um pai-antagonista. Porém, em um segundo momento, vai se percebendo que o pai
era compreensivo e protetor do relacionamento do filho. Pode-se afirmar que há
aceitação e com isso, percebe-se uma oposição de valores a fim de realçar a força
expressiva entre preconceito e respeito.
No spot inteiro e em específico na ordem sonora “Filho você vai encontrar um
rapaz que te mereça” está presente o eufemismo. Procurou-se suavizar a linguagem
verbal evitando-se palavras como homossexual, gay e namorado, que são termos
socialmente desagradáveis no contexto brasileiro.

4.4.1.4 Intertextualidade

O texto foi construído tendo em vista outros discursos, porém este apresenta
a intertextualidade por alusão ao discurso de intimidação que normalmente é
delineado em campanhas de prevenção à aids, pois os discursos anteriores à AIDS
são investidos de valores negativos como doença, preconceito, exclusão social.
Assim, constata-se o discurso polêmico em que a AIDS é mostrada como possível
elo entre os integrantes de uma família se estiverem apoiando e compreendendo a
diferença, podendo-se evitar a doença, uma vez que não há necessidade de ocultar
ou levar uma vida dupla, ou seja, ser homossexual não é caso de exclusão.

4.4.2 Análise Psicanalítica

A campanha do Ministério da Saúde apresenta em seu discurso uma


contradição de valores. Em um primeiro momento, evidenciou-se a repressão da
família em relação às tendências homossexuais do filho, porém, ao desfecho do
anúncio, percebe-se que a família nada mais era do que cúmplice do relacionamento
do rapaz.
Assim, o enunciador propenso a criar um simulacro, desenvolve a ficção com
base nos mecanismos de defesa do seu público real.
51

Considerando o instinto homossexual como um sentimento regido pelo


princípio do prazer (ID) percebe-se que, historicamente ele é vulnerável a
julgamentos de senso comum e consequentemente à condenação, ou, ao pré-
conceito.
Sabe-se que, em um indivíduo homossexual, o fato de sua condição sexual
não ser aceita socialmente, desencadeia processos de defesa em sua mente, na
retenção desses instintos no ego. Dessa forma, o objeto retido (instintos
homossexuais) através da repressão, é enviado ao inconsciente. Porém, Silva
(2007) explica que:

...o instinto tem uma relação histórica e imutável ao mesmo tempo em que
pode ser latente, uma vez que o desejo do indivíduo é o de romper com as
amarras da sociedade que o reprimem: quanto menor o espaço, maior as
tentativas do indivíduo de romper com as imposições da sociedade; quando
este não sucumbe à instabilidade emocional provocada pela repressão dos
seus instintos. (SILVA, 2007)

Nota-se que, o objeto-instinto retido agora no inconsciente, tenta encontrar


uma saída para emergir a consciência. Contudo, o ego para não permitir que esse
conteúdo retorne a consciência, despende de energia para mantê-lo no
inconsciente. Observa-se que, pelo fato de dedicar uma quantidade considerável de
energia para manter o conteúdo no esquecimento, o ego entra em fadiga.
Por outro lado, quando o conteúdo latente não consegue retornar a mente
consciente, desenvolvem-se fobias e neuroses como uma proteção à emersão
desses instintos.
A promiscuidade - freqüente em grupos homossexuais - é o reflexo do que foi
apresentado acima. Entende-se a banalização do sexo como conseqüência da
retenção da homossexualidade no inconsciente. O conteúdo latente do inconsciente
associa-se a um desejo comum ao ego e ao ID, permitindo a mente diminuir a
pressão que o segundo exercia pelo primeiro. Dessa forma, adota-se uma postura
promíscua como forma de evitar a criação de laços afetivos com o objeto de prazer,
ou seja, concilia-se a vontade do ego em reprimir a homossexualidade com a
vontade primária da obtenção do prazer do ID. Uma vez sanada a necessidade
latente dos instintos sexuais reprimidos, sublima-se o acontecimento pela remoção
temporária da repressão. Porém, o instinto homossexual persiste no inconsciente
até adquirir autonomia para manifestar-se por meio da promiscuidade novamente,
dando continuidade ao ciclo.
52

Dessa forma, conhecendo a mente humana sobre esse ponto de vista e


sabendo que o homossexual é mais propenso a AIDS; por conta da promiscuidade;
construí-se o argumento da AIDS como possível elo entre pais e filhos. Percebe-se
que, a campanha propõe o diálogo na família como forma de evitar a AIDS, porém,
fazendo isso, deve-se deixar de lado as diferenças sexuais. Contudo, deixa-se o
instinto homossexual manifestar-se sem grandes repressões no indivíduo, evitando
o desenvolvimento de fobias e neuroses que podem levar a promiscuidade.
Evidencia-se o diálogo como importante fator para a difusão da informação
sobre técnicas sexuais preventivas, deixando de lado a repressão como forma de
respeito às diferenças e de evitar a contaminação do filho pela AIDS. Identifica-se o
público com a representação da realidade (simulacro) e com a própria doença que
alude à importância do diálogo como fonte de informação e prevenção, da não-
repressão e do respeito mútuo.

4.5 Campanha 2: Nunca subestime um Síndrome de Down

O texto sincrético apresenta o local da narrativa e seus actantes. É uma


lanchonete-restaurante bem freqüentada, onde se vêem crianças, homens adultos,
jovens em geral. Atrás do balcão da lanchonete há um homem e um jovem e fora
dele, uma garçonete com síndrome de Down a qual será denominada garçonete 1 e
outra garçonete não portadora se síndrome, a qual será denominada garçonete 2.
Dessa forma, será facilitada a descrição, a seguir, considerando-se as duas
garçonetes nas cenas. O que se pretende é deixar clara a distinção entre elas. Vale
lembrar que a narrativa apresenta muitos cortes rápidos interligados por fade in e
fade out o que pode dificultar a compreensão do anúncio.

Descrição:
Data: sem data
Anúncio: Sociedade Síndrome de Down- “Nunca subestime um síndrome de Dwon”
Duração: 30’
Fonte: http://www.youtube.com
Palavra - chave: Síndrome de Down
53

Quadro 2: Decoupagem Campanha 2


Planos Ordem Visual Ordem Sonora
Plano médio Garçonete 1 (uniformizada) dirige-se ao Som natural de restaurante
balcão da lanchonete ergue o dedo (liquidificador, vozes, passos,
pedindo algo. O predomínio da cor no música ao fundo etc.).
ambiente é esverdeado.
01
Plano próximo Garçonete 1 pega um copo de refrigerante Mesmo som
e no balcão, alguém coloca um canudo no
contra plano copo (braços e costas de uma pessoa).
“Mariana, 22 anos.”. Escrito com letras
bancas na parte inferior e central da tela.

02
Fade out Mudança de cena
03
Fade in Mudança de cena
04
Plano conjunto Garçonete portadora de síndrome de
down conversa com actante que está
sentada frente a um balcão. Na sua frente
passa e sai de plano garçonete2
05 (uniformizada).

Fade out Mudança de cena


06
Plano conjunto Garçonete 1 carrega uma bandeja com
e comidas e bebidas delicadamente e apóia
na mesa onde estão sentadas algumas
pessoas. Em segundo plano aparece
outras mesas enfileiradas onde se vê
algumas pessoas e a garçonete 2
atendendo a mesa de trás, da que a
garçonete 1 está atendendo.
07
Fade out Mudança de cena
08
Fade In Mudança de cena
09
Plano conjunto Garçonete 1 conversa com garçonete 2,
esta lhe mostra um cardápio.
10
Plano conjunto Garçonete 1 estende um cardápio a um
11 senhor negro que lhe fala algo.
Plano conjunto Garçonete 1 deposita (no fundo da
lanchonete) uma bandeja com lanches e
12 bebida sobre a mesa do senhor negro.
Fade out Mudança de cena
13
Plano conjunto Garçonete 2 caminha com uma bandeja.
Revela-se a imagem da garçonete 1, no
fundo da lanchonete, novamente no
balcão de pedidos. Frente ao balcão, há
14 uma jovem mulher sentada.
Plano médio Garçonete 1 pega uma bandeja de
lanches que está sob um balcão e
caminha pelo ambiente.
54

15
Plano Dois homens de costas atrás de um
Americano balcão. E outro homem sentado à frente
e contra plano do mesmo.
16
Plano médio Um senhor e um jovem viram-se Som de pratos e talheres
rapidamente passando a olhar para caindo e quebrando no chão.
mesma direção no ambiente. A expressão
facial denota curiosidade.
17
Plano Clientes (crianças, jovens, idosos e Ausência de som
conjunto adultos), sentados inclinam suas cabeças
para a mesma direção no ambiente.
18
Plano próximo Duas meninas e uma mulher ao fundo Ausência de som
(aparece apenas seu pescoço e metade
do seu rosto), observam com expressão
de surpresa e curiosidade.
19
Plano Médio Jovem mulher sentada frente a um balcão Som ambiente mais baixo
com um cardápio a mão, observa com
expressão de desaprovação.
20
Zoom in Pessoas em segundo plano, sentadas em Som de cacos de vidro sendo
uma mesa, observam garçonete 2, recolhidos.
abaixada, como juntando algo no chão.
(O foco começa no segundo plano Som ambiente mais baixo
mostrando pessoas sentadas em mesas e
passa para garçonete abaixada que está
em primeiro plano).

21
Plano médio Senhor negro lendo um jornal, afasta-o e Som de cacos de vidro sendo
observa a garçonete ao chão. recolhidos.

Som ambiente mais baixo


22
Plano Garçonete 2, abaixada no chão segura Som de cacos de vidro sendo
conjunto uma bandeja vazia, juntando lanches e recolhidos.
cacos de pratos do chão e colocando-os
na bandeja. No plano de fundo, a Som ambiente mais baixo
garçonete 1 passa com uma bandeja.
“Você também acabou de...”
(narrador in off)

23
Plano médio Braços e costas de uma pessoa (contra “... cometer um erro.”
(contra plano) plano) que mostra algo para garçonete . (narrador in off)

Som ambiente mais baixo


24
Plano conjunto Garçonete 1 caminha no corredor da Som ambiente mais baixo
lanchonete segurando uma caneta e um
cardápio. “Eles podem muito mais do
que você...”(narrador in off)
25
55

Fade out Fundo preto com uma logomarca em “... imagina.” (narrador in off)
branco e os dizeres abaixo, em branco e
sublinhado: Som ambiente
“Sociedade Síndrome de Down”
“www.ssd.org.br”
26
Fonte: elaboração própria

4.5.1 Análise semiótica

A semiótica greimasiana trata de se (pre) ocupar com o texto, como o texto


diz e o que diz. Neste texto sincrético, temos a simulação de uma moça com
síndrome de Down que trabalha em uma lanchonete em mesmas condições do que
os outros funcionários. Contudo, consistiu-se em uma figura simbólica a garçonete
portadora de deficiência, pois permite uma conexão interpretativa do sujeito
deficiência com regras sociais (preconceito). Vale destacar que a figura instalada de
um homem negro já remete à evidência de preconceito, há de lembrar que as
pessoas negras também são passíveis de preconceitos.
Percebeu-se, no plano 02 a identificação de ordem visual da personagem
deficiente com os dizeres inscritos em branco na tela: “Mariana, 22 anos.”. Dessa
maneira, deu-se a intenção do enunciador destacar a garçonete Down como uma
figura de importância entre as outras pessoas ali presentes pela inscrição verbal
“Mariana, 22 anos”. É por esse fato que se pode inferir que o objeto do discurso de
constitui em igualdade nas relações sociais e a não aceitação do preconceito.
Assim, através de uma relação entre pessoas com deficiência e de cor à
valores de doença, inutilidade e incapacidade o enunciador desdobra-se em um
destinatário hipotético com a finalidade de construir um enunciado que faça o
enunciatário acreditar ser real. Dessa forma, o destinatário representa todas as
pessoas (crianças, jovens, adultos, empregadores, colegas de trabalho, negros)
enquanto o destinador é a própria síndrome de Down. O destinatário a fim de
representar os valores de igualdade, potencialidade de realização, atenção, inclusão
social, relação trabalhista e relação social influencia o target a adotar uma postura
contra o preconceito e consequentemente favorece à mudança de comportamento.

4.5.1.1 Manipulação
56

A narrativa nada mais é do que a simulação do fazer do homem no


mundo, suas ações, circunstâncias, contextos que servem de bojo para refletir a
estada do ser humano. O fazer – persuasivo ou fazer-crer do destinador tem como
contrapartida o fazer – interpretativo ou o crer do destinatário, de que decorre a
aceitação ou a recusa do contrato. O percurso do destinador-manipulador contém
duas etapas hierarquizadas: a de atribuição de competência semântica e a de
doação de competência modal. A atribuição de competência semântica está sempre
pressuposta na doação de competência modal, pois é preciso que o destinatário-
sujeito creia nos valores do destinador, ou por ele determinados, para que se deixe
manipular.
Portanto através da manipulação por Tentação: o destinador é investido de
valores em sua competência semântica que levam o destinatário à competência
modal do querer-fazer, ou seja, o destinatário tem confiança em aceitar as pessoas
de forma não preconceituosa, pois mostra que a moça mesmo com síndrome de
Down consegue realizar suas atribuições e tarefas de forma precisa e atenciosa. Por
outro lado, vemos uma segunda garçonete, não portadora de deficiência, que deixa
cair a bandeja, o que caracteriza que um erro é passível a todas as pessoas e não
somente com portadores de deficiências.
No quadrado semiótico, pode se constatar que circula o parecer e o não-ser,
que caracteriza a Mentira, em outras palavras, o texto, por um momento, sugere que
a queda de pratos é devida à moça com síndrome de Down, no entanto, a câmera
mostra que a queda deveu-se à outra moça, o que reforça a idéia do erro inerente a
qualquer ser humano.

4.5.1.2 Linguagem não - verbal

Como elemento da linguagem o anúncio apóia-se na cor verde para transmitir


valores como saúde, equilíbrio e tolerância, para transmitir a sensação de que a
sociedade apóia a síndrome de Down. Paralelamente a linguagem cromática, tem-se
o enfoque de câmera, as expressões faciais e efeitos de edição que merecem
também atenção e destaque.
57

A insistência de efeitos de edição como fades (in/out) sugerem uma


passagem de tempo. Nota-se que essa passagem é significativa no que concerne a
rotina vivida pela garçonete 1, na medida em que, junto com os amplos
enquadramentos de câmera (prevalecem os planos conjunto e médio)
contextualizam a personagem em seu ambiente de atuação, trabalho e social.

4.5.1.3 Figurativização

Todo texto sincrético é investido de figuras do mundo natural a fim de produzir


efeitos de sentido de realidade. Subjacente às figuras no texto, encontra-se os
temas da enunciação. Como figuras, temos: balcão de lanchonete, os fregueses,
o(s) patrão(ões) lanches, bebidas, comidas, cardápio,bandejas, uniformes. Daí se
podem depreender os temas, tais como: ambiente público e relações sociais, classe
de nível médio, trabalho, precisão, atenção, desempenho. A partir daí pode-se
constatar que o anúncio visa à sociedade em geral, ou seja, o enunciatário se
identifica com a configuração de figuras e assimila a configuração temática pretensa
da mensagem.

4.5.1.4 Intertextualidade

Na arena discursiva, percebe-se a intertextualidade por alusão polêmica, pois


sugere a síndrome de Down como um fator de não-descriminação, aceitação e
inclusão social, fator contrário do que acontece na realidade na qual síndrome de
Down é investida de valores negativos como doença, preconceito e exclusão social.
Colocou-se, por meio de um erro da garçonete 2, que derruba a bandeja com os
lanches no chão, o erro como uma característica inerente a qualquer ser humano e
que portadores de síndrome de Down não podem ser considerados, em função do
preconceito, incapazes de desempenhar seus papéis sociais como todas as outras
pessoas.

4.5.2 Análise Psicanalítica

Sob o ponto de vista psicanalítico, os sentimentos de aversão e antipatia das


pessoas, por estranhos com quem têm de tratar, decorrem do narcisismo e
58

consequentemente da dificuldade de aceitar o diferente. No entanto, Freud


(1976) explica que:

Esse amor a si mesmo trabalha para preservação do indivíduo e comporta-


se como se a ocorrência de qualquer divergência de suas próprias linhas
específicas de desenvolvimento envolvesse uma crítica delas e uma
exigência de sua alteração. (FREUD, 1976, p. 129)

Presume-se, então, que o preconceito decorre em função do ego narcisista


que impede as pessoas de aceitarem as diferenças sociais, sem que se sintam
lesadas, ou criticadas pela adoção de um novo comportamento.
Passando agora para um plano grupal, onde o indivíduo insere-se em um
grupo social e se mantém ligado à seus integrantes em função de um ideal
dominante, percebe-se que o preconceito (ideal), nesse caso, pode funcionar como
uma característica comum aos membros do grupo e até mesmo unificadora. Por
esta razão, fica difícil estabelecer uma ligação entre portadores de síndrome de
Down e a sociedade em geral, à medida que, os primeiros são excluídos do convívio
social.
Contudo, o anúncio televisivo da Sociedade Síndrome de Down ao propor um
simulacro onde a questão da deficiência não é sinônimo de discriminação, permite
que o enunciatário se depare com uma rivalidade de valores sociais (discriminação
vs aceitação). Com a finalidade de fomentar a mudança de comportamento em
relação ao deficiente e, a inclusão do deficiente no meio social, a propaganda
evidencia que é necessário uma transformação do ideal negativo (preconceito,
aversão, discriminação) unificador do grupo em uma ligação positiva através de
laços emocionais, ou seja, um ideal positivo como componente de ligação entre os
membros do grupo. Deixam-se assim, as diferenças de lado, tolerando-se mais uns
aos outros. Então, o deficiente passa a integrar-se no grupo e não é mais excluído
ou vítima de aversão.
Um exemplo dessa transformação de ideais (negativos em positivos) é
sugerido no vídeo quando o narrador comenta “Você também acabou de cometer
um erro.”. Fica claro que o erro não é um fator de discriminação, pois como se vê é
comum a todo ser humano. O preconceito perde o sentido quando o ego narcisista
se vê obrigado a considerar o erro como uma característica comum aos dois grupos
59

– sociedade e portadores de síndrome de Down - e, portanto não são mais


passíveis de diferenciação.

4.6 Considerações Finais

Buscou-se, por meio da análise de conteúdo, comprovar as hipóteses que em


geral as campanhas de propaganda querem despertar, estabelecer e ordenar
valores sociais e com isso buscam atingir a sociedade por meio de estratégias de
persuasão sensibilizadoras; que campanhas publicitárias mais recentes utilizam
estratégias de persuasão racionais e; o público em geral é mais vulnerável a
argumentos dionisíacos (argumentos usados pra emocionar) do que apolíneos
(argumentos racionais, objetivos e diretos) em campanhas com fins sociais.
Para evidenciar de que forma cada critério de análise contribuiu para a
comprovação dessas hipóteses, segue abaixo um quadro comparativo das
campanhas 1 e 2 e seus respectivos critérios:

Quadro 3: Tabela comparativa das campanhas 1 e 2


Análise Semiótica Campanha 1 Campanha 2
Manipulação Tentação Tentação
Linguagem não-verbal Cor esverdeada Cor esverdeada
Figurativização Temas: família de classe Temas: relações sociais,
média estruturada em trabalho, precisão,
respeito e compreensão desempenho e atenção.
Intertextualidade Alusão polêmica Alusão polêmica
Fonte: elaboração própria

O comparativo proposto acima evidencia a manipulação por tentação como


uma constante em campanhas de fins sociais, com temas relacionados ao
preconceito. A tentação na construção da mensagem influencia o público adotar um
novo comportamento. Para isso, foram propostos nas campanhas ideais com os
quais se espera que o público se identifique. A cor esverdeada comum aos dois
filmes influencia na produção de efeito de sentido de realidade, conferindo à
mensagem veracidade e consequentemente sua aceitação por parte do target. A
alusão a outros discursos relacionados à AIDS, inclusão social e a maneira polêmica
60

como trataram o preconceito na mensagem auxiliam na conscientização e


aceitação do novo comportamento sugerido.
Contudo, comprovou-se que ao lidar com o combate ao preconceito as
estratégias discursivas das propagandas apresentam os mesmos recursos e
mecanismos, em outras palavras, mantém-se o discurso básico de inclusão social e
combate ao preconceito, no entanto, com diversificação textual.
As diferenças básicas apresentadas pelas duas campanhas se dão pelo fato
de que, na campanha 1, é a família quem apóia a tendência e orientação sexual do
filho e na campanha 2, no caso da portadora de síndrome, é a sociedade em geral
quem apóia a inclusão social. Mostrou-se, portanto que as campanhas de cunho
social, que têm como tema o combate ao preconceito, manifestam-se
persuasivamente por meio da manipulação por tentação e pela intertextualidade por
alusão polêmica. Portanto, evidencia-se polemicamente o discurso de que o
preconceito não procede nas relações familiares e sociais e por essa razão tenta-se
o enunciatário a adotar uma outra postura frente às diferenças, como forma de
proporcionar a mudança de comportamento.
Percebeu-se também que os anúncios analisados recriaram uma realidade,
mostrando o preconceito de forma lúdica, pois não se vêem explicitamente atitudes
preconceituosas nos vídeos. Dessa forma, as estratégias de persuasão sensibilizam
e tentam a sociedade buscando uma alteração do seu comportamento.
Concomitantemente, observou-se que os anúncios funcionam também por sua
característica racional na propagação de:
• Apelos verbais “Usar a camisinha é tão importante quanto respeitar as
diferenças” e “Eles podem muito mais do que você imagina”;
• Valores como inclusão social, combate ao preconceito e difusão de métodos
contraceptivos.
Em relação à análise psicanalítica, constatou-se que o emissor, com o objetivo
de alterar um comportamento social (preconceito) e ciente dos processos
inconscientes da mente humana, oferece em seu discurso sentimentos e processos
antagônicos e opostos. Se em um primeiro momento tem-se a projeção do
preconceito nas figuras mostradas - como no caso da figura paterna que induz a
uma figura repressora e do barulho que indica um erro da garçonete Down – em um
pólo oposto ou em um segundo momento percebe-se a identificação do público com
61

os ideais de compreensão, aceitação e igualdade. Com isso, evidenciou-se a


transição do narcisismo para um plano no qual se deve deixá-lo de lado para a
aceitação do diferente e consequentemente o combate ao preconceito.
Entretanto, esse estudo monográfico por focar seu objeto de estudo em
campanhas que possuem como tema o combate ao preconceito, não generaliza a
idéia de que estratégias de persuasão sensibilizadoras são as mais freqüentes nas
diferentes temáticas de campanhas com fins sociais. Porém, tal limitação decorre da
falta de tempo e espaço para que um estudo mais minucioso fosse realizado.
Sugere-se, portanto, a partir dessa análise, a elaboração de um novo
documento científico que envolva campanhas do Terceiro Setor de diferentes temas,
como forma de investigar à fundo outras características persuasivas - que
possivelmente se perderam em decorrência da classificação por tema - de
campanhas com fins sociais .

CONCLUSÃO

Evidenciou-se, por meio deste trabalho monográfico que, em geral, as


campanhas televisivas que possuem como tema o combate ao preconceito
homossexual e a portadores de deficiência mental utilizam estratégias persuasivas
tentadoras e sensibilizadoras para mobilizar o target.
Observou-se, portanto, que a publicidade e propaganda como é vista hoje
nada mais é do que conseqüência do pensamento das principais teorias de
comunicação. Os estudos com ênfase no emissor e receptor contribuem, na
atualidade, para que essa área da comunicação tenha um maior domínio sobre o
alcance dos resultados pretendidos.
62

O desenvolvimento, o profissionalismo e a precisão das funções


publicitárias na difusão de uma mensagem são verificados na prática com o próprio
desenvolvimento social brasileiro. A linguagem da propaganda passou por muitas
transformações na história, bem como a área de atuação do profissional de
publicidade.
Notou-se que a funcionalidade comercial da publicidade e propaganda nos
dias atuais instiga a novas reflexões no que se refere o seu caráter de formação. A
publicidade e propaganda como uma habilitação de comunicação social há muito
tempo desvirtuou-se do caminho humanitário, adquirindo autonomia no próprio
sistema capitalista. Porém, tais reflexões e o excesso de profissionais atuantes nas
áreas de comunicação abriram espaço para uma nova área de atuação. O Terceiro
Setor surgiu então, como resposta às aspirações sociais. A preocupação com o
social e o caráter operacional com que essas entidades vêem desempenhando seu
papel na sociedade fomentaram a necessidade da adoção de novas técnicas e
modelos de gestão. A comunicação proporcionou as organizações que não visam
lucro um maior aproveitamento dos recursos financeiros, auxiliando até mesmo a
captação de recursos e a prospecção de potenciais investidores. Assim, as
ferramentas comunicacionais aplicadas ao Terceiro Setor auxiliam na aceitação da
imagem institucional dessas entidades sociais e, também, permitem a divulgação e
difusão dos ideais defendidos por essas instituições.
A publicidade e propaganda surge no Terceiro Setor como uma ferramenta
capaz de persuadir a sociedade em prol de causas humanitárias. Por meio das
campanhas sociais, é possível observar não somente a divulgação de ideais
humanitários como também a conscientização social pelo acesso à informação
básica. As campanhas publicitárias nesse domínio passam a adquirir um papel
relevante no que se refere à difusão da informação como mecanismo educador.
Portanto, em função dos temas abordados na fundamentação teórica do
corpo de texto monográfico, foi possível alcançar os resultados obtidos na pesquisa
de campo. Compreender a publicidade e propaganda de forma teórica foi necessário
para atestar sua aplicação prática por meio da construção de mensagens e
estratégias de campanhas sociais. Em função dessa relação foi possível entender
que tais estratégias só possuem sentido se estiverem de acordo com as verdadeiras
aspirações sociais. Contudo, conhecer a história da comunicação e entender a
relação da técnica publicitária com outras disciplinas, de forma a estabelecer uma
63

categoria multidisciplinar, é necessário para que não se mantenham relações e


explicações superficiais. Preocupou-se, em todo momento, responder de que forma
essas categorias multidisciplinares contribuem para que se tenha uma noção ampla
de como a publicidade está ligada implicitamente à cultura, política e ao próprio
comportamento humano.
Sugere-se, portanto, como forma de responder a novas aspirações
decorrentes desse processo monográfico, a realização de pesquisas voltadas à
análise de conteúdo das mais diversas campanhas do Terceiro Setor. Também,
pode-se estabelecer um novo estudo que se dedique a responder se essas
estratégias realmente correspondem aos objetivos da campanha no que se refere à
adoção de um novo comportamento.

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MINISTÉRIO DA SAÚDE. Campainha. 2002. Disponível em:


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RELATO SETORIAL DA ÁREA DE DESENVOLVIMENTO SOCIAL E GERÊNCIA DE


ESTUDOS SETORIAIS DO BANCO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO
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SILVA, Lajosy. O revisionismo histórico em Bent, de Martin Sherman. In: Revista


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TÓTH, Mariann. Campanhas Sociais vs Comunicação Social Estratégica.


Disponível em: <http://www.socialtec.org.br/> Acesso em: 10 de abril de 2007.
67

APÊNDICE

Glossário

ACTANTE: é uma entidade sintática da narrativa que se define como termo


resultante da relação transitiva, seja ela uma relação de junção ou de transformação.
Corresponde ao papel actancial que o ator cumpre na narrativa.
CÂMERA ALTA: é o enquadramento visto de um ângulo superior que produz uma
visão menor do que se situa abaixo.
CÂMERA BAIXA: é o enquadramento visto de um ângulo inferior que produz uma
visão maior do que se situa acima.
COMPETÊNCIA MODAL: é a qualificação, determinada pelo destinador, do sujeito
com seu fazer.
COMPETÊNCIA SEMÂNTICA: é a crença do sujeito em um valor do destinador.
CONTRA PLANO: quando a câmera situa-se atrás de um personagem e não a sua
frente.
DECOUPAGEM: técnica que consiste em desmembrar uma produção audiovisual
em partes menores.
DESTINADOR: é o actante narrativo que determina os valores em jogo.
DESTINATÁRIO: é o actante narrativo manipulado pelo destinador.
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DISCURSO: é a narrativa ‘enriquecida’ pelas opções do sujeito da enunciação


que assinalam os diferentes modos pelos quais a enunciação se relaciona com o
discurso que enuncia.
DISCURSO TEMÁTICO: é o discurso de figuração em que as figuras não chegam a
constituir percursos figurativos completos que ocupem as dimensões do discurso.
ENUNCIAÇÃO: é a instância de mediação entre as estruturas narrativas e
discursivas que, pressuposta no discurso, pode ser reconstruída a partir das pistas
que nele espalha.
ENUNCIADOR: desdobramento do sujeito da enunciação, o enunciador cumpre os
papéis de destinador do discurso e está sempre implícito no texto, nunca nele
manifestado.
ENUNCIATÁRIO: uma das posições do sujeito da enunciação, o enunciatário,
implícito, cumpre os papéis de destinatário do discurso.
FADE IN: efeito de edição que tem a propriedade de escurecer lentamente uma
cena.
FADE OUT: efeito de transição de uma imagem qualquer para o preto.
FIGURATIVIZAÇÃO: é o procedimento semântico pelo qual conteúdos mais
concretos recobrem os percursos temáticos abstratos.
INTERPRETANTE: aquele que decodifica a mensagem.
INTERTEXTUALIDADE: é o processo de incorporação de um texto em outro.
INVESTIMENTOS SEMÂNTICOS: são conteúdos investidos nas relações sintáticas,
nos diferentes níveis de descrição lingüística ou semiótica.
NARRADOR IN OFF: sujeito da enunciação que não aparece, mas opina no final.
OBJETO DINÂMICO: é aquilo que o signo remete.
ORDEM SONORA: é a linguagem sonora, verbalização, trilhas, ruídos, jingles entre
outros formatos.
ORDEM VISUAL: linguagem visual (corresponde ao não-verbal), imagens, cores,
cinematografia, luz entre outros formatos.
PLANO CONJUNTO: é o enquadramento que permite ter uma noção ampla da
ambientação da cena e dos personagens que estão inseridos nesse contexto.
PLANO MÉDIO: é o enquadramento que reduz a área visível ao limite do quadril à
cabeça de um ator.
PLANO PRÓXIMO: é o enquadramento no qual somente são visíveis a cabeça e os
ombros dos atores.
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SIMULACRO: cópia ou representação da realidade.


TARGET: público-alvo.
TEXTO SINCRÉTICO: reunião de linguagens, organizadas hierarquicamente, para a
produção de efeito de sentido.
ZOOM IN: efeito de aproximação através do ajuste do foco.

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