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nrene ne ora? NG Platéia ste gem defsens, em qual {ier teadigao a partir da qual enten. ja. A absolute novidade da imagem fem movimento snhmetet-oa pertanto ‘2m estado normalmente atributdo a Selvagens que, em sew encontro primal ‘com a tecnologia avangada dos coloni- zadores ocidentais, fogem uivando, tuum terror impotente diante do poder da maquina, 0 piblico dos primeiros filmes subsiste aqiuém do deseje de su- pressiio da divide, j4 que a iminéneia flo terror impede até messmo umn desvio dda negagio do “Eu sei muite bem... © nao obstante”. A erednlidade soterea 0 gua fo teatro spi (primaire verso) as desergiestradicionais dos primcios eqpectadores do hema, um imagem se der ara veapte de terror de pie Hien dod chogada do trem tsteni, de Lumber, Segan- do vivios historadoces, os espesta- doves pularam oon suas eadeires, ou pritarain, ou levantarsnie © co Fam para fora do aaditério (on os 86 ucctnivamante) Como na nsioria dos Ihitos de origem, afoutedestne desor- des permanece impalpavel, No fign- oven gnalquerrelato sobre a prime ono Salon Indien do Grand Café queen tha encontendot, Ey como om tals mitos, seus 08 ideolGgic0s, tanto quanto sua veracidade, exigem Prova kav plc tine m ‘loves mitos sobre acevincla da stra todo 0 resto; 6 reflexo fi um trauma visual. Assim pensado, 0 mito do terror inivial define © poder fio filme como un realino sem prece: fos eqpectadores de que a imagem nb- vel era, de fato, palp4vel e perigosa, vindo em direcko a eles com um im- pacto fisieo. A imagem ganhou vida, Seyorando, com sia forga inexordvel, ‘qualquer reflexio sobre n representegso A imaginario é percebido como real Mais ainda: e2sa cena primal do ei- nema fandamenta algumas eoriascontem- pariness sobre o piiblico. O aterro- Hinado erpectador do Grand Café ai da subsiste na imaginagae dos tebricos de einema, que supdem uma platéia UMA ESTETICA DO ESPANTO 0 Ginema das Origens e o Espectador (in)Crédule + Testo publicade originalmente om Art & Text $4, Spring 1989, pp.31-46. aaa eee Tom Gunning sobmetendo-ge passivamente a um ato tode podernso, hipnotizada e ps ralisada polo seu poder ilusionista Tedtings rantemporaneos de cine sem feito carreiva subestimando ainte= ligeneia clementar ¢ a babilidade de testar a realidade do espectador co. num, endo véem qualquer problema fem teatar as primeira awdiéncias com Gesilém similar. A leitura mais autil dlesse terror inicial és feta por Christian Meta, Mas sua adiirvel sutilezs tor nna aanglise deficiente do ponto de vista histérieo. Metz deserere a reagito de panico de parte do piblico do Grand {fé como um deslocamento da eredu- lidade do espectador eontemporineo para uina inities infneia do meio. Co- fo na jnfaneia, quando se acredita em Papai Noel, como no inicio dos tempos, ‘quando ainda se acredita deforma lite ral nos mitot, a erenga nesse audit6rio endario, sustenta Metz, permite-nos rejeitar nosta propria érenga diante do cinema. Nér no acreditamos na imagem da tela do mesmo modo que eles o fizerain, Nosta credulidade & transferida para uma audiéneia da infancia do cinema, “A aguda interpretagio de Metz so- bre o papel mitico desse primeiro au- ditério nao leva a uma desmitologi- zagio. Em lugar disso, ele introjeta-o, retirando-o da andlise histérica e in ternalizando-o como um aspecto de tum provével observador intemporal Nao mais um espectador histérico no Grand Café em 1895, 0 ingénuo espec~ tador “ainda se aloja sob o inerédulo, fou no seu corngio”. Assim retirado dio logar © do tempo, esse crédulo es- pectador interno gurante a forgs mo- triz para sua compreensio do espec~ tador fetichists, que oscila entre s simpléria posigfo de crenga na ima- gem e a reprimida conseiGneia dessa flusdo ~ causadora de ansiedade. O historico paniea no Grand Café seria simplesmente, segundo Metz, a pro- jeqio de uma profunda decepeao em relagao ao lugar mitico do “era ‘uma ver" cinematografico Bambora tenha minbas ditvi- das de que wm panico efetivo tenha tido lugar no Salon In- ddien do Grand Café, 6 corto que fuma reagdo de espanto © até mesmo tuma espéeio de terror companharam muitas proje- bes antigas, Nao protendo, nes- Se sentido, apenas negar esse mito fundador do espectador fiecinema; insist em aborda-lo historicemente. Nao podemos simplesmente engolir inteira imagem de um espectador in feujas reagder & imagem a0 as de sis ples erenga e pinico. Precisamos di Fela, chimpeurte dias primeins p ues ndo pode act explicad por am Inodelo ineoanicieta de um espectador jingenuo que, nvm estado psivdtico tem- pordio, confuaile imagem e realidade. Mas que contexto poders explicar 0 fato atestado de que as primeiras pro: jegdes causaram impacta e espanto, numa exeitagdo que beira 0 terror, se texeluirmos a credulidade infantil? Se- ria possivel entender essa experiéncia texeitante mais como parte de uma atra- 0 do novo invento do que como um lemento perturbador que precison ser removide? E que papel 4 iluaio de realidade desempenha nessa recep¢io ‘terrorizada? Somente nma enidadose conside rage do contexto histérico dessas pri- tnciras imagens pode restabelecer uma compreensio desse poder estranho € exeitante que exerceram nos espec- tadores, Esse contexto inclui as pri- meiras formes de exibiglo, a tradiczo dos entretenimentos visuais na virada do séeulo ea estética basica do cinema fdas ovigene, que chamei de “cinema de latragies” ~ que via 0 cinema como ‘uma série de impactos visuais. Res- tituida ao eeu contexto historico par- ticular, « projecao das primeiras ima- gens em movimento coincidiu com 0 Suge de um periodo de intenso desen- valvimento dos entretenimentos visu~ ais, tradigdo enjo realismo era mui- Cena de The Black Dlamond Bxpress, Edison, 1086, EUA. ticsimo ralorizado pes seus efeitos fan- tistiooe, E procito recouhecer tal tra Adigao e vefletie sobre sen papel na vie rads do acenh ruosteei en outro hagar, mui- tos dos primeiros cspectadores rec: nhecerau a primeiva projeglo 0 co: roamento final da evolugio extrem mente sofisticada do teatro teas, como o de Mélite no Thé ert Hondin e 0 de eet mentor ing Maskleyne no London's Egyptian Hall, Na vivada do séeulo, esse tra digo usava a mais avangada teono- Togia (como luz elétries focalizada © elaborada maquinaria de palco) para prodazir enconagies de milagres. A. Aparente tranzcendéncia das leis do universo materia no teatro de migi- tas define anatuveza dinlétioa de suas iusbes:« tarets das ilusses encenadas no séeulo XIX consistia em tornar vi- sivel algo que podleria nio existir, em condusir 9 jogo das aparéncias de mo- {9-4 confundir as expectativas da logi- ca eda experiencia. A platéia a que tate teatro ee divigia era composta nfo por caipiras simplérios e grosseiros, Inas por sofistieados eitadinos em bus” cea de prazer, perfeitamente cientes de aque estavam vendo as mais modernas éenicas do ofieio teatral: 0 teatro de Méliés 6 inconcebivel sem 0 declinio generalizado da erenga no maravilho- 0, que fornecen a base de um contex- to racional, O teatro de magicas ope- rava de forma a tornar visivel 0 que era impostivel de acreditar. Seu poder visual consistia num jogo de trompe Voeil de dar e retirar, numa vontade “obsestiva de testar os limites da refu- tagio intelectual ~ Eu sei, mas mesmo aim, vejo. Gomo género de ilusio estética, 0 trompe Uoeil sublinha 0 papel proble- iitico que a “ilusio perfeita” desem- penha na recepeio estétiea tradicio hal. Como propée Martin Battersby, 0 {queumdrompe Vosil almeja no é ape- has representar com exatidiio, mas provocar “im sentimento de Aesconforto no espirito do ob- servador™. Essa inquietagiio sdvém de “um conflite de men- Sagens”: por tim lado, 2 cons: cidneia de que te esté vendo un quadro e, por outro, uma ex: periéneia visual suficientemen- te convincente a ponto de “ea antic um exame mais aproxi- mado ¢ mnesino 0 envolvimento de wina sensagao tétil”™. O rea- smo da imagem esta a servigo da experiéneia de revelagio do tspeetador, que vacila entre aeiteitins eeenga e 2 diivida, Embora o trompe Voeil pavtille com A chegada do trem A estacia e com 0 teatro de magicas fests panic one weilagho entre conve [Ho e diivida, eles ostentam diferengas importantes: a escala normalmente pequena das pintweas do srompe l'oeil fo dereja de aproximar-se © toci-las Contrasta clavasuente om a grandeur haturale? do filme do trem de Lumiare ¢o impulse do observador de afastar- Sedele, assiin como da distancia fisica Uo obsorvador das ilusdes do teatro de magicas. Contudo, as trés formas mos- tram que, mais do que ser um simples eleito de realidade, as artes ilusio- histas do séeulo XIX exploravam sua fesséncis inacreditivel, mantendo deli- Deradamente o faco no fato de que eran apenas ilusies. ‘De fato, no relato mais detathado fe wrtieulada que so tom de uma antiga projegio de Lumiére, Maxim Gérki (referindo-se uma mostra no Nizhny-Novgorod Fair em julho de 1896) da énfaze ao estranho efeito de rmistura de qualidades realistas e nio- rrealistas da nova atragio. Para Gér- ‘ki, ocinematdgrafo apresenta wn mun- do cuja animagao e vitalidade foram ‘drenadas: "... 4 sua frente, uma vid ondala, uma vide despojada de pal ‘eas e privada da existéncia do espee- tro de cores ~ a cingenta, silenciosa, deserta ¢ sombria vida”. O cinema: tégeafo, explica, no apresenta a vi- da, mas a sua sombra, e Gorki adinite a possibilidade de tomar essa sornbra cinematografice pela substincia Dererevendod chegada do trem, percebe (1 muinente: "Ele lanca sobre ‘cnidado! E como s ele fosse me zulhar na eseuridio em que voot esti Sentado, transformando-o num saco testropiado, cheio de carne dilacersds besos estilhagados...". Mas, acrescenta tle, “seo 6 tamhém somente um trem de Sonubras”, Crenga e terror so mesclados 4 conseléncia da ilusio e, para o sof ticado paladar de Gérkiy a um fastio do insubstancial e & desoladora feustrag0 “Alguém poderia des Gérki come a de um sofisticado desdém deinteleetualeultivado, deliberadamente tontrério ao acolhimento habitual das Imagens dos primeivos filmes. Embora avaliagao negativa de Gérki acerea do ‘inema fosse incomom num perfodo em (que os novos avangos na tecnologia do Entreteninento eram geralmente sauda- dos com alvarogo e satisfago, sen reco- hhecimento de que a imagem cinemato- srifica combinava efeitos realistas com Iumestado de coneeizncia do artfiio pode responder i reago geral do patlica de ‘uma maneira mais preci do ue os ing blico deentio, parseularinente dos obser vailores comune, rem dificiluente en coutréveis, « pripria técnien de apre= ‘sentagio das projegées dle Lumitre (tanto ‘quanto ade outros antigos einegrafistas) ‘ontémtam eleraente fundamental ue ser~ viu para minar #experiincia ingénua do realiemo, E puguisimo resealtado que, zhas primeiras projegies de Lumiére, 05 filmes eram apresentados inicinlmente como imagens congeladas, projecbes de otografias iméveis. Em soguida, osten- tando ana maestria na arte dos entreteni- rmentos visuiais, 0 projetor comecava & rodare aimaget se mavia, Ox, como des exeve Gérkir de repente, umn estranho ‘remeluziv atravessaatelaenfignra corre para a vida" ‘Ao mesmo tempo que uma tal repre sentagi parecia impede a leitara daima- gem como realidade um trem fisico real ela intensfieava o impacto do inicio do ‘movimento. Em vez de confundir a ima- em com a realidade, @ espectador see pant com sus transformagio através da nova ilusio produzida pelo movimento projetado, Tudo, menos eredulidade: ‘quem deixa o observado natureza inaereditvel da pr6pria lasko, 0 que éexposta diante da platéia nfo & tanto 0 avango iminente do trem mas a orga do aparato cinematogrifico. On, para dizé-lo melhor, um demonstra & outra, O cepanto deriva mais precis ‘mente da metamorfoce magica do que da aparente reprodugio da realidade. A im- portincis nical dessa transformagzo na Drimeira apresentagio de Lumibre & des- Crita por um expertem efeitos desse tipo, George Mélits: “wna fotografia imével rmostrando o Bellecour em Lyon estava sendo projetada. Um pouco suxpreso, sb tive tempo de dizer a meu visinko: "Eles ‘querem nes impressionar com projegbes como esta? Tenk feito isso hdmais de dex fanos", Mal seahara de proferilo quando tum eavalo puxando uma earroga come ‘gotta andar emnoseadiregio, sepuido por ‘outros veionloe, pedestres, em suma, toda snimagio de uma rua. Diante dese espeticulo, ficamos de boca aberta, totalmente surpreso, indeseritvelments expantados", Esse coup de thétro, a sibita trans formagio da fotografia imével na ilusio de movimento, suxpreonde os expecta ores ¢ ostmts ofateinjo pelo einemats- grafo emia novidade. Néo estando demo- do algum fora da supressio da divvida, 0 espeticulo apresenta as contraditérias tapas de envolvimento com 4 imagem, revelanda, como outros entreten visusis do séeulo XIX, nina vacilay tre conviegio inceoduldads. i jetovia da experidncia exigida por uma pnatuseza morta em trompe Ved: « Blinc fe aprescnta peimeiramente cara tima sv imagen ates de presenta se co mo verdadciras borholetas, cartées pos- tis on camafeus, cuja apreenso inicial parece representar um trompe Veil. 2 Yer le waa gradual nquietagao orgindeia ‘a contradigio entreo quese sabe eo qe fe v8, 0 impacto da imagem cinemato- grifica advén de uma sibita transfor Inagio, enquanto a fotografia projetada, Alifebnente insta (Gri também mani festou seu desnpontamento inicial com “nage espeticulo demasiadamente famili- ar), dé lugar so espantoto instante do movimento. A sensapao de impacto do piblico éproduaida menos poru finginna de que estio sendlo ameagados por urma locomotive de fato do que pela Inacreditavel transformago que ocorre dante de sows olhos, paralela is maisfor- midéveie maravilhas do teatro de ma- gicas. ‘Como nesse teatro, aparente realis- to da imagem transforma-a nema ilusto bem-sucedida, mas sabe-se, nfo obstante, aque ae trata de wma ilusdo. Ao mesmo tempo que uma tal tansformacio pode- via cer absolutamentecapaz de causar no ‘espectador um reflexo fisico ou verbal, permanece-2e eonsciente de que o filme & meramente uma projeeio: a primeira jimagem imével demonstra-o irvefuta- ‘velmionte. Mas essa fotografia estatica ‘dquire movimento, torna-se animada, essa inacreditavel imagem em movimento o que tanto surpreende. Negando por tum instante a lasio do movimento, «qe ba raison d'étre do aparato, 2 projevio inicil de wma imagem imével produ, mos primeicos espetdeulos cinematograticos, lum efeita de suspense, visto que a platéia sahin que 9 movimento cra peecisamente o que o cinematdgrafo prometia (dat a inquiotagio de Meliés). Ao retardar sua ‘apatigio,aexibigio de Lumixe no ape- nas Focaliza a invengo, mas tambéin sinala sia fidelidad a uns ostética do tspanto que vai além do interesse eienti- fico na reprodugio do movimento. Vindo desta ver do outro lado do Atlintico, um outro relato sobre as pri- ‘meiras projegées demonstra mais uma vez fateatralidade deste artificio ¢ alinha ‘aramenteo terror doa primeiros eepec- tadores a um conseiente deleite com 0 impacto eo tuspense, As memdrias de Alert E, Smith, um dos fundadores da ‘Vitagraph Company, narram seus pri eitos anos como exibidor ambulante,

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