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Sistemas Agroflorestais e a Legislacao Ambiental nas de es as ae esti ‘Quando procuramos saber se algo esté ou nio esta dentro da Lei, € importante pensarmos que, na verdade, nao existem s6 as Ieis como regras do que pode e do que nao pode ser feito, nem de como deve ser feito aquilo que é permitido. Exster regras co- locadas de diferentes maneiras, dispostas em diferentes tipos de instrumentos legais, que formam um conjunto de normas a serem aplicadas,e existe uma hierarquia entre ela. Em primeiro lugar, nenhuma regra ou instrumento legal esta acima ou pode ser contraditério ao que propée a Constituigao Fe- deral. Tendo como referénciaa Constituigao, cabe ao Poder Leg lativo a elaboracao de Leis, sejam elas federas, estaduais ou mu- nicipais. Os espacos do Congresso Nacional (em nivel federal), das Assembléias de Deputados (em nivel estadual) e das Camaras, de Vereadores (em nivel municipal) sao, em um Estado democré- tico, os espagos de construcao das leis. As eis entretanto, so em geral bastante generalistas indican- do a grosso modo 0 que deve e o que nao deve ser feito, ouo que é legal ¢ 0 que no é legal. Nem sempre uma lei detalha tudo 0 ‘que esté relacionado ao tema que ela tratae, para que elas sejam, implementadas de fato, € preciso que haja esse detalhamento. A regulamentacao das leis, tornando.as “praticaveis’, cabe muitas vvezes ao Poder Executivo, por meio de decretos. Via de regra, a ta dos decretos éelaborada por 6rgios relacionados a tem- a das leis, sendo sempre sancionada pela autoridade maxima da instancia do Poder Executivo associada ao émbito de Lei. En relacdo a regulamentacao de uma Lei Federal relativa a0 meio “ambiente, por exemplo, pode caber a elaboracao de uma minuta, ‘ou de ume proposta de Decreto, pelo Ministério do Meio Am- biente. Essa proposta s6 vira Decreto depois de passar pela apro- vvacio da Casa Civil ou seja, da Presidéncia da Repii Para a aplicagdo de Leis ou Decretos, pelos drgios executores das politicas (no caso do meio ambiente, rgaos executores do Sistema Nacional do Meio Ambiente) por veres ainda é necessé- rio 0 detalhamento dos procedimentos edministratives, pra cos, do contetido destes instrumentos. Nestes casos, € de res- ponsabilidade dos érgaos executores - tais como, na rea am- biental, o Ministério do Meio Ambiente (MMA), 0 IBAMA, 0 Ins- tituto Chico Mendes (ICMBio), 0s 6rgaos estacuais de meio am- biente, as secretarias estaduais e municipais de meio ambiente, etivas aS etc -a elaboracao de Instrucdes Normativas, ou ainda Portarias, para este detalhamento, Na rea ambiental, éimportante ressaltar também o papel dos Conselhos de Meio Ambiente, em nivel federal (CONAMA), esta- dual (CONSEMAs) e municipal (COMDEMAs). A estes conselhos,, Cabe elaborar Resolugdes sje no sentido de criar regulamenta ‘Ges sobre temas nao diretamente tratados em Leis, seja visando detalhar o contetido das mesmas. Grande parte dos instrumen- tos legais hoje vigentes, na drea ambiental, sao Resolugdes do CONAMA. Obviamente, qualquer tipo de instrument legal nao pode ser contraditério 4 Constituigao Federal. Da mesma forma, um De- creto, uma Resolugao ou uma Instrucao Normativa nao podem ser contradit6rios as Leis. Além disso, na érea ambiental, Leis mu- nidpais no podem ser menos resritvas do que Les Estaduas, € estas ndo podem ser menos restritivas do que Leis federais. Essas diferencas de tipo e hierarquia dos instrumentos legais podem dar a impressio de confusao, mas é justamente por causa dessas diferengas que é possivel a consirucdo gradativa da participagao ¢ do controle social no estabelecimento de regras coletivas. “Nao sao as leis que modificam 0 mundo. 0 mundo é que modifica as leis.” Vivemos num mundo em construcao, quando se fala no es- tabelecimento de regras coletivas. Na area ambiental, os paises comegaram a fazer regras ha pouco mais de 30 anos, Quando pensamos que fazemos regras sobre como devemos nos rlaco- far uns com os outros ha milhares de anos ~ por exemplo, desde as cvlizagdes antigas exstem regras relacionadas a como puri quem roube ou mata- é facil perceber que estamos ainda engati: nhando no processo de fazer regras na area ambiental © problema é que os impactos ambientals nos citimos anos nao esto crescendo devagar... pelo contrario, 03 efeitos ambien- tais negativos da industrializacao, da urbanizacao e do aumento: de dreas agricola condunidas de forma a aumentar a erosio © a contaminagio ambiental por agrotéxicos tem sido crescents. De maneira geral, ha varios nstrumentos legais que propoem medi- das para redue ou mitigar esses efeltos, mas nem sempre les so suficientes, sa porque muitas vezes sio incomplets, seja Porque os 6rgaos ambientais em geral nao tém estrutura e recur- sos adequados para torné-los efetivos, ou seja, principalmente, regr cc porque a sociedade ainda nao tomou paras, com todaa participa- $20 e controle socal, a gestao sobre o ambiente. Em relago aosimpactos das atividades sobre os ambientes na- turais,alégica de compensagio ambiental tem sido muito utliza- da na elaboracao de instrumentos legals. Nessa ligica, assume-se que é possivel desenvolver priticas produtivas que geram grandes impactos ambientais, desde que haja dreas onde a conservagio ambiental - que possa em principio compensar esses impactos ~ esteja ocorrendo. Aqui, entretanto, hi um grande problema: as relagSes ecoligicas nao sao simples contas de matemitica e, por traz da compensacdo, existe uma forte pressdo para o crescimento econdmico. Hoje, por exemplo, o Brasil é 0 maior consumidor de agrot6xicos do mundo, utiizando 20 % do que se usa desses pro- dutos no planeta. A agricultura convencional e em larga escala, no Brasil eno mundo, usa quase 80 % da dgua doce disponivel, para irvigagio e para misturar os agrot6xicos. Em um mundo em que, em 2056, seremos 9 bilhoes de pessoas, sedentas de crescimen- to econémico (e também de agua), é bem provavel que sobrem Si st lore Observando 0 texto da Constitvicio Federal, é importante anal sar alguns elementos que apresentam uma certa relacao com 0 de- senvolvimento de agroflorestas ou sistemas agroflorestais, ainda {que de forma generalista [No Artigo 5°, Iniso XXII, € definido que “a propriedade atende- +4 asua fung3o social”. A definigio de fungao social é dadano Artigo 186, dispondo que a mesma é cumprida quando hé “aproveitamen- to racional e adequado, utlizagio adequada dos recursos naturais disponiveise preservacao do meio ambiente, observancia das dispo- sigdes que regulam as relacoes de trabalho e exploracio que favore- $2 obem-estar dos propritirios e dos trabalhadores.” artigo 225 da Constituigao Federal, por sua vez, abordando a questdo ambiental, define que “todos tém direto ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essen- cial saci qualidede de vida, impondo-se ao Poder Piblico ea cole- tividade o dever de defende-o e preservé-to para as presentese fu- turas geracées.” No Pardgrafo 1' desse Artigo,Inciso | esta disposto que, "Para assegurar a efetividade desse direito,incumbe ao Poder Pibiico preservar e restaurar 0 processos ecoldgics essenciais © prover o manejo ecologico das especies e ecossistemas.” muito poucas éreas para compensar impactos ambientais. Nesse melo em que é comum os espacos serem clasificados em “espacos de producao” ou “espacos de conservacao", praticas produtivas de diferentes grupos sociais, que juntam producio com conservaco ambiental namesma area, muitas vezes nao en- contram correspondéncia em leis, decretos ou outros instrumen- tos legais, levando a pressuposigao equivocada de que sio ilegais. Esta pressuposigdo € muitas vezes corroborada pelos prdprios 6rgios ambientais, apesar da Constituicdo Federal ser clara a0 afirmar que “a falta de norma regulamentadora nao pode tornar invidvel o exercicio dos direitos e liberdades constitucionais e das pretrogativas inerentes a nacionalidade, & soberania e a cidada- nia.” Ou seja, mesmo que ainda nao existam normas detalhadas sobre determinada prdtica produtiva, nao significe que ela seja ilegal, mas apenas que ela néo foi ainda reguiamentada Considerando estes aspectos, a participacao social ea discus- sao politica dos instrumentos legais deve ser umn elemento funda- ‘mental em um Estado que se quer realmente democratico. Assim, de uma forma geral,portanto, dias questdes princiaisin- dicam a ‘consttucionalidade” dos Sistemas Agroflorestais * 0s Sistemas Agroflorestais permitem o condicionamento dda fungao social da propriedade? +05 Sistemas Agroflorestais restauram processos ecol6aicos essenciais e/ou promovem 0 manejo ecolégico das espécies ¢ dos ecossistemas? Se arespostaa estas duas questoes € afirmativa, em tese os Sste- mas Agroflorestais nio s6sio respaldados pela Consttuigdo Federal quanto merecem apoio do Poder Pblico, No ambito da Cooperafio- resta, estudos realizados recentemente em parceria com o Instituto CChico Mendes de Conservacao da Biodiversidade (ICMBio), a Em- bapa Florestas e a Universidade Federal do Parana demonstraram que estas respostas 0 de fato afirmativas: as agroflorestas,além de produzirem alimentos em grande quantidade, gerando cada vez ‘mais autonomia e seguranca alimentar para as familias agricultoras, apresentam grande biodiversidade e fixam mais de 6 toneladas de carbono por ano, no mesmo espago.

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