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A SUBJETIVIDADE AUTORAL EM TEXTOS

ACADÊMICOS: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

AUTHORIAL SUBJECTIVY IN ACADEMIC TEXTS: SOME


REMARKS

Adail Sobral1
Rosaura Soligo2
Guilherme do Val Toledo Prado3

RESUMO: A partir de propostas teóricas de Bakhtin e Bruner, e considerando a


experiência de escrita e da vivência acadêmica dos três autores, este ensaio especulativo
pretende discutir aspectos da relação entre a subjetividade e a objetividade na esfera
acadêmica, incidindo mais especificamente sobre as marcas de subjetividade autoral em
textos acadêmicos. Nossa discussão recorre a exemplo práticos, apoiando-se nas marcas
linguísticas (materialidade textual) e nas marcas enunciativas (relações entre locutores e
interlocutores e posicionamento avaliativo do locutor). Enfocamos algumas formas “não
canônicas” de apresentação de dissertações e teses, hoje aceitas em algumas instituições.
Examinamos implicações dessa alteração de atitude considerando as possíveis relações
entre modos de pensar e formas de dizer, em termos da definição de gênero (e de “nova
ciência”) de Bakhtin e da distinção entre modo paradigmático e modo narrativo de
pensar, de Bruner. Buscamos mostrar que não são as marcas aparentes do texto que
indicam a maior ou menor subjetivação na construção discursiva do autor, mas as
posições enunciativas possíveis nele reveladas/desveladas. Concluímos que é possível
realizar gêneros acadêmicos, em sua proposta objetividade, recorrendo a diferentes
textualidades que propiciam, em maior ou menor grau, a manifestação em textos
acadêmicos da subjetividade legítima, aquela inerente a tudo o que é humano.

Palavras-chave: subjetividade autoral, textos acadêmicos, Bruner, Bakhtin.

ABSTRACT: Based on theoretical proposals by Bakhtin and Bruner and considering the
experience of writing and academic practice of its authors, this speculative essay aims to
present a discussion about the relationship of what might be considered subjective and
objective in the academic sphere, more specifically regarding authorial subjectivity in
academic texts. Our discussion examines practical examples and considers the question
in terms of linguistic (textual materiality) and enunciative marks (relations between
enunciators and interlocutors and the enunciator‟s evaluative positioning). We examine
so-called non-canonical forms for presentation of dissertations and theses, today
accepted in some institutions. We explore implications of this alteration of attitude
considering the possible relations between ways of thinking and forms of saying, in terms
of Bakhtin‟s definition of genres (and “new science) and Bruner‟s distinction between
paradigmatic and narrative modes of thinking. We make efforts to show for showing that
it is not linguistic marks in the text that indicate the higher or lesser degree of
subjectivation in the discursive construction of authors, but their possible enunciative

1
Professor do Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade Católica de Pelotas
(UCPEL). E-mail: adail.sobral@gmail.com.
2
Professora do Instituto de Educação e Cultura ABAPORU – Salvador-BA. E-mail:
rosaurasoligo@gmail.com.
3
Professor da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). E-
mail: gvptoledo@gmail.com.
Sobral, A.; Soligo, R.; Prado, G. V. T. A subjetividade autoral em textos acadêmicos: 175
algumas considerações. Nonada: Letras em Revista, n. 28, vol. 1. Maio de 2017.
pp. 174-193.

positions. We conclude that it is possible to comply to academic genres, in their


proposed objectivity, resorting to different textualities favoring a higher or lesser degree
for expressing the legitimate subjectivity in academic texts, the one inherent to
everything that is human.

Keywords: authorial subjectivity, academic texts, Bakhtin, Bruner.

Introdução

Talvez os homens não sejamos outra coisa que não um modo particular de
contarmos o que somos. E, para isso, para contarmos o que somos, talvez
não tenhamos outra possibilidade senão percorrermos de novo as ruínas de
nossa biblioteca, para aí tentar recolher as palavras que falem por nós
...Que podemos cada um de nós fazer sem transformar nossa inquietude
numa história? E, para essa transformação, para esse alívio, acaso
contamos com outra coisa a não ser os restos desordenados das histórias
recebidas? E isso a que chamamos autoconsciência ou identidade pessoal,
isso que ao que parece tem uma forma essencialmente narrativa não será
talvez a forma sempre provisória e a ponto de desmoronar que damos ao
trabalho infinito de distrair, de consolar ou de acalmar com histórias
pessoais aquilo que nos inquieta? (Jorge Larrosa)

Este texto é uma reflexão sobre uma questão cuja base são tanto
propostas teóricas de Bakhtin e Bruner como a experiência discursiva de
seus três autores, que aqui se afirmam em um “nós” autoral que revela, em
lugar de esconder, a existência de sujeitos, eus de fato afinados numa
mesma fundamentação teórica em relação aos textos acadêmicos, ainda que
partindo de posições distintas. Nos últimos anos temos praticado uma
escrita de textos que não ambiciona, enganosamente, a isenção objetiva,
uma vez que nem mesmo o tempo e o espaço estão isentos de valores (como
o provou Einstein com a Teoria da Relatividade), mas que busca não ser
subjetivista, sem bases ou fundamento, e revelar ou desvelar o
posicionamento valorativo do autor.
Todo autor pretende sempre legitimar de algum modo a presença
de suas próprias convicções pessoais. E o faz porque, como “a” verdade não
existe, tem-se de assumir, sem distorções além das inerentes à condição
humana – marcada por um aqui-agora singulares, porém com um pé na
universalidade –, as nossas verdades como verdades provisórias, porém
válidas, que outras não anulam, mas compõem. Em russo (e essa observação
vem do fato de um de nossos autores de base ser Bakhtin) há duas palavras
para “verdade”; uma para as verdades ditas universais, istina, e outra, pravda,
para as verdades “contextuais”, ou seja, para a veridicidade, aquela que é
verdade situadamente e não em termos universais (BAKHTIN, 2003,
passim). O que seria, de fato, uma verdade universal? Talvez a afirmação de
que a Terra se move? No mundo do sentido, mundo da linguagem em uso,
das relações entre sujeitos via linguagem, no qual há pouco de fixo e muito
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algumas considerações. Nonada: Letras em Revista, n. 28, vol. 1. Maio de 2017.
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de negociado no contexto, seria a istina possível ou se poderia negociar uma


istina que não anulasse a pravda?
Todo escrito é marcado por uma construção, que varia com o
tempo, o lugar e as pessoas, ou seja, a situação e o contexto: estamos sempre
escolhendo um interlocutor virtual (ou presumido) com o qual
pretendemos dialogar diretamente. Mas acabamos por responder a
interlocutores de cuja existência sequer desconfiamos, desprezamos outros
por meio de um simples advérbio, às vezes involuntariamente, mudamos o
que dizemos – ou, ao contrário, fazemos provocações subliminares – por
causa de opiniões e ou posições de leitores reais ou potenciais.
Ponte e/ou abismo, a rigor o texto escrito é sempre uma construção
que coloca em contato autor e leitor. E camuflar nossas intenções, nossas
preferências, nossa “situacionalidade” de autor, esperando que não sejam
identificadas, é, nesse caso, uma impossibilidade. Afinal, há muito Paul
Valéry nos alertou de que mesmo as teorias mais científicas são sempre
fragmentos, cuidadosamente preparados, de uma autobiografia qualquer
(1991, p. 204). O que precisamos, portanto, é assumir a precariedade de toda
afirmação com pretensões à verdade universal, e defender a veridicidade das
afirmações de nosso ponto de vista, que depende de nosso contexto
específico. Não como álibi (“não consigo entender x”), mas como
responsabilidade pelo dito e pelo dizer (“de minha posição, que assumo,
acho que x não cabe neste caso”).
Nossa proposta não defende o uso de avaliações que simplesmente
caracterizem um objeto como " ótimo” ou “péssimo", mas a validade de
afirmações como "considero X positivo/negativo porque leva/não leva em
conta o contexto, como se pode perceber, por exemplo, no seguinte
comentário...". Muitas vezes, em nome da objetividade positivista, a
polêmica ou o reconhecimento do valor de um objeto, impõem-se restrições
a análises em que o analista reconhece seu ponto de vista valorativo em vez
de tentar ocultá-lo. O fato é que os valores mobilizados na comunicação
estão em permanente tensão com valores advindos da posição singular de
cada um dos envolvidos.
Nosso ponto de partida e de referência é a descrença na
possibilidade de uma total objetividade em um registro que tem no
comando um sujeito, autor de linguagem, dirigindo-se a leitores igualmente
sujeitos, pois essa condição de sujeito invariavelmente pressupõe uma
subjetividade presente, mínima que seja, e ainda que a esfera de produção,
recepção e circulação social do texto escrito exija “objetividade”, o seu
autor jamais será desencarnado (NAJMANOVICH, 2001). Logo, não se nega
a objetividade, mas se deseja pensá-la sem prejuízo da inevitável
subjetividade.
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Vejamos um exemplo simples: o título “Quem forma quem? –


Instituição dos sujeitos”4 de uma dissertação de mestrado. De um ponto de
vista enganosamente objetivo, temos uma pergunta a sugerir que a pesquisa
é uma resposta, seguida de uma afirmação que remete à ideia de formação
como um processo instituinte dos sujeitos. Entretanto, a criação desse
título pela autora, com estas seis palavras e dois sinais de pontuação, teve,
segundo ela,

a intenção de, pela pergunta, revelar a busca das recíprocas


influências no processo de formação e, pela afirmação que a ela
se segue, sugerir o posicionamento teórico a respeito desse
processo e da relação entre instituição e sujeito. Assim, a
expressão „instituição dos sujeitos‟ pretende afirmar três
possibilidades ao mesmo tempo: a de instituição composta de
sujeitos, tomados como participantes ativos, o que poderia
metaforicamente sugerir que ela é deles; a instituição dos sujeitos
como uma ação de sujeitos que instituem; e a instituição dos sujeitos
como uma ação que incide nos sujeitos, instituindo-os. (SOLIGO,
2007 p. 34).

Além disso, a escolha de um título com apenas seis palavras e sem


dois pontos tem a pretensão de ser alternativa, uma vez que o habitual em
teses e dissertações nas ciências humanas são títulos bastante longos e
geralmente com dois pontos separando duas afirmações, uma geral, que
nomeia o trabalho, e outra, mais específica, que se pretende uma explicação
ou exemplificação da anterior. Trata-se de uma convenção corriqueira do
gênero, que, nesse caso, não foi seguida, sem com isso distorcê-lo ou torná-
lo outro, uma vez que, como veremos, o texto em si não é a base do gênero,
por ser sua condição necessária, mas não suficiente.
O título em questão é, assim, portador dessas preferências que, no
caso, foram explicitadas na apresentação do trabalho. Evidentemente, o
objeto de desejo de um autor com esse perfil, que encara a escrita como
produção de um jogo de efeitos para enredar o leitor, é a completa
coincidência entre o que pretendia dizer, o que de fato diz e o que será
compreendido pelo leitor. Sim, mas acontece que esta coincidência – muito
útil como objetivo e legítima como objeto de desejo – na realidade é sempre
uma ficção. Porque a produção de sentidos a partir do que lê é uma
prerrogativa do leitor, ainda que ele não seja autárquico. Claro que há um
eixo de sentido que serve de ponto de convergência, mas assim como a
entoação avaliativa, a compreensão ativa revela a posição do sujeito que
diz/escreve e escuta/lê.
O sujeito é sempre sujeito e autor tanto quando escreve como
quando lê. Quando escreve, pode desejar tudo e fazer de tudo para produzir

4
Dissertação de Mestrado de Rosaura Soligo, intitulada “Quem forma quem? – Instituição dos
sujeitos” orientada por Guilherme do Val Toledo Prado, defendida em 2007 na Faculdade de
Educação da Unicamp.
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os efeitos de sentido que pretende. Seu leitor, entretanto, poderá


compreender o que bem entender, pois é autor de sua própria produção de
sentido, ainda que dependendo da entoação ativa do autor do texto que lê.
Além disso, o autor não deixa de ser autor ao fazer sua leitura de outros
autores que, em relação a ele, tinham o mesmo objeto de desejo. Contra essa
fatalidade discursiva não há nada a fazer. O discurso de sentido único é uma
ficção sem final feliz, pois a produção de sentidos, acontecimento inevitável
da linguagem, não lhe permite vir à existência.
Portanto, de certo modo as intencionalidades e preferências do
autor podem ser solenemente ignoradas pelo leitor. Este,ao assim agir,
estará exercendo seu pleno direito, exceto em casos de evidente equívoco.
Ou seja, os desejos subjetivos que o autor pretendeu marcar objetivamente
na escrita podem ser inalcançáveis como tal pelo leitor. Mas sua escrita não
deixa de ser portadora de subjetividades simplesmente porque estas não
são reconhecidas no contexto acadêmico. Do mesmo modo, um autor
engenhoso, que supõe praticar uma escrita rigorosamente objetiva,
desencarnada, dita imparcial e neutra, poderá a qualquer momento ser
descoberto em sua subjetividade, impossível de ocultar por completo.
Ressaltamos que “subjetividade” não tem aqui o sentido de
aparelho psíquico individual, de domínio pelas emoções em si, mas de
situacionalidade, de posição enunciativa – social e histórica – de quem
escreve. A objetividade fundada apenas no apagamento de marcas de
subjetividade (por exemplo, dizer “verifica-se...”) seria entendida assim
como algo que busca criar um simulacro da ausência de um sujeito
enunciador, um inútil ocultamento da autoria, pois esse agir supõe um
autor que cria sua própria ausência e, assim agindo, deixa inevitavelmente
marcas de seu agir, de sua presença criadora de ausência. A especular sobre
isso dedicamos este nosso ensaio.
Num primeiro momento, discutimos a autoria do ponto de vista
bakhtiniano. Em seguida, discorremos com base em Bruner sobre os dois
modos de pensamento e discurso. Em outra seção, para delimitar
devidamente nosso tópico, apresentamos uma descrição da perspectiva
bakhtiniana de gêneros do discurso. Nesse momento, unimos teoria e
análise, fazendo uma descrição de vários exemplares de gênero desse ponto
de vista, distinguindo entre gênero, discurso e texto. Preferimos, dado o
caráter ensaístico do texto, não separar teoria e análise, mas mostrar uma
possibilidade de integrá-las. Por fim, empenhamo-nos em dar certo
acabamento a nossas especulações retomando os distintos elementos
arrolados a fim de apresentar uma proposta de legitimação da subjetividade
fundada no deslocamento desta da materialidade textual estrita (“meu
trabalho...”) para o plano das relações enunciativas: a posição relativa do
autor do texto com respeito a seus interlocutores.
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A perspectiva dialógica de autoria

Para definir nosso posicionamento a respeito da autoria, partimos


de Bakhtin (1993), nos termos da discussão de SOBRAL (2012), aqui
retomada em parte e reformulada neste contexto ensaístico. As relações
dialógicas como princípio estruturador do sentido são constitutivas dos
discursos em termos arquitetônicos (de posicionamento enunciativo),
ainda que os discursos possam ser estruturados composicionalmente (em
termos de forma nos textos) de modo a apresentar ou não suas marcas.
Como se sabe, a forma arquitetônica é entendida como a concepção da obra
enquanto objeto estético (uma relação de sentido entre interlocutores), e a
forma composicional como o modo específico de estruturação da obra
externa (o texto em si) a partir de sua concepção arquitetônica. O objeto
estético é o todo da obra, os sentidos criados pela obra, enquanto a obra
externa é o plano dos recursos de linguagem de que lança mão o autor. Obra
estética e obra externa não existem uma sem a outra, mas a obra estética
tem a obra externa como um de seus recursos, sendo, portanto, superior a
ela no sentido de englobá-la. Tudo é dialógico em termos arquitetônicos,
ainda que isso não seja explicitado composicionalmente: isto é, mesmo que
apareça em forma de monólogo, um discurso é sempre a voz de alguém em
contato, direto ou indireto, próximo ou remoto, com outras vozes, tanto
presentes ao texto como ausentes dele. Aí reside a grande produtividade do
conceito de gênero do discurso do chamado Círculo de Bakhtin:– o fato de
unir os aspectos textuais aos aspectos discursivos, e privilegiar a posição
relativa dos sujeitos como base do sentido, mostrando assim, em seus
termos, a totalidade do dito, que vem de um dizer (texto) e de um modo de
dizer (discurso), a depender das relações enunciativas.
Nesse sentido, talvez se possa dizer que há duas grandes
modalidades de discurso em termos de forma. O discurso tendencialmente
monológico e o discurso tendencialmente dialógico. O primeiro busca criar
efeitos de neutralização, na superfície discursiva, das vozes que o
constituem, ou seja, procura esconder as marcar linguísticas dessas vozes;
ele também está voltado para a instauração de uma voz dominante, de
maneira explícita ou implícita. O discurso tendencialmente dialógico está
voltado para tornar presentes as vozes que o constituem, para a
instauração, mais ou menos explícita, de um concerto de vozes, que
naturalmente podem ser dissonantes. Logo, pode haver discursos que se
mostram composicionalmente dialógicos (na superfície) e tendem ao
monológico (no nível das relações concretas entre vozes), e discursos
composicionalmente monológicos (na superfície) que tendem ao dialógico
no sentido de instauração, mais ou menos explícita, de um concerto de
vozes.
O autor está presente no todo do discurso, em sua organização, nas
escolhas feitas. Não é a partícula “eu” que indica o autor, mas o fato de
alguém dizer algo de uma dada maneira, com ou sem a partícula “eu”. Claro
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que se pode discutir sobre graus de presença autoral, que teriam como
possíveis extremos o formulário do Imposto de Renda e a ficção, mas o que
importa é que, embora as marcas de pessoa num texto sejam relevantes, é
no todo do texto, que as inclui, que está o autor.
Destaca-se aqui a ação autoral arquitetônica. A posição do autor
com relação ao conteúdo de seu enunciado é ativa, mas não o coloca acima
de todas as marcas, discursivas ou não, que incidem sobre seu agir em seu
ambiente sócio-histórico. Ser autor de um texto escrito envolve dizer tudo
em termos pragmático-referenciais, isto é, cabe explicitar as circunstâncias
do texto produzido e seu objeto, pois faltam aos enunciados escritos as
circunstâncias concretas que permitem identificar o dito e o presumido de
modo relativamente imediato como o seria na interação face-a-face (ainda
que nem sempre se identifiquem todos os ditos e presumidos nesta última).
O estilo também é interativo, e vem da relação entre o autor e o
grupo social de que faz parte, em seu representante autorizado, ou típico,
definindo-se a partir da imagem social do interlocutor, que também é
constitutivo da obra. Tem relações com a forma do conteúdo, o modo como
o conteúdo é organizado, sendo determinado pelas inter-relações da escala
avaliativa do evento descrito (ou seja, as posições relativas do eu e tu
envolvidos), e de seu agente (a imagem social do autor) cujo peso depende
do “contexto não articulado de avaliações básicas da obra” (BAKHTIN,
1997, p. 11), isto é, das possibilidades sociais de avaliação. Isso se liga ao
modo como o mundo social e histórico se faz presente na obra. Para
Bakhtin, a avaliação não se resume a um ou outro enunciado do autor, mas,
pelo contrário, manifesta-se “na própria maneira como o material artístico é
visto e disposto” (BAKHTIN, 1997, p. 12), o que descarta de uma vez por
todas a ideia de que só são avaliações autorais os elementos apresentados
como tais nos discursos, como usar a primeira pessoa, por exemplo.
Para os propósitos deste ensaio – problematizar a questão da
subjetividade autoral em textos acadêmicos – não será demais considerar
que, partindo da necessidade de haver dois participantes “para ocasionar
um acontecimento estético”, Bakhtin (1997, 42) afirma que o evento
estético pressupõe, para realizar-se, “duas consciências que não coincidem”,
algo que na verdade se aplica a todo evento discursivo. Os vários graus de
distanciamento entre o autor (como figura discursiva e não autor pessoa
física) e o tópico produzem diferentes gêneros, mas permanece o fato de
que o autor se ocupa de um dado tópico a fim de produzir o tema do
enunciado como um todo, ou seu sentido. Para deixar mais clara a questão,
recorremos a um exemplo: o autor pode falar da cigarra e da formiga (seu
tópico) a fim de dar uma lição de moral (seu tema).
O posicionamento do autor ao lado do tópico, o compartilhamento
por eles de um valor comum, ou mesmo sua oposição, produzem diferentes
eventos discursivos. Portanto, o que marca o gênero dos textos não são as
palavras usadas, as formas comuns etc., mas a relação entre o autor, seu
tópico e seu interlocutor, bem como a ação que o gênero realiza, algo que se
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define em termos da esfera de produção, recepção e circulação em que o


texto é produzido, da relação de interlocução específica, com toda uma
margem de estabilidade relativa etc.
É preciso destacar que, de uma perspectiva bakhtiniana, o autor, o
tópico e o grau de proximidade entre eles não prescindem do interlocutor, o
outro, que afeta a relação entre autor e tópico. Nesse sentido, o grau de
proximidade/distanciamento do autor com relação ao outro também é
constitutivo, podendo-se verificar que, num dado gênero, o enunciador é
levado a assumir esta ou aquela posição com relação ao outro, e, a depender
do gênero, tem um maior ou menor grau de liberdade. Na variedade de
relações com o outro está a chave da constituição do tom (avaliação) e do
fio (unidade temática) dos discursos, levando-se em conta necessariamente
as esferas de atividade em que isso é, num dado momento, possível e
aceitável.
Ser autor, nesse sentido, é assumir, de modo permanentemente
negociado, posições que implicam diferentes modalidades de organização
de textos segundo os gêneros. Em outros termos, a própria seleção de
palavras pelo autor envolve uma orientação tanto em relação ao ouvinte
como em relação ao tópico, sendo essa orientação que encaminha a
interlocução. Trata-se de escolhas marcadas por juízos de valor, que vêm do
contexto em que se acha o autor, levando seus enunciados a apontar para
uma direção específica. Assim podemos compreendê-la como uma
cosseleção lexical, em que a simpatia entre os interlocutores, ou sua
antipatia, remete à avaliação que o autor faz do tópico do enunciado.5
E como nenhuma escolha é neutra, mas sempre carregada de juízos
de valor na interlocução estabelecida entre os participantes do evento
discursivo, a organização dos discursos fica submetida a esse imperativo
comunicativo de unir autor, leitor e tópico numa negociação de sentidos
que não é infinita, mas apresenta uma ampla margem de variação. Nesse
processo, a língua em si é mobilizada pelas necessidades de interação e é
isso que transforma significação (parte do sistema da língua) em sentido
(parte do sistema da linguagem).

Modos de pensamento e Discurso

A intenção de problematizar a subjetividade autoral e,


consequentemente, a tensão entre gênero e modalidade textual, da
perspectiva a partir da qual entendemos a questão, pressupõe tematizar os
tipos de pensamento que se realizam nos discursos manifestos nos textos
escritos. Para tanto, nos apoiamos nas contribuições de Bruner (2002), cuja
argumentação é de que há dois modos distintos e complementares de
pensamento: o modo narrativo e modo paradigmático (ou lógico-científico).
São modos distintos de funcionamento cognitivo que se vinculam com

5
Cf. AUTOR1, 2012, p.133, para a formulação original aqui parafraseada.
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modos diferentes de o sujeito se relacionar com a experiência e com a


realidade e, segundo entendemos, definem, e justificam, modos distintos de
organização do discurso, e mesmo do texto que lhe dá materialidade,
segundo a posição autoral (narrativa ou lógico-cientifica). Não se trata do
pensamento como conteúdo, nem em termos psicológicos estritos, mas e
distintos atos de pensamento como estratégia de abordagem de objetos. Diz
Bruner sobre o modo paradigmático:

O modo paradigmático se apoia em argumentos lógicos e


funciona como uma tentativa de preencher o ideal de um
sistema formal de descrição e explicação, que lança mão de
procedimentos de caracterização ou conceitualização e das
operações pelas quais as categorias são estabelecidas,
instanciadas e relacionadas umas às outras para formar um
sistema. (pp.13-14)

Bruner caracteriza esse modo de pensamento observando que,


grosso modo, ele busca causas genéricas, definições e procedimentos para
assegurar a referência comprovável e testar a verdade empírica. A
linguagem, aí, responde a necessidades de consistência, de não contradição
e de fundamentação. A perspectiva é transcender o particular em direção ao
geral, à abstração, e no final renunciar, por princípio, a qualquer valor
explicativo relacionado ao particular. Esse é o modo de pensamento que
orienta o discurso acadêmico padrão, levando a escolher os gêneros do
discurso considerados porta-vozes de dizeres predominantes na academia,
o que se aplica especialmente a textos de registro de pesquisas.
Não seguir estritamente essa forma de registro pressupõe, para o
pesquisador recusar a forma predominante de se relacionar com a
experiência, com a realidade que é tema de análise, com o discurso
predominante e com as formas canônicas de apresentação do texto
considerado final. Pressupõe assim pensar de outro modo, não canônico.
Surge a questão: se a perspectiva for de produzir formas narrativas de
registro, será preciso então privilegiar um modo narrativo de pensar? Terá
este modo legitimidade no mundo acadêmico?
Conforme Bruner (2002),

O modo narrativo de pensamento tem como enfoque ações e


intenções humanas ou similares às humanas, bem como
vicissitudes e consequências que marcam o seu curso. Ele se
esforça para colocar seus milagres atemporais nas
circunstâncias da experiência e localizar a experiência no
tempo e no espaço. (...) A história tem que construir dois
panoramas simultaneamente. Um é o panorama da ação, onde
os constituintes são os argumentos da ação: agente, intenção ou
objetivo, situação, instrumento, algo que corresponde a uma
“gramática da história”. O outro é o panorama da consciência: o
que os envolvidos na ação sabem, pensam ou sentem ou não
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sabem, não pensam ou não sentem. Os dois panoramas são


essenciais e distintos (p.14-15).

Apoiando-se em Paul Ricoeur, Bruner (2002) afirma que a narrativa


se constrói com o foco na condição humana e que, por esse motivo, as
histórias possuem desfechos singulares. Nesse aspecto elas diferem dos
argumentos teóricos, que são simplesmente conclusivos ou inconclusivos,
sem margem para as singularidades.
Realizados na linguagem, os dois modos de pensamento podem ser
igualmente convincentes, mas com perspectivas muito diferentes. O modo
paradigmático é convincente porque se apoia em provas empíricas,
proposições, uso de categorias e conceitos, relações de causalidade,
generalizações em busca de uma verdade universal, consistência teórica
comprovada. Já o modo narrativo é convincente porque busca
verossimilhança, apresenta condições prováveis entre dois eventos,
podendo até mesmo ser contraditório sem prejuízo do sentido. Além disso,
se empenha em generalizar sem apagar o particular, o singular, mas
transcendendo-o. O modo paradigmático se caracteriza por aspirar à
verdade universal e o narrativo por aspirar à construção de uma coerência
verossímil.
Retomando o que dissemos, esses dois modos podem ser
caracterizados, a partir de Bakhtin, da seguinte maneira: o paradigmático se
vincula à busca da istina, a verdade universal, e, o narrativo se vincula à
pravda, a veridicidade, contextualmente variável, vinculada ao particular.
Bakhtin defende, contra a teorização desencarnada, que só vê o geral e
apaga o particular, a manutenção dos dois planos. Em sua discussão, afirma:

É um triste equívoco, herança do racionalismo, imaginar que a


verdade [pravda] só pode ser a verdade universal [istina] feita de
momentos gerais, e que, por consequência, a verdade [pravda] de
uma situação consiste exatamente no que esta tem de
reprodutível e constante, acreditando, além disso, que o que é
universal e idêntico (logicamente idêntico) é verdadeiro por
princípio, enquanto a verdade individual é artística e
irresponsável, isto é, isola uma dada individualidade.
(BAKHTIN, 2010, p. 92)

Unindo os elementos advindos de Bakhtin e de Bruner, de nossa


perspectiva não existiria apenas “a” verdade normativa única, mas dois
planos de verdades, um geral e outro particular, ambos os planos com
direito de cidadania no discurso científico: cada um constrói sua/s
verdade/s a partir da realidade relacional que vive, da experiência de viver,
da história de sua vida, dos sentidos que atribui às coisas, ao mundo, a si, ao
outro, sempre constituído por esse outro, sem no entanto negar a
generalidade. A bem dizer, como insiste Bakhtin (2010), é o
reconhecimento das verdades particulares que dá forma concreta à verdade
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algumas considerações. Nonada: Letras em Revista, n. 28, vol. 1. Maio de 2017.
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universal. Em outras palavras, os valores universais são mantidos no plano


das verdades situadas, mas isso não precisa necessariamente refutar os
valores particulares que lhe dão forma; o “ser humano em geral” só se
manifesta em seres humanos concretos particulares, ou seja, nunca vemos o
ser humano abstrato, mas seres humanos particulares, sem que por isso
refutemos a existência do “ser humano” como categoria que engloba todos
os seres humanos. Logo, o verídico [pravda], singular, não nega o verdadeiro
[istina], geral, mas o concretiza.

Gênero, discurso, texto – tensões e aproximações

Nossa própria existência não pode ser separada do modo


pelo qual podemos nos dar conta de nós mesmos. É
contando nossas próprias histórias que damos, a nós
mesmos, uma identidade. Reconhecemo-nos, a nós
mesmos, nas histórias que contamos sobre nós mesmos. E
é pequena a diferença se essas histórias são verdadeiras
ou falsas – tanto a ficção como a história verificável nos
proveem de uma identidade (Ricoeur)

O desafio de pesquisadores de grupos e tendências que têm


priorizado registros narrativos da pesquisa é produzir o registro de um
gênero (dissertação ou tese, por exemplo), que é estritamente vinculado ao
modo de pensamento paradigmático, na forma de um texto narrativo –
muito mais compatível com o modo de pensar narrativo, que não costuma
ser considerado o mais adequado para os gêneros acadêmicos dissertação e
tese.
A dificuldade, nesse caso, é relatar a pesquisa com um tipo de
registro (narrativo) cujas características são antagônicas ao tipo de
pensamento/discurso (lógico-científico/paradigmático) vinculado
historicamente ao gênero a ser produzido (dissertação/tese) por se tratar de
uma pesquisa acadêmica. Em outras palavras, como gênero, uma
dissertação/tese pressupõe certos temas (não tópicos) e certas formas de
composição (explicitação de conceitos, percurso metodológico, análise de
dados, lições aprendidas etc.) que devem ser garantidos, mas que, em
princípio, não são incompatíveis com os gêneros marcados pelos recursos
narrativos escolhidos para os registros. Daí que o esforço de apresentar
narrativamente uma pesquisa acadêmica do campo das ciências humanas
tende a ser trabalhoso, porque há uma tensão entre o gênero a ser
produzido (tese ou dissertação) e o texto do registro do percurso de
pesquisa.
A concepção bakhtiniana de gênero, que é nossa base aqui, consiste
em, sem desprezar as marcas linguísticas (digamos, o pronome “eu”), ver o
uso destas em termos dos propósitos enunciativos, do projeto de dizer, de
quem usa, ou seja, ela considera também as marcas enunciativas, que é do
plano, superior ao do texto, do discurso. Assim, dessa perspectiva, a
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algumas considerações. Nonada: Letras em Revista, n. 28, vol. 1. Maio de 2017.
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presença ou ausência de “eu” não é o fator determinante, mas sim o que essa
presença indica sobre o texto (a materialidade) do ponto de vista do
discurso (a organização dessa materialidade por um locutor/autor com
relação a um dado interlocutor, sendo esses os elementos que vão constituir
o gênero (as formas relativamente estáveis doas enunciados nas diversas
esferas).
Bakhtin não destaca em sua principal formulação de gênero do
discurso a questão do estilo, da forma de composição e da unidade temática
(aquilo a que o texto remete, seja qual for o tópico abordado), mas as
relações enunciativas dos gêneros, o projeto enunciativo: é a partir deste
que esses outros elementos formais se organizam. Cabe por isso diferenciar
tópico e tema. O tópico aponta para o assunto tratado por um texto e o
tema para o sentido que se deseja atribuir a esse texto. Três textos com o
mesmo tema em uma mesa redonda em geral têm três tópicos distintos.
Digamos que o tema da mesa seja “educação básica: desafios”; os três textos
vão abordá-lo de diferentes maneiras, de acordo com diferentes tópicos.
Digamos que um aborde a legislação da educação básica, outro os dilemas
da educação básica e o terceiro a relação entre educação básica e formação
de professores. Nenhum desses tópicos esgota o tema; o tema é a integração
entre esses vários tópicos. Assim, o mesmo tema terá sido tratado segundo
diferentes posições enunciativas, e por isso o que constitui o sentido do
tema da mesa é a integração entre esses tópicos, logo, dessas três posições
enunciativas. Mesmo que os três membros concordem em sua avaliação do
tema, suas posições enunciativas não coincidem.
Em termos do “texto” final da mesa, esses três tópicos vão criar seu
tema como um todo: partindo do mesmo tema, os textos vão abordar
distintos aspectos deste, e a unidade resultante dos três será o tema geral da
mesa, aquilo que esse evento como um todo enunciou a partir dos tópicos.
Resumindo, o tópico dos textos é o assunto diretamente abordado por eles,
ao passo que o tema é a perspectiva a partir da qual abordam esse assunto.
Em nosso exemplo, a unidade, tensa e contraditória que seja, entre esses
tópicos vai gerar o tema, aquilo que, quando o interlocutor deixa o recinto
onde as pessoas falaram, fica ressoando nele, aquilo que não foi dito
diretamente nos textos, mas que resultou daquilo que o foi, o ponto alto de
tudo o que se disse, o que ficou por assim dizer fixado para os
interlocutores.
Cabe agora estabelecer o elemento que marca efetivamente um
gênero, sem menosprezar os demais componentes Segundo Bakhtin, trata-
se da relação entre os interlocutores; é esta que integra todos os outros
elementos:

Essa consideração [do destinatário] irá determinar também a


escolha do gênero do enunciado e a escolha dos procedimentos
composicionais e, por último, dos meios linguísticos, isto é, o
estilo do enunciado. (...). Portanto, o direcionamento, o
endereçamento do enunciado é sua peculiaridade constitutiva,
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algumas considerações. Nonada: Letras em Revista, n. 28, vol. 1. Maio de 2017.
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sem a qual não há nem pode haver enunciado [grifamos]. (...).


As várias formas típicas de tal direcionamento e as diferentes
concepções típicas de destinatários são peculiaridades
constitutivas e determinantes dos vários gêneros do discurso.
(...) A escolha de todos os recursos linguísticos é feita pelo
falante sob maior ou menor influência do destinatário e da sua
resposta antecipada [grifamos] (Bakhtin, 2003, p. 302 e 305-6).

Destacamos a conclusão de Bakhtin: “A escolha de todos os


recursos linguísticos é feita pelo falante sob maior ou menor influência do
destinatário e da sua resposta antecipada” (BAKHTIN, 2003, p.306). O
gênero, portanto, não se reduz para ele ao conjunto de procedimentos
linguísticos que criam o texto. O elemento vital é o posicionamento dos
interlocutores uns com relação aos outros, e o projeto de dizer do locutor.
Estilo, forma de composição etc. são recursos necessários, mas não
suficientes, porque sua escolha depende do projeto de dizer, e não vice-
versa.
Vejamos, em termos dessa definição de gênero, um exemplo de
texto de um dado gênero, pensando na questão da presença ou não de um
“eu”, ou “ele”,e do sentido desse “eu” ou “ele”:

Foi no ano de 1985. Ele cursava o segundo ano na Faculdade de


Educação da Universidade Estadual de Campinas.
... Foi quando conheceu o “velho judeu de barbas brancas”
(como dizia uma professora), Karl Marx. Esse autor penetrou
em sua vida de leitor profundamente.
... Como em um labirinto, muitos conceitos de Marx o levaram
para becos aparentemente sem saída. Encontrou, por outro
lado, respostas até para perguntas que ainda não havia
formulado. Os esforços para sair das armadilhas do labirinto
foram recompensados em reflexões inusitadas e, pouco a pouco,
consistentes.
... O texto que mais lhe chamou a atenção naquela época foi “A
questão do Método”, primeira parte do livro Desregulagens, de
Laymert Garcia dos Santos. ... Nesse texto introdutório ele
encontrou, citados, George Orwell, Aldous Huxley e Eugène
Zamiatine. Isso o surpreendeu! Por que esses autores se
encontravam em um trabalho acadêmico? Qual a contribuição
que a literatura poderia dar à ciência, ao conhecimento
científico?
Veio do próprio texto o que o esclareceu: “Graças à ficção, tais
autores, explorando os limites do problema que abordam,
podem apresentar o desfecho lógico de algumas das mais
importantes linhas mestras que percorrem a sociedade
industrial” (Santos, 1981, p. 42-43). A literatura expondo um
movimento da sociedade. A sociedade imprimindo na literatura
seus valores. A literatura absorvendo, transformando e
mostrando as consequências dos valores da sociedade na
própria sociedade...
Com esse texto ele foi mergulhado em um universo onde a
literatura e a ciência se compõem, para buscar um
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algumas considerações. Nonada: Letras em Revista, n. 28, vol. 1. Maio de 2017.
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conhecimento da realidade que penetra, transforma e faz viver...


os homens.
... Em suas veias, os „vírus-ideias‟ daquela época ainda vivem.
(PRADO, 1992, p. 5-9)

Esses trechos vêm de uma dissertação de mestrado – Da busca de


ser professor: Encontros e Desencontros – escrita no início dos anos 90 do
século passado. Não foi um desafio fácil para o autor produzir esse tipo de
registro de pesquisa, há mais de duas décadas, quando ainda não sabíamos o
que hoje sabemos e abordamos neste texto. Assumir essa posição autoral,
mediante um recurso de impessoalização textual que permitiu,
paradoxalmente, dizer mais de si discursivamente, era – muito mais do que
hoje – um empreendimento de risco, a violação de um pacto acadêmico.
Sim, porque não se trata apenas de escolher a forma “ele” em vez da forma
“eu”; trata-se de, ao usar “ele” em sua dissertação, assumir uma posição em
que, como sujeito, aborda a si mesmo como objeto. “Ele” aí é na verdade o
“eu” do autor da dissertação. Registrar narrativamente uma pesquisa
acadêmica – ainda mais em terceira pessoa do singular – não era um
procedimento comum, tampouco esperado de um pesquisador. Nem mesmo
hoje é. Então as críticas, diante de uma escolha e um resultado inesperado e
pouco familiar, estiveram pairando sobre a dissertação, quando não foram
feitas de forma explícita. Mas um caminho se abriu a partir desta e por
certo de umas poucas outras, que provavelmente foram recebidas de modo
semelhante. A aparente impessoalidade da terceira pessoa, por ser
inusitada, não foi aceita com parcimônia, uma vez que, naquele contexto,
naquele tempo, o aspecto estável do gênero prevalecia sobre o aspecto da
relatividade, sendo mais relevantes as marcas linguísticas (o dito e suas
palavras) do que as marcas enunciativas (o dizer e suas maneiras). Na
verdade, essa atitude não se alterou generalizadamente: essas “liberdades”
ainda são criticadas a partir de uma atitude que não percebe que não é o
texto em si, mas o discurso de que é parte, o elemento vital.
Defendemos aqui que essa é uma maneira tanto de evitar em nossos
dias acusações de subjetivação antiacadêmica, ao atender a expectativas de
seus interlocutores acadêmicos, como permitir que o autor, em terceira
pessoa, se apresente como “distante de si” e, assim, com um menor
compromisso textual de escrever sobre si (o que é um peso), registre mais
livremente sua experiência, ainda que ele continue a ser tão subjetivo em
sua autoria como o seria se usasse eu, e tão objetivo em termos de sua
posição de candidato avaliado. Seja como for, a posição enunciativa
permanece: o sujeito está submetido a uma avaliação por uma banca, e essa
mudança de posição marca uma avaliação sua que altera na superfície do
texto elementos da relação enunciativa sem com isso modificá-la
substancialmente, torna-la outra. “Ele” não é autor da biografia de alguém,
nem faz autoficção, mas registra, com esse recurso, e de forma narrativa (em
vez de paradigmática) uma pesquisa acadêmica.
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Quinze anos depois, em 2007, sob a orientação do então


pesquisador Guilherme do Val Toledo PRADO, na mesma Universidade,
Rosaura SOLIGO também optou por registrar sua dissertação
narrativamente, não em terceira pessoa, mas na forma composicional de
cartas endereçadas a educadores e gestores dos sistemas de ensino. Não
cartas efetivamente escritas para eles, mas cartas a eles destinadas no
sentido de os tomarem, no âmbito da dissertação, como destinatários
típicos (Voloshinov), presumidos, daquilo que a autora tinha a dizer.
A dissertação – Quem forma quem? - Instituição dos sujeitos –, já
citada, apresenta uma carta de abertura endereçada à Academia, que
funciona, respeitosa e provocativamente, como um pedido de licença para a
transgressão da forma habitual de registro, mas mantendo o endereçamento
(no sentido de Bakhtin) desse registro. Essa carta assim se encerra:

Se houvesse essa categoria, talvez pudéssemos dizer que os


textos acadêmicos são antônimos das narrativas.
Em geral, eles são impessoais. Elas não.
Em geral, eles escondem as intenções do autor. Elas não.
Em geral, eles são formais. Elas não.
Em geral, eles se fazem passar por outros. Elas não.
Em geral, eles não são produzidos com desejo. Elas sim.
Em geral, eles não são manipulados com prazer. Elas sim.
Em geral, eles não têm emoção. Elas sim.
Em geral, eles não são acessíveis. Elas sim.
Em geral, eles não são sedutores. Elas sim.
Em geral, eles não são muito procurados. Elas sim.
Em geral. Apenas em geral. (SOLIGO, 2007, p. 23)

O empenho para produzir o gênero obrigatório, porém na forma


composicional atípica escolhida, resultou em explicitações como a que
segue, uma vez que a circunstância comunicativa concreta não era de
escrita de cartas espontâneas sobre assuntos de interesse do remetente e
dos destinatários, mas sim um registro de pesquisa acadêmica. O desafio
consiste aqui, mais uma vez, em mostrar que a posição enunciativa do
sujeito autor não se altera quando se usam cartas numa dissertação, porque
a situação é a de um candidato submetendo o registro de sua pesquisa
acadêmica à avaliação de uma banca de professores na universidade. A
pertinência ao gênero “dissertação” é reconhecida pela autora:

Em primeiro lugar, peço a paciência de vocês, caros educadores,


para a leitura do texto talvez mais denso, dentre todos os que
compõem estas Correspondências. Esse é, entretanto, um
procedimento necessário no registro de um trabalho de
investigação.
Aqui apresento a fundamentação teórica geral da pesquisa, o
enfoque, as questões que se colocaram como desafios e os
objetivos decorrentes. A opção por tratar desses aspectos em
uma mesma correspondência apoia-se no entendimento de que
a inter-relação entre eles aconselha uma abordagem articulada.
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algumas considerações. Nonada: Letras em Revista, n. 28, vol. 1. Maio de 2017.
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Nas demais Correspondências alguns conceitos aqui


apresentados serão aprofundados e outros, que destes se
desdobram, serão introduzidos no contexto em que fazem mais
sentido (SOLIGO, 2007, p. 29)

Vemos que a carta anterior se encerra com uma série de afirmações


que não lembram um texto acadêmico do ponto de vista da prova da
verdade, mas que lembram as verdades universais desses textos: “eles são...”;
“elas não”. A informalidade do tom se apropria da impessoalidade das
afirmações de validade universal e lhes dão um aspecto pessoal. Logo, não
se trata de afirmações comprovadas, mas de alegações de validade: escolhi a
forma X porque ela me permite realizar certo projeto de dizer que a forma
Y, a meu ver, não permitiria também nos termos de meu projeto de dizer.
A carta de onde foi transcrito o último trecho apresenta as bases
teóricas da dissertação. Ela também cria uma tensão, já que se dirige a um
“vocês”, atípico num texto acadêmico e, mais do que isso, mostra que esse
“vocês” não é parte do mundo acadêmico, ao dizer, por exemplo, “texto
talvez mais denso”. Em vez de dar as explicações costumeiras para não
seguir estritamente as exigências acadêmicas, a autora por assim dizer se
desculpa perante esses interlocutores virtuais por atender a algumas delas.
Portanto, não é o texto em si, mas o discurso (relação entre
interlocutores), que estabelece o que é o gênero. As marcas linguísticas
estão sempre a serviço de uma situação de enunciação que faz delas partes
vitais, mas não determinantes, das marcas enunciativas, marcas da
diversidade de posicionamentos do sujeito. Usar “eu” ou “ele” marcam, no
discurso, a avaliação que o sujeito faz do que diz, mas não se pode dizer que
ao usar “eu” o autor é subjetivo e ao usar “ele” é objetivo. Afirmações
impessoais (“vê-se...”), primeira pessoa do singular (“vejo...”), terceira
pessoa do singular (“vê”) e primeira pessoa do plural (“vemos”) marcam
diferentes posições de autor, mas não alteram por si a relação enunciativa, e,
assim, não mudam o gênero porque mudaram aspectos formais seus.6
Também Sobral (2009, p. 18) tratou da problemática
subjetivo/objetivo nos escritos acadêmicos. Sua posição ficou expressa da
seguinte maneira:

Pretendo descobrir um meio de legitimar a presença das


próprias convicções pessoais. Porque, como a verdade não
existe, temos de assumir, sem distorções além das inerentes à
condição humana – marcada por um aqui e um agora singulares,
porém com um pé da universalidade –, a verdade de cada um
como uma verdade provisória, mas válida, que outras não
anulam, mas compõem.
(...) E quero mais: explicitar as predileções, para aproveitá-las
sem explorá-las indevidamente. (...) Acho que não devemos
tentar camuflar nossas preferências, nossa “situacionalidade”,

6
Uma análise detalhada da referida dissertação foi feita na dissertação de mestrado de Fernanda
Taís Brignol Guimarães (GUIMARÃES, 2015).
Sobral, A.; Soligo, R.; Prado, G. V. T. A subjetividade autoral em textos acadêmicos: 190
algumas considerações. Nonada: Letras em Revista, n. 28, vol. 1. Maio de 2017.
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mas sim assumir a precariedade de toda afirmação. (...) Mas não


proponho que não haja valores compartilhados; proponho que
esses valores estão em permanente tensão com valores advindos
da posição singular de cada um.

Nessa declaração está a alegação de que não há motivo para tentar


camuflar as escolhas que fazemos, uma vez que elas refletem nossa
situacionalidade, nosso posicionamento identitário e institucional, bem
como o caráter precário das afirmações que fazemos em textos acadêmicos
com pretensões de universalidade. A ideia de explicitar as preferências para
dar legitimidade ao seu uso vincula-se com a ideia de que, embora haja
valores partilhados, há sempre um sujeito-autor singular que, ao agir em
resposta ao coletivo, o faz à sua própria maneira. A aceitação da
inevitabilidade da subjetividade em tudo o que envolva o ser humano em
sua busca incessante de sentido parece distante se considerarmos a doxa do
ambiente acadêmico. Talvez a saída esteja em insistir na necessidade de
reconhecer e, especialmente, legitimar o componente subjetivo inevitável
do sujeito humano, seja dentro ou fora da academia.

Especulações finais

Hoje eu atingi o reino das imagens, o reino da despalavra.


Daqui vem que todas as coisas podem ter qualidades humanas.
Daqui vem que todas as coisas podem ter qualidades de
pássaros.
Daqui vem que todas as pedras podem ter qualidade de sapo.
Daqui vem que todos os poetas podem ter qualidades de árvore.
Daqui vem que os poetas podem arborizar os pássaros.
Daqui vem que todos os poetas podem humanizar as águas.
Daqui vem que os poetas devem aumentar o mundo com suas
metáforas.
Que os poetas podem pré-coisas, pré-vermes, podem pré-
musgos.
Daqui vem que os poetas podem compreender o mundo sem
conceitos.
Que os poetas podem refazer o mundo por imagens, por
eflúvios, por afeto. (Manoel de Barros)

No modo como apresentamos nossos argumentos, evidenciamos


nossos posicionamentos a favor de uma escrita acadêmica que – em vez de
esconder o autor a partir de uma perspectiva paradigmática e que busca
atribuir istinas com suas produções – revela intencionalmente marcas da
autoria, a partir de um modo narrativo de produção de conhecimento,
procura apresentar pravdas decorrentes de um amplo diálogo com a própria
tradição acadêmica – mas não só – e legitimar diferentes modos de produzir
conhecimento na universidade.
O uso de istina no plural é emblemático da alegação que aqui é feita.
Porque podemos entender que isso se refere tanto a várias verdades
Sobral, A.; Soligo, R.; Prado, G. V. T. A subjetividade autoral em textos acadêmicos: 191
algumas considerações. Nonada: Letras em Revista, n. 28, vol. 1. Maio de 2017.
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universais (o Sol brilha, a Lua reflete o sol...) que não competem umas com
as outras, como (por paradoxal que pareça) a várias verdades universais
concorrentes, conflitantes, o que na prática as transforma em pravdas, essas
sim sempre plurais, por definição, e sempre constituindo um problema para
as istinas... Essa realidade narrativa implica uma produção de pensamento
coadunado com um modo de produção textual que amplia o horizonte de
possibilidades a partir de diferentes posições enunciativas (Bakhtin, 2003)
provenientes do diálogo com diversos modos de conhecimento, acadêmicos
ou não, como os artísticos, cotidianos, ficcionais, poéticos, imagéticos,
sensoriais e, até mesmo, extrassensoriais...
Sendo um “eu” que se manifesta, sempre em diálogo com outros
“eus”, inclusive os “eus” de si próprio, o “eu” da narrativa, em toda a sua
potencialidade e limitação, no contexto acadêmico, poderia gerar diálogos
mais potentes com as esferas de comunicação cotidianas, porque
impregnadas de uma similar subjetividade que mais aproxima os
interlocutores do que os afasta, como ocorreria quando marcadas pela
produção de uma suposta objetividade calcada no modo de pensamento
paradigmático.
A narrativa, concebida como espaço de afeto e afetação, tem como
projeto último não só impregnar as memórias ancestrais humanas, como
indicou Bruner (2002), como também gerar, nos processos de produção de
sentidos, uma verossimilhança que cativa e convida os interlocutores a
narrarem também suas histórias pessoais e coletivas, realizando o que tão
bem apresentou Benjamin (1987) como a arte de intercambiar experiências.
E a verossimilhança da verdade contextual (pravda) pode gerar,
entre autores e leitores – interlocutores em diálogo – a busca, em coletivo e
em constante comunicação tensa e intensa, pela verdade universal (istina)
eternamente por vir... Verdades materiais necessárias existem, como a do
movimento da Terra, mas as verdades do mundo humano são eternas
pravdas que têm a inalcançável istina postulada como horizonte, ponto
móvel que nos faz seguir uma direção com esperança de lá chegar.
Talvez correndo o risco de uma analogia indevida, pode-se dizer
que talvez esteja em jogo, naquilo que chamamos aqui de narrativa, ou
modo narrativo de produção acadêmica, uma batalha (que foi travada pelo
Círculo de Bakhtin, como vemos nas quatro palavras russas aqui usadas)
entre a nauka (ciência acadêmica) e a inonauka (um outro tipo de ciência) –
que são diferentes tanto da antinauka, ou anticiência, como da nenauka, ou
não ciência. Essa proposta de inonauka busca identificar o que há em comum
entre enunciados, aquilo que aparece em todos os enunciados proferidos
(sua istina?), e ao mesmo tempo apontar o que eles têm de singulares, aquilo
que os distingue uns dos outros (suas pravdas).
Não se trata nem de um fechamento do sentido nem de uma
abertura que nos deixasse sem chão. A narrativa é um momento
privilegiado em que, para um dado eu, todas as pravdas são istinas ainda não
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algumas considerações. Nonada: Letras em Revista, n. 28, vol. 1. Maio de 2017.
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reconhecidas, isto é, as verdades provisórias (pravdas) parecem a esse


sujeito verdades universais (istinas) que, nesse momento, só ele vê. Essa
possibilidade de autoengano, que os interlocutores mais tarde haverão de
modular, permite uma posição enunciativa de aparente diálogo consigo
mesmo que amplia o horizonte do possível. Há sim um outro ali presente,
mas o eu que narra sustenta, influenciado por esse outro, um fio que narra
não só uma sua experiência, mas sua própria vida.
O saber acadêmico não nasce apenas na/da academia como espaço
estanque, vindo, em vez disso, do mergulho nas águas profundas da
sociedade e da história em que a instituição acadêmica existe e nas quais é
construída. O locutor em um contexto acadêmico, às voltas com os sentidos
de uma perspectiva narrativa e assumindo radicalmente o diálogo, numa
vertente bakhtiniana, poderá não contribuir necessariamente para a
resolução de conflitos e problemas do mundo que geraram suas pesquisas,
mas ao menos pode colaborar para a produção de um horizonte de
possibilidades em que novas posições enunciativas venham,
subjetivamente, a constituir sentidos partilhados e solidários, no que se
refere ao conhecimento acadêmico do qual também faz parte e é produtor.

Referências

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BAKHTIN, M. M. Para uma filosofia do ato responsável. São Carlos: Pedro &
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CONTIER, Ana Teresa Contier e LOBO NETTO, Márcio. Representações
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Recebido em 15 de abril de 2017.


Aceito em 27 de abril de 2017.

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