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Reinaldo Dias GESTAO AMBIENTAL Reinaldo Dias Gestao Ambiental Responsabilidade Social e Sustentabilidade 28 Edicdo Revista e atualizada SAO PAULO EDITORA ATLAS S.A. = 2011 © 2005 by Baitora Atlas S.A. 1.ed. 2006; 2. ed. 2011 ‘capa: Leandro Guerra ee Composigao: Setup Time Ares Gréfiess eee Dados Internaeionais de Catalogacdo na Publicagao (CIP) (Camara Brasileira do Livro, SB Brasil) Dias, Reinaldo Gestiio ambiental: responsabilidade social e sustentabilidade / Reinaldo Dias, -2. ed. - Sé0 Paulo: Adlas, 2011, Bibliografia. ISBN 978-85-224.6286.5 1. Administragao de empresas 2. Desenvolvimento sustentével 3. Gestao ambiental 4. Plangjamento estratégico 5. Responsabilidade social das organizacées 1. Titulo. 06-0342, cpp -658.408 Indices para catdlogo sistematico: 1, Gestio ambiental : Responsabilidade social e sustentabilidade : Empresas : Administracio 658.408 ‘TODOS OS DIREITOS RESERVADOS - f proibida a reprodugfo total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violagio dos direitos de autor (Lei n° 9.610/98) & crime estabelecido pelo artigo 184 do Cédigo Penal. Depésito legal na Biblioteca Nacional conforme Decreto n* 1.825, de 20 de dezembro de 1907. Impresso no Brasil/Printed in Brasil Pel Baitora Atlas S.A. Rua Conselheiro Nébias, 1984 (Campos Elisios) (01203-904 $0 Paulo (SP) ‘Tel: (0-11) 3357-9144 (PABX) ‘ewwBditoradelas.com.br Apresentagdo, ix A.evolugdo histérica da questo ambiental, 1 LL Ohomem e a natureza na pré-histéria, 1 12 Acriagio do ambiente cultural: 0 processo de urbanizacio, 4 13 Industrializagdo ¢ meio ambiente, 5 24 Acontaminagio industrial, 7 Gonciuséio, 13, Atomada de consciéncia do problema ambiental, 15 21 O problema ambiental no século XX, 15 22 A década de 70, 17 23 Adécada de 80, 21 24 A década de 90 e o inicio do século XX, 22 25 Cestado do debate ambiental no final do século XX , 26 26 Aexpansio da consciéncia ambiental: o papel das ONGs, 28 ‘Goncluséo, 32 ‘© desenvolvimento sustentavel como nove paradigma, 35 Antecedentes histéricos, 35, A Comissao Brundtland e o conceito de sustentabilidade, 36 ‘A Conferéncia das Nacbes Unidas no Rio de Janeiro (1992) ¢ os seus desdobramentos, 38 O desenvolvimento sustentavel no mbito empresarial, 42 As dimens6es da sustentabilidade: econmica, social e ambiental, 44 Triple Bottom Line ou Tripé da Sustentabilidade, 46 0 Protocolo Verde, 47 Cestio Ambiental © Dias 3.8 0 Principio Poluidor-Pagador (PPP), 49 3.9. Apegacia ecolégica, 50 Conclusdo, $3 ‘As empresas eo meio ambiente, 55 4.1 Empresas e contaminagio, 55 4.2. Fatotes externos que induzem respostas das empresas, 58 4.3. Aresposta das empresas, 61 44 Gestio ambiental e competitividade, 63 45. Estimulos para a adogio de métodos de gestdo, 67 4.6 Aavaliagdo de impacto ambiental, 73, 4.7 O Estudo de Impacto Ambiental (BIA) e o Relatério de Impacto do Meio Ambiente (RIMA), 79 Conclusdo, 80 ‘As empresas ¢ a comunidade local, 81 5.1 As empresas e as comunidades, 81 5.2 O governo municipal e as empresas, 85 5.3. A legislagao ambiental municipal e as empresas, 89 5.4 Apolitica ambiental municipal, 92 Conelusdo, 95 © sistema de gestio ambiental nas empresas, 97 6.1 Histérieo, 97 6.2. Os sistemas de gestio ambiental, 102 6.3 As normas ISO 14000, 104 64 A norma ISO 14001:2004, 109 6.5 Anecessidade de uma cultura ambiental nas organizacées, 110 Gonelusto, 114 Comércio internacional e meio ambiente, 117 7.1 Axelagio entre o comércio internacional e o meio ambiente, 117 7.2 AOMGea questéo ambiental, 119 7.3. Blocos comerciais e meio ambiente: 0 caso do Mercosul, 123, 74 Adeclaragao de Taranco, 126 7.5 O acordo-quadro sobre meio ambiente do Mercosul, 129 Conclusdo, 131 A mudanga climatica global e 0 Protocolo de Kyoto, 133, 8.1. Bfeito estufa e a mudanga climatica, 133 8.2 Convencio das Nagoes Unidas sobre mudanca climatica, 135 8.3 0 Protocolo de Kyoto, 136 8.4 O contetido do Protocolo de Kyoto, 137 == inicio de século, as preocupagées com 0 meio ambiente assumem ‘sevporcies cada vez. maiores, em virtude dos efeitos visiveis de desequi scados pelo homem na natureza. As empresas, vistas ha muito tempo ‘pancipais vilas do problema, esto de alguma forma conseguindo dar +2 muitos questionamentos da sociedade. =: as aces empresariais ambientalmente responséveis nfo sejam ad parcelas significativas das organizagées, aquelas que o fazem repre- erancas que vao se tornando referéncias em seus respectivos setores € o-se em modelos para a adocdo de padres e patamares de exceléncia das empresas com a sociedade mais geral, ¢ a do seu entorno ‘== particular, por outro lado, esté ainda num nivel de intensidade in- adocdo por parte das empresas de sistemas de gestio ambiental. Esse ‘s=fite, em primeiro lugar, um desconhecimento da amplitude de que se = = sroblemética ambiental por parte dos dirigentes das empresas, e, em se- ‘Sesxx também um despreparo das administracdes municipais no trato da = por auséncia de quadros capacitados, ou por puro desinteresse, dado |S oxganizacao da sociedade local. 2 intensificago da criacdo de cursos superiores espalhados pelos mais ‘pontos do pais, gera-se uma expectativa de que se formario quadros preencher as necessidades de gestdo ambiental, tanto no setor piiblico, ‘se setor privado, e para tanto é necessério que se estabelecam os contor- X_ Gest Ambiental + Diag Neste sentido é que publicamos este livro: para contribuir para a formacéo de agentes ambientalmente responsdveis; que estes nos seus futuros (ou atuais) locais de trabalho procurem inserir suas organizactes na perspectiva do desen- volvimento sustentavel. Para tanto, abordamos neste livro a Gestéio Ambiental do ponto de vista ma- cto, no nos restringimos ao ambiente interno das organizacdes; procuramos ‘mostrar que o trato com 0 meio ambiente no pode ser limitado & unidade produ- tiva, visto que esta sempre esté inserida num contexto sociocultural e ambiental amplo, do qual constitui apenas uma de suas unidades. Neste sentido, defende- mos ao longo de todo o texto uma articulaczio maior entre os setores privado, pti- blico ¢ 0 terceiro setor (que envolve as organizacdes no governamentais). A importincia da participacdo do cidadao nas decisées, o respeito ao seu po- sicionamento nas entidades em que participa, a sua capacidade de entendimento dos processos envolvidos, propiciadla pelo maior acesso & informacdo, so abor- dados, permeiam toda a publicacéo, além de constituirem todo um capitulo, destacando a relacdo entre a cidadania e as empresas. Alguns capftulos do livro sintetizam ou aprofundam pesquisas, na érea am- biental, por mim realizadas nos iiltimos anos, que tratam das organizacdes, do poder ptblico, da urbanizacao, da cidadania, dos blocos econémicos, do turismo, entre outros, sendo que alguns deles se encontram citados na bibliografia. © livro tem o objetivo de dar uma visto geral da relaco do meio ambiente com as organizacdes, buscando conseguir ampliar o ntimero daqueles que atuam na dea ambiental, nao s6 como perspectiva de vida profissional, mas também assumindo uma bandeira de luta permanente que busque difundir aos habitantes do planeta a importdncia de preservacao da nossa morada no universo: 0 plane- ta Terra. Reinaldo Dias s tltimos 300 anos, o desenvolvimento tecnoldégico da humanidade foi inigualével. Em nenhum outro perfodo histérico foram feitas tantas des- “ccberias, em todos os campos da ciéncia, gerando uma incrivel capacidade de jucdo e de controle de elementos natutais, No entanto, também € o periodo srico em que o ser humano gerou os meios que podem levé-lo & extingéo. © sm, sem predadores naturais, tora-se, como afirmava Thomas Hobbes, 0 de si mesmo. O processo que ora est em curso, de contaminacao excessiva “> meio ambiente natural, foi acelerado com a Revoluco Industrial e sua com- 4o é fundamental para que nos conscientizemos da gravidade da situa¢ao para a obtengdo dos meios necessdrios para a sua superagao. Neste capitulo, 1s essa evolugéo humana e sua relagdo ambigua com a natureza. 1 Ohomem ea natureza na pré-histéria O ser humano, dentre todas as espécies animais existentes, é a que apresenta maior capacidade de adaptacao ao ambiente natural, ¢ pode ser encontrado no ‘mais causticante, no frio continente antédrtico, nas profundezas da flores- ‘= amazénica, sob 0 oceano ou voando na atmosfera ¢ além dela. Esta inerivel capacidade de adaptacio sé foi possivel porque o homem sem- ‘eriou no seu entorno um meio ambiente préprio, diferente do meio circun- 1 ~ natural — que denominamos cultural. A construgao pelos seres humanos ‘um espaco proprio de vivéncia, diferente do natural, se deu sempre & revelia e a modificagao do ambiente natural. Assim, o ser humano, para sua sobrevi- ‘a, de um modo ou de outro, sempre modificou o ambiente natural. 2. Cesdo Ambiental + Dias ‘Na pré-hist6ria, a primeira grande modificagao feita pelo homem foi nas suas préprias condigdes biolégicas, pois 0 equipamento humano de sobrevivéncia no Ihe daria boas condiges de superacdo dos predadores naturais, mas mesmo as- sim a espécie humana sobreviveu. “E, no entanto, o fez com um equipamento fisico muito pobre. Incapaz de correr como unt antilope; sem a forca de um tigre; sem a cacuidade visual de um lince ow as dimensoes de um elefante.” Para superar suas limitagées, 0 homem aprendeu a criar ferramentas que multiplicavam suas capacidades limitadas, e ao mesmo tempo compreendeu que sua resisténcia ao meio ambiente hostil era mais facilmente superada com a for- macéio de grupos, que, organizados em tomo de um objetivo, multiplicavam suas capacidades individuais. Essa multiplicacio da capacidade humana de intervir no meio ambiente nao afetou de maneira significativa a natureza durante a pré-histdria, embora haja re- gistros de caca a grandes animais na América do Norte, cujas manadas eram en- curraladas em desfiladeiros profundos, nos quais se lancavam, morrendo centenas deles. Esse tipo de caca mostra a importante diferenca entre o ser humano e os ou tros animais. Nao séio somente os homens que cagam em grupos; muitos animais também o fazem. No entanto, diferentemente dos animais, o homem concebe sua aco previamente no seu cérebro, na forma de planejamento, e a cada aio incorporam-se novas informag6es, que resultartio em diferentes solugées para os ‘mesmos problemas que se apresentam. Essa atividade realizada pelos seres vivos (no s6 pela espécie humana), que interfere na natureza de modo a transformé-la para melhor satisfazer a suas ne- cessidades, denominamos trabalho. Deste modo, 0 trabalho é uma atividade de- senvolvida pela espécie humana para modificar a natureza e adapté-la para a satisfagdo de suas necessidades. Embora tanto os animais como os seres humanos realizem trabalho, h4 uma profunda diferenca entre eles, pois “o trabalho humano € consciente e proposital, 420 passo que o trabalho dos outros animais é instintivo” 2 O homem, ao trabalhar, executa uma atividade que previamente havia pla- nejado em sua mente, ¢ ao desenvolvé-la materialmente pode modificé-la a seu modo. Ao longo da realizacéo do projeto, é capaz de resolver os problemas que surgem, muitas vezes modificando a sua concepséo inicial. Deste modo, ao traba- Ihar, o homem sofre uma transformacao no seu modo de pensar, modificando-se. Laraia (1997, p. 39). * Braverman (1980, p. 50). A evoluctohisica da quesiéa ambient 3 ‘Gomo afirmou Marx, “atuando assim sobre a natureza externa e modificando-a, ao 10 tempo modifica sua prépria naturesa”.? Desse modo, o trabalho humano, em sua esséncia, tem como objetivo maior /manutencéo da espécie humana no ambiente natural, melhorando as suas con- es de existéncia, ou seja, a sua qualidade de vida. A partir do momento em que os individuos entenderam que com a unio al- SSscavam objetivos comuns, surgitt a necessidade de organizacao das atividades que estes objetivos fossem alcancados. Deste modo se desenvolve um pro- 2 de organizagio do trabalho, estreitamente ligado a distribuicao de funcées 20 sequenciamento de tarefas, o que provoca um aumento do rendimento. A acidade de trabalho do homem aumenta, ou, dito de outro modo, a sua capa- de intervir na natureza é ampliada e, consequentemente, crescem os im- no ambiente natural produzidos pelo homem ‘Ohomem passou a fazer 0 que todos os outros animais faziam, s6 que melhor. iu represas maiores e melhores do que aquelas que constroem os casto- desenvolveu a capacidade de tecer fibras vegetais melhor do que os animais, iu abrigos melhor do que as outras espécies conseguiam, aperfeigoou seus dos de caca e pesca, tornando-se 0 predador mais temido, superando os ani- mais ferozes que existiam. Deste modo, a capacidade de intervenctio huma- sobre o meio ambiente ao longo dos anos foi sendo multiplicada de uma forma imaginada pelo préprio homem, superando todos os seus limites. Durante milhares de anos, esse processo de intensificacdo da capacidade hu- a de intervir no ambiente natural foi se desenvolvendo de forma gradativa ‘cemulativa, mas durante muito tempo as modificagdes provocadas, aparen- =ate, no foram significativas se comparadas as dos dias atuais. Até que hd imadamente entre 8.000 e 10.000 anos houve uma primeira grande revolu- Glentifico-tecnolégica que provocou enormes impactos no ambiente natural do ao aumento da capacidade produtiva humana. HA muito tempo que as sociedades humanas viviam em constante movimen- ‘acando 0s animais selvagens que se deslocavam em rebanhos, e mudando ‘sx Tugar para outro em fungio das estagées do ano, coletando frutos e gros sua alimentagio (sociedades de cagadores ¢ coletores de sementes). No pe- © citado, hd mais de 8.000 anos, os homens aprenderam a domesticar os sais e a plantar sementes selecionadas, o que permitia maiores e melhores tas ao longo do ano. Essas duas novas atividades ~ domesticagéo dos ani- dominio da técnica de plantio — provocaram uma revolugao na historia da sx Karl (1989, p. 202) 4 Gesio Ambiental © Dias humanidade (uma revolucéo agricola), pois permitiram a fixagdo das pessoas ¢ 0 surgimento das primeiras vilas e cidades, Com o homem passando a produzir os alimentos de que necessitava, houve um excedente de alimentos, o que permitiu que se aumentasse a complexidade de fanc6es que existiam. Puderam surgir oficios nao diretamente ligados a produgao de alimentos, aumentando a divisio do trabalho. Com o aumento da complexida- de das sociedades, cresceu a necessidade cle cooperacao continuada de numerosas pessoas para um fim especifico, de manutengao da qualidade de vida. Nesse mo- ‘mento, a melhoria da qualidade de vida se dava em detrimento do mundo natural, ois a concepgao predominante era de luta do homem contra a natureza. Com a concentracao humana em locais especificos aldeias, vilas, cidades -, cresceu a necessidade de atendimento dessa populacdo, e principalmente au- mentou a ocupacao dos espacos naturais. Surgiram novos anseios que somente oderiam ser atendidos em detrimento do mundo natural. As pirdmides seriam construidas destruindo-se dreas que detinham o material necessério para a sua construcéo; cursos d’4gua foram desviados para atender as necessidades das con- centracées humanas; florestas foram destrufdas para atender a demanda de ma- deira para as habitacées etc. 1.2 Actiacio do ambiente cultural: 0 processo de urbanizagao Gom o surgimento da agricultura e 0 consequente sedentarismo, ocorre 0 inicio de um processo profundo de transformac&o da relagdo do homem com a natureza, pois a atividade agricola exige a criagao de um meio ambiente artificial para o cultivo de plantas e do gado. Toma-se necessério proteger as plantacoes, © 0 gado dos animais selvagens. Deve-se cercar determinado espago do terreno, que passa a ser propriedade de alguém ou de um grupo. Surge a propriedade pri- vada. A produgao de alimentos permite uma abundancia de comida, que possibi- lita um grande incremento da populacdo, que por sua vez ocupa mais espacos em detrimento do ambiente natural. Quanto maiores as aglomeragées humanas, mais destrutivas eram do ponto de vista ambiental. E, nesse estigio de crescimento acentuado da populac&o hu- mana, muitas espécies desapareceram gradativamente onde o homem construfa em ritmo acelerado o seu préprio ambiente. No Oriente Médio, onde atualmente se encontra o Iraque, se registram as primeiras grandes aglomeracGes humanas e € onde ocorrem as primeiras grandes extingdes de espécies animais. Os grandes predadores sao rapidamente extintos, pois eram a primeira ameaca ao homem ¢ a suas criagdes de animais domésticos. Hé intimeras representacdes de cacadas a lees e outros predadores naquela regio, que foram rapidamente extintos. (0 de grandes cidades inte wizinho. Assim ocorreu na Mesopotamia, com a construcio da Babi- ‘exis obra mais conhecida até hoje foi uma recriaco artificial do ambiente —os jardins suspensos da Babil6nia, revelando a existéncia de uma nos- “qse ligava 0 sentimento das populagdes e de sua classe dominante com a skteracdo do ambiente natural. Svillizacdo romana foi, na Antiguidade, a que mais criou espacos urbanos 20 Mediterraneo, ¢ a que mais contribuiu para a diminuigdo da diversid: predadores naturais, que eram capturados para servir de ‘nas arenas que existiam em intimeras cidades, e principalmente no Coli- ‘Boma. Uma das perdas mais sensfveis foi a do grande leo do Atlas, que (ee norte da Africa e que era portador de juba preta, que aumentava a sua e que o tornava uma importante atragio das arenas romanas. ‘cutmas partes do mundo, as coisas no eram diferentes. Nas Américas, os indicam que a civilizacio Maia que existiu na América Central antes da dos espanhéis teve seu declinio acentuado pela destruicao de seu habitat Camboja, Asia, a localidade de Angkhor Vat teve ocupada no meio da flo- ‘ema drea equivalente & atual cidade de New York, nos Estados Unidos, ¢ ‘em decadéncia, também, porque o uso insustentével dos recursos naturais sua destruicdo. concentragdes urbanas, ao destruirem 0 ambiente natural, e recriarem biente propicio ao homem, provocam também a adaptacio dos organis- ‘qs= existiam nos ambientes naturais, os quais passam a conviver no espaco mo como pragas, que se multiplicam quase sem controle, além de intimeros ismos que transmitem doengas. Assim, durante séculos tivemos no- Ge grandes epidemias que assolaram as cidades, trazidas por animais que ssram a viver no ambiente humano. ‘Derante a Idade Média, em particular, temos exemplos de como as concen- es humanas nao se encontravam, ainda, adequadas a garantir a seguranca ‘seres humanos. As grandes epidemias que ocorreram provocaram a mortan- de milhdes de pessoas, alterando a fisionomia da populacdo europela. Industrializagdo e meio ambiente No século XVIII, ocorreu outra grande transformagio na capacidade produti- ‘umana. Aconteceu outra grande Revolucao Cientifico-Tecnolégica, a segun- que também é conhecida como Revolugao Industrial. Ela surgiu inicialmente -a, se espalhou e dominou o cendrio durante os séculos XIX e XX, pro- 6 Gestz0 Ambiental + Die vocando profundas alteragdes no meio ambiente natural, que na realidade apon- tou para a perspectiva de sua destruigao. A Revolucdo Industrial, que teve seu inicio na Inglaterra no século XVIII e ra- pidamente se espalhou por outros recantos do planeta, promoveu 0 crescimento econdmico e abriu as perspectivas de maior geracio de riqueza, que por sua vez traria prosperidade e melhor qualidade de vida. © problema ¢ que o crescimento econdmico desordenado foi acompanha- do de um processo jamais visto pela humanidade, em que se utilizavam grandes quantidades de energia e de recursos naturais, que acabaram por configurar um quadro de degradacao continua do meio ambiente. A industrializacio trouxe varios problemas ambientais, como: alta concentra- sao populacional, devido a urbanizagao acelerada; consumo excessivo de recursos naturais, sendo que alguns nao renovaveis (petréleo e carvao mineral, por exem- plo); contaminacao do ar, do solo, das 4guas; e desflorestamento, entre outros. A.urbanizacio foi um dos mais importantes subprodutos da Revolucdo Indus- trial e criou um ambiente sem precedentes nas cidades. Por volta de 1850, ha- via mais cidadéos briténicos morando em cidades do que no campo, e quase um tergo da populacéo total vivia em cidades com mais de 50.000 habitantes. Essas cidades eram cobertas de fumaca e impregnadas de imundicie, e os servicos pi- blicos basicos ~ abastecimento de Agua, esgotos sanitérios, espacos abertos ete. no acompanhavam a migragao maciga de pessoas, “produzindo assim, sobretu- do depois de 1830, epidemias de célera, febre tifoide e 0 pagamento assustador de tributo constante aos dois grandes grupos de assassinos urbanos do século XIX - a poluigdo do ar e das éguas, ou doengas respiratérias ¢ intestinais”.* © fendmeno da urbanizagao na Inglaterra da primeira metade do século XIX agravava as mortes por doengas infecciosas, responsaveis por mais da metade de- las. Uma em cada duas criancas nascidas nas cidades morria antes de completar cinco anos, 0s sistemas sanitarios eram inadequados e, em muitos casos, 0 esgo- to ia diretamente para os rios dos quais as companhias de esgoto retiravam seu abastecimento de dgua.* Ainda nos primérdios da industrializagao, um economista inglés, Thomas Robert Malthus (1766-1834), publicou um trabalho denominado Ensaio sobre a © Hobsbawm, Eric J. Da revolugdo industria inglesa ao imperialism. Tradugio de Donaldson Ma- galhes Garschagen, Rio de Janeito: Forense Universitaria, 1983. p. 81 * Deane, Phyllis. A Revolugdo Industrial. 3, ed. Tradugo de Meton Porto Gadela, Rio de Janeiro: Zahar, 1975. p. 275, -Acvolucsohitrica da quetio ambiental 7 lacdo: como afeta o futuro progresso da humanidade (1798),* onde sistemati- _z2y2 um conjunto de preocupagées que apontava para os problemas decorrentes -@ aumento populacional e para a possibilidade de esgotamento dos recursos na- is € seus reflexos no crescimento econdmico. Dando destaque ao crescimento cional, afirmava que “o poder da populacdo ¢ infinitamente maior que o da ‘para produsir a subsisténcia do homer’, Sem diivida, os novos mecanismos e formas de produgio, acrescidos da ex- intensiva e sistemdtica dos recursos naturais trazidos pela Revolucéo , generalizaram-se e se espalharam de forma descontrolada, sem prever consequéncias para o meio ambiente. Os processos de industrializaclo aumen- de forma espetacular, mas foram concebidos de forma irracional, tendo resultado o grave problema ambiental que afeta todo o planeta nos dias ‘hoje. O desmatamento intensivo para criar novas reas agricolas e produzir 0 vegetal provocou o desaparecimento da maior parte da cobertura florestal Europa no século XIX e inicio do século XX. A exploracéio industrial do meio ambiente manteve-se sem contestagao du- todo 0 século XIX e a maior parte do século XX. A visio equivocada de que secursos naturais eram ilimitados e estavam A disposi¢ao do homem somente u a ser questionada e exigit maior reflexdo da humanidade na década 2n0s 70 (embora desde os anos 50 e 60 existissem algumas aces pontuais sentido), quando os processos de deterioracdo ambiental e a possibilidade ‘Sszotamento de determinados recursos naturais se tornaram mais evidentes. Acontece que, embora 0 inicio do desenvolvimento industrial tenha quase culos, é somente nas duas tiltimas décadas do século XX que o volume fisi- 2 producio industrial no mundo cresceu espetacularmente, considerando-se 2 segunda metade do século XX foram empregados mais recursos naturais |peoduco de bens que em toda a historia anterior da humanidade.” A contaminacao industrial ‘Um dos problemas mais visiveis causados pela industrializagao é a destina- es residuos de qualquer tipo (sélido, liquido ou gasoso) que sobram do produtivo, e que afetam o meio ambiente natural e a satide humana. ‘Thomas. Ensalo sobre o principio da popularo. Tradugéo de Eduardo Salé. Publicagées ea, 9/d. p. 26 [do original: Essay on the principle of population, 1798). Y/PNUMA. Kco-efficiency and cleaner production. Charting the course to sustainability Pa- RECSD, 1998. 8 Gestio Ambiental + Dias Ao longo do séeulo XX, foram os grandes acidentes industriais e a contaminacao Tesultante deles que acabaram chamando a atengéo da opinifo piiblica para a gravidade do problema. Alguns dos problemas ambientais tornaram-se assuinto slobal e pela sua visibilidade e facilidade de compreensio quanto a causa e efei. to constitufram-se na principal ferramenta de construcdo de uma conscientizacdo dos problemas causados pela mé gestao. Os principais casos que passaram para a historia dos desastres ambientais esto relacionados no Quadro 1.1, e constituem um pequeno apanhado dos acidentes mais ilustrativos que envolvem as empresas e que tiveram maior repercussso mundial, No ano de 2010, dois acidentes ambientais de grandes proporcées atrafram a atencdo da midia internacional: o vazamento de petrdleo na plataforma da Bri. tish Petroleum nos EUA ¢ a lama t6s na Hungria, a, 0 desastre ecolégico nos EUA O desastre ambiental nos EUA provocado pelo vazamento na plataforma da BP comecou apés explosao e afundamento da Plataforma Deepwater Horizon, matando 11 trabalhadores, dia 20 de abril de 2010, no Golfo do México, ¢ ime. diatamente assumiu proporgées catastrdficas. A extensdo da tragédia levou & in- tervencao do governo do EUA, forcando a presenca do presicente Barak Obama no local do desastre. ‘Tendo 0 acidente ocorrido a 1.500 metros de profundidade, a mancha nos primeiros dias tomou conta do litoral de quatro estados americanos (Alabama, Florida, Louisiana e Mississipi), provocando mudangas na cor do mar, surgindo Passaros e peixes cobertos de petroleo, o que provocot uma ampla cobertura da midia internacional. O vazamento colocou em risco 40% dos pAntanos costeiros dos EUA, que so dificeis de limpar. Prejudicou um ecossistema tico, com muitos manguezais e es- tudrios, que ja havia sido afetado pelo furacao Katrina (2005). O acidente causou_ Sraves prejuiizos ao setor da pesca (que foi proibida em parte da regiao) e do to. tismo, colocando em xeque, mais uma vez, a capacidade de gestio de crises am_ bientais do governo dos EUA Tomou-se o pior desastre ecolégico dos Estados Unidos, sendo considerado o maior vazamento de petréleo da histéria. b. A Lama Téxica na Hungria No dia 4 de outubro de 2010, ocorreu um derrame de lama téxica de uma Fabrica de aluminio em Ajka, 165 km a oeste de Budapeste, na Hungria, que ma- fou nove pessoas e mais de 150 foram hospitalizadas por queimaduras quimicas, Milhares dle moradores de sete povoados vizinhos a fébrica foram afetados pelo desastre sendo removidos de suas casas, Acvulugiohistrica da quetio ambiental 9 Qesdro 1.1 Principais acidentes ambientais no século XX.* Descricgo Navio carregado de nitrato de aménia explode no Texas, causando mais de 500, martes e deixando 3,000 feridos. Contaminagio da baa de Minamata, Japo. Foram registrados casos de disfungdas neurolagicas em familias de pescadores, gatos e aves. A contaminacéo ‘contecia desde 1939 devido a uma companhia quirica instalada as margens.. ‘Moradores morreram devido as altas concentracoes de mercério, que causavam chamada "doenca de Minamata” Na cidade de Feyzin, Franca, um vazamento de GLP causa a morte de 18 pessoas © deixa 65 intoxicadas. No dia 10 de julho, em Seveso, cidade italiana perto de Milgo, a fabrica Hoffmann-La Roche liberou densa nuvem de um desfolhante conhecido como agente laranja, qua, entre outras substancias, continha dioxina, altamente venenosa, Em torne de 733 familias foram retiradas da regio. ‘Na cidade de San Carlos, Espanha, caminhao-tanque carregado de propano explode causando 216 mortes e deixando mais de 200 feridos. No dia 2 de dezembro, um vazamento de 25 toneladas de isocianato de metila, ‘ecorrida em Bhopal, india, causou a morte de 3.000 pessoas e a intoxicacéo de mais de 200,000. O’acidente foi causado pelo vazamento de gas da Fabrica da Union Carbide. Em San Juanico, México, incEndio de GLP seguido de explosdo causa 650 mortes © deixa 6.400 feridos. No dia 26 de abril, um acidente na usina de Chernobyl, na antiga URSS, causado pelo desligamento do sistema de refrigeracao com o reator ainda em funeionamento, provacou um incéndio que durou uma semana, langando na atmosfera um volume de radiacao cerca de 30 vezes maior que o da bomba {3témica de Hirashima, & radiacao espalhou-se, atingindo varios paises europeus © até mesmo 0 Japs. Em Basilela, Sulga, apés incéndio em uma inddstria foram derramadas 30 tonelades de pesticidas no Rio Reno, causando a mortandade de peixes 20 longo de 193 km. Na madrugada de 24 de marco de 1989, o navio-tanque EoxonValdez, a0 se desviar de um iceberg, bateu num recfe e a seguir encalhou no estreito do pe William, no Alasca, O combo aberto no casco deixou vazar cerca de 44 milhoes de litros de petr6leo. 0 vazamento de 6leo, o pior da historia dos EUA, Stingiu uma area de 260 km, poluindo Aguas, ilhas e praias da regio. Morrerem milhares de animais — peixes, baleias e ledes-marinhos. Eaborado a partir de Dias (2003), Bago (1996) e Cetesb, "PesEAo adotado foi de relacionar os acidentes que tiveram repercusséo na midia intemacio- ‘= gee acabaram de algum modo contribuindo para 0 avanco das discussbes sobre problemas 10 Geto Ambiewal + Dias ‘Alama vermelha, res{duo t6xico, é a sobra da produgéo de aluminio e contém substncias nocivas, como chumbo, bem como elementos altamente corrosivos. A producio de uma tonelada de aluminio gera cerca de trés toneladas de lodo. Foi considerado como o pior acidente ambiental quimico da histéria do pats. Nesse dia, & tarde, as paredes de um reservatério de residuos da fabrica de alumt- nio se romperam despejando 1,1 milhdes de metros ctibicos de lama toxica ver- melha, inundando trés vilarejos. Varias cidades proximas foram inundadas e em Kolontar e Devecser 0 lodo chegou a dois metros de altura. Oacidente trouxe uma grande preocupacao para a Europa pela possibilidade de contaminacdo de um dos seus principais rios: 0 Dantibio. A Jama téxica che- gou a atingir um dos seus afluentes, a apenas 20 km desse importante rio, que espalharia a tragédia ambiental de forma dramética para milhées de europeus. Nas dreas afetadas pela Maré Vermelha, nao haveré fauna e flora durante al- guns anos e rios que foram atingidos, como 0 Tolna, podem ter sido condenados a morte. Hé 0 risco ainda, de quando secar a lama, poder ser transportada na forma de poeira e afetar outras areas. ‘Aempresa htingara MAL, responsdvel pelo acidente quimico, declarou-se dis- posta a pagar até 5,5 milhdes de euros (US$ 7,3 milhGes) a titulo de indenizagéo para as vitimas nos préximos cinco anos. No Brasil, segundo relatério “O Estado Real das Aguas no Brasil— 2003/2004”, elaborado pela Defensoria das Aguas, a contaminagao das Aguas de rios, lagos ¢ lagoas quintuplicou nos tiltimos dez anos. O relatério foi realizado a partir do mapeamento de 35 mil deniincias de agressao ao meio ambiente e ages civis pti- blicas que jé receberam sentenca judicial. Orelatério aponta que a principal fonte de contamina¢ao no pais € o despejo de material téxico proveniente das atividades agroindustriais ¢ industriais, que so responsaveis pelo consumo de 90% das 4guas e que so devolvidas contami- nadas apés 0 uso. A pesquisa apontou 20.000 areas contaminadas no pais. Um dos piores casos de contaminagio de aguas, revelados pelo relatério, 6 0 que foi provocado pelo aterro Mantovani, uma érea do Municipio de San- to Antonio de Posse, na Regiéo Metropolitana de Campinas (SP), onde mais de 50 empresas multinacionais depositaram toneladas de residuos téxicos de forma inadequada entre 1973 e 1987. Entre outras induistrias, Cargill, Monsanto, Phi- lips, Petrobras, Du Pont, Chrysler, Bosch, Johnson & Johnson despejaram mais de 500 mil toneladas de material téxico, contaminando rios e pessoas.” * Defensoria das Aguas. O Estado Real das Aguas no Brasil - 2003/2004. Disponivel em: baseada na oposiciio entre os pafses ricos do Norte e os pobres do Sul), explicitan- do duas novas preocupagdes: a deplecdo dos recursos naturais ¢ a redistribuigao de renda no planeta como forma de desenvolvimento dos paises do Sul.'° Esses eventos, em particular a publicagéo do relatério do Clube de Roma e a Conferéncia das Nagées Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, contribuiram para que se estabelecessem preocupagées normativo-institucionais tanto no Am- bito da ONU, quanto no dos Estados (criagdo de Ministérios, Agéncias e outras organizagbes governamentais incumbidas do Meio Ambiente e multiplicagao da legislacdo ambiental), bem como junto a organizagdes financeiras multilaterais, (BID € BIRD, por exemplo), que constituiram assessorias, posteriormente trans- formadas em departamentos, encarregadas da questo ambiental. Outro mérito da Conferéncia foi o de langar as bases para a abordagem dos problemas ambientais numa ética global de desenvolvimento, primeiros passos do que viria a se constituir mais tarde no conceito de desenvolvimento sustentavel.”” AConferéncia da ONU em 1972 gerou a Declaragao sobre o Ambiente Huma- no e produziti um Plano de Aco Mundial, com o objetivo de orientar a preserva- ‘cdo ea melhoria no ambiente humano. Um outro importante resultado do evento foi a criagdo do Programa das Nacdes Unidas sobte 0 Meio Ambiente (PNUMA), encarregado de monitorar 0 avanco dos problemas ambientais no mundo. No final do ano de 1972, a Assembleia Geral da ONU prosseguiu o debate sobre a problematica do meio ambiente tendo como base as conclusées da Confe- réncia de Estocolmo. Em consequéncia, a Assembleia Geral adotou em 15 de de- zembro a Resoluio 2997/XXI\, pela quall se aprovava a criaglo de um programa internacional para a salvaguarda do Meio Ambiente, com um Conselho Diretor formado por 58 Estados. Como seu primeiro diretor-executivo foi nomeado 0 ca- nadense Maurice Strong, que havia desempenhado o cargo de Secretario-Geral * maimon (1992, p. 60). * Bizzozero (1992). * Kitamura (1994, p. 48) Atomics de conseiéncla do probloma ambiental 21 Conferéncia de Estocolmo, Decidiu-se que a sede do PNUMA seria em Nairdbi, ‘Quénia, para favorecer uma maior participacdo dos paises em desenvolvimen- S novo organismo iniciou suas atividades oficialmente em outubro de 1973. Refletindo a importéncia das discussées que ocorreram em Estocolmo, nos seguintes proliferaram acordos e conferéncias teméticas internacionais, ~ Convengiio sobre 0 Comércio Internacional de espécies ameacadas da fau- flora silvestres (1973), Convengio Internacional para a Prevencao da Po- Scio pelos Navios (1973), Conferéneia Alimentar Mundial (1974), Convencio 2 Protegio da Natureza no Pacifico Sul (1976), Conferéncia das Nacdes sobre a Agua (1977), Conferéncia das Nagdes Unidas sobre a Desertifi- 4977), Conferéncia Mundial sobre o Clima (1978), Convencdo sobre @ ragdo das espécies migrantes pertencentes & fauna selvagem (1979), Con. sobre a conservacao da fauna e da flora maritimas da Antartida (1980) outros documentos que foram normatizando procedimentos que deve- ser adotados pelas pessoas e organizagées em relagio ao meio ambiente Adécada de 80 ‘wo ano de 1983, a Assembleia Geral da ONU, como reflexo do aumento das preocupagées ambientais, criou a Comissio Mundial sobre o Meio tee o Desenvolvimento (CMMAD), presidida pela primetra-ministra da | Gro Harlem Brundtland, com o objetivo de examinar as relagées entre ‘ambiente e o desenvolvimento e apresentar propostas vidveis. “a Presidente da Comissio, Gro Brundtland, esclareceu no prefaicio do relat6- © que foi solicitado para a Comissdo: apresentar um trabalho que consistiria “agenda global para mudanga” para, entre outras coisas: + proporestratégias ambientais que viabilizem 0 desenvolvimento susten- tavel por volta do ano 2000 em diante; recomendar formas de cooperacéo na érea ambiental entre os paises em desenvolvimento ¢ entre os paises em estigios diferentes de desenvol- ‘vimento econdmico e social que os levem a atingir objetivos comuns, Sa anc c Fevereiro de 1997, 0 Consetho Administrative do PNUMA langou a denominada J de Nair6bi, na qual sto reafirmados os objetivos do organismo que foram eonfirmados ‘bleia Geral da ONU em junho do mesmo ano. SOKAD (1991, item XD. 22 Gestioambiental + Diae consideradas as inter-relagdes de pessoas, recursos, meio ambiente desenvolvimento; encontrar meios ¢ maneiras para que a comunidade internacional possa lidar mais eficientemente com as preocupagées ambientais; contribuir com a definicéo de nogdes comuns relativas a questées am- bientais de longo prazo e os esforcos necessérios para tratar com éxito 8 problemas da protegdo e da melhoria do meio ambiente, uma agenda de longo prazo a ser posta em pritica nos préximos decénios. informe Brundtland, da Comisséio Mundial para o Meio Ambiente e 0 De- senvolvimento (CMMAD), denominado “Nosso Futuro Comum?,'* divulgado em 1987, pode ser considerado um dos mais importantes documentos sobre a ques- to ambiental e o desenvolvimento dos tiltimos anos. Vincula estreitamente eco- nomia e ecologia estabelece com muita preciso o eixo em torno do qual se deve discutir 0 desenvolvimento, formalizando 0 conceito de desenvolvimento sustentivel e estabelecendo os parémetros a que os Estados, independentemente da forma de governo, deveriam se pautar, assumindo a responsabilidade no s6 pelos danos ambientais, como também pelas politicas que causam esses danos. © documento “Nosso Futuro Comum’” foi referéncia e base importante para 0 debates que aconteceram na Conferéncia das Nagées Unidas sobre 0 Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD), realizada no Rio de Janeiro em 1992, ‘onde se popularizou 0 conceito de desenvolvimento sustentavel, tornando as quest6es ambientais e de desenvolvimento indissoluvelmente ligadas. 2.4 Adécada de 90 e 0 inicio do século XXI No final do século XX, no inicio da década de 90, o meio ambiente ocupava ‘um patamar privilegiado na agenda global, tendo se tornado assunto quase obri- gatério nos intimeros encontros internacionais. Foi um periodo de intensos deba- tes, atividades, foruns e encontros que resultaram em um consenso mundial dos Perigos que corria o planeta caso se mantivesse o modelo de crescimento insus- tentavel até ent&o em vigor. ACNUMAD ocorret 20 anos apés a Conferéneia de Estocolmo e concentrou- -se em identificar as politicas que geram os efeitos ambientais negatives. Con- cluiu ela, de forma eloquente, que “a protegco ambiental constitui parte integrante do processo de desenvolvimento, e ndo pode ser considerada isoladamente deste”. O * cama (1991). ‘Atomada de consciénela do problema ambiental 23 ‘meio ambiente e o desenvolvimento sao duas faces da mesma moeda com nome sréprio, desenvolvimento sustentével, 0 qual “ndo se constitui num problema téc- co, mas social e politico”.'> Como produto desse encontro foram assinados cinco documentos que di- “Rcionariam as discussdes sobre o meio ambiente nos anos subsequentes, quais Be? #8 Agenda 21; Convénio sobre a Diversidade Biolégica (CDB); Convénio sobre as mudangas climaticas; Principios para a Gestéio Sustentavel das Florestas; Declaragao do Rio de Janeiro sobre meio ambiente e desenvolvimento. ‘Numa avaliagdo da Conferéncia do Rio, houve aqueles que se sentiram de- jonados com os resultados. No entanto, conforme afirma PRESTRE, “suas des poderiam se revelar prematuras. Nao se resolve em uma conferéncia um to de questées tao complexas cientificamente e dificeis politicamente”.° Os jos internacionais no Ambito da politica ambiental ndo constituem fins em si 105, mas iniciam um processo: “N@o definem objetivos absolutos e inamoviveis ou um mandato de acio imperati- Vo, mas serve de base a negociagbes ¢ ajustamentos futuros entre 0s atores inte- ressados, definindo seus pardmetros. Por conseguinte, a Conferéneia do Rio nfo foi © ponto culminante de um processo, porém uma etapa que permite compreender 0s limites das utopias, a complexidade dos mecanismos ¢ as dimensOes multiplas dos problemas. Hla forneceu um meio de mobilizacdo continua dos governos ¢ so- ciedades civis e um quadro intelectual, que permitiré a consideracio de interesses diversos. A despeito de seus limites, a Conferéncia do Rio eriou um potencial de progresso substancial e mostrou a via para uma insercio melhor da dimensio am- bientalista nas politicas econémicas e nos processos de decisio.”” De em os Soo se =O pare 235 s. pars feio 2, Das Além dos importantes documentos contendo diretrizes gerados na CNUMAD, um desdobramento institucional importante, que foi a criagdio da Comis- sobre o Desenvolvimento Sustentével (CDS) em dezembro de 1992, para ar a implementac&o das propostas da Rio 92. A CDS é uma comissio do lho Econémico e Social das Nagdes Unidas (ECOSOC). aRe RRR RS we ° © (2000, p. 240). (2000, p. 240). 24 Gost Ambiental + Dias Em dezembro de 2000, a Assembleia Geral das Nacdes Unidas resolveu que a CDS serviria de Orgéo Central organizador da Cipula Mundial de Desenvolvi mento Sustentével, conhecida como Rio+10, que ocorreria em Johannesburgo entre os dias 26 de agosto ¢ 4 de setembro de 2002 e que teria como objetivo avaliar a situagdo do meio ambiente global em funcao das medidas adotadas na CNUMAD-92. Realizada a Conferéncia, foram produzidos dois documentos relevantes: a Declaragao de Johannesburgo sobre o Desenvolvimento Sustentdvel e © Compro- miso de Johannesburgo para um desenvolvimento sustentével. Os participantes da Ctipula Mundial sobre o Desenvolvimento Sustentvel (CMDS), de Johannesburgo, reconheceram que nao foram alcancados os objeti- vos fixados na Ciipula do Rio, e reiteraram que os trés pilares insepardveis de um desenvolvimento sustentavel estabelecidos naquela ocasiéo continuavam sendo a proteco do meio ambiente, o desenvolvimento social eo desenvolvimento econd- mico. Foi adotado 0 Compromisso de Johannesburgo para o Desenvolvimento Sus- tentavel, o qual como declaragio é bastante prolixo, mas, quanto a compromissos concretos, deixa muito a desejar e fica muito distante de uma verdadeira agenda para a acao. De modo getal, os compromissos assumidos foram muito vagos e sem. prazos para alcancar os objetivos socioeconémicos ¢ ambientais colocados."* A definitiva vinculagio da temética ambiental com as propostas de desen- volvimento pode ser considerada um marco no debate ambiental, pois, passados vinte anos, abriu-se a possibilidade para uma nova abordagem das questées am- bientais, vinculando-as com os problemas sociais tipicos dos paises subdesenvol- vidos do Sul, tais como a desigualdade e a injustica social. Com 0 avanco da conscientizagao ecoldgica nos paises do Norte nas décadas de 70 e 80, desenvolveram-se tecnologias que possibilitaram melhor controle da emisséo de poluentes, maior economia energética e substituicdo de alguns re- cursos naturais escassos. A presso da opiniao puiblica e das agéncias ambientais fez com que determinadas indtistrias transferissem suas plantas industriais, seus processos produtivos e, muitas vezes, a comercializacéio de produtos que nao sa- tisfaziam as novas exigéncias para os paises em desenvolvimento.” Ao constatarem que os problemas ambientais eram fundamentalmente glo- bais, os pafses do Norte tentaram fazer crer que as responsabilidades deveriam. * Sela (2002). Para a populagio, de modo geral, oautomével é 0 produto mais visivel dessa transferéncia para 60s paises em desenvolvimento. Aqueles que nao atendiam as especificagées ambientais de emissio de gases continuaram a ser produzitos nos pafses do Sul. Devemos considerer, einda, como trans feréncia significativas as indistrias quimnicas e de pape ¢ celulose, ‘A tomada de consctncia do problema smbientt 25, ser globalmente distribuidas, desconsiderando deste modo os diferentes estagios de desenvolvimento em que se encontravam os paises. Esta erescente preocupagao dos paises industrializados transformou seu re- lacionamento com os paises em desenvolvimento numa espécie de “imperialismo benevolente”,*” que passa a exigir ages voltadas ao meio ambiente, vinculando sua efetiva realizacdio com os empréstimos das agéncias de financiamento, Até 0 Sim da década de 80, os tinicos projetos de inversio que realizavam estudos de Smpacto ambiental na Argentina, por exemplo, o faziam porque era uma exigé ‘2 das agéncias financeiras internacionais — Banco Internacional de Reconstru- ‘0 € Desenvolvimento (BIRD), BID e outros.* Os problemas ambientais dos paises do Norte esto relacionados com o de- seavolvimento excessivo. O aquecimento global, por exemplo, é provocado por ‘Sse que se originam das sociedades industrializadas, Isto significa que o estilo = vida das nagées ricas € ecologicamente irracional e que 0 seu desenvolvimento 20 pode qualificar-se de “sustentavel”.* Por outro lado, nos paises em desenvolvimento, a degradacao dos recursos as- ‘Samiu dimensdes mais tragicas, devido & necessidade de exploracéo da natureza ‘per garantir a sobrevivéncia de suas populagdes. Deste modo, esto sacrificando += futuro para assegurar uma vida cotidiana precdria no presente. Esté claro que ‘=20 se pode proteger um recurso natural negando-se a sua utilizacdo por aqueles “= dependem desse recurso.” E, além de os paises do Sul fazerem uso intensivo 5s recursos naturais,2* so grandes consumidores de energia e suas indtistrias apresentam controle de emissao de poluentes compardveis aos encontrados pafses desenvolvidos. A introducao de novas tecnologias que tornariam seus s produtivos ecologicamente aceitéveis, de outro lado, encareceria seus iutos, tornando-os menos competitivos no mercado internacional. Sem dui- nenhuma, evoluiu muito o debate sobre o real papel do meio ambiente no afses do Sul frente & pressdo exercida pelos paises do Norte. Hoje, ha pou- ‘uestionamento sobre sua importéncia e, na realidade, a discusséo ambiental Sperilismo Benévolo em espanhol. Expresso utilizada no documento da Cepal (1990) e repro- sda por nds no texto. PAL (1990). Boutros-Ghali (1992). “Boutr0s-Ghali (1992). SSHoricamente, os diferentes imperialismos, particularmente o brtinico e 0 amesicano, desti 205 paises do Sul este papel, o de exportadores dle matéria-prima para os Paises Centrais, 26 Gest Ambiental + Dias retoma a problemética de qual deve ser 0 modelo de deseswolirimento que redu- zird a desigualdade entre os pafses do Norte ¢ do Sula existente no interior dos paises em desenvolvimento. ‘A busca de uma agenda comum de ataque & pobrezs © 3 destrui¢ao ambiental constitui-se num objetivo que une paises desenvalwides © =m desenvolvimento nos féruns internacionais; embora apresentem diferentes proposcas* no enfrentamen- to do problema, concordam em que somente com a adocso de estratégias comuns poderao enfrentar o duplo desafio que representa a pobreza e 0 meio ambiente. 2.5 O estado do debate ambiental no final do século XX A década de 90 inicia-se com uma nova realidade entre as nacées: a queda do muro de Berlim assinala a substituigéo definitiva do confronto Leste-Oeste pelo embate Norte-Sul, colocando a questéo ambiental como um dos itens fundamen tais da agenda internacional. Essa mudanca no eixo pelo qual se articulam os interesses no sistema mun- dial provoca na década de 90, particularmente apés a Eco-92, um aumento da as- sinatura de tratados e acordos multilaterais internacionais, 20 mesmo tempo em. que aumentam as medidas normatizadoras®” tomadas pelos organismos financei- ‘os intetnacionais que contribuem para desenhar um quadro em que se configura a construgao de uma nova ordem ambiental mundial. A construcio de um arcabouco normativo-institucional ambiental nos Esta- dos-nacGes é direcionada, em grande medida, pelo significativo nimero de acor- dos multilaterais relacionados com 0 meio ambiente que constituem o aspecto mais visivel dessa nova ordem, Até 0 ano de 1993, estavam em vigor numero- sos acordos multilaterais sobre meio ambiente - em torno de 127 -, aos quais se acrescentam as notificacées do Acordo sobre Obstécuilos Técnicos ao Comércio estabelecido na Rodada de Téquio - no total de 211. Estas notificagoes estabe- leceram regras para a protecdo ambiental e da satide e seguranga humanas em diversas dreas de interesse ecoldgico.* {As propostas diferentes no limite podem até chegar a excluir @ pobreza como vinculada A ques- ‘io ambiental, como desejavam os norte-americanos, que procuravam impedir que sais referéncia, ‘a esse problema no documento final da Reuniso de Cipula das Américas realizada na Bolivia, e que s6 permaneceu no final do documento por pressto do Brasil ® Leonard (1992) e Banco Mundisl-BIRD (1992). * Particularmente, os condicjonamentos ambientais a empréstimos tomedos junto a esses orga- aismos. * lbavera (1992),

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