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Titulo original: Gefiihle in Zeiten des Kapitalismus Copyright da edigao brasileira © 2011: Jorge Zahar Editor Ltda. rua Marqués de Sao Vicente 99 12 andar | 2451-041 Rio de Janeiro, ry tel (21) 2529-4750 | fax (21) 2529-4787 editora@zahar.com.br | www.zahar.com.br Todos os direitos reservados. A reproducao nao autorizada desta publicacao, no todo ou em parte, constitui violagao de direitos autorais. (Lei 9.610/ 98) Grafia atualizada respeitando 0 novo Acordo Ortografico da Lingua Portuguesa Preparacao: Geisa Pimentel Duque Estrada Revisdo: Eduardo Monteiro, Eduardo Farias | Indexacao: Nelly Praca Capa: Dupla Design | Foto da capa: © Kevin Russ/iStockphoto cip-Brasil. Catalogacao na fonte Sindicato Nacional dos Editores de Livros, ry Tllouz, Eva, 1961- I29a Oamor nos tempos do capitalismo / Eva Illouz; traduc4o Vera Ribei- 10, — Rio de Janeiro: Zahar, 2011. Traducdo de: Gefiihle in Zeiten des Kapitalismus Inclui bibliografia e indice ISBN 978-85-378-0710-1 1. Capitalismo — Aspectos sociais. 2. Emocées — Aspectos sociolégi- cos. 3. Relagées humanas e cultura. 1. Titulo. 3. Redes romanticas! PERMITAM-ME COMECAR in media res, falando de um filme que teve grande popularidade na época em que foi lancado. O filme Mensagem para vocé, de Nora Ephron, de 1999, é a historia da dona de uma loja de livros infantis, Kathleen Kelly (Meg Ryan), que tem um namorado na vida real, mas mantém também um romance platénico com alguém na internet. Ela nao co- nhece seu amigo da internet, mas nés, espectadores, sabemos quem ele é. Assim, quando Joe Fox (Tom Hanks), dono de uma megalivraria d la Barnes and Noble, leva Kathleen Kelly a faléncia, nds, espectadores, sabemos que esses dois inimigos s4o, na verdade, os melhores amigos romanticos da rede. O filme se desenrola no género da “comédia maluca”, com os dois protagonistas manifestando o tempo todo sua antipatia, que se transforma numa atragao relutante, até finalmente se renderem a seu amor reciproco. Mas 0 que torna o filme uma comédia romantica da internet é o fato de que, confrontada com a escolha entre Joe Fox (por quem passou a se sentir atrai- da e de quem sabemos que gosta) e seu namorado on line, Meg Ryan escolhe este ultimo (sem saber que se trata da mesma pessoa). Tudo acaba bem, é claro, quando ela descobre que seu namorado da internet e o homem por quem passou a se sentir relutantemente atraida na vida real sio um s6. O resumo da 107 a O amor nos tempos do capitalisma coisa toda é simples: no filme, o eu da internet parece muito mais auténtico, sincero e compassivo do que 0 eu social pi. Dlico, este mais propenso a ser dominado pelo medo dos outros, pela postura defensiva e pela insinceridade. Em contraste com © romance da rede, no decorrer do qual os dois podem revelar um ao outro seus pontos fracos ocultos e sua verdadeira gene rosidade, na “vida real”, Joe Fox e Kathleen Kelly mostram um a0 outro seu eu pior ~ ¢ presumivelmente falso. A primeira vista, isso é surpreendente. Quando um pes. quisador da internet indaga “Como [podem] relagées inter- pessoais romanticas ... vir a existir nessa matriz global de computadores, aparentemente inanimada e impessoal?”? a resposta dada pelo filme é simples: o que torna 0 romance na rede tao incontestavelmente superior aos relacionamentos da vida real é 0 fato de que o romance cibernético anula o corpo, € por isso, supostamente, faculta uma expressio mais plena do eu auténtico. Claramente, a internet é apresentada como uma tecnologia descorporificadora, e que desmaterializa o corpo de maneira positiva, no sentido de que o filme se apoia na ideia de que o eu se revela melhor e é mais auténtico ao set apresentado fora das limitagdes das interacdes corporais. Essa ideia, por sua vez, 6 compativel com um “discurso central utépico em torno da tecnologia da computagio", centrado no “potencial oferecido pelos computadores para que os seres humanos escapem do corpo. ... Na cultura do computador, a corporaliza¢do é comumente representada como uma bar: reira lamentavel 4 interagao com os prazeres computacionais. Na escrita cibernética, é comum fazer-se referéncia ao corpo como ‘a carne’, a carne morta que cerca a mente ativa que constitui o eu ‘auténtico’."? Redes romanticas 109 Segundo essa visio, portanto, 0 corpo ~ ou melhor, a au- séncia dele — permite que os sentimentos evoluam a partir de tum eu mais auténtico ¢ fluam para um objeto mais digno, ou seja, 0 eu verdadeiro ¢ incorpéreo do outro. Mas, se é assim, do ponto de vista de uma sociologia dos afetos, isso deveria criar um problema especial, pois os afetos em geral e 0 amor romAntico em particular alicergam-se no corpo. As palmas das maos suadas, 0 cora¢do disparado, as faces ruborizadas, as, mios trémulas, os punhos cerrados, as kigrimas, a gagueira, tudo isso so apenas alguns exemplos dos modos pelos quais, ‘0 corpo esta profundamente envolvido na experiéncia dos afe- tos, e do amor em particular. Se é assim, e se a internet anula ou poe entre parénteses corpo, como ela pode moldar os sentimentos, se € que 0 faz? Mais exatamente, de que modo a tecnologia rearticula a corporeidade € os afetos? Romanceando a internet Os sites de encontros da internet tornaram-se empresas suma- mente populares e lucrativas. Em 1999, um em cada doze adul: tos solteiros nos Estados Unidos havia experimentado a busca de parceiros on line, e o site norte-americano match.com, criado j4 em 1995, afirmou ter mais de cinco milhées de usu- arios registrados, ¢ hoje se gaba de receber doze milhoes de visitas por dia.* Os dados exatos nio sio faceis de obter, mas parece que de vinte a quarenta milhées de pessoas, s6 nos Estados Unidos, visitam mensalmente os sites de encontros da rede, inclusive mais de um milhio de usuarios acima de 665 anos.” Com pacotes mensais que custam cerca de 25 délares, 0 encontros on line sio também um negécio lucrativo. Na

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