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MÓDULO 4 “A EUROPA NOS SÉCULOS XVII E XVIII – SOCIEDADE, PODER E DINÂMICAS COLONIAIS

Unidade 2 “A Europa dos Estados absolutos e a Europa dos Parlamentos”

2.1. A estratificação social do Antigo Regime. Uma Sociedade de Ordens.

No Antigo Regime (séculos XVI a XVIII) as sociedades europeias organizavam-se segundo uma estratificação que vinha já da Idade Média, e que se baseava na
desigualdade do nascimento e funções desempenhadas.
Era uma sociedade de “Ordens” ou “Estados”: Clero, Nobreza e 3.º Estado (burguesia/povo).
O mais numeroso e menos privilegiado era, sem dúvida, o 3.º Estado, do qual faziam parte os camponeses, mineiros, pescadores, artesãos, operários, comerciantes e
funcionários.
No topo estava o rei que garantia o privilégio dos dois primeiros Estados ou Ordens Sociais, que eram o Clero e Nobreza.
O estado social de cada indivíduo dependia do seu nascimento (Nobre ou 3.º Estado) ou da função que desempenhava (Clero).
Conforme a sua condição, assim beneficiava de determinados privilégios ou estava obrigado a um conjunto de deveres que decorriam dos códigos de atuação pública
da sua “Ordem”.
Neste tempo, a mobilidade social era raríssima, apenas as economias mais progressistas da Inglaterra e dos Países Baixos permitiam alguns processos de ascensão
social, baseados na riqueza, na cultura, estilo de vida e alianças familiares.

A pluralidade dos estratos sociais


A Sociedade de Ordens do Antigo Regime assentava no princípio da desigualdade natural das pessoas. As ordens privilegiadas eram o
Clero e a Nobreza.
Na hierarquia social, o Clero ocupava o 1.º lugar, em prestígio, privilégios, desigualdades e honras. Estava dependente diretamente do Papa, tinha tribunais privativos
(de acordo com o direito canónico), estava isento de serviço militar, não pagava impostos e tinha o direito a cobrar o dízimo eclesiástico. Devido ao seu grau de cultura,
ocupava altos cargos na Administração Pública, Corte e Ensino.

A Nobreza ocupava o 2.º lugar. Havia a Nobreza Rural (que vivia dos rendimentos da terra), a Nobreza Cortesã (exercia cargos na corte, que acumulava com a condição
de grande proprietária), a Nobreza de Espada (ligada à vida militar), a Nobreza de Sangue (nobreza de linhagem que se fechava em casta) e a Nobreza de Toga (recém
nobilitada pelo exercício de importantes cargos públicos: diplomacia, justiça e administração).
Os nobres não pagavam impostos e tinham foro próprio.

O 3.º Estado / Diversidade de comportamentos e valores


Apesar das “Ordens” serem entre si (e dentro da própria “Ordem”), muito heterogéneas, a verdade é que mantiveram uma grande coesão social interna que assegurou
a sua manutenção ao longo dos séculos. Isto, porque as leis consagraram a sua institucionalização e a mentalidade dominante as justificava e defendia.
O 3.º Estado, como é óbvio, era o mais sobrecarregado de deveres e sem quaisquer privilégios.
No seu dia a dia, todos os estratos sociais se distinguiam pelos “tratos” (a diferenciação social era aí bem patente), pela maneira como se apresentavam em público
(nobres só saíam à rua acompanhados), e pelas normas de saudação e tratamento (cada categoria tinha formas próprias) ou pela maneira como conviviam uns com os
outros, nos espaços públicos.
Na Sociedade do Antigo Regime o “estrato social” mais inconformado era a “burguesia”, que se sentia acorrentada pelas estruturas arcaicas dessa sociedade e isso foi o
fator determinante da evolução social que poria fim ao Antigo Regime.

O Absolutismo régio
Na Europa do Antigo Regime, o regime político dominante era, de facto, a monarquia absoluta.
Foi o resultado de uma longa evolução da política centralizadora que começou ainda na Idade Média (séc. XIII) e foi favorecida pelos seguintes fatores:
 O ressurgimento do urbanismo e da economia de mercado;
 A pressão ascensional da burguesia enriquecida;
 O desenvolvimento cultural e renascimento do direito romano (que valorizava o estado centralizado);
 O crescimento económico e alargamento geográfico dos países/impérios europeus.

Tudo isto contribuiu decisivamente para a valorização da figura do rei junto das sociedades daquela época. Os reis absolutos tornaram-se, assim, nas primeiras e mais
poderosas pessoas dos respetivos Estados, exercendo o poder de forma pessoal, absoluta, única e concentrando todos os poderes nas suas mãos (legislativo, judicial e
executivo).

Os limites dos poderes do rei absoluto


Apesar do rei absoluto concentrar todos os poderes nas suas mãos e de se identificar com o próprio Estado, a verdade é que, mesmo assim, havia alguns limites à sua
atuação política.
Entre esses limites, pelo menos teóricos, destacam-se os seguintes:
 As leis da “justiça natural” dos homens (desde quase sempre eram reconhecidos o direito à propriedade, à vida, à justiça e à liberdade da pessoa);
 As eis de Deus (o rei devia o seu trono à vontade e determinação divina, por isso, devia jurar-lhe obediência e governar segundo a vontade divina);
 As leis consuetudinárias de cada Reino (pelo respeito dos costumes e tradições próprias de cada Reino). Claro que ninguém (senão a própria consciência do
soberano) controlava a ação do rei que para provar a sua magnificência e omnipotência, não convocava as Cortes e conferia aos Conselhos de Estado um carácter
meramente consultivo.

A afirmação do absolutismo em Portugal


A imagem pública do poder absoluto impunha-se não apenas como símbolo do poder político e do Estado, mas como a própria fonte e reconhecimento do poder.
A Corte era o local mais importante de cada Reino, onde funcionavam os principais órgãos e instituições do poder político e administrativo. O grandioso Palácio de
Versalhes do rei Luís XIV funcionava como modelo a seguir por outras Cortes Europeias.
A Monarquia Portuguesa também conheceu o regime absolutista, que se foi instaurando desde o séc. XV.
A 1.ª fase do absolutismo régio português remonta ao reinado do D. João I (quando este nobilitou alguns burgueses e expulsou a velha nobreza para Castela) e,
sobretudo, ao de D. João II (que reprimiu com eficácia e subordinou totalmente a nobreza à sua autoridade) e prossegue no reinado de D. Manuel e de D. João V,
assumindo no reinado de D. José I o carácter de despotismo esclarecido com o Marquês de Pombal.

A preponderância da nobreza fundiária e mercantilizada


Durante a Idade Moderna (ou Antigo Regime) os mais altos cargos administrativos e militares continuavam nas mãos da Alta Nobreza (tanto no Reino como no
Império).
Ao mesmo tempo, a Nobreza portuguesa envolvia-se também na atividade mercantil – eram os fidalgos-mercadores.
Com uma mentalidade conservadora, a nobreza gastava os seus rendimentos em bens sumptuários e bens de raiz (propriedades fundiárias).
Também o Clero foi beneficiado com doações régias, vendo o seu património fundiário crescer.
A Burguesia Portuguesa, ao contrário, enferma de grande debilidade, muito por causa do comércio externo ser monopólio do Rei, a Nobreza ocupava os lugares que
deveriam ser seus no comércio colonial, e serem também da Nobreza os principais cargos políticos, administrativos e militares.
Só no período filipino e na conjuntura da Restauração se registaram condições favoráveis ao crescimento da burguesia.

O aparelho burocrático do Estado Português - séc. XVII


A complexificação da vida política do séc. XVII obrigou o Estado absoluto português a criar diversos órgãos administrativos como:
 A Casa da Suplicação (Tribunal da Justiça da Corte);
 A Mesa do Desembargo do Paço (com competências judiciais, deferia licenças, petições, perdões e concedia “provisões”);
 A Mesa da Consciência e das Ordens (Tribunal Régio que decidia as questões com o Clero, Nobreza e 3.º Estado);
 O Tribunal do Santo Ofício (julgava e condenava os suspeitos de judaísmo e hereges);
 O Conselho da Fazenda (administrava a fazenda real).

No reinado de D. João IV, e em virtude das guerras da Restauração, foi criado:


 O Conselho de Guerra (com competências político-militares);
 O Conselho Ultramarino (decidia tudo o que se referia ao Ultramar);
 A Junta dos Três Estados (administrava e superintendia nos impostos, receitas e contrato do tabaco e açúcar e despesas com a defesa do Reino);
 Foi reorganizado o Conselho de Estado (a partir de D. João IV foi constituído pelos Secretários de Estado, presididos pelo Rei).
O Absolutismo Joanino

João V foi o monarca português que melhor ilustrou a imagem de rei absoluto, sabendo superiorizar-se relativamente a todos os grupos sociais. Grande admirador de
Luís XIV, Rei Sol, tentou imitar o rei francês, tentando controlar todo o poder (diminuindo progressivamente a capacidade de decisão dos diversos Conselhos).
O absolutismo de D. João V manifestou-se na ostentação da sua riqueza, mas também nas reformas empreendidas na governação do Reino. Uma das características do
Absolutismo Joanino foi a não convocação de Cortes. Reformou a estrutura governativa com a criação de três Secretarias de Estado do Reino (que dirigia o Governo):
dos Negócios Estrangeiros e da Guerra; da Marinha e do Ultramar.
Ele presidia ao governo das Três Secretarias de Estado. O seu absolutismo traduziu-se, assim, no fortalecimento do poder real e na expansão das áreas de influência do
Estado.

Política cultural de D. João V


A prosperidade económica do reinado de D. João V possibilitou-lhe o empreendimento do desenvolvimento das Letras, das Ciências e das Artes.
Fundou a Academia Real da História Portuguesa (1720) e promoveu o estudo da Música (Escola do Seminário Patriarcal – 1713).
Foi também no seu tempo que surgiu o primeiro periódico (“Gazeta de Lisboa”).
Apoiou o desenvolvimento científico (Matemática, Física, Astronomia e Medicinal) e retirou o monopólio do ensino aos Jesuítas.
O barroco joanino é também uma faceta do mecenato praticado por este monarca relativamente às artes.
Chamou à Corte os melhores artistas plásticos do mundo, ou pagou o aperfeiçoamento no estrangeiro dos melhores artistas portugueses e, durante o seu reinado,
empreenderam-se grandes obras, como o Palácio-Convento de Mafra (símbolo do seu reinado) ou o Aqueduto das Águas Livres de Lisboa.
Muitas igrejas remodelaram os seus altares, recobertos a talha dourada.

Unidade 3 “Triunfo dos estados e dinâmicas económicas nos séculos XVII e XVIII

3.1. Reforço das economias nacionais e tentativas de controlo do comércio

O mercantilismo
Nos séculos XVII e XVIII os Estados europeus tiveram uma grande tendência para proteger as respetivas economias nacionais, procurando uma balança comercial
favorável à custa de um grande estímulo à produção urbana, consolidada com medidas protecionistas. Entre os primeiros estados a praticar o mercantilismo (doutrina
económica que defende que a riqueza dum estado está na abundância de metais preciosos [ouro/prata], resultantes do “superavit” do comércio externo) está a
Holanda que promoveu o protecionismo à produção interna (agrícola e manufatureira) para obter uma balança comercial favorável.
Os países que tinham um império colonial, onde era possível a exploração de metais preciosos, como Portugal e Espanha, também viram aumentar as suas reservas em
metal precioso, mas isso não significa uma verdadeira política mercantilista, porque esta aposta sempre numa política de grandes investimentos na produção nacional e
numa legislação protecionista.

O mercantilismo Francês
As medidas mercantilistas em França foram adotadas, sobretudo por Colbert, no reinado de Luís XIV, e consistiram: na criação de manufaturas régias; modernização das
técnicas e processos de fabrico; concessão de benefícios fiscais e jurídicos às indústrias; fiscalização da qualidade da produção; regulamentação do trabalho fabril e
adoção de pautas aduaneiras protecionistas. Criou também Companhias Comerciais Monopolistas e alargou as áreas coloniais, reforçando os investimentos no
desenvolvimento da frota mercante e da marinha de guerra.
Mas esta política não resultou porque Colbert esqueceu a agricultura, os gastos com a guerra e com a Corte eram elevadíssimos, teve a oposição da Nobreza e notou-se
um excesso de dirigismo político. Ainda assim este modelo de mercantilismo foi o mais adotado pelos países europeus.

O mercantilismo inglês
O “mercantilismo inglês” assenta nos “Atos de Navegação” que são responsáveis pelo domínio inglês do comércio marítimo mundial a partir da 2.ª metade do séc. XVII.
Na prática, esta legislação inglesa, altamente protecionista, pretendia retirar aos holandeses o seu domínio nas áreas do comércio britânico, impedindo que as
mercadorias estrangeiras chegassem ao mercado inglês noutros barcos que não fossem os ingleses ou os do país de onde eram esses produtos. Até os tripulantes dos
navios ingleses deveriam ser maioritariamente britânicos.
Entre as principais medidas mercantilistas adotadas pelos Estados europeus, salientam-se as seguintes: redução das taxas fiscais para as exportações; proibição das
importações de artigos de luxo; aumento das taxas sobre os produtos importados; incentivo à produção manufatureira; criações de Companhias Comerciais
monopolistas; exclusivo colonial.

A disputa das áreas coloniais. Os conflitos dos séculos XVII e XVIII


O mercantilismo espanhol preocupou-se sobretudo com a conservação dos metais preciosos no país. Para isso, promulgou pautas aduaneiras proteccionistas e proibiu a
saída de metal amoedável. As práticas mercantilistas provocaram disputas económicas que estiveram na origem de conflitos bélicos entre a Inglaterra e a Holanda, na
sequência dos “Atos de Navegação” que prejudicou muito os interesses holandeses. Entre a Inglaterra e a Holanda houve três situações de guerra (1652-54, 1664-66 e
1672-74), que terminaram com o triunfo inglês.
Na conjuntura do mercantilismo, a França e a Inglaterra entraram em concorrência pelo domínio de um maior espaço económico, sobretudo na América do Norte, o
que levou a conflitos armados. O 1.º destes conflitos foi a Guerra da Sucessão de Espanha (1702-13) que terminou com o Tratado de Utreque, que acabou por aumentar
o imperialismo britânico. Já em meados do séc. XVIII a Guerra dos Sete anos (1756-1763) voltou a conceder vantagens à Inglaterra que foi consolidando a sua condição
de “Rainha dos Mares”.

Hegemonia económica britânica / A Revolução Agrícola e o arranque da Revolução Industrial


A hegemonia britânica vai ser uma realidade a que o mundo rapidamente se habitua. O surto demográfico do séc. XVIII; a urbanização e o mercado nacional (em 1840,
mais de metade da população inglesa era urbana); e o dinamismo do mercado externo (de que o comércio triangular é um dos maiores êxitos do comércio colonial) são
alguns dos fatores que explicam o arranque da Revolução Industrial Inglesa.

No séc. XVIII, os países mais desenvolvidos da Europa (Holanda e Inglaterra) iniciaram importantes inovações no setor agrícola, das quais se destacaram os seguintes:
substituíram o sistema rotativo trienal pelo quadrienal (acabando com o pousio);
 aumentaram as áreas de cultivo (apropriando-se de baldios e recorrendo a arroteamentos e drenagens);
 praticaram o emparcelamento e vedação de terrenos;
 selecionaram sementes;
 recorreram à mecanização(máquina de semear) e intensificaram a criação de gado.

A Revolução Agrícola, por sua vez, estimulou o arranque da industrialização, libertando mão-de-obra dos campos, fornecendo-lhe matéria-prima (lã, linho e algodão),
permitindo a acumulação de capitais e consumindo instrumentos de ferro (produzidos pela indústria metalúrgica).

A mudança provocada pela maquinofactura


A introdução da máquina a vapor no setor têxtil algodoeiro trouxe consigo o desenvolvimento da metalurgia, que fornecia as máquinas e outros equipamentos à
indústria. Importante foi também a enorme exploração de hulha, abundante no subsolo inglês, para conseguir produzir o vapor que se tornou a principal força motriz
da 1.ª revolução industrial.
Com a nova máquina a vapor de James Watt, 1.ª fonte de energia artificial da História, a manufatura cedeu o lugar à maquinofatura, aplicando-se a teares, martelos
mecânicos, locomotivas e a toda a espécie de maquinismos.
Mas estas mudanças não se limitaram ao setor económico, tiveram também as suas repercussões em termos sociais e políticos. Grande número de camponeses migrou
para as cidades que cresceram de forma desordenada e desumanizada, surgindo os bairros pobres onde existiam toda a espécie de carências. Por outro lado, a
burguesia industrial reforçava a sua importância política. Os transportes modernizavam-se, encurtando distâncias, e fazendo circular mercadorias, pessoas, notícias e
hábitos novos, contribuindo para a mudança de mentalidades.

Portugal – dificuldades e crescimento económico


Crise comercial portuguesa do fim do século XVII e medidas mercantilistas
Entre 1670 e 1692, Portugal conheceu uma das suas maiores crises comerciais de sempre: os tradicionais produtos das nossas exportações, designadamente o açúcar e
o tabaco brasileiros, tiveram grandes dificuldades de escoamento e o seu preço baixou muito. Foi o resultado das políticas mercantilistas adotadas por vários países
europeus.
Para ultrapassar as consequentes dificuldades financeiras de pagamento das nossas importações, o 3.º Conde de Ericeira, como Vedor da Fazenda de D. Pedro II,
resolveu restringir as importações ao mesmo tempo que recorreu à fundação das manufacturas (têxteis, fundição de ferro e vidro) e às leis pragmáticas (que proibiam
as importações de bens de luxo, chapéus, vidros e azulejos), criou companhias monopolistas e fez-se uma política de desvalorização monetária.
Nos finais do séc. XVII, uma orientação política diferente, motivada pelo abrandamento daquela crise (os nossos produtos voltaram a ter procura nos mercados
internacionais) e pelo aparecimento de minas de ouro no Brasil (1693-95), pararam o desenvolvimento manufatureiro e incrementaram o desenvolvimento da
viticultura.

O Tratado de Methuen
Assinado entre Portugal e a Inglaterra (em 1703), garantia privilégios fiscais aos têxteis ingleses que entrassem no mercado português (pagando apenas 2/3 de direitos
alfandegários) em troca de igual privilégio para os vinhos portugueses que entrassem no mercado inglês.
Mas, tal Tratado, mostrar-se-ia mais favorável aos interesses ingleses do que aos interesses portugueses (nós poderíamos, sem grandes dificuldades, produzir aqui os
têxteis que importávamos, mas eles, mesmo que quisessem, não podiam produzir na Inglaterra vinhos iguais aos nossos, porque o clima é bem diferente do nosso).

A Política económica e social pombalina


Em meados do século XVIII, quando as remessas de ouro brasileiro começaram a diminuir, Portugal viu-se numa nova crise.
A situação de crise económica e da nossa dependência face à Inglaterra coincidiram com o governo de Marquês de Pombal que pôs em prática um conjunto de medidas
para reforçar a economia nacional.
Os grandes objectivos da política pombalina foram a redução do défice e a nacionalização do sistema comercial português. Para diminuir a importação de bens de
consumo, relançar as indústrias e oferecer ao comércio português estruturas que lhe garantissem a segurança e a rentabilidade foram tomadas medidas de tipo
mercantilista:
O rei criou a Junta do Comércio, a quem competia:
 Regular a actividade económica do reino;
 Reprimir o contrabando;
 Intervir na importância de produtos manufacturados;
 Vigiar as alfândegas;
 Coordenar a partida das frotas para o Brasil;
 Licenciar a abertura de lojas e a actividade dos homens de negócios.
Criaram-se companhias monopolistas, que procuravam serem superiores, economicamente, aos ingleses.
Pombal volta a dar importância ao sector manufactureiro procedendo à revitalização das indústrias existentes e à criação de novas.
Pombal criou manufacturas dos mais diversos ramos; reorganizou e protegeu o comércio nacional, procurando subtraí-lo à influência inglesa; valorizou a agricultura,
com a criação da Companhia das Vinhas do Alto Douro.
Todas as manufacturas pombalinas receberam privilégios (instalações, subsídios, exclusivos) e foram providas das técnicas mais adequadas.
O Marquês procurou ainda valorizar a classe mercantil, tornando-a mais capaz e conferindo-lhe maior estatuto, para isso criou a Aula do Comércio que fornecia uma
preparação adequada aos futuros comerciantes, privilegiando no currículo matérias de carácter prático.
A alta burguesia, accionista das companhias monopolistas, recebeu o estatuto nobre, que, à data, abria as portas de acesso a numerosos cargos e dignidades. Deve-se
ainda a Pombal o fim da distinção entre cristãos-novos e cristãos-velhos bem como a subordinação do Tribunal do Santo Ofício à Coroa.
O Marquês de Pombal não dá tanto valor ao nascimento, mas sim ao mérito próprio.

Os resultados da política pombalina fizeram-se sentir de imediato. As áreas económicas sob controlo das companhias prosperaram, desenvolveram-se outros produtos
coloniais como o algodão, o café e o cacau, em muitos ramos da indústria as produções internas substituíram as importações e aumentaram também as exportações
para o Brasil, de produtos manufacturados da metrópole.
A balança comercial obteve saldo positivo.
Guerras e revoluções afectaram o comércio francês e inglês, contribuindo para devolver a Lisboa um pouco da sua antiga grandeza como entreposto atlântico.
Graças às medidas económicas tomadas pelo marquês de Pombal, no fim do século XVIII Portugal viveu a sua melhor época de sempre
Unidade 4 Construção da modernidade europeia
4.2. A filosofia das Luzes e a crítica aos valores tradicionais

No início do séc. XVIII, os intelectuais achavam que tinham descoberto o caminho para um futuro melhor para a humanidade. A Filosofia das Luzes representa,
efetivamente, a evolução do pensamento renascentista, promovendo o espírito crítico baseado na razão, e acreditando no conhecimento, na técnica e no progresso,
como meios primordiais para atingir a felicidade humana.
A religião, a política e a Sociedade do século XVIII foram objeto de críticas contundentes, que estão na base da condenação dos valores tradicionais e na defesa dos
direitos naturais (igualdade natural), valorizando a crença na natureza, o individualismo, a liberdade, a crença no trabalho, ilustração e progresso. Estes novos valores,
explicitados na “Enciclopédia”, estão na origem das Revoluções Liberais que ocorreram nos finais do séc. XVIII e princípios do séc. XIX.
A valorização do indivíduo
Defendendo os princípios do humanismo, racionalismo, empirismo, crença na natureza, razão e progresso, os iluministas defendiam também a educação como forma
de divulgar o saber e, sobretudo, de valorizar o indivíduo, desenvolvendo nele as capacidades naturais e racionais, e colaborar, assim, para formar cidadãos cultos,
capazes de construir um futuro de progresso. Empenharam-se em demonstrar, perante os governos, a importância da educação para o pleno desenvolvimento das
faculdades naturais dos indivíduos; defenderam a educação escolar para todos (rapazes e raparigas); explicaram a utilidade e riqueza para as nações que resultaria do
facto de terem todos os seus cidadãos instruídos, preconizarem uma reforma de ensino, recorrendo a novos métodos pedagógicos e à introdução de novos currículos
escolares, adequados à necessidade da época. Os novos modelos pedagógicos punham de parte os castigos físicos e incentivavam uma aprendizagem baseada no gosto
de aprender em liberdade e com responsabilidade.
A defesa do direito natural / O contrato social / Separação dos poderes
Valorizando a razão e a filosofia natural os iluministas, com base no direito natural, defendem uma sociedade nova assente no reconhecimento dos direitos naturais do
homem: igualdade e liberdade, negando o absolutismo e a teoria da origem divina do poder real, contrapondo os princípios da soberania nacional (que pertence ao
povo) e do contrato social (acordo, tácito ou explícito, entre o povo e os seus governantes).
Os iluministas, relativamente ao poder político, defenderam a sua tripartição: poder legislativo (o que faz as leis, normalmente, pertencente a assembleias eletivas);
poder judicial (o que julga o não cumprimento da lei, pertencente aos tribunais); e poder executivo (o que aplica as leis e vigia o seu cumprimento).
Em termos sociais, achavam que todos deviam ser iguais perante a lei, mas aceitam as desigualdades resultantes dos talentos e capacidades individuais.

Humanitarismo e tolerância / A difusão do pensamento das Luzes


Os Filósofos das Luzes preocuparam-se, no que respeita ao direito, com os atropelos à dignidade humana, que eram cometidos nas instituições judiciais, onde era
prática corrente o recurso à tortura na fase de interrogatório dos arguidos, a penas dolorosas, extremamente violentas, e a trabalhos forçados.
Em 1764, Cesare Beccaria, censurando veementemente estas práticas, põe mesmo em causa a pena de morte. Estas críticas estão na base de um maior humanitarismo
nas práticas da Justiça que levarão, nos séculos seguintes à abolição da escravatura e da pena de morte, de que Portugal foi pioneiro.
A tolerância religiosa foi também defendida e estimulada pelos filósofos das Luzes, o que levará, nos séculos seguintes, à separação entre a Igreja e o Estado.
A crítica a tudo o que estava mal fez com que o iluminismo conquistasse muitas pessoas, algumas delas com grandes responsabilidades políticas como as figuras régias
de Frederico II, da Prússia e Catarina II, da Rússia. Para além da Enciclopédia francesa que as divulgou entre os intelectuais, as propostas iluministas tornaram-se tema
de debate nos salões aristocráticos, nos cafés mais populares, nos clubes privados, nas Academias, nas lojas maçónicas e na imprensa periódica.
Portugal – o projecto pombalino de inspiração iluminista

A reforma das instituições e o reforço da autoridade do Estado


Em Portugal vigorava o despotismo esclarecido onde um rei culto, justo e empenhado era iluminado pela Razão, e utilizava para o bem do povo, para a evolução, para o
progresso.
A diminuição das remessas de ouro do Brasil e a doença prolongada do rei (D. João V) desorganizaram a máquina governativa. O descalabro financeiro, a inoperância
das instituições e a corrupção dos seus oficiais abatem-se sobre o reino e as suas colónias, pondo em causa o modelo de governo centralizado e o próprio absolutismo
régio.
Sentiu-se a necessidade de racionalizar o aparelho de Estado e havia que pôr ordem nas finanças do reino. Para isso Pombal:
 Reestruturou a política fiscal e financeira das colónias;
 Melhorou o sistema de cobrança de impostos do reino;
 Reprimir o contrabando que punha em causa os monopólios concedidos às companhias de comércio.
 Criou o Erário Régio, permitiu a gestão das contas públicas.
 Reformou o sistema judicial. Uniformiza o país para efeitos judiciais e derroga os antigos privilégios de foro da nobreza e do clero. Estes privilégios, bem como as
excepções criadas pelo direito local, constituíam um pesado entrave à boa justiça do rei.
 Criou a Intendência-Geral da Polícia que representa a operacionalização do sistema através de um organismo centralizado e eficiente.
 Criou o Desembargo do paço que era um tribunal que controlava a aplicação da justiça.

O atentado contra D. José (1758) deu a Pombal o pretexto para uma repressão dirigida contra as principais famílias nobres, com destaque para os Távoras, condenadas
à pena máxima. A violência e o aparato com que foram executadas as sentenças, encheu de horror o país e a Europa.

Com o objectivo de reduzir a influência do clero, Pombal procurou controlar o Tribunal de Santo Ofício que, progressivamente, subordinou à Coroa. Instituiu, também,
um organismo de censura estatal - a Real Mesa Censória -, que chamou a si as funções de avaliação das obras publicadas, até aí competência dos inquisidores.
Alvo particular da animosidade do ministro foi a Companhia de Jesus, que detinha um papel de relevo na missionação dos índios brasileiros e nas instituições de ensino.

O terramoto de Lisboa e o reordenamento urbano


O sismo ocorrido em Lisboa no dia 1 de Novembro de 1755, permitiu a Pombal mostrar a sua valia e eficiência. Logo no próprio dia do sismo, tomou as primeiras
providências que levou a efeito para ‘’sepultar os mortos e cuidar dos vivos’’.
Foi o responsável pela tarefa de reerguer a cidade, o projecto foi feito pelos engenheiros Manuel da Maia e Eugénio dos Santos, a reconstrução tinha um traçado
completamente novo. As ruas eram largas e rectilíneas. Os prédios, de 4 andares tinham as fachadas iguais e não eram permitidos projectos próprios que identificassem
a “classe social” dos moradores.
Foram adoptadas soluções originais para a distribuição de água (às habitações) e para a drenagem dos esgotos, e concebeu-se um engenhoso sistema de construção
anti-sísmica (gaiola pombalina).

A reforma do ensino
Considerando a ignorância o maior entrave ao progresso dos povos, a filosofia iluminista colocou o ensino no centro das preocupações dos governantes. Foram
tomadas medidas no sentido de alargar a rede de instrução pública e de renovar, à luz das novas pedagogias, as antigas instituições. Este espírito chegou a Portugal por
via dos estrangeirados.
Pombal criou um colégio destinado aos jovens nobres, com o objectivo de os preparar para o desempenho dos altos cargos do Estado. O Real Colégio dos Nobres foi
organizado de acordo com as mais modernas concepções pedagógicas, integrando as línguas vivas, as ciências experimentais, a música e a dança, estas últimas
imprescindíveis à frequência dos círculos sociais aristocráticos a que os alunos pertenciam. O projecto do Real Colégio não prosperou, talvez pela renitência dos nobres
em colocarem os seus filhos numa instituição tão conotada com um ministro que detestavam.

A expulsão dos Jesuítas obrigou ao encerramento de todos os seus colégios. Foram criados postos para ‘’mestres de ler e escrever’’. Para os alunos que pretendessem
prosseguir estudos, instituíram-se mais de duas centenas de aulas de retórica, filosofia, gramática grega e literatura latina, cujo conhecimento era imprescindível a
quem quisesse ingressar na universidade.
Criou-se a Junta da Previdência Literária que fica incumbida de estudar a reforma da Universidade.
A Universidade recebe os seus novos estatutos, estes configuram uma reforma radical, quer no que respeita ao planeamento dos cursos, quer no que toca às matérias
e aos métodos de ensino, que passam a ser orientados por critérios racionalistas e experimentais.
Uma vez que a reforma no ensino ia dar muitas despesas, foi criado um novo imposto, o Subsídio Literário, sobre a carne, o vinho e a aguardente, pagável no reino e
nas colónias.
A subida ao trono de D. Maria I significou a desgraça do ministro que, desapossado dos múltiplos cargos que exercia, se viu desterrado e perseguido.

MÓDULO 5 O LIBERALISMO – IDEOLOGIA E REVOLUÇÃO, MODELOS E PRÁTICAS NOS SÉCULOS XVIII E XIX
Unidade 4 “A implantação do Liberalismo em Portugal”

4.1. Antecedentes e conjuntura (1807-1820)

A rainha D. Maria I foi declarada como louca e por isso estava incapaz de exercer o seu cargo, portanto, em 1792 o seu filho D. João (futuro D. João VI) subiu ao poder
como príncipe regente. Nesta altura o país estava ainda muito ligado ao antigo regime.
Todavia, apesar do absolutismo, havia uma burguesia comercial urbana e um conjunto de intelectuais que desejavam a mudança. Muitos iam a cafés, botequins e lojas
maçónicas onde eram propagados os ideais de Liberdade, Igualdade e Fraternidade vindos de França.
As invasões francesas (1807-1811) podem ser consideradas como uma causa indirecta da Revolução Liberal portuguesa de 1820, na medida em que criaram uma
conjuntura propícia à mudança, a vários níveis:
1. Conjuntura política:
a) A família real, juntamente com todos os que representavam a monarquia e os súbditos que quisessem acompanhar a viagem em navios privados (cerca de 15 000
pessoas, no total), embarcou para o Brasil (1807).A ideia não era nova, pois já em épocas anteriores (por exemplo, aquando da invasão espanhola, em 1580) se havia
pensado nessa possibilidade
Porém, a mudança da Corte para o Brasil, apesar de justificada, então, pela necessidade de preservar a independência de Portugal e de evitar a dissolução da dinastia
de Bragança, foi entendida, pelos súbditos comuns, como uma verdadeira fuga, contribuindo, assim, para o descrédito da monarquia absoluta.

b) Na ausência de D. João Vl (que apenas regressaria em 1821), Portugal ficou sob o domínio do marechal inglês William Beresford, tornado presidente da Junta
Governativa. Beresford organizou a defesa contra os Franceses, controlou a economia e exerceu a repressão contra o Liberalismo nascente. Conquistou o ódio dos
militares, que perdiam os postos de comando para os ingleses, e da generalidade dos Portugueses que o viam como prepotente (tendo-se salientado o episódio da
execução do general Gomes Freire de Andrade por envolvimento na conspiração liberal de 1817).
A Revolução de 1820 viria a ser desencadeada aproveitando a ausência de Beresford, que se havia deslocado ao Brasil no intuito de solicitar ao rei poderes acrescidos.
c) A permanência dos Franceses no território português (apesar de serem os invasores malquistos), bem como o exemplo da revolução liberal espanhola de 1820,
contribuíram para disseminar as ideias liberais entre os Portugueses.

2. Conjuntura económica:
a) As invasões francesas, para além de responsáveis pela destruição material à passagem dos soldados, provocaram a desorganização em todos os sectores económicos
e o défice financeiro.

b) A situação do Brasil como sede do reino (em consequência das invasões francesas) valeu-lhe a atenção do regente que, durante a sua estadia, tomou medidas
favoráveis à economia brasileira, porém, muito contestadas pela burguesia da metrópole, destacando-se:
- em 1808, a abertura dos portos do Brasil, obrigando a burguesia portuguesa a competir com os estrangeiros pelo mercado brasileiro;
- em 1810, o tratado de comércio com a Inglaterra, que favorecia a entrada de manufacturas inglesas no Brasil.

3. Conjuntura social:
a) A burguesia, sendo o grupo mais afectado pela crise no comércio e na indústria decorrente das invasões francesas, era também o mais descontente, logo, mais
inclinado à preparação da revolta. A tomada de consciência política traduziu-se na constituição do Sinédrio (associação secreta fundada por Manuel Fernandes Tomás,
ligada à Maçonaria) que planificou a rebelião.
4.2 A Revolução de 1820 e as dificuldades de implantação da ordem liberal (1820-1834)

A 24 de Agosto de 1820, no Porto, saiu vitoriosa a Revolução Liberal portuguesa.


Os objectivos da revolução, presentes no "Manifesto aos Portugueses", de Manuel Fernandes Tomás, eram, essencialmente, três: a convocação de Cortes, a
elaboração de uma Constituição e uma governação justa, que recuperasse o país da crise em que se encontrava.

Formou-se, então, a Junta Provisional do Supremo Governo do Reino, que governou o país durante quatro meses e organizou eleições para as Cortes Constituintes
(Cortes Gerais Extraordinárias e Constituintes da Nação Portuguesa).

Da reunião das Cortes (1821-1822) resultou a Constituição de 1822, elaborada de acordo com a vontade da ala mais radical dos deputados. O Vintismo é, assim,
identificado com um liberalismo de tipo radicalista, que vigorou em Portugal através da Constituição, entre 1822 e 1826, muito embora ameaçado por golpes
absolutistas desde 1823.
A acção do Vintismo caracterizou-se, no essencial, pelas seguintes medidas:
 Elaboração da Constituição de 1822 e instituição do parlamentarismo;
 Instituição da liberdade de expressão: a Inquisição acabou, a censura foi abolida (com efeitos importantes sobre a imprensa e o ensino);
 Eliminação de privilégios do clero e da nobreza: foram abolidos o pagamento da dízima à Igreja e os privilégios de julgamento; a reforma dos forais (1821) libertou
os camponeses da prestação de um grande número de direitos senhoriais; a "Lei dos Forais" (1822) reduziu (mas não eliminou) as rendas e pensões que os
camponeses tinham de pagar aos senhores das terras.

O Vintismo fracassou por vários motivos:

1. Pela oposição constante das ordens privilegiadas, que não queriam perder os seus direitos.

2. Pelo descontentamento das classes populares, as quais pretendiam uma reforma socioeconómica mais profunda, que anulasse as estruturas de Antigo Regime; ao
invés, a actuação vintista defendeu os interesses da burguesia rural em detrimento do pequeno campesinato, pois os deputados das Cortes eram, também,
proprietários de terras. A Lei dos Forais, nomeadamente, não surtiu o efeito desejado porque não se aplicava a todas as terras e porque convertia as rendas
(habitualmente pagas em géneros) em prestações pagas em dinheiro, sem um critério de conversão uniforme.

3. Pela actuação antibrasileira das Cortes; apesar de o Brasil ter o estatuto de reino desde 1815, toda a actuação das Cortes se orientou no sentido de lhe retirar
autonomia e de refrear o progresso económico:
 o regresso de D. João Vl a Portugal em 1821, onde veio a assinar a Constituição de 1822, interrompeu a obra de desenvolvimento que este monarca havia iniciado no
Brasil (por exemplo, permitindo a criação de indústrias, ordenando a criação de um banco, de uma biblioteca, de um teatro, de uma imprensa local). Ficou no Brasil,
como regente, o seu filho Pedro.
 as Cortes, compostas por deputados que dependiam do comércio colonial, aprovaram várias leis que tornavam o Brasil directamente dependente de Lisboa (por
exemplo, os poderes judicial e militar eram submetidos directamente a Lisboa) e que retiravam a liberdade de comércio à colónia (nomeadamente, só os navios
portugueses podiam fazer o comércio de porto em porto em todas as possessões do império).
 o príncipe regente D. Pedro foi chamado a Portugal com o argumento (pouco convincente) de ser educado na Europa.

Esta tentativa, por parte das Cortes, de retirar direitos que os colonos sentiam como adquiridos resultou, em 1822, na independência do Brasil proclamada pelo próprio
D. Pedro, coroado imperador do Brasil (foi D. Pedro I do Brasil, entre 1822 e 1831, e D. Pedro lV de Portugal, durante uma semana apenas, em 1826, antes de abdicar do
trono português em favor da sua filha).
A perda da colónia americana foi um dos factores de fracasso do Vintismo, pois retirou importantes fontes de rendimento a Portugal, o que provocou o
descontentamento social. A independência do Brasil só viria a ser reconhecida pela metrópole portuguesa em 1825.

A Constituição de 1822
A Constituição de 1822 é um diploma arrojado para o seu tempo. Eis as suas principais deliberações:
1. Os direitos dos cidadãos foram assegurados (arº I "A Constituição política da Nação Portuguesa tem por objectivo manter a liberdade, segurança e propriedade de
todos os Portugueses."). Porém, a ausência de representação das classes populares nas Cortes (os deputados eram, maioritariamente, magistrados, proprietários e
comerciantes) repercutiu-se na afirmação do sufrágio não-universal (Título III, Capítulo l, item 33 - "Na eleição dos deputados têm voto os portugueses que estiverem
no exercício dos direitos de cidadão *...+. Da presente disposição se exceptuam *…+")

2. O poder real foi limitado: o rei, a quem cabia o poder executivo, tinha direito de veto suspensivo sobre as Cortes, isto é, podia remeter uma lei já aprovada às Cortes
Legislativas, mas teria de acatar o resultado dessa segunda votação. Assim, o absolutismo foi abolido, pois a soberania residia nas Cortes e não no rei (Título II, item 26 -
"A soberania reside essencialmente em a Nação").

3. A sociedade de ordens foi abolida, pois não se reconheciam quaisquer privilégios à nobreza e ao clero (Título I - item 9 - "A lei e igual para todos"). Esta determinação
motivou, aliás, a oposição cerrada das ordens privilegiadas ao radicalismo vintista.

4. A responsabilidade de elaboração das leis foi entregue a uma Câmara única (Cortes Legislativas), o que retirava às ordens superiores a possibilidade de terem um
órgão de representação próprio (Título III, Capítulo V item 105 - "A iniciativa directa das leis somente compete aos representantes da Nação juntos em Cortes.").

5. A religião católica era aceite como religião oficial dos Portugueses.

A Carta Constitucional de 1826, ao contrário da Constituição de 1822, é um documento de tipo moderado. A Carta foi outorgada por D. Pedro, após a morte do pai, D.
João VI, em 1826 ("Faço saber a todos os meus súbditos portugueses que sou servido decretar, dar e mandar jurar imediatamente pelas três Ordens do Estado a Carta
Constitucional *…+ " Procurava conciliar o Antigo Regime e o liberalismo, através das seguintes medidas:
1. O poder real foi ampliado: graças ao poder moderador de que passava a usufruir (Título V Art.º 71 - "O poder moderador é a chave de toda a organização política e
compete privativamente ao rei [...] "), o monarca podia nomear os Pares, convocar as Cortes e dissolver a Câmara dos Deputados, nomear e demitir o governo, vetar a
título definitivo as resoluções das Cortes (Título III, Art.º 59- "O rei dará, ou negará, a sanção em cada decreto *…+”) e suspender os magistrados.

2. Os privilégios da nobreza foram recuperados (Título VIII, Art.º 45, item 31 - "Garante a nobreza hereditária e suas regalias.")

3. As Cortes Legislativas passaram a ser compostas por duas Câmaras: a Câmara dos Deputados, eleita por sufrágio indirecto e censitário, e a Câmara dos Pares,
reservada a elementos das ordens superiores nomeados a título vitalício e hereditário (Título III Art.º 14 - "as Cortes compõem-se de duas Câmaras [...] "

4. A liberdade religiosa não era admitida.

5. Os direitos do indivíduo só aparecem no fim do documento (Título VIII, Art.º 45 "*…+ a liberdade, a segurança individual e a propriedade [...]" e o sufrágio era
censitário e indirecto.

A Carta Constitucional teve três períodos diferentes de vigência: 1.º entre 1826 e 1828, o 2.º entre 1834 e 1836 e o 3.º entre 1842 e 1910 (embora sujeita a alterações
desde 1851).
A guerra civil de 1832 e a resistência ao Liberalismo
O Liberalismo português sofreu várias ameaças:
 As primeiras reacções absolutistas lideradas pelo infante D. Miguel foram apoiadas pela sua mãe, a rainha D. Carlota Joaquina, pela nobreza e pelo clero.
Beneficiando de uma conjuntura externa favorável ao retorno das monarquias absolutas, D. Miguel pôs em prática dois movimentos militares: a Vilafrancada, em
1823 e a Abrilada, em 1824. Apesar de fracassados (D. Miguel é exilado em Viena de Áustria) puseram termo ao projecto progressista do Vintismo. D. João VI
remodelou o governo, que passou a integrar liberais moderados, e muitos dos liberais (ou "malhados", como lhes chamavam os partidários de D. Miguel) fugiram do
país;
 Em 1828, Portugal tornou-se, de novo, um país absolutista. Perante o problema da sucessão ao trono após a morte de D. João VI, D. Pedro, então imperador do
Brasil, confirmou a regência de Portugal pela sua irmã, a infanta D. Isabel Maria e abdicou dos seus direitos à Coroa em favor da filha D. Maria da Glória (rainha D.
Maria II). Porem, como a sua filha tinha apenas sete anos, ficaria como regente D. Miguel, o qual casaria com a sobrinha e juraria a Carta Constitucional. O
casamento não se chegaria a realizar pois D. Miguel, após ter regressado do exílio, convocou Cortes onde se fez aclamar rei absoluto. Assim, entre 1828 e 1834,
Portugal viveu sob o regime absolutista, o que conduziu à fuga de um grande número de liberais;
 Entre 1832 e 1834 desenrolou-se a guerra civil entre os liberais (chefiados por D. Pedro desde 1831) e os absolutistas (liderados por D. Miguel). A implantação
definitiva do Liberalismo revelou-se muito difícil, pois D. Pedro apenas dispunha de um pequeno exército (de cerca de 7500 homens). Foi a partir da ilha Terceira dos
Açores (que já se havia insurgido militarmente contra o absolutismo em 1828 e em 1829) que D. Pedro organizou a resistência. Em 1832 desembarcou em Pampelido
(Mindelo), dirigindo-se para a cidade do Porto, onde foi cercado, durante dois anos, pelas forças absolutistas (Cerco do Porto). A vitória liberal só aconteceu em
1834, e foi selada pela Convenção de Évora-Monte. D. Pedro morreu, pouco tempo depois, de tuberculose, enquanto o seu irmão D. Miguel foi exilado para o resto
da sua vida. D. Maria II rainha desde os sete anos de idade, só então, com quinze anos, pôde sentar-se no trono português.
4.3. O novo ordenamento político e socioeconómico (1832/34-1851)

José Xavier Mouzinho da Silveira, ministro da Fazenda (finanças) e da Justiça durante a regência de D. Pedro (1832-1833), promulgou decretos fundamentais para a
consolidação do Liberalismo, atacando as estruturas de Antigo Regime:
 Na agricultura, aboliu os dízimos, os morgadios e os forais, libertando os camponeses das dependências tradicionais;
 No comércio, extinguiu as portagens internas e reduziu os impostos sobre a exportação, de maneira a retirar os entraves à actividade comercial;
 Na indústria, acabou com os monopólios, nomeadamente o da Companhia das Vinhas do Alto Douro;
 Na administração, dividiu o país em províncias, comarcas e concelhos; também instituiu o Registo Civil para todos os recém-nascidos, retirando a questão do
nascimento da alçada da Igreja;
 Na justiça, organizou o país segundo uma hierarquia de circunscrições (divisões territoriais), submetendo todos os cidadãos à mesma lei;
 Nas Finanças, criou um sistema de tributação nacional, eliminando a tributação local que revertia, em grande parte, a favor do clero e da nobreza; substituiu o Erário
Régio (criado pelo Marquês de Pombal) pelo Tribunal do Tesouro Público para controlar a arrecadação de impostos;
 Na cultura, mandou abrir aulas e instituiu a Biblioteca Pública do Porto.

Ferreira Borges desempenhou, igualmente, um papel importante na liquidação do Antigo Regime em Portugal, ao elaborar o Código Comercial de 1833, onde se
aplicava o princípio fundamental do liberalismo económico: o livre-câmbio, ou seja, a livre circulação de produtos (por oposição ao proteccionismo), através da abolição
de monopólios e de privilégios, bem como da eliminação do pagamento de portagens e de sisas.

Joaquim António de Aguiar, ministro da Justiça, mereceu o epíteto de "mata-frades" pela sua intervenção legislativa (1834-1835) contra os privilégios do clero, em
particular do clero regular, identificado com o projecto miguelista:
 Aboliu o clero regular, através do Decreto de Extinção das Ordens Religiosas que acabava com "todos os conventos, mosteiros, colégios, hospícios e quaisquer casas
de religiosos de todas as Ordens Regulares" masculinas; as ordens religiosas femininas eram, indirectamente, aniquiladas por meio da extinção dos noviciados
(preparação para o ingresso numa ordem religiosa).
 Os bens das ordens religiosas foram confiscados e nacionalizados;
Em 1834-1835, esses bens, juntamente com bens da Coroa, das Rainhas e do Infantado, foram vendidos em hasta pública - beneficiando a alta burguesia - e o produto
da venda foi utilizado, pelo ministro da Fazenda (Silva Carvalho), para pagar dívidas do Estado.

O Setembrismo
O reinado de D. Maria II (1826-1853) correspondeu a um período conturbado da história política portuguesa de Oitocentos. Começou a reinar, efectivamente, em 1834,
sob a vigência da Carta Constitucional redigida pelo seu pai, D. Pedro (1834-1836: etapa designada por Cartismo). Porém, em Setembro de 1836, uma revolução de
carácter civil obrigou a rainha a revogar a Carta e a jurar a Constituição de 1822.
O Setembrismo (1836-1842) foi um projecto político da pequena e média burguesia, com o apoio das camadas populares (contra o predomínio da alta burguesia, que
havia sido favorecida pelo Cartismo). Os mentores do Setembrismo, que integravam o novo governo, eram Sá da Bandeira e Passos Manuel.
A política setembrista, apoiada na nova Constituição de 1838, caracterizou-se, essencialmente, pelas seguintes medidas:
 O rei (neste caso, a rainha) perdeu o poder moderador (embora mantivesse o direito de veto definitivo sobre as leis saídas das Cortes);
 A soberania da Nação foi reforçada;
 Adoptou-se o proteccionismo económico, sobrecarregando com impostos as importações, de modo a tornar mais competitivos os produtos industriais nacionais
(sem grande sucesso);
 Investiram-se capitais em África, como alternativa à perda do mercado brasileiro;
 Reformou-se o ensino primário, secundário e superior, com destaque para a criação dos liceus, por Passos Manuel, onde os filhos da burguesia se preparavam para o
ensino superior que lhes permitiria exercer cargos de relevo;
 As taxas fiscais aplicadas aos pequenos agricultores não foram abolidas, o que contribuiu para o fracasso económico do Setembrismo.

O Cabralismo
Entre 1842 e 1851, vigorou a ditadura de António Bernardo da Costa Cabral. O país enveredou, novamente, pela via mais conservadora: enquanto o Setembrismo se
inspirava na Constituição de 1822, o Cabralismo repôs em vigor a Carta Constitucional de 1826, identificando-se, assim, com o período do Cartismo (1834-1836). E, tal
como aconteceu com o Cartismo, as medidas tomadas durante o período do Cabralismo favoreceram, em primeiro lugar, a alta burguesia.
Destacam-se, nomeadamente:
 O fomento industrial (fundação da Companhia Nacional dos Tabacos, difusão da energia a vapor);
 O desenvolvimento de obras públicas (criação da Companhia das Obras Públicas de Portugal para a construção e reparação de estradas; construção da ponte pênsil
sobre o rio Douro);
 A reforma fiscal e administrativa (publicação do Código Administrativo de 1842, criação do Tribunal de Contas para fiscalização das receitas e despesas do Estado).
No entanto, as Leis da Saúde Pública, em especial a proibição do enterramento dentro das igrejas, a par do descontentamento com o acréscimo de burocracia e com o
autoritarismo de Costa Cabral, despoletaram duas movimentações de cariz popular
A revolta da "Maria da Fonte" e a "Patuleia" que se transformaram em guerra civil (1846/47) e acabaram por conduzir à queda de Costa Cabral, em 1847.
Este regressaria ao poder em 1849, sendo afastado definitivamente em 1851, pelo golpe do marechal-duque de Saldanha.
Depois de uma primeira metade de século extremamente agitada, nos últimos 50 anos de Oitocentos, Portugal iria gozar a paz e o progresso material do período da
Regeneração.

MÓDULO 5 O LIBERALISMO – IDEOLOGIA E REVOLUÇÃO, MODELOS E PRÁTICAS NOS SÉCULOS XVIII E XIX
Unidade 5 “O legado do Liberalismo na primeira metade do século XIX”

5.1. O Estado como garante da ordem liberal

O Liberalismo é uma forma de organização social, política e económica que vigorou na Europa Ocidental nos séculos XVIII e XIX.
A nível político, o Liberalismo defende a representatividade popular, contra o regime absolutista;
A nível económico, é a favor da liberdade de iniciativa privada, contra o intervencionismo do Estado;
A nível social, coloca a burguesia no topo da escala social, contra os privilégios da nobreza e do clero.
A implantação do Liberalismo correspondeu à queda do Antigo Regime e influenciou, de forma marcante, grande parte dos regimes actuais.

O Liberalismo e os direitos individuais


O Liberalismo defende os direitos individuais porque considera que esses direitos são naturais, isto é, derivam da própria condição do ser humano e, como tal, nascem
com o indivíduo. São eles:
1. O direito à liberdade (que dá o nome ao Liberalismo): é o direito mais abrangente, pois engloba todos os outros direitos - podemos referir, nomeadamente, a
liberdade de seguir apenas a ler, rejeitando qualquer autoridade arbitrária, a liberdade de expressão, a liberdade de exercer uma profissão, de possuir bens, de reunião,
a liberdade religiosa, a liberdade de participar na vida política.
2. O direito à igualdade: todos os cidadãos passavam a ser considerados iguais perante a lei; porém, nas formas de liberalismo moderado eram aceites e, até
fomentadas as distinções sociais, nomeadamente com base na riqueza. A questão dos direitos a liberdade e à igualdade levantou, em vários países, a polémica sobre a
permanência da escravatura, considerada contraditória com os direitos naturais; nos EUA, nomeadamente, a escravatura esteve na base da guerra civil entre o Norte
liberal e o Sul esclavagista, entre 1861 e 1865.
3. O direito à segurança e à propriedade: a importância concedida à posse de bens explica-se pela preponderância da burguesia (grupo social que baseou a sua
ascensão social nos lucros do comércio e na aquisição de propriedades). Defendia-se, abertamente, que as assembleias representativas deveriam ser compostas por
proprietários, os únicos que seriam capazes de representar os interesses dos seus eleitores (também eles, proprietários) e de manter a ordem e a segurança necessárias
à preservação dos bens.
A defesa do direito à propriedade explica porque é que, na maioria dos países que adoptaram o Liberalismo, só podia escolher os seus representantes quem atingisse
um determinado patamar de rendimentos - sufrágio censitário - apesar de este tipo de sufrágio introduzir um factor evidente de desigualdade entre os cidadãos. Os
mais ricos eram também, na opinião dos liberais, os mais instruídos e, portanto, os mais capazes de votar.
4. O direito a intervir na governação: o súbdito do Antigo Regime é substituído pelo cidadão do Liberalismo, indivíduo que é convidado a participar na vida política de
múltiplas maneiras - como eleitor e detentor de cargos (se tivesse os meios económicos de se tornar cidadão activo), mas também participando nos diversos clubes (por
exemplo, no Clube dos Jacobinos, em França), assistindo às assembleias legislativas, onde intervinha na discussão, escrevendo para jornais ou apresentando petições
(reivindicações escritas). Basta lembrar a importância dos sans-culottes na etapa da Convenção da Revolução Francesa para nos apercebermos de como os cidadãos
ditos "passivos" podiam influenciar de forma determinante o rumo da governação.

Pela sua importância, estes direitos apareceram consignados nos diplomas fundamentais do Liberalismo:
 - A Declaração de Independência dos Estados Unidos da América (1776) apresenta como justificação para romper os laços políticos com a Inglaterra os "Direitos
inalienáveis, entre os quais a Vida, a Liberdade e a procura da Felicidade";
 - A Constituição dos Estados Unidos da América (1787) tem como objectivo assegurar "os benefícios da liberdade';
 - A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (França, 1789) refere, no seu artigo 1.º, que "Os homens nascem e são livres e iguais em direitos" e, no artigo
2.º que os direitos naturais do homem "são a liberdade, a propriedade, a segurança e a resistência à opressão",
 - A Carta Constitucional de 1814 esclarece, no Artigo 1.º, que "Os Franceses são iguais perante a lei [...] ", embora apresente, seguidamente, todas as nuances a esse
direito características de um liberalismo moderado (bicameralismo, sufrágio censitário, autoridade real reforçada, liberdade de expressão e de religião relativizadas);
 - A primeira Constituição Portuguesa (1822) explicita, logo no seu artigo 1.º, que "tem por objectivo manter a liberdade, a segurança e a propriedade de todos os
Portugueses.";
 -A Carta Constitucional portuguesa (1826), partidária de um liberalismo mais moderado, remete a enunciação dos direitos para o fim do diploma constitucional,
referindo, no artigo 45.º que "A inviolabilidade dos direitos civis e políticos dos cidadãos portugueses, que tem por base a liberdade, a segurança individual e a
propriedade, é garantida pela constituição do Reino".

O constitucionalismo; separação dos poderes; soberania da Nação, representada em assembleias


Em todos os países onde o Liberalismo se afirmou, foi necessário criar os mecanismos legais para impedir o retorno ao Absolutismo. Deste modo, os princípios liberais
eram salvaguardados pelas seguintes medidas:
- Elaboração de um documento onde eram explicitados os direitos e os deveres dos cidadãos e o funcionamento do Estado: esse documento podia ser chamado
Constituição, quando era elaborado e votado pelos representantes do povo (deputados) ou Carta Constitucional, quando era outorgado por um monarca, nos regimes
liberais mais conservadores;
- Separação dos poderes legislativo, executivo e judicial, entregues a diferentes representantes para que um déspota não pudesse concentrar em si todos os poderes.
Habitualmente, o poder executivo pertencia ao rei (pois o Liberalismo não significou o fim das monarquias) e aos ministros do Governo, enquanto o poder legislativo
pertencia a assembleias eleitas pelos cidadãos e o poder judicial cabia a juízes eleitos;
- Direito dos cidadãos da Nação a fazerem-se representar em assembleias (soberania nacional). As assembleias, que elaboravam as leis, podiam assumir a forma de uma
Câmara única que representava os cidadãos (nos regimes liberais mais progressistas) ou de um sistema bicameral (no Liberalismo moderado ou conservador) em que
ainda se permitia que os representantes das ordens sociais superiores - clero, nobreza - se reunissem à parte, depois de nomeados pelo rei.
A soberania nacional não deve ser confundida com a soberania popular, característica dos regimes democráticos pois, devido às restrições impostas ao direito de voto
com base na fortuna (sufrágio censitário), a população não era representada na sua globalidade.

A secularização das instituições


Um dos aspectos mais polémicos da implantação do Liberalismo foi a questão religiosa. A defesa dos direitos individuais dos cidadãos previa o direito à liberdade
religiosa; porém, na maior parte dos países que adoptaram o Liberalismo, as estruturas da Igreja católica foram declaradamente atacadas por serem consideradas
coniventes com o regime absolutista deposto.
Em França, por exemplo, subordinou-se o clero ao Estado através da Constituição Civil do Clero, procedeu-se a uma campanha de descristianização e à promulgação da
Lei do Casamento e do Divórcio que substituía o sacramento do matrimónio por um contrato civil, passível de dissolução.
A laicização do Estado (emancipação do Estado da influência religiosa) passou, também, pelas seguintes medidas:
 Instituição do registo civil para os nascimentos, casamentos e óbitos, substituindo os registos paroquiais;
 Criação de escolas e hospitais públicos;
 Expropriação e nacionalização dos bens das ordens religiosas, muitas das vezes extintas. Devido à secularização (sujeição às leis civis) das instituições, o clero viu
perder, num curto espaço de tempo, os privilégios de que havia beneficiado desde a Idade Média; o anticlericalismo chocou uma parte da sociedade civil, a qual
chegou mesmo, por vezes, a identificar-se, de novo, com o Absolutismo - foi o que aconteceu em França, na revolta da Vendeia, ou em Portugal, na adesão popular a
D. Miguel.

O Liberalismo económico
Ao contrário daquilo que defendia o mercantilismo, o liberalismo económico opunha-se à intervenção do Estado na economia.
De acordo com o valor iluminista do individualismo, devia dar-se total liberdade à iniciativa privada, pois a procura individual do lucro resultaria, naturalmente, na
riqueza e progresso de toda a sociedade. Destacaram-se vários pensadores na formulação dos princípios do liberalismo económico:
- Adam Smith defende a inteira liberdade de iniciativa dos indivíduos para produzir e comerciar; o Estado não precisa de se imiscuir na economia pois esta rege-se por
leis próprias, em particular a lei da oferta e da procura e a livre concorrência;
- Quesnay advoga o fisiocratismo, doutrina económica segundo a qual a base da riqueza de cada país está na agricultura, pelo que se deve incentivar todos os cidadãos
a serem agricultores e a comercializarem, em regime de livre concorrência, os seus produtos agrícolas; o fisiocratismo serviu de base ideológica à revolução agrícola
inglesa do século XVIII;
- Gournay exprimiu o ideal de livre concorrência na famosa expressão "laissez faire, laissez passer" ("deixai produzir, deixai comercializar").

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