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MANUAL DE REUMATOLOGIA
para Graduação em Medicina

Ricardo Fuller
Professor Colaborador da USP. Assistente Doutor do Serviço de Reumatologia
do HC FMUSP. Professor Responsável pelo Curso de Reumatologia da
Graduação em Medicina da FMUSP.

2007
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ÍNDICE

1. A articulação
Ricardo Fuller

2. Classificação das Doenças Reumáticas


Ricardo Fuller

3. Propedêutica Reumatológica Básica


Ricardo Fuller

4. Laboratório em Reumatologia
Ricardo Fuller

5. Fator Anti-nuclear
Eloísa Silva Dutra de Oliveira Bonfá
Vilma dos Santos Trindade Viana

6. Artrite Reumatóide
Ieda Maria Magalhães Laurindo

7. Artropatias Soronegativas
Claudia Goldenstein Schainberg
Célio Roberto Gonçalves

8. Lúpus Eritematoso Sistêmico


Eloísa Silva Dutra de Oliveira Bonfá
Eduardo Ferreira Borba Neto

9. Esclerose Sistêmica
Romy Beatriz Christmann de Souza
Claudia Tereza Lobato Borges

10. Polimiosite e Dermatomiosite


Claudia Tereza Lobato Borges
Mauricio Levy Neto

11. Síndrome de Sjögren


Claudia Tereza Lobato Borges
Romy Beatriz Christmann de Souza
Mauricio Levy Neto

12. Doença Mista do Tecido Conjuntivo


Maria Teresa Correia Caleiro

13. Síndrome anti-fosfolípide


Jozélio Freire de Carvalho

14. Vasculites
Ari Stiel Radu Halpern
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15. Osteoartrite
Ricardo Fuller

16. Osteoporose
Rosa Maria Rodrigues Pereira
Jaqueline Barros Lopes

17. Reumatismo de Partes Moles


Lais Verderame Lage
Ricardo Fuller

18. Fibromialgia
Lais Verderame Lage

19. Artrites Infecciosas


Natalino Hajime Yoshinari

20. Febre Reumática


Rosa Maria Rodrigues Pereira

21. Gota
Ricardo Fuller
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COLABORADORES

Ari Stiel Radu Halpern


Doutor em Reumatologia pela FMUSP. Médico assistente do Serviço de Reumatologia do HC
FMUSP. Responsável pelo Ambulatório de Vasculites do HC FMUSP.

Célio Roberto Gonçalves


Mestre e Doutor em Reumatologia pela FMUSP. Médico assistente do Serviço de
Reumatologia do HC FMUSP. Professor Colaborador da USP. Responsável pelo Ambulatório
de Artropatias Soronegativas do HC FMUSP.

Claudia Goldenstein Schainberg


Doutora em Reumatologia pela FMUSP. Assistente do HC FMUSP. Professora Colaboradora
da USP. Responsável pelo Ambulatório de Artropatias Soronegativas e pelo Laboratório de
Imunologia Celular da Disciplina de Reumatologia da FMUSP (LIM 17).

Claudia Tereza Lobato Borges


Doutora em Reumatologia pela FMUSP. Médica assistente do HC FMUSP. Responsável pelos
Ambulatórios de Esclerose Sistêmica, Síndrome de Sjögren e Dermatomiosite/Polimiosite.

Eduardo Ferreira Borba Neto


Doutor em Reumatologia pela FMUSP. Médico Assistente do Serviço de Reumatologia do HC
FMUSP. Professor Colaborador da USP. Responsável pelo Ambulatório de Lúpus Eritematoso
do HC FMUSP

Eloísa Silva Dutra de Oliveira Bonfá


Professora Titular da Disciplina de Reumatologia da FMUSP. Responsável pelo Laboratório de
Investigação Médica da Disciplina de Reumatologia (LIM 17).

Ieda Maria Magalhães Laurindo


Mestra e Doutora em Reumatologia pela FMUSP. Médica Assistente do Serviço de
Reumatologia do HC FMUSP. Professora Colaboradora da USP. Responsável pelo
Ambulatório de Artrite Reumatóide do HC FMUSP.

Jaqueline Barros Lopes


Médica reumatologista, Pós-graduanda da Disciplina de Reumatologia da FMUSP

Jozélio Freire de Carvalho


Doutor em Reumatologia pela FMUSP. Médico Assistente do Serviço de Reumatologia do HC
FMUSP. Professor Colaborador da USP. Responsável pelo Ambulatório de Síndrome
Antifosfolípide do HC FMUSP
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Lais Verderame Lage


Mestre e Doutora em Reumatologia pela FMUSP. Médica Assistente do Serviço de
Reumatologia do HC FMUSP. Responsável pelo Ambulatório de Fibromialgia do HC FMUSP.

Maria Teresa Correia Caleiro


Mestre e Doutora em Reumatologia pela FMUSP. Médica Assistente do Serviço de
Reumatologia do HC FMUSP. Responsável pelo Ambulatório de Doença Mista do Tecido
Conjuntivo do HC FMUSP.

Maurício Levy Neto


Mestre e Doutor em Reumatologia pela FMUSP. Médico Assistente do Serviço de
Reumatologia do HC FMUSP. Responsável pelos Ambulatórios de Vasculite, Síndrome de
Sjögren e Miopatias do HC FMUSP

Natalino Hajime Yoshinari


Professor Associado do Departamento de Clínica Médica da Disciplina de Reumatologia da
FMUSP. Responsável pelo Laboratório de Doença de Lyme Símile da Disciplina de
Reumatologia da FMUSP. Responsável pelo Ambulatório de Artropatias Infecciosas do HC
FMUSP

Romy Beatriz Christmann de Souza


Doutora em Reumatologia pela FMUSP. Médica Assistente do Serviço de Reumatologia do HC
FMUSP. Professora Colaboradora da USP. Médica Assistente dos ambulatórios de Esclerose
Sistêmica e Síndrome de Sjögren.

Rosa Maria Rodrigues Pereira


Professora Associada da FMUSP. Responsável pelo Laboratório de Metabolismo ósseo
da Disciplina de da FMUSP (LIM-17), Coordenadora da Liga de Osteoporose do HC-
FMUSP. Responsável pelo grupo de Doenças Ósteo-Metabólicas. Responsável pelo
Curso de Reumatologia da Graduação em Medicina da FMUSP.

Vilma dos Santos Trindade Viana

Pesquisadora Doutora da Disciplina de Reumatologia da Faculdade de Medicina da


Universidade de São Paulo
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A ARTICULAÇÃO

Ricardo Fuller

A articulação é uma estrutura altamente diferenciada, composta por diferentes


estruturas e tecidos, com funções distintas e complementares. Neste capítulo serão
abordados seus principais constituintes.

CARTILAGEM ARTICULAR

A cartilagem articular hialina, que recobre as extremidades ósseas das


articulações diartrodiais, é um tecido altamente diferenciado, desprovido de
vascularização e inervação, constituído majoritariamente (95%) por numa matriz
extracelular formada por macromoléculas e água, e por uma pequena população
celular de condrócitos (5% do tecido), que conferem à mesma características
especiais de elasticidade e compressibilidade para ser capaz de resistir às poderosas
forças de impacto e fricção a que estão submetidas as articulações móveis.
As propriedades da cartilagem são asseguradas pela composicão e organização
ultraestrutural dos principais componentes da matriz: o colágeno, e os proteoglicanos,
(FIGURA 1 A e B).

Proteoglicanos
Os proteoglicanos compõe 20 a 37% do peso seco da matriz. São agregados de
macromoléculas organizadas numa complexa arquitetura terciária. Suas unidades
básicas são constituídas por cadeias polissacarídicas sulfatadas denominadas
glicosaminoglicanos (GAG). Existem diversos tipos de GAGs, que na cartilagem são
representados pelo sulfato de condroitina e pelo querato sulfato. Trinta a quarenta
cadeias de GAGs ligam-se a uma proteína central, formando complexos denominados
agrecans que por sua vez estão ligados ao ácido hialurônico (FIGURA 1 C).

Colágeno
O colágeno é uma glicoproteína que integra a maior parte de todas as matrizes
extracelulares. Na cartilagem articular o colágeno representa 46,1% a 63,7% do peso
tecidual seco. Vários tipos de colágeno estão presentes na cartilagem articular
humana normal. O principal é o colágeno do tipo II que compõe aproximadamente
85% do colágeno da cartilagem. O restante é constituído por colágenos denominados
menores, do tipo IX e XI que junto com o II formam as fibrilas colágenas da cartilagem.
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A
C

3 2
4

B 5
2
3
1 7
6
4

10 8
D
9

B cartilagem
C estrutura molecular A articulação
da cartilagem 1 Cartilagem 5 Menisco
1 Condrócito
2 Osso 6 Músculo
2 Colágeno
3 Sinóvia 7 Bursa
3 Ácido hialurônico
4 Líquido sinovi al 8 Tendão
4 Proteoglicanos
5 Cápsula articular 9 Ligamentos
D sinóvia
FIGURA 1. Estrutura da articulação
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Classicamente, o papel atribuído a essa proteína fibrilar tem sido apenas o de


elemento estrutural que confere resistência à cartilagem; entretanto, atualmente, sabe-
se que o colágeno, além da função de suporte, participa também na diferenciação,
adesão, migração e proliferação celular, e exerce atividade antigênica em processos
imunológicos (FIGURA 1 C).

Organização molecular da cartilagem


Os proteoglicanos, o colágeno e os condrócitos se interligam através de
glicoproteínas de menor peso molecular como as fibronectinas, condronectinas,
integrinas e outras, constituindo uma rede contínua.
Essa complexa e eficiente arquitetura confere à cartilagem uma alta capacidade
elástica, sem consumo de energia, pré-requisito fundamental para um tecido
avascular.

Metabolismo da cartilagem
A cartilagem articular é controlada pelo condrócito, que apresenta um
metabolismo bastante ativo, mas que passa a ser insuficiente em algumas situações
de maior demanda porque estão presentes em pequeno número na cartilagem. O
condrócito sofre a ação reguladora de dois tipos de mediadores: os pró-catabólicos
(citocinas) e os pró-anabólicos (fatores de crescimento), os quais podem promover
junto ao condrócito a ativação de mecanismos para a degradação tecidual (mediada
por enzimas e seus inibidores) e para a regeneração da cartilagem (via multiplicação
celular e síntese dos elementos da matriz). As citocinas que regulam a atividade
condrocitária são o fator de necrose tumoral alfa e a interleucina 1. Já as enzimas
capazes de degradar a matriz são basicamente as metaloproteases, utilizadas pelo
condrócito para preparar a cartilagem para a posterior substituição por
macromoléculas neoformadas. Esse mecanismo é importante para a adaptação
biomecânica da cartilagem a diferentes demandas.

OSSO
É a estrutura rígida da articulação, mas que apresenta uma certa elasticidade
que junto com a cartilagem ajuda no amortecimento do impacto. É constituído por uma
matriz mineral acoplada a uma estrutura de colágeno, composta basicamente pelo
colágeno do tipo I. O osso não tem uma participação direta nos processos articulares
de natureza reumática, porém é através dele, nos exames de imagem, que se pode
reconhecer lesões ocasionadas principalmente pela inflamação. São as erosões, os
cistos, e a redução de densidade. Nas artropatias, quando a inflamação está ausente,
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ou é muito branda, o osso sofre remodelação, aumentando a densidade subcondral e


formando osteófitos.

SINÓVIA (MEMBRANA SINOVIAL)


É o principal tecido de nutrição e defesa da articulação, revestindo internamente
a cápsula articular e, por conseguinte, a cavidade articular. É composto por uma
mono-camada de sinoviócitos e um tecido conjuntivo frouxo bastante irrigado, com
células mononucleares e macrófagos. Frente a algum fator de agressão, ocorre uma
rápida resposta, que inclui vasodilatação, acúmulo de células inflamatórias,
principalmente polimorfonucleares na fase aguda, e migração desses elementos
celulares para a cavidade articular. Existe uma passagem do edema para o meio intra-
articular, que dilui o líquido sinovial, reduzindo sua viscosidade. Numa fase crônica,
ocorre o acúmulo de mononucleares, por vezes numa tal quantidade, que simulam
folículos linfóides. Existe uma hipertrofia da camada de sinoviócitos. O líquido sinovial
da membrana inflamada carreia também uma série de enzimas capazes de erodir o
osso e causar osteopenia, erosões e cistos. Os processos imuno-inflamatórios
reumáticos da articulação acontecem na sinóvia.
As respostas dos principais tecidos da articulação são organizadas pelos
linfócitos, macrófagos, sinoviócitos, mastócitos, células endoteliais, fibroblastos.
condrócitos e neutrófilos. Através da sua interferência, ocorre produção e liberação de
diversas citocinas que modularão a resposta tecidual. No processo inflamatório
articular por exemplo, a membrana sinovial torna-se inflamada, o osso sofre
reabsorção, existe proliferação do tecido conjuntivo e degradação da cartilagem
articular (FIGURA 2).

LÏQUIDO SINOVIAL
Sua composição líquida é semelhante ao soro, porém com uma concentração
ligeiramente inferior de alguns de seus constituintes como a glicose. O que torna o
líquido sinovial um lubrificante quase perfeito são as moléculas de ácido hialurônico,
um polímero de sacarídeos neutros. O líquido sinovial faz o transporte de oxigênio e
nutrientes para a cartilagem, uma vez que ela é avascular. Possui normalmente até
200 células por mm3 para suprir uma atividade reacional imediata que se faça
necessária. Sua coloração normal é amarelo transparente.

DEMAIS ESTRUTURAS DA ARTICULAÇÃO


A articulação é encapada por uma cápsula fibrosa resistente que sustenta a
membrana sinovial, e torna o ambiente intra-articular isolado. Os meniscos servem de
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estabilizadores para uma melhor adaptação de superfícies côncavas e convexas.


Ligamentos reforçam a congruência articular, e junto com os músculos constituem-
se no principal conjunto estabilizador da articulação. As bursas são estruturas de
acolchoamento da articulação, interpondo-se entre tendões e ossos, e entre esses e a
pele nos locais onde existem proeminências ósseas como o olécrano e o trocânter
femoral. São constituídas por uma cápsula e uma membrana interna que produz
líquido. Os tendões assim como os ligamentos são estruturas quase que
exclusivamente fibrosas, muito ricas em colágeno (basicamente o colágeno I), e uma
quantidade muito pequena de fibrócitos. Possui um turnover muito lento, e por isso as
lesões tendíneas tem recuperação demorada. Alguns tendões possuem em alguns
segmentos, bainhas sinoviais, que nada mais são que estruturas que lembram uma
cápsula articular e membrana sinovial rudimentares. Quando a bainha fica inflamada,
pode enfraquecer-se, dilatar-se localmente, dando origem a um cisto sinovial.

FIGURA 2. Mecanismos celulares de resposta dos tecidos articulares

Linfócito

Macrófago Sinóvia
Inflamação

Sinoviócito

Osteoblasto

Mastócito Citocinas Reabsorção


TNF α
IL 1
Célula IL 6
endotelial IL 8,15, 17,18 Fibroblasto
INF γ Prolifera

Fibroblasto Condrócito

Reabsorção
Condrócito

Neutrófilo
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ARTICULAÇÃO RESUMO

Cartilagem

Tecido composto por uma matriz formada basicamente por proteoglicanos, aminosacárides
com função de mola biológica e colágeno, proteína fibrilar que confere resistência ao tecido. A
produção da matriz e sua adaptação às diferentes demandas biomecânicas é realizada pelo
condrócito, que também produz citocinas, fatores de crescimento e enzimas capazes de
degradar a cartilagem.

Osso

Formado por uma matriz mineral e orgânica. É uma das principais estruturas pela qual se
podem inferir os processos reumáticos da articulação nos métodos de imagem, tais como
osteopenia periarticular, cistos, erosões e neoformação óssea.

Sinóvia

Tecido composto por uma membrana de sinoviócitos delimitando um tecido conjuntivo frouxo,
no qual existe uma rica circulação e células mononucleares. Responde pela nutrição, produção
de líquido sinovial e reação imuno-inflamatória presente nas doenças reumáticas. Nessa
circunstância hipertrofia-se e forma pseudo folículos linfóides.

Líquido sinovial

É um filtrado do soro com propriedades de nutrição e defesa da cartilagem, e principalmente


capacidade lubrificante muito eficiente conferida pelo ácido hialurônico. É normalmente
3
amarelo transparente e tem até 200 células/mm .

ARTICULAÇÃO QUESTÕES

1. A função de mola da cartilagem é conferida por:


a) Colágeno
b) Proteoglicanos
c) Fibronectina
d) condrócitos
e) Conteúdo de água

2. O principal colágeno da cartilagem e osso são respectivamente:


a) IX e II
b) I e II
c) IX e I
d) II e I
e) Colágenos maiores e colágenos menores

3. O líquido sinovial normal apresenta a viscosidade, número de células e molécula


responsável pela viscosidade, respectivamente:
a) baixa, < 200, colágeno
b) baixa, > 200, colágeno
c) alta, > 200, mucoproteína
d) alta, < 200, ácido hialurônico
e) baixa, < 200, ácido hialurônico
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4. Faça a correspondência com a função: estabilidade articular, produção do líquido


sinovial, defesa da articulação
a) Cartilagem, condrócito, bursas
b) Sinóvia, cartilagem, músculo
c) Sinóvia, osso, bursas
d) Ligamentos, sinóvia, cartilagem
e) Ligamentos, sinóvia, sinóvia

5. A capacidade de regeneração da articulação depende dos tecidos que a compõe, e os


mesmos apresentam velocidade anabólica variável. Em relação aos seguintes tecidos -
cartilagem, sinóvia, tendão, essa velocidade é respectivamente:
a) baixa, alta, baixa
b) alta, alta, baixa
c) baixa, alta, alta
d) alta, baixa, baixa
e) baixa, alta, alta

Respostas LABORATÓRIO: 1-b; 2-d; 3-d; 4-e; 5-a


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CLASSIFICAÇÃO DAS DOENÇAS REUMÁTICAS

Ricardo Fuller

Para fins didáticos, a classificação foi feita para facilitar a elaboração do


diagnóstico sindrômico (QUADRO 1). Deste modo foi estabelecido um grande grupo
de doenças reumáticas sob a classificação de artropatias inflamatórias crônicas:
inflamatórias porque quase sempre existe artrite, e crônicas por que persistem por
mais de 6 semanas (a maioria delas evolui com manifestações articulares
ininterruptas). Esse grupo afeta adultos jovens e pode ser subdividido em três: a artrite
reumatóide, as artropatias soronegativas e as doenças difusas do tecido conjuntivo.
A artrite reumatóide se caracteriza por cursar com artrite de grandes e pequenas
articulações periféricas e simetria. Atinge a coluna de maneira relativamente restrita
(cervical). O fator reumatóide é positivo e as manifestações extra-articulares
moderadamente prevalentes (nódulos reumatóides, pneumonite, vasculite e síndrome
seca). Seu principal marco é a artrite acentuada e erosiva.
As artropatias soronegativas caracterizam-se por não apresentarem fator
reumatóide. Cursa com importante flogose nas articulações atingidas, com presença
de erosões ósseas. Diferenciam-se da artrite reumatóide por uma menor tendência à
simetria, e acometimento importante do esqueleto axial em toda a sua extensão. É
freqüente e típico o envolvimento das articulações sacro-ilíacas, bem como ligamentos
e enteses (p. ex. fasciíte plantar e ligamentos longitudinais da coluna). Habitualmente
o paciente evolui com redução significativa da amplitude de movimento da coluna. As
manifestações extra-articulares são freqüentes segundo a doença, atingindo
principalmente a pele (artropatia psoríatica e síndrome de Reiter), mucosas (Reiter),
olhos sob a forma de uveítes e conjuntivite (todas, mas principalmente o Reiter),
sistema urogenital baixo (uretrites, cervicites, cistites) e intestinal (entero-artropatias).
Um marcador interessante é o antígeno de histocompatibilidade HLA B27, presente
em uma freqüência variável de 30 a 80%.
As doenças difusas do tecido conjuntivo (DDTC) Eram denominadas
“colagenoses”. Diferenciam-se das acima por apresentarem apenas artrite periférica,
com sinais flogísticos discretos ou ausentes, e não erosivas ao raio X. O fator
reumatóide quando positivo, apresenta baixos títulos. O grande diferencial desse
grupo são as manifestações extra-articulares, exuberantes e polimórficas juntamente
com a presença de uma ampla gama de auto-anticorpos do tipo fator antinuclear.
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QUADRO 1. Classificação das doenças reumáticas


1. Artropatias inflamatórias crônicas ***
1.1. Artrite reumatóide
1.2. Artropatias soronegativas
x Espondilite anquilosante
x Artrite psoriática
x Síndrome de Reiter
x Enteroartropatias
Inflamatórias - Doença de Crohn
- Retocolite ulcerativa
Reativas – Salmonela, Shiguela, Yersínia
1.3. Doenças difusas do tecido conjuntivo ***
x Lupus Eritematoso Sistêmico
x Dermatomiosite e Polimiosite
x Esclerose Sistêmica
x Doença Mista do Tecido Conjuntivo
x Síndrome de Sjögren
x Conectivopatia Não Diferenciada
x Superposições
2. Síndrome antifosfolípide ***
3. Osteoartrite ***
4. Artropatias microcristalinas
x Gota ***
x Artropatia por Pirofosfato de Cálcio
5. Artropatias infecciosas ***
x Virais
x Bacterianas
x Fúngicas
6. Artropatias reativas (p. ex Febre Reumática) ***
7. Artropatias metabólicas
x Osteoporose ***
x Doença de Paget
8. Artropatias dependentes de outros sistemas
x Sistema hematológico (p. ex. anemia falciforme)
x Sistema endócrino (p. ex. hipo e hipertireoidismo)
x Artropatias paraneoplásicas
9. Reumatismo de partes moles ***
x Tendinopatias e entesites
x Bursites
x Síndromes miofasciais
x Fibromialgia
x Síndromes compressivas neurológicas (p. ex. Síndrome do Túnel do Carpo)
10. Vasculites
11. Artropatias diversas
x Sarcoidose
x Amiloidose
*** Programação obrigatória da graduação
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No lúpus ocorre a fotossensibilidade, eritema malar, úlceras orais, envolvimento


renal, hematológico e neurológico. Na esclerose sistêmica verifica-se enrijecimento da
pele, envolvimento pulmonar e digestivo e fenômeno de Raynaud. Na polimiosite e
dermatomiosite o envolvimento muscular é dominante, e na síndrome de Sjögren
predomina a síndrome seca. Nas demais pode ocorrer combinações dos sintomas
acima.
A síndrome antifosfolípide não se insere num grupo específico. Seu diferencial é
a ocorrência de tromboses e abortos na presença de anticorpos anti-cardiolipina e
outros. Com freqüência está associada ao lúpus.
A osteoartrite é uma condição puramente articular. Tem natureza crônica, mas
diferencia-se das artropatias inflamatórias crônicas por apresentar-se de modo mais
insidioso, com manifestações articulares menos flogísticas, ausência de quadro extra-
articular, bem como de fator reumatóide e fator antinuclear. As articulações mais
afetadas são as de carga (joelhos, quadris e coluna), e na forma generalizada ou
genética, as mãos. Atinge indivíduos acima dos 50 anos.
As artropatias microcristalinas tem uma clínica articular bastante típica:
geralmente se apresentam como surtos autolimitados de monoartrite, e, em geral não
apresentam dificuldade no diagnóstico diferencial com as artropatias inflamatórias
crônicas. A gota acomete caracteristicamente homens após os 40 anos.
As artropatias infecciosas também são marcadas por um curso característico,
com envolvimento de uma ou poucas articulações, geralmente de modo agudo no
caso das bacterianas, e mais lentamente no caso das fúngicas e tuberculosas. As
artrites virais são agudas, poliarticulares, e autolimitadas, sem deixar seqüelas.
A artrite da febre reumática é aguda, migratória, bastante dolorosa e
autolimitada, não deixando seqüela. Atinge crianças e adolescentes, dificilmente
ocorrendo no adulto.
A osteoporose não representa problema no diagnóstico diferencial com
artropatias porque não causa manifestações articulares. Na verdade, podem até
acarretar dor na coluna quando houver fratura, o que é facilmente identificável ao
raioX.
Na seqüência serão apresentados quadros e figuras que resumem os principais
aspectos clínico-radiográficos e laboratoriais que auxiliam no diagnóstico diferencial
destas entidades (QUADROS 2, 3 e 4 e FIGURA 2).
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Artrose Artrite DDTC Soro - Gota

Inflamação + ++++ 0/++ +/+++ ++++


Simetria ++ ++++ ++++ 0/++ 0/++
No artic. +/+++ ++++ +++ +/+++ +
Erosões 0/++ ++++ 0 +++ ++++

FIGURA 1. Topografia do envolvimento articular nas doenças reumáticas: artrose =


osteoartrite; artrite = artrite reumatóide; DDTC = doenças difusas do tecido conjuntivo;
soro- = artropatias soronegativas

QUADRO 2. Diagnóstico diferencial das manifestações articulares das doenças reumáticas

Artropatias Inflamatórias Crônicas

Artrite Soro-
DDTC Osteoartrite
Reumatóide negativas

Sinovite ++++ +++ ++ +


(variável)

++
Quadro Erosões ++++ +++ +/-

Articular Axial ++ ++++ - +++

Sacro-iliíte + ++++ - -

Punhos / MCF +++ + ++ +

IFD + + +/- +++


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QUADRO 3. Diagnóstico diferencial das manifestações extra-articulares das doenças reumáticas

Artropatias Inflamatórias Crônicas

Artrite Soro-
DDTC Osteoartrite
Reumatóide negativas

Mucocutâneas + ++ ++++ -
Quadro (Variável)

Extra-
Oculares + +++ + -

Articular Vasculite ++ +/- +++ -

Vários órgãos ++ + ++++ -

Auto- FR +++ + + -

Anticorpos FAN + + ++++ -


F R = Fator Reumatóide; FAN = Fator Antinuclear

QUADRO 4. Diagnóstico diferencial das manifestações radiográficas das doenças reumáticas

Artropatias Inflamatórias Crônicas

Artrite Soro-
DDTC Osteoartrite Gota
Reumatóide negativas
Redução
Rápida Rápida Não ocorre Lenta Tardia
Espaço
Osteopenia
++++ +++ +/- - +/-
periarticular
Neoformação
- - - +++ +++
óssea

Erosões ++++ +++ - ++ +++


(forma erosiva) (saca-bocado)

Cistos ósseos ++++ +++ - + +++


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CLASSIFICAÇÃO RESUMO

A reumatologia tem como objeto, as doenças que cursam com manifestações


osteomioarticulares, com ênfase àquelas próprias do tecido conjuntivo. Algumas se destacam
pela freqüência, e neste capítulo são abordadas sindromicamente.

Para facilitar o diagnóstico diferencial, as principais doenças reumáticas podem ser


agrupadas como artropatias inflamatórias crônicas. Elas apresentam como denominador
comum o envolvimento poli ou oligoarticular e o curso crônico, e via de regra estão associadas
à agressão auto-imune. Dividem-se em 3 subgrupos:

1. Artrite reumatóide: é a mais agressiva do ponto de vista de agressão articular, com


exuberância inflamatória, erosiva e deformante. Cursam com fator reumatóide positivo.

2. Artropatias soronegativas: também são agressivas, deixando com freqüência


seqüelas articulares. Cursam com envolvimento inflamatório da coluna e ausência de
fator reumatóide.

3. Doenças difusas do tecido conjuntivo: Anteriormente denominadas de colagenoses,


caracterizam-se por manifestações articulares mais brandas, muitas vezes somente
com artralgias ou até ausência de envolvimento articular, e muito envolvimento
sistêmico bem como presença de fator antinuclear.

Artropatias microcristalinas: cursam em surtos de mono ou oligoartrite autolimitados,


em questão de dias, com regressão expontânea.

Artropatias infecciosas: as bacterianas são agudas, muito destrutivas e mono ou


oligoarticulares; as fúngicas e tuberculosas são mais insidiosas, e também mono e
oligoarticulares. As virais são poliarticulares e autolimitadas.

Febre reumática: artrite migratória de grandes articulações, dolorosa e autolimitada,


evolui sem deixar seqüelas.

Osteoporose: Geralmente só se manifesta quando há fraturas vertebrais, que levam a dor


crônica e deformidade na coluna.

Reumatismo de partes moles: pode ser localizado como nas tendinopatias, bursites,
fasciítes e entesites; regionais como nas síndromes miofasciais; e difusas como na
fibromialgia. Podem ainda acarretar compressões de nervos periféricos.
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CLASSIFICAÇÃO QUESTÕES

1. A artrite com características erosivas é observada em quais das doenças abaixo:


a) Artrite reumatóide e artropatias soronegativas
b) Lupus eritematoso e artrite reumatóide
c) Esclerose sistêmica e artropatias soronegativas
d) Osteoartrite e febre reumática
e) Síndrome de Sjögren e polimiosite

2. As manifestações extra-articulares são mais freqüentes em quais das doenças


abaixo:
a) Artrite reumatóide
b) Osteoartrite
c) Doenças difusas do tecido conjuntivo
d) Artropatias soronegativas
e) Artrites infecciosas

3. Em qual situação abaixo as artropatias não se caracterizam por simetria no


envolvimento articular:
a) Artrite reumatóide e lupus eritematoso
b) Esclerose sistêmica e lupus eritematoso
c) Gota e artrite reumatóide
d) Síndrome Reiter e gota
e) Síndrome de Sjögren e artrite reumatóide

4. Quais dentre as características abaixo são marcantes nas doenças difusas do tecido
conjuntivo:
a) Artrite simétrica, envolvimento axial, manifestações extra-articulares
b) Artrite assimétrica, fator antinuclear, manifestações extra-articulares
c) Artrite crônica, fator reumatóide, sacro-iliíte
d) Artrite não erosiva, fator antinuclear, manifestações extra-articulares
e) Artrite não erosiva, rigidez matinal < 30 minutos, deformidades articulares

5 . Homem com 32 anos, artrite dos joelhos e tornozelo esquerdo há 6 meses. Em qual
das opções abaixo esse paciente teria maior probabilidade de se encaixar:
a) Síndrome de Reiter
b) Artrite reumatóide
c) Febre reumática
d) Gota
e) Artrite tuberculosa

Respostas Classificação: 1-a; 2-c; 3-d; 4-d; 5-a


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PROPEDÊUTICA REUMATOLÓGICA

Ricardo Fuller

Reumatologia é uma especialidade cujo objeto é o estudo das doenças que


cursam com manifestações no sistema músculo-esquelético, quer diretamente quer
indiretamente relacionadas a ele.

Idade e sexo
As doenças difusas do tecido conjuntivo acometem mulheres jovens, já a partir
da adolescência. A artrite reumatóide envolve mulheres adultas, e as artropatias
soronegativas predominam em homens jovens, com exceção da artrite psoriática. A
osteoartrite atinge indivíduos a partir da quarta e quinta décadas, com discreta
predominância no sexo feminino. A gota atinge quase que exclusivamente homens
acima dos 40 anos. A febre reumática acomete crianças e adolescentes. A fibromialgia
acomete mulheres adultas. O reumatismo de partes moles tem distribuição mais
universal, dependendo mais de fatores ocupacionais que idade e sexo. A osteoporose
incide em mulheres idosas.

Didaticamente as manifestações podem se dividir em articulares e extra-


articulares.

1. MANIFESTAÇÕES ARTICULARES

Entre artralgia e artrite existe um espectro do acometimento articular. A artrite,


por representar um processo mais evidente, e ser passível de identificação ao exame
físico, sendo mais valorizada na elaboração diagnóstica.
Artralgias são, via de regra inespecíficas, ganhando significado se presentes na
mesma articulação por um período prolongado. Podem sugerir uma osteoartrite,
distúrbios mecânicos (neuropatias, instabilidade) e mesmo doenças difusas do tecido
conjuntivo nas fases iniciais.
Artrites são mais específicas, permitindo o diagnóstico de doenças como a artrite
reumatóide, artropatias soronegativas, microcristalinas e infecciosas.
Na avaliação articular, é conveniente estabelecer-se um roteiro para a obtenção
de todos os dados possíveis:
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Número de articulações envolvidas


x Monoarticular: 1 (gota, infecciosas, algumas osteoartrites)
x Oligoarticular: 2-4 (artropatias soronegativas, osteoartrite, febre reumática)
x poliarticular > 4 (doenças difusas do tecido conjuntivo, osteoartrites e algumas
artropatias soronegativas)

Simetria
A simetria pode ser observada na artrite reumatóide e doenças difusas do tecido
conjuntivo, enquanto que a assimetria pode ocorrer nas artropatias soronegativas e
microcristalinas.

Duração
x Aguda
Os quadros agudos sugerem artropatias relacionadas a trauma, artrites
microcristalinas, artrites infeccciosas e transinfecciosas, reumatismo de partes
moles.
x Crônica (arbitra-se em geral > 6 semanas)
Os crônicos sugerem artropatias inflamatórias crônicas ou seja, artrite
reumatóide, artrites soronegativas e doenças difusas de tecidos conjutivo.

Topografia
x Axial – coluna, Iinter-apofisárias, intervertebrais, costo-vertebrais, esterno-
clavicular, esterno-costais e sacroilíacas. O acometimento axial sugere
artropatias soronegativas, osteoartrite e eventualmente casos de artrite
reumatóide com envolvimento cervical.
x Periférica – as demais articulações.

Tipos de sinais flogísticos


x Edema que corresponde à sinovite, e caracteriza-se por apresentar
consistência de borracha macia à palpação
x Eritema e calor, geralmente presentes em casos mais graves
x Derrame articular (líquido intra-articular).
O derrame apresenta consistência cística à palpação. No joelho o derrame
produz o sinal da tecla que é o movimento que a patela faz quando
pressionada para baixo até impactar no fêmur. (FIGURA 1)
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FIGURA 1. Sinal da tecla para detecção de


derrame articular no joelho. Nota-se o
volume do derrame abaixo da patela (seta).

Rigidez matinal
É a sensação de lentificação da articulação. É característica quando atinge as
pequenas articulações das mãos. Observada nas doenças inflamatórias articulares
crônicas. É medida em tempo. Acima de 30 minutos passa a ter importância clínica
mais significativa, e se superior a 60 minutos, integra os critérios diagnósticos da
artrite reumatóide.

Tipo de dor
1. Inflamatória: tende a ser mais contínua, e pode acontecer no repouso noturno.
É característica das artropatias inflamatórias crônicas.
2. Mecânica: relacionada ao movimento. Ocorre no início do movimento ou
quando ele é executado de modo mais prolongado. Tende a ser mais freqüente
após longos períodos de permanência na mesma posição. Ocorre principalmente
nas articulações de carga (joelhos, quadris e coluna). Neste caso, o paciente
queixa-se de dor e rigidez ao levantar-se após longo período sentado.

Tempo de seguimento
Os quadros agudos sugerem artropatias relacionadas a trauma, artrites
microcristalinas, artrites infeccciosas e transinfecciosas, reumatismo de partes moles.
Os crônicos sugerem artropatias inflamatórias crônicas ou seja, artrite reumatóide,
artrites soronegativas e doenças difusas de tecidos conjuntivo.

Intensidade

A dor guarda habitualmente relação com o grau de inflamação e destruição


articular, sendo portanto mais intensas nas artropatias, erosivas como a artrite
reumatóide soronegativas, microcristalinas e infecciosas
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Evolução
Algumas doenças reumáticas apresentam curso articular progressivo (artrite
reumatóide e artropatias soronegativas). Outras evoluem em surtos (febre reumática),
e algumas tem comportamento episódico, auto-limitado (artrites microcristalinas).

Localização
Dores difusas sugerem processo não articular, como miopatias, fibromialgia e
síndromes miofaciais. Dores localizadas ocorrem nas artrites e reumatismo de partes
moles. Dores regionais do tipo queimação, ou acompanhadas de parestesias sugerem
envolvimento neurológico (vasculites, neuropraxias).

1. MANIFESTAÇÕES EXTRA-ARTICULARES
Pele e mucosas
É um dos tecidos mais afetados nas doenças reumáticas, provavelmente devido a
abundância de conjuntivo. As manifestações mais freqüentes são:
1. Fotossensibilidade: consiste num eritema de rápida instalação e persistente.
Ocorre nas doenças difusas do tecido conjuntivo (DDTC), principalmente no lúpus.
O eritema malar é uma lesão infiltrada e eritematosa malar fotossensível (lúpus)
2. Alopecia: difusa ou em placas (lúpus)
3. Esclerodermia: espessamento da pele, com diminuição de rugas, e um aspecto
infiltrado na fase edematosa e endurativa. Quando ocorre nos dedos, cursa com
afilamento das polpas digitais e reabsorção distal da falange. Causa afilamento do
nariz e orelhas (esclerose sistêmica – ES).
4. Fenômeno de Raynaud: é a mudança de cor dos dedos ocorrendo em três
fases, iniciando por palidez intensa seguida de cianose e hiperemia reacional,
presentes nos dedos em resposta ao frio ou estresse. Ocorre em todas as
DDTC, principalmente na ES e Doença Mista do Tecido Conjuntivo (DMTC)
5. Vasculite cutânea: máculas, nódulos ou placas eritematosas, dolorosas que por
vezes necrosam e ulceram. Ocorrem em todas as DDTC.
6. Eritema nodoso: são nódulos eritematosos bastante dolorosos, que ocorrem
geralmente nos membros, principalmente nas pernas, e representam uma
manifestação vasculítica cutânea a doenças reumáticas, infecciosas,
neoplásicas, endócrinas, erupção a drogas, etc.
7. Lúpus discóide: máculas hipocrômico-atróficas, circundadas por um halo
hipercrômico, com perda definitiva dos anexos cutâneos. São decorrentes do
envolvimento cutâneo profundo do lúpus.
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8. Livedo reticular: é um eritema reticulado, observado nos membros. Pode ocorrer


em indivíduos sadios e nas DDTC, principalmente no lúpus e na síndrome anti-
fosfolípide (FIGURA 2).

FIGURA 2. Livedo reticular no antebraço

9. Nódulos subcutâneos: ocorrem na artrite reumatóide, febre reumática e algumas


vasculites.
10. Tofos: são acúmulos de urato principalmente nos tecidos subcutâneos e
periarticulares, que ocorrem na gota.
11. Calcinose: verifica-se nódulos e placas de consistência rígida no subcutâneo,
em pacientes com dermatomiosite.
12. Telangiectasias: na ES elas se distribuem na face e mãos, e tem o aspecto de
pequenas máculas purpúricas
13. Lesões psoriáticas: placas eritematosas com descamação lamelar e distrofia
ungueal.
14. Púrpura, equimoses e hematomas: ocorrem nas DDTC e vasculites como
conseqüência de plaquetopenia, distúrbio da coagulação e uso de corticóide.
15. Úlceras mucosas: decorrem de vasculite. São dolorosas e persistentes.
Ocorrem no lúpus, doença de Behçet e síndrome de Reiter.
16. Eritema palmar: ocorre no lúpus
17. Heliótropo (coloração eritêmato violácea nas pálpebras) e Gottron (eritema na
face dorsal das articulações das mãos e cotovelos). Ocorrem na
dermatomiosite

Coração e pulmões
1. Pleurite e pericardite nas DDTC, principalmente no lúpus.
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2. Pneumonite intersticial nas DDTC, principalmente a ES e a dermatopolimiosite.


Pode cursar assintomática por longos períodos, sendo fundamental a avaliação
através da tomografia de alta resolução
3. Valvulites: ocorrem na febre reumática, eventualmente no lúpus e espondilite
anquilosante.
4. Cardite: febre reumática, vasculites e DDTC.
5. Hipertensão arterial: decorre geralmente da insuficiência renal decorrente de
nefropatias de origem reumática, uso de corticóide e crise esclerodérmica.
6. Hipertensão pulmonar: ocorre nas DDTC, principalmente na ES e na doença
mista do tecido conjuntivo. Na suspeita diagnóstica deve ser avaliada
inicialmente através de ecocardiograma.

Aparelho gênito-urinário
1. Nefrites: ocorrem principalmente no lúpus, mas também em outras DDTC e
vasculites. São identificadas por hematúria, espuma na urina e através da urina
I (sendo que a presença de hemácias dismórficas sugere sangramento renal).
2. Cistites, uretrites e cervicites podem ocorrer em artrites reativas como na
síndrome de Reiter.
Sistema digestório
1. Disfagia, refluxo gastro-esofágico por alterações de motilidade esofágica e
obstipação por megacolon ocorrem na ES.
2. Diarréia nas artrites reativas como a síndrome de Reiter e as enteroartropatias
3. Xerostomia na síndrome de Sjögren

Olhos
1. Conjuntivite, Uveíte, irite e iridociclite nas artropatias soronegativas,
principalmente na síndrome de Reiter
2. Xeroftalmia na síndrome de Sjögren
3. Episclerite na artrite reumatóide

Sistema nervoso
1. Neuropatias: ocorrem nas DDTC e vasculites
2. Convulsões: lúpus e vasculites
3. Coréia: febre reumática e lúpus
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PROPEDÊUTICA RESUMO

1. Manifestações articulares

Número de articulações:
x Monoartrites – gota e infecciosas
x Oligoartrites – 2 a 4 articulações – soronegativas, osteoartrite
x Poliartrites - > 4 articulações – artrite reumatóide, osteoartrite, doenças difusas do
tecido conjuntivo (DDTC)

Topografia: Periférica: DDTC, artrite reumatóide, osteoartrite


Axial: artropatias soronegativas e osteoartrite

Sinais flogísticos: artrite na artrite reumatóide, artropatias soronegativas, artrites infecciosas,


gota, febre reumática. Artralgia nas DDTC, osteoartrite.

Simetria: presente nas DDTC, artrite reumatóide e alguns tipos de osteoartrite. Tendência à
assimetria nas artropatias soronegativas, gota, artrites infecciosas

Rigidez matinal: presente e maior de 1 hora na artrite reumatóide, presente em grau e


duração variadas nas artropatias soronegativas e eventualmente presente
e com duração menor que 10 minutos na osteoartrite

Tipo de dor:
x Inflamatória: dor presente continuamente e também noturna. Ocorre na artrite reumatóide
e artropatias soronegativas.
x Mecânica: dor aos movimentos; rigidez protocinética. Ocorre na osteoartrite.

2. Manifestações extra-articulares

Cutâneo-mucosas
Presentes principalmente nas DDTC. As mais freqüentes são a fotossensibilidade (lúpus),
eritema malar (lúpus), úlceras mucosas (lúpus, Behçet, Reiter, vasculites, Raynaud (ES,
doença mista), lúpus discóide (lúpus), livedo reticular (DDTC, síndrome antifosfolípide),
telangiectasias (ES), heliótropo e Gottron na dermatomiosite, eritema nodoso nas DDTC,
nódulos subcutâneos (artrite reumatóide e febre reumática), espessamento cutâneo na ES.

Coração e pulmões
Pneumonite nas DDTC, principalmente na ES, pleurite e pericardite no lúpus, hipertensão
pulmonar na ES, cardite nas DDTC, valvulite na febre reumática

Aparelho gênito-urinário
Nefrite nas DDTC, principalmente no lúpus e cistite, uretrite e cervicite em algumas
artropatias soronegativas.

Sistema digestório
Disfagia e esofagite e megacolon na ES. Diarréia em algumas artropatias soronegativas.
Xerostomia na síndrome de Sjögren

Sistema nervoso
Neuropatias, convulsões no lúpus e vasculites

Olhos
Conjuntivite, uveíte, iridociclite nas artropatias soronegativas. Xeroftalmia na síndrome de
Sjögren
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PROPEDÊUTICA QUESTÕES

1. Quais condições, dentre as abaixo, acomete preferencialmente mulheres jovens:


a) osteoporose
b) gota
c) reumatismo de partes moles
d) fibromialgia
e) artropatias soronegativas

2. Assinale a correta:
a) A simetria no acometimento articular é a regra nas artropatias soronegativas
b) A simetria no acometimento articular tem pouca importância no diagnóstico das
doenças reumáticas
c) O envolvimento axial é altamente relevante no diagnóstico das artropatias
soronegativas
d) O envolvimento axial é altamente relevante no diagnóstico da artrite reumatóide
e) O envolvimento axial e a simetria caracterizam a artrite reumatóide

3. Mulher com 32 anos e história de poliartralgia nas mãos, punhos, joelhos e


cotovelos, simétrica há 6 semanas, acompanhada de rigidez matinal de 1 hora. Não
apresenta nenhuma manifestação extra-articular. O diagnóstico mais plausível
dentre os abaixo é:
a) Osteoporose
b) Fibromialgia
c) Vasculite
d) Artrite reumatóide
e) Reumatismo de partes moles

4. Mulher de 23 anos com história de fenômeno de Raynaud e edema difuso dos dedos
das mãos. É possível que essa paciente apresente:
a) Osteoartrite
b) Síndrome de Sjögren
c) Artrite tuberculosa
d) Artrite psoriática
e) Esclerose sistêmica

5. Assinale a alternativa que contemple a correspondência correta:


a) Fibromialgia – dor localizada
b) Artrite reumatóide – dor mecânica
c) Osteoartrite – dor mecânica
d) Lúpus – calcinose
e) Espondilite anquilosante – úlcera mucosa

Respostas Propedêutica: 1 – d; 2 – c; 3 - d; 4 – e; 5 - c
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LABORATÓRIO EM REUMATOLOGIA

Ricardo Fuller

A reumatologia é uma especialidade cujos diagnósticos são baseados


principalmente em dados clínicos. Os exames complementares muitas vezes são
coadjuvantes. Por vezes podem apresentar maior potencial de confirmação de uma
doença, ou mesmo serem altamente específicos, mas via de regra devem ser
interpretados em conjunto com dados clínicos de modo criterioso. Neste capítulo serão
apresentados alguns exames laboratoriais mais utilizados na prática reumatológica.

PROVAS DE FASE AGUDA

São alterações em substâncias séricas produzidas sob a influência de citocinas,


em grande parte pelo fígado, frente a vários estímulos, principalmente pelos que
causam dano tecidual. São indevidamente chamadas de “provas de atividade
reumática”, termo incorreto pois não são específicas dessa categoria de doenças. E
mesmo o termo “provas de atividade inflamatória” não é de todo correto, pois elas
podem estar relacionadas também a situações não inflamatórias.

Proteína C reativa: é um pentâmero, relativamente preservado na escala


zoológica, importante por desempenhar uma ação inespecífica, porém rápida frente a
agressões infecciosas e de outra natureza. É uma das provas de fase aguda mais
utilizadas na prática, prestando-se também como parâmetro de monitorização
terapêutica. As principais causas de elevação da Proteína C reativa encontram-se
listadas no QUADRO 1.

QUADRO 1. Causas de elevação da Proteína C Reativa

< 1 mg/dl 1- 10 mg/dl > 10 mg/dl

Exercício vigoroso Infarto do miocárdio Infecções


Frio Neoplasias bacterianas
Gravidez Pancreatite agudas
Gengivite Infecção mucosa Grandes
Convulsão (bronquite, cistite) traumas
Depressão Doenças do conjuntivo Vasculite
Diabetes Artrite reumatóide sistêmica
Obesidade
Idade
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Velocidade de hemossedimentação: Muito utilizada, corresponde à medida da pilha


de hemáceas que se precipitam espontaneamente durante uma hora. O processo
pode ser acelerado pela presença de proteínas de carga assimétrica como o
fibrinogênio e as imunoglobulinas e outras substâncias de fase aguda. Trata-se
portanto de uma avaliação indireta, que capta a influência de uma série de outras
substâncias, bem como situações fisiológicas (TABELA2), o que a torna sensível mas
pouco específica. Exceção deve ser feita a valores muito elevados, próximos a 100
mm/h verificados na arterite temporal.

TABELA 2. Causas de alteração da velocidade de hemossedimentação

MULHERES p FIBRINOGÊNIO
IDOSOS ICC
GRAVIDEZ CAQUEXIA
INFLAMAÇÃO SAIS BILIARES
ANEMIA POLICITEMIA
COAGULAÇÃO DA AMOSTRA
n COLESTEROL > 2 hs PARA PROCESSAR
IRC MICROCITOSE
OBESIDADE ANISOCITOSE
LESÃO TECIDUAL ESFEROCITOSE
HEPARINA p TEMPERATURA
n TEMPERATURA

Alfa-1 glicoproteína ácida: Eleva-se 12 horas após a lesão tecidual. Substituiu a


dosagem da mucoproteína, por ser mais específica.

Eletroforese de proteínas: engloba todas as proteínas séricas. Nas frações alfa-


globulinas estão a maioria das proteínas de fase aguda. A proteína C reativa por
exemplo corre em alfa 2 e a alfa 1 glicoglobulina ácida corre em alfa 1. Nos processos
inflamatórios verifica-se um aumento na fração alfa 2, e nos casos crônicos, um
aumento policlonal das gamaglobulinas e diminuição da albumina (FIGURA 1)

FIGURA 1. Eletroforese de proteínas nos processos inflamatórios

A A

D J
D E J E
D D
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Outras: várias substâncias também se elevam na fase aguda da lesão tecidual, porém
são menos utilizadas na prática. São exemplos: fibrinogênio, ferritina,
complemento, haptoglobina, amilóide sérico A.

LÍQUIDO SINOVIAL

É produzido pela membrana sinovial, sendo responsável pela lubrificação da


cartilagem graças à sua alta viscosidade conferida pelo ácido hialurônico, um
macropolímero sacarídico. Quando existe uma agressão articular o líquido pode se
alterar. A análise das suas características pode auxiliar no diagnóstico diferencial das
doenças articulares. Em algumas situações sua avaliação pode ser conclusiva para o
diagnóstico, como por exemplo nas artrites sépticas e microcristalinas. Uma
desvantagem é que só se consegue retira-lo de grandes e médias articulações. O
líquido sinovial divide-se em 5 grupos, de acordo com suas características, conforme a
TABELA 1.

TABELA 1. Grupos de líquido sinovial

I II III IV

GRUPO Normal Não inflamatório Inflamatório Séptico Hemorrágico

Transparência ++++ ++++ ++/+++ 0/+ 0/+++


Viscosidade ++++ +++ ++ 0/+ ++/+++
Leucócitos/ml < 200 < 3 000 3 000 a 50 000l > 50 000 < 3000
Polimorfonucleares < 25 % < 25 % > 50 % > 75 %
Hemáceas ~0 ~0 ~0 ~0 presentes

Doenças Osteoartrite Artropatias Infecções Trauma


inflamatórias bacterianas
mais Trauma crônicas Hemartrose
(Reumatóide,
freqüentes Doenças Difusas do soronegativas) Acidente de
Tecido Conjuntivo punção
(lupus, etc) Gota
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FATOR REUMATÓIDE e ANTI PEPTÍDEO CITRULINADO CÍCLICO (CCP)

O fator reumatóide é um anticorpo das classes IgM, IgG ou IgA, contra a porção
Fc de uma IgM. Aproximadamente 60 a 75% dos pacientes com artrite reumatóide
apresentam esse auto anticorpo, e sua presença e título guardam certa correlação
com manifestações extra-articulares e agressividade do envolvimento articular. Em
alguns pacientes pode haver uma redução nos níveis de fator reumatóide quando há
controle da doença, mas não é uma regra. O fator reumatóide não é específico da
artrite reumatóide. Até 5% dos indivíduos normais podem apresentar fator reumatóide
em baixos títulos, e sua prevalência e nível aumentam com a idade, alcançando até
16% aos 65 anos. Também pode estar presente em outras doenças reumáticas como
nas doenças difusas do tecido conjuntivo (principalmente a síndrome de Sjögren, mas
também no lupus, esclerose sistêmica progressiva e doença mista do tecido
conjuntivo), doenças infecciosas (endocardite bacteriana, tuberculose, lues, hepatite),
doenças pulmonares (pneumoconiose, sarcoidose, doenças intersticiais) e neoplasias
(leucemia, adenocarcinoma de cólon). Geralmente o título do fator reumatóide é mais
baixo fora da artrite reumatóide e da síndrome de sjögren.

Portanto, quando um paciente apresenta fator reumatóide positivo, o diagnóstico


deve levar em conta o título, a idade, e principalmente as manifestações clínicas.
Nesse aspecto, não é um exame de confirmação diagnóstica.

O CCP é um auto anticorpo presente em 80 a 90 % dos casos de artrite


reumatóide, diferindo deste por ser muito mais específico, além poder anteceder a
eclosão clínica da doença. Pode estar presente na artrite reumatóide com fator
reumatóide negativo.

FATOR ANTINUCLEAR (FAN)

Designa uma família de auto-anticorpos contra constituintes celulares nucleares.


A pesquisa do FAN é realizada por um teste de triagem pela técnica da
imunoflorescência indireta, utilizando como substrato células de fígado de
camundongo (FAN clássico) e células Hep 2. Quando positivo, realiza-se a tipagem de
anticorpos específicos como ant-DNA, anti-Sm, anti-Ro, etc. Estão presentes em 99%
dos casos de lupus e em freqüência variável nas doenças difusas, tema que será
abordado num capítulo específico.
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O FAN não é específico do lúpus ou de doenças auto-imunes. Pode ocorrer em


indivíduos saudáveis e em outras doenças não reumáticas e não auto-imunes. Na
interpretação do FAN positivo, deve-se levar em conta o título, o tipo (alguns são
específicos e outros pouco ou inespecíficos) e o contexto clínico. Os quadros 3 e 4
resumem a interpretação do FAN em algumas situações.

FAN positivo isolado não configura doença.

QUADRO 3. FAN no lúpus e outras condições

Fator Antinuclear

Prevalência: Probabilidade de lupus:


Lupus: 99 % Teste positivo: 5 %
Normais: 1 - 30% Teste positivo + dor: 20 %
Outras doenças
*
* Polimiosite, S. Sjogren, Esclerodermia, Vasculite, Artrite reumatóide
Hepatite crônica ativa, Cirrose biliar primária, Hepatopatia alcoólica
Fibrose pulmonar idiopática, Pneumoconiose, Hipertensão pulmonar
Infecções cronicas
Neoplasias: linfomas, leucemias, melanoma, Pulmão, mama, ovário, etc
Púrpura trombocitopênica idiopática, Anemia hemolítica autoimune
Miscelânea: Doenças endócrinas, neurológicas, IRC, etc

QUADRO 3. FAN em normais

FAN NA POPULAÇÃO NORMAL

> 1/40 20 – 30%


> 1/80 10 – 12%
> 1/160 5%
> 1/320 3%
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ANTI-ESTREPTOLISINA O (ASLO)

São os anticorpos decorrentes de uma estreptococcia, ou seja são uma


evidência de uma infecção pregressa ou atual, e não uma confirmação de febre
reumática ou outra doença reumatológica. A ASLO eleva-se em 85% das infecções
estreptocóccicas, e permanece desta forma durante aproximadamente 2 meses,
decaindo lentamente em 6 meses.

ÁCIDO ÚRICO

O ácido úrico tende a aumentar após os 40 anos e os maiores níveis ocorrem


nos homens. O limite é de 7 mg/100 ml, que representa o ponto de saturação máxima
nos fluídos fisiológicos. A prevalência de hiperuricemia na gota chega a 97% e nos
indivíduos normais é de 5%. Numa amostra populacional aleatória, a hiperuricemia
não estará relacionado à gota em 90% dos indivíduos. A dosagem do ácido úrico
presta-se para o diagnóstico e seguimento terapêutico da gota. Na gota, utiliza-se
também a dosagem do ácido úrico na urina de 24 horas para se determinar o melhor
tipo de tratamento.

COMPLEMENTO

O sistema complemento engloba várias proteínas, que podem ser ativadas numa
seqüência, através de uma via clássica que se inicia por C1 e por uma via alternativa,
através do C3. A avaliação do complemento objetiva a detecção do consumo que
ocorre em doenças onde haja formação de imunocomplexos (principalmente o lupus e
a glomerulonefrite). Habitualmente verifica-se o nível do complemento total (CH50), C3
e C4. É útil para a detecção de atividade do lúpus e para monitorizar a resposta ao
tratamento. Pode estar também diminuído eventualmente em outras doenças auto-
imunes nas quais haja formação de imunocomplexos. Pode estar diminuído também
devido a uma deficiência constitucional de algum dos seus componentes como o C2 e
o C4.
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LABORATÓRIO RESUMO

Provas de fase aguda

Proteína C reativa, Velocidade de hemossedimentação, alfa 1 glicoproteína ácida, fração alfa 2


e gama da eletroforese de proteínas são as principais. Elevam-se em decorrência da
inflamação e processos imunes. Presta-se não ao diagnóstico, mas para a detecção de
atividade de doença e monitorização terapêutica.

Líquido sinovial

Auxilia na complementação diagnóstica das artropatias inflamatórias. Confirma o diagnóstico


de artrite séptica e artropatias por cristais.

Fator reumatóide

Utilizado na complementação diagnóstica da artrite reumatóide, na qual tem prevalência de até


75%, mas não é específico, podendo ser positivo em normais e doenças infecciosas entre
outras. Títulos altos conferem maior especificidade e estão associados a formas mais grave de
doença.

Anti CCP

Presente em até 90% dos casos de artrite reumatóide, é mais específico que o fator
reumatóide.

Fator antinuclear

Presente em 99% dos casos de lúpus e é também muito freqüente nas outras doenças difusas
do tecido conjuntivo. Uma vez positivo, deve ser caracterizado, pois cada tipo de FAN tem sua
própria especificidade. Pode ser encontrado em baixos títulos em até 30% dos indivíduos
normais. Também pode estar presente em algumas infecções e neoplasias.

Complemento

Verificação de atividade de doença e monitorização da terapêutica, principalmente da nefrite do


lúpus.

Anti-estreptolisina (ASLO)

Indica infecção pregressa recente por estreptococus. Não fecha diagnóstico de “doença
reumática”.

Ácido úrico

Está elevado em 95% dos casos de gota, mas também pode estar alterado em indivíduos
normais. Para cada 10 hiperuricêmicos, apenas um tem gota.
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LABORATÓRIO QUESTÕES

1. Homem, 32 anos, com artrite do joelho direito há 2 dias, com edema eritema e derrame
articular e febre de 39 graus centígrados. Os exames com maior potencial diagnóstico são:
a. Proteína C reativa e fator antinuclear
b. Proteína C reativa e fator reumatóide
c. Proteína C reativa e ácido úrico
d. Análise do líquido sinovial e hemograma
e. Acido úrico e hemograma

2. Mulher, 30 anos, com poliartrite há 2 meses, sem outras manifestações. Quais os


exames com maior potencial diagnóstico para o caso.
a. Fator antinuclear
b. Fator rematóide
c. Anti peptídeo citrulinado cíclico
d. Complemento
e. Eletroforese de proteína

3. Mulher 22 anos, há 6 semanas com febre, emagrecimento, máculas eritematosas nos


membros superiores e face e poliartralgia. Para fins de diagnóstico, qual a melhor opção
entre as abaixo:
a. Fator antinuclear, hemograma e ácido úrico
b. Análise de líquido sinovial, fator antinuclear, fator rematóide.
c. Hemograma, Urina I e fator antinuclear.
d. Complemento, proteína C reativa, eletroforese de proteínas
e. Eletroforese de proteínas, fator antinuclear e hemossedimentação.

4. Num check up de rotina uma mulher de 45 anos assintomática detectou anti-


estreptolisina O moderadamente elevada. A partir desse achado foram solicitados mais
exames, nos quais se verificou fator antinuclear de 1/160. A hipótese mais provável é:
a. Doença autoimune
b. Linfoma
c. Lupus eritematoso sistêmico
d. Alguma doença difusa do tecido conjuntivo
e. Ausência de doença

5. Um paciente de 46 anos apresentando velocidade de hemossedimentação de 38 mm


na 1ª hora (normal < 15 mm), e proteína C reativa de 8 mg/dl (normal < 5). Com base nos
exames, o diagnóstico pode ser:
a. Artrite reumatóide
b. Artropatía soronegativa
c. Processo infeccioso
d. Amigdalite purulenta
e. Todas as acima

Respostas LABORATÓRIO: 1-d; 2-c; 3-b; 4-e; 5-e

BIBLIOGRAFIA RECOMENDADA

Viana, VS T; Bonfá, E S D O, Análise laboratorial em reumatologia. In: Yoshinari, N H; Bonfá, E S D O,


Reumatologia para o Clínico. São Paulo, Ed Roca, 2000, p223-231.
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FATOR ANTINUCLEAR
Eloísa Bonfá
Vilma S. Trindade Viana

INTRODUÇÃO
As doenças auto-imunes, nas quais se incluem muitas das condições reumáticas,
constituem-se nas conseqüências clínicas da resposta imune dirigida a componentes
moleculares do próprio organismo. Esse processo auto-reativo se caracteriza pelo
desenvolvimento de uma série de eventos celulares (geração e proliferação de células T
reativas) e humorais (produção de auto-anticorpos e alteração seletiva nos níveis de
citocinas pró-inflamatórias) que levam à lesão tecidual. Devido às limitações da avaliação
de auto-reatividade celular na prática laboratorial, a investigação das doenças auto-
imunes é voltada principalmente à detecção de auto-anticorpos.
Muitas das doenças difusas do tecido conjuntivo (DDTC) caracterizam-se pela
presença de auto-anticorpos com um amplo espectro de especificidade antigênica. Os
principais antígenos alvo incluem constituintes intracelulares, de membrana e mesmo
alguns extracelulares. Nas DDTC esses auto-antígenos caracterizam-se pela distribuição
ubíqua (em todas as células) no organismo, por serem altamente conservados nas
espécies e por exercer função biológica relevante no ciclo celular, processo de
transcrição e na síntese protéica. Quanto à sua natureza, os auto-antígenos incluem
ácidos nucléicos (DNA), proteínas, complexos de ribonucleoproteínas (RNPs) e
fosfolípides de membrana celular.
Os auto-anticorpos antinucleares (ANA) ou fatores antinucleares (FAN) estão
presentes nos pacientes com DDTC em freqüência variada. São anticorpos dirigidos a
diversos componentes moleculares intracelulares sendo sua denominação baseada na
sua localização na célula (p.ex. nucleolar, centromérico), natureza molecular (p.ex.
U1RNP ou complexo ribonucleoprotéico constituído por pequenos resíduos de RNAs
ricos em uracila e DNA), no nome do paciente no qual o anticorpo foi descrito inicialmente
(p. ex. Sm, Ro, La, Jo-1) ou ainda nas iniciais da doença onde o anticorpo
correspondente foi detectado pela primeira vez (p. ex. SS-A ou SS-B de Síndrome de
Sjögren, Scl-70 de esclerose sistêmica).
A importância da detecção e caracterização dos auto-anticorpos nas DDTC se
baseia na contribuição de muitos deles no auxílio diagnóstico e monitoramento clínico-
terapêutico.
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FATORES ANTINUCLEARES

A despeito de sua denominação os fatores antinucleares são dirigidos a um amplo


espectro de moléculas de distribuição não apenas nuclear como também citoplasmática.
A pesquisa de FAN se constitui no teste de triagem inicial da pesquisa de auto-anticorpos
nas doenças reumáticas.
Análise laboratorial: O método de escolha para sua detecção é o de
imunofluorescência indireta (IFI) utilizando como substrato antigênico células isoladas
(células HEp-2 que é uma linhagem de carcinoma de laringe humana) (FIGURA 1). Os
resultados são expressos com a descrição morfológica do padrão de imunofluorescência
observado e na distribuição subcelular da reatividade e são expressos em títulos (maior
diluição do soro que ainda apresenta reatividade). Na prática, somente FAN em títulos
igual superiores a 1/80 são considerados de significância clínica.

Fator antinuclear - FAN


4
3

2 5

1
6

FIGURA 1. Imunofluorescência indireta em células HEp-2


para a detecção de FAN: os anticorpos (1) presentes no
soro dos pacientes se ligam especificamente a antígenos
intracelulares (nucleares e citoplasmáticos). Esta ligação é
revelada com anticorpo específico para imunoglobulina
humana (2) conjugado à fluoresceína (3). Os padrões de
imunofluorescência nuclear homogêneo (4), nuclear
pontilhado (5) e citoplasmático pontilhado (6) são
comumente observados nas doenças reumatológicas.

Os padrões de reatividade dos auto-anticorpos antinucleares na IFI são bastante


variados e refletem a ligação dos anticorpos a proteínas presentes na célula durante a
intérfase e também àqueles antígenos que são expressos predominantemente nas
diferentes fases do processo da mitose. A FIGURA 2 ilustra alguns dos padrões de
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reatividade dos FAN mais comumente observados pela técnica de IFI na pesquisa
laboratorial do FAN nas conectivopatias. Dentre esses, podemos citar:

Nuclear Homogêneo: este padrão de reatividade está associado à presença de 3 tipos


de auto-anticorpos: anti-DNA de dupla fita (dsDNA) que é específico do lúpus eritematoso
sistêmico (LES), o anticorpo anti-cromatina ou nucleossoma (complexo DNA/histona) e
os anticorpos anti-histona e DNA de fita simples (ssDNA) (FIGURA 2a). Além disso, este
mesmo padrão na IFI quando em baixos títulos, pode também indicar a ocorrência de
auto-reatividade em doenças neoplásicas, infecciosas crônicas e mesmo em alguns
b c
indivíduos saudáveis. Nesses casos, entretanto, a especificidade antigênica do FAN é
distinta daquela observada nas conectivopatias e a relevância deste achado ainda não
está bem estabelecida.

Nuclear Pontilhado: padrão típico de auto-reatividade à proteínas intracelulares


extraíveis com solução salina (extractable nuclear antigens ou ENA). Nesse grupo
incluem-se os anticorpos específicos às ribonucleoproteínas Sm (específicos do LES) e
U1 RNP (ou simplesmente) RNP, que na IFI apresentam padrão de reatividade
pontilhado grosso. O padrão de reatividade nuclear pontilhado fino é comum aos
anticorpos para as proteínas denominadas Ro ou SS-A e LA ou SS-B presentes
principalmente em pacientes com LES e síndrome de Sjögren (FIGURA 2b).

Nucleolar: padrão observado na esclerose sistêmica (ES) e, está associado aos


anticorpos antiproteínas nucleolares como fibrilarina, Scl-70 e RNA polimerases I, II e III
bem como anti-PM/Scl detectados na síndrome de sobreposição de polimiosite e
esclerodermia (FIGURA 2c). Este amplo painel de reatividade dos anticorpos
antinucleoares reflete variações da marcação do nucléolo na IFI: aglomerado, pontilhado
e homogêneo.

Centromérico: a imunofluorescência com padrão pontilhado discreto e disperso pelo


núcleo da célula em intérfase e que se alinha com os cromossomos na placa metafásica
da célula em divisão, é altamente específico de anticorpos anti-proteínas CENP A, B e C
constituintes do centrômero (FIGURA 2d) detectados em 70% dos pacientes com CREST
(tipo localizado de esclerose sistêmica).

Citoplasmático pontilhado fino: é representativa do anticorpo anti-Jo-1 (ou anti-


sintetase-1,2-de histidil-tRNA) marcador sorológico específico das miopatias inflamatórias
idopáticas sendo detectado em 20-30% dos pacientes com polimiosite e em 60-70%
daqueles com miosite e fibrose intersticial pulmonar.
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a b

c d

e f
e

FIGURA 2. Padrões de imunofluorescência em células HEp-2 representativos


de pacientes com doenças reumáticas: a. Nuclear homogêneo: associado a
anticorpos anti-dsDNA, histona, e dsDNA/histona; b. nuclear pontilhado
grosso: associado a anticorpos anti-Sm e anti-snRNP; c. nucleolar
aglomerado: típico de anticorpos anti-fibrilarina ou U3-nRNP; d. nuclear
centromérico: associado a anticorpos anti-proteínas do centrômero; e. padrão
misto do tipo citoplasmático pontilhado fino denso e nucleolar homogêneo:
característico de anticorpos anti-proteína P ribossômica. Padrão de
imunofluorescência dos anticorpos anti-dsDNA em C. luciliae ( f ). Microscópio
Zeiss – Axiovert 200, invertido, motorizado e Sistema confocal ZEISS LSM 510
Meta UV). Elaboração do material fotográfico: C. Bueno e M B. Vendramini
(LIM17-FMUSP).
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Já a variação do pontilhado citoplasmático padrão fino denso isolado ou associado à


marcação do nucléolo (padrão misto) é sugestiva do anticorpo anti-proteína P
ribossômica, marcador sorológico específico do LES (FIGURA 2e).

A TABELA 1 resume a freqüência de FAN positivo, os padrões de imunfluorescência


mais comumente observados e os antígenos alvos relacionados nas conectivopatias
auto-imunes.

TABELA 1. Fatores antinucleares nas doenças reumáticas auto-imunes: freqüência, padrões de


reatividade e antígenos-alvo relacionados

Doença FAN Padrão Predominante Auto-antígeno


(%) (IFI em células HEp-2) alvo

Lúpus eritematoso >95 Nuclear:


sistêmico Homogêneo Ds/ssDNA,
Pontilhado grosso Cromatina, histona
Pontilhado fino snRNP, Sm
Citoplasmático misto: Ro/SS-A, La/SS-B
Pontilhado fino denso e nucleolar Proteína P
homogêneo ribossômica

Lúpus induzido por droga 100 Nuclear Homogêneo Histona

Doença mista do tecido >95 Nuclear pontilhado grosso U1-snRNP


conjuntivo

Síndrome de Sjögren 40-60 Nuclear pontilhado fino Ro/SS-A, La/SS-B

Esclerose sistêmica 60-90 Nucleolar aglomerado Fibrilarina


Nucleolar pontilhado RNA pol I
Misto: Nuclear e nucleolar pontilhado Scl-70

CREST (variante da 70-80 Centromérico CENP-A, B e C


esclerose sistêmica)

Polimiosite 30-50 Citoplasmático pontilhado fino Jo-1


Dermatomiosite

Sobreposição PM/SSc 24 Nucleolar homogêneo PM/Scl

Artrite reumatóide (Fator 30 Homogêneo Cromatina?


reumatóide positivo)

Interpretação do FAN: A utilidade do teste do FAN se baseia na sua sensibilidade e


facilidade de execução, e na sua especificidade. Embora sua análise auxilie o diagnóstico
da doença, não é de grande valor no acompanhamento da mesma, pois seus títulos não
variam significantemente no curso da doença, existindo outros testes mais específicos
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para este fim. Um resultado negativo torna o diagnóstico de LES altamente improvável e
sua repetição imediata não é necessária. Os padrões de imunofluorescência do FAN
podem, na maioria das vezes sugerir, mas não confirmar, a especificidade antigênica de
determinados auto-anticorpos. Tanto a detecção de FAN em altos títulos como a sua
persistência são, em geral, características típicas das doenças reumáticas auto-imunes.
Por outro lado, FAN em baixos títulos (1:40 – 1:80) pode ser detectado em outras
condições clínicas tais como doenças auto-imunes órgão específicas (colangite auto-
imune primária, cirrose biliar primária), infecções crônicas (lepra, hepatite viral,
endocardite bacteriana subaguda) e neoplasias (leucemias, melanoma). Da mesma
forma, FAN em baixos títulos com padrão homogêneo e/ou pontilhado pode ser
observado em cerca de 10% da população aparentemente sadia (20-60 anos) e numa
maior freqüência em idosos ou indivíduos com história familiar de doença auto-imune.
Assim, a interpretação do FAN positivo e de seus níveis deve ser feita dentro do contexto
clínico mesmo porque a ausência desta reatividade não exclui a ocorrência de doença.

CARACTERIZAÇÃO DA ESPECIFICIDADE ANTIGÊNICA DOS FATORES


ANTINUCLEARES
A identificação da especificidade antigênica do FAN nas doenças reumáticas auto-
imunes tem sido conduzida na rotina através de técnicas de imunofluorescência indireta,
imunodifusão dupla em gel, contra-imunoeletroforese, hemaglutinação passiva e
immunoblotting utilizando extratos teciduais ou lisados celulares como substratos
d específicos (FIGURA 3).
antigênicos

FAN: Especificidade antigênica

dsDNA, Sm: Lúpus


snRNP: Lúpus, DMTC
Ro/SS-A : Lúpus, S. Sjögren
La/SS-B: Lúpus, S. Sjögren
P ribossômica: Lúpus (SNC)
Scl-70: Esclerodermia
Centrômero: Esclerodermia
Pm/Scl: sobreposição Pm/Scl

FIGURA 3. A especificidade antigênica dos auto-


anticorpos antinucleares pode ser identificada por técnicas
como ELISA que empregam antígenos purificados. Alguns
auto-anticorpos estão associados a uma determinada(s)
doença(s) ou manifestação clínica.
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Além disso, o teste de ELISA também tem sido empregado com freqüência
usando proteínas altamente purificadas, peptídeos sintéticos ou ainda proteínas humanas
recombinantes. Mais recentemente, novos metodos têm sido introduzidos, os quais
possibilitam a determinação simultânea de um grupo de auto-anticorpos correlacionados
(Multiplex technology) através de uma plataforma de microarray de proteínas com grande
potencial na investigação do perfil dos auto-anticorpos.

Anticorpo anti-DNA nativo ou de dupla hélice: é altamente específico do lúpus


eritematoso sistêmico (LES) e está associado à nefrite lúpica. O método de detecção
mais comumente empregado é o de imunofluorescência indireta utilizando o
hemoflagelado Crithidia luciliae que apresenta DNA puro no seu cinetoplasto localizado
próximo ao flagelo (FIGURA 2f). No entanto esse anticorpo pode ser detectado também
por ELISA usando preparações de DNA purificadas como substrato antigênico.
Significado clínico: como são específicos do LES os anticorpos anti-dsDNA são
considerados marcadores sorológicos da doença sendo sua detecção portanto de grande
valor diagnóstico. Estão presentes em 40-60% dos pacientes com LES em geral, 70-95%
com LES ativo e em 20-30% com LES inativo. Esses anticorpos também têm grande
valor prognóstico e assim, a monitorização dos seus níveis séricos é bastante relevante
no acompanhamento clínico do paciente. A recente introdução de terapia biológica com
anticorpos monoclonais anti-TNF alfa na artrite reumatóide tem mostrado, no entanto,
que anticorpos anti-dsDNA podem ser detectados eventual e transitoriamente nos
pacientes que receberam essa medicação.

Anticorpos antinucleossoma ou anticromatina: nos últimos anos tem se fortalecido a


relevância dos anticorpos anticromatina ou nucleossoma, que é um complexo
macromolecular constituído por um octâmero de histonas ao redor do qual se dispõe a
molécula de dsDNA. O método de escolha para a sua detecção é a técnica de ELISA
empregando complexo de DNA/histonas.
Significado clínico: Anticorpos antinucleossoma (ANucl) estão presentes em 75-88%
dos pacientes com LES e universalmente naqueles com lúpus induzido por droga. Estes
anticorpos são associados à atividade clínica e renal do LES sendo sua pesquisa útil no
diagnóstico e monitoramento da atividade do lúpus particularmente nos pacientes que
são negativos para anticorpos anti-dsDNA. Os ANucl são especialmente prevalentes nos
pacientes com nefrite lúpica sendo também detectados mais precocemente que os
anticorpos anti-dsDNA.
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Anticorpos anti-histonas: os anticorpos anti-histonas (H1, H2A, H2B, H3 e H4) são


bastante heterogêneos com relação sua especificidade antigênica: alguns reconhecem as
histonas isoladamente (um único ou vários tipos de histona) ou complexos histona-
histona ou ainda histona-DNA (cromatina). Esses anticorpos podem ser detectados por
ELISA ou immunoblotting.
Significado clínico: Cerca de 30-70% dos pacientes com LES têm anticorpos anti-
histona. Mas eles podem estar presentes numa variedade de outras doenças auto-
imunes ou infecciosas crônicas. Sua presença é, no entanto, relevante no diagnóstico da
síndrome do lúpus induzido por droga (procainamida, hidralazina, isoniazida e D-
penicilamina) sendo sua prevalência >95% nesses pacientes.

Anticorpos anti-ENA (Extractable Nuclear Antigens): os auto-anticorpos anti-ENA são


dirigidos às ribonucleoproteínas Sm, RNP, Ro e La bem como às enzimas topoisomerase
I (Scl-70) e sintetase-1,2-de histidil-tRNA (Jo-1).

x Anticorpos anti-Sm e anti-RNP: são comumente detectados por hemaglutinação


passiva, imunodifusão dupla em gel ou contra-imunoeletroforese empregando extratos
de timo ou baço como fonte de antígeno. Os anticorpos anti-Sm são altamente
específicos do LES e estão incluídos nos critérios de diagnóstico da doença. Sua
prevalência no LES é de 15-30% e geralmente estão associados aos anticorpos anti-
RNP. Sua presença, no entanto, não está associada a alguma manifestação clínica em
particular. Por outro lado os anticorpos anti-RNP podem estar presentes num amplo
espectro de doenças reumáticas (LES, esclerose sistêmica e síndrome de Sjögren).
Entretanto, quando presentes isoladamente e em altos títulos, fazem parte dos critérios
de diagnóstico da doença mista do tecido conjuntivo (DMTC). Sua presença no LES
não está associada a nenhuma manifestação ou sintoma clínico em particular, com
exceção do fenômeno de Raynaud.

x Anticorpos anti-Ro e anti-La: são determinados por imunodifusão dupla, contra-


imunoeletroforese e ELISA. Podem ser detectados no soro de pacientes com síndrome
de Sjögren (60-75%), LES (25-50%) e na síndrome do lúpus neonatal (>95%). A
determinação dos anticorpos anti-Ro é de interesse e significado no diagnóstico clínico
do LES quando da ausência de outro marcador sorológico (anticorpos anti-dsDNA e
anti-Sm) bem como no diagnóstico da Síndrome de Sjögren (SS) podendo ser
detectados isoladamente ou associados mais freqüentemente ao auto-anticorpo anti-
La. Na síndrome do lúpus neonatal os anticorpos anti-Ro estão associados ao bloqueio
cardíaco e/ou manifestação cutânea do recém nascido. O anticorpo anti-La apresenta
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uma alta especificidade de diagnóstico para a Síndrome de Sjögren fazendo, portanto,


parte do critério para sua classificação. Nos casos de SS primária o anticorpo anti-La
aparece em cerca de 40% dos pacientes e no LES em 6-15% dos casos. A
identificação do anticorpo anti-La é um achado sorológico estável já que seus níveis
séricos não parecem flutuar no curso da doença. Além disso, este anticorpo é
detectado quase que tão somente nos pacientes que são anti-Ro positivos, mas o
inverso não é verdadeiro.

x Anticorpos anti-Scl-70 e anti-Jo-1: os métodos de escolha para a determinação


desses auto-anticorpos são imunodifusão dupla em gel, immunoblotting e a técnica de
ELISA. O anticorpo anti-Scl-70 é considerado marcador diagnóstico da esclerose
sistêmica sendo encontrado em 60% dos pacientes com a forma cutânea difusa da
doença. Quando presente indica maior risco de desenvolvimento de fibrose pulmonar
nesses pacientes. Já o anticorpo anti-Jo-1 é considerado marcador sorológico de um
subgrupo de polimiosite inflamatória idiopática no adulto particularmente naqueles com
quadro de doença pulmonar intersticial, fenômeno de Raynaud, mãos de mecânico e
artralgia, denominada síndrome anti-sintetase. Cerca de 30% dos pacientes adultos
com polimiosite são anti-Jo-1 positivos e essa freqüência é maior (60%) naqueles
pacientes com comprometimento intersticial pulmonar.

Anticorpos anticentrômero: os antígenos alvo são proteínas constitucionais


centroméricas e a ligação dos anticorpos pode ser evidenciada por IFI em células HEp-2
em fase de divisão. Esse é um dos raros casos onde a IFI é o método de escolha para a
detecção dos anticorpos específicos, sem a necessidade de caracterização por outro
teste.
Significado clínico: os anticorpos anticentrômero são específicos de pacientes com a
forma limitada de esclerose sistêmica ou síndrome CREST (calcinose, fenômeno de
Raynaud, alteração motora do esôfago, e esclerodactilia e telangectasia) sendo
detectados numa freqüência de 70%. Por outro lado, são detectados numa menor
freqüência (20%) nos pacientes com a forma sistêmica da ES. Além disso, os pacientes
com fenômeno de Raynaud primário e anti-centrômero positivo podem desenvolver a
síndrome de CREST.

Anticorpos antiproteína P ribossômica: na IFI em células HEp-2 esse anticorpo


apresenta padrão citoplasmático fino e difuso e sua especificidade pode ser confirmada
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10

por immunoblotting. Alternativamente, a técnica de ELISA pode também ser utilizada com
a vantagem de possibilitar a determinação dos seus níveis séricos.
Significado clínico: a presença de anti-P é altamente específica para o diagnóstico de
LES sendo detectados em cerca de 10% desses pacientes, mas essa freqüência
aumenta até 40% naqueles com doença ativa. Há uma forte correlação do anticorpo anti-
P com distúrbios neuropsiquiátricos do lúpus, principalmente psicose e depressão bem
como com hepatite crônica ativa (em crianças com lúpus juvenil) e a glomerulonefrite no
LES.

FAN RESUMO

x A pesquisa de FAN tem relevância na triagem inicial dos pacientes com doenças
reumáticas auto-imunes e seu laudo deve indicar o padrão de fluorescência observado e o
título da reatividade detectada.

x Presença de FAN é mais freqüente no lúpus eritematoso sistêmico, lúpus induzido por
droga e doença mista do tecido conjuntivo. Freqüência variável tem sido observada na
esclerose sistêmica, polimiosite/dermatomiosite, Síndrome de Sjögren, e artrite
reumatóide.

x Os títulos de FAN não se correlacionam com atividade clínica da doença e os padrões de


imunofluorescência, salvo alguma exceção (padrão centromérico), não são específicos de
uma determinada doença.

x A especificidade antigênica do FAN deve ser determinada por métodos específicos


considerando o padrão de fluorescência observado. Dentre os antígenos nucleares e
citoplasmáticos alvos dos auto-anticorpos antinucleares incluem-se: ribonucleoproteínas
(Ro, La, Sm, RNP), ácidos nucléicos (ds/ssDNA), Scl-70, Jo-1, proteína P ribossômica e
histonas.

x Determinados anticorpos antinucleares são marcadores sorológicos de doença: anticorpos


anti-dsDNA, Sm, proteína P ribossômica são específicos do LES, anti-Jo-1 da polimiosite
e anti-centrômero da CREST.

x Alguns anticorpos antinucleares estão associados a uma determinada manifestação


clínica: anti-dsDNA e anticromatina associados à nefrite lúpica; anti-proteína P
ribossômica ao quadro neuropsiquiátrico do LES; anti-Ro e anti-La ao bloqueio cardíaco
congênito da síndrome do lúpus neonatal

x Alguns anticorpos antinucleares são marcadores de atividade de doença, como o anti-


dsDNA e o anti-P ribossômico. Seus níveis merecem ser monitorizados no curso das
doenças.

x A TABELA 2 resume os auto-anticorpos antinucleares mais comumente detectados nas


doenças reumáticas, sua freqüência e a sua especificidade para uma determinada doença
reumática.
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11

TABELA 2. Auto-anticorpos nas doenças reumáticas: especificidade antigênica, freqüência, e


sua especificidade para a doença

Doença Auto-anticorpos
Especificidade Freqüência Especificidade
antigênica (%) para a doença
Lúpus eritematoso dsDNA 50-75a Alta
sistêmico Sm 20-30 Alta
Proteína P ribossômica 10 Alta
Cromatina 75-88a Alta
RNP 30-40 Baixa
Ro e La 35 e 15 Baixa
Histona 30-70 Baixa
ssDNA 80 Baixa
Síndrome do lúpus Ro >95
Alta
neonatal La 90

Esclerose sistêmica forma Scl-70 20-60 Alta


difusa Centrômero 5 Baixa

CRESTb Centrômero (CENP-B) 80-35 Alta

Polimiosite Jo-1 30 Alta

Síndrome de Sjögren Ro 60 Moderada


La 20-40 Alta

Doença mista do tecido RNPc >95 Alta


conjuntivo
Lúpus induzido por droga Histonad 60-80 Baixa

PM/SSce PM/Scl 24 Alta

a
Freqüência de anticorpos anti-dsDNA e anticromatina nos pacientes lúpicos em geral; b
CREST: forma limitada da esclerose sistêmica; c quando isolado e em altos títulos; d anticorpos
anti-histonas em altos títulos; eSíndrome de sobreposição polimiosite e esclerose sistêmica.
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12

FAN QUESTÕES

1. Na análise laboratorial de pacientes com suspeita clínica de LES:


1. A pesquisa de FAN não tem utilidade na elaboração do diagnóstico
a. O teste do FAN é conclusivo não sendo necessária posterior caracterização da sua
especificidade antigênica
b. FAN negativo exclui com certeza o diagnóstico de LES
c. A pesquisa de FAN e de anticorpos anti-dsDNA, anti-Sm, anti-P são úteis na elaboração
diagnóstica do LES
d. FAN com padrão homogêneo associado a anticorpos anti-histona sugere fortemente LES

2. A presença de anticorpos anti-dsDNA:


a. Auxilia no diagnóstico mas tem pouca pouca utilidade no prognóstico do LES
b. Tem valor diagnóstico mas pouca utilidade no monitoramento dos pacientes com LES
c. Deve ser sempre investigada quando o FAN apresenta padrão de fluorescência nuclear
pontilhado
d. Deve alertar para doença renal no LES
e. É muito freqüente no LES e, portanto, é considerado marcador sorológico desta doença
f. Seus níveis séricos são sempre elevados no curso do LES

3. A presença do FAN:
a. Ë exclusivo das doenças reumáticas auto-imunes
b. Em títulos altos não é incomum em indivíduos saudáveis adultos ou em neoplasias
c. É freqüente em pacientes com lúpus induzido por drogas
d. Pode se negativar no curso do LES
e. Deve ser monitorada no curso da doença porque seus títulos flutuam significantemente

4. Consideram-se auto-anticorpos marcadores de doença reumática aqueles que:


a. Estão presentes numa alta freqüência em uma determinada doença
b. Estão presentes em títulos elevados numa determinada doença
c. São específicos de uma determinada doença
d. Estão presentes constantemente no curso de uma doença
e. Estão associados a uma manifestação clínica específica de uma doença

5. Qual das afirmações abaixo é verdadeira:


a. FAN positivo com padrão nuclear pontilhado grosso (anti-RNP) positivo isolado e em altos
títulos é sugestivo de doença mista do tecido conjuntivo
b. FAN positivo com padrão centromérico é sugestivo mas não suficiente para o diagnóstico
da forma lilmitada da esclerodermia
c. FAN positivo com padrão nuclear pontilhado fino e anti-Ro positivo é sugestivo de
Síndrome de Sjögren
d. FAN positivo com padrão nuclear pontilhado grosso e anti-Sm negativo é sugestivo de
LES
e. FAN positivo com padrão pontilhado citoplasmático é específico da polimiosite
RESPOSTAS FAN: 1-d ; 2- d ; 3- c ; 4-c; 5-a.

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA
2. Reichlin M, Harley JB. Antinuclear antibodies: an overview. In: Wallace DJ, Hahn BH, eds.
Dubois´lupus erythematosus. 5th ed. Baltimore: Williams & Wilkins, 1997. 397-405.
3. Viana VST, Bonfa E. Análise Laboratorial em Reumatologia. Yoshinari NH, Bonfa E eds.
Reumatologia para o clínico. 1ª. ed. São Paulo. Editora Roca, 2000. p.223-31.
4. Sheldon J, Laboratory testing in autoimmune rheumatic disease. Best Pract Res Clin Rheumatol
2004; 18:249–69.
5. Viana VST, Bonfa E. Análise Laboratorial em Reumatologia. Lopes AC ed. Tratado de Clínica
Médica. 1ª ed. São Paulo. Roca, 2006. Vol 1: p.1864-71.
6. Shoenfeld Y, Gershwin ME, Meroni PL, eds. Autoantibodies. 2nd ed. Amsterdam. Elsevier, 2007
voltar ao índice

ARTRITE REUMATÓIDE
Iêda Maria Magalhães Laurindo

DEFINIÇÃO

A artrite reumatóide (AR) é uma doença inflamatória crônica de etiologia


desconhecida, caracterizada por artrite simétrica e aditiva das pequenas e grandes
articulações, podendo também apresentar manifestações gerais e envolvimento de outros
órgãos e sistemas.

EPIDEMIOLOGIA

A AR pode ocorrer em qualquer faixa etária, sendo mais freqüente na quarta


década, com prevalência de cerca de 0,5% a 1%. Sua incidência é maior no sexo
feminino (3.1), sendo que dados recentes tanto dos outros países da América Latina
como do Brasil apontam para uma proporção ainda maior de mulheres, cerca de 6-7 para
1. A existência de uma predisposição genética é sugerida pela associação com
antígenos de histocompatibilidade de classe II, o HLA-DR4 e DR-1.

PATOGÊNESE

Além da influência genética acredita-se que fatores hormonais e ambientais, como o


fumo, também contribuam para o risco da doença.

A participação da imunidade celular seria responsável pela cronicidade do processo


através de uma resposta imunológica envolvendo as células T, particularmente células T
auxiliadoras e a ativação de monócitos, macrófagos e outras células presentes na
articulação (sinoviócitos, condrócitos, células endoteliais e osteoblastos) capazes de
produzir citocinas. A participação dos linfócitos T auxiliadores (CD4) reconhecendo
peptídeos antigênicos apresentados pelas células dendríticas (ou outras células
apresentadoras do antígeno como linfócito B) no contexto do complexo maior de
histocompatibilidade tem sido destacada com passo fundamental na passagem de uma
resposta inespecífica (imunidade inata) para a específica e, no caso da AR, o
desencadeamento de uma resposta não adequadamente controlada, responsável pela
cronicidade desta doença. No líquido e tecido sinovial de pacientes com AR foi
identificada a presença de citocinas, principalmente as de origem predominantemente
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macrofágica como IL-1 (interleucina-1), e TNF (fator de necrose de tumores) além de


muitas outras como IL-2, IL-6, IL-8, IL-15, IL-18 e fator estimulador de colônias de
macrófagos-granulócitos (MCSF), de granulócitos (GCSF), fator de crescimento derivado
de plaquetas (PDGF) e derivado do endotélio (VEGF). Estas citocinas são capazes de
atuar, direta ou indiretamente, sobre linfócitos, polimorfonucleares, fibroblastos,
condrócitos, osteoblasto, e células endoteliais, sugerindo uma ampla interação celular na
patogênese da AR. É possível também que a deficiência de inibidores, como do inibidor
de IL-1, de IL-2, de TNF, associada à superprodução de citocinas contribua de maneira
decisiva para a cronicidade do processo inflamatório.

Em resumo o fator etiológico que desencadeia a AR não é conhecido. Acredita-se


que um possível agente infeccioso, viral ou bacteriano inicie este processo em indivíduos
geneticamente predispostos, em condições ambientais favoráveis. A artrite reumatóide
seria inicialmente decorrente de uma resposta imunológica dirigida contra este antígeno
não identificado, perpetuando-se através das interações celulares e da secreção local de
citocinas e de fatores de crescimento em um processo inflamatório crônico. A patogênese
da AR encontra-se ilustrada na FIGURA 1.

FIGURA 1. Fatores desencadeantes da AR

PATOLOGIA

A membrana sinovial, inicialmente edemaciada com vasodilatação e exudato rico em


polimorfonucleares, torna-se espessada, com vilosidades, infiltrada por grande número
de linfócitos (chegando mesmo a formar verdadeiros folículos), plasmócitos e monócitos.

Observa-se proliferação das células de revestimento da membrana sinovial,


aparecimento de fibrose e tecido de granulação (pannus, constituído principalmente por
células semelhantes a macrófagos e fibroblastos), capaz de destruir a cartilagem e o
osso subcondral por mecanismos diretos (secreção de enzimas proteolíticas-
metaloproteases estromelisina e colagenase) e indiretos (secreção de citocinas).
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As erosões ósseas, características da AR, mais precoces e importantes ocorrem junto à


margem da articulação, onde a cartilagem termina e a cápsula articular se liga ao tecido
ósseo. Nestes pontos o osso é recoberto pela membrana sinovial, que se dirige do
periósteo para revestir a porção interna da cápsula articular.

O processo inflamatório enfraquece a cápsula articular e os ligamentos. A combinação de


destruição articular, ineficiência das estruturas de suporte,atrofia muscular, desbalanço
de grupos musculares opostos resulta na instabilidade articular e subluxação. Inflamação
persistente nas bainhas dos tendões pode causar seu enfraquecimento e ruptura.

Os nódulos reumatóides, são formados por uma área central de necrose e restos
celulares, cercada por várias camadas de células monocíticas em paliçada. Na periferia
encontra-se infiltração de linfócitos e monócitos.

QUADRO CLÍNICO

Na maior parte dos doentes a AR se manifesta de forma insidiosa, com quadro


prodrômico de várias semanas de evolução, caracterizado por fadiga, fraqueza, mal-
estar, enrijecimento articular, artralgias e mialgias vagas. Desde seu inicio o quadro
clínico é geralmente poliarticular (75% dos casos), envolvendo especialmente as
pequenas articulações das mãos e pés O padrão do envolvimento articular é simétrico e
aditivo na maioria dos doentes. A AR pode se manifestar também de forma aguda, com
febre, manifestações sistêmicas importantes e quadro poliarticular.

Exame físico

As articulações se apresentam quentes, dolorosas, edemaciadas. A membrana


sinovial se torna palpável como um tecido de consistência semelhante ã borracha junto
às margens articulares, observando-se atrofia da musculatura próxima à articulação
afetada. Ocorre limitação à movimentação articular, principalmente aos movimentos de
extensão, com o desenvolvimento de contraturas em flexão e eventualmente anquilose
fibrosa e óssea. Termos como "dedos em pescoço de cisne", em "casa de botão", em
"martelo" são utilizados para descrever as deformidades mais frequentemente
observadas nos dedos das mãos e pés dos pacientes (FIGURA 2 e 3). É característica a
presença de subluxação e desvio ulnar dos dedos.

Articulações mais acometidas

Embora qualquer articulação diatrodial possa ser envolvida, as mais


frequentemente acometidas são as falango-falangeanas proximais, metacarpo-
falangeanas, metatarso-falangeanas, punho, joelho, cotovelo e tornozelo. Enquanto que o
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comprometimento da coluna cervical é comum, a coluna lombar é relativamente poupada.


A subluxação da articulação atlanto-axial é uma complicação séria que pode causar
compressão da medula espinhal pelo processo odontóide com sintomas e sinais
clássicos como disfunção de bexiga, incotinência esfincteriana, etc. Raramente pode ser
causa de óbito. As articulações têmporo-mandibular e, mais raramente, crico-aritenóide
podem também ser acometidas causando respectivamente dor à mastigação e
rouquidão.

Sinovite nos tendões dos punhos pode causar compressão especialmente do nervo
mediano com o desenvolvimento da síndrome do túnel do carpo.

O aparecimento de cistos sinoviais pode ocorrer em qualquer articulação, embora


seja mais comum associado à sinovite dos joelhos (cisto de Baker). O cisto é formado a
partir da herniação ou ruptura da sinóvia posteriormente através da cápsula articular ou
da comunicação da cavidade articular com a bursa semimembranosa.

A
MTC IFD

IFP

IFP
normal
B

MTC IFD

C
IFD

MTC IF

MCF = articulação metacarpo-falangeana; IFP = articulação interfalangeana proximal; e IFD = interfalangeana distal

FIGURA 2. Deformidades características da AR: A – Dedo em”pescoço de cisne” (hiperextensão


das IFP e flexão das IFP); B – dedo em “casa de botão” (flexão das IFP e hiperextensão das IFD) ;
C – dedo em martelo (flexão das IFD); D – desvio ulnar dos dedos
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FIGURA 3. Mão reumatóide típica: sinovite nos punhos e articulações


metacarpo-falangeanas, atrofia dos músculos interósseos, desvio
ulnar dos dedos, e subluxação do polegar tipo “dedo em caroneiro”.

Rigidez matinal

Durante os períodos de atividade articular os pacientes geralmente referem a


sensação de enrijecimento ou inchaço das articulações das mãos ao levantar pela
manhã, que melhora com a movimentação. Esta sensação constitui a chamada rigidez
matinal cuja duração é valorizada como índice de atividade clínica. Acredita-se que seja
decorrente do maior acúmulo de líquido na articulação inflamada durante o repouso
noturno, melhorando com o aumento da drenagem decorrente da movimentação. Na AR,
a rigidez matinal geralmente é superior a 60 minutos.

Manifestações extra-articulares

Nódulos reumatóides

São encontrados em aproximadamente 25% dos pacientes e sua localização mais


freqüente é no tecido subcutâneo em áreas de pressão, particularmente na face
extensora dos cotovelos, podendo estar aderidos ao periósteo. Podem aparecer no dorso
dos dedos e sobre tendões. Não são dolorosos, apresentando consistência fibrosa,
raramente cistica, à palpação. Embora seu aparecimento não mantenha uma correlação
com a atividade clínica articular, geralmente são manifestação de forma mais agressiva
da doença e com FR positivo.
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Vascular

O acometimento da vasa nervorum pode causar neuropatia periférica com


comprometimento sensorial e motor. Vasculite peri-ungueal, gangrena digital, úlceras em
membros inferiores e quadros cutâneos eritemato-urticariformes podem ocorrer..

Ocular

A manifestação mais comum é a ceratoconjuntivite seca (como parte da


síndrome de Sjögren) observada em cerca de 15% dos pacientes. Ocasionalmente
ocorre esclerite e mesmo episclerite que pode evoluir com a formação de um
verdadeiro nódulo reumatóide, que eventualmente perfura a esclera (escleromalacia
perfurante).

Pulmonar

As manifestações pulmonares da AR são variadas, podendo-se observar fibrose


intersticial difusa, nódulos solitários ou múltiplos no parênquima pulmonar, e derrame
pleural, raramente com manifestações clínicas importantes. A síndrome de Caplan,
descrita originalmente nos mineiros de carvão de Welsh, é simplesmente a associação
da AR e nódulos pulmonares múltiplos (granulomas reumatóides) em pacientes com
pneumoconiose.

Cardíaco

Sinais ou sintomas clínicos de comprometimento cardíaco são raros, embora


seja relativamente freqüente a presença de pericardite nos estudos de autópsias (mais
de 50% dos casos). Atualmente, está amplamente reconhecida o aumento da
incidência de doenças cardiovasculares nos pacientes reumatóides, sendo a doença
coronariana uma das principais causas de morte prematura nestes casos.

Hematopoiético

Esplenomegalia pode ser observada em 10% dos pacientes. Linfoadenopatia


generalizada ou regional, próxima à articulação envolvida, pode estar presente.
Anemia (de doença crônica) é um achado freqüente.

Outras manifestações

Ocasionalmente observa-se o desenvolvimento de amiloidose, e conseqüente


insuficiência renal, nos pacientes com doença de longa evolução.

A associação de AR, esplenomegalia e neutropenia recebe o nome de Síndrome


de Felty, que eventualmente (15%) acomete pacientes com doença de longa
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evolução. Anemia e trombocitopenia podem ocorrer, bem como vasculite manifestada


como úlceras nos membros inferiores e neuropatia periférica. Infecções freqüentes e
graves podem ser complicação da neutropenia acentuada. .

Doença de Still

Uma das formas clínicas da Artrite Crônica Juvenil, pode acometer adultos, com
febre geralmente alta e intermitente como manifestação clínica inicial da doença.
Poliartralgias, milagias, rash máculo-papular evanescente, pericardite, pneumonite, dor
de garganta, linfoadenopatia, esplenomegalia, e dor abdominal são outras
manifestações desta variante da doença. Deformidades articulares raramente ocorrem
e os testes laboratoriais para FR e anticorpos antinucleares são negativos.

Síndrome de Sjögren

Classicamente é caracterizada pela tríade xeroftalmia (ceratoconjuntivite seca),


xerostomia com ou sem aumento das glândulas salivares e a presença de uma
doença do conjuntivo, geralmente AR. Seu tratamento inclui sintomáticos (colírio de
metilcelulose, uso de balas ou chicletes sem açucar) e medicação adequada para a
conectivopatia associada.

Curso clínico

A evolução da AR é extremamente variável e imprevisível. Exacerbações e


remissões espontâneas são características, salientando-se porém que as remissões
tendem a ocorrer no início da doença. Aproximadamente 10 a 20% dos pacientes
apresentam remissão completa ou evoluem com uma forma branda que requer pouca
ou nenhuma medicação. Por outro lado, outros 10% dos pacientes sofrerão com uma
doença agressiva, deformante, acabando por ficar confinados à cadeira de rodas ou
ao leito. A maior parte dos pacientes evolui com uma forma intermediária.
Aparentemente existem alguns elementos sugestivos de pior prognóstico como
persistência de altos títulos de FR, presença de nódulos reumatóides ou vasculite.

Exames laboratóriais

Anemia normocrómica, hipocrômica é frequentemente observada durante os


períodos de atividade clínica da AR. Os níveis séricos de ferro são baixos, mas a
capacidade total de ligação é normal.

A velocidade de hemossedimentação (VHS) habitualmente está elevada durante


a atividade da doença e a dosagem da proteina C reativa é frequentemente positiva.
Apesar da sua inespecificidade, estes exames são recomendados para o
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acompanhamento da atividade clínica da doença, sendo que a sua normalização é um


dos sinais da eficácia da terapêutica instituída.

O teste do FR realizado através da aglutinação de partículas de látex é positivo


na maioria dos pacientes (80%). Apenas o FR da classe IgM é avaliado com a
utilização das técnicas habituais (Látex e Waaler-Rose ou nefelometria), A detecção
de FR tipo IgG e IgA é feita apenas em pesquisas.

O FR, embora presente na maior parte dos pacientes já no primeiro ano de


doença, acompanhando ou precedendo as manifestações clínicas, não é específico.
Pacientes com doenças não-reumatológicas, geralmente de natureza infecciosa como
tuberculose, lepra, sífilis, endocardite, bacteriana subaguda, parasitoses, influenza,
hepatite víral, mononucleose podem apresentar FR positivo. A presença do FR
também é observada em outras doenças reumatológicas e ainda na fibrose pulmonar
idiopática, pneumoconiose, sarcoidose, púrpura hipergamaglobulinêmica,
crioglobulinemia mista, macroglobulinemia de Waldenstrom, hepatite crônica ativa,
cirrose, linfoma, transplantes renais, e transfusões de sangue repetidas. Estudos
populacionais com indivíduos saudáveis, demonstraram a maior prevalência do FR
com a idade, atingindo 40% em populações com mais de 60 anos, embora com títulos
baixos, próximos dos limites superiores da normalidade.

Concluindo, pode-se afirmar que a ausência do FR não exclui a AR nem a sua


presença garante este diagnóstico; é um exame que deve ser sempre interpretado em
função do quadro clínico.

Recentemente foram descritos os anticorpos anti-peptídeos citrulinados. Embora


a citrulinação de peptídeos ocorra em diferentes condições, a resposta imunológica
contra tais peptídeos parece ser específica da AR. Através de testes laboratoriais
(Anti-CCP) estes anticorpos podem ser avaliados e, embora ainda em estudo,
recomenda-se sua pesquisa nos pacientes com suspeita clínica de AR e FR negativo.

Anticorpos contra antígenos nucleares (FAN) estão presentes em 20 a 60% dos


pacientes. Os níveis de complemento sérico são normais ou discretamente elevados.

Radiografia

Recomenda-se sempre solicitar radiografias de mãos e pés. Nas fases iniciais da


doença observa-se apenas aumento de partes moles e porose justa-articular. A seguir
surgem erosões na margem das articulações, particularmente nas 4ª e 5ª articulações
metatarso-falangeanas e face radial da 1ª e 2ª metacarpo-falangeanas e falango-
falangeanas proximais e também no processo estilóide da ulna. À medida que ocorre
destruição da cartilagem, observa-se diminuição do espaço articular. Com a
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progressão da doença aparece destruição do osso subcondral e osteoporose difusa.


Anquilose óssea e subluxações são comuns nos quadros mais avançados. É
conveniente lembrar que o envolvimento da coluna cervical pode causar subluxação
atlanto-axial detectada através de radiografias realizados com a coluna em flexão e
extensão.

DIAGNÓSTICO

O diagnóstico da AR é facilmente realizado diante de um quadro de poliartrite


simétrica e aditiva, compromentendo principalmente as pequenas articulações das
mãos e pés, com nódulos, FR positivo e alterações radiográficas definidas. Entretanto,
o paciente que se apresente com história de fadiga e artralgia, poderá estar tanto na
fase inicial da AR como com um quadro depressivo. Artralgias e artrites de grandes e
pequenas articulações podem acompanhar doenças virais, especialmente na fase
prodrômica, particularmente da rubéola e hepatite B e ainda mononucleose e quadros
associadas a coxsackie e ecovirus. A artrite da febre reumática e a associada aos
gonococos, podem ser diagnósticos diferenciais importantes.

Outros tipos de artrite inflamatória merecem ser considerados, especialmente


diante do paciente com doença mono ou oligoarticular e assimétrica. Artrite reativa,
espondilite anquilosante, artropatia psoriática, lupus eritematoso sistêmico, e artrites
associadas a doenças gatrointestinais devem ser parte do diagnóstico diferencial.
Osteoartrose é facilmente distinguível da AR, exceto em sua forma erosiva, nas quais
há frequentemente envolvimento das articulações falango-falangeanas proximais e
distais. O achado de um teste FR positivo em um indivíduo idoso não implica
necessariamente no diagnóstico de AR, uma vez que indivíduos saudáveis podem
apresentar FR positivo, especialmente em baixos títulos.

O diagnóstico definido da AR depende principalmente da presença de


manifestações clínicas características e da exclusão de outras artrites inflamatórias. É
um diagnóstico clínico; exames de laboratório e imagem podem contribuir reforçando a
suspeita clínica.

TRATAMENTO

Medidas gerais

Uma vez estabelecido o diagnóstico, deve-se ter certeza de que o paciente e sua
família compreendam claramente a natureza crônica e incapacitante da doença (ainda
que temporariamente, durante os períodos de maior atividade articular). O objetivo do
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tratamento é manter a capacidade funcional do paciente e para tanto deve-se reduzir a


inflamação e a dor, manter a movimentação e força articular, prevenir e corrigir
deformidades. A utilização adequada de repouso, drogas antiinflamatórias, talas,
fisioterapia e cirurgia ortopédica têm o propósito de preservar a função articular. O
repouso, e curtos períodos de descanso durante o dia assim como noites bem
dormidas, é importante adjuvante terapêutico.

Tratamento medicamentoso

Recomenda-se que todos os pacientes sejam tratados com medicamentos


modificadores do curso da doença (MMCD), um grupo de drogas farmacologicamente
não relacionadas, que teriam a propriedade de interferir com a AR, alterando o seu
curso clínico e, mesmo induzindo remissão. Como seu efeito só é observado
decorridas algumas semanas de uso regular, na tentativa de melhorar os sintomas
pode-se utilizar analgésicos e anti-inflamatórios nas doses recomendadas e com
atenção aos efeitos adversos, particularmente nos idosos e em pacientes com
insuficiência cardíaca, doenças cardiovasculares, cirrose com ascite, diabetes e uso
crônico de diuréticos.

Estes medicamentos (MMCD) incluem antimaláricos (cloroquina 3-4mg/kg/dia e


hidroxicloroquina – 6mg/kg/dia), sulfassalazina (0,5a1g, 2 ou 3 vezes/dia), metotrexato
e leflunomide (20mg/dia). A azatioprina (1-2mg/kg/dia) e a ciclosporina (2,5mg a
4mg/kg/dia) são utilizadas em situações específicas devido à baixa relação
eficácia/efeitos adversos.

Recomenda-se a utilização de antimaláricos e sulfassalazina para casos mais


leves ou com dúvida diagnóstica, enquanto que metotrexato é considerado o
medicamento de primeira escolha (10 a 25mg uma vez por semana – controles
hematológicos e hepáticos a cada um-dois meses) empregado de forma isolada ou
associada aos outros MMCD, particularmente a sulfassalazina e/ou cloroquina e o
leflunomide.

O uso de corticosteróide deve ser reservado para aqueles casos de difícil


controle, principalmente em pequenas doses (até no máximo 7.5 mg de
prednisona/dia) enquanto se aguarda o efeito de um MMCD.

Um número crescente de estudos tem demonstrado que o tratamento iniciado


precocemente, preferencialmente dentro dos primeiros seis meses de sintomas,
idealmente dentro das primeiras 12 semanas tem melhor resultado, mais
possibilidades de induzir remissão e melhor prognóstico. Admite-se inclusive iniciar o
tratamento diante de forte suspeita clínica sem que o diagnóstico esteja
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completamente estabelecido. Nesta fase inicial a consulta ao reumatologista pode


fazer toda a diferença em termos de um tratamento mais adequado e conseqüente
prevenção de deformidades. É igualmente importante o acompanhamento freqüente
do paciente pelo menos acada três meses para ajustes de doses e eventual troca de
medicação.

Recentemente, baseado nos avanços na compreensão da fisiopatologia da


doença e nas técnicas de biologia molecular, surgiu um novo grupo de medicamentos
os chamados agentes biológicos: inibidores da citocina TNF ( Infliximabe, etanercepte
e adalimumabe) , inibidores de IL-1 (anakinra- não disponível no Brasil), depletores de
linfócitos B ( rituximabe) e moduladores da atividade de linfócitos T ( abatacept-
inibidor da co-estimulação). Tanto pelos seus efeitos imunossupressores e como
também pelo alto custo são recomendados apenas para pacientes resistentes às
forma clássicas de tratamento.

Em resumo, o tratamento da AR deve ser iniciado o mais cedo possível;


Metotrexate é considerado a medicação padrão. Corticosteróides só devem ser
utilizados em situações especiais e pelo menor tempo possível. O uso dos novos
agentes biológicos deve ser reservado aos pacientes que não responderam às formas
mais convencionais de tratamento.

Fisioterapia

Esta forma de tratamento tem um importante papel em todas as fases da


doença. Calor local alivia o espasmo muscular e reduz a rigidez. Exercícios passivos
ajudam a prevenir ou minimizar a perda de função. Exercícios isométricos aumentam a
força muscular e contribuem para a manutenção da estabilidade articular. O uso de
talas noturnas é importante para prevenir contraturas em flexão, especialmente dos
joelhos e punhos. Avaliação e orientação da rotina em casa e no trabalho e o uso de
adaptadores certamente aumenta a habilidade do paciente em manter atividade
independente.

Cirurgia ortopédica

A correção de deformidades e estabilização das articulações contribui para a


melhora da capacidade funcional. A remoção da sinóvia pode prevenir ruptura de
tendões e auxiliar a manutenção de função. Subluxação da articulação atlanto-axial
com compressão medular implica em estabilização cirúrgica. A utilização de proteses
de quadril, joelho, cotovelo, metacarpo e interfalangeanas é procedimento freqüente,
oferecendo novas possibilidades de recuperação de função.
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ARTRITE REUMATÓIDE RESUMO

Epidemiologia
x Idade: incidência – adultos com qualquer idade, com pico em torno dos 40 anos
x Prevalência da artrite reumatóide: 0,5 a 1,0 %
x Sexo: mulheres 3:1 homem (dados internacionais); 6-7:1 na América Latina e no Brasil

Fisiopatologia
1. Etiologia desconhecida;
2. A membrana sinovial das articulações é o local primariamente afetado;
3. Processo inflamatório crônico, envolvendo uma complexa rede de:
x Interações celulares, particularmente células apresentadoras de antígeno (células
dendríticas e outras), linfócitos T auxiliadores CD4, macrófagos e fibroblastos, mas
também neutrófilos, plaquetas, células endoteliais, condrócitos e osteoblastos;
x Mediadores químicos incluindo prostaglandinas, leucotrienos e citocinas,
particularmente, quimiocinas, Fator de Necrose Tumoral (TNF), interleucina 1 (IL-1) e
interleucina 6 (IL-6).
x Autoanticorpos como fator reumatóide;
4. Participação de fatores ambientais e hormonais;
5. Fatores genéticos.

Quadro Clínico
1. Manifestações articulares
x Poliartrite crônica acometendo grandes e pequenas articulações de forma simétrica e
aditiva.
x Caracteristicamente afeta as articulações das mãos e pés, poupa o esqueleto axial
(exceto a coluna cervical).
x Quadro crônico com evidentes sinais inflamatórios: dor, calor local, aumento de volume
e limitação à movimentação.
x Presença de rigidez matinal com pelo menos uma hora de duração;
x Evolução para deformidade e incapacidade funcional;

2. Manifestações extra articulares


x Gerais: febre, mal-estar, fadiga, perda de peso;
x Nódulos reumatóide – em cerca de 25% dos pacientes, geralmente observados nas
superfícies extensoras das articulações.
x Vascular- vasculite digital, gangrana digital, úlceras nos membros inferiores, neuropatia
periférica (vasa vasorum), quadros cutâneos seriam as manifestações mais
freqüentes.
x Ocular – ceratoconjuntivite seca (S Sjögren), esclerite e episclerite.(escleromalacia
perfurante).
x Pulmonar - fibrose intersticial difusa, nódulos solitários ou múltiplos no parênquima
pulmonar, e derrame pleural.
x Cardíaco – raramente pericardite clínica. Doenças cardiovasculares como causa
freqüente de óbito.
x Hematológico – anemia de doença crônica; eventualmente esplenomegalia e
linfadenomegalia.
x Outras; amiloidose, S de Felty, S de Sjögren , Doença de Still.

Exames complementares
x RX – mãos e pés:
x aumento de partes moles;
x porose justa articular;
x erosões;
x redução do espaço articular;
x subluxações e anquilose
x Tomografia e Ressonância – mais informações sobre cartilagem e partes moles
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x Ultrasonografia - exame ainda em fase de padronização, detecta erosões, presença de


derrame articular e sinovite; particularmente útil nos casos iniciais;
x Laboratório – Fator Reumatóide (FR) positivo (cerca de 80% dos casos)
- Anticorpos anti-peptídeos citrulinados (ainda em fase de estudo; úteis
para diagnóstico nos casos em que o FR é negativo)
- Provas de fase aguda (VHS e PCR) elevadas durante a atividade da
doença;
- Anemia normocítica, normocrômica (doença crônica).
)

Diagnóstico
x Eminentemente clínico
x Radiografia com alterações características (porose justa articular, erosões, redução do
espaço articular)
x FR positivo contribui para o diagnóstico (não é específico ou patognomônico);
x Anti-CCP (anticorpo anti-peptídeos cíclicos citrulinados), mais específico, contribui para
o diagnóstico principalmente nos casos iniciais e com FR negativo.

Tratamento
1. Não medicamentoso:
x Orientações gerais
x Fisioterapia
x Terapia ocupacional
2. Medicamentoso:
Sempre
Instituído no momento do diagnóstico ou de forte suspeita clínica
x DMARDS: metotrexato associado ou não a cloroquina/hidroxicloroquina
como primeira opção;
x Antiinflamatórios não hormonais/analgésicos como sintomáticos;
x Eventualmente corticóide em dose baixa, enquanto se espera a resposta ao
DMARD;
x Novas drogas disponíveis para casos resistentes: inibidores da citocina pró-
inflamatória fator de necrose tumoral, depletores do linfócito B e inibidores da
co-estimulação (moduladores da função de linfócitos T)

ARTRITE REUMATÓIDE QUESTÕES

1) O diagnóstico da artrite reumatóide:


a) Depende da presença do fator reumatóide
b) Só pode ser feito com imagens de erosões na radiografia das mãos
c) É fundamentalmente um diagnóstico clínico
d) Depende da presença de VHS e PCR elevados
e) É imediato, basta FR positivo e a presença de artralgias/artrite.

2) assinale a afirmação correta:


a) Como a artrite reumatóide é uma doença crônica seu tratamento também deve ser instituído
de maneira lenta e gradual
b) Deve-se aguardar pelo menos 6 meses antes de alterar o tratamento de um paciente com
AR, pois este é o tempo necessário para que se tenha certeza da não resposta a qualquer
medicamento
c) Metotrexato é o tratamento padrão ouro para a AR, mas só deve ser administrado a
pacientes com doença erosiva.
d) Todas estão corretas
e) Todas estão erradas
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3) MSM, feminina, 20 anos, procura o reumatologista queixando-se de dor e dificuldade


ao movimento das mãos com piora gradual. Ao exame físico observa-se dor leve nos
punhos e dor leve e edema discreto nas metacarpofalangeanas e 2ª e 3ª falango-
falangeans proximais bilateralmente . Qual a melhor conduta:
a) Solicitar radiografias de mãos e pés e FR para confirmação do diagnóstico de AR;
b) Instituir tratamento pois acredita-se que quando mais precoce o tratamento melhor o
prognóstico;
c) Pedir FAN e complemento pois pode ser LES em fase inicial;
d) Refazer a história clínica
e) Solicitar provas de fase aguda

4) MSM, feminina, 20 anos, estudante de medicina, procura o reumatologista queixando-


se de dor e dificuldade ao movimento das mãos há cerca de uma semana, com piora
gradual. Refere rigidez matinal nos últimos dois dias de cerca de 40 minutos. Nega
quadros virais ou diarréia precedendo o quadro e refere vacinação contra rubéola há 3
semanas. Nega familiares com doenças autoimunes. Nega uso de qualquer
medicamento, bebidas alcoólicas e tabagismo. Nega febre, alopecia, fotosensibilidade e
Raynaud. Nega alterações cutâneas ou fraqueza muscular. Exame físico normal exceto
por dor leve nos punhos, dor leve e edema discreto nas metacarpofalangeanas e 2ª e 3ª
falango-falangeanas proximais bilateralmente. Qual a melhor conduta:
a) Solicitar radiografias de mãos e pés e FR para confirmação do diagnóstico de AR
b) Instituir tratamento pois acredita-se que quando mais precoce o tratamento melhor o
prognóstico
c) Pedir FAN e complemento pois pode ser LES em fase inicial
d) Tranqüilizar e orientar a paciente, prescrever analgesia de demanda, pois provavelmente
se trata de quadro reativo à vacinação
e) Iniciar corticóide e cloroquina

5) PFG, feminina, 20 anos, estudante de medicina, procura o reumatologista queixando-


se de dor e dificuldade ao movimento das mão há mais de um mês, com piora gradual.
Refere rigidez matinal nos últimos 10 dias de cerca de 60 minutos e nos últimos dois
meses cansaço e mal-estar, algumas mialgias, sem febre. Nega quadros virais ou
diarréia precedendo o quadro e refere vacinação contra rubéola há 10 meses. Mãe e tia
com artrite reumatóide em tratamento. Nega uso de qualquer medicamento, Fumante (1
maço/dia) desde os 15 anos. Nega febre, alopecia, fotossensibilidade e Raynaud. Nega
alterações cutâneas ou fraqueza muscular. Exame físico normal exceto por dor leve nos
punhos, dor leve e edema discreto nas metacarpofalangeanas e 2ª e 3ª falango-
falangeans proximais bilateralmente. Qual a melhor conduta:
a) Solicitar radiografias de mãos e pés e FR para confirmação do diagnóstico de AR
b) Instituir tratamento pois acredita-se que quando mais precoce o tratamento melhor o
prognóstico
c) Pedir FAN e complemento para afastar lúpus em fase inicial
d) Todas as acima, além de solicitar exames gerais e sorologias virais adequadas ao
diagnóstico diferencial
e) Pensar em quadro psicossomático

Respostas AR: 1-c; 2-e ; 3-d ; 4-d ; 5-d

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA
1. MELLO, S. B. V., LAURINDO, I. M. M. Inflamação e reparação tecidual In: Tratado de Clínica Médica.1ª ed.São
Paulo : Editora Roca Ltda, 2006, v.I, p. 1571-1579.
2. LAURINDO, I. M. M. Artrite Reumatóide In: Tratado de Clínica Médica.1ª ed.São Paulo: Editora Roca Ltda, 2006, v.I,
p. 1580-1594.
3. LAURINDO, I. M. M., XIMENES, A. C., LIMA, F. A. C., PINHEIRO, G. R. C., BATTISTELLA, L. R., BÉRTOLO, M. B.,
ALENCAR, P., XAVIER, R. M., GIORGI, R. D. N., CICONELLI, R. M., RADOMINSKI, S. C.Artrite Reumatóide:
Diagnóstico e tratamento. Revista Brasileira de Reumatologia 2004; 44:435 – 442.
4. ARNETT FC, EDWORTHY SM, BLOCH DA, et al. The American Rheumatism Association 1987 revised criteria for
the classification of rheumatoid arthritis. Arthritis Rheum. 1988;31:315-324
5. LATIN AMERICAN RHEUMATOLOGY ASSOCIATIONS OF THE PAN-AMERICAN LEAGUE OF ASSOCIATIONS
FOR RHEUMATOLOGY(PANLAR) AND THE GRUPO LATINOAMERICANO DE ESTUDO DE ARTRITIS
REUMATOIDE (GLADAR) - First Latin American Position Paper on the Pharmalogical Treatmente of Rheumatoid
Arthritis – Rheumatology 2006;45: ii5-ii22.
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ARTROPATIAS SORONEGATIVAS

Cláudia Goldenstein-Schainberg
Célio Roberto Gonçalves

As espondiloartropatias englobam um grupo de doenças reumáticas inflamatórias


que afetam primariamente o esqueleto axial e as inserções ligamentares e tendinosas.
Em geral, apresentam aspectos epidemiológicos, patológicos, patogenéticos e clínicos
comuns e caracterizam-se pelo envolvimento das articulações sacroilíacas além de
oligoartrite assimétrica periférica com ausência de fator reumatóide sérico (soronegativa).
Tendência à agregação familiar, acometimento ocular, da pele, de anexos e de mucosas
são comuns, enquanto que envolvimento valvar e pulmonar é extremamente raro.

A etiopatogenia destas condições é pouco conhecida, no entanto mecanismos


multifatoriais genéticos (interação familiar e HLA B27), ambientais e infecciosos parecem
estar envolvidos no desencadeamento das alterações inflamatórias observadas. O HLA-
B27 pode estar presente em até 80 a 90% dos casos de espondilite anquilosante. Em
hospedeiros geneticamente susceptíveis, parece haver interação com antígenos
bacterianos e na artrite psoriática, a ocorrência de um trauma como o estresse emocional
ou psicológico pode estar presente como gatilho para iniciar o quadro clínico.

Conforme as diferentes manifestações articulares, peri-articulares ou extra-


articulares associadas, tais como conjuntivite, uretrite, envolvimento cutâneo, aspectos
radiológicos e a evolução clínica, as diferentes espondiloartropatias são classificadas em
entidades clínicas distintas tais como a espondilite anquilosante (EA), a artrite reativa
(ARe), a artrite psoriásica (APs) e as enteroartropatias. As três primeiras serão
abordadas nesse capítulo

ESPONDILITE ANQUILOSANTE (EA)

Caracteriza-se pelo acometimento do esqueleto axial, das articulações da coluna


vertebral, principalmente as sacro-ilíacas e num grau variável do restante da coluna. Em
menor freqüência, pode haver artrite periférica e manifestações extra-articulares que
podem preceder ou acompanhar o quadro articular. Durante muitos anos recebeu
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sinonímias variadas como Doença de Bechterew, Espondilite Deformante, Espondilite


Rizomélica, Doença de Marie - Strumpell e Espondilite Reumatóide.

Sua distribuição quanto ao sexo, raça e idade não são uniformes, embora seja
mais freqüente nos caucasianos e incida três vezes mais no sexo masculino,
principalmente por volta dos 20 anos de idade. Envolvimento familiar é comum, e a
susceptibilidade para desenvolver a doença na população HLA-B27 positiva é dez vezes
maior. Há baixa incidência de EA em pacientes não caucasianos possivelmente pela
menor freqüência do HLA-B27 nas populações de raça amarela e negra.

Apesar de a EA ser comum, seu diagnóstico precoce é difícil, devido ao baixo


grau de suspeita clínica. A dor lombar é sintoma habitual em torno de 30% dos indivíduos
da nossa sociedade, em algum período da sua vida. No entanto, lombalgia persistente e
de caráter inflamatório é menos freqüente e deve chamar a atenção para a suspeita de
alguma forma de espôndilo-artropatia inflamatória, especialmente a EA.

Alguns pacientes relatam inicialmente dor torácica do tipo pleural, causando


desconforto no leito e distúrbio do sono. Esta dor piora na inspiração e é devida à
tendinite das inserções musculares das várias articulações costo-esternais e costo-
vertebrais. A lombalgia não é bem localizada pelo paciente e pode ser central, na
transição dorso lombar ou nas nádegas com mínima irradiação refletindo acometimento
das articulações sacroilíacas (FIGURA 1). O envolvimento da coluna cervical nesta
entidade atinge as articulações interapofisiárias e os ligamentos, levando a sua fusão
total (FIGURA 1). A dor inicia-se de forma insidiosa e é mais freqüente no período
noturno, acompanhada ou não de febre baixa, perda de peso e fadiga (dor do tipo
inflamatória).

Ao exame físico observa-se perda da lordose lombar e intenso espasmo muscular.


Ao contrário das condições mecânicas da coluna lombar, sua mobilidade está diminuída
em todas as manobras de flexão e movimentos laterais, simetricamente. O grau de
restrição da mobilidade lombar é mensurado pela manobra de Schober. Esta consiste na
medição da amplitude de movimento da coluna lombar, em posição ereta e em flexão
máxima, observando-se dois pontos previamente marcados: o primeiro na transição
lombosacra e o segundo 10 cm acima. Ao solicitar-se ao paciente que flexione a coluna
para frente, realiza-se nova medição, que é então considerada limitada se a variação for
menor ou igual a 5 centímetros.
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FIGURA 1. À esquerda sacro-iliíte bilateral. Nota-se esclerose


periarticular e irregularidade nos bordos. À direita retificação e
anquilose da coluna cervical, decorrente de calcificação ligamentar e
fusão das articulações interapofisárias.

Manifestações oculares podem ser observadas em torno de 20% dos


casos, seja a iridociclite (uveíte anterior) ou episclerite. Mais raramente ocorre
envolvimento cardíaco (3 a 10%) com insuficiência aórtica, alterações de condução ou
cardiomegalia. As manifestações pulmonares de pneumonite intersticial e fibrose
apical pulmonar são raras.

As alterações radiográficas são precocemente reconhecidas pela quadratura


dos corpos vertebrais lombares devido ao processo inflamatório no local das inserções
das fibras externas do anulo fibroso. Os achados tardios compreendem a formação de
pontes de sindesmófitos (neoformações ósseas nas bordas dos corpos vertebrais),
dando o aspecto de espinha em "linha de trem" ou "bambu" (FIGURA 2). A fusão das
articulações sacroilíacas é achado patognomónico.

Não existe prova laboratorial patognomônica para este grupo de doenças. Na


verdade, elas justamente se caracterizam pela ausência de fator reumatóide sérico.
Os parâmetros laboratoriais de atividade inflamatória como a velocidade de
hemossedimentação e a proteína C reativa estão geralmente elevados. A tipagem do
HLA-B27 é positiva em torno de 90% dos casos, mas o teste não define o diagnóstico,
embora possa auxiliar o diagnóstico em alguns casos.
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FIGURA 2. Coluna em “bambu” ou “linha de trem”. Observa-se


calcificações dos ligamentos lombares, incidência em perfil à esquerda
e ântero-posterior à direita.

A abordagem terapêutica abrange cuidados não farmacológicos para evitar


posições viciosas, exercícios respiratórios e uso de medicamentos anti-inflamatórios
não hormonais como naproxeno, indometacina e inibidores seletivos da ciclo-
oxigenase 2, além de drogas de ação lenta como a sulfassalasina. Mais recentemente,
agentes biológicos como os inibidores de fator de necrose tumoral têm mostrado boa
eficácia clínica.

ARTRITE REATIVA (ARe)

Associação entre artrite pós-quadro infeccioso de uretrite foi descrita já em 1818.


Um século depois, foi relatado paciente com a tríade conjuntivite, uretrite e artrite após
um surto de disenteria. A presença de uretrite não gonocócica, artrite e conjuntivite foi
denominada Síndrome de Reiter (SR). Em 1963 esta entidade foi classificada como
uma forma de espondiloartropatia devido a seus aspectos clínicos, epidemiológicos e
imunogenéticos peculiares e atualmente, a terminologia SR tem sido substituída por
artrite reativa (ARe), por envolver um conceito mais genérico. De fato, os critérios
diagnósticos da tríade clássica (uretrite, conjuntivite e artrite) sofreram modificações no
decorrer dos anos devido à identificação de formas completas e incompletas da
doença. Assim, Arnett, em 1979, descreveu a forma incompleta da doença, em que
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artrite periférica assimétrica oligoarticular isolada ou associada a doença inflamatória


ocular (conjuntivite e/ou uveíte anterior aguda) e/ou doença mucocutânea
(queratodermia blenorrágica, balanite circinada, distrofia ungueal e ulceração oral),
preenchia os requisitos necessários para o diagnóstico. Mais tarde, em 1981, a
Associação Americana de Reumatologia, estabeleceu como critério diagnóstico para a
forma definida da síndrome, a presença de artrite periférica com mais de um mês de
duração em associação com uretrite e/ ou cervicite, excluindo-se Espondilite
Anquilosante (EA), Artrite Psoriática ou Psoriásica) (APs), Síndrome de Behçet (BÇ) e
outras doenças reumáticas.

Em 1977, Svejgaard demostrou que 70 a 80% dos pacientes apresentavam o


HLA B27 e estudos imunogenéticos apontam para a interação entre este antígeno e o
agente infeccioso como etiopatogenia provável da ARe. Em surtos epidêmicos de
bactérias relacionadas, 2 a 3% dos pacientes desenvolverão artrite reativa, cuja
incidência é cinco vezes maior no sexo masculino.

Classicamente são conhecidos 2 formas de início da doença. A primeira, pós-


surto disentérico, ocorre uma a três semanas após a infecção, geralmente causada
por Shigella, Salmonella, Campylobacter ou Yersinia enterocolítica. A segunda é a
pós-venérea que aparece duas semanas após episódio de uretrite inespecífica. A
doença pós-venérea acomete o sexo masculino numa freqüência aproximadamente 15
vezes maior que no sexo feminino, entre a 2ª e 3ª décadas de vida com predomínio
em caucasianos, ressaltando-se que, a dificuldade de diagnóstico de cervicite e
uretrite no sexo feminino pode colaborar para essa diferente distribuição entre os
sexos. Os agentes implicados no desencadeamento desta doença pós-venéra são as
formas T do Mycoplasma ou da Chlamydia trachomatis.

A artrite ocorre geralmente 2 a 6 semanas após o estimulo infeccioso e


manifesta-se por ínicio abrupto de oligoartrite ou poliartrite assimétrica, predominante
de membros inferiores joelhos e tornozelos. O achado de "dedos em salsicha"
(dactilite), inchaço ou hipersensibilidade dolorosa da região da inserção do tendão do
calcâneo ou da fáscia plantar e dor lombar caracterizada por sacro-iliíte são
manifestações articulares consideradas típicas de ARe.

Conjuntivite não infecciosa unilateral ou bilateral é a manifestação mais


comumente observada (40%), sendo precoce e transitória. Outras lesões inflamatórias
oculares menos comuns são uveíte, epiesclerite e ulceração de córnea. A uretrite é a
manifestação geniturinária mais freqüente seguida da balanite, cistite, prostatite e
cervicite, sendo a cistite mais freqüente nas mulheres. A balanite circinada é a mais
freqüente das manifestações mucocutâneas aparecendo em 25 a 50% dos pacientes,
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seguida das lesões psoriasiformes e da queratodermia (lesões palmoplantares)


podendo acometer pele e unhas além das úlceras orais (aftas).

Febre, perda de peso e linfoadenopatia assim com acometimento sistêmico


podem ocorrer, seja do coração com alterações do sistema de condução ou aortite
levando a insuficiência aórtica ou envolvimento neurológico central e periférico.

O achado laboratorial mais significativo é a presença do antígeno HLAB27 em


80% dos pacientes, sendo que os indivíduos que possuem este antígeno, apresentam
20% de chance de desenvolver a doença após estímulo infeccioso. Outros paramêtros
laboratoriais (provas inflamatórias) podem estar presentes, porém são inespecíficos.

Avaliação radiográfica revela periostite comum às entesopatias e ou sacroiliíte


e sindemósfitos geralmente assimétricos (FIGURA 3).

FIGURA 3. Tomografia de sacro-ilíacas, mostrando acometimento bilateral e assimétrico


(esclerose marginal ilíaca e sacral e erosões ósseas). À direita esporão hipertrófico
plantar.

O curso clínico pode ser de um surto isolado ou vários episódios e tendência à


cronificação.

A terapêutica vai ser orientada conforme a evolução clínica e dependerá do tipo


de envolvimento seja ele predominante axial ou periférico. Tetraciclina é boa opção
para tratamento de uretrite. Antiinflamatórios não hormonais são usados para o quadro
articular; corticoesteróides tópicos podem ser necessários para controlar
manifestações mucocutâneas e oculares. Sulfassalazina, methotrexate ou azatioprina
são úteis nos casos de surtos freqüentes ou curso crônico.
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ARTRITE PSORIÁSICA (APs)

A Artrite Psoriásica (APs) afeta mais a caucasianos, com prevalência na


população geral de 1-2 %. A psoríase cutânea isolada incide em 1 a 3% da população
mundial, e sua associação com artrite pode ocorrer em até 10 a 42% dos indivíduos.
Em cerca de 75% dos casos, o quadro cutâneo precede a artrite, em 15% são
concomitantes e em 10% dos casos, a doença articular precede a psoríase. Em geral
a psoríase cutânea aparece na segunda ou terceira décadas de vida, e o quadro
articular duas décadas após. O pico de incidência da artrite ocorre entre 30 e 50 anos,
com freqüência similar em ambos os sexos, apesar da forma espondilítica afetar 3 a 5
vezes mais homens do que mulheres.

Sua etiopatogenia parece sofrer influências ambientais, infecciosas e


imunogenéticas com aumento de incidência do HLA B27, DR4, DR38 e DR7 nas
formas espondilíticas, erosiva e periférica, respectivamente. Traumas, estresse
emocional ou psicológico, podem desencadear o inicio da doença.

Alterações da imunidade celular e níveis elevados de anticorpos circulantes


dirigidos contra staphilococcus e streptococcus, reforçam a noção de que seja uma
artrite reativa à flora microbiana presente na placa psoriásica de indivíduos
geneticamente susceptíveis. Há infiltrado de linfócitos T e outras células inflamatórias
além de expressão aumentada de citocinas inflamatórias como fator de necrose
tumoral, IL-1, IL-6 e IL-18 no tecido sinovial, no soro e na placa destes pacientes.
Além das lesões eritemato descamativas na pele manifestações inflamatórias
nas articulações e partes moles adjacentes com rigidez, dor, e edema particularmente
nas pontas dos dedos das mãos e pés são características.
Conforme Moll e Wright a artrite psoriásica é classificada em 5 subgrupos. As
formas clínicas da doença são:

1. Clássica afetando 5-10% dos pacientes


2. Mutilante em 5%
3. Espondilítica em 5-40%
4. Oligoartrite assimétrica em 70%
5. Poliartrite simétrica similar a artrite reumatóide em 25% dos casos.
Entretanto, estudos subseqüentes revelam uma grande variação nestas
incidências, entre 1-17% para a forma clássica, 2-16% para a mutilante, 2-27% para a
espondilítica, 16-70% para a oligoartrite assimétrica e 15-78% para a forma ‘’AR-like’’.
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Na forma clássica há envolvimento das interfalangeanas distais das mãos e pés e


geralmente acompanha-se de lesões ungueais caracterizadas por estrias transversas,
"pitting nails" e hiperqueratose subungueal. A artrite mutilante é a forma mais grave
erosiva e destrutiva; afeta dedos dos pés e mãos, articulações metacarpofalangeanas
e metatarsianas e associa-se a osteólise das falanges envolvidas, anquilose e
osteoporose com deformidades graves. A osteólise total leva à migração do segmento
distal de um osso para o proximal do osso adjacente nas mãos, causando a
deformidade conhecida como dedos telescopados ou "óculos de ópera". A forma
espondilítica associa-se ao antígeno HLA-B27, geralmente é assintomática e com
envolvimento ileosacral em 20 a 40% dos casos. Na forma monoarticular ou
oligoarticular assimétrica há pouca relação entre a atividade cutânea e a articular e
envolvimento assimétrico das articulações interfalangeanas proximais, distais e
metacarpofalangeanas, além de dedos dos pés, tornozelos, calcanhares, joelhos e
coxofemorais. A tenossinovite digital leva ao característico “dedo em salsicha”. Na
poliartrite simétrica tipo reumatóide, pequenas e grandes articulações são afetadas de
maneira semelhante a da artrite reumatoíde.
Outras manifestações observadas são conjuntivite em 20%, uveíte em 5-10%
geralmente unilateral com dor ocular, vermelhidão, lacrimejamento, fotofobia e
associada ao HLA-DR13 (não observada nos nossos pacientes), entesite, dactilite e
lesões mucosas.
O diagnóstico da APs é clínico e baseado na presença de artrite inflamatória
mono, oligo ou poliarticular associada a lesões cutâneas clássicas de psoríase,
sempre na ausência do fator reumatóide soro do paciente afetado. A avaliação
laboratorial é inespecífica, mas proteínas de fase aguda como VHS, PCR e
alfa1glicoproteína ácida em geral estão aumentadas na fase ativa da doença.
Hipergamaglobulinemia policlonal, anemia, hipoalbuminemia, complemento sérico
normal ou elevado, imunecomplexos circulantes e hiperuricemia podem ser
observados em alguns pacientes. Fator antinuclear (FAN) pode ser positivo em até
10% dos casos. O líquido sinovial tem características inflamatórias com aumento de
celularidade. A investigação radiográfica revela artropatia inflamatória com edema de
partes moles, redução do espaço articular e nos casos avançados, pode mostrar
doença erosiva grave, osteólise com destruição articular e anquilose óssea. Na APs
poliarticular simétrica há alargamento do espaço articular, proliferação e anquilose
óssea, deformidade "lápis na xícara" e porose peri-articular mínima. Nas formas axiais,
sindesmófitos isolados e assimétricos com sinais de periostite secundária a
entesopatia podem ser observados e a sacro-iliíte pode ser unilateral nas fases iniciais
mas geralmente evolui para fusão bilateral.
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O tratamento da APs é feito com anti-inflamatórios não hormonais (naproxeno,


indomentacina e inibidores da COX-2), drogas remissivas e imunossupressores
(antimaláricos, colchicina, metotrexato, sulfassalazina, azatioprina, ciclosporina),
fisioterapia e terapia ocupacional. Para controle das lesões cutâneas, evitar a
exposição à luz solar e/ou ultravioleta e produtos tópicos específicos são importantes.
Recentemente, agentes biológicos como os inibidores do fator de necrose
tumoral (adalimumabe, etanercepte e infliximabe) são alternativas para os cassos
refratários.

ESPONDILOARTROPATIAS RESUMO

As espondiloartropatias compreendem principalmente manifestações articulares


periféricas assimétricas predominantes em membros inferiores e articulações rizomélicas (raiz
de membros), assim como o acometimento das articulações sacroilíacas e coluna vertebral
geralmente de forma ascendente, precedidas ou seguidas de manifestações extra-articulares
como hiperqueratose palmoplantar, lesões de psoríase, uveíte, diarréia e/ou disenteria,
agregação familiar, HLA B27, Fator Reumatóide negativo, inicio principalmente antes dos
quarenta anos de idade, e leve predominância do sexo masculino.

ESPONDILITE ANQUILOSANTE

Dados epidemiologicos
x Incidência: 1 a 2 % da população mundial branca
x Idade: Segunda a quarta década
x Sexo: 9 M / 1 F
x Distribuição universal

Etiopatogenia
Desconhecida interação genética (HLAB27 em 90%), ambiental e infecciosa

Quadro clínico
Inicio insidioso, dor lombar noturna no repouso), ascendente, acometendo toda a coluna
e principalmente sacro-ilíacas, pode se apresentar inicialmente como artrite periférica
assimétrica, predominando nos membros inferiores, e entesopatia. Extra-articular: uveíte
anterior aguda, insuficiência aórtica e fibrose apical pulmonar

Diagnóstico
x Clínico
x Laboratorial: presença do HLA B27 pode auxiliar nos quadros iniciais, Fator Reumatóide
negativo. VHS e proteina C reativa aumentadas.
x Imagens: Sindesmófitos e Sacro-ilíte no RX
x Ultrassom: entesopatia
x Ressonância magnética mostra precocemente edema ósseo

Tratamento Cinesioterapia preventiva e reparadora


Antiinflamatórios não hormonais, DMARDS, agentes biológicos
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ARTRITE PSORIÁSICA

Epidemiologia
x 5 a 20% dos casos de psoríase cutânea (3 % da população mundial tem psoríase).
x Sexo : M = F
x Idade : 3ª a 5ª década

Etiopatogenia: desconhecida

Quadro clínico
x Em 5% o quadro articular precede o quadro cutâneo
x Manifestação ungueal sugere em 80 % que tem ou terá quadro articular
x Artrite assimétrica com acometimento e lise de interfalangeanas distais pode ser achado
patognomônico
x RX: acometimento assimétrico e osteólise de interfalangeanas distais
Sacroiliite unilateral, sindesmofitos hipertróficos

Tratamento
Antiinflamatórios não hormonais para o quadro articular e avaliação conjunta com a
dermatologia no quadro cutâneo.

ARTRITE REATIVAS

Epidemiologia
x Interação genética (HLA B27+ 50% casos).
x Distribuição universal
x M > F relação 3:1 no Ocidente, 20: 1 no Oriente
x Idade: 2ª a 4ª décadas

Etiopatogenia
Desconhecida, estímulos infecciosos (clamydia, shigella, salmonella, etc.)

Quadro clinico
x Artrite migratória assimétrica inicio agudo 2ª a 6ª semana predominante em membros
inferiores.
x Quadro extra-articular: lesões de mucosas como balanite, uretrite, cervicite, conjuntivite,
aftas e diarréia. Lesões de pele e anexos: queratodermia, lesões psoriasiformes,
hiperqueratose ungueal e couro cabeludo. Ocular uveíte anterior.

Diagnóstico
x Clínico
x Cultura e bacterioscópico de secreções, sorologia para agentes infecciosos
x HLA B27 em 50% dos casos
Tratamento
Antibiotico terapia nos casos comprovados tratamento com antiinflamatórios não
hormonais no surto, nos casos com cronificação da artrite podemos fazer uso de
DMARDS.
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ESPONDILOARTROPATIAS QUESTÕES

1. Na espondilite anquilosante qual a manifestação extra-articular mais comum:


a) Lesão ungueal
b) Insuficiência valvar
c) Artrite simétrica e aditiva
d) Uveíte
e) Diarréia

2. Na artrite reativa qual o intervalo de tempo estabelecido entre o estimulo infeccioso e


as primeiras manifestações do quadro clinico :
a) 3 a 7 dias
b) 2 a 6 semanas
c) 3 a 6 meses
d) 3 meses
e) Não existe intervalo de tempo

3. A infecção por Clamydia Tracomatis geralmente esta ligada:


a) Doença de Crohn
b) Espondilite Anquilosante
c) Artrite gonococcica
d) Artrite reativa
e) Artrite psoriasica

4. Nas espondiloartropatias qual o achado laboratorial mais freqüente:


a) Acido úrico aumentado no soro
b) Fator reumatóide negativo
c) Fator reumatóide positivo
d) HLA B27 positivo
e) Hipergamablobulinemia

5. O quadro articular periférico mais comum das espondiloartropatias é:


a) Poliartrite migratória
b) Poliartrite simétrica e aditiva
c) Oligoatrite assimétrica de membros inferiores
d) Monoartrite aguda
e) Sacro-ilíte

Respostas Soronegativas: 1- d; 2- b; 3- d; 4- b; 5- c

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA

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CATS, A.; DUKMANS, B.; OLIVIERI, I.; PASERO, G.; VEYS, E.; ZEIDLER, H.: The european
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5. HELLIWELL, PS, TAYLOR, WJ. Classification and diagnostic criteria for psoriatic arthritis. Ann Rheum
Dis 2005; 64; Suppl II:ii3.
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LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO

Eduardo Ferreira Borba


Eloísa Bonfá

DEFINIÇÃO
O Lúpus Eritematoso Sistêmico (LES) é uma doença inflamatória crônica de
caráter auto-imune que afeta múltiplos órgãos, sendo considerada o protótipo das
doenças por imune-complexos. Caracteriza-se por períodos de exacerbações e
remissões das suas manifestações clínicas. Por vezes, a sua apresentação clínica é
polimórfica, o que dificulta a sua suspeita na sua fase inicial, mas a torna uma das
doenças sistêmicas mais fascinantes do ponto de vista clínico.

EPIDEMIOLOGIA
Sexo e Idade: A doença é mais prevalente em mulheres na idade fértil. Os
primeiros sinais e sintomas iniciam-se principalmente entre a segunda e terceira década
de vida. O sexo feminino predomina na proporção de 10:1. Ocorre também com relativa
freqüência em crianças e adultos mais idosos, com menor predomínio do sexo feminino.
Distribuição Étnica: É universal. No entanto, parece ser mais prevalente na raça
negra apesar de ser encontrada em todas as demais etnias e em diferentes áreas
geográficas. A incidência anual nos EUA é de 27,5/milhão para mulheres brancas e
75,4/milhão para mulheres negras e a prevalência varia entre 1/1000 e 1/10000.

GENÉTICA
Doença Clínica: Existe uma maior prevalência da doença em determinadas
famílias, uma vez que cerca de 10 a 20 % dos pacientes com LES apresentam história
familiar de alguma doença auto-imune ou mesmo de lúpus. Existe também uma alta
concordância nos gêmeos monozigóticos.
Alterações Imunológicas: Os familiares têm uma maior freqüência de FAN
positivo, deficiência de complemento, e hipergamaglobulinemia.
HLA: Associado principalmente com os HLA-DR2 e HLA-DR3 de classe II, além de
HLA DQw1 e DQw2. Existe maior freqüência do HLA B8 de classe I.

ETIOPATOGENIA
Hormonal: A doença pode se iniciar ou agravar em decorrência de alterações dos
níveis de estrógeno. Existe um metabolismo anormal de hormônios sexuais, com
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aumento da 16-D hidroxiestrona e de prolactina. Evidencia-se também alteração no


metabolismo dos andrógenos, com baixos níveis de testosterona nos homens e de
dehidroepiandosterona nas mulheres.
Ambiental: É bem conhecido o fato da exposição à luz solar desencadear ou
agravar a doença. A luz ultravioleta, particularmente a irradiação E, induz e exacerba a
atividade inflamatória cutânea e sistêmica.
Infecciosos: Questiona-se a participação de diversos agentes infecciosos como o
vírus Epstein Barr (EBV), o mixovírus, parvovírus, retrovírus, na gênese da doença.
Existe uma influência e inter-relação destes fatores que determinam uma produção
anormal de auto-anticorpos pelas células B, o evento de maior magnitude no lúpus.
Além da anormalidade das células B (um defeito intrínseco do LES), estudos recentes
sugerem que a apoptose (morte celular programada) represente um componente
fundamental, pois a exposição de antígenos celulares decorrente deste processo pode
propiciar uma resposta imunológica inadequada.

CLASSIFICAÇÃO

TABELA 1. Critérios revisados para a classificação do LES (1997)

1. Eritema Malar
2. Lesão Discóide
3. Fotossensibilidade
4. Úlcera Oral
5. Artrite
6. Serosite (Pleurite ou pericardite)
7. Doença Renal (Proteinúria > 0,5g/24h ou cilindrúria)
8. Doença Neurológica (Convulsão ou psicose)
9. Doença Hematológica (Anemia hemolítica e/ou leucopenia (< 4000/mm3) e/ou
linfopenia (< 1500/mm3)e/ou trombocitopenia (< 100000/mm3)
10. Alteração Imunológica (anti-dsDNA e/ou anti-Sm e/ou anticorpos antifosfolípide
positivo)
11. Anticorpo Anti-nuclear
O diagnóstico de LES é definitivo quando quatro ou mais critérios
estiverem presentes
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freqüentes são o eritema máculo-papular, a lesão discóide e o lupus subagudo. Um


terço desses pacientes referem fotossensibilidade. O fenômeno de Raynaud ocorre em
30% dos pacientes. As úlceras orais e a vasculite cutânea ocorrem em
aproximadamente 20% dos pacientes e são sinais importantes de atividade de doença.
As úlceras orais diferenciam-se das aftas por serem mais dolorosas e persistentes. A
alopecia ocorre na maioria dos pacientes e a forma mais comum é a difusa. O lúpus
pode se apresentar apenas com manifestações cutâneas, sendo nesse caso
geralmente o lúpus subagudo e o lúpus discóide. O lúpus discóide se caracteriza pela
lesão discóide que é uma mácula eritematematosa profunda e que por isso envolve os
fâneros, causando a sua perda definitiva. Na evolução, a mácula torna-se atrófica,
hipocrômica, com os bordos hipercrômicos, e ausência de pelos. Quando atingem o
couro cabeludo deixam uma cicatriz sem cabelos. Tratamento: fotoprotetor e cloroquina.
Imunomoduladores como a talidomida e dapsona podem ser utilizadas após falência da
cloroquina. O corticóide e imunossupressores só estão indicados nas lesões mais
graves.

FIGURA 2. À esquerda lesões tipo lúpus discóide: máculas hipocrômico-atróficas, com halos
hipercrômicos; à direita, eritema malar em “asa de borboleta”

Articular: Artralgia ou artrite são manifestações freqüentes no início do LES. Acometem


pequenas e grandes articulações, geralmente tem padrão simétrico. As articulações das
mãos e punhos são as mais afetadas. As deformidades são pouco freqüentes e as
erosões nos Raios-X são muito raras. Alguns pacientes apresentam deformidades nas
mãos, que lembram a artrite reumatóide, porém sem erosões, e caracteristicamente
reversíveis, denominadas de Jaccoud. Outra condição que leva a dor articular é a
necrose óssea asséptica. Tratamento: antiinflamatórios não-hormonais e difosfato de
cloroquina.
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Sistema cardiovascular: A pericardite com ou sem derrame é a mais freqüente na


doença, porém manifestações subclínicas ocorrem em 50% dos pacientes. A miocardite
é mais rara, e usualmente se apresenta como arritmia ou insuficiência cardíaca.
Tratamento: antiinflamatórios não-hormonais ou corticóide dependendo da gravidade.
Sistema pulmonar: A pleurite é o sintoma pulmonar mais comum. O derrame pode ser
detectado em até 50% dos pacientes e a dor pleural em 70%. A pneumonite lúpica é
mais rara, e o diagnóstico requer uma rigorosa exclusão de outras causas. Tratamento:
antiinflamatório não hormonal, corticóide e imunossupressor dependendo da gravidade.
Sistema hematológico: A anemia ocorre em 50% dos pacientes sendo do tipo "doença
crônica" ou seja normocítica, normocrônica (não é critério diagnóstico), e somente 10%
é hemolítica. A leucopenia e a linfopenia são freqüentes em especial durante as fases
de atividade de doença, sendo de auxílio diagnóstico no início da doença. A
trombocitopenia leve ocorre em 1/3 dos pacientes, em fases precoces ou tardiamente na
doença. Tratamento: corticóide e/ou imunossupressor dependendo da gravidade.
Rim: Evidência clínica de lesão renal ocorre em pelo menos 50% dos pacientes
em algum momento da doença. As lesões podem ser classificadas histologicamente em:
mesangial, proliferativa focal, proliferativa difusa e membranosa. Manifesta-se mais
frequentemente como síndrome nefrótica, com proteinúria maior que 0,5 g nas 24 horas,
hematúria, leucocitúria e cilindrúria, hipertensão arterial e perda de função renal. O
quadro renal é um dos fatores importantes no prognóstico da doença. Pacientes que
evoluem para insuficiência renal crônica dialítica geralmente melhoram das outras
manifestações do LES, provavelmente devido à redução da imunidade acarretada pela
uremia. Tratamento: corticóide e imunossupressor. Particularmente a ciclofosfamida é a
droga de escolha para a indução nas formas proliferativas graves de nefrite.
Micofenolato de mofetil e azatioprina são utilizados como manutenção destas formas ou
mesmo para tratamento nas demais.
Sistema nervoso: As manifestações clínicas mais freqüentes são convulsões, psicose,
lesões de parênquima (AVC) e neuropatia periférica. A gravidade da lesão é também um
fator importante no prognóstico da doença. Tratamento: corticóide e imunossupressor,
dependendo da gravidade.

LABORATÓRIO
Auto-anticorpos: É o achado laboratorial mais consistente da doença. Alguns
autoanticorpos, como o anti-Sm, o anti-DNA de dupla hélice (dsDNA), e o anti-P, tem
valor diagnóstico, pois são altamente específicos para o LES. Os outros anticorpos não
são específicos para a doença, porém auxiliam no diagnóstico (TABELA 1).
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No acompanhamento clínico da atividade de doença, em especial a atividade renal,


apenas o anti-dsDNA (DNA dupla hélice ou nativo) e o anti-P tem significado. O ssDNA
ou DNA de hélice simples é inespecífico.
Complemento: As flutuações nos níveis de C3, C4 e CH50 (ou CH100) são de grande
auxílio para o acompanhamento da atividade de doença.
Hemograma: Exame fundamental na fase de diagnóstico e dimensionamento clínico do
LES e acompanhamento das diversas citopenias. As flutuações nos níveis de leucócitos
e linfócitos podem auxiliar o acompanhamento da atividade de doença. O teste de
COOMBs e a elevação da desidrogenase lática auxiliam no diagnóstico da anemia
hemolítica.

TABELA 1. Autoanticorpos no lúpus eritematoso sistêmico

AUTOANTICORPO PREVALÊNCIA (%) ESPECIFICIDADE

Anti-dsDNA 40-60 Alta

Anti -ssDNA 80-90 -

Anti -Sm 30 Alta

Anti -RNP 30-40 -

Anti -Ro (SS-A) 20-60 Baixa

Anti -La (SS-B) 15-40 -

Anti -P 10-15 Alta

Eletroforese de proteínas: Importante para avaliar elevação de gamaglobulina, que por


vezes pode estar associada à atividade de doença. Também útil para avaliar níveis de
albumina e da atividade inflamatória.
Outros: Velocidade de hemossedimentação, e Proteína C reativa são testes de fase
aguda (inespecíficos no aspewcto diagnóstico) que podem ser utilizados para avaliar o
grau de atividade inflamatória em casos isolados.
Avaliação sistemática dos diferentes órgãos: A avaliação renal (Urina I, Uréia,
Creatinina e Clearance) deve ser feita independente da presença de manifestações
clínicas. Os demais exames devem realizados de acordo com o acometimento de cada
órgão ou para controle das medicações empregadas no tratamento.
Podemos didaticamente dividir os exames em 2 grupos, conforme o quadro 1.
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QUADRO 1 - Utilização dos exames complementares no lúpus eritematoso sistêmico

Diagnóstico: Acompanhamento:
• ANTI-dsDNA • ANTI-dsDNA
• ANTI-Sm • Complemento
• Complemento • Hemograma
• Hemograma • Renal (sedimento e função)
• Provas de atividade inflamatória • Avaliação sistemática de órgãos
• Avaliação de órgãos

LES RESUMO

Definição
O Lúpus Eritematoso Sistêmico (LES) é uma doença inflamatória crônica de caráter auto-
imune que afeta múltiplos órgãos. Caracteriza-se por períodos de exacerbações e remissões das
suas manifestações clínicas.

Epidemiologia
A doença é universal e mais prevalente em mulheres na idade fértil entre a segunda e
terceira década de vida, onde o sexo feminino predomina na proporção de 10:1.

Genética
HLA: Associado principalmente com os HLA-DR2 e HLA-DR3 de classe II, além de HLA
DQw1 e DQw2. Existe maior freqüência do HLA B8 de classe I.

Etiopatogenia
• Hormonal: início frente a alterações dos níveis de estrógeno. Existe um aumento da
prolactina e diminuição testosterona e dehidroepiandosterona.
• Ambiental: a luz ultravioleta (irradiação E) exacerba a doença.
Existe uma produção anormal de auto-anticorpos pelas células B, e a apoptose é um
componente de fundamental.

Classificação
O diagnóstico de LES é definitivo quando da presença de quatro ou mais CRITÉRIOS
REVISADOS PARA A CLASSIFICAÇÃO DO LES (1997)
• Eritema Malar
• Lesão Discóide
• Fotossensibilidade
• Úlcera Oral
• Artrite
• Serosite (Pleurite ou pericardite)
• Doença Renal (Proteinúria ou cilindrúria)
• Doença Neurológica (Convulsão ou psicose)
• Doença Hematológica (Anemia hemolítica e/ou leucopenia e/ou linfopenia e/ou
trombocitopenia)
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• Alteração Imunológica (anti-dsDNA e/ou anti-Sm e/ou anticorpos antifosfolípide positivo)


• Anticorpo Anti-nuclear

Quadro clínico
• Sintomas Gerais: Febre, linfoadenopatia, perda de peso e fadiga.
• Pele e Mucosa: Eritema facial em asa de borboleta fotossensibilidade e alopecia são as
mais comuns mas qualquer lesão pode ocorrer como a lesão discóide e o lupus
subagudo.
• Articular: Artralgia ou artrite são manifestações freqüentes no início do LES.
• Sistema cardiovascular-pulmonar: A pleurite e pericardite com ou sem derrame são
freqüentes na doença.
• Sistema hematológico: A leucopenia e a linfopenia são observadas nas fases de
atividade de doença, sendo de auxílio diagnóstico no início da doença.
• Rim: Lesão renal ocorre em pelo menos 50% dos pacientes em algum momento da
doença e seguem classificação da OMS.
• Sistema nervoso: Convulsões, psicose, lesões de parênquima (AVC) e neuropatia
periférica.

Laboratório
• Autoanticorpos: o anti-Sm, o anti-DNA de dupla hélice (dsDNA), e o anti-P, tem valor
diagnóstico, pois são altamente específicos para o LES.
• Complemento: As flutuações nos níveis de C3, C4 e CH50 (ou CH100) são de grande
auxílio o acompanhamento da atividade de doença.
• Hemograma: Acompanhamento das citopenias. Níveis de leucócitos e linfócitos podem
auxiliar o acompanhamento da atividade de doença.
• Avaliação sistemática dos diferentes órgãos: A avaliação renal (Urina I, Uréia,
Creatinina e Clearance) deve ser feita independente da presença de manifestações
clínicas.

Resumo da utilidade dos Exames


• Diagnóstico: ANTI-dsDNA, ANTI-Sm, Complemento, Hemograma, Avaliação de órgãos.
• Acompanhamento: ANTI-dsDNA, Complemento, Hemograma, Renal (sedimento e
função), Avaliação sistemática de órgãos, Provas de atividade inflamatória.

LES QUESTÕES

1. Paciente feminina de 27 anos com quadro de poliartrite simétrica de pequenas


articulações de mãos com rigidez matinal há 2 meses associado a eritema em região
malar e fotossensibildiade. Os melhores exames para diagnóstico são:
a) Hemograma e FAN
b) Hemossedimentação e Fator Reumatóide
c) Fator Reumatóide e proteína C reativa
d) Hemossedimentação e proteína C reativa
e) FAN e proteína C reativa

2. É exame específico de LES entre os abaixo:


a) Fator Reumatóide
b) FAN
c) Anti-Ro
d) Anti-DNA
e) Anti-fosfolípide
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3. São exames de acompanhamento de LES:


a) Hemograma, Hemossedimentação, proteína C reativa
b) Hemograma, FAN, Hemossedimentação
c) Urina I, Hemossedimentação, FAN
d) Hemograma, Anti-DNA, Complemento
e) FAN, Anti-Sm, Complemento

4. Paciente de 17 anos com derrame pleural confirmado ao Rx, acompanhado de dor


pleurítica há 10 dias. Possui prima com LES. Os melhores exames que ajudariam a
confirmar esta hipotese:
a) Hemograma, Hemossedimentação, proteína C reativa, Rx mãos
b) Hemograma, ASLO, Hemossedimentação, proteína C reativa
c) Hemograma, fator reumatóide, FAN, Hemossedimentação
d) Hemograma, FAN, Anti-DNA, Urina I
e) Hemograma, Rx tórax, Hemossedimentação, FAN

5. Paciente, 24 anos, feminino, evoluindo há 1 mês com febre, edema de membros


inferiores que evoluiu para anasarca, hipertensão. Há 1 ano acompanahva na
dermatologia por lesão auricular que iniciou eritematosa e deixou sequela de lesão
hipocrônica melhor exame para diagnóstico:
a) Hemograma, Hemossedimentação, Anti-cardiolipina, Fator reumatóide, Anti-citulina
b) Hemograma, FAN, Creatinina, Anti-DNA, Urina I
c) Hemograma, FAN, Anti-Sm, Urina I
d) Hemograma , FAN, Anti-Ro, Anti-La, Urina I
e) Hemograma, FAN, Proteinúria de 24 horas, Anti-centrômero
Respostas LES: 1.a; 2.d; 3.d; 4.d, 5.b

BIBLIOGRAFIA RECOMENDADA

1. Tan EM, Cohen AS, Fries JF, Masi AT, McShane DJ, Rothfield NF, Schaller JG, Talal N, Winchester RJ.
The 1982 revised criteria for the classification of systemic lupus erythematosus. Arthritis and
Rheumatism 1982; 25: 1271-7.
2. Hochberg MC. Updating the American College of Rheumatology revised criteria for the Classification of
systemic lupus erythematosus. (Letter) Arthritis and Rheumatism 1997; 40: 1725.
3. Systemic lupus erythematosus. Em: Primer on the Rheumatic diseases (Klippel JH). 12th edition.
Arthritis Foundation, Atlanta, Georgia. 2001: 329-52.
4. Rothfield NF. Systemic lupus erythematosus: clinical aspects and treatment. Em: Arthritis and allied
conditions (McCarty DJ, Koopman WJ). 12th edition. Lea & Febiger, Philadelphia. 1993: 1155-77.
5. Dubois´ Lupus Erythematosus (Wallace DJ, Hahn BH). 6th edition. Williams & Wilkins, Baltimore. 2002.
6. Borba Neto, EF; Bonfá, ESDO. Lúpus Eritematoso Sistêmico. In Lopes, AC Tratado de Clínica Médica.
São Paulo, Roca, 2006, p 1595-1604
7. Borba Neto, EF; Bonfá, ESDO. Lúpus Eritematoso Sistêmico. In Yoshinari, NH; Bonfá, ESDO.
Reumatologia para o Clínico. São Paulo, Roca, 2000, p. 25-33.
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ESCLEROSE SISTÊMICA

Claudia Tereza Lobato Borges


Romy Beatriz Christmann de Souza
DEFINIÇÃO
A esclerose sistêmica (ES) é uma doença auto-imune do tecido conjuntivo
caracterizada por fenômeno de Raynaud, fibrose da pele e de outros órgãos. É
também incorretamente chamada de esclerodermia uma vez que esse termo é
inespecífico por designar qualquer espessamento cutâneo e não só a ES.
A doença tem dois subtipos, a forma difusa e a forma limitada. A extensão do
espessamento da pele é que diferencia esses dois subtipos.

EPIDEMIOLOGIA
É uma doença rara e alguns estudos sugerem uma incidência anual de 1 a 2
casos por 100.000.habitantes. Tem um pico de início entre 30 e 50 anos e é pelo
menos quatro vezes mais prevalente em mulheres e parece ser mais freqüênte na
raça negra.

ETIOLOGIA:
A ES é uma doença complexa, de etiologia desconhecida sendo improvável
que um gene ou fator ambiental seja a causa da doença.
Fator Genético: A forte associação entre a ES e o fator genético vem principalmente
de estudos de uma tribo indígena Choctaw no estado de Oklahoma, onde a
prevalência da ES é de quase 20 vezes maior que da população geral. Por outro lado,
há pouca concordância entre gêmeos idênticos (4,2%), mas apresentam 100% na
presença de anticorpos e a presença de anticorpos em familiares é mais comum do
que na população geral.
Infecção: A infecção latente por vírus pode precipitar ou piorar a doença. Certos
retrovírus tem a mesma seqüência da proteína topoisomerase 1 que é um alvo na ES.
Este mimetismo molecular, pode ser um fator precipitante.
Fator ambiental: A sílica, solventes orgânicos , drogas (bleomicina) e um fator
mecânico, como a vibração são os fatores ambientais mais relatados. Os relatos de
reconstrução mamária com prótese de silicone levando ao aparecimento de ES ou
outra doença auto-imune não foram confirmados pelos grandes estudos
epidemiológicos e meta-análises. Vários agentes químicos (cloridrato de vinil,
benzeno), drogas (L-Tryptofano), síndrome do óleo tóxico (ingestão de óleo
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contaminado na Espanha no início dos anos 80 que desencadeou uma doença


semelhante a ES) foram implicados como fatores precipitantes para o
desenvolvimento da ES.
Microquimerismo: Alguns estudos detectaram a presença de pequenas quantidades
de células fetais no sangue periférico na maioria das grávidas e a persistência das
mesmas durante vários anos após a gravidez, fenômeno hoje conhecido como
microquimerismo fetal. Na ES evidenciou-se que a quantidade de células fetais nas
mulheres é maior quando comparadas com mulheres sadias. Entretanto, alguns
trabalhos não confirmaram essa associação, mostrando que o microquimerismo
acontece tanto na ES quanto em indivíduos normais e está mais relacionado com a
presença HLA DQA1.

QUADRO CLÍNICO
Classificação da Esclerose Sistêmica – forma Difusa e forma Limitada.
Principais diferenças:
Esclerose Sistêmica Difusa: Geralmente evolução rápida, espessamento cutâneo
extenso afetando além de mãos, pés e rosto, a região central do corpo como braços,
abdome e dorso. Acometimento pulmonar (doença intersticial) pode ocorrer
principalmente nos primeiros 5 anos da doença.
Esclerose Sistêmica Limitada: O espessamento da pele ocorre nas mãos e pés e é
restrita a parte distal aos joelhos e cotovelos. Não acomete abdome, dorso, braços e
coxas. Evolução mais lenta, acometimento de esôfago freqüênte e hipertensão
pulmonar mais tardiamente. Chamada de CREST quando na presença de calcinose,
raynaud, envolvimento do esôfago, esclerodactilia e telangiectasia.
Em 10% dos pacientes a pele é normal, isto é, “esclero sine-esclero” e o
diagnóstico é feito quando o paciente apresenta fenômeno de Raynaud e
acometimento de órgãos que caracteristicamente são atingidos na ES como o esôfago
e pulmão e a presença de auto-anticorpos específicos da ES.
Fenômeno de Raynaud: é a mudança de cor dos dedos ocorrendo em três fases,
iniciando por palidez intensa seguida de cianose e hiperemia reacional, presentes nos
dedos em resposta ao frio ou estresse.
A avaliação cuidadosa de um indivíduo com fenômeno de Raynaud pode
separar pacientes com chances para o desenvolvimento ou não de doença auto-
imune. Há dois tipos de fenômeno de Raynaud: o primário ou doença de Raynaud e o
secundário, associados às doenças do tecido conjuntivo.
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Manifestações cutâneas: O comprometimento de pele na ES é caracterizado por três


fases: uma fase inicial edematosa, seguida por uma fase de espessamento cutâneo e
tardiamente evoluindo para uma atrofia.
Na fase edematosa, o paciente apresenta edema, principalmente nas mãos,
dedos e braços. O endurecimento da pele começa nos dedos e mãos. Na face e
pescoço ocorre o apagamento dos sulcos naturais. O nariz e os lábios se tornam
afilados, a abertura da boca torna-se reduzida (microstomia) (FIGURA 1).

FIGURA 1. Esclerose sistêmica forma


difusa: observa-se afilamento do nariz e
lábios.

As telangiectasias ocorrem principalmente na face, palma das mãos e


membranas mucosas e tendem a aumentar em número com o passar dos anos.
Calcinose (FIGURA 2) são depósitos anômalos de cálcio que ocorrem em
regiões peri-articulares, ponta dos dedos, cotovelo, bursa pré-patelar e superfície
extensora do antebraço. A sua presença pode levar a inflamação local, ulcerando a
pele e drenando material calcificado, o que predispõe frequentemente à infecção.
Úlceras de pele principalmente em regiões peri-ungueais são comuns na ES e são
úlceras do tipo isquêmicas e muito dolorosas. A cicatrização é lenta e levam à
diminuição da polpa digital e cicatrizes. (FIGURA 3).
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FIGURA 2. Calcinose no pé
Avaliação da pele pode ser feita pelo escore modificado de Rodnan que
avalia 17 regiões do corpo e pontua de 0 (normal) a 3 (sem pregas) para o
espessamento da pele, com pontuação máxima de 51 pontos.

FIGURA 3. Reabsorção digital com perda e diminuição do tamanho das


falanges. Observe também as ulcerações nas pontas dos dedos.

Manifestações músculo-esquelética: Artralgia, artrite e a rigidez matinal são


sintomas freqüentes em pacientes com ES nas fases iniciais de doença, levando
muitas vezes a um diagnóstico inicial de artrite reumatóide.
A fraqueza muscular é freqüente em pacientes com ES, tanto na forma difusa
como na limitada. A miopatia na ES tem várias causas como drogas (corticosteróide,
D-penicilamina) progressão da fibrose para o músculo e inflamação e atrofia por
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desuso. As enzimas musculares (CK e aldolase) e eletromiografia geralmente são


normais.
Manifestações do trato gastrintestinal: O trato gastrintestinal é acometido em 90%
dos casos. O esôfago é o segmento mais acometido, seguido pela região anorretal ,
intestino delgado, estômago e cólon. Disfagia, odinofagia, dor em queimação
retroesternal, regurgitação e sensação de parada do alimento no esôfago são
sintomas comuns e algumas vezes incapacitantes.
A desnutrição resultante da má absorção é uma importante causa de
mortalidade em pacientes com ES necessitando algumas vezes de nutrição parenteral.
Manifestações Pulmonares: O comprometimento pulmonar na ES é principal causa
de morbidade e mortalidade na ES. Dois tipos de envolvimento: doença intersticial
pulmonar (mais freqüente e ocorre em até 70% dos casos) e a hipertensão pulmonar
isolada que é quase exclusiva da forma limitada. Os pacientes geralmente são
assintomáticos e quando surgem os sintomas como a dispnéia aos esforços e tosse
seca, a extensão da lesão é grande e compromete a resposta ao tratamento.
Coração: O comprometimento cardíaco ocorre mais na forma difusa por processo
fibrótico da doença e os pacientes são geralmente assintomáticos. O derrame
pericárdico é um achado de ecocardiograma em até 50% dos pacientes, mas
geralmente não causa sintomas. Ocasionalmente síncope e, raramente morte súbita,
ocorrem em pacientes com ES podendo ser resultante de arritmias.
Envolvimento renal: A crise renal esclerodérmica é a manifestação mais importante
do comprometimento renal na ES. É caracterizada por um início súbito de hipertensão
arterial grave associado ou não a insuficiência renal rapidamente progressiva. Ocorre
em aproximadamente 10% dos pacientes, mais na forma difusa e nos primeiros quatro
anos de doença, mas sua incidência tem diminuído nos últimos 10 anos.
Outras manifestações: Síndrome sicca (sensação de olho e boca seca), neuropatia
do trigêmio, síndrome do túnel do carpo, mononeurite multiplexa e comprometimento
do sistema nervoso central.

DIAGNÓSTICO
A ES é uma doença na qual a anamnese e o exame físico são essenciais, e em
90% dos casos são suficientes para o diagnóstico. Os exames laboratoriais e de
imagem se prestam confirmação, avaliação da extensão e acompanhamento da
doença (QUADRO 1).

QUADRO 1. Critérios diagnósticos da esclerose sistêmica


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Critério Maior

Espessamento da pele proximal às articulações metacarpofalangeanas

Critérios menores

Esclerodactilia

Cicatrizes em polpas digitais

Fibrose pulmonar

* Para o diagnóstico é necessário o critério maior ou dois critérios menores.

Exames complementares
Auto-anticorpos: O FAN é encontrado em mais de 95% dos pacientes, entretanto, os
anticorpos que são específicos da doença são o anti-centrômero e o anti-
topoisomerase 1 (scl-70). Os anticorpos anti-centrômero estão presentes em 60% das
pacientes com a forma limitada. Anticorpo anti-topoisomerase (Scl-70) estão presentes
em 40% das pacientes com a forma difusa. A presença deste anticorpo está mais
associado com a doença intersticial pulmonar e maior extensão de espessamento da
pele.
Anticorpos contra RNA polimerase I, II e III e fibrilarina são também
encontrados na forma difusa e geralmente responsáveis pelo padrão nucleolar na
imunoflorescência.
Capilaroscopia: Exame simples, não invasivo e barato é de grande auxílio nesta
abordagem. Mostram a microcirculação capilar na cutícula dos dedos das mãos. Na
ES ocorre o chamado padrão SD ou esclerodérmico, caracterizado por áreas de
depleção e deleção capilar, ectasias,e microhemorragias. A quase totalidade dos
pacientes apresentam alterações típicas (padrão SD).
Raio X de Mãos: As alterações mais características são: (1) reabsorção de tecidos
moles nas polpas digitais, (2) calcificações (calcinose) de tecidos moles, (3) osteólise
provocando reabsorção das falanges distais;(4) deformidades com uma tendência a
luxação da primeira articulação carpo-metacarpo.
Trato gastrintestinal: Para o esôfago, manometria, esofagograma e endoscopia.
Trânsito intestinal deve ser avaliado quando há sinais de diarréia e desnutrição. O
enema opaco e a presença de dilatações e pseudo-divertículos do intestino grosso
são muito sugestivas de ES.
Pulmão: A tomografia de cortes finos (FIGURA 4) é o primeiro e mais sensível exame
a detectar a lesão intersticial. As áreas basais, subpleurais e posteriores são os locais
preferenciais de lesão. Imagens do tipo velamento em vidro fosco nas bases
pulmonares são as lesões mais encontradas. As provas de função pulmonar tornam-
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se alteradas mais tardiamente, porém são de grande auxílio no acompanhamento


destes pacientes. A espirometria mostra padrão restritivo. Hipertensão pulmonar é
definida no Doppler-ecocardiografia como uma pressão de artéria pulmonar maior que
40 mmHg. A redução da difusão de monóxido de carbono na ausência de restrição na
espirometria é muito sugestiva de hipertensão pulmonar.

FIGURA 4. Tomografia de tórax mostrando pneumonite intersticial

Biópsia de pele: Raramente é necessária para o diagnóstico. Pode ser útil para
diagnóstico diferencial.

DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
O diagnóstico diferencial inclui outras doenças associadas ao fenômeno de
Raynaud, outras doenças do tecido conjuntivo, e condições com envolvimento cutâneo
ou visceral semelhante a ES. Exemplos: fenômeno de Raynaud primário, esclerose
digital do diabetes mellitus, escleroderma de Buschke, Raynaud induzido por drogas
(beta-bloqueadores), distrofia simpático-reflexa, policitemia, doença do enxerto versus
hospedeiro e outras.

TRATAMENTO
A abordagem terapêutica da ES deve enfocar os órgãos acometidos.
Raynaud: Deve-se eliminar todos os fatores que pioram o vasoespasmo como o
tabagismo, o uso de drogas como beta-bloqueadores ou derivados da ergotamina
muito utilizados para enxaqueca. Usar meias e luvas. Utiliza-se vasodilatadores como
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bloqueadores de canais de cálcio (nifedipina, diltiazem) e inibidores da enzima


conversora da angiotensina. A simpatectomia cervical ou lombar pode ser eficaz em
casos graves e resistentes. A terapia anti-agregante inclui aspirina (100 a 300mg/dia),
pentoxifilina (400mg três vezes/dia).
Pele: A D-penicilamina (DPA) é capaz de reduzir a produção de colágeno e com
provável efeito imunossupressor. A ciclofosfamida também pode ser utilizada em
casos graves.
Doença pulmonar: A ciclofosfamida é eficaz na estabilização da função pulmonar.
Na hipertensão pulmonar as prostaciclinas por via endovenosa e os inibidores
de endotelina 1 mostraram diminuir a mortalidade. A terapia anti-coagulante é
obrigatória.
Trato gastrintestinal: Mudar hábitos: ingerir refeições pequenas e freqüentes, ao
deitar manter a cabeça elevada. Indica-se procinéticos como a metoclopramida e a
domperidona, inibidores de bomba de próton como o omeprazol, e antibióticos para
para tratar o crescimento bacteriano.
Doença cardíaca: A pericardite sintomática responde a anti-inflamatórios não
hormonais ou baixas doses de corticoesteróides. O papel das drogas
imunossupressoras ainda não está estabelecido no tratamento da doença cardíaca.
Doença renal: A pressão arterial deve ser controlada com inibidores da enzima
convertora da angiotensina cujo uso diminuiu a evolução para a insuficiência renal.

ESCLEROSE SISTÊMICA RESUMO

Epidemiologia
x Idade: incidência - 30 a 50 anos, com pico aos 40 anos.
x Prevalência: 1 a 2 casos/100.000 habitantes

Fisiopatologia
x Multifatorial: genética, infecção, ambiental e microquimerismo fetal.

Classificação
x Esclerose Sistêmica Difusa - espessamento cutâneo extenso
x Esclerose Sistêmica Limitada – acometimento localizado e distal dos membros.

Quadro Clínico
x Fenômeno de Raynaud: palidez intensa seguida de cianose e hiperemia reacional.
x Manifestações cutâneas: Três fases - edematosa, espessamento e atrofia.
x Telangiectasias ocorrem principalmente em face, palma das mãos e membranas mucosas.
x Calcinose
x Úlceras de pele principalmente em regiões peri-ungueais.
x Musculo-esquelético: Artralgia, artrite e a rigidez matinal
x Manifestações do trato gastrointestinal: Acometido em 90% dos casos. O esôfago é o mais
acometido, seguido pela região anorretal , intestino delgado, estômago e cólon.
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x Manifestações Pulmonares: Principal causa de morbidade e mortalidade na ES. Dois tipos de


envolvimento: doença intersticial pulmonar (mais freqüente e ocorre em até 70% dos casos) e a
hipertensão pulmonar isolada é quase exclusiva da forma limitada.
x Coração: envolvido na forma difusa da doença, geralmente assintomático.
x Envolvimento renal: A crise renal esclerodérmica (hipertensão) é grave e ocorre em 10% dos
pacientes.

CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS
Critério Maior: Espessamento da pele proximal às articulações metacarpofalangeanas.
Critérios menores: Esclerodactilia, cicatrizes em polpas digitais e fibrose pulmonar.
™ necessário o critério maior ou dois critérios menores.

Exames complementares
x Auto-anticorpos: O FAN - 95% dos pacientes, anti-centrômero - 60% das pacientes com a forma
limitada e anti-topoisomerase (Scl-70) - 40% das pacientes com a forma difusa.
x Capilaroscopia: alterada na quase totalidade dos pacientes.
x Raio X das Mãos: reabsorção de tecidos moles nas polpas digitais, calcificações (calcinose) de
tecidos moles, (3) osteólise;(4) deformidades.
x Trato gastrointestinal: Esôfago - manometria, esofagograma e endoscopia.
x Pulmão: tomografia de cortes finos (primeiro e mais sensível exame a detectar a lesão intersticial),
prova de função pulmonar, e doppler-ecocardiografia (hipertensão pulmonar).

Tratamento
x Fenômeno de Raynaud: Orientações gerais para evitar o frio, bloqueadores de canais de cálcio
(nifedipina, diltiazem), inibidores da enzima conversora da angiotensina, aspirina e pentoxifilina.
x Pele: D-penicilamina(DPA) e ciclofosfamida em casos graves.
x Doença pulmonary: ciclofosfamida EV ou oral.
x Trato gastrointestinal: Mudar hábitos, procinéticos (metoclopramida e a domperidona) e inibidores
de bomba de prótons.
x Doença cardíaca: anti-inflamatórios não hormonais e corticoesteróides.
x Doença renal: Controle da pressão arterial com inibidores da enzima convertora da angiotensina

ESCLEROSE SISTÊMICA QUESTÕES

1) Uma paciente queixa-se de alteração da coloração nas mãos, que iniciaram no início
do inverno. As mãos ao serem expostas ao frio ficam pálidas, seguidas de
arroxeamento de alguns dedos e depois de alguns minutos ficam vermelhas. O
fenômeno relatado por esta paciente pode ser encontrado em várias doenças
reumatológicas, exceto:
a) Síndrome de Sjögren
b) Lupus Eritematoso Sistêmico
c) Osteoartrite
d) Esclerose Sistêmica
e) Doença Mista do tecido Conjuntivo

2) Escolha a alternativa correta:


a) A Esclerose Sistêmica é classificada em Limitada e Difusa conforme a presença de auto-
anticorpos específicos.
b) A fibrose pulmonar ocorre apenas em pacientes com Esclerose Sistêmica na forma difusa.
c) O esôfago é raramente acometido na Esclerose Sistêmica.
d) A forma difusa da Esclerose Sistêmica é caracterizada por acometer a pele proximalmente
aos cotovelos e proximalmente aos joelhos, além do rosto e mãos.
e) O pulmão é raramente envolvido na Esclerose Sistêmica.
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3) Sobre a Esclerose Sistêmica podemos afirmar que:


a) O pulmão é o principal fator de mortalidade da doença, sendo a tomografia
computadorizada de tórax o principal exame para seu diagnóstico precoce.
b) O seu diagnóstico é feito apenas com exames de sangue como os auto-anticorpos.
c) O envolvimento da pele é raro e com pouca relevância no diagnóstico da doença.
d) O exame fator anti-núcleo é positivo em menos de 30% dos pacientes.
e) O auto-anticorpo mais encontrado na forma difusa da doença é o anticorpo anti-Ro.

4) A esclerose sistêmica pode acometer vários órgãos. Assinale a alternativa correta:


a) A calcinose, telangiectasias são características da forma difusa.
b) O tratamento do fenômeno de Raynaud baseia-se em expor-se ao frio, beta-bloqueadores e
antibióticos.
c) Não há acometimento do trato gastrintestinal da Esclerose Sistêmica.
d) A pele sempre é acometida nesta doença.
e) A capilaroscopia, exame que analisa os vasos peri-unqueais tem utilidade na avaliação de
pacientes com o fenômeno de Raynaud.

5) Uma paciente de 38 anos chega ao consultório queixando-se que sua pele está
endurecida nas mãos, antebraços e rosto. Refere também que ao expor-se ao frio
suas mãos mudam de cor variando entre branco, roxo e vermelho. Durante a
investigação laboratorial desta paciente quais anticorpos específicos você solicitaria,
pensando na doença esclerose sistêmica?
a) Anti-Sm e anti-Scl 70
b) Anti-Ro e anti-La
c) Anti-Scl 70 e anticentrômero
d) Anti-Jo 1 e anticentrômero
e) Anti-Scl 70 e anti-DNA

Respostas ES: 1-c; 2-d; 3-a; 4-e; 5-c

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA
1. Borges, C T L Esclerose sistêmica In: Yoshinari, N H e Bonfá, E S D O. Reumatologia para o Clínico.
São Paulo, Roca, 2000, p 49-58.
2. Marques Neto, JF, Sampaio-Barros, PD, Borges, CTL, Souza, RBC, Esclerose Sistêmica In: Lopes,
AC, Tratado de Clínica Médica, SãomPaulo, Roca, 2006, p.1612-1618
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POLIMIOSITE E DERMATOMIOSITE

Claudia Tereza Lobato Borges


Maurício Levy

DEFINIÇÃO
O termo miopatias inflamatórias designa um grupo de doenças caracterizadas
por inflamação da musculatura estriada.

EPIDEMIOLOGIA
PM e DM têm uma prevalência estimada de 1/ 100.000 habitantes na população
geral. A incidência anual estimada varia de 2 a 10 casos por milhão de pessoas. As
mulheres são 2 vezes mais acometidas que os homens. Em adultos tem um pico de
incidência entre 40 e 50 anos e em crianças entre 10 e 15 anos. A MCI é mais comum
após 50 anos de idade e no sexo masculino

CLASSIFICAÇÃO DAS MIOPATIAS INFLAMATÓRIAS IDIOPÁTICAS


Com base em critérios clínicos, demográficos, histológicos e imunopatológicos,
as MII são classificadas em 5 categorias principais (QUADRO1).

QUADRO 1. Classificação das Miopatias Inflamatórias Idiopáticas

1. Dermatomiosite - DM (juvenil e adulta)

2. Polimiosite – PM

3. Miosite por Corpúsculo de Inclusão – MCI

4. Síndromes de Superposição (PM, DM ou MCI associadas a outras doenças do tecido


conjuntivo)

5. Dermatomiosite associada ao câncer

QUADRO CLÍNICO

História e Exame Físico


Pacientes referem dificuldade para realizar atividades diárias, como levantar de
uma cadeira, carregar objetos, pentear os cabelos e dificuldade de levantar a cabeça
do travesseiro. Em casos agudos ou graves é comum a disfagia com episódios de
engasgo, até com a própria saliva, e fraqueza respiratória que traz o risco de
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aspiração se não colocar sonda naso-enteral. Para confirmação e avaliação do nível


de fraqueza, é realizado, durante exame físico, teste muscular baseado em um
sistema padronizado de graduação de força muscular (QUADRO 2).

QUADRO2. Graduação da força muscular

Grau 0 Nenhum movimento do músculo

Grau 1 Movimento completo quando se elimina força da gravidade

Grau 2 Esboço de contração muscular

Grau 3 Movimento vence a gravidade

Grau 4 Movimento vence certa resistência

Grau 5 Vence qualquer resistência (normal)

Critérios diagnósticos
Para se fazer o diagnóstico da miopatia é necessário além da anamnese,
exames laboratoriais e histopatológicos para diminuir a chance de erro diagnóstico,
Além disso, é importante que se use a mesma forma de diagnosticar os pacientes em
qualquer lugar do mundo. Desta forma foram propostos os critérios diagnósticos
(QUADRO 3)

QUADRO 3. Critérios diagnósticos de Bohan e Peter

1. Fraqueza muscular proximal.

2. Elevação de enzimas musculares: CPK ou Aldolase

3. Alterações miopáticas à Eletroneuromiografia - potenciais de unidade motora


de curta duração, polifásicos ou com fibrilações espontâneas).

4. Biópsia com achados compatíveis com miopatia inflamatória (necrose,


degeneração, regeneração e infiltrado inflamatório)

5. Lesões de pele características: heliótropo (edema e eritema nas pálpebras


superiores), Sinal de Gottron (eritema edematoso, atrófico, ou macular nas
superfícies extensoras das articulações dos dedos), eritema das superfícies
extensoras de cotovelos ou joelhos.

Diagnóstico definitivo: Polimiosite - 4/4 Critérios (1º ao 4º )


Dermatomiosite – 4/5 critérios (5º obrigatório)

2
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A fraqueza é a manifestação principal desses pacientes, entretanto, outras


manifestações podem ocorrer (QUADRO 4).

QUADRO 4. Manifestações Extra-musculares

Articular Poliartrite geralmente transitória e não-


erosiva.

Pulmonar Pneumonia aspirativa, doença Pulmonar


intersticial

Anti-Jo1, doença pulmonar intersticial,


Síndrome anti-sintetase: poliartrite, febre, fenômeno de Raynaud e
mãos de mecânico.

Cardíaco Geralmente é assintomático

Trato Gastro-intestinal Disfagia superior, regurgitação nasal ou


disfonia e vasculite sistêmica

Calcinose Calcificações Podem ocorrer na pele, tecido


subcutâneo, fáscia e músculos. Compromete
especialmente casos de DM juvenil

Renal Há relatos de glomerulonefrite em pacientes


com PM, entretanto essa associação é rara.

Fibra muscular normal DM e PM


A FIGURA 1 mostra a fibra muscular normal e suas principais regiões. Na PM e
DM ocorre necrose, degeneração e regeneração das fibras musculares e infiltrado
inflamatório, entretanto, a localização e as células da inflamaçào auxiliam na distintção
da DM e PM

Exames para diagnóstico da miosite

1. Enzimas musculares e relacionadas


x Creatinofosfokinase (CPK)- exame mais sensível para detectar a inflamação
x Adolase
x Desidrogenase lática (DHL)
x TGO / TGP
2. Auto-anticorpos
Auto-anticorpos específicos da miosite são encontrados em 30% dos pacientes. Estes
anticorpos são contra antígenos nucleares ou citoplasmáticos. Os anti-Jo1 são os mais

3
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importantes, fazendo parte de um grupo de anticorpos denominados de anti-sintetase.


Existe uma condição denominada síndrome anti-sintetase caracterizada por anti-Jo1,
fibrose pulmonar, febre, fenómeno de Raynaud, mãos de macânico e artrite.
3. Eletroneuromiografia
x Aumento de atividade insercional, com fibrilações e ondas positivas.
x Descargas bizarras de alta freqüência.
x Potenciais de unidade motora polifásicos, de baixa amplitude e curta duração.
4. Biópsia muscular
x Atrofia, degeneração e regeneração, bem como infiltrado inflamatório que pode
predominar no perimísio ou no endomísio.
x Na polimiosite, o infiltrado inflamatório tende a ser mais focal, com predomínio no
endomísio, com invasão de fibras por linfócitos T CD8+.
x Na dermatomiosite, em contraste, o infiltrado tende a ser constituído,
predominantemente, por células B e T CD4+, predominando na região
perivascular e perimisial, sem invasão das fibras.

DERMATOMIOSITE E NEOPLASIA
x Tem risco aumentado de malignidade de 4 a 6 vezes comparando com a
população geral, o início geralmente é após os 50 anos de idade. O câncer é
identificado principalmente no diagnóstico da DM ou no 1o ano de doença ou a
neoplasia ocorre um ano antes da DM. As neoplasias mais comumente
associadas são as de ovário, trato gastrointestinal, pulmão, mama e linfoma não-
Hodgkin.
x Para a detecção precoce, preconiza-se a realização periódica de história clínica
cuidadosa, exame físico completo (incluindo exame ginecológico e retal). Os
exames complementares indicados são o hemograma completo, bioquímica,
Papanicolau, pesquisa de sangue oculto nas fezes, raio X de tórax, mamografia
e colonoscopia, de acordo com idade e história familiar. Não são indicados
estudos invasivos e de imagem mais elaborados.

DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
Inclui doenças infecciosas, metabólicas, medicamentosas, inatas e
reumatológicas. As principais acham-se listadas no QUADRO 5.

5
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QUADRO 5. Diagnóstico diferencial

x Infecções: hepatite B e C, dengue, HIV, HTL1, Epstein Barr,


Influenza, toxoplasmose, leptospirose

x Distrofias

x Miastenia Gravis

x Rabdomiólise

x Piomiosite

x Hipotiroidismo, Hiperparatiroidismo

x Polimialgia reumática

x Hipocalemia e hiponatremia

x Miopatia alcoólica

x Miopatia Medicamentosa

TRATAMENTO

1. Corticoesteróide – é a droga de escolha no tratamento inicial da PM/DM. A mais


utilizada é a prednisona na dose de 1 mg/Kg/dia, mantida por um mês e meio até a
CPK se normalizar ou ocorrer melhora objetiva da força muscular. A dose da
prednisona deve ser diminuída progressivamente até 5 a 10 mg/dia mantida por até
um ano.

2- Hidroxicloroquina – na dose de 400mg/dia para controle do “rash” malar, artralgia,


mialgia e a fadiga muscular.

3- Imunossupressores – deve ser utilizado desde o diagnóstico, e permite a redução


mais rápida do corticóide. Deve ser mantido durante pelo menos um ano para
posterior redução gradual. Os principais imunossupressores estão citados abaixo:
x Metotrexate: na dose de 15 a 50 mg por semana associado ao ácido fólico para
prevenir complicação hepática. A dose máxima absorvida por via oral é de 25 mg;
acima disso deve-se utilizar a via subcutânea ou intramuscular.
x Azatioprina: na dose de 1.5 a 2 mg /Kg/dia monitorizando-se os leucócitos,
linfócitos e enzimas hepáticas.
x Ciclosporina: na dose de 3mg/Kg/dia de forma fracionada, acompanhando-se
eventual aumento da pressão arterial e da creatinina, que são indicadores de lesão

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renal pela droga.


x Ciclofosfamida: 1000mg/dose mensal endovenoso, por aproximadamente um ano,
reservado para casos de doença pulmonar grave e casos resistentes.
x Gamaglobulina: na dose de 1g /Kg por dois dias; está indicada para casos graves
e refratários, devido ao alto custo da medicação

4. Fotoprotetor: para evitar cicatrizes ou manchas residuais. Os bloqueadores devem


ter fator de proteção contra raio UVA e UVB de pelo menos 20.
5. Tacrolimus creme: indicado nos casos de “rash” resistente

Reabilitação:
Esta modalidade de tratamento é de extrema importância e deve ser iniciada já
ao diagnóstico para evitar retrações e atrofias musculares.

Prevenção de osteoporose
É recomendada a introdução de carbonato de cálcio (CaCO3) na dose de 1500
mg/dia e vitamina D - 800UI/dia para os pacientes sob o uso de altas doses de
corticosteróides. Para os pacientes já com osteoporose deve ser iniciada a terapia
com bisfosfonatos.

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POLIMIOSITE E DERMATOMIOSITE RESUMO

Definição
Doenças caracterizadas por inflamação da musculatura estriada.

Quadro Clínico
x Pacientes referem dificuldade para realizar atividades diárias, como levantar de uma
cadeira, carregar objetos, pentear os cabelos, dificuldade de levantar a cabeça do
travesseiro. Em casos agudos ou graves é comum a disfagia com episódios de engasgo,
até com a própria saliva, e fraqueza respiratória levando o paciente a aspirar se não
colocar sonda naso-enteral. A força muscular deve ser avaliada e graduada segundo
avaliação clínica padronizada (graduação da força e manobra de Mingazzini).
x Lesões de pele características: heliótropo (edema e eritema nas pálpebras superiores),
sinal de Gottron (eritema edematoso, atrófico, ou macular nas superfícies extensoras das
articulações dos dedos), eritema das superfícies extensoras de cotovelos ou joelhos.

Classificação das Miopatias Inflamatórias Idiopáticas


1. Dermatomiosite - DM (juvenil e adulta)
2. Polimiosite – PM
3. Miosite por Corpúsculo de Inclusão – MCI
4. Síndromes de Superposição (PM, DM ou MCI associada a outras doenças do tecido
conjuntivo)
5. Dermatomiosite associada ao câncer
Exames laboratoriais
1. Enzimas musculares: CPK, aldolase, TGO, TGP, DHL
2. Eletroneuromiografia
Aumento de atividade insercional, com fibrilações e ondas positivas.
Descargas bizarras de alta freqüência.
Potenciais de unidade motora polifásicos, de baixa amplitude e curta duração
3. Biópsia muscular: atrofia, degeneração e regeneração, bem como infiltrado inflamatório
que pode predominar no perimísio ou no endomísio. Na Polimiosite o infiltrado predomina
no endomisio, tendendo a ser mais focal, invadindo as fibras com células T. Na
dermatomiosite, o infiltrado tende a ser constituído predominantemente, por células B e T,
predominando na região perivascular e perimisial, sem invasão das fibras.

Tratamento
Reabilitação – precoce
Cloroquina
Corticoesteróide
Imunossupressores – Metotrexate, Azatioprina, ciclosporina, ciclosfamida

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POLIMIOSITE E DERMATOMIOSITE QUESTÕES

1. Na Polimiosite:
a) A biópsia muscular não é necessária para o diagnóstico.
b) A associação com neoplasia é mais comum que na população geral
c) Entre as enzimas musculares a CPK é o exame mais sensível
d) Os imunossupressores devem ser usados somente em casos refratário
e) A eletroneuromiografia deve ser evitada pois provoca dano muscular

2. Assinale a errada:
a) O FAN e o anti-Jo1 são sempre positivos nas miopatias inflamatórias
b) O anti-DNA pode estar presente na DM.
c) Na síndrome anti-sintetase, a fibrose pulmonar é um dos principais achados
d) As transaminases TGO e TGP podem estar alteradas nas miopatias inflamatórias
e) A polimiosite cursa com dor e fraqueza muscular

3. Marque a alternativa correta.


a) A neoplasia mais comum associada com a miopatia inflamatória é o linfoma
b) As lesões patognomônicas da DM não aparecem quando existe associação com neoplasia
c) No diagnóstico da DM deve ser investigada a presença de neoplasia
d) Caso não se encontre evidência de neoplasia devem-se utilizar métodos diagnósticos mais
sofisticados
e) nenhuma das anteriores

4. Na polimiosite, assinale a incorreta:


a) Gottron, heliotrópo, rash malar e fotossensibilidade são sinais patognomônicos.
b) Na biópsia muscular o infiltrado inflamatório é principalmente peri-vascular
c) O uso do protetor solar deve ser obrigatório
d) O pulmão é um órgão que sempre deve ser investigado
e) Miosite por Corpúsculo de Inclusão faz parte das miopatias inflamatórias

5. Assinale a incorreta:
a) A fraqueza muscular é diagnóstica nas miopatias inflamatória
b) As sorologia para vírus e protozoários são necessárias no diagnóstico
c) Nas distrofias musculares as enzimas musculares estão alteradas
d) A eletroneuromiografia é de grande ajuda na exclusão de doenças neurológicas que
podem confundir o diagnóstico das miopatias inflamatórias
e) A dermatomiosite cursa com Gottron e heliótropo

Respostas DM/PM: 1– c; 2- a; 3- c; 4- a; 5- a.

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA
1. Borges, CTL. Esclerose Sistêmica. In: Yoshinari, NH; Bonfá, ESDO. Reumatologia para o Clínico.
São Paulo, SP: Editora Roca Ltda.,pp.-49-58,2000
2. Marques Neto JF, Sampaio Barros,PD, Borges CTL, de Souza RBC. Esclerose Sistêmica In Lopes,
AC. Tratado de Clínica Médica v1. São Paulo, ed Roca. 2006, 1612-1618.
3. Oddis CV, Medsger TA . Inflammatory muscle disease: clinical features. In: Hochberg A, Silman AJ,
Smolen JS. Rheumatology. 3ª ed. London: Mosby, 2003. 1537-54.
4. Dalakas M, Reinhard H. Polymyosistis and Dermatomyositis. Lancet 2003; 971-82
5. Mastaglia FL, Phillips BA. Idiopathic inflammatory myopathies: epidemiology, classification, and
diagnostic criteria. Rheum Dis Clin N Am. 2002; 723-41.
6. Bohan A and Peter JB. Polymyositis and Dermatomyositis. N Engl J Med 1975; 344-47, 403-07.

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SÍNDROME DE SJÖGREN

Claudia Tereza Lobato Borges


Romy Beatriz Christmann de Souza
Maurício Levy

DEFINIÇÃO
É uma síndrome caracterizada por diminuição da função das glândulas salivares
e lacrimais levando o olho e boca seca, quadro denominado de síndrome sicca (ou
síndrome seca).
A Síndrome de Sjögren (SS) pode afetar outros órgãos e sistemas, como
articulações, pulmões, rins, coração fetal (lúpus neonatal), trato gastrintestinal, fígado,
vasos e sistema nervoso.

EPIDEMIOLOGIA
Cerca de 1% da população adulta é acometida pela SS segundo os Critérios de
Classificação Internacionais Revisados para SS publicados em 2002. A SS pode
ocorrer em qualquer idade, mas afeta principalmente mulheres com uma proporção de
9 mulheres para cada homem acometido. Incide entre a 4ª e 5ª décadas de vida.

CLASSIFICAÇÃO E QUADRO CLÍNICO


É denominada de SS primária quando aparece isoladamente, por outro lado,
quando está associada a doenças reumatológicas auto-imunes, caracteriza a SS
secundária, o que corresponde a 60% dos casos da doença. Os principais sintomas da
SS estão descritos no QUADRO 1.

QUADRO 1 – Freqüência das manifestações clínicas


Sintomas glandulares

x Xeroftalmia 95%

x Xerostomia 90%

x Parotidite 50%

x Dispareunia 30%

Sintomas extra-glandulares

x Artralgia e artrite 70%

x Fenômeno de Raynaud 50%


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x Fadiga, febre 40%

x Linfadenopatia 30%

x Doença Pulmonar de pequenas vias aéreas 20%

x Doença intersticial pulmonar 5%

x Nefrite intersticial, nefrocalcinose 10%

x Púrpura palpável 8%

x Glomerulonefrite 2%

x Esplenomegalia 5%

x Neuropatia periférica 2%

x Linfoma 5 a 10%

x Quadro hematológico 1%

DIAGNÓSTICO
O diagnóstico de SS é baseado na anamnese, exame físico e exames
complementares e auxiliado pelos critérios de classificação (QUADRO 2).

QUADRO 2. Critérios diagnósticos - a sensibilidade e a especificidade para o


diagnóstico de SS é de 97,2% e 90,2%, respectivamente.

I-Sintoma ocular (presença de pelo menos um desses sintomas)

1- Olho seco, 2-Sensação de corpo estranho, 3-Necessidade de uso de lágrima artificial.

II-Sintoma oral (presença de pelo menos um desses sintomas)

1- Boca seca, 2-Aumento de glândulas salivares, 3-Necessidade de ingestão de líquido


para ingerir alimentos.

III-Exames objetivos oculares (pelo menos um desses testes)

Teste de Schirmer positivo1, Rosa Bengala positivo2.

IV-Acometimento de glandulas salivares (pelo menos um desses testes)

1. Fluxo salivar não-estimulado (”1,5ml em 15 minutos) 3


2. Sialografia de parótida mostrando a presença de
sialectasias difusas (padrão destrutivo, cavitário ou puntato), sem
evidência de obstrução nos ductos principais4.
3. Cintilografia de glândula salivar mostrando atraso na captação, redução da
concentração e/ou atraso na excreção do traçador5.

V-Histopatologia
Sialoadenite linfocítica focal em glândula salivar menor, com escore focal • 1 (Foco:
aglomerado de pelo menos 50 linfócitos; por 4mm2 de tecido glandular) 6

VI-Auto-anticorpos.
Anticorpos séricos contra os antígenos Ro/SS-A ou La/SS-B, ou ambos.
2
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SS Primária: Presença de 4 dos 6 itens é indicativo de SS Primária, sendo obrigatório


o item V ou VI
SS Secundária: a presença do item I ou II, mais 2 dos itens III, IV e V pode ser
considerado como indicativo de SS Secundária em pacientes com outra doença do
tecido conectivo definida. Deve-se, entretanto, afastar algumas condições, tais como:
passado de tratamento com irradiação da cabeça e pescoço, Infecção pelo vírus da
hepatite C, síndrome da imunodeficiência adquirida (SIDA), linfoma pré-existente,
sarcoidose, doença do enxerto versus hospedeiro, uso de drogas anticolinérgicas,
antidepressivos, antihipertensivos, parassimpaticolíticos e neurolépticos.

Testes citados nos critérios de classificação:


1
Teste de Schirmer
Avalia quantitativamente a produção de lágrima, colocando-se uma fita de papel-
filme no saco conjuntival inferior. Considera-se o teste positivo quando menos de 5
mm na fita de papel é umidificada após 5 minutos. O normal é maior de 10 mm.
2
Coloração de Rosa-Bengala
Realizado com a aplicação do corante Rosa-Bengala que quando visualizado com
lâmpada de fenda é capaz de detectar a ceratoconjuntivite seca puntata ou filamentar.
3
Sialometria
Mede durante 15 minutos o fluxo salivar não-estimulado em um tubo calibrado.
O fluxo normal é maior que 1,5ml.
4
Sialografia
É um método radiográfico para acessar as mudanças anatômicas do sistema
ductal das glândulas salivares. Na SS, a sialografia mostra distorção dos ductos
(sialectasias) com importante retenção do contraste.
5
Cintilografia de glândulas salivares (Tecnécio99m)
É uma avaliação funcional de todas as glândulas salivares. O resultado
compatível com SS revela atraso na captação, redução da concentração e/ou atraso
na excreção do traçador.
6
Biopsia de glândula salivar menor
Considerada tradicionalmente como exame “padrão-ouro” para o diagnóstico. É
realizada na gengiva onde há glandulares salivares pequenas, sendo nessa
localização, menos incômodo para o paciente.

CONDIÇÕES GRAVES ASSOCIADAS À SS

3
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1-Linfoma
O linfoma na SS é 18 vezes mais comum em relação à população normal. O
linfoma geralmente aparece em média após 7 a 12 anos do diagnóstico da SS. Na
maioria dos casos trata-se de linfoma não-Hodgkin de linhagem de células B de grau
baixo ou intermediário de malignidade. Os fatores de risco para o desenvolvimento de
linfoma encontram-se discriminados no QUADRO 3.
O Linfoma MALT (linfoma extra-nodal, relacionado com mucosa) é o mais
comum, podendo ser localizado na parótida, estômago, pulmão e outras mucosas.

QUADRO 3. Fatores de Risco para Linfoma na SS


CLínicos Laboratoriais

Linfadenopatia Anticorpos anti-Ro e anti-La

Febre Crioglobulinas

Púrpura palpável, úlceras cutâneas de membros Hipergamaglobulina e pico monoclonal


inferiores

Parotidite Complemento baixo

Neuropatia Desaparecimento do fator reumatóide

2- Bloqueio cardíaco congênito:


É uma síndrome rara, 1:10.000 nascidos vivos, caracterizada por bloqueio
cardíaco congênito do 3o grau, irreversível, que pode ser detectado intra-uterin, a partir
de 21 semanas de gestação. Pode acompanhar-se de dermatite cutânea, lesão
reversível que aparece com a exposição à luz.

TRATAMENTO
O tratamento desta síndrome, deve ser multi-profissional, envolvendo a
reumatologia, oftalmologia, otorrino, ginecologia, odontologia e dermatologia.
Medidas fundamentais devem ser aplicadas a todos os pacientes, incluindo evitar
drogas anticolinérgicas e irritantes como fumaça de cigarro e pó. Recomenda-se
manter-se o ambiente úmido e ingestão líquidos freqüentemente..

1-Medidas locais:
Xeroftalmia
x Colírios de lágrima artificial
x Colírios de ciclosporina a 0,05%, contribuindo com a manutenção da integridade
do epitélio conjuntival e corneano,

4
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x Os corticóides tópicos devem ser usados com critérios, pois podem induzir
lesões corneanas e infecções e catarata
x Oclusão dos ductos naso-lacrimais,
Xerostomia
x Cuidados dentários preventivos e uso de flúor são essenciais.
x A saliva artificial pode melhorar a lubrificação e hidratação da mucosa oral.
Dispareunia: lubrificantes vaginais e para a xerose cutânea, o uso de emolientes.

2-Tratamento sistêmico:
- Secretagogos – estimulam as glândulas, atuando como agonistas colinérgicos,
estimulando receptores muscarínicos (M1 e M3) encontrados nas glândulas salivares,
lacrimais e outros órgãos. Os principais agentes utilizados na SS são: pilocarpina e
cevimelina.
A pilocarpina é comercializada em comprimidos de 5mg, utilizada 2 a 4 vezes por
dia. Os principais efeitos adversos são sudorese excessiva, náusea, rinite e diarréia.
Os comprimidos de cevimelina (30mg), são utilizados na dose de 30 mg 3 vezes ao
dia. Os efeitos colaterais são os mesmos descritos para a pilocarpina, mas em menor
freqüência.

3 - Tratamento das manifestações extra-glandulares

Fadiga músculo-esquelética
A hidroxicloroquina é muito utilizada para esse fim com boa resposta.
Fenômeno de Raynaud
Medidas gerais: evitar fumo, estresse emocional e ambiente frios, uso de luvas e
meias. O tratamento medicamentoso é indicado quando as medidas gerais não são
suficientes sendo utilizados os bloqueadores do canal de cálcio.
Sintomas extra-glandulares
Dependendo da manifestação e gravidade da doença utilizam-se
imunossupressores tais como ciclofosfamida, metotrexate, azatioprina, ciclosporina, e
rituximabe (especialmente no MALT).

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SÍNDROME DE SJÖGREN RESUMO

Definição
Doença auto-imune caracterizada pelo comprometimento das glândulas salivares e
lacrimais principalmente. Há dois tipos de SS: a primária e a secundária, que está
associada a outra doença do tecido conjuntivo.

Quadro Clínico principal


1. Xerostomia
2. Xeroftalmia
3. Parotidite
4. FAN: anti-Ro e anti-La

Complicações mais graves da SS


1. Linfoma – manifestações que indicam maior risco: linfadenopatia, parotidite, púrpura ou
úlceras cutâneas, febre, neuropatia, complemento baixo, anticorpos anti-Ro e anti-La,
pico monoclonal, crioglobulinas e desaparecimento do Fator reumatóide.

2. Lúpus Neonatal
o
a. Bloqueio cardíaco de 3 grau irreversível
b. Dermatite cutânea

Exames complementares:
1. Teste de Schirmer
2. Teste de Rosa Bengala
3. Sialometria
4. Sialografia
5. Cintilografia de parótidas
6. Biópsia de glândula salivar menor

Tratamento
1. Multi-profissional
2. Colírios, saliva artificial, cremes vaginais
3. Colírio de ciclosporina
4. Hidroxicloroquina – para fadiga e sintomas músculo-esquelético
5. Secretagogos: Pilocarpina e Cevimeline
6. Medicações imunossupressivas: Azatioprina, Metotrexate, ciclosporina, ciclofosfamida

6
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SÍNDROME DE SJÖGREN QUESTÕES

1) Assinale a alternativa correta:


a) O teste de Schirmer é feito para se detectar o olho seco
b) A síndrome de Sjögren primária está associada a outras doenças reumatológicas auto-
imunes
c) É uma doença mais comum em homens
d) O lúpus neonatal é uma manifestação freqüente da SS
e) O teste de Rosa Bengala é feito para avaliar a xerostomia.

2) Paciente do sexo feminino, 33 anos com parotidite de repetição recidivante, úlceras


cutâneas e linfadenopatia. Neste caso:
a) Deve-se pensar em linfoma, especialmente o MALT
b) A punção aspirativa de parótida auxiliaria o diagnóstico
c) A presença de pico monoclonal pode ser sugestivo de linfoma
d) Complemento baixo é um exame de auxilio na suspeita do linfoma
e) Todas são corretas.

3) Paciente com artriite reumatóide que inicia com xerostomia e xeroftalmia Assinale e
alternativa incorreta:
a) A artrite reumatóide é a doença reumatológica mais comumente associada a síndrome
de SS.
b) A SS é uma doença que deve ser cuidada somente pelo reumatologista
c) O uso de colírios lubrificantes pode evitar úlceras de córnea.
d) Os imunossupressores são indicados oem manifestações mais graves
e) O diagnóstico é baseado nos critérios de classificação.

4) Paciente do sexo feminino com 55 anos com xeroftalmia, fenôme de Raynaud e


artralgia Assinale a alternativa correta:
a) Esses sintomas são sugestivos de artrite reumatóide
b) O uso de hidroxi-cloroquina e bloqueadores de canal de cálcio não estão indicados.
c) A avaliação oftalmológica é indicada.
d) Esses sintomas não merecem tratamento
e) A ciclofosfamida é a droga de escolha

5) Assinale a alternativa correta SS primária


a) É uma doença geralmente benigna.
b) O corticóide é uma droga muito utilizada.
c) A biópsia da glândula saliva é mandatória para o diagnóstico da SS primária
d) O Lúpus neonatal ocorre nas pacientes com lúpus eritematoso sistêmico
e) O comprometimento de SNC é uma manifestação frequente

Respostas S Sjögren: 1-a; 2-e; 3-b; 4-c; 5-a

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA
1. Síndrome de Sjögren In: Natalino Hajime Yoshinari; Eloísa Silva Dutra Oliveira Bonfá. Reumatologia
para o Clínico. São Paulo, SP. Editora Roca, 2000, pp.49-58.
2. Síndrome de Sjögren In: Antonio Carlos Lopes editor 1 ed Tratado de Clínica Médica, São Paulo, SP,
Editora Roca v1, 2006, pp 1612-1618.
3. Tzioufas AG, Moutsopoulos H. Sjögren´s syndrome. In: Hochberg MC, Silman AJ, Smolen JS, Weinblatt
ME, Weisman MH, editores. Rheumatology. 3nd ed. London: Mosby, 2003.1431-43.
4. Vitali C, Bombardieri S, Jonsson R, Moutsopoulos HM, Alexander EL, Carsons SE, et al.
Classification criteria for Sjögren´s syndrome: a revised version of the European criteria proposed by the
American-European Consensus Group. Ann Rheum Dis 2002; 554-58.
5. Zintzaras E, Voulgarelis M, Moutsopoulos HM. The risk of lymphoma development in autoimmune
diseases – A meta-analysis. Arch Intern Med 2005; 2337-44.

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DOENÇA MISTA DO TECIDO CONJUNTIVO


E SÍNDROMES DE SUPERPOSIÇÃO

Maria Teresa Correia Caleiro

DEFINIÇÃO
A DMTC é uma doença difusa do tecido conjuntivo que foi descrita em 1972, a
partir de estudos com soros de pacientes que continham altas taxas de anticorpo anti-
RNP dirigidos a um antigeno extraível do núcleo, a ribonucleoproteína.
As síndromes de superposição são definidas pela presença de mais de uma
doença do tecido conjuntivo em um mesmo paciente sendo, portanto, bastante raras.

EPIDEMIOLOGIA
Acomete principalmente pacientes do sexo feminino numa relação que varia de
9:1 até 24:1. A idade de início situa-se entre de 4 e 56 anos, segundo diferentes
séries, havendo maior incidência na quarta década de vida.
Não existem dados sobre diferença de prevalência segundo a raça, mas as
casuísticas orientais (especialmente do Japão) são bastante numerosas em
comparação às ocidentais. Estudos epidemiológicos na Finlândia detectaram
incidência anual de DMTC de 8/ 1.000.000 de adultos e de 1/1.000.000 de crianças.

ETIOLOGIA
A etiologia da DMTC não é conhecida.

ANÁTOMO-PATOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
Sendo rara, pouco se sabe sobre a fisiopatologia. O achado mais importante e
encontrado em diferentes séries é do comprometimento vascular, disseminado, com
proliferação da íntima e hipertrofia da média em artérias e arteríolas em todos os
tecidos examinados post-mortem. Ao mesmo tempo, há achados de processo
inflamatório crônico associadas à lesão vascular ou isoladamente, assim como
vasculite com ou sem necrose fibrinóide.

QUADRO CLÍNICO

O início da doença é habitualmente insidioso. Os comprometimentos mais


freqüentes no início da doença são poliartrite, fenômeno de Raynaud, edema difuso de
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dedos e/ou mãos e fraqueza muscular. Manifestações gerais como febre, perda de
peso e adinamia não são raras. Diferentes estudos evidenciaram achados
semelhantes de prevalência de manifestações clínicas, sendo: fraqueza muscular em
75% dos pacientes, assim como febre e disfagia baixa; linfadenopatia e
hipergamaglobulinemia em 68%; outras manifestações em mais de 63%: quadro
articular, Raynaud, edema de dedos e/ou mãos, miosite, e diminuição da capacidade
de difusão de monóxido de carbono (CO) no sistema respiratório.

O fenômeno de Raynaud pode preceder em muitos anos as outras


manifestações da doença. Frequentemente é intenso e requer tratamento
medicamentoso além de medidas físicas. Quando grave, foi considerado fator preditivo
de maior mortalidade em adultos. Os pulsos periféricos são normais ao exame físico.

Quando o edema de dedos e/ou mãos (FIGURA 1) aparece nas fases iniciais,
pode vir acompanhado de fenômeno de Raynaud. Não é característico de DMTC,
podendo estar presente no início da esclerose sistêmica, na fasciíte eosinofílica e nas
síndromes de superposição relacionadas com anticorpos citoplasmáticos tRNA
sintetases.

FIGURA 1 – edema difuso de dedos e mãos

Artralgia acomete até 100% dos pacientes, sendo de altíssima prevalência em


todas as casuísticas; artrite é o sintoma inicial em 50 a 89% dos casos. O
envolvimento articular mostrou-se semelhante ao padrão da artrite reumatóide (DRe);
deste modo, a confusão inicial com esta enfermidade não é rara. As características
são variáveis, podendo ser LES-símile ou, raramente, evoluir para artrite mutilante.

A esclerodactilia, ou espessamento da pele dos dedos distalmente às


articulações metacarpofalangeanas está presente em até 75-86% dos pacientes.
Pacientes com DMTC com frequência apresentam lesões cutâneas
eritematosas: livedo reticular, teleangiectasias, eritema malar, por vezes em asa de
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borboleta. Menos freqüentes são as lesões de dermatomiosite como heliótropo


(eritema violáceo nas pálpebras) e sinal de Gottron (eritema no dorso das articulações
das mãos).

A miosite aparece em 51 a 67% dos pacientes, em geral leve e pouco


sintomático na maioria deles. Habitualmente surge nos primeiros três anos de doença.

O trato digestivo alto é frequentemente acometido (mais de 90%), com


redução da pressão do esfíncter inferior do esôfago e alterações de motilidade
esofágica chegando a aperistalse. A complicação mais comum é a esofagite de refluxo
de difícil tratamento, já que a resposta terapêutica da dismotilidade é muito limitada.

O quadro pulmonar da DMTC é comum (25-85% dos pacientes) e


responsável por alto índice de morbidade, além de frequentemente grave. No entanto,
só é sintomático em 27-30% dos acometidos. A queixa mais comum, quando presente,
é tosse seca e/ou dispnéia aos esforços. A ausculta pulmonar é normal nas
manifestações iniciais e verificam-se estertores crepitantes finos nas bases
pulmonares na doença mais avançada. Pneumonite intersticial e fibrose pulmonar
respondem por 20-65% das pneumopatias na DMTC. Pleurite aparece em 2 a 20%
dos pacientes.

A manifestação cárdio-vascular mais grave e maior causa de óbito nesta


doença é a hipertensão pulmonar. Não é secundária à fibrose pulmonar, sendo
causada por alteração da vasculatura pré-capilar. Está presente em 23 a 75% dos
pacientes com manifestação clínica de fadiga ou dispnéia aos esforços. A oximetria
basal pode ser normal mas apresenta redução após caminhada de 6 minutos.
O comprometimento ocular mais prevalente na DMTC é o olho seco
(xeroftalmia) isoladamente ou associado a xerostomia.
As citopenias estão presentes na DMTC devido à doença propriamente dita
ou a seu tratamento. As três séries podem estar comprometidas, em geral
isoladamente. Trombocitopenia pode ser refratária ao tratamento em até 10% dos
pacientes. Síndrome anti-fosfolípide clássica foi raramente relatada na literatura.
Comprometimento renal não é frequente sendo que a nefropatia mais
prevalente, ainda que rara, é a nefirte membranosa com proteinúria leve.
As alterações endócrinas mais importantes relacionam-se ao tratamento. O uso
de corticoesteróides, mesmo em doses leves a moderadas, como na maioria dos
casos, frequentemente leva a síndrome de Cushing iatrogênica e suas complicações.
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Manifestações neuro-psiquiátricas são raras; o comprometimento mais


comum é a neuropatia do trigêmio. No entanto, quadros graves já foram relatados
como mielite transversa e catatonia.

DIAGNÓSTICO

O diagnóstico de DMTC baseia-se em dados clínicos de história e exame


físico, necessariamente com a presença do auto-anticorpo anti-U1RNP(anti-RNP) em
títulos superiores a 1:1000 por hemaglutinação, além de exames complementares.

Para efeito classificatório de doenças e aumento de probabilidade de acerto


diagnóstico existem critérios aceitos internacionalmente. No caso da DMTC os critérios
de classificação são muito importantes devido às manifestações clínicas semelhantes
à outras doenças difusas do tecido conectivo e às síndromes de superposição. Um
dos critérios mais utilizados na literatura está descrito no QUADRO 1.

À suspeita clínica de DMTC, exames complementares indispensáveis para


diagnóstico do paciente incluem:
x Hemograma completo - citopenias
x Pesquisa dos auto-anticorpos anti-RNP, anti-Sm e anti-DNAn
x Dosagem de CPK e aldolase no soro - miopatia
x RX simples de tórax e testes funcionais com determinação da capacidade
de difusão de monóxido de carbono (CO); caso o RX seja normal,
tomografia computadorizada de tórax de alta resolução - avaliação
pulmonar
x Esofagograma contrastado com bario – dismotilidade esofágica
x Eletroneuromiografia - no caso de suspeita clínica de miopatia e dosagem
normal de enzimas musculares

DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL

O diagnóstico diferencial se faz inicialmente com doenças infecciosas,


endócrinas e neoplásicas, dependendo da forma de apresentação do paciente. Do
ponto de vista muscular, lembrar sempre de tireoidopatias e toxoplasmose. O
QUADRO 2 apresenta sintomas e sinais clínicos relativamente específicos em relação
às DDTC.

QUADRO 1. Critérios de classificação propostos por Kasukawa e cols.


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1. Sintomas comuns:

1.1. Fenômeno de Raynaud

1.2. Edema de dedos ou mãos

2. Anticorpos anti-RNP presentes em títulos superiores a 1:1000

3. Achados clínicos:

3.1. Achados LES-símile:

- poliartrite

- linfadenopatia

- eritema facial

- pericardite ou pleurite
3 3
- leucopenia (< 4.000/mm ) ou trombocitopenia (< 100.000/mm )

3.2. Achados ES-símile :

- esclerodactilia

- fibrose pulmonar, restrição pulmonar ou redução da capacidade de difusão (DCO< 70%)

- hipomotilidade ou dilatação do esôfago

3.3. Achados PM-símile:

- fraqueza muscular

- aumento das enzimas musculares no soro (CPK)

- padrão miopático à eletroneuromiografia

DIAGNÓSTICO: quando todas as 3 condições abaixo forem preenchidas:

1. Pelo menos um dos sintomas comuns estiver presente.

2. Presença de anti-RNP.

3. Um ou mais achados em duas ou três das categorias de doença de 3.1., 3.2. e 3.3..

Afastados clínica e/ou laboriatorialmente diagnósticos não reumatológicos,


devemos pensar nas doenças difusas do tecido conjuntivo. O QUADRO 3 apresenta
de forma resumida dados laboratoriais nas diferentes doenças difusas do tecido
conjuntivo. Lúpus eritematoso sistêmico (LES), esclerose sistêmica (ES), artrite
reumatóide (AR) e dermato-polimiosite (DPM) serão sempre os diferenciais mais
importantes.

Quando o paciente apresenta fenômeno de Raynaud, deve ser solicitada a


capilaroscopia periungueal (CPU) para visualização da rede capilar nesta localização.
Praticamente 100% dos pacientes com ES apresentam alterações microangiopáticas,
80% dos que têm dermatomiosite, 65-72% dos enfermos com DMTC e 2-12% dos
doentes lúpicos. Doença reumatóide não traz alterações microangiopáticas
visualizáveis à CPU.
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Os auto-anticorpos anti-DNAn (nativo ou dupla hélice) e o anti-Sm são


altamente específicos para LES e portanto devem estar negativos para o diagnóstico
de DMTC. É de fundamental importância se ter em mente que auto-anticorpos não
fazem diagnóstico isoladamente. O conjunto clínico-laboratorial é indispensável para o
raciocínio diagnóstico e para avaliação de diagnósticos diferenciais.

QUADRO 2 - Alguns aspectos clínicos relacionados às DDTC

Relativamente específicos Relativamente pouco específicos

Artrite Artralgias
Miosite Mialgias
Fenômeno de Raynaud de início na infância Fenômeno de Raynaud de início tardio
Espessamento de pele em extremidades e Fotossensibilidade
tronco
Fadiga
Eitema malar
Rigidez matinal

QUADRO 3 - Alguns aspectos dos auto-anticorpos nas DDTC

Achados laboratoriais relativamente Achados laboratoriais relativamente


específicos pouco específicos

x FAN padrão periférico (LES) x FAN padrão homogêneo


x FAN padrão nucleolar (ES) x FAN padrão salpicado (ou pontilhado )
x Anti-DNAn (nativo ou dupla hélice) (LES) x Anti-DNA (hélice simples)
x Anti-Sm (LES) x Anti-Ro (SSA)
x Anti-SCl-70 ou anti-topoisomerase 1(ES) x Anti-La (SSB)
x Anti-centrômero (ES) x Fator Reumatóide positivo
x Anti-Jo 1 (PM)

TRATAMENTO

O tratamento se baseia no controle do processo inflamatório e da evolução da


doença. A escolha do anti-inflamatório depende da intensidade da inflamação, sendo
necessário o uso de anti-inflamatório hormonal (corticoterapia) na maioria absoluta dos
casos, embora em doses baixas a moderadas de prednisona (0,1 a 0,5 mg/kg/dia).
Doses de até 1 mg/kg/dia e pulsoterapia podem ser necessárias.
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Para controle da evolução da doença são utilizadas drogas citotóxicas como


metotraxate, azatioprina, micofenolato de mofetil, ciclofosfamida, entre outras. Utiliza-
se colchicina nos casos de doença fibrótica leve ou moderada da pele, e cloroquina,
sulfassalazina e leflunomida na doença articular. A D-penicilamina e os sais de ouro
não devem ser administrados, assim como é discutível o uso de fármacos anti-fator de
necrose tumoral alfa.

O quadro esofágico e o fenômeno de Raynaud devem receber tratamento


específico.

Novas drogas estão sendo empregadas no tratamento da hipertensão arterial


pulmonar como bosentan, epoprostenol, treprostinil, iloprost inalatório, ou combinação
de drogas como iloprost associado a corticoesteróide, ciclofosfamida e heparina.

SÍDROMES DE SUPERPOSIÇÃO

As manifestações de uma síndrome reumatológica não aparecem


necessariamente ao mesmo tempo, podem ser aditivas. Desse modo, não é raro que
se encontrem pacientes com sinais e sintomas de uma ou mais DDTCs, sem
completar o quadro de uma doença específica. Nesta situação, o paciente tem uma
doença indiferenciada do tecido conectivo (com várias sinonímias, como
conectivopatia não-definida - CND e conectivopatia indiferenciada - CI). Este paciente
pode, na evolução desenvolver o quadro completo e fechar o diagnóstico para uma
das DDTCs; pode também desenvolver sinais e sintomas de mais de uma DDTC e
completar o quadro de duas doenças, ficando assim com uma síndrome de
superposição ou ainda, pode continuar apenas com manifestações de uma ou mais
DDTCs sem evoluir para um diagnóstico definido, que é a possibilidade mais freqüênte
na prática clínica.
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DMTC RESUMO

Epidemiologia

x Idade de início: 4 a 56 anos com pico na quarta década


x Gênero: homens 1 : 9 a 24 mulheres
x Prevalência: mais rara que LES, mais comum que ES e DPM (1 a 8 / 1 000 000)

Fisiopatologia e patologia

x Comprometimento vascular - proliferação da íntima e hipertrofia da média em artérias e


arteríolas
x Comprometimento inflamatório - processo inflamatório crônico em associação à lesão
vascular ou isoladamente
x Vasculite com ou sem necrose fibrinóide

Quadro Clínico

x Início insidioso, muitas vezes iniciado com poliartrite, fenômeno de Raynaud, edema
difuso de dedos e/ou mãos e fraqueza muscular
x Fenômeno de Raynaud – pode preceder a doença em anos, em geral intenso
x Edema difuso dos dedos ou mãos
x Artrite e artralgia são muito frequentes e é comum seguir o padrão da artrite
reumatóide
x Esclerodactilia aparece em aproximadamente 80% dos pacientes
x Lesões eritematosas semelhantes às do LES e/ou da DM
x Miosite por vezes leve e sub-clínica
x Dismotilidade esofágica com doença do refluxo gastro-esofágico e conseqüente
esofagite e complicações pulmonares
x Doença intersticial pulmonar crônica: muito prevalente porém, de evolução
silenciosa.
x Primeira causa de óbito é a hipertensão pulmonar, presente em até 75% dos
pacientes.
x Plaquetopenia pode ser grave, chegando a 10% de casos refratários
x Doença renal é rara, sendo a lesão membranosa a mais comum.

Exames complementares

Havendo suspeita clínica de DMTC:

x Hemograma completo
x Pesquisa dos auto-anticorpos anti-RNP, anti-Sm e anti-DNAn
x Dosagem de CPK e aldolase no soro
x Avaliação pulmonar com RX simples de tórax e testes funcionais com determinação
da capacidade de difusão de monóxido de carbono (CO); caso o RX seja normal,
tomografia computadorizada de tórax de alta resolução
x Esofagograma contrastado com bário
x Eletroneuromiografia no caso de suspeita clínica de miopatia e dosagem normal de
enzimas musculares

Diagnóstico

x O conjunto clinico-laboratorial é indispensável para o raciocínio diagnóstico e para


avaliação de diagnósticos diferenciais.

x Critérios de classificação propostos por Kasukawa e cols.


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DMTC QUESTÕES

1) Que lesões cutâneas podem estar presentes nas referidas doenças:


a) Dermatomiosite – heliótropo e fotossensibilidade
b) LES – eritema malar e púrpura
c) ES – espessamento cutâneo de face e antebraços
d) DMTC – eritema malar e heliótropo
e) Todas as anteriores

2) Mulher de 29 anos, entrou no PS do InCor com queixa de falta de ar progressiva há 8


meses. Procedente de Goiás, recebeu diagnóstico de Hipertensão Pulmonar e e que
a evolução seria fatal por não haver tratamento disponível. Apresentou-se com
intensa dispnéia e cianose em lábios. A história incluía quadro de fraqueza muscular
que antecedeu a dispnéia e anemia leve. Referia pirose e regurgitação. Ao exame, foi
observado edema difuso de dedos, espessamento cutâneo em face, Raynaud
importante, fraqueza muscular de cinturas e ausculta cárdio-pulmonar compatível
com o diagnóstico dado. Trouxe ecocardiograma confirmatório, enzimas musculares
elevadas 6 vezes e FAN positivo, padrão pontilhado. Pergunta-se:

1. Hipótese diagnóstica principal:


a) Hipertensão pulmonar primária idiopática
b) Hipertensão pulmonar secundária a fibrose pulmonar
c) Hipertensão pulmonar secundária a doença do colágeno, provavelmente LES
d) Hipertensão pulmonar secundária a doença do colágeno, provavelmente ES
e) Hipertensão pulmonar secundária à doença do colágeno, provavelmente
DMTC

2. Qual exame pode confirmar a hipótese acima:


a) Tomografia computadorizada de tórax de alta resolução
b) Esofagograma contrastado com bário
c) Dosagem de outros auto-anticorpos
d) Testes funcionais pulmonares com difusão de monóxido de carbono
e) Oximetria em repouso e após caminhada de 6 minutos

3) Mulher de 38 anos, referindo poliartrite de pequenas e grandes articulações há 4


meses, emagrecimento de 3kg no período e escurecimento e branqueamento dos
dedos quando lava louça, às vezes ficando muito vermelhos depois de alguns
minutos. Ao exame físico, BEG, corada, hidratada, dispneica+, anictérica, acianótica,
subfebril. Pulsos periféricos normais. Fenômeno de Raynaud moderado. Poliartrite
leve nas mãos, punhos e joelhos. Presença de edema difuso de dedos ++/4,
dificultando a avaliação de esclerodactilia. Leve hiperfonese de segunda bulha em
foco pulmonar. Auto-anticorpos: FAN + padrão pontilhado, anti-Sm negativo, anti-
RNP 1:5120, anti-DNAn negativo, anti-SCl-70 negativo. Pergunta-se:

1. Qual a maior causa de óbito nesta doença?


a) Hipertensão Pulmonar
b) Infecções
c) Broncopneumonia aspirativa
d) Nefropatia
e) Fibrose pulmonar

2. Assinale manifestações intra-torácicas frequentemente presentes nesta


doença:
a) Esofagite e cistos pulmonares
b) Esofagite e valvopatia
c) Cistos pulmonares e divertículo de Zenkel
d) Doença intersticial pulmonar e dismotilidade esofágica
e) Doença intersticial pulmonar e divertículo de Zenkel
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Respostas DMTC: 1-e; 2.1-e; 2.2-c; 3.1-a; 3.2-d

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA

1. Sharp GC. MCTD: a concept which stood the test of time. Lupus 2002; 11:333-339.
2. Burdt MA, Hoffman RW, Deutscher SL, Wang GS, Johnson JC, Sharp GC. Long-term outcome in Mixed Connective
Tissue Disease. Arthritis Rheum 1999;42(5):889-909.
3. Bodolay E, Szekanecz Z, Dévényi K, Galuska L, Csípö I, Vègh J et al. Evaluation of interstitial lung disease in mixed
connective tissue disease. Rheumatology 2005; 44:656-61.
4. Pope JE. Other manifestations of mixed connective tissue disease. Rheum Clin N Am 2005; 31:519-33.
5. Vegh J, Szororay P, Kappelmayer J, Csipo I, Udvardy M, Lakos G et al. Clinical and immunoserological
characteristics of mixed connective tissue disease associated with pulmonary arterial hypertension. Scand J Immunol
2006;64(1)(suppl):69-76.
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SÍNDROME ANTIFOSFOLÍPIDE (SAF)

Jozélio Freire de Carvalho

DEFINIÇÃO
A Síndrome Antifosfolípide é uma trombofilia adquirida auto-imune caracterizada
pela presença de trombose vascular e/ou abortamentos de repetição e, comumente,
plaquetopenia.

EPIDEMIOLOGIA
É uma síndrome de descrição relativamente recente (década de 80) na
Medicina, no entanto já tem vários pontos da sua fisiopatologia compreendidos, inclusive
com modelos animais experimentais para a sua reprodução e estudo. Em relação à
predominância de sexo, na síndrome associada a doenças do conjuntivo (p. ex. lúpus
sistêmico) há uma nítida predominância do sexo feminino. Por outro lado, quando na sua
forma isolada de aparecimento a SAF apresenta igual prevalência em ambos os sexos.

FISIOPATOLOGIA
Na SAF existe um ambiente extremamente favorável à trombose. Neste sentido,
todas as etapas do sistema hemostático podem estar envolvidas:
a) Existe uma maior expressão e ativação das células endoteliais
b) Pode haver um aumento da agregação e da adesividade plaquetárias
c) Maior tendência à formação de trombina, e consequentemente, a clivagem
do fibrinogênio em fibrina
d) Redução das proteínas anticoagulantes naturais (proteínas C e S)
e) Redução da fibrinólise.

QUADRO CLÍNICO
A SAF apresenta como manifestação clínica mais comum a trombose venosa
profunda (TVP) de vasos dos membros inferiores, com ou sem embolia pulmonar,
seguida em freqüência por eventos arteriais, sendo o mais comum deles o acidente
vascular encefálico isquêmico. Os episódios trombóticos sempre devem ser confirmados
por exames de imagem, seja o ultra-som doppler dos vasos, arteriografia, ressonância
magnética, cintilografia pulmonar de ventilação-perfusão ou ainda uma análise de biópsia
revelando trombos em pequenos vasos.
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Em relação às manifestações obstétricas da SAF. Deve-se suspeitar desta


síndrome na presença de pelo menos 3 abortamentos com idade gestacional menor que
10 semanas ou um abortamento com idade gestacional maior ou igual a 10 semanas ou
ainda um parto prematuro (<34 semanas) desencadeado por eclâmpsia, pré-eclâmpsia
ou insuficiência placentária (TABELA1).

TABELA1. Critérios clínico-laboratoriais de SAF

CRITÉRIOS CLÍNICOS

Trombose arterial e/ou venosa e/ou de capilares. Confirmado por imagem ou histopatologia.

- 1 ou + óbito fetal • 10 sem


- 3 ou + abortos espontâneos < 10 sem
- 1 ou + parto prematuro (< 34 sem) – eclâmpsia, pré-eclâmpsia ou insuf placentária
Excluir: alterações hormonais, anatômicas e cromossômicas

CRITÉRIOS LABORATORIAIS

Anticoagulante lúpico
Anticardiolipina IgG ou IgM em título médio ou alto (ELISA) > 40 GPL ou MPL
Anti-ȕ2-glicoproteína-I IgG ou IgM (ELISA)

Outras manifestações também presentes são a tromboflebite superficial, úlceras


isquêmicas, a amputação de membros por isquemia de extremidade e isquemia de vasos
retinianos. Praticamente todos os sistemas vasculares do organismo podem ser
envolvidos por essa síndrome de modo que quando um paciente apresentar com
trombose de território vascular atípica, a SAF deve ser considerada.
A manifestação cutânea mais comum e que deve levar à investigação de SAF é
a presença de livedo reticular. Em relação ao quadro hematológico destaca-se a
plaquetopenia como manifestação mais freqüente, seguida da anemia hemolítica,
podendo ser Coombs positiva. A neutropenia não foi descrita na SAF primária.
Outras manifestações não-trombóticas da SAF bastante comuns são a
enxaqueca, a coréia, a mielite transversa e o livedo reticular.
As condições clínicas e laboratoriais que podem levar à suspeita de SAF
encontram-se listadas na TABELA 2.

LABORATÓRIO
Os anticorpos antifosfolípides utilizados na rotina clínica atualmente são o
anticoagulante lúpico, a anticardiolipina IgG e/ou IgM e, por fim, a anti-beta-2-
glicoproteína 1 IgG e/ou IgM.
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O anticoagulante lúpico é um ensaio funcional onde se faz inicialmente uma


triagem com teste de coagulação de rotina: Tempo de Tromboplastina Parcial ativado
(TTPa) ou Tempo de Veneno diluído da Víbora Russel (dRVVT). Se estes testes
estiverem prolongados acrescenta-se plasma de um indivíduo normal e a seguir o teste é
repetido. Caso haja uma normalização do TTPa ou dRVVT, o mais provável é que se
trate de deficiência de fator de coagulação; caso se mantenha prolongado pode ser
devido à presença de um inibidor de fator(es) de coagulação. Na última etapa do teste,
adiciona-se fosfolípides ao ensaio. Se houver normalização do TTPa ou dRVVT, fica
demonstrado a dependência de fosfolípides e confirma-se assim a presença de
anticoagulante lúpico.
Em relação a anticardiolipina e anti-beta-2-glicoproteína I IgG e/ou IgM utiliza-se
a técnica de ELISA, já padronizada internacionalmente.
Estes anticorpos devem ser medidos em duas ocasiões com intervalo de pelo
menos 12 semanas, o que demonstra a não temporariedade dos auto-anticorpos.

TABELA 2. Condições clínicas nas quais se deve considerar a SAF

Pacientes jovens com trombose (< 40 anos)

Plaquetopenia

Trombose em território atípico

Múltiplas tromboses

TTPa prolongado sem causa definida

Livedo reticular

Trombose em indivíduos sem fatores de risco para aterosclerose (DM, HAS, dislipidemia)

Abortamentos de repetição

Trombose com doença auto-imune associada (p. ex.. LES)

Eclâmpsia, pré-eclâmpsia, insuficiência placentária

DIAGNÓSTICO
O diagnóstico de SAF sempre é feito pela associação de pelo menos um evento
clínico vascular ou obstétrico e a presença persistente de pelo menos um anticorpo
antifosfolípide. Os critérios de SAF encontram-se na TABELA 1.
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TRATAMENTO
Em relação ao tratamento da SAF, deve-se dividir em fase aguda ou tratamento
de manutenção, que na verdade é a profilaxia de novos eventos. Na fase aguda de uma
trombose deve-se realizar o mesmo tratamento de uma condição isquêmica que não seja
SAF. Ou seja, uso de bolus de heparina não-fracionada (HNF) intravenosa seguida de
infusão contínua e o controle obrigatório através do TTPa. Outra opção é o uso de
heparinas de baixo peso molecular (HBPM) que não requerem monitorização laboratorial
para atingir o alvo terapêutico.
Após o episódio agudo, a anticoagulação deve ser mantida indefinidamente. Nos
indivíduos que apresentaram eventos venosos, o uso de warfarin (anticoagulante oral)
deve ter como alvo um INR entre 2 e 3. Os indivíduos arteriais, subdividem-se em 2
grupos: aqueles com AVC e aqueles com fenômenos isquêmicos arteriais não-AVC. Nos
pacientes com isquemia arterial extra-SNC, o acerto posológico deverá objetivar INR
entre 3 e 4. Nos indivíduos com o primeiro episódio de AVC, preconiza-se o AAS
300mg/dia ou warfarin, mantendo-se o INR entre 2 e 3; no caso de episódios recorrentes
de AVC a escolha terapêutica é anticoagulação com warfarin mantendo-se o INR entre 3
e 4.
Em relação aos eventos obstétricos considera-se duas situações.
1) quando a mulher nunca apresentou episódio trombótico prévio: o tratamento
na gravidez é feito com AAS (100mg/dia) associado à heparina em dose
profilática (HNF 5000 UI subcutânea 2x dia ou enoxaparina 40mg
subcutânea 1x dia).
2) Nos casos nos quais a mulher tenha apresentado episódio vascular prévio e,
portanto sob uso crônico de anticoagulante oral, o mesmo deve ser suspenso
no primeiro trimestre por ser teratogênico e substituído por HNF numa
dosagem de modo a situar o TTPa entre 1,5-2,5 ou HBPM em dose
terapêutica anticoagulante. Na gravidez recomenda-se monitorizar a
anticoagulação com HBPM através da dosagem dos níveis do fator anti-Xa.
A plaquetopenia em níveis moderados (entre 50.000 e 100.000) é freqüente e
raramente cursa com sangramentos (equimoses, petéquias, gengivorragia ou epistaxe)
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SAF RESUMO

Epidemiologia
x Idade: incidência - 30 a 50 anos
x Sexo: mulheres 9 : 1 homem na SAF secundária e 1:1 na SAF prmária

Fisiopatologia
1. Aumento da ativação endotelial
2. Hiperagregação e adesividade palquetária
3. Aumento da geração de trombina
4. Redução da fibrinólise
5. Redução de fatores anticoagulantes naturais

Classificação
1. Primária: Quando ocorre isoladamente, sem outra doença do tecido conjuntivo
concomitantemente.
2. Secundária: Quando associada a outra doença do tecido conjuntivo, principalmente o lúpus
eritematoso sistêmico.

Quadro Clínico
1. Manifestações vasculares: Trombose arterial, venosa, de capilares qeud eve ser
demosntrada em exame de imagem ou anatomia patológica.

2. Manifestações obstétricas
x 1 ou + óbito fetal • 10 sem
x 3 ou + abortos espontâneos < 10 sem
x 1 ou + parto prematuro (< 34 sem) – eclâmpsia, pré-eclâmpsia ou insuficiência
placentária

Exames complementares
x Anticardiolipina IgG e/ou IgM (ELISA padronizado)
x Anticoagulante lúpico (testes funcionais padronizados)
x Anti-beta-2-glicoproteína-I IgG e/ou IgM (ELISA padronizado)
x Para confirmar a SAF: pelo menos um desses anticorpos, em pelo menos duas
ocasiões com intervalo de 12 semanas.

Diagnóstico
x Pelo menos 1 manifestação clínica + pelo menos 1 anticorpo antifosfolípide.

Tratamento

1. Episódio vascular:
a. Fase aguda de trombose: Tratamento segue a rotina similar da trombose não-SAF, ou
seja, anticoagulação plena com heparina
b. Preventivo:
x Trombose vensosa: warfarin com manutenção do INR 2-3
x Trombose arterial não-AVC: warfrin com INR 3-4
x AVC - 1º episódio: AAS 300mg/dia ou warfarin INR 2-3
x AVC recorrente: warfarin INR 3-4

2. Episódio obstétrico:
x Se a paciente não apresenta previamente evento trombótico: AAS 100mg/dia +
heparina dose profilática durante toda a gravidez.
x Se a paciente apresenta previamente evento trombótico: AAS 100mg/dia + heparina
dose anticoagulante durante toda a gravidez.
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SAF QUESTÕES

1. Como se faz o diagnóstico de SAF?


a) 1 manifestação clínica + 2 dosagens de anticorpo antifosfolipide com intervalado de 12
semanas
b) 2 manifestações clínicas + 2 dosagens de anticorpo antifosfolípide com intervalado de 12
semanas
c) 2 manifestações clínicas + 2 dosagens de anticorpo antifosfolípide com intervalado de 6
semanas
d) 2 manifestações clínicas + 1 dosagem de anticorpo antifosfolípide
c) 1 manifestação clínica + 1 dosagem de anticorpo antifosfolípide

2. As condições abaixo levam à consideração de SAF, apesar de não fazerem parte de


critérios, exceto:
a) neutropenia
b) livedo reticular
c) úlceras de membros inferiores
d) enxaqueca
e) plaquetopenia

3. Um paciente de 35 anos apresentou episódio de trombose venosa da veia femural direita


diagnosticado por sintomas e sinais clínicos locais. Apresenta anticardiolipina IgG 40
GPL (normal é ” 10). Qual a próxima seqüência na investigação diagnóstica?
a) confirmar a Trombose Venosa Profunda (TVP) por método de imagem + nova dosagem de
anticardiolipina
b) realizar doppler e caso confirmar TVP está fechado o diagnóstico
c) nova dosagem de anticorpo antifosfolípide
d) já está feito o diagnóstico de SAF
e) colher dímero D e nova anticardiolipina

4. Paciente 40 anos apresenta plaquetas no valor de 80.000, sem sangramentos. Nega


episódios trombóticos. Informa 1 abortamento com 12 semanas sem causa definida.
Apresenta anticoagulante lúpico. Qual a próxima etapa a ser seguida para diagnóstico?
a) dosagem de anticoagulante lúpico após 12 semanas e fechar diagnostico de SAF
b) aguardar outro abortamento para fechar diagnóstico de SAF
c) aguardar plaquetas < 50.000 para fechar diagnóstico de SAF
d) fazer dosagem de anticardiolipina seriada
e) solicitar anti-beta-2-glicoproteína I

5. Paciente 28 anos, com quadro de acidente vascular cerebral (AVC) isquêmico. Não tem
história de AVC pregresso, tromboses na família ou dislipidemia. Tem a presença de
anti-cardiolipina IgM 120 MPL (normal ” 10) em duas ocasiões com intervalo de 12
semanas. Como deve ser o tratamento de manutenção após a fase aguda?
a) AAS 300mg/dia
b) Warfarin com INR entre 2 e 3
c) Warfarin com INR entre 3 e 4
d) Heparina de baixo peso molecular
e) As letras a e b estão corretas

Respostas SAF: 1.a, 2.a, 3.a, 4.a, 5e

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA
1. Miyakis S, Lockshin MD, Atsumi T, et al. International consensus statement on an update of the
classification criteria for definite antiphospholipid syndrome (APS). J Thromb Haemost. 4(2): 295-306,
2006.
2. Levy, RA e Bonfá E. Síndrome Antifosfolípide. In.: Yoshinari NH e Bonfá ESDO. Reumatologia para o
clínico. São Paulo, Ed. Rocca,2006.
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VASCULITES SISTÊMICAS

Ari Stiel Radu Halpern

DEFINIÇÃO
Vasculite, é um processo clínico e patológico causado pela inflamação da parede
de vasos sanguíneos. Trata-se de um achado comum a várias doenças humanas
incluindo aqui doenças infecciosas, neoplásicas e imunológicas. No entanto, existe um
grupo de doenças no qual o quadro clínico é preponderantemente causado pela
inflamação de artérias e veias. Trata-se das Vasculites Sistêmicas, caracterizadas por
um intenso infiltrado inflamatório acometendo a parede de vasos de qualquer calibre,
acompanhada de necrose fibrinóide do vaso.
Muito embora este processo possa acompanhar doenças do tecido conectivo e
neopalsias são as formas primárias que serão discutidas em detalhes neste capítulo.
Estas Vasculites Sistêmicas Primárias são doenças relativamente raras mas de
grande importância clínica, devido sua gravidade e pelo fato de representarem um
diagnóstico diferencial importante de várias condições clínicas, particularmente
aquelas que se caracterizam pelo envolvimento concomitante de múltiplos órgãos e
sistemas, glomerulonefrites, neuropatia periférica, úlceras cutâneas, isquemia
periférica e trombose arterial ou venosa.

FISIOPATOLOGIA

As vasculites sistêmicas primárias são um grupo de doenças heterogêneas de


causa ainda desconhecida. No entanto, a resposta terapêutica ao uso de drogas
imunossupressoras, sugere um mecanismo imunológico envolvido na maioria dos
casos. A deposição de imunocomplexos formados por antígenos e anticorpos com a
conseqüente ativação da cascata do complemento é um dos mecanismos
tradicionalmente sugeridos, dada à semelhança clínica e patológica com a doença do
soro. Da mesma forma, é bem conhecida a relação entre certas formas de vasculites
sistêmicas (particularmente a poliarterite nodosa e a crioglobulinemia) e infecções
virais crônicas. Outra forma peculiar de vasculite, a granulomatose de Wegener, está
relacionada com a produção de auto anticorpos dirigidos contra enzimas lisossômicas
de neutrófilos. No entanto, geralmente não se encontra depósitos de imunecomplexos
nos vasos e tecidos acometidos pelas vasculites. Igualmente, apenas uma pequena
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parcela de pacientes com vasculites sistêmicas se beneficia de plasmaferese, um


método que potencialmente retira imunecomplexos da circulação. Consequentemente,
outras alterações da imunidade (celular e humoral) também são consideradas na
fisiopatologia destas doenças. Finalmente, é preciso lembrar que as próprias células
endoteliais e da musculatura lisa dos vasos podem participar ativamente na resposta
imune.

CLASSIFICAÇÃO

O quadro clinico das vasculites sistêmicas costuma ser mais ou menos


incaracterístico, uma vez que qualquer órgão ou sistema pode ser acometido. O
diagnóstico definitivo ainda depende em grande parte de achados de histopatologia.
No entanto, as alterações histológicas também não são específicas das várias formas
de vasculites. Assim sendo, o diagnóstico diferencial das diferentes doenças que
compõe o grupo das vasculites sistêmicas depende do conjunto de características do
infiltrado inflamatório, do tipo de vaso acometido (TABELA 1) e de manifestações
clínicas.

TABELA 1. Vasculites sistêmicas primárias: classificação segundo o tamanho dos vasos

CALIBRE DO VASO Vênulas e Capilares Pequeno Médio Grande

V. de Hipersensibilidade ++

Henoch Schoenlein ++

Granulomatose de Wegener + ++

Poliangiíte microscópica + ++

Angiíte de Churg Strauss + ++

Poliarterite Nodosa + ++

Arterite de Takayasu ++

Arterite Temporal + ++

Existem várias classificações das vasculites sistêmicas, nenhuma delas


definitiva. Embora, a maioria dos pacientes se enquadre em uma das formas clássicas
de vasculite, uma parcela significativa apresenta formas mistas ou incaracterísticas.
Mais importante do que a classificação das vasculites é o diagnóstico diferencial entre
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vasculites sistêmicas primárias, vasculites sistêmicas secundárias e outras doenças


sistêmicas (infecciosas, neoplásicas e outras) que mimetizam quadro de vasculite.
Em 1994 foram publicados os critérios do Colégio Americano de Reumatologia
(ACR) para a classificação das vasculites. Estes critérios foram criados com o objetivo
de separar entidades distintas dentro do grupo das vasculites sistêmicas e não como
critérios diagnósticos destas doenças. Outros critérios divergentes também foram
publicados e ainda não existe um consenso neste sentido. Mais recentemente, a
descoberta da presença de auto-anticorpos específicos para certas formas de
vasculites, bem como avanços no conhecimento da imunopatologia de algumas
doenças têm auxiliado na tarefa de classificar estas doenças com objetivo de
individualizar o tratamento.
Neste capítulo iremos abordar apenas as principais formas de vasculites
sistêmicas, sem nos prender a um critério de classificação específico que inclua todas
as doenças deste grande grupo:
1- Vasculite de hipersensibilidade
2- Vasculite de Henoch Shoeinlein
3- Vasculites associadas ao anticorpo contra citoplasma de neutrófilos (ANCA)
Granulomatose de Wegener
Poliangiíte Microscópica
4- Poliarterite nodosa
5- Síndrome de Churg Strauss
6- Arterite de Takayasu
7- Arterite temporal (arterite de células gigantes)

1- Vasculite de Hipersensibilidade

Vasculites de hipersensibilidade são formas de vasculites predominantemente


cutâneas, afetando vênulas e capilares. Clinicamente se manifestam como púrpura
cutânea disseminada ou outras lesões dermatológicas como pápulas, bolhas, urticária
e úlceras necróticas. Na maioria dos pacientes o quadro permanece limitado à pele.
Mais raramente existe algum grau de envolvimento orgânico leve, porém, o quadro
cutâneo é sempre preponderante.

A histologia revela o padrão de leucocitoclase caracterizado pelo infiltrado de


polimorfonucleares apresentando fragmentação dos núcleos (citoclase). Este mesmo
padrão clínico e histológico pode ser observado na doença do soro, nas vasculites
secundárias às doenças do conectivo, nas vasculites associadas à neoplasias e
infecções, ou mesmo em associação com outras formas de vasculites primárias.
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Portanto, o diagnóstico depende sempre da exclusão de outras possibilidades


etiológicas. Em geral existe um fator desencadeante (drogas, infecções) que leva ao
surgimento das lesões. No entanto formas idiopáticas e recidivantes (sem um antígeno
precipitante reconhecível) também ocorrem.

Formas leves não necessitam de tratamento, cursando de maneira auto-limitada.


Quando há um antígeno precipitante reconhecido, basta a retirada do estímulo
antigênico com suspensão do uso de drogas ou tratamento antibiótico no caso de
infecções bacterianas. Nas formas recidivantes ou naquelas com algum grau de
envolvimento orgânico, corticosteróides podem ser utilizados, geralmente com ótima
evolução.

2- Vasculite de Henoch Shönlein


Embora também seja uma forma de vasculite de hipersensibilidade, a púrpura de
Henoch Shönlein merece consideração especial. Clinicamente caracteriza-se pela
presença invariável de púrpura palpável associada com artralgias difusas, cólicas
abdominais e glomerulonefrite. A doença acomete preferencialmente crianças com um
surto único auto-limitado que pode evoluir com quadro de náuseas, vômitos e dor
abdominal intensa mimetizando abdômen agudo cirúrgico. Raramente evolui com
intucepção de alça intestinal.
A glomerulonefrite se manifesta por hematúria microscópica que muito raramente
evolui com perda da função renal. Formas atípicas acometendo adultos, recorrentes
ou evoluindo com insuficiência renal também têm sido descritas.
Biópsias das lesões revelam o padrão típico de vasculite leucocitoclástica com
depósitos freqüentes de IgA na pele e nos rins que apresenta um quadro de
glomerulonefrite necrotizante com crescentes.

3- Vasculites Associadas ao ANCA


3.1 Granulomatose de Wegener
A granulomatose de Wegener (GW) é uma forma de vasculite sistêmica que
tipicamente envolve o trato respiratório alto, pulmões e rins. A tríade clínica clássica de
sinusite, nódulos pulmonares e glomerulonefrite, geralmente é acompanhada de uma
vasculite sistêmica de pequenos vasos envolvendo qualquer órgão ou tecido. A
doença afeta homens e mulheres de qualquer idade.
A lesão característica de uma vasculite necrotizante e granulomatosa é
observada principalmente no trato respiratório baixo. A histologia renal revela um
padrão de glomerulonefrite segmentar e focal com crescentes, sem a presença de
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depósitos ao exame de imunofluorescência (glomerulonefrite pauci-imune). Além disso


a doença costuma cursar com uma vasculite de pequenos vasos disseminada
acometendo literalmente qualquer órgão ou tecido.
Quadros típicos se manifestam com envolvimento inicial de vias aéreas
superiores. Os pacientes referem quadros de sinusite ou otite média de repetição,
lesões orais e de septo nasal, febre, astenia e perda de peso. As lesões de vias
aéreas superiores e retro-orbitárias tendem a evoluir de forma progressiva e
necrotizante. Complicações comuns como o desabamento do septo nasal e a proptose
ocular, dão ao paciente um aspecto mais ou menos característico. O envolvimento
pulmonar se caracteriza pela presença de nódulos, cavidades ou infiltrados intersticiais
que se manifestam clinicamente com tosse, dispnéia, escarros hemoptoicos ou
mesmo hemoptise franca. A hemorragia alveolar é uma complicação grave da doença
que pode surgir como manifestação inicial ou ocorrer na evolução do quadro. O
envolvimento renal se caracteriza pela hematúria microscópica e insuficiência renal
rapidamente progressiva. Além disso, o envolvimento sistêmico pode ser
extremamente florido na dependência do órgão acometido.
A forma clássica generalizada da GW é uma doença de péssimo prognóstico na
ausência de um tratamento adequado. Existem, no entanto, formas localizadas, que
cursam de maneira mais indolente.
O diagnóstico da GW é feito com uma associação de achados clínicos,
histológicos e laboratoriais. Este diagnóstico deve ser fortemente considerado em
pacientes com envolvimento multisistêmico associado à tríade clínica clássica descrita
acima. O padrão ouro do diagnóstico, ou seja, a demonstração de uma vasculite
necrotizante granulomatosa, ou de glomerulonefrite com crescentes pauci-imune nem
sempre é possível.
No final da década de 1980 foi demonstrada uma associação altamente
específica entre a GW e anticorpos contra o citoplasma de neutrófilos (ANCA). A
detecção destes anticorpos no soro dos pacientes, auxilia no diagnóstico e
acompanhamento terapêutico particularmente naqueles pacientes com forma ativa e
generalizada da doença.
ANCA são detectados por imunofluorescência indireta. Existem dois padrões de
imunofluorescência descritos:
O padrão clássico (cANCA) é altamente específico para a granulomatose de
Wegener. O padrão perinucelar (pANCA) ocorre mais freqüentemente na Poliangiite
Microscópica (PAM) também podendo ser observado na GW e mais raramente na
Arterite de Churg- Strauss descritas abaixo. Além disto, pANCA pode ser observado
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em uma grande variedade de situações clínicas não relacionadas com as vasculites


sistêmicas.
O tratamento ideal da GW sistêmica e generalizada inclui ciclofosfamida e
corticosteróides em dose alta. A ciclofosfamida é a droga imunossupressora de
escolha na indução da remissão da doença. Outros esquemas imunossupressores
menos agressivos podem ser utilizados em formas localizadas ou,após o período de
indução, na mantenção da remissão.
O tratamento imunossupressor mudou radicalmente o prognóstico desta doença
antigamente mortal. Mesmo assim a GW permanece uma doença crônica associada
com uma importante morbidade e mortalidade. O diagnóstico precoce e o tratamento
especializado são fatores que auxiliam na melhor evolução destes pacientes.

3.2 Poliangiite Miscroscópica


A PAM é uma forma de vasculite que historicamente foi classificada como parte
do espectro clínico da poliarterite nodosa (vide abaixo). Trata-se de uma vasculite
sistêmica e necrotizante envolvendo vasos de pequeno e médio calibre associada com
uma glomerulonefrite semelhante a que ocorre na Granulomatose de Wegener. O
envolvimento renal freqüente pode associar-se com acometimento do pulmão e
vasculite sistêmica generalizada.
Apesar de não cursar com lesões granulomatosas e envolvimento de vias aéreas
superiores, a presença de auto-anticorpos da classe dos ANCA e sua sensibilidade
terapêutica à ciclofosfamida sugerem uma maior relação fisiopatológica com a
granulomatose de Wegener do que com outras formas de vasculite.

4- Poliarterite Nodosa
A poliarterite nodosa (PAN) foi a primeira forma de vasculite sistêmica a ser
descrita, por Kussmaul e Maier em 1866. Na sua forma clássica a doença afeta
artérias de médio calibre poupando característicamente o pulmão. As manifestações
clínicas decorrem da oclusão arterial levando a isquemia do órgão ou tecido afetado.
Homens são mais afetados do que as mulheres numa proporção de 2:1 a 3:1 podendo
se iniciar em qualquer idade.
As lesões da PAN afetam artérias de médio e pequeno calibre, principalmente
nos locais de bifurcação. O processo inflamatório é segmentar com infiltrado
neutrofílico e necrose fibrinóide. Característicamente, a histologia revela lesões
vasculares em diferentes estágios de evolução, desde o estágio inicial descrito acima
até a presença de infiltrado de células mononucleares, necrose da parede e formação
de trombos.
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O quadro clínico pode ser bastante variado dependendo da distribuição das


lesões. Sintomas constitucionais iniciais como febre, astenia e perda de peso são
freqüentes. Sintomas articulares, mialgia e dor visceral também ocorrem comumente.
Sintomas mais sugestivos da doença incluem a presença de livedo reticularis,
mononeurite múltipla e hipertensão arterial.
Não existem achados laboratoriais específicos da PAN. Além disso o quadro
clínico pode ser bastante inespecífico. Por isso, é necessário conhecer esta doença
para que, frente a um quadro clínico compatível se levante a suspeita. A confirmação
diagnóstica depende, em grande parte, da demonstração histológica das lesões. Uma
parcela dos doentes tem PAN associada à infecção crônica pelo vírus da hepatite B.
O tratamento da PAN é feito com corticosteróides e, eventualmente, drogas
imunossupressoras. Nos casos associados ao vírus da hepatite B o tratamento
antiviral específico deve ser introduzido.

5- Síndrome de Churg-Strauss (SCS)


A vasculite de Churg Strauss (ou angiite granulomatosa e alérgica) é uma forma
de vasculite necrotizante sistêmica acometendo vasos de pequeno e médio calibre
com envolvimento pulmonar, cutâneo e sistêmico associado com hipereosinofilia
periférica. A histologia pode revelar uma vasculite granulomatosa com intenso
infiltrado eosinofílico, Outras vezes encontra-se um aspecto em muito semelhante ao
da poliarterite nodosa (vide abaixo). Existe uma típica relação com história de atopia,
asma de início (ou piora) recente, lesões cutâneas e vasculite disseminada. O quadro
clinico sobrepõe-se ao da PAN exceto pelo envolvimento pulmonar e história de
atopia.
Muito embora classificada separadamente neste capítulo, ANCAs podem ser
detectados em uma pequena parcela dos portadores de SCS, geralmente com padrão
perinuclear.
O tratamento inclui corticosteróides e, eventualmente drogas citotóxicas nos
casos mais graves.

6- Arterite de Takayasu

A arterite de Takayasu (AT) é uma forma de vasculite afetando artérias de


grande calibre, particularmente a aorta e seus ramos. Trata-se de uma doença mais
freqüente em mulheres jovens entre 20 e 30 anos de idade.
A doença pode se manifestar inicialmente com quadro de febre alta, perda de
peso, artralgias e astenia. Estes sintomas inespecíficos costumam passar
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desapercebidos exceto nos casos mais intensos,nos quais os pacientes passam a ser
investigados por um quadro crônico de febre de origem indeterminada. Com a
evolução da doença, ocorrem manifestações de estenose arterial como a claudicação
de membros, isquemia mesentérica, isquemia cerebral ou isquemia de artéria renal
com hipertensão reno-vascular. Outras vezes a doença permanece totalmente
assintomática sendo detectada em um exame de rotina devido a ausência de pulsos
periféricos ou assimetria da pressão arterial nos membros.
O quadro histológico caracteriza-se inicialmente por um processo inflamatório
granulomatoso afetando a camada média e adventícia da artéria. Com o tempo ocorre
hiperplasia da íntima, degeneração da camada média e fibrose da adventícia. As
artérias envolvidas desenvolvem estreitamentos segmentares (ou mesmo oclusões),
muitas vezes associados com dilatações pós-estenóticas e formações de aneurismas.
Estas alterações são facilmente identificadas em exame arteriográfico. Na fase
inicial da doença as provas de atividade inflamatória (velocidade de
hemossedimentação, proteína C reativa) apresentam-se muito elevadas. No entanto,
na fase crônica, oclusiva, podem estar normais.
O tratamento na fase aguda é feito com corticosteróides. Na fase oclusiva,
medicamentos anti-adesivos plaquetários e eventualmente procedimentos cirúrgicos
são necessários.

7- Arterite temporal
A arterite temporal (ou arterite de células gigantes) é uma forma de vasculite que
acomete tipicamente pacientes após a quinta década de vida. Trata-se de uma
vasculite acometendo artérias de grande e médio calibre, particularmente carótida e
seus ramos. No entanto, esta é uma doença sistêmica cursando frequentemente com
manifestações gerais como febre e perda de peso. Além disso, é muito freqüente a
associação da AT com quadro de Polimialgia Reumática caracterizado por artralgias,
dor e rigidez da musculatura lombar, cervical e ombros. Apesar de ser uma doença
sistêmica, ao contrário daquilo que foi descrito nas demais formas de vasculite, o
envolvimento de órgãos como rins, pulmão e pele é bastante raro.
A manifestação clínica mais típica é a cefaléia temporal causada pelo
acometimento da artéria temporal. Outras manifestações freqüentes incluem
claudicação de mandíbula e manifestações oculares como diplopia ou amaurrose
súbita. A amaurose da AT é irreversível, portanto todo paciente suspeito deve ser
imediatamente tratado para evitar esta complicação.
A suspeita diagnóstica é feita em pacientes com mais de 50 anos de idade
apresentando quadro clínico característico associado com grande elevação da
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velocidade de hemosedimentação. A biópisa de artéria temporal pode revelar uma


vasculite granulomatosa porém, nos casos altamente suspeitos o tratamento deve ser
introduzido mesmo na ausência de confirmação histológica.
Corticosteróide em alta dose inicial é necessário para evitar complicações ou
recorrência da doença. Com o tempo a dose é reduzida progressivamente porém
alguns pacientes permanecem dependentes de doses baixas de corticóides.

VASCULITES RESUMO

Definição

Processo clínico e patológico causado pela inflamação da parede de vasos sanguíneos. As


vasculites sistêmicas primárias são doenças nas quais o quadro clínico é preponderantemente
causado pela inflamação de artérias e veias representando um diagnóstico diferencial
importante de várias condições clínicas.

Fisiopatologia

Grupo de doenças heterogêneas de causa ainda desconhecida mas de provável modulação


imunológica. A deposição de imunocomplexos formados por antígenos e anticorpos, alterações
de imunidade celular e humoral estão implicados na sua fisiopatologia. Alguns casos de
vasculites estão relacionadas com exposição crônica à antígenos virais, particularmente o vírus
da hepatite B.

Classificação

Existem várias classificações das vasculites sistêmicas, nenhuma delas definitiva. Mais
importante do que a classificação das vasculites é o diagnóstico diferencial entre vasculites
sistêmicas primárias, vasculites sistêmicas secundárias e outras doenças sistêmicas que
mimetizam quadro de vasculite.

1- Vasculite de Hipersensibilidade

Vasculites de hipersensibilidade são formas predominantemente cutâneas, afetando vênulas e


capilares. O diagnóstico depende sempre da exclusão de outras possibilidades etiológicas
como infecções e doenças do conectivo. A maioria dos casos é auto-limitada.

2- Vasculite de Henoch Shönlein

Associação entre púrpura cutânea, poliartralgia, cólicas abdominais e glomerulonefrite. A


doença acomete preferencialmente crianças com um surto único auto-limitado que pode evoluir
com complicações intestinais. Menos frequentemente a doença evolui de forma recorrente ou
crônica e raramente leva a insuficiência renal.
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3- Granulomatose de Wegener (GW) e a Poliangiite Microscópica (PAM)

Vasculites que afetam pequenos vasos associadas à presença de anticorpos contra o


citoplasma de neutrófilos. A GW envolve o trato respiratório alto, os pulmões, os rins,
acompanhada de vasculite sistêmica de pequenos vasos envolvendo qualquer órgão ou tecido.
Na PAM há um envolvimento renal freqüente que pode associar-se com acometimento do
pulmão e vasculite sistêmica generalizada. A lesão renal de ambas doenças é uma
glomerulonefrite crescentica segmentar e focal pauci-imune. Na GW observa-se também uma
vasculite necrotizante e granulomatosa principalmente no trato respiratório baixo. Anticorpos
contra o citoplasma de neutrófilos (ANCA) com padrão clássico na imunofluorescência
relacionam-se especificamente com a GW. ANCA padrão perinuclear é observado na PAM e
outras patologias.

4- Síndrome de Churg-Strauss (SCS)

A angiite granulomatosa e alérgica acomete vasos de pequeno e médio calibre com


envolvimento pulmonar, cutâneo e sistêmico associado com hipereosinofilia periférica e historia
de atopia. A histologia pode revelar uma vasculite granulomatosa com intenso infiltrado
eosinofílico, O tratamento inclui corticosteróides e, eventualmente drogas citotóxicas nos casos
mais graves.

5- Poliarterite Nodosa (PAN)

A PAN afeta artérias de médio calibre poupando característicamente o pulmão. Febre, astenia,
artralgias e mialgias ocorrem junto com sintomas variados incluindo livedo reticularis,
mononeurite múltipla e hipertensão arterial. A confirmação diagnóstica depende, em grande
parte, da demonstração histológica das lesões. Uma parcela dos doentes tem PAN associada à
infecção crônica pelo vírus da hepatite B. O tratamento da PAN é feito com corticosteróides e,
eventualmente, drogas imunossupressoras.

6- Areterite de Takayasu (AT)

Vasculite que afeta aorta e seus ramos, mais freqüente em mulheres jovens. A doença pode
passar desapercebida ou se manifestar com quadro agudo de febre e artralgias.
Posteriormente podem surgir sintomas relacionados com estenose arterial como a claudicação
de membros, isquemia mesentérica,, isquemia cerebral ou isquemia de artéria renal com
hipertensão reno-vascular. O diagnóstico depende da demonstração arteriográfica das lesões.
O tratamento corticóide está indicado apenas na fase aguda,com atividade inflamatória, da
doença.

7- Arterite temporal

Vasculite de pacientes com mais de 50 anos associada com grande elevação das provas de
atividade inflamatória. A doença acomete particularmente ramos da carótida.

A manifestação clínica mais típica é a cefaléia temporal. Claudicação de mandíbula e


manifestações oculares tambémsão freqüentes. A complicação mais temida é a amaurose
súbita. Casos suspeitos devem ser tratados com corticosteroides.
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VASCULITES QUESTÕES

1. Assinale a correta.
a. O diagnóstico das vasculites sistêmicas depende da detecção de anticorpos contra a célula
endotelial
b. O diagnóstico das vasculites sistêmicas depende da detecção de anticorpos contra o
citoplasma de neutrófilos (ANCA)
c. O diagnóstico das vasculites depende exclusivamente de achados de histopatologia.
d. O diagnóstico das vasculites sistêmicas depende da associação de achados clínicos,
histológicos, laboratoriais e eventualmente radiológicos
e. O diagnóstico das vasculites sistêmicas depende da associação de achados laboratoriais e
clínicos

2. São sintomas sugestivos de vsculite sistêmica


a. Febre e perda de peso
b. Neuropatia periférica
c. Glomerulonefrite e hemorragia aveolar
d. Púrpura e úlceras cutâneas
e. Todos acima

3. Paciente do sexo feminino com 20 anos de idade apresentando púrpura cutânea em


membros inferiores. Biópsia da lesão revela vasculite leucocitoclástica. Assinale a
alternativa correta:
a. Trata-se de uma vasculite de hipersensibilidade e deve ser tratada com corticóides
b. deve-se investigar causas imunológicas, neoplásicas e infecciosas
c. trata-se de lúpus eritematoso sistêmico e deve ser tratada com drogas imunossupressoras
d. trata-se de vasculite de hipersensibilidade não necessitando de tratamento medicamentoso
e. trata-se de púrpura de Henoch-Shönlein necessitando de tratamento com corticóide.

4. Paciente do sexo masculino, 42 anos apresentando quadro de dor abdominal, febre,


dor testicular, livedo reticular e neuropatia periférica. Qual das afirmativas abaixo é
correta?
a. Pensar na possibilidade de Granulomatose de Wegener. Solicitar sorologia para hepatite B
b. Pensar na possibilidade de Poliarterite Nodosa. Solicitar sorologia para hepatite B
c. Pensar na possibilidade de Granulomatose de Wegener. Solicitar pesquisa de ANCA.
d. Pensar na possibilidade de Poliarterite Nodosa. Solicitar pesquisa de ANCA
e. Nenhuma das anteriores

5. Assinale a correta
a. ANCA clássico está especificamente associado com a granulomatose de Wegener
b. ANCA perinuclear está especificamente associado com a granulomatose de Wegener
c. ANCA clássico está especificamente associado com a poliarterite nodosa
d. ANCA perinuclear está especificamente associado com a poliarterite nodosa
e. ANCA perinuclear está especificamente associado com a poliangiite microscópica
Respostas VASCULITES: 1-d; 2-e; 3-b; 4-b; 5-a

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA

1- HUNDER G.G et al: The American College of Rheumatology 1990 criteria for classification of vasculitis.
Arthritis Rheumatism v33, p. 1065
2- JEANETTE, J.C.; FALK, R.J.; ANDRASSY, K.: Nomenclature of systemic vasculitides. Proposal of an
international consensus conference. Arthritis Rheumatism v.37, p.187-192, 1994
3- FAUCI A., HAYNES B.F. KATZ P.: The spectrum of vasculits. Clinical, pathologic,immunologic and
therapeutic considerations. Ann Intern Med v.89, p.660-676,1978.
4- JEANETTE, J.C.; FALK, R.J Clin Exp rheumatol v. 25(1) Suppl 44, p. S52-6, 2007.
5- SEO P; STONE J.H.: The antineutrophil cytolplasmic antibody-associated vasculitides. Am J Med; 117-
139, 2004.
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OSTEOARTRITE

Ricardo Fuller

EPIDEMIOLOGIA
A osteoartrite (também denominada osteoartrose ou artrose no nosso meio) é
doença de alta prevalência, atingindo aproximadamente 10% da população acima dos 60
anos. Considerando apenas o aspecto histopatológico, a osteoartrite pode iniciar-se já na
adolescência e atingir aos 40 anos 90% dos indivíduos.
Considerando-se os achados radiográficos, 52% da população adulta apresenta
OA de joelhos, e destes, 20% com quadro moderado ou severo. 85% dos indivíduos na
faixa dos 55 aos 64 anos, 85% apresentam algum grau de OA em uma ou mais
articulações e acima dos 85 anos a prevalência da doença (radiográfica) alcança os
100%. A osteoartrite parece acometer igualmente ambos os sexos, porém, se
considerarmos a faixa etária abaixo dos 45 anos, os homens são maioria, enquanto que,
nas mulheres a prevalência é maior após os 55 anos.
Do ponto de vista socio-econômico, o impacto gerado pela OA é de grande
monta em nível mundial, visto constituir uma das principais causas de perda de horas de
trabalho, além de acarretar gastos com internações e cirurgias reparadoras para o
tratamento desses doentes. No Brasil, dados obtidos junto ao Instituto Nacional de
previdência Social mostraram que em 1974, as doenças osteoarticulares foram
responsáveis por 10,6% das faltas ao trabalho (ocupando o terceiro lugar das causas de
incapacidade, após as doenças mentais e as cardiovasculares). A osteoartrite foi a causa
do impedimento laborativo em 7,8% dos casos.

FISIOPATOLOGIA
A integridade do tecido cartilaginoso depende de um lento turnover dos
elementos da matriz, que ocorre de maneira a garantir uma adequada homeostase
tecidual. O condrócito é dotado de um arsenal enzimático que age sobre o colágeno, e os
proteoglicanos, de modo a promover uma degradação tecidual localizada e controlada
para dar lugar à síntese de novas moléculas quantitativa e qualitativamente adequadas
às necessidades biomecânicas do momento. Trata-se de um mecanismo fisiológico de
adaptação e renovação tecidual. A osteoartrite representa a falência cartilaginosa que
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ocorre quando se instala o desequilíbrio entre a degradação e o processo de reparação


tecidual.
O condrócito sofre a ação reguladora de dois tipos de mediadores: os pró-
catabólicos que são as citocinas, principalmente a interleucina 1 e o fator de necrose
tumoral alfa e os pró-anabólicos que são os fatores de crescimento. Esses mediadores
promovem junto ao condrócito a ativação de mecanismos para a degradação tecidual
(mediada por enzimas e seus inibidores) e para a regeneração da cartilagem (via
multiplicação celular e síntese dos elementos da matriz). O principal sistema de
degradação da cartilagem articular inclui 3 enzimas zinco-dependentes existentes no
condrócito e na sinóvia, denominadas metaloproteases. Sob a ação das citocinas, ocorre
também a produção de colágenos ectópicos (colágeno I no lugar do colágeno II, próprio
da cartilagem), que deterioram as propriedades do tecido, acelerando a degradação.

PATOLOGIA
A cartilagem osteoartrítica sofre degradação, com o surgimento de fibrilações e
erosões. Ocorre a redução progressiva da espessura da cartilagem que culmina com a
desnudamento do osso subcondral, que, por sua vez, sofre intensa remodelação,
tornando-se mais denso e prolongando-se nas bordas da superfície articular, formando
exostoses marginais denominados osteófitos.
Os debris osteocartilaginosos são fagocitados pelas células da membrana
sinovial, induzindo à liberação de citocinas e outros mediadores inflamatórios. A
membrana sinovial inflamada por sua vez acelera a degradação cartilaginosa via
liberação de enzimas proteolíticas no líquido sinovial. Os condrócitos, tornam-se
metabolicamente mais ativos, com núcleos hipertróficos e multiplicação celular,
principalmente junto às fibrilações, formando clones de duas ou mais células.
Paralelamente, ocorre morte de condrócitos.

CLASSIFICAÇÃO
A osteoartrite é definida como idiopática quando não existem fatores
predisponentes identificáveis, e secundária quando claramente decorrente de agentes
locais ou sistêmicos que agindo na articulação, modificariam suas características,
fundamentalmente aquelas necessárias para um desempenho funcional ideal. Tanto a
OA idiopática, como a secundária podem ocorrer como formas localizadas ou
generalizadas. Na OA secundária o dano articular atinge, em geral, poucas articulações,
frequentemente aquelas que suportam carga, como os joelhos, coxo-femorais e coluna
vertebral, em decorrência da ação de fatores mecânicos locais.
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Atuariam como elementos de estresse mecânico, deformidades articulares


congênitas (p. ex. joelho varo ou valgo, displasia acetabular, escoliose, etc), instabilidade
articular gerada por desvio de alinhamento, flacidez ou hipotrofia dos elementos
estabilizadores da articulação (cápsula, ligamentos, meniscos, tendões e músculos), e,
num sentido mais genérico, quaisquer fatores (endócrinos, metabólicos, neurológicos,
etc) que acarretem sobrecarga anormal nas articulações como encurtamento de
membros, vícios posturais, obesidade, etc.
Já na osteoartrite idiopática destaca-se a forma generalizada, verificada
principalmente em mulheres, acometendo em 85 % dos casos as mãos. Existe um forte
componente genético nessa forma de doença.

QUADRO CLÍNICO
O principal sintoma e da osteoartrose é a dor articular de duração e intensidade
variáveis de acordo com o estado evolutivo da doença. Nas fases iniciais, a dor é fugaz e
episódica. Posteriormente, com a progressão da OA, torna-se contínua e difusa, com
características basicamente mecânicas (isto é, aparece com o início do movimento e
melhora com o repouso), o que permite diferenciá-la na maioria das vezes, da dor com
características inflamatórias, que ocorre por exemplo na artrite da doença reumatóide e
tende a ser contínua. A evolução da doença é lenta, geralmente meses a anos, e o seu
início é impreciso no tempo. Ela tende a ser difusa, o que a diferencia da dor localizada
que acontece por exemplo nas tendinopatias, bursites ou lesões meniscais, entre outras,
que podem cursar em paralelo com a OA.
O processo osteoartrítico leva à perda gradual da estabilidade articular e,
consequentemente, à dor de maior intensidade e à limitação, inicialmente antálgica
(funcional) e na evolução anatômica, ou seja, determinada pelo encurtamento de
ligamentos, tendões, cápsula e músculos. No exame físico, é comum encontrar dor à
palpação, crepitação (fina ou grosseira) aos movimentos e alargamento articular rígida à
palpação (que corresponde aos osteófitos). Às vezes, sinais inflamatórios, derrame
articular e comprometimento músculo-tendíneo. Os casos de evolução mais grave
apresentam deterioração da função articular, chegando até a anquilose. Outros sintomas
da OA, incluem rigidez matinal, geralmente de curta duração (menos de 15 minutos).
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Nas mãos, as articulações mais afetadas são as interfalangeanas distais e as


interfalangeanas proximais, com a formação de nódulos de Heberden e Bouchard
respectivamente (FIGURA 2). Essa forma de OA é conhecida como osteoartrite nodal, e
os pacientes que a apresentam cursam também com uma grande freqüência de
envolvimento articular extra-mãos. Essa forma tem importante influência genética, e
predomina em mulheres, na proporção de 9:1. Ainda nas mãos é notório o envolvimento
da base do polegar, na articulação trapézio-metacarpeana, também denominada de
rizartrose. É possível verificar um aumento de volume local, de consistência endurecida,
que corresponde à formação de osteófitos locais. A OA nessa localização está muito
relacionada ao uso excessivo e em atividades que envolvam preensão com carga.

Bouchard

Heberden

FIGURA 2. Manifestações da osteoartrite: à esquerda joelhos em varo apresentando-se


edemaciados (setas); na figura do meio, mãos com nódulos de Heberden nas articulações
interfalangeanas distais e Bouchard nas proximais. À direita, detalhe do Heberden: verifica-se que
a nodulação tem localização dorso-lateral.

O joelho é uma das articulações mais atingidas. O compartimento medial é o


comprometido com maior freqüência por suportar aproximadamente 85% da carga do
joelho. A OA fêmuro-patelar também é bastante freqüente e sintomática. Em alguns
pacientes existe uma deficiência intrínseca da cartilagem da patela, denominada
condromalácia de patela, que favorece o surgimento mais prematuro da doença. A OA
dos joelhos pode cursar com deformidade em varo (FIGURA 2) ou valgo.
Na coluna, a osteoartrite atinge os discos (OA intervertebral ou doença discal
degenerativa) e as articulações interapofisárias. Os segmentos mais atingidos são os
mais móveis, isto é, o cervical (principalmente entre C5 e C7) e o lombar (principalmente
entre L4 e S1). O processo manifesta-se como uma dor local, e eventualmente dor
radicular devido a compressão das raízes na sua emergência pelos forames
intervertebrais, determinada por complexos disco-osteofitários. Os sintomas podem ser
crônicos, eventualmente com períodos de crises vinculadas principalmente ao esforço e
vícios posturais.

Exames complementares
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Na prática clínica, a intensidade do dano articular na OA pode ser avaliado por


métodos de imagem clássicos, como radiografia convencional, tomografia
computadorizada e ressonância nuclear magnética. Os achados radiográficos incluem
redução do espaço articular, esclerose óssea subcondral e osteófitos que indicam
remodelação óssea (FIGURA 1-II e 3). Cistos e erosões ósseas podem estar presentes
nos casos mais severos.
Exames laboratoriais são normais, prestando-se mais para o diagnóstico
diferencial com outras artropatias crônicas. Nos casos mais avançados, principalmente
das grandes articulações, podem exibir uma discreta elevação das provas de fase aguda.

FIGURA 3. Manifestações radiográficas da osteoartrite. À esquerda verifica-se envolvimento dos


joelhos, com redução do espaço articular, esclerose óssea subcondral e osteófito. No centro
observam-se grandes osteófitos na coluna lombar. À direita, verifica-se o envolvimento das
articulações interfalangeanas na osteoartrite nodal: estão presentes as mesmas alterações
descritas para os joelhos, acrescidas de deformidades.

DIAGNÓSTICO
Habitualmente suspeita-se de osteoartrite nos casos de dor insidiosa, com poucos
sinais inflamatórios em indivíduos acima de 50 anos, atingindo joelhos, quadris, coluna e
mãos. Para o diagnóstico, é fundamental a associação dos sintomas com os achados dos
métodos de imagem, principalmente a radiografia. Isso, porque é muito freqüente a
existência de alterações radiográficas compatíveis com osteoartrite, na ausência de
sintomas. Nesses casos não se configura o diagnóstico de osteoartrite. Esse fato é
particularmente comum na coluna, quando exames de rotina podem revelar a presença
de osteófitos sem nenhuma clínica.
TRATAMENTO
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Tratamento não medicamentoso


No tratamento da osteoartrite, deve-se reconhecer os possíveis fatores de risco
como sobrecarga mecânica, obesidade, trauma, deformidade e instabilidade articular
para que sejam eliminados quando possível. Torna-se necessário a educação do
paciente quanto à natureza e evolução da doença. Sempre que possível, oferecer
orientação sobre atividades profissionais e da vida diária que possam ter implicações na
progressão da osteoartrite. É importante que se estabeleça um programa de repouso e
exercícios que tem por finalidade melhorar a estabilidade articular, minimizando
sobrecargas. Bengala, palmilhas e calçados anti–impacto e redução do peso são
medidas importantes na redução dos sintomas e progressão da doença nas articulações
de carga. Os meios físicos incluem entre outros a crioterapia. A aplicação de calor
profundo na forma de ultrassom não mostrou eficácia em estudos controlados recentes.
Preconiza-se também a aplicação de TENS (estimulação elétrica transcutânea) e a
acupuntura, ambos para efeito analgésico e relaxante.

Tratamento medicamentoso
Inclui dois grupos de medicamentos: os de ação rápida e os de ação lenta.
1. Fármacos de ação rápida: são os analgésicos, antiinflamatórios não hormonais e
os miorelaxantes. Os 2 primeiros devem ser utilizados pelo menor tempo possível. Nos
casos nos quais existe crise inflamatória, principalmente se acompanhados de derrame
articular, preconiza-se o uso de infiltrações com corticóide de depósito e eventualmente
uso de colchicina.
2. Fármacos de ação lenta: esse grupo contempla os fármacos de ação lenta para o
controle dos sintomas cuja ação se inicia geralmente após 1 a 2 meses de uso e
persiste por algumas semanas após a suspensão, São exemplos a diacereína, a
cloroquina, o sulfato de glicosamina, o sulato de condroitina, a hidroxiprolina, e o ácido
hialurônico (este último é de aplicação intra-articular) e os extratos insaponificados de
soja e abacate. Outro grupo de fármacos de ação lenta, são os modificadores de
doença, antes chamados de condroprotetores, que atuam via inibição de
metaloproteases e estimulação da síntese dos elementos da matriz cartilaginosa. Existem
evidências que os fármacos citados acima possam atuar também por esse mecanismo,
mas sua real eficácia para mudar a história natural da doença ainda não está plenamente
estabelecida na literatura médica.
Tratamento cirúrgico
Está indicado nos casos que preenchem as seguintes condições: 1. grande
comprometimento da articulação identificado por métodos de imagem; 2. manifestação
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clínica grave, persistente e sem resposta ao tratamento clínico, quer seja dor, quer seja
limitação articular e, 3. vontade pessoal do paciente, para que haja colaboração na
aderência aos procedimentos fisioterápicos no pós operatório. As cirurgias mais
realizadas são os desbridamentos e limpeza, e as artroplastias. Atualmente são utilizados
também em casos selecionados o transplante de condrócitos e cartilagem.

OSTEOARTRITE
RESUMO

Epidemiologia
x Idade: prevalência progressiva após os 45 anos, acometendo 10% dos indivíduos com 60
anos
x Sexo: predomina nas mulheres principalmente o acometimento das mãos

Fisiopatologia
Degradação da cartilagem articular decorrente de sobrecarga mecânica ou alterações
constitucionais

Fatores predisponentes / agravantes


x Obesidade
x Lesões articulares preexistentes
x Instabilidade articular (p. ex. hipotrofia muscular)
x Genética
x Atividades e posturas de risco

Patologia
x Erosões e fissuras na cartilagem
x Sinovite secundária, leve a moderada

Quadro Clínico
x Artralgia insidiosa, progressão lenta, tipo mecânica (protocinética e aos esforços)
x Rigidez fugaz (<15 min)
x Crepitação articular
x Sinais flogísticos geralmente leves ou ausentes
x Coluna -lombalgia, cervicalgia e sinais de compressão radicular
x Mono /oligoarticular (secundária a fatores locais) ou poliarticular (genética)
x Topografia:
x Periférica - mãos: 1ª carpometacarpiana
Interfalangeanas distais – Nódulos de Heberden
Interfalangeanas proximais – Nódulos de Bouchard
- Joelhos e quadris
x Axial – Coluna lombar e coluna cervical principalmente (discos e interapofisárias)

Exames complementares
x RX- – Redução do espaço articular
- Esclerose óssea subcondral
- Osteófitos
- Cistos ósseos (casos avançados)
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x Tomografia e Ressonância – mais informações sobre cartilagem e partes moles


x Laboratório – normal

Diagnóstico
x Manifestações clínicas (obrigatório a dor) + RX (ou ressonância / tomografia)
x Cuidado: existe com freqüência alterações radiográficas sem clínica. Nesses casos não
se configura a osteoartrite

Tratamento
1. Não medicamentoso:
x Orientações gerais / afastar fatores predisponentes e agravantes
x Exercícios
x Calçados apropriados / órteses
x Fisioterapia
2. Medicamentoso:
x Analgésicos
x Antiinflamatórios não hormonais
x Infiltrações (corticóide e ácido hialurônico)
x Fármacos de ação lenta: glicosamina, condroitina, diacereína, cloroquina, extratos de
soja e abacate)

OSTEOARTRITE
QUESTÕES

1. Mulher de 59 anos, assintomática, ao fazer uma radiografia de tórax num check up


descobriu vários osteófitos na coluna torácica. Qual a melhor conduta?
a) Fazer uma ressonância magnética para avaliar possibilidade de lesão discal
b) Fazer radiografia da coluna lombar e cervical pois os osteófitos nessa topografia são mais
freqüentes
c) Iniciar fisioterapia para evitar piora do quadro
d) Não fazer nada
e) Agendar consultas periódicas para manter observação

2. A osteoartrite é mais freqüente em quais conjuntos de articulações abaixo:


a) Joelhos, quadris e tornozelos
b) Mãos, joelhos e coluna
c) Punhos, quadris e coluna
d) Cotovelos, tornozelos e coluna
e) Cotovelos, tornozelos e ombros

3. A osteoartrite caracteriza-se ao raio X por apresentar:


a) Esclerose óssea subcondral, redução do espaço articular e fratura de estresse
b) Osteófitos, aumento do espaço articular e cistos
c) Redução do espaço articular, osteopenia periarticular e sindesmófitos
d) Osteopenia periarticular, redução do espaço articular e erosões
e) Esclerose óssea subcondral, redução do espaço articular e osteófitos

4. Assinale a alternativa correta:


a) O processo inflamatório é o principal mecanismo de agressão articular na osteoartrite
b) O principal tratamento para a osteoartrite são os anti-inflamatórios não hormonais
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c) A osteoartrite é uma doença degenerativa própria do idoso, uma vez que ocorre devido a uma
involução da cartilagem
d) A osteoartrite é uma doença originada na cartilagem articular, que torna-se fibrilada e erodida
e) A rigidez matinal prolongada é um dos sintomas verificados na osteoartrite

5. Um homem de 38 anos, eletrecista, queixa-se de dor progressiva na base dos polegares,


mais acentuada à direita. A dor surge quando ele agarra objetos com força, e melhora ao
repouso da mão. Notou que houve um pequeno aumento de volume localizado na região.
Não apresenta outras queixas. A manobra de Finkelstein é negativa (para tendinopatia
local). Em relação ao caso, podemos afirmar com maior probabilidade de acerto:
a) Trata-se de uma artropatia soronegativa devido ao sexo e idade do paciente
b) Trata-se de uma artrite reumatóide devido à localização e da cronicidade da dor
c) Uma radiografia das mãos pode confirmar a suspeita clínica
d) Um fator reumatóide e provas de atividade inflamatória teriam maior valor que o raio X, do
ponto de vista diagnóstico
e) Esse paciente teria pouca melhora com o uso de anti-inflamatórios não hormonais

Respostas OA: 1 – d; 2- b; 3 – e; 4 – c; 5 – c

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA

1. Fuller, R. Osteoartrose. In Yoshinary, N H e Bonfá, E S D O. Reumatologia para o Clínico. Ed Roça.


São Paulo, SP. 2000, pp 139-148.
2. Fuller, R. Osteoartrite. In Lopes, A C. Tratado de Clínica Médica v1. Ed Roca. São Paulo, SP. 2006,
pp 1721-1729.
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OSTEOPOROSE
Rosa Maria Rodrigues Pereira
Jaqueline Barros Lopes

DEFINIÇÃO
A Osteoporose (OP) é uma doença esquelética caracterizada pelo
comprometimento da resistência óssea, predispondo o indivíduo ao risco de fraturas.
A resistência óssea é a resultante da integração entre a qualidade do osso e a
densidade mineral óssea (DMO) A qualidade óssea depende da arquitetura,
remodelamento ósseo, acúmulo de lesão (microfraturas) e mineralização. A DMO é
expressa em gramas de mineral por área (g/cm2) ou volume (g/cm3) em um dado
indivíduo, e é determinada pelo pico de massa óssea e pela quantidade de perda
óssea.
É importante lembrar que a osteoporose nem sempre resulta da perda óssea.
Se um indivíduo não atinge o ótimo do pico de massa óssea durante a infância e
adolescência, este pode desenvolver osteoporose, sem a ocorrência acelerada de
perda óssea.
Até o momento não existe medida acurada da resistência óssea. A DMO é
utilizada como medida aproximada por contribuir com aproximadamente 70% da
resistência óssea. Baseada nos valores da DMO a Organização Mundial de Saúde
(OMS) define osteoporose como DMO abaixo de 2,5 desvios-padrão (DP) em relação
à média para mulheres jovens brancas saudáveis (T-Score) (TABELA 1).

TABELA 1. Categorias para o Diagnóstico de Osteoporose segundo a OMS


Categoria Definição
Normal T-Score > - 1 DP
Osteopenia -1 > T-score > - 2,5 DP
Osteoporose T-Score ” - 2,5 DP
Osteoporose Estabelecida T-Score ” - 2,5 DP e pelo menos uma fratura por
fragilidade óssea

EPIDEMIOLOGIA DAS FRATURAS


É estimado que por volta de 40% das mulheres brancas americanas e 13% dos
homens brancos americanos com 50 anos de idade irão apresentar pelo menos uma
fratura clínica por fragilidade no decorrer de suas vidas.
Estudos epidemiológicos sugerem que indivíduos com história de fraturas por
fragilidade apresentam maior risco de desenvolver novas fraturas. Assim, a presença
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de fratura vertebral prévia aumenta em 7 a 10 vezes o risco de nova fratura vertebral


subseqüente.
As taxas de sobrevida após fraturas de vértebras e de quadril foram
encontradas ao redor de 80% do esperado para homens e mulheres de idade
semelhante sem fraturas.

CLASSIFICAÇÃO E QUADRO CLÍNICO


A osteoporose é referida como doença silenciosa, pois a perda óssea pode
ocorrer sem sintomas clínicos. A osteoporose generalizada pode ser classificada como
primária ou secundária (TABELA 2).

TABELA 2 – Classificação de Osteoporose Generalizada


Osteoporose Primária
Osteoporose Juvenil Idiopática
Osteoporose Idiopática em Adulto Jovem
Osteoporose Involucional ou Senil
Osteoporose Secundária
Hipogonadismo
Síndrome de Cushing
Hiperparatiroidismo
Hipertiroidismo
Doença celíaca
Síndromes de má absorção
Doença pulmonar obstrutiva crônica
Doença neurológica crônica
Artrite reumatóide
AIDS/HIV
Neoplasias: Mieloma Múltiplo, Linfoma, Leucemia,
Mastocitose
Doenças hereditárias do Tecido Conectivo:
Síndrome de Ehlers-Danlos
Homocistinúria
Síndrome de Marfan
Osteogênese Imperfeita
Medicações: Glicocorticóide, Anticonvulsivantes, Lítio

Osteoporose Involucional ou Senil


O quadro da osteoporose involucional pode se manifestar com a ocorrência

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das fraturas axiais ou periféricas ou evoluir silenciosamente.


As fraturas vertebrais podem se manifestar agudamente com dor nas costas
após movimento rápido de flexão, extensão ou mesmo após tossir ou espirar. No
entanto, a maior parte das fraturas é assintomática e somente se manifestam com a
progressão da cifose ou são descobertas durante a realização de radiografias de
rotina. A maior parte das fraturas vertebrais ocorre na região torácica baixa ou lombar
alta. A dor pode ser leve ou intensa, localizada no sítio de fratura ou irradiada para a
região anterior do abdome. Os episódios agudos de dor desaparecem após quatro a
seis semanas. Se a dor no esqueleto persistir após este período, outras causas de
fratura, como doença metastática ou mieloma múltiplo, deverão ser consideradas.
Após diversos episódios de dor intermitente aguda, decorrente de novas
fraturas, pode surgir dor mecânica crônica resultante da deformidade vertebral. Nos
casos em que a fratura vertebral é indolor esta, pode ser diagnosticada clinicamente
por perda da altura (> 4 cm em relação a idade aos 25 anos ou > 2,5 cm em 1 ano).
As fraturas de coluna torácica levam ao aumento progressivo no grau de cifose.
Na coluna lombar há retificação da lordose lombar e escoliose. A perda progressiva da
altura resulta no encurtamento da musculatura paravertebral e contração ativa dos
músculos paravertebrais, resultando em dor e fadiga muscular. A dor piora com a
posição em pé prolongada e melhora quando o paciente anda. Em alguns pacientes,
as costelas inferiores podem encostar-se à crista ilíaca, levando ao desconforto, dor
contínua e pronunciada distensão abdominal.
As alterações esqueléticas que acompanham a osteoporose acentuada, na
caixa torácica, podem provocar infecções respiratórias repetitivas ou problemas
restritivos. Na coluna lombar, pode haver diminuição da cavidade abdominal com
aparecimento de quadros de obstipação intestinal crônica.
As fraturas de quadril e antebraço distal, geralmente ocorrem após queda.
Aproximadamente 30% dos indivíduos, acima de 65 anos, caem uma ou mais vezes
por ano e, destes, 3% desenvolvem fraturas.
O tempo de consolidação da fratura por osteoporose é semelhante ao de
qualquer fratura. Se houver atraso na consolidação da fratura, outras condições
devem ser investigadas, como hiperparatiroidismo, osteomalácia ou variantes da
osteogênese imperfeita.

Fatores de Risco para Osteoporose e Fraturas


Na avaliação clínica de um paciente com suspeita de osteoporose devem-se
considerar inicialmente os fatores de risco e afastar causas secundárias de
osteoporose. Os fatores de risco mais importantes associados com o aumento de
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risco para fraturas osteoporóticas são mostradas na TABELA 3.

TABELA 3. Fatores de Risco para Osteoporose e Fraturas


MAIORES MENORES
História pessoal de fratura na vida adulta Deficiência de estrógeno (menopausa<45 a)
História de fratura em parente de 1o grau Baixa ingestão cálcio durante a vida
História atual de tabagismo Atividade física inadequada
Baixo peso (< 57 kg) Alcoolismo
Uso de glicocorticóide Quedas recentes
Idade avançada Demência
Déficit de visão
Doenças crônicas associadas

AVALIAÇÃO LABORATORIAL

1. Exames Laboratoriais Gerais- Exames gerais devem ser realizados para se


afastar causas secundárias de perda de massa óssea (TABELA 4).

TABELA 4 – Avaliação Laboratorial Geral de Diminuição da massa óssea


Exame Diagnóstico ou exclusão da patologia
Cálcio elevado Hiperparatiroidismo 1ario, metástase óssea
Fósforo baixo Hiperparatiroidismo 1ario, osteomalácia
25 hidroxivitamina D baixa Deficiência vitamina D, osteomalácia
Fosfatase alcalina elevada Osteomalácia, Doença de Paget
Calciúria de 24 hs elevada Hipercalciúria
Calciúria de 24 hs baixa Deficiência vitamina D
Eletroforese de proteínas com pico Mieloma múltiplo
monoclonal
TSH elevado Hipertiroidismo
FSH elevado Menopausa
Testosterona livre diminuída Hipogonadismo masculino
Anticorpos:anti-gliadina, anti-endomísio Doença celíaca
positivos
Paratormônio intacto elevado Hiperparatiroidismo
Creatinina sérica elevada Insuficiência renal
Enzimas hepáticas alteradas Insuficiência hepática
C Cortisol livre-urina de 24 hs elevado ou Síndrome de Cushing
teste de supressão com dexametasona
positivo

2. Marcadores Bioquímicos do Metabolismo Ósseo- Os marcadores bioquímicos


do metabolismo ósseo podem ser utilizados na monitorização da osteoporose e são
divididos em marcadores de formação e de reabsorção óssea.
Os marcadores de formação óssea incluem a fosfatase alcalina total e fração

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óssea, a osteocalcina e os propeptídeos carboxil ou amino-terminais do colágeno tipo


I. Os marcadores da reabsorção óssea mais utilizados são produtos da degradação
do colágeno. Os utilizados são: N-telopeptídeo (NTx) e C-telopeptídeo (CTx),
piridinolina (PD) e deoxipiridinolina (DPD).

DENSITOMETRIA ÓSSEA
A densitometria óssea de dupla emissão com fonte de raios X (DXA) ainda é o
“padrão ouro” para diagnóstico, monitorização e investigação clínica do paciente com
osteoporose. As indicações para avaliação de densidade óssea segundo a Sociedade
Internacional de Densitometria Clínica (ISCD) e Sociedade Brasileira de Densitometria
Clinica (SBDens) são mostradas na TABELA 5.
Na DXA, a massa óssea é relatada como: um valor absoluto em g/cm2 , T-
Score (comparação com a média da massa óssea de um indivíduo jovem adulto
saudável) e Z-Score (comparação pareada para idade e sexo de um padrão de
referência) (FIGURAS 1 e 2).
Em crianças, adolescentes, mulheres pré-menopáusicas e homens entre 20 e
50 anos, devem ser usados o Z-Score. Nestes casos um Z-Score de -2,0 DP ou
inferior é definido como “abaixo da faixa esperada para a idade” e um Z-Score acima
de -2,0 deve ser classificado como “dentro dos limites esperados para a idade”.
Os locais mais comumente avaliados densitometricamente são a coluna (L1-
L4) e quadril (colo de fêmur, fêmur total). O T-Score é utilizado para predizer o risco
de fratura e classificar a síndrome osteoporótica em mulheres pós-menopausadas
(TABELA 1). Para cada declínio de aproximadamente um desvio-padrão da massa
óssea existe um aumento de 1,3 a 2,5 vezes no risco de fratura em qualquer região.

TABELA 5: Indicações Para Avaliação de Densidade Óssea

x Mulheres com 65 anos ou mais


x Homens com 70 anos ou mais
x Mulheres na pós-menopausa < 65 anos, e homens (50-70 a) com fatores de risco
x Adultos com fraturas de fragilidade
x Adultos com doença ou condição associada à perda de massa óssea
x Adultos em uso de medicações associadas com baixa massa óssea ou perda
óssea
x Pacientes onde a terapia farmacológica esteja sendo considerada
x Pacientes em tratamento, a fim de monitorar a eficácia da terapêutica
x Pacientes que não estejam em tratamento, onde a evidência de perda óssea
poderia indicar tratamento

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FIGURA 1. Densitometria óssea da coluna lombar em mulher na pós menopausa


demonstrando osteoporose na região de coluna lombar total L1-L4 (T-Score < -2,5 DP)

FIGURA 2. Densitometria óssea de quadril em mulher na pós-menopausa demonstrando


osteoporose na região de colo de fêmur e fêmur total (T-Score < -2,5 DP)

Avaliação de Fraturas Vertebrais

A radiografia de coluna torácica (T4-T12) e coluna lombar (L1-L4), em perfil,


devem ser realizadas para se identificar fraturas vertebrais assintomáticas. Utiliza-se a

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análise semi-quantitativa para a classificação das fraturas vertebrais: Grau I ou


deformidade leve: redução de 20-25% do corpo vertebral, Grau II ou fratura moderada:
redução de 25-40% e Grau III ou fratura grave: redução > 40% (FIGURA 3).

Anterior Bicôncava Posterior

Grau 1
Leve 20-25%

Normal

Grau 2
Moderada 25-40%

Grau 3
Grave > 40%

FIGURA 3. Classificação das fraturas vertebrais: Grau 1 (leve), Grau 2


(moderada), Grau 3 (grave)

Prevenção e Tratamento da Osteoporose


Embora a diminuição na DMO possa predizer o risco de fratura, a incidência de
novas fraturas é o fator mais importante para avaliar o efeito de uma intervenção nos
estudos de tratamento e prevenção da osteoporose.
Várias sociedades médicas têm sugerido diretrizes para o tratamento e
prevenção da osteoporose. Em 1998 a “National Osteoporosis Foundation (NOF)”
publicou diretrizes em colaboração com 10 organizações médicas. Segundo a NOF e
a “American Association of Clinical Endocrinologists (AACE)” as recomendações para
o tratamento farmacológico visando reduzir o risco de fraturas nas mostradas na
TABELA 6.

TABELA 6. Recomendações da terapia farmacológica em mulheres pós-menopausadas,


segundo a National Osteoporosis Foundation (NOF) e a American Association of Clinical
Endocrinologists (AACE).
T- Score
Fator(es) de Risco NOF AACE
Ausente < - 2 DP d -2,5 DP
Presente < -1,5 DP d 1,5 DP

Nutrição
Evidências sugerem que a ingestão de cálcio é importante durante o
crescimento esquelético e o desenvolvimento do pico de massa óssea. Suplementos

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contendo cálcio e vitamina D mostram reduzir a perda óssea em homens e mulheres


acima de 65 anos de idade. A presença de oxalatos (frutas ou vegetais), fitatos
(cereais e farinhas) em excesso, tetraciclina e sulfato ferroso, deficiência de vitamina
D, dificultam a absorção adequada de cálcio. O excesso de sódio, proteínas e uso de
diúreticos (não tiazídicos) aumentam a excreção renal, piorando o balanço de cálcio
do organismo. As carnes e alimentos industrializados (congelados, enlatados e
refrigerantes a base de cola), apresentam grande quantidade de fosfatos que se
presentes no lúmen intestinal pode formar cristais com cálcio, impedindo a sua
absorção.
Exercícios
Um modelo ótimo para prevenção da osteoporose e fraturas osteoporóticas é
maximizar e manter a massa e a resistência óssea, e minimizar o trauma. A atividade
física regular pode contribuir para cada um destes determinantes, mas com diferentes
resultados dependendo do período da vida do indivíduo. Exercícios durante a infância
e adolescência são mais efetivos para o aumento de força e massa óssea que o
exercício na vida adulta. Nos adultos o benefício primário do exercício é a
conservação, não aquisição de massa óssea.
Nos indivíduos idosos, o exercício pode reduzir a taxa de perda óssea e
melhorar a saúde e a força muscular contribuindo para a prevenção de quedas e
menor risco de fraturas, porém a quantidade de exercício necessária para minimizar
esta perda é desconhecida.
Indivíduos assintomáticos com densidade mineral óssea normal e/ou
osteopenia leve podem ser orientados para um exercício mais intenso que ajudará a
manter a massa óssea. Pacientes com osteoporose e/ou história de fratura
atraumática apresentam maior risco e não existe evidência que o exercício intenso,
com impacto, irá corrigir esta condição, podendo teoricamente causar mais fraturas.
Assim, em indivíduos idosos com osteoporose o foco primário para a atividade física
será minimizar o trauma mais do que construir massa óssea.
Pacientes com diagnóstico de OP devem evitar exercícios abdominais
dinâmicos ou exercícios que requerem movimentos de torção, abruptos ou de flexão
(TABELA 7)
TABELA 7 - Exercícios que devem ser evitados em indivíduos com baixa massa óssea

x Exercícios abdominais de caráter dinâmico


x Flexão do tronco
x Movimentos bruscos e de torção
x Exercícios com carga abrupta e explosiva
x Exercício com carga de alto impacto

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Cálcio e Vitamina D
Baseado em ensaios clínicos e em considerações teóricas, a dose de cálcio
requerida para alcançar um balanço ósseo positivo é ao redor de 1000 mg por dia,
associada a uma ingestão dietética que pode ser tão baixa quanto 500 mg. O leite e
derivados são a principal fonte de cálcio, embora este esteja presente em alimentos
como o peixe e frutos do mar, vegetais de folhas verdes e escuras como espinafre,
couve e brócolis, entretanto a grande quantidade de oxalato presente nestes alimentos
impede sua absorção adequada.
A vitamina D (D2 e D3) em doses fisiológicas ou farmacológicas tem sido
usada para corrigir a depleção de vitamina D e evitar a deficiência de vitamina D em
todas as idades. Atualmente, recomenda-se uma dose de vitamina D de 400 -1000
UI/dia, onde o risco de desenvolver hipercalcemia e/ou hipercalciúria é reduzido.

Outras Terapêuticas Farmacológicas


As medicações utilizadas para tratamento da Osteoporose podem ser
classificadas como anti-reabsortivas ou anti-catabólicas (Alendronato, Risedronato,
Ibandronato, Raloxifeno, Calcitonina, Ranelato de estrôncio) e pró-formadoras ou
anabólicas (Teriparatida, Ranelato de estrôncio).

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OSTEOPOROSE RESUMO

Definição
Doença esquelética caracterizada pelo comprometimento da resistência óssea, predispondo a um risco de
fratura

Quadro Clínico
1. Assintomática
2. Fraturas
a: fratura vertebral :
Cifose, dor aguda, perda de altura (> 4 cm em relação a idade aos 25 anos ou > 2,5 cm em 1 ano), redução
da capacidade torácica e abdominal
b. fratura de antebraço distal, fratura de quadril e outras fraturas periféricas

Fatores de risco para osteoporose e fratura


1. Maiores
a. História pessoal de fratura na vida adulta
o
b. História de fratura em parente de 1 grau
c. História atual de tabagismo
d. Baixo peso (< 57 kg)
e. Uso de glicocorticóide
f. Idade avançada
2. Menores
a. Deficiência de estrógeno (menopausa < 45 a)
b. Baixa ingestão cálcio durante a vida
c. Atividade física inadequada
d. Alcoolismo
e. Quedas recentes
f. Demência
g. Déficit de visão
h. Doenças crônicas associadas
Exames laboratoriais
1. Cálcio, fósforo, 25 hidroxivitamina D, fosfatase alcalina
2. Calciúria de 24 hs
3. Anticorpos:anti-gliadina, anti-endomísio
4. Eletroforese de proteínas, TSH
5. FSH, Testosterona livre
6. Creatinina sérica, enzimas hepáticas
7. Paratormônio intacto
8. Cortisol livre-urina de 24 hs ou teste de supressão com dexametasona

Densitometria Óssea
1. Critérios da OMS para diagnóstico densitométrico de osteoporose em mulheres na pós-menopausa
a) Normal: T-Score > - 1 DP
b) Osteopenia: -1 > T-Score > - 2,5 DP
c) Osteoporose: T-Score ” - 2,5 DP
d) Osteoporose estabelecida: T-Score ” - 2,5 DP e pelo menos uma fratura por fragilidade óssea

2. Indicações para avaliação da densidade óssea


a) Mulheres com 65 anos ou mais
b) Homens com 70 anos ou mais
c) Mulheres na pós-menopausa abaixo dos 65 anos, e homens (50-70 a) com fatores de risco
d) Adultos com fraturas de fragilidade
e) Adultos com doença ou condição associada à perda de massa óssea
f) Adultos em uso de medicações associadas com baixa massa óssea ou perda óssea
g) Pacientes onde a terapia farmacológica esteja sendo considerada
h) Pacientes em tratamento, a fim de monitorar a eficácia da terapêutica
i) Pacientes que não estejam em tratamento, onde a evidência de perda óssea poderia indicar tratamento

Exame radiológico para avaliação de fraturas vertebrais


RX de coluna torácica (T4-T12) e coluna lombar (L1-L4) em perfil

Tratamento
1. Nutrição: alta ingestão de cálcio (> 1000 mg/dia)
2. Exercícios individualizados dependo do grau de perda de massa óssea
3. Suplementação com cálcio e vitamina D
4. Medicações anti-reabsortivas ou anti-catabólicas (Alendronato, Risedronato, Ibandronato, Raloxifeno, Estrógeno,
Calcitonina, Ranelato de estrôncio) e pró-formadoras ou anabólicas (Teriparatida, Ranelato de estrôncio)

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OSTEOPOROSE QUESTÕES

1) Assinale a alternativa correta:


a) O Z-Score deve ser utilizado em mulheres jovens, crianças e adolescentes.
b) A OMS define osteoporose baseado nos valores de desvio padrão da densidade mineral óssea de uma
população saudável da mesma idade e sexo.
c) O T-Score deve ser utilizado para o diagnóstico de osteoporose em todas as mulheres, independente da
faixa etária.
d) A osteoporose estabelecida é a única indicação de terapêutica farmacológica.
e) Qualquer sítio do esqueleto pode ser utilizado para diagnóstico densitométrico de osteoporose.

2) Mulher de 57 anos, na pós-menopausa, realizou densitometria óssea que mostrou T-Score= - 3,0 em
coluna lombar (L1-L4); T-Score= - 2,0 em colo femoral e T-Score= – 0,9 em fêmur total. Com relação às
orientações para a prática de atividade física para esta paciente assinale a alternativa correta.
a) A Atividade física é totalmente contra indicada visto que a paciente apresenta osteoporose de coluna.
b) Exercícios de torção da coluna e abdominais dinâmicos são indicados para fortalecimento da musculatura
paravertebral.
c) Treino de equilíbrio é desnecessário já que não apresenta osteoporose de quadril
d) Deve realizar atividade física com alto impacto uma vez que o exercício pode reduzir a taxa de perda óssea e
melhorar a saúde e a força muscular.
e) O foco primário para atividade física nesta paciente, será minimizar o trauma, com exercícios de baixo
impacto, visando fortalecimento muscular e manutenção da massa óssea.

3) Mulher de 60 anos, na pós menopausa, peso 50 kg, altura com 1,56 m, mãe com história de fratura de
quadril, densitometria óssea com os seguintes valores de T-Score: -1,8 em coluna lombar (L1-L4), -1,6 em
colo femoral e -1,8 em fêmur total. Assinale e alternativa correta:
a) Esta paciente não tem indicação de terapêutica farmacológica.
b) A osteopenia desta paciente deve ser tratada apenas com cálcio e vitamina D
c) A osteopenia desta paciente deve ser tratada com cálcio, vitamina D e exercícios de alto impacto.
d) A paciente tem indicação de tratamento farmacológico baseado no diagnóstico densitométrico e presença de
fatores de risco associados.
e) A decisão terapêutica deve ser baseada principalmente nos achados de densitometria óssea.

4) Mulher 66 anos, com diagnóstico recente de fibromialgia, apresentando densitometria óssea com T-Score
em L1-L4 = –1,5 DP, T-Score em colo femoral = -2,5 DP e T-Score em fêmur total= -2,0 DP. Avaliação
laboratorial de rotina mostrou cálcio=10,6mg/dl (VR=8,5 a 10,5mg/dl), fosfatase alcalina 100UI/l (normal até
150), creatinina=0,8mg/dl (VR:0,5 a 1,0), TSH=5,5UI (VR: 0,1 a 5), T4 livre normal. Assinale a alternativa
correta:
a) Esta mulher tem indicação de terapêutica farmacológica devido a osteoporose involucional na região do
quadril.
b) O diagnóstico de osteoporose é secundário a presença de hipotireoidismo.
c) Nesta paciente a orientação de exercícios físicos é prioritária para o tratamento da fibromialgia e
osteoporose.
d) Outros exames laboratoriais devem ser solicitados para diagnóstico de osteoporose secundária
e) A radiografia de coluna é fundamental para o diagnóstico de osteoporose involucional.

5) Assinale a alternativa correta:


a) Cifose torácica é uma manifestação inicial de fratura vertebral.
b) As fraturas vertebrais osteoporóticas são sintomáticas em 80% dos casos.
c) Aproximadamente 40% das mulheres brancas com 50 anos de idade irão apresentar pelo menos uma fratura
clínica no decorrer das suas vidas.
d) Todas as mulheres com 45 anos têm indicação de realizar densitometria óssea.
e) O uso de corticóide e anticonvulsivantes são fatores de risco maiores para fraturas

Respostas Osteoporose: 1-a; 2-e; 3-d; 4-d; 5-c

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA

1. National Osteoporosis Foundation. Physician´s guide to prevention and treatment of osteoporosis,1999


(http://www.nof.org/)
2. Brown JP, Josse RG. 2002 clinical practice guidelines for the diagnosis and management of
osteoporosis in Canada. JAMC 167(10 suppl):1- 34, 2002.
3. Binkey N, Bilezikian JP, Kendler DL, Leib ES, Lewiecki EM, Petak SM. Official Positions of the
International Society for Clinical Densitometry and Executive Summary of the 2005 Position Development
Conference. J Clin Densitom 9:4-14, 2006.
4. Marcus R, Feldman D, Kelsey J. Osteoporosis, 2nd ed. California, Academic Press, 2001.
5. Rosen CJ. Clinical practice. Postmenopausal osteoporosis. N Eng J Med 353:595-603, 2005.

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REUMATISMOS DE PARTES MOLES

Lais Verderame Lage


Ricardo Fuller

DEFINIÇÃO

O termo “reumatismo de partes moles” (RPM) ou “reumatismo extra-articular” faz


referência às dores desencadeadas pelas estruturas peri-articulares, ou seja, bursas,
músculos, ligamentos, fáscias, enteses (tecido de inserção tendão-osso) e bainhas
tendíneas. Estes quadros dolorosos de natureza aguda, sub-aguda ou crônica podem
resultar de fatores mecânicos, seja por excesso de uso ou por mal posicionamento de
algumas destas estruturas durante determinadas atividades ou ainda como parte do
quadro das doenças inflamatórias articulares. Estes quadros dolorosos podem ser
localizados (como uma bursite) ou regionais (quadros miofasciais). Os termos LER
(lesões por esforços repetitivos) e DORT (distúrbios osteomusculares relacionados ao
trabalho) muitas vezes são incorretamente utilizados como sinônimos de reumatismo
de partes moles. Essas siglas, no entanto se referem ao mecanismo de lesão de
alguns RPM, e não a um diagnóstico, e trazem forte conotação de doenças
ocupacionais.

EPIDEMIOLOGIA

As entidades que se reúnem sob o rótulo de reumatismo de partes moles


apresentam como denominador comum dor e rigidez músculo-esquelética. Constituem
as principais causas de morbidade e falta ao trabalho, causando pesado ônus às
empresas e à sociedade. Estima-se que a cada ano, sete entre 100 pessoas procurem
auxílio dos serviços de saúde com quadro típico de "reumatismo de partes moles".

ETIOPATOGENIA

O sistema músculo esquelético é o responsável pela estabilidade estática e


dinâmica das extremidades e do tronco. A eficiência de sua função depende da
integridade de seus componentes estruturais, biomêcanica adequada, e alinhamento
corporal e postural corretos, resultando em movimentos livres e indolores. Quando há
quebra desse conjunto harmônico ocorrem os fenômenos dolorosos e perda da
função.
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Embora os reumatismos de partes moles englobem grande número de condições


dolorosas, a maioria é resultante de traumatismos agudos ou crônicos e geralmente
são acompanhados de incapacidade temporária ou permanente. O traumatismo pode
ocorrer como um acidente único e violento, com imediato aparecimento da lesão, ou
ser o resultado de traumas crônicos resultantes de hábitos posturais ou ocupacionais
que originam fadiga muscular persistente, desequilíbrio músculo-fáscio-tendíneo e
tensão. Embora relativamente freqüente, o processo inflamatório nem sempre está
presente, e por isso, atualmente se adota a denominação de tendinopatia no lugar de
tendinite.

1. Reumatismos de partes moles localizado:

Classificação

Para fins de facilitar o estudo e compreensão destes quadros, podemos


didaticamente sugerir que as principais estruturas envolvidas nos quadros dolorosos
localizados são tendões e suas bainhas, ligamentos, fáscias, cápsulas, enteses. Os
sintomas são geralmente bem localizados e as queixas específicas – “meu cotovelo
dói”, “Tenho dor no ombro”.

É interessante observar que cerca de 90% dos quadros de dor no ombro são
“não-articulares”, derivando de estruturas como bursas, bainhas tendíneas e menos
frequentemente, capsulite adesiva. A articulação do ombro está muito sujeita as dores
não articulares, visto ser uma articulação multiaxial e a que apresenta maior amplitude
de movimentos em todo corpo, havendo por isso, prejuízo da estabilidade. Por esta
razão é potencialmente a articulação mais sujeita aos reumatismos de partes moles.
De modo similar, mais de 90% das dores localizadas no cotovelo, também são de
origem não articular, pois esta articulação, além do movimento de flexo-extensão,
realiza movimentos de torção (prono-supinação) favorecendo o aparecimento de
lesões, sendo muito comum a epicondilite (que é uma entesite) lateral ou medial, e
menos freqüentemente bursite do olécrano, que pode ser também de origem
infecciosa. Dores no calcanhar usualmente estão associadas a entesite da fáscia
plantar (fasciíte plantar), e apesar desta condição poder estar associada a espôndilo-
artropatias (principalmente em homens jovens), freqüentemente surge pelo excesso
de uso (corredores) ou pelo uso de calçados inadequados no amortecimento do
impacto do calcâneo contra o solo, durante a marcha.
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Fazendo parte do complexo articular, existem numerosas bursas, grupos de


tendões com suas bainhas e enteses, e seria desnecessário descrever todas elas,
sendo muito mais lógico entendermos a origem destes quadros se soubermos a
função, composição e destas estruturas. O QUADRO 1 traz alguns reumatismos mais
comuns na prática clínica.

QUADRO 1. Principais reumatismos de partes moles localizados

NOME DA LESÃO ESTRUTURA (LOCAL) ACOMETIDA


Membros superiores
Tendinite estenosante (dedo em gatilho) Flexores dos dedos das mãos
Tendinopatia dos punhos Flexores e extensores dos punhos
Tendinopatia de De Quervain Abdutor longo e extensor curto do polegar
Cistos sinoviais Bainhas tendíneas (p. ex. punhos)
Síndrome do impacto Tendão supraespinhal
Tendinopatia do cabo longo do bíceps Região anterior do ombro
Capsulite adesiva do ombro (ombro congelado) Todo o ombro (limita abdução)
Bursite sub-acromial Região anterior do ombro
Epicondilite medial (cotovelo de golfista) Região medial do cotovelo
Epicondilite lateral (cotovelo de tenista) Região lateral do cotovelo
Contratura de Dupuytren Espessamento e retração da fáscia palmar
Síndrome do túnel do carpo Nervo mediano na região ventral do carpo
Síndrome do canal de Guyon Nervo ulnar, na região ventral do carpo
Membros inferiores
Tendinopatia dos glúteos médio e mínimo Trocânter maior do fêmur (lateral da coxa)
Tendinopatia da pata de ganso Inserção do semi-tendinoso, semi-
membranoso e sartório na tíbia proximal
Bursite trocantérica Trocânter maior do fêmur (lateral da coxa)
Tendinopatia patelar Sobre e distalmente à patela
Tendinopatia do tendão do calcâneo Retro-calcânea
Fasciíte plantar Região plantar e medial do calcâneo
Tendinopatia do tibial posterior Região retromaleolar medial

Tanto as bursas como as baínhas tendíneas são muito semelhantes. Como


tecido adventício, não possuem membrana basal e são compostas por um aglomerado
de células fibroblásticas, que, assim como as células sinoviais, apresentam funções
macrofágicas e secretoras. As bursas geralmente formam uma cavidade achatada,
enquanto que as bainhas tendíneas são estruturas longas e tubulares. As bursas têm
como função proteger os tecidos moles das proeminências ósseas adjacentes. As
causas mais freqüentes de bursites são as traumáticas, mas podem ser de origem
inflamatória como nas doenças metabólicas do tipo da gota e pseudogota, doenças
inflamatórias do tecido conjuntivo como a artrite reumatóide, e finalmente processos
infecciosos localizados.
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Os tendões são formados por fibras colágenas densas, paralelas, e por fibrócitos
e fibroblastos. Sua principal função é conectar o músculo ao osso tornando o esforço
muscular mais eficiente, pois concentra a sua ação sobre uma pequena área. As
inflamações agudas ou crônicas geralmente ocorrem não nos tendões, mas em suas
bainhas (tenossinovites), tal como as bursites, freqüentemente são desencadeadas
pelos traumatismos, geralmente associados aos movimentos repetitivos, realizados
em posições posturais inadequadas, ou que requeiram o uso de força. Ao exame
clínico, podemos detectar discreto edema e calor local (FIGURA 1), com crepitação,
diminuição de força e espessamento ao longo da unidade músculo-tendínea
comprometida. Algumas tenossinovites podem se associar a processo estenosante da
bainha tendínea, como na tenossinovite dos flexores dos dedos das mãos (dedos em
gatilho), do tendão abdutor longo e extensor curto do polegar (síndrome de De
Quervain), ou ainda nos processos inflamatórios da goteira inter-tubercular da cabeça
do úmero (tendinopatia do cabo longo do bíceps).

FIGURA 1. Edema dos tendões flexores dos dedos

Entese é o local de inserção de um ligamento, músculo ou cápsula articular no


osso. Esses pontos apresentam terminações nervosas especiais e o tendão se alarga
e se prende diretamente em leque na zona de inserção. Durante o movimento as
ênteses são expostas a grandes sobrecargas mecânicas. Freqüentemente esses
pontos são agredidos em atividades desportivas e programas de condicionamento
físico inadequados. Os locais mais acometidos pelos traumas diários e movimentos
repetidos que levam a quadros de entesites são o epicôndilo lateral do úmero
(cotovelo do tenista), o epicôndilo medial (cotovelo do golfista), a entesopatia da pata
de ganso, entesopatia retrocalcânea e subcalcânea, entre outras.
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DIAGNÓSTICO

x O diagnóstico é principalmente clínico.


x Usualmente feito pela identificação de dor bem localizada, relacionando-a
com alguma estrutura ou tecido específico.
x Nas tenossinovites usualmente se consegue sentir crepitação e dor ao longo
da bainha acompanhando os movimentos passivos e ativos da articulação
adjacente.
x As radiografias nem sempre auxiliam, a não ser no caso de tendinopatias
calcificadas.
x Os exames de ultrassom dependem da experiência do operador e nem
sempre são confiáveis.
x A ressonância magnética pode demonstrar alterações das estruturas
comprometidas, mas não devem ser solicitadas de rotina devido ao seu alto
custo.
x A eletroneuromiografia está indicada quando existem manifestações de
compressão neurológica relacionada ao edema de partes moles adjacente.

TRATAMENTO

x Antiinflamatórios não hormonais podem ser utilizados, nas doses usuais e


antiinflamatórios tópicos (na forma de gel, aerossóis ou adesivos).
x Aplicação de gelo nos casos agudos ou com sinais flogísticos. Na fase de
recuperação o calor na forma de bolsas térmicas ou ultrasom e ondas curtas, e
a aplicação de TENS (estimulação elétrica transcutânea) podem apressar a
melhora.
x Alongamento e fortalecimento de grupamentos musculares envolvidos, assim
como orientação postural, visando-se prevenir a recorrência,.
x Infiltração com corticoesteróides, (40-80 mg de metilprednisolona com 0,5-1ml
de lidocaina 2%) é geralmente bastante eficiente, e apresenta efeito duradouro.
Não recomendamos o uso de triancinolona em partes moles ou estruturas não
articulares, pois ela pode acarretar importante atrofia da pele adjacente.
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2. Reumatismos regionais

Dentro desta categoria estão classificados principalmente os quadros


miofasciais, os quais apresentam dor com distribuição regional, irradiada e mal
definida, não acompanhando trajeto nervoso típico. A dor usualmente pode ser
reproduzida pela pressão sobre os denominados pontos gatilhos (“trigger points”). Os
pontos-gatilho geralmente estão localizados no músculo comprometido.

ETIOPATOGENIA

Tal como os quadros localizados, as síndromes miofasciais são usualmente


desencadeadas por vícios posturais, estáticos ou dinâmicos, traumatismos, excesso
de uso ou podem ser idiopáticas. As alterações histológicas dos pontos gatilhos são
geralmente pouco significativas ou mesmo ausentes.
Os quadros miofasciais pós-traumáticos usualmente ocorrem por lesão direta do
músculo, como por exemplo por queda ou torção. No caso das síndromes miofasciais,
tanto por excesso de uso como idiopáticas, não se sabe porque em determinados
indivíduos, e em determinados períodos, grupos musculares entram em espasmo
quando usados repetidamente, enquanto que em outros sob as mesmas condições,
isso não ocorre. A hipótese melhor aceita atualmente é a de que estes quadros podem
estar associados a distúrbios do sono, com privação dos estágios III e IV do sono
NREM, o que é bastante freqüente nos períodos de ansiedade e estresse. Uma teoria
alternativa é a de que existe uma deficiência de fosfatos de alta energia, levando
músculos ao estado de fadiga precoce, seguido por lesão. Na patogênese da dor
miofascial também podem ser incluídos, além dos fatores traumáticos, as alterações
bioquímicas, metabólicas, neurogênicas e isquêmicas locais e o sistema nervoso
central, que atuariam juntos criando um ciclo de dor-espamo-dor (FIGURA 2).

ESTÍMULO Traumas
Distúrbios bioquímicos
Distúrbios metabólicos
Distúrbios neurogênicos
Distúrbios isquêmicos
Modulação do SNC

DOR

ESPASMO

FIGURA 2. Fisiopatologia da Síndrome miofascial


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DIAGNÓSTICO

x O diagnóstico é clínico e de exclusão.


x Pressão sobre o ponto gatilho causa dor e/ou formigamento com distribuição
característica.
x O músculo no qual o ponto gatilho está presente, usualmente encontra-se
encurtado por espasmo, o que resulta em diminuição da amplitude de
movimento. Tanto a contração como o alongamento do músculo desencadeia
dor.
x A injeção de anestésico no ponto-gatilho abole tanto a dor local como a dor
referida.

Alguns quadros de compressão de feixes nervosos podem ser enquadrados nos


quadros miofasciais, e abaixo citamos alguns exemplos:

Meralgia parestesia: a queixa principal dos pacientes com alterações do nervo fêmur-
cutâneo é de parestesias na face ântero-lateral da coxa. A ausência de fraqueza do
quadríceps e preservação do reflexo patelar diferenciam este quadro da neuropatia do
nervo femoral, evitando-se submeter o paciente a procedimentos diagnósticos, e até
mesmo cirúrgicos desnecessários.

Síndrome do desfiladeiro torácico: é o nome genérico dado às diversas


manifestações clínicas caracterizadas pela compressão anormal do plexo braquial,
artéria e veia subclávia quando estas estruturas passam pelo desfiladeiro torácico, isto
é uma região delimitada pela clavícula, primeira costela torácica, músculos escalenos
anterior e médio, além das fáscias fibrosas ao longo do desfiladeiro torácico. Os
fatores desencadeantes mais freqüentemente observados são as posturas viciosas
dos membros superiores, mamas volumosas, musculaturas laxas, associadas ou não
a anomalias anatômicas como costelas cervicais ou hipertrofia de apófise transversa
de C7. A realização de movimentos repetitivos, principalmente as atividades que
.

exijam longos períodos de movimentação com os braços elevados acima dos ombros
abduzidos e empregando força muscular também podem acarretar o quadro. As
queixas referidas geralmente são de "sensação" de edema unilateral ou bilateral do
braço e da mão, fraqueza distal e "sensação" de mãos frias.

Síndrome tensional do pescoço: é uma doença orgânica e funcional provocada pelo


trabalho com carga estática principalmente associada à posição inadequada da
cabeça e membro superior. As queixas são de dor cervical e ombro, cefaléia occipito-
parietal, com duração de dias, e que não respondem ao uso de analgésicos comuns.
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Parestesias e tonturas também podem estar presentes. Esse quadro pode estar
associado a alterações radiográficas degenerativas do segmento cervical, que podem
agir como fator causal inicial, mas geralmente a perpetuação dos sintomas está
relacionado às alterações de tônus muscular, principalmente do trapézio e esterno-
cleidomastoideo. Estes, por sua vez, limitam a movimentação muscular, causando a
diminuição de força e sensibilidade dos membros superiores, favorecendo a
manutenção de posturas viciosas, fechando o ciclo dor - espasmo muscular - dor.

.TRATAMENTO

É similar ao dos quadros localizados, conforme já mencionado.

x O uso de antiinflamatórios não hormonais pode ser útil.


x Relaxantes musculares como a ciclobenzaprina, carisoprodol ou tizanidina
devem ser utilizados quando houver importante espasmo muscular.
x Ante a evidência de quadros de ansiedade ou estresse o paciente deve ser
encaminhado para tratamento adequado com psiquiatra ou psicoterapeuta.
x A injeção de anestésico no ponto gatilho pode estar indicada em determinados
casos e tem ação curativa.
x Fisioterapia é medida grande valia.
x Massagem dos músculos com contratura geralmente alivia a dor, embora de
forma transitória.
x Nos casos mais crônicos, é essencial se tentar esclarecer a causa do quadro e
corrigir eventuais vícios posturais.

Observações:

x Orientação quanto a prevenção de novos surtos deverá ser estabelecidas a


partir da identificação de nexo etiológico da lesão e dos fatores predisponentes
e desencadeantes do processo álgico.

x A adequação nas atividades profissionais e a manutenção do equilíbrio osteo-


mio-articular, são fatores fundamentais para se atingir uma adequada
prevenção de novas lesões.

x A abordagem terapêutica deve buscar o restabelecimento do equilíbrio


fisiológico e biomecânico, pois somente a normalização funcional é igual à
cura.
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REUMATISMO DE PARTES MOLES RESUMO

Compreendem os quadros de dores músculo-esqueléticas originadas nas estruturas peri-


articulares. Também pode ser denominado de Reumatismo não-articular.

Fisiopatologia
Estes quadros usualmente estão relacionados ao excesso de uso das articulações, seja por
movimentos realizados com mau posicionamento da articulação (ou seja, pelo mal uso), seja
pela realização de movimentos repetidos na presença ou não de vícios posturais. A ansiedade
e o estresse podem agravar estes quadros, levando-os ‘a cronificação do quadro doloroso.

Classificação
Quadros localizados – bursites, tendinopatias, tenossinovites, capsulites,
fasciítes e entesites
x Queixa bem localizada
x Comprometimento de estruturas relacionadas à lubrificação e diminuição do atrito
durante os movimentos, ou seja, as bursas e as bainhas tendíneas, ou à estruturas
sujeitas à grande força de tração ou trauma como as enteses.
x Quadros são geralmente auto-limitados
x Esclarecimento do fator desencadeante é essencial para prevenir recorrências.

Quadros regionais - miofasciais e compressão de feixes nervosos


x Dor difusa e mal definida comprometendo um segmento corporal
x Presença de ponto gatilho, que uma vez ativado simula o quadro
x É mais sujeito à cronificação que os quadros localizados
x Freqüentemente apresenta espasmo muscular com encurtamento do grupo
muscular comprometido
x Podem estar associados a quadros de ansiedade e estresse.

Exames complementares
x São de pouco auxilio
x O exame clínico cuidadoso geralmente faz o diagnóstico

Tratamento
x Analgésicos e antiinflamatórios
x Medidas físicas (gelo, calor, exercícios, alongamento, correção ergonômico-postural)
x Injeções de corticosteróides ou anestésicos em casos específicos
x Identificação do fator desencadeante visando prevenir as recorrências
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REUMATISMO DE PARTES MOLES QUESTÕES

1) Cite a causa mais comum dos reumatismos de partes moles


a) Vícios posturais
b) Movimentos repetitivos
c) Traumatismos diretos ou indiretos
d) Fadiga muscular
e) Todas as anteriores

2) A fim de se evitar as lesões de esforços repetitivos devemos evitar, exceto:


a) Uso de força com ferramentas inadequadas
b) Exercícios físicos visando o condicionamento físico
c) Trabalhar em ambientes excessivamente frios, pois o gelo é analgésico
d) Permanecer longos períodos na posição ideal
e) Repetir sempre os mesmos movimentos para acostumar a articulação

3) Paulo tem 49 anos de idade e corre 25 Km por dia, há mais de 20 anos. Há 6 meses
se queixa de dores na planta do pé, na região do calcanhar. Qual a conduta mais
adequada para resolver o problema?
a) Parar com as corridas diárias e fazer natação
b) Colocar aparelho gessado por 3 semanas para dar repouso ao calcanhar
c) infiltração da fasciíte plantar com corticoesteróide
d) orientar o uso de calçado e/ou órtese para diminuição do trauma local
e) tomar antiinflamatório para resolver a dor.

4) Leila trabalha na área de informática há 25 anos. Recentemente reformou seu


escritório para tornar o ambiente mais agradável e apesar disto, vem apresentando
dores nos punhos e dedos das mãos, com dificuldade para digitação. O que pode
estar acontecendo?
a) A paciente está estressada pelos gastos da reforma e necessita antidepressivos.
b) Osteoartrose das mãos, pois há muito tempo executa a mesma tarefa.
c) Alterações inadequadas na ergonomia do local de trabalho.
d) Seria interessante fazer uma RNM para descobrir a causa
e) Deve usar tala gessada nas duas mãos e punhos durante 2 semanas

5) Nena é dona de casa e sempre gostou dos serviços domésticos. Há 6 meses fraturou
o punho direito, e desde então passou a utilizar mais a mão esquerda para evitar
problemas com a fratura (apesar da mesma estar consolidada), e mesmo assim vem
sentindo dores em todo o membro superior direito. O que pode estar acontecendo?
a) Quadro miofascial
b) Com a fratura, houve lesão de nervo
c) Com o tempo de imobilização para a consolidação da fratura ocorreu atrofia muscular
do membro superior direito
d) É comum restarem dores após as fraturas
e) A paciente está com dor psicológica e necessita tratamento psiquiátrico

Respostas RPM: 1- e; 2- b; 3- d; 4- c; 5- a

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA

1. Novaes, G S; Yoshinari, N H. Reumatismo de Partes Moles. In: Yoshinari, N H e Bonfá, E S D O. Reumatologia para
o Clínico. Ed Roca. São Paulo. 2000, pp 181-186.
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FIBROMIALGIA

Lais Verderame Lage

DEFINIÇÃO

A Fibromialgia é uma condição comum na prática clínica e se caracteriza pelo


quadro de dor difusa e crônica, freqüentemente associada a queixas de fadiga, e sono
não repousante. Os pacientes podem ainda apresentar uma variedade de sintomas
vagos incluindo parestesias, sensação subjetiva de edema de extremidades,
alterações cognitivas com dificuldade de concentração e raciocínio, ansiedade, humor
deprimido e irritabilidade, tontura, sensação de desmaio iminente, perda de memória,
dores de cabeça (tanto tensional como enxaquecosa), palpitações e fraqueza.

EPIDEMIOLOGIA:

A fibromialgia é um quadro que afeta predominantemente o gênero feminino,


com prevalência variando de 2 a 11,5%. Em nosso meio, a fibromialgia acomete entre
2,5 a 4,4% da população. Embora o quadro seja mais estudado em adultos, o mesmo
pode estar presente entre crianças e adolescentes, não havendo diferenças entre
meninos e meninas.

ETIOPATOGENIA

A etiopatogenia da fibromialgia é desconhecida, havendo diversas teorias para


explicá-la:

Alterações Musculares

x Atrofia de fibras tipo II,


x Presença de fibras reticulares,
x Edema focal,
x Aumento do conteúdo lipídeo
x Aumento do numero de mitocôndrias.

Estes achados são interpretados como conseqüentes à redução da


microcirculação local, o que acarreta hipóxia das fibras musculares e redução da
reserva energética do tecido muscular.
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Alterações de neurotransmissores

x Diminuição dos níveis de serotonina no soro e no liquido cérebro-espinal (a


associação entre deficiência de serotonina e depressão já é bem estabelecida.
Além de modular o humor, a serotonina possui importante papel nas fases III e IV
do sono não-REM e no limiar de dor).

x Elevação dos níveis da substância algogênica P no liquor (a substância P esta


associada ao aumento da percepção da dor).

Distúrbios do sono

x Sono não repousante


x Aumento do número de micro-despertares.
x Padrão alfa-delta de sono (diminuição da quantidade do sono de ondas-lentas com
a intrusão anormal de ondas alfa nas fases III e IV do sono não-REM).
x Correlação positiva entre a quantidade de ondas alfa, durante o sono de ondas
lentas, e a queixa de sono não restaurador, e queixas dolorosas.

A Fibromialgia tem sido definida na atualidade como um quadro de ampliação


da sensibilidade a estímulos sensitivos periféricos como calor, corrente elétrica,
pressão, que são interpretados pelo sistema nervoso central como sensações
desagradáveis e traduzidas pelo sintoma dor.

QUADRO CLÍNICO E DIAGNÓSTICO

Um dos grandes desafios frente à complexidade de queixas e sintomas que


pode acompanhar o quadro de fibromialgia é justamente o reconhecimento da
síndrome, do qual depende a adequada abordagem diagnóstica e instituição
terapêutica. O desconhecimento do quadro acarreta uma busca incessante por
diversos médicos e especialidades, com a exaustiva e onerosa solicitação de exames
complementares que culminam com a instalação de tratamentos ineficazes com
resultados frustrantes tanto para médicos como para pacientes. Na fibromialgia não
existem anormalidades óbvias ao exame físico, assim como exames laboratoriais e de
imagem são normais. Porém, a ausência de anormalidades objetivas não define saúde
ou bem estar.

A Síndrome fibromiálgica reforça a necessidade do diálogo com o paciente, a


importância de um bom exame físico e a solicitação de exames subsidiários
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criteriosos, para complementar o diagnóstico, e não para substituir a avaliação do


doente. Interessantemente, em tempos de alta tecnologia, tudo quanto se requer para
o diagnóstico de fibromialgia é despender-se tempo adequado e suficiente com o
paciente.

Seguindo-se a recomendação do Colégio Americano de Reumatologia (ACR), os


critérios de classificação para a síndrome da Fibromialgia, são a presença de dor
difusa pelo corpo (acima e abaixo da cintura, do lado direito e esquerdo do corpo) por
mais de 3 meses e a detecção de 11 pontos dolorosos à palpação (de um conjunto de
18 pré-estabelecidos – os “tender points”). ( FIGURA 1).

DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL

As principais afecções com sintomas semelhantes, mas que devem ser distinguidas
da fibromialgia, exatamente por apresentarem abordagem terapêutica diferenciada
são, principalmente:

x Hiperparatiroidismo

x Polimialgia reumática

x Dermato/polimiosite

x Parkinsonismo

x Hipocalemia

x Uso de determinados medicamentos (estatinas, bloqueadores H2,


corticoesteróides) ou ilícitas (cocaína e canabis).
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FIGURA 1 – Localização dos 18 “tender points”

1- Inserção dos músculos sub-occipitais

2- Borda anterior dos espaços inter-tranversais das vértebras C5-C7

3- Borda superior do músculo trapézio

4- Segunda costela, junto à articulação costocondral

5- Origem do músculo supra-espinhal, acima da espinha da escápula

6- Dois centímetros distais ao epicôndilo lateral

7- Quadrante súpero-lateral da região glútea

8- Imediatamente posterior ao grande trocanter do fêmur

9- Interlinha medial do joelho


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EXAMES LABORATORIAIS

Os mesmos devem ser solicitados para a exclusão de outras doenças. Na


fibromialgia os exames laboratoriais são normais, exceto na presença de co-
morbidades como artrite reumatoide, hipotiroidismo, osteoartrite, e
espondiloartropatias. Na abordagem do quadro temos recomendado a solicitação dos
seguintes exames:

x Provas de atividade inflamatória (VHS e Proteína C reativa)

x Hormônios tiroideanos

x Avaliação do metabolismo ósseo com a dosagem de cálcio e paratormônio

x Potássio sérico (principalmente quando o paciente faz uso de diuréticos)

x CPK e aldolase (caso seja detectado patente fraqueza muscular)

x Rx bacia ante a difícil diferenciação com as espondiloartropatias.

TRATAMENTO

Diferentes abordagens podem ser utilizadas, tanto no que diz respeito ao


arsenal medicamentoso como nos recursos não medicamentosos. A adoção de
medidas que levem em conta as peculiaridades de cada paciente, é que determinarão
a eficácia do tratamento. Os principais objetivos do tratamento da síndrome
fibromiálgica visam:

x Minimizar a dor

x Restaurar a amplitude de movimento e a flexibilidade

x Melhorar a qualidade de vida

x Promover trabalho educativo visando o manejo das possíveis crises,


procurando o reconhecimento de fatores precipitantes ou perpetuantes.

Tratamento não medicamentoso

x Exercícios Físicos: Programas de exercícios têm incluído atividades aeróbias,


de alongamento e fortalecimento muscular. Exercícios utilizados para
condicionamento cardiovascular também induzem melhora significativa da dor.
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x Acupuntura: O uso de acupuntura na Fibromialgia demonstra resultados


conflitantes, alguns pacientes relatam melhora dos sintomas, enquanto que
outros referem piora.

x Massoterapia: A massagem é considerada um recurso eficaz com redução


significativa da dor, porém seu efeito é transitório.

Tratamento Medicamentoso

Analgésicos e antiinflamatórios: o uso de analgésicos comuns como o


paracetamol ou anti-inflamatórios não hormonais, não são efetivos no
tratamento de sensibilização central, mas podem ser úteis no manuseio de
alterações geradoras de dor periférica.

Drogas Antidepressivas: embora o papel desse tipo de medicação na


fibromialgia não esteja ainda bem esclarecido, antidepressivos reduzem os
sintomas dor e fadiga durante o tratamento a curto prazo. Nesta categoria as
drogas mais comumente utilizadas são:

x Amitriptilina e nortriptilina (antidepressivos triciclicos)

x Fluoxetina, citalopran e paroxetina (agem na recaptaçao de serotonina)

x Milnacepran e duloxetina (drogas recaptadoras de serotonina e norepinefrina)

Relaxantes musculares

x Ciclobenzaprina

x Tizanidina

x Carisoprodol

Hipnóticos: os benzodiazepínicos atuam como sedativo, anticonvulsivante,


ansiolítico e possuem potente ação miorrelaxante. O alprazolam é uma das
drogas que pode ser utilizada nas fases iniciais do tratamento da fibromialgia,
por seu importante efeito ansiolítico. No entanto, deve-se salientar que os
benzodiazepínicos potencialmente acarretam dependência química,
tornando seu uso restrito a curtos intervalos.
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Conclusão

O diagnóstico de Fibromialgia é complexo e deve ser considerado na presença


das seguintes queixas:

x Dor difusa (acima e abaixo do quadril e em ambos os lados) por mais de 3


meses

x Distúrbio do sono (sono não reparador)

x Inatividade física (sedentarismo) e intolerância ao exercício

x Fadiga associada com atividades diárias habituais

x Múltiplas queixas e sintomas que não podem ser facilmente explicáveis

FIBROMIALGIA RESUMO

Epidemiologia
x Idade: maior incidência - 35 a 55 anos
x Prevalência: 2 a 4 %
x Sexo: predominantemente mulheres

Fisiopatologia
x Etiologia: desconhecida
x Alterações musculares
x Diminuição de serotonina
x Distúrbio do sono: padrão alfa-delta

Quadro Clinico
x Dor em todo o corpo
x Fadiga
x Sono não repousante

Diagnostico
x Dores generalizadas > 3 meses
x Hemicorpo direito e esquerdo, acima e abaixo da cintura
x Presença de 11 tender points
Tratamento
1. Não medicamentoso:
x Orientações gerais
x Restraurar amplitude de movimentos e flexibilidade
x Exercícios físicos
x Acunpuntura
x Massoterapia
2. Medicamentoso:
x Antidepressivos
x Relaxantes musculares
x Hipnóticos
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FIBROMIALGIA QUESTÕES

1) Quanto ao diagnostico da Fibromialgia, assinale a alternativa CORRETA:


a) O diagnostico de fibromialgia é presuntivo e de exclusão.
b) Só se pode falar em fibromialgia quando a ressonância de encéfalo for normal
c) Pacientes com artrite reumatóide e estão livres de apresentarem fibromialgia, por
serem doenças antagônicas.
d) Na fibromialgia os anticorpos anti-fm estão presentes em altos títulos
e) A fibromialgia acomete exclusivamente, mulheres após a menopausa.

2) Quanto ao padrão de sono na fibromialgia pode-se afirmar que:


a) A principal alteração é do sono REM
b) Pacientes se sentem cansados por causa da insônia.
c) O uso de analgésicos ao deitar, facilita a correção dos distúrbios do sono
d) A serotonina elevada no líquor causa pesadelos
e) O padrão de sono da fibromialgia é o alfa-delta.

3) Indique qual a faixa etária e sexo predominante na fibromialgia:


a) Adolescentes dos 13 aos 18 anos
b) Homens dos 20 aos 35 anos
c) Mulheres idosas com idade > do que 70 anos.
d) Mulheres com idade entre 40 e 55 anos.
e) Homens ou mulheres dos 20 aos 80 anos, pois a doença é universal.

4) Quanto ao tratamento da fibromialgia devemos inicialmente indicar:


a) Codeína
b) Diazepam
c) Condicionamento físico
d) AINH
e) Imuno moduladores como a ciclosporina.

5) Quanto ‘a etiopatogenia da fibromialgia:


a) Fibras musculares com infiltrado monohistiocitário em fibras do tipo II.
b) Alterações degenerativas de plexos nervosos sensitivos
c) Elevação da substancia PKO no líquor
d) Multifatorial e não esclarecida
e) Hipertrofia de tálamo e região pontina responsáveis pela interpretação dos estímulos
sensitivos.

Respostas Fibromialgia: 1-a; 2- e; 3- d; 4-c; 5-d

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA

Yoshinari, NH; Lage, LV.Fibromialgia. In: Lopes, AC. Tratado de Clínica Médica v1. São Paulo, ed Roca.
2006, pp. 1746-1748.
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ARTRITES INFECCIOSAS

Natalino Hajime Yoshinari

Define-se artrite infecciosa como infecção da membrana sinovial e demais componentes


articulares por microorganismos. Segundo o agente etiológico, as artrites infecciosas são
divididas em:

1. Artrites bacterianas
1.1. Inespecíficas
1.2. Específicas
1.2.a. Gonocócicas
1.2.b. Tuberculosa
2. Artrites fúngicas
3. Artrites virais

1 ARTRITES BACTERIANAS

1.1 Artrites bacteríanas inespecíficas

Etiopatogenia

As vias mais importantes na infecção intra-articular são a hematogênica, a


inoculação direta e a por contigüidade
ade de infecções ósseas ou de partes moles.
Normalmente, as células sinoviais desempenham papel importante na defesa da
articulação à presença de bactérias, fagocitando e clareando o líquido sinovial. Alguns
fatores sistêmicos como diabetes, alcoolismo, neoplasias, uso de drogas, doença
reumatóide, lúpus eritematoso sistêmico predispõem à infecção. Sítios articulares
previamente lesados por processos traumáticos ou reumatológicos, igualmente
predispões às infecções, assim como infiltração local com corticóides. Os agentes
etiológicos mais comuns são, por ordem decrescente de freqüência: S. aureus,
Streptococo, Pneumococo, E. coli, P. aeruginosa, S. marcences, H. influenza e
Salmonella sp. Uma vez na articulação, as bactérias causam fenômenos inflamatórios,
com liberação de enzimas proteolíticas originadas pelas células inflamatórias e
sinoviócitos, enzimas essas que causam rápida destruição cartilaginosa. Essa agressão
se dá em três etapas: perda de proteoglicanos da matriz cartilaginosa, morte dos
condrócitos e destruição das fibras de colágeno, refletindo na lesão da cartilagem e até
do osso subjacente. A lesão se torna irreversível a partir da segunda etapa. É importante
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salientar que em período curto de dias pode haver destruição articular se não houver
diagnóstico precoce e conduta terapêutica pronta e adequada. Indica-se pronta punção
articular para exame bacterioscópico e cultura. A terapêutica é iniciada de imediato,
baseado no exame do líquido sinovial. Deve ser pesquisado foco infeccioso à distância
ou presença de ferimentos próximos às articulações.

Clínica
É geralmente mono ou oligoarticular, com sinais inflamatórios intensos e impotência
funcional. No caso da coxo-femoral e do ombro, os sinais inflamatórios podem ser
mínimos, pois são articulações mais profundas. As articulações que suportam peso
(joelhos, tornozelos e coxo-femorais) são mais frequentemente envolvidas. A febre
costuma estar presente. O diagnóstico diferencial se faz com as artrites por cristais,
traumáticas, virais, hemartroses agudas, síndrome de Reiter e, nas formas poliarticulares,
com febre reumática, doença do soro, artrite viral, doença reumatóide do adulto e juvenil
e artropatias soro-negativas.

Exames subsidiários

Líquido sinovial: a bacterioscopia é positiva em 1/3 a 2/3 dos casos. O líquido


apresenta-se turvo ou purulento, com coagulo de mucina pobre (perda de ácido
hialurônico), celularidade geralmente maior que 40.000, às custas de neutrófilos, com
glicose baixa. Deve ser feita, também, cultura e antibiograma. Com a orientação dos
achados da bacterioscopia, inicia-se o tratamento imediatamente, antes do resultado do
antibiograma.

Hemoculturas: positivas em aproximadamente ¾ dos casos. Hemograma, VHS,


proteína C Reativa, eletroforese de proteínas são exames úteis, porém sem
específicidade.

Imagem: inicialmente pode-se observar edema de partes moles e osteopenia peri-


articular. Mais tardiamente (7 a 10 dias), pode aparecer redução do espaço articular e lise
óssea sub-condral.

Cintilografia: é útil no caso de suspeita de infecções de articulações profundas e


de difícil acesso, como as sacro-ilíacas, quadril, coluna.

Biópsia de sinóvia com cultura: aumenta a possibilidade do achado do agente


etiológico.

Tratamento

Antibioticoterapia inicial é orientada segundo o quadro clínico e os achados da


bacterioscopia. O antibiograma pode reorientar o tratamento e a duração do mesmo
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dependendo do agente causal e da evolução clínica. Drenagem - é feita por punções


esvaziadoras de repetição, uma a duas vezes por dia. Articulações profundas devem ser
avaliadas por ortopedistas., para eventuais procedimentos cirúrgicos de limpeza articular.
A imobilização e repouso articular em posição funcional são importantes na fase aguda. A
reabilitação deve ser iniciada quando houver melhora da inflamação. Inicialmente deve
ser passiva; posteriormente ativa, e finalmente, contra resistência.

1.2 Artrites bacterianas específicas

1.2.a gonocócicas

Clínica: tem maior incidência em mulheres e a faixa etária mais freqüentes é em


adolescentes e adultos jovens. Após a infecção primária, geralmente genital, o
gonococo ganha a corrente sanguínea, havendo quadro bacterêmico com febre e
toxemia. O envolvimento articular inicialmente é poliarticular, migratório, até que
se instale uma monoartrite ou oligoartrite, quando ocorre instalação bacteriana
articular. Deve-se pesquisar foco primário no sistema genital, especialmente em
mulheres (frequentemente assintomáticas), próximo do período menstrual. Pode
haver infecção oral ou anal. Manifestações periarticulares, como tenossinovites,
são frequentes. Lesões cutâneas vesico-pustulares, pápulas hemorrágicas ou
bolhas hemorrágicas podem aparecer, acompanhando a fase bacterêmica.

Exames subsidiários: deve-se tentar isolar o germe do foco primário, das lesões
articulares, cutâneas ou do sangue, através de bacterioscopia e cultura dos
materiais. A cultura do líquido sinovial é positiva em menos de 50% dos casos. O
exame citológico do líquido sinovial, outros exames laboratoriais e a radiologia já
foram referidos anteriormente.

Tratamento: o antibiótico de escolha é a penicilina cristalina.

1.2.b tuberculosas.

Clínica: a artrite tuberculosa é uma forma crônica de infecção secundária e ocorre


em cerca de 3% dos doentes com tuberculose. Pode atingir articulações axiais e
periféricas, sendo o acometimento da coluna conhecido como mal de Pott, a
manifestação mais freqüente. Entre as articulações periféricas que suportam peso
(joelhos e coxo-femorais) são as mais envolvidas. Na forma periférica, apresenta-
se como sinovite associada a acometimento ósseo sub-condral e costuma poupar
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a cartilagem articular. A história clínica é arrastada, demorando semanas a meses


até o diagnóstico. A inflamação articular não é intensa e as manifestações gerais
nem sempre expressivas. A artrite é mono-articular ou oligoarticular. Na coluna,
acomete mais o segmento dorsal, iniciando-se por infecção do disco
intervertebral, evoluindo para acometimento das bordas vertebrais anteriores,
evoluindo para acunhamento vertebral e cifose localizada. Pode ocorrer abscesso
para vertebral. A tríade de Phemister é um achado radiográfico e consiste em
osteopenia peri-articular, erosão da margem articular e diminuição do espaço
articular. Cerca de 30-60% apresentam foco infeccioso à distância.

Exame subsidiários:

Imagem: as lesões encontradas são lise óssea sub-condral, esclerose óssea, osteopenia
periarticular e colapso vertebral.

Líquido sinovial: é turvo, com celularidade em torno de 10 a 20.000 células/mm3, com


predomínio de neutrófilos, proteínas elevadas e baixa concentração de glicose. A
pesquisa de BAAR é positiva em cerca de 20% dos casos. A cultura é positiva em 80%. A
biópsia de sinóvia, revela granulomas e cultura de tecidos, é positiva em 90% doscasos.
O PPD geralmente é positivo. O Raio-X de tórax revela o foco primário em 50% dos
casos. Na ausência de foco pulmonar, devem-se pesquisar os rins e gânglios. Em 40%
dos pacientes não se encontram o foco primário.

Tratamento: os esquemas utilizados são os mesmos de outras infecções


tuberculosas.

Recentemente, tem aumentado as infecções por micobactérias atípicas ( M. kansaii, M.


marinum), especialmente em imunodeprimidos. Do ponto de vista clínico ocorre
acometimento de tendões e bursas, especialmente em articulações das mãos, seguidas
pelos punhos e joelhos. Sintomas constitutivos são incomuns.

2 Artrites fúngicas

As micoses podem acometer o sistema osteo-articular através de disseminação


hematogênica. A mais importante no Brasil é a paracocidioidocose, que apresenta quadro
osteo-articular crônico em 5-10% dos casos. Os focos são geralmente múltiplos. O raio-X
apresenta-se de início com aspecto de "roído de traça", com posterior aparecimento de
áreas de esclerose e periostite. O diagnóstico é feito pelos métodos habituais, além da
identificação do agente no líquido sinovial e no material de biópsia. O tratamento é o
mesmo das outras formas da doença.
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As artrites por cândida, fungo oportunista, podem vir superpostas a outras condições de
base, como artrite reumatóide, lúpus eritematoso sistêmico, imunossupressão,
corticoterapia sistêmica ou intra-articular, AIDS ou viciados em drogas. O acometimento é
puramente articular, com sinovite, e o agente é identificado através da pesquisa direta ou
cultura.

Outras que devem citadas são as artrites por fungos subcutâneos, como a esporotricose,
freqüente em alcoólatras, e a maduromicose.

3. Artrites virais

As mais importantes são:

Hepatite B: geralmente é um quadro poliarticular que acompanha o período febril,


precedendo o quadro ictérico e persistindo por algumas semanas. Ocorre em 10-30% dos
pacientes e é provavelmente uma artrite por depósito de imunocomplexos, ou seja não se
identifica o agente etiológico na sinóvia..

Rubéola: ocorre em mulheres adultas, em 15-60% dos casos de rubéola. É uma


poliartrite aguda, às vezes apenas com poliartralgia, podendo durar de poucos dias a
meses. Em 5-10% das pacientes vacinadas para rubéola, pode ocorrer quadro rubéola-
símile, com fenômenos articulares, geralmente 2-4 semanas após a vacinação, durando
poucos dias até três semanas.

Parvovírus: é uma infecção bastante disseminada, que causa artrite em 5% e artralgias


em 10% das crianças acometidas, que podem desenvolver exantema febril conhecida
como quinta doença. Em cerca de 10% dos adultos a poliartrite lembra artrite reumatóide
e tem curso evolutivo prolongado.

Retrovírus: o vírus da SIDA causa várias síndromes articulares, como manifestações


sugestivas da Síndrome de Reiter (uma artropatia soronegativa) em cerca de 11% dos
infectados. Cerca de 1/3 dos doentes apresenta oligoartrite assimétrica. Foram relatados
ainda, quadros semelhantes à artrite reumatóide e finalmente 10% apresentam quadro
conhecido como síndrome articular dolorosa em ombros, cotovelos e joelhos.

Outras infecções virais que podem ser acompanhadas por fenômenos articulares são a
caxumba, varicela, mononucleose infecciosas e eco viroses.
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DOENÇA DE LYME-SÍMILE NO BRASIL

A doença de Lyme símile (DLs) é uma zoonose emergente de grande importância


para a Medicina Brasileira, pelo aumento crescente da casuística e grande morbidade
associada à enfermidade. No país tem características próprias, pois existem
particularidades epidemiológicas e clínicas, que a distinguem da clássica Doença de
Lyme (DL) observada no Hemisfério Norte.

A DL clássica que ocorre nos EUA e Eurásia é definida como enfermidade infecciosa
transmitida por carrapatos do complexo Ixodes ricinus e causada por espiroquetas do
complexo Borrelia burgdorferi sensu lato. Clinicamente apresenta a típica lesão de pele
conhecida como eritema migratório (EM), que surge no ponto de inoculação dos
microorganismos, entre 4 a 30 dias da picada por carrapato. Na fase de disseminação
podem surgir lesões semelhantes conhecidas como anulares secundárias, porém pouco
expansivas. Na fase secundária podem aparecer complicações articulares, cardíacas e
neurológicas. Na fase tardia ou crônica observa-se artrite destrutiva, surgimento de lesão
de pele conhecida como acrodermatite crônica atrófica e neuropatias que lembram
enfermidades crônicas idiopáticas. Importante salientar que o aspecto mais característico
da DL, que é o EM, está presente em cerca de 70% dos doentes dos EUA e em menos
da metade dos enfermos europeus.

No Brasil o carrapato responsável pela transmissão pertence ao gênero Amblyomma


(FIGURA 1) e o agente etiológico é incultivável no meio de cultura conhecido como BSK,
próprio para crescimento de borrélias. Este aspecto implica em que o agente etiológico
seja diferente no país, ou que existe uma variante da clássica borrelia com propriedades
biológicas diferentes da B. burgdorferi. Análises à microscopia eletrônica do sangue
periférico dos pacientes com DLs revelam estruturas que lembram espiroquetas,
micoplasmas e chlamídias. Sabe-se que, espiroquetas ( ou qualquer outra bactéria) na
sua forma L, também conhecidas como esferoplastos ou cistos, são desprovidas de
parede celular e exibem estas características morfológicas citadas ao exame
microscópico. Do ponto de vista clínico, todas as manifestações da DL estão presentes
no Brasil. Contudo algumas diferenças são distintivas e de grande relevância, como a alta
freqüência de recorrências, que acontecem em cerca de 75% dos doentes,
especialmente quando existe demora no diagnóstico e tratamento. O diagnóstico
laboratorial da DLs é difícil, pois microorganismo do nosso meio não foi isolado ainda, e
os ensaios no país são realizados com emprego de borrélias de outros continentes,
especialmente a Borrelia burgdorferi de origem americana. Contudo, estas dificuldades
não podem servir de justificativa para o desconhecimento da enfermidade, pois é
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altamente prevalente e mórbido do ponto de vista evolutivo. O interrogatório


epidemiológico é de grande valia no diagnóstico da DLs, como histórico de picadas por
carrapatos e visita às áreas de risco com presença de vegetação e animais, num período
de 30 dias antes da ocorrência dos sintomas.

FIGURA 1. Amblyomma cajennense, carrapato transmissor da DLs no Brasil.

Desde o início da pesquisa da DLs no Brasil em 1989, a nomenclatura da


enfermidade no país tem mudado constantemente, refletindo resultados das pesquisas
em andamento na FMUSP. Dentre os nomes empregados podemos citar: Doença de
Lyme, Doença de Lyme símile, Síndrome Doença de Lyme símile, Síndrome Infecto
Reacional Lyme símile.

Na fase aguda da DLs existem manifestações clínicas gerais, como febre, mialgia,
artralgia, cefaléia, calafrios, rash malar, adenopatia. O EM surge em média após 10 dias
da picada por carrapato (FIGURA 2), e está presente em 30-50% dos casos e pode
recorrer na fase secundária da zoonose. Outra forma de apresentação cutânea
secundária da DL, conhecida como linfocitoma borreliano, também já foi descrita no país.
Caracteriza-se pela presença de nódulos de cor violácea, localizada em lóbulo de orelhas
e mamilos, que histologicamente exibem acúmulo de linfócitos B. A acrodermatite crônica
atrófica, lesão tardia da borreliose, mostra atrofia cutânea e aspecto semelhante ao
observado na esclerose sistêmica. Esse tipo de manifestação tem sido igualmente
descrita no Brasil.

A artrite da DLs é idêntica ao da DL, e está presente em cerca de 35% dos pacientes,
A apresentação geralmente é monoarticular ou oligoarticular de grandes articulações,
em especial dos joelhos, que surge dias ou semanas do início do contágio. Tem curso
intermitente, com surtos inflamatórios recorrentes, durando semanas a meses quando
não tratados. Com a progressão da zoonose, o quadro articular exibe tendência a tornar-
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se poliarticular, chegando a acometer pequenas articulações, sugerindo artrite


reumatóide. Pode ocorrer rigidez matinal, intensa fadiga e mialgia, que lembram
fibromialgia. O líquido sinovial na artrite da DLs é de padrão inflamatório com predomínio
de neutrófilos.

Na DLs 30% evoluem com complicações neurológicas, caracterizadas pela tríade:


meningite, neurite craniana e neurite periférica. A meningite é de padrão linfomonocitária
e o doente exibe poucos sintomas. Todos os nervos cranianos podem ser acometidos,
mas o nervo facial é o mais freqüente, e quando o comprometimento é bilateral, torna-se
altamente sugestivo de borreliose. A neuropatia periférica sensitivo-motora é de padrão
axonal.

Comprometimento cardíaco ocorre em cerca de 5% dos doentes no país. O


achado mais típico é a arritmia cardíaca, em especial do bloqueio átrio-ventricular. Em
geral revertem com tratamento e não necessitam de marca-passo, mas pode haver
recorrência dos sintomas.

No Brasil já existem exemplos de pacientes com DLs que após repetidos surtos
de recorrências, evoluíram para a fase terciária, quer da forma cutânea quer da forma
neurológica. Doentes com complicações neurológicas crônicas exibem distúrbios
psiquiátricos e manifestações do envolvimento neurológico central, confirmados por
achados de síndromes desmielinizantes à Ressonância Nuclear Magnética.

Laboratório

O diagnóstico laboratorial específico para a DLs deve ser interpretado com cuidado,
pois a sorologia empregada não é específica para a zoonose encontrada no país. Utiliza-
se a cepa americana de Borrelia burgdorferi no ensaio imunoenzimático (ELISA) e
western-blotting (WB). Na fase de convalescência do estagio primário, cerca de 50% dos
doentes apresentam anticorpos, especialmente da classe IGM (ELISA). Na fase
secundária, aproximadamente 65% desenvolvem anticorpos, na maioria das vezes da
classe IgG (ELISA). A sorologia na DLs apresenta reação cruzada com outras
espiroquetoses ( sífilis, leptospirose), viroses, rickettsiose, leishmaniose visceral, doenças
autoimunes ( doença reumatóide, lúpus eritematoso sistêmico, esclerose sistêmica),
neuropatias crônicas (esclerose lateral amiotrófica e esclerose múltipla). Exames
sorológicos seqüenciais podem ajudar no diagnóstico laboratorial da DLs.

Outros exames complementares podem ser úteis em situações particulares da DLs.


Incluem-se exames como a eletroneuromiografia, eletrocardiograma, exames de Imagem,
dosagem de enzimas musculares na suspeita de miosite ( CK, aldolase). Exames
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laboratoriais gerais são de pouca ajuda. Provas de atividade inflamatória como VHS,
mucoproteinas e PCR alteram-se em apenas 25% dos casos. Hipergamaglobulinemia e
presença de FAN podem surgir durante a evolução da zoonose, mostrando que com a
evolução, a enfermidade exibe aspectos auto-imunes.

DIAGNÓSTICO

O Laboratório de DLs na FMUSP elaborou um critério diagnóstico com objetivo de facilitar


a identificação desta zoonose no país (TABELA 1).

TABELA 1. Critérios diagnósticos da Doença de Lyme Símile


CRITÉRIOS MAIORES

EPIDEMIOLOGIA picada de carrapato ou


Presença em áreas de risco 30 dias antes do início dos sintomas

CLÍNICA Eritema migratório ou


Artrite ou
Neuropatia ou
Cardite

LABORATÓRIO Sorologia + por Elisa ou WB

CRITÉRIOS MENORES

RECORRÊNCIAS
SINAIS CLINICOS MENORES Fadiga crônica
Distúrbios cognitivos
Identificação de espiroquetas (microscopia de campo escuro)

DIAGNÓSTICO: 3 Critérios maiores ou


2 Critérios maiores + 1 critério menor

TRATAMENTO

O tratamento da zoonose é realizado com uso de antibióticos. No estágio primário


recomenda-se o uso da doxiciclina 100 mg duas vezes ao dia por 30 dias. Em crianças
pode-se empregar amoxicilina pelo mesmo período. Alternativamente prescreve-se
azitromicina na dose de 500 mg/dia. O tratamento deve ser prolongado, pois no Brasil o
risco de recidiva é elevado. Nos casos de evolução secundária (como na artrite),
empregam-se os mesmos medicamentos, porém por período mais longo, chegando até a
três meses de tratamento. Manifestações neurológicas podem ser tratadas com
ceftriaxone 2g/dia por 30 dias ou penicilina cristalina 20 milhões /dia, seguido do uso de
doxiciclina por mais dois meses. Havendo episódios freqüentes de recorrência, pode-se
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introduzir antimaláricos ( hidroxicloroquina 400 mg/dia) ou sulfasalazina na dose de


2g/dia por período prolongado (meses a anos).

FIGURA 2. Eritema migratório de padrão homogêneo

ARTROPATIAS INFECCIOSAS RESUMO

Trata-se de tema de grande importância pela freqüência , urgência no diagnóstico e


brevidade na conduta terapêutica, com riscos de evolução para complicações irreversíveis.
Artrite bacteriana aguda
Na suspeita, é imperativo a punção articular ( exceto se tiver infecção adjacente da pele)
para exame do líquido sinovial para contagem de células, bioquímica, bacterioscopia e cultura.
Antibioticoterapia deve ser imediata, assim como a lavagem ou abordagem cirúrgica da articulação
para limpeza.
Artrite gonocócica
É a mais freqüente em jovens, cursa com artrite migratória inicial, havendo fixação
bacteriana em uma ou poucas articulações, evolui com tenosinovite e complicações cutâneas
(vesículas). Deve-se procurar foco primário, especialmente em mulheres, que podem estar
assintomáticas.
Tuberculose e fungos
Evoluem de forma crônica, com poucos sinais inflamatórios. A Tbc articular atinge
articulações que sustentam peso e a coluna, especialmente dorsal ( mal de Pott), determinando
cifose localizada da coluna. Punção com biópsia e cultura é de grande importância no diagnóstico
da tuberculose articular, pois foco à distância pode estar ausente. A dosagem da glicose no líquido
sinovial é baixa.
Artrites virais
Destacam-se a rubéola ( presença de vírus na sinóvia), hepatite B ( imunecomplexos) e
parvovírus B (exantema infantil, quinta doença). Na rubéola o quadro articular surge
concomitantemente ao exantema e na hepatite na fase pré-ictérica. Vacina da rubéola também
causa artrite. O quadro articular geralmente acomete as mãos, tem padrão simétrico, e por vezes
traz confusão com artrite reumatóide, nos casos de evolução prolongada ( rubéola, parvovirose).
Lembrar que na SIDA há diferentes manifestações articulares, incluindo apresentações que
sugerem artropatias soro-negativas, com a Síndrome de Reiter.
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Doença de Lyme brasileira (DLs)


Zoonose transmitida por carrapatos, causada por espiroquetas do complexo Borrelia
burgdorferi sensu lato, tem características próprias no país, mas a etiologia ainda não está
elucidada e existe alta freqüência de recorrência de sintomas no Brasil. O seu conhecimento é de
fundamental importância ao médico, pois além de emergente, a casuística está crescendo
assustadoramente, e o prognóstico torna-se reservado, com grande morbidade, quando não
diagnosticado precocemente. No Brasil encontramos as mesmas manifestações clínicas da
Doença de Lyme encontrada no Hemisfério Norte, ou seja, eritema migratório, artrite de grandes
articulações, manifestações neurológicas ( meningite, radiculite craniana e periférica) e cardite
(arritmias). O tratamento é com antibióticos especialmente a doxiciclina em adultos, administrados
de forma prolongada para evitar recidivas.

ARTROPATIAS INFECCIOSAS QUESTÕES

1. Menino de 7 anos chegou no pronto socorro com febre, toxemia e intenso derrame em
joelho direito, acompanhado de calor e rubor, que teve início há três dias após machucar
a perna com pedaço de vidro. Aponte a alternativa errada.
a) Deve-se puncionar o joelho de imediato, e enviar o líquido sinovial para análise laboratorial.
b) O agente etiológico mais provável é estafilococos.
c) Deve-se aguardar o resultado da cultura e antibiograma para início do tratamento .
d) O líquido sinovial deve mostrar elevada celularidade ( superior a 40.000/mm3) com
predomínio de neutrófilos.
e) A viscosidade do líquido sinovial é baixo.

2. Jovem adolescente de 16 anos inicia o quadro com febre; artralgia migratória seguida de
artrite fixa em tornozelo direito, acompanhada de intensa atividade inflamatória,
dificuldade para movimentar a mão esquerda por inflamação dos tendões extensores do
punho e surgimento de vesículas pustulosas no tronco. Aponte a alternativa errada:
a) Encaminhar paciente para exame ginecológico.
b) Puncionar o tornozelo D.
c) Realizar ultrasson de punho E antes do tratamento.
d) Tratamento antibiótico precoce.
e) Enviar material da vesícula para bacterioscopia e cultura.

3. Homem de 35 anos apresenta monoartrite de joelho D há um ano, com febre vespertina.


Relata ter tido tuberculose renal com 18 anos. Aponte o procedimento errado:
a) Realizar punção-biópsia do joelho
b) Fazer RX do joelho
c) Tratar imediatamente.
d) Fazer RX de Tórax e Ultrasson renal.
e) Solicitar exames reumatológicos.
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4. Rapaz de 20 anos, 10 dias após voltar de passeio em Hotel-Fazenda onde andou a cavalo
e caminhou por trilhas na mata, desenvolve febre baixa, artralgia, mialgia e lesão
avermelhada em coxa direita. Aponte a pergunta não pertinente ao caso clínico:
a) Foi picado por carrapato?
b) A mancha é expansiva?
c) Tem cefaléia e rigidez de nuca?
d) Comeu algo estragado no hotel?
e) Alguém com seu sintoma?

5. Adolescente, feminina, de 16 anos, apresenta febre, poliartrite nos punhos, metacarpo-


falangeanas, adenomegalia cervical posterior e rush cutâneo no tronco há 3 dias. A
conduta mais adequada dentre as abaixo é:
a) Punção articular em alguma articulação acometida e enviar para cultura
b) Solicitar fator reumatóide
c) Iniciar tratamento com antibiótico
d) Solicitar sorologia para SIDA
e) Nenhuma das anteriores

Respostas Infecciosas: 1-c; 2-c; 3-c; 4-d; 5-e

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA
Yoshinari, NH; Gauditano, G. Doença de Lyme-símile no Brasil. In: Lopes, AC. Tratado de Clínica Médica v1.
São Paulo, ed Roca. 2006, pp. 1684-1692
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FEBRE REUMÁTICA

Rosa Maria Rodrigues Pereira


Jaqueline Barros Lopes

DEFINIÇÃO
Febre Reumática (FR) é uma complicação tardia não supurativa de uma
infecção faríngea por sepas de Streptococcus ȕ-hemolítico do grupo A de Lancefield.

EPIDEMIOLOGIA
Nos ditos “paises em desenvolvimento”, ainda hoje se observam cerca de 150
novos casos por 100.000 habitantes. Estima-se que a cada ano ocorrerá de 15 a 20
milhões de casos novos nos paises do terceiro mundo, onde 2/3 da população mundial
vive.
Recentemente casos de ressurgimento de epidemias de FR foram relatados
nos Estados Unidos da América. Em algumas das localizações a maioria das crianças
afetadas pertencia a famílias de situação sócio-econômica boa, com acesso
estabelecido a antibióticos e ao sistema de saúde.
A “população alvo” da FR consiste basicamente dos indivíduos mais
suscetíveis a infecções por Streptococcus: crianças e jovens, com pico de incidência
entre os 5 aos 15 anos de idade. Homens são afetados da mesma forma que
mulheres. Casos em menores de 4 anos e na vida adulta são raros.

ETIOPATOGENIA

Fator desencadeante
Convincentes evidências epidemiológicas indiretamente implicam o
Streptococcus como fator desencadeante da Febre Reumática. Está bem estabelecido
que surtos de FR acompanhem epidemias de escarlatina e de faringite pela bactéria. A
FR não ocorre após infecções estreptocócicas em outros locais, por exemplo,
pneumonia, feridas e sepse puerperal ou infecções por estreptococos de outros
grupos.
No entanto, nem todos os Streptococcus do grupo A parecem ser capazes de
provocar Febre Reumática, e nem todos os indivíduos parecem ser susceptíveis a esta
doença. Estima-se que apenas cerca de 1 a 3% da população apresentarão Febre
Reumática, mesmo se infectados por uma cepa sabidamente reumatogênica. Os

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fatores que conferem susceptibilidade, tanto bacteriana quanto hospedeira, não são
totalmente conhecidos, mas serão mais discutidos a diante.

Auto-imunidade
Após a faringite estreptocócica e o período de latência, no momento da Febre
Reumática aguda, o Streptococcus raramente pode ser isolado no hospedeiro, uma
evidencia indireta de que ele já foi eliminado. A Febre Reumática é rara antes dos 4
anos de idade, o que mostra a necessidade de uma sensibilização prévia ao agente,
ou certa maturidade do sistema imunológico.

Fatores bacterianos
Cada estreptococo é envolvido por diversas camadas, que pela semelhança
química com estruturas presentes em tecidos humanos (mimetismo antigênico),
induzem a formação de anticorpos configurando a chamada reação cruzada (FIGURA
1). Destas estruturas, a Proteína M é considerada um dos mais importantes antígenos
de superfície. Sua função consiste em dificultar a fagocitose pelas células
imunológicas do hospedeiro, ajudando a fixar a bactéria na célula epitelial da faringe e
é capaz de induzir anticorpos contra a tropomiosina muscular.

Cápsula de ácido hialurônico Sinóvia e Cartilagem articular

Camada Externa - Proteína M Sarcolema miocárdico

Camada Média - Grupo de carboidratos A Miocárdio

Camada Interna – Mucopepitídeo Tecido valvular

Membrana Protoplasmática Sarcolema miocárdico e


Núcleo Caudado Subtalâmico

FIGURA 1. Estruturas do Streptococcus ȕ-hemolítico do grupo A (corte transversal) e suas reações


cruzadas com o tecido humano

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Fatores do Hospedeiro
a- Imunidade Humoral - Anticorpos reativos contra estruturas cardíacas estão
presentes no momento, ou um pouco antes do segundo ataque de FR. De fato,
gamaglobulinas têm sido encontradas ligadas ao sarcolema de áreas lesadas em
corações de pacientes reumáticos.
b- Imunidade celular - Há na FR a hipótese de uma resposta celular exagerada e
duradoura, certamente relacionada com a fisiopatologia da doença. Consistente com esta
hipótese, é o achado de expansão de linfócitos CD4 positivos e redução da atividade
supressora no sangue periférico de pacientes com FR Aguda.
A histopatologia dos tecidos cardíacos acometidos na FR mostra um infiltrado
linfomonocitário, formado principalmente por linfócitos do tipo CD4+, e, posteriormente,
proliferação de fibroblastos e fibrose.
A relação entre infecção por Streptococcus, reação celular e lesão cardíaca na FR
foi bem abordada pela análise de células T encontradas nestas lesões. Estas células
reconhecem de forma cruzada peptídeos derivados da proteína M e proteínas de tecidos
cardíacos. Padrão semelhante de linfócitos foi encontrado no sangue periférico destes
pacientes.
c - Citocinas - A cardiopatia reumática leve, artrite e a coréia parecem apresentar
predomínio de citocinas, padrão Th 2 de resposta. A cardiopatia reumática grave é
basicamente mediada por um padrão Th 1, com aumento de IL-1, Fator de Necrose
Tumoral alfa e IL-2, visto nas fases agudas da doença.

QUADRO CLÍNICO
De 2 a 3 semanas após a faringite desencadeante, o individuo apresentará um
quadro febril agudo acompanhado de artrite migratória predominantemente de grandes
articulações e/ou sinais clínicos ou laboratoriais de cardite e valvulite. Sintomas
secundários ao acometimento de sistema nervoso central (Coréia de Sydenham,
alterações de comportamento) são menos freqüentes, mas muito sugestivos, e irão
ocorrer após um período de latência geralmente mais longo, geralmente de 3 a 6 meses.
O episódio agudo da FR é auto limitado com duração de um a seis meses. A
doença apresenta tendência a recorrer, especialmente nos primeiros cinco anos após o
surto inicial e nos pacientes com doença cardíaca reumática prévia. Os surtos
subseqüentes tendem a minimizar o inicial. A FR não causa urticária, edema
angioneurótico ou glomerulonefrite clínica.

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Cardite - É a manifestação clínica mais freqüente no Brasil (65%) e a mais importante


pela morbidade e mortalidade. Pode ocorrer até a sexta semana do surto agudo e
caracteriza-se por acometimento isolado ou associado dos 3 folhetos (pancardite). A
endocardite está presente em 100% dos casos seja o sopro audível ou não. Já a
pericardite e a miocardite são manifestações mais raras e sempre ocorrem associadas à
endocardite.
Semiologicamente a endocardite manifesta-se por sopro orgânico da válvula
comprometida e que por ordem de freqüência são: mitral, aórtica, tricúspide e
excepcionalmente a pulmonar. Sopro de estenose mitral pode estar presente em crianças,
indicando a existência de surto anterior.
Cardite leve, não acompanhada de outros sintomas da doença, podem passar
despercebidos. A cardite reumática pode evoluir para a cura, permanecer estacionária ou
sofrer calcificações progressivas. Alteração cardíaca permanente depende primariamente
da gravidade da valvulite.
Coréia de Sydenham - A presença de movimentos corêicos em crianças são altamente
sugestivos do diagnóstico de FR. Por apresentar um período de latência prolongado (um
a seis meses) entre a infecção estreptocócica e o início das manifestações clínicas, é
comum não serem observadas na coréia, alterações das provas de fase aguda, nem
evidências da infecção estreptocócica anterior.
Clinicamente caracteriza-se por movimentos involuntários uni ou bilaterais
arrítmicos, rápidos, desordenados, que desaparecem com o sono. São mais evidentes
nas extremidades e podem ser acompanhados de dificuldade de concentração e escrita,
voz arrastada, disartria, fraqueza muscular e labilidade emocional. O surto de coréia
geralmente é autolimitado, tem duração variável de uma semana a dois anos, com média
de dois a três meses.
Artrite - Dentre os sinais maiores de febre reumática é o que envolve maior dificuldade
diagnóstica quando se apresenta isoladamente. Classicamente é caracterizada por uma
poliartrite migratória de grandes articulações, sendo pouco freqüente o envolvimento das
coxofemorais, coluna e pequenas articulações de mãos e pés. A duração do surto
articular não excede duas a três semanas e evolui para a cura completa, raramente com
seqüelas. A síndrome de Jaccoud, isto é desvio ulnar e subluxação das articulações
metacarpo-falangeanas sem destruição óssea, pode aparecer, decorrente de surtos
repetidos da FR. O quadro articular pode ser incaracterístico, ou seja, com artrite aditiva,

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duração mais prolongada, sendo o diagnóstico realizado pela presença concomitante de


cardite e/ou coréia.
Nódulos subcutâneos - É uma manifestação rara, ocorrendo em menos de 3%, em geral
associada à cardite. Aparecem várias semanas após o início do surto, localizados nas
superfícies das articulações, sobre proeminências ósseas e no couro cabeludo; de
consistência endurecida, indolores e imóveis.
Eritema Marginado - Apresenta associação freqüente com cardite, caracterizando-se por
lesões de bordas nítidas avermelhadas, serpiginosas, com centro claro, não pruriginosas
e de localização preferencial em tronco e porções proximais dos membros. Geralmente
são evanescentes, com duração de horas ou mesmo minutos.

DIAGNÓSTICO
O diagnóstico tem sido baseado nos critérios de Jones (TABELA 1). Eles incluem
as manifestações clínicas já descritas e achados de exames laboratoriais. A presença de
duas manifestações maiores ou de uma manifestação maior e duas menores somadas à
evidência de uma faringoamidalite por estreptococos do grupo A, satisfazem o
diagnóstico. É importante lembrar, que cardite e coréia isoladas são altamente sugestivas
de FR e, portanto, os critérios de Jones não são absolutos, mas sim auxiliares no
diagnóstico da doença. Além disso, essas manifestações podem ocorrer após um longo
período de latência onde a documentação de uma infecção estreptocócica precedente
pode não ser possível.
Não há alterações laboratoriais patognomônicas para o diagnóstico da FR. Os
exames laboratoriais têm por finalidade demonstrar a reação inflamatória aguda,
evidenciar a infecção estreptocócica anterior e auxiliar na exclusão de outras doenças.
Dentre as provas de fase aguda, destacam-se a velocidade de
hemossedimentação (VHS) e a proteína C reativa (PCR). Apesar de não específicas,
estas alterações estão presentes em todos os pacientes com processo reumático agudo
não suprimido pelo uso de antiinflamatórios. A coréia pura e ocasionalmente o eritema
marginatum persistente são exceções a esta regra.
Três parâmetros são utilizados como evidência de infecção estreptocócica
anterior: escarlatina recente, cultura de orofaringe positiva para Streptococcus ß
hemolítico do grupo A e aumento de títulos dos anticorpos específicos.

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TABELA 1. Critérios Modificados de Jones para o diagnóstico de Febre Reumática


Manifestações Maiores Manifestações Menores
Cardite Achados Clínicos
Poliartrite Artralgia
Coréia Febre
Eritema Marginatum
Nódulos Subcutâneos Achados Laboratoriais
Elevação de Reagentes de Fase Ativa
VHS
Proteína C Reativa
Prolongamento do intervalo PR no ECG
Mais:
Evidências de Infecção previa pelo Streptococcus do Grupo A
Cultura faríngea ou teste rápido pra antígenos estreptocócicos positivos
Títulos elevados do Título de anticorpos anti-estreptococos

É conveniente lembrar que cerca de 50% das amidalites estreptocócicas dos


pacientes FR são assintomáticas ou leves e cerca de 1/3 destes pacientes não recordam
de ter tido doença no mês anterior à instalação da FR.
A cultura da orofaringe pode ser útil, apesar da tipagem do Streptoccus não ser
feita de rotina e de não distinguir o estado de portador de infecção. Esta apresenta taxa
de positividade, em torno de 20% se colhida no momento dos primeiros sintomas de FR
(duas a três semanas após a infecção estreptocócica).
As determinações dos anticorpos antiestreptocócicos (antiestreptolisina O,
antihialuronidade, antiestreptoquinase, antiDNAase e antiDNAse - B), deverão ser sempre
realizadas, lembrando-se que pelo menos 80% dos pacientes terão antiestreptolisina O
(ASLO) elevadas durante o curso da doença e todos apresentarão alterações, quando
três ou mais anticorpos forem dosados.
Quando os títulos iniciais de ASLO não estiverem aumentados, recomenda-se a
repetição do exame em duas a três semanas, pela possibilidade de detectar-se ascensão
dos valores prévios. Níveis de ASLO entre 200 - 300 e mesmo 500 U são comuns em
crianças escolares, especialmente nas de níveis sócio-econômico mais baixo.
Para auxílio na exclusão de outras patologias, hemograma, complemento, Fator
antinúcleo (FAN) podem ser úteis.

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Alterações eletrocardiográficas são comuns e quando isoladas tem bom


prognóstico. Apesar de considerado um sinal menor, o alargamento do espaço P-R não é
específico da FR, podendo ocorrer em outras doenças e mesmo em crianças normais.
Ecocardiograma com doppler deve sempre ser solicitado na suspeita de FR por
ser um exame útil no diagnóstico de valvulopatias discretas, de disfunção miocárdica e
pericardite.

DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
Na suspeita de FR, de acordo com o quadro clínico inicial, recomenda-se excluir
outras doenças:
1. Artrite: afastar rubéola, hepatite B, poliartrite gonocócica, artrite idiopática juvenil (AIJ),
anemia falciforme, leucemia
2. Cardite: sopros funcionais, endocardite bacteriana subaguda, lúpus juvenil (LESJ),
prolapso de válvula mitral, aorta bicúspide
3. Coréia: raramente outros diagnósticos são prováveis (encefalite viral, LESJ, coréia
familial benigna)
4. Nódulos subcutâneos: nódulos benignos, AIJ
5. Eritema marginado: reações a drogas, infecções

TRATAMENTO
a- Profilaxia primária – Erradicação do Streptococcus ß hemolítico da orofaringe.
A droga de escolha é a penicilina, esta reduz a freqüência de FR quando
administrada até 9 dias após início da faringite.
Pode ser administrada em dose única intramuscular (Penicilina benzatina
600.000UI em crianças até 25 kg e 1.200.000 UI para crianças maiores de 25 kg) ou via
oral (Penicilina V - 50.000 U/kg/dia de 6/6 h por 10 dias). A dose intramuscular deve ser
preferida à oral, pela facilidade posológica e garantia de tratamento, considerando que
níveis adequados de antibiótico devem ser mantidos por 10 dias para erradicação do
estreptococo.
A eritromicina constitui uma opção apenas nos casos de alergia a penicilina, (30-
40 mg/kg/dia via oral de 6/6 h por 10 dias)
b- Profilaxia secundária – Prevenção de novas infecções estreptocócicas.
A profilaxia secundária deva ser feita com a utilização de penicilina benzatina cada
3 semanas nas mesmas doses recomendadas para a profilaxia primária. Nos casos de

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alergia à penicilina, a droga de escolha é a sulfadiazina na dose de 500mg/d para


crianças até 25Kg e 1g/dia para aquelas com peso superior. A duração da profilaxia
depende da presença e intensidade do acometimento cardíaco:
x Pacientes sem cardite – Até os 18 anos ou tempo mínimo de 5 anos, com
preferência pelo período mais longo*.
x Pacientes com cardite na fase aguda, mas sem cardiopatia crônica residual – Até
a idade de 25 anos ou tempo mínimo de 10 anos, com preferência pelo período
mais longo*.
x Pacientes com cardiopatia crônica residual ou submetidos à implantação de
próteses valvares – por tempo indeterminado.
* Após esse período, o intervalo entre as doses e o tempo poderá ser ampliado na
dependência, do tipo de atividade exercida pelo paciente (hospitais, locais e alto risco de
contaminação).
c- Tratamento das manifestações clínicas
x Artrite: Aspirina - 90 - 100 mg/kg/dia VO 6/6 h até melhora clínica e laboratorial,
com redução gradual em quatro semanas a oito semanas. Dose máxima - 3 g/dia.
x Cardite: Prednisona 1 - 2 mg/kg/dia VO (não ultrapassar 60 mg) 12/12h ou de
8/8h até melhora clínica e laboratorial, geralmente 2 a 3 semanas. Passar para
dose única pela manhã e iniciar a redução, até retirada completa em 8 -12
semanas. O repouso é recomendado na dependência da gravidade do quadro
clínico. O uso de digitálicos e diuréticos podem ser necessários nos casos de
insuficiência cardíaca.
x Coréia: Haloperidol - iniciar com 2 mg VO/dia 12/12h. Após 72h se não houver
melhora, aumentar 1mg/dia até 4 - 6 mg/dia. Cautela com sinais de impregnação.
Ácido valpróico (20 - 40 mg/kg/dia VO 6/6h ou 8/8h), Clorpromazina (1 - 3
mg/kg/dia VO 6/6h ou 8/8h), Fenobarbital (5 - 7 mg/kg/dia VO 6/6h ou 8/8h).
d - Dúvidas terapêuticas freqüentes
x Contactantes domiciliares de um caso de FR devem ser tratados se a cultura de
orofaringe for positiva. Na prática, pelas dificuldades de realização deste exame,
recomenda-se o tratamento de todas as crianças da casa com penicilina
benzatina.
x A amidalectomia não reduz o risco de faringite estreptocócica, não altera o curso
da doença e não reduz a freqüência de FR.
x Ainda não se conseguiu a viabilização de uma vacina antiestreptocócica.

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FEBRE REUMÁTICA RESUMO

Definição - complicação tardia de uma infecção faríngea por sepas de Streptococcus ȕ-hemolítico
do grupo A de Lancefield.

Epidemiologia - Indivíduos mais suscetíveis a infecções por Streptococcus: crianças e jovens,


entre os 5 aos 15 anos de idade. Raro antes dos 4 anos de idade e na vida adulta. Igual nos dois
sexos.

Etiopatogenia - Auto-imunidade desencadeada por faringoamidalite pelo Streptococcus ȕ-


hemolítico do grupo A, dependente de fatores bacterianos (superfície antigênica do estreptotoco
em especial a Proteína M – mimetismo antigênico) e fatores do hospedeiro (imunidade humoral,
imunidade celular, citocinas e marcadores genéticos).

Quadro Clínico - Aparece de 2-3 semanas após a faringoamidalite. Inicia-se com poliartrite
migratória ou cardite. A coréia pode ocorrer isolamente após um período de latência maior de 3 a 6
meses. Nódulos subcutâneos e eritema marginatum acompanham o surto de cardite. A cardite
isolada ou associada é a manifestação clínica mais freqüente no Brasil (65%) e é a mais
importante pela morbidade e mortalidade. O sopro está presente em 100% dos casos de cardite e
as válvulas mais acometidas por ordem de freqüência são: mitral, aórtica, tricúspide e
excepcionalmente pulmonar.

Diagnóstico – Critérios de Jones são úteis, mas nos casos de cardite e coréia o diagnóstico pode
ser realizado sem a observação estrita destes. São úteis para o diagnóstico: cultura da orofaringe
(positiva em 20% dos casos), dosagem seriada dos valores de ASLO e dosagem dos outros
anticorpos (antihialuronidade, antiestreptoquinase, antiDNAase e antiDNAse–B. Ecocardiograma
para identificação de cardite.

Diagnóstico diferencial – Recomenda-se afastar outras doenças, de acordo com a manifestação


clínica inicial: poliartrite gonocócica, endocardite bacteriana subaguda, doenças virais, artrite
idiopática juvenil, anemia falciforme, leucemias, lúpus juvenil, reações a drogas, etc.

Tratamento
Profilaxia primária – erradicação do Streptococcus ß hemolítico da orofaringe.
Profilaxia secundária – prevenção de novas infecções estreptocócicas.
A droga de escolha para ambas as profilaxias é a penicilina benzatina.
Tratamento das manifestações clínicas: artrite (aspirina), cardite (prednisona), coréia (haloperidol
ou ácido valpróico ou clorpramazina ou fenobarbital).

FEBRE REUMÁTICA QUESTÕES

1) Assinale a alternativa correta:


a) A válvula tricúspide é a mais acometida na Febre reumática.
b) A duração da profilaxia secundária em pacientes que tiveram febre reumática com cardite
sem doença orovalvar sequelar é de pelo menos 10 anos ou até os 25 anos de idade.
c) As válvulas aórtica e mitral tem freqüência de acometimento semelhante na febre reumática.
d) Cardite isolada não pode ser considerada para o diagnóstico de Febre Reumática.
e) A cardite é sempre uma manifestação tardia da Febre reumática, ocorrendo após 6 meses
da faringoamidalite estreptocócica.

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2) Assinale a alternativa correta:


a) A poliartrite migratória da Febre Reumática acomete principalmente pequenas articulações.
b) A poliartrite da Febre Reumática ocorre após 2 a 3 semanas de qualquer infecção por
estreptococos, como a piodermite.
c) Artrite idiopática juvenil não é diagnóstico diferencial para a febre reumática, visto que as
faixas etárias são diferentes.
d) A dosagem de ASLO é o melhor método para o diagnóstico da artrite por febre reumática.
e) A poliartrite da Febre Reumática é característicamente migratória e autolimitada, mas pode
ocorrer de forma aditiva, geralmente não causando deformidades permanentes.

3) Menino com 10 anos, apresenta movimentos involuntários e descoordenados em um dos


braços. Relata que tem notado dificuldade de escrever e se concentrar durante nas
aulas. Às vezes percebe que sua voz fica mais lenta quando os movimentos nos braços
aparecem. Mãe refere que o filho anda chorando sem motivo aparente e acha que está
querendo apenas chamar sua atenção por ciúmes do irmão mais novo.
a) O diagnóstico mais provável deste adolescente é Coréia de Sydenham e profilaxia
secundária deve ser realizada pelo resto da vida.
b) O diagnóstico de coréia por febre reumática só pode ser estabelecido após evidência de
infecção estreptocócica por cultura ou testes sorológicos específicos.
c) A realização de ecocardiograma não ajudará na investigação diagnóstica.
d) O diagnóstico é altamente sugestivo de coréia por FR e profilaxia secundária para infecção
estreptocócica deve ser iniciada, com duração dependente ou não da presença de cardite.
e) Os critérios de Jones são imprescindíveis para diagnóstico nesse caso.

4. Adolescente de 14 anos, apresenta-se com poliartrite aditiva há 2 semanas; ela refere que
era previamente hígida e que tudo começou 5 semanas após dor de garganta.
a) O teste de ASLO (anti-estreptolisina O) não auxiliará no diagnóstico.
b) Evidência de glomerulonefrite é sugestivo do diagnóstico de febre reumática.
c) Presença de valvulites em especial sopro de insuficiência mitral deve ser pesquisado no
exame físico desta paciente.
d) Doenças como lúpus eritematoso sistêmico e artrite reumatóide não são diagnósticos
diferenciais, pois o quadro é agudo.
e) A cultura de orofaringe é positiva em 100% dos casos e auxiliará no diagnóstico.

5. Menina de 7 anos, apresenta dor de garganta, febre há 1 dia e presença de secreção


purulenta em tonsilas palatinas ao exame físico. A mãe está preocupada, pois a criança
tem um irmão com febre reumática. Assinale a correta:
a) O risco desta criança apresentar FR é o mesmo que para outras crianças sem parentes com
a doença, já que nenhuma alteração genética foi comprovadamente associada à FR.
b) O uso de penicilina benzatina só deve ser indicado após a coleta de material para cultura e
confirmação de infecção por estreptocos ȕ-hemolítico do grupo A de Lancefield.
c) Esta criança com certeza terá FR se não for realizada a profilaxia primária.
d) A Febre Reumática é uma doença auto-imune, mas sua manifestação depende do tipo de
infecção estreptocócica e da resposta humoral e celular de cada hospedeiro.
e) Título de ASLO normal nesta criança afasta completamente infecção aguda por
estreptococos.

Respostas FR: 1 – b; 2 – e; 3 – d; 4 – c; 5 - d

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA
1. Ayoub, Elia M. Rheumatic Fever at Clinical Immunology Principles & Practice, 2001, second edition, Section
6 (Systemic Immune Diseases), Chapter 69: 1-7.
2. Rheumatic Fever at Primer on the Rheumatic Diseases, 2001, 12th edition, chapter 12E: 279-83.

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3. Manyemba J et cols. Penicillin for secondary prevention of rheumatic fever. 2002, The Cochrane library; 4:
1-24.
4. Bonow RO, Carabello B, de Leon AC Jr, Edmunds LH Jr, Fedderly BJ, Freed MD, Gaasch WH, McKay CR,
Nishimura RA, O'Gara PT, O'Rourke RA, Rahimtoola SH, Ritchie JL, Cheitlin MD, Eagle KA, Gardner TJ,
Garson A Jr, Gibbons RJ, Russell RO, Ryan TJ, Smith SC Jr. Guidelines for the management of patients with
valvular heart disease: executive summary. A report of the American College of Cardiology/American Heart
Association Task Force on Practice Guidelines (Committee on Management of Patients with Valvular Heart
Disease). Circulation. 1998 Nov 3;98:1949-84.

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GOTA

Ric
ardo Fuller

DEFINIÇÃO

A doença é caracterizada por um aumento nos níveis de ácido úrico (ou


hiperuricemia), levando à formação de cristais de monourato de sódio nos mais
variados tecidos, principalmente articulações, estruturas periarticulares, rins e
subcutâneo. Caracteriza-se clinicamente por surtos agudos da artrite geralmente
envolvendo uma ou poucas articulçações e que numa fase crônica pode se generalizar
atingindo várias articulações. É também muito característico o desenvolvimento de
grandes acúmulos de cristais denominados tofos.

EPIDEMIOLOGIA

Acomete principalmente os homens, numa proporção de 10:1, incidindo dos 30


aos 60 anos pico aos 40 anos. Nas mulheres ocorre preferencialmente após a
menopausa. A prevalência da gota na população adulta geral (30 anos) é de 0,2 a
0,3%. Em indivíduos acima dos 40 anos atinge 0,5 a 1,0% são afetados (2,8% em
homens e 0,4% em mulheres). Esses dados referem-se a caucasianos. Em algumas
raças a prevalência é maior. Filipinos, povos do noroeste da América do Norte e
Maoris da Nova Zelândia (nestes a prevalência atinge 10%). Existe uma forte
influência hereditária na transmissão da gota, sendo verificada a presença de
antecedentes familiares em 38 a 80% dos pacientes.

HISTÓRICO

Gota vem do latim "guta" para designar a doença onde "gotas de veneno" pingam
sobre a articulação, analogia determinada pela intensidade e rapidez de instalação da
dor sofrida pelos pacientes. A evidência mais antiga da doença foi encontrada no Egito
onde verificou-se presença de depósitos tofáceos em hálux de múmias. Hipócrates
deixou a primeira referência escrita sobre a gota, no século V ac. A doença sempre foi
reconhecida como condição que aflige ricos e poderosos, glutões e beberrões (Celsus
- sec. I dc), carregando esta conotação até a atualidade. Em 1854, Garred estabeleceu
vinculação patogênica da gota com os uratos. É interessante notar que o primeiro
tratamento eficaz contra ataques agudos de gota vem sendo utilizado há 1500 anos
quando Alexandre Tales iniciou o emprego terapêutico da colchicina. Porém somente
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em 1950 surgiu o primeiro uricoredutor, o probenecide, e a partir de 1963 o alopurinol


passou a ser utilizado.

CLASSIFICAÇÃO e ETIOPATOGENIA

Quanto à etiopatogenia, a gota pode ocorrer por 2 mecanismos básicos:

1. Aumento na produção de ácido úrico: idiopático, defeito enzimático, alto


turnover ácidos nuclêicos, estresse (trauma, cirurgia, infecção) e dieta rica em
proteína.
2. Diminuição na eliminação de ácido úrico pelo rim. Aproximadamente 85% dos
pacientes com gota apresentam um defeito específico na eliminação de ácido
úrico (que independe da função renal global). Muitas vezes o mecanismo
desencadeante da gota para um dado paciente é misto.

Quanto à classificação, a gota pode ser primária ou segundária. No primeiro


grupo enquadram-se a gota idiopática e a gota associada a defeito enzimático que
leva ao aumento na produção de ácido úrico. A gota secundária pode ocorrer por: 1)
elevação do turnover de ácidos nuclêicos como em neoplásias, tratamento
quimioterápico (onde há muita morte celular), hiperparatiroidismo psoríase, estresse
físico (cirurgia, exercício físico intenso etc), estresse emocional, etc ou 2) diminuição
na eliminação renal de ácido úrico por insuficiência e uso de drogas (diuréticos, AAS,
tuberculostáticos, álcool), intoxicação por chumbo e acidose metabólica (infecção,
jejum etc). Existe ainda uma forma de gota de ocorrência na infância devido à
deficiência completa de hipoxantina guanina fosforibosil transferase, denominada de
Síndrome de Lesh Nyhan onde uma severa hiperuricemia leva a comprometimento
neurológico (espasticidade, coreoatetose e automutilação) quadro e morte precoce.

QUADRO CLÍNICO

Para fins de facilitar o estudo e compreensão da gota, podemos didaticamente dividir


seu espectro clínico da seguinte forma:

1. Hiperuricemia assintomática
2. Artrite gotosa aguda
3. Período intercrítico
4. Gota tofácea crônica
5. Gota renal e urolitíase
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1. Hiperuricemia assintomática

O ácido úrico é um produto normal do catabalismo das purinas, excretado


basicamente pelo rim. O ácido úrico conserva uma solubilidade sérica adequada até a
concentração de 7 mg/100 ml no soro, na temperatura de 37ºC. Acima desse nível
eleva-se progressivamente a possibilidade dessa substância cristalizar-se nos tecidos.
Por esse motivo, define-se hiperuricemico o indivíduo com nível sérico de ácido úrico
superior a 7 mg/100 ml. Hiperuricemia assintomática caracteriza-se por níveis séricos
elevados de ácido úrico porém sem manifestações clínicas. Hiperuricemia ocorre em
10% da população masculina acima dos 40 anos, sendo também observada em
mulheres principalmente após a menopausa e também em homens mais jovens,
porém numa freqüência menor. Indivíduos hiperuricêmicos tem maior chance de
desenvolver gota que normouricêmicos porém a maioria permanece indefinidamente
assintomática, não necessitando nenhuma medida terapêutica. Estudos recentes tem
associado a hiperuricemia a fator de risco independente para doença cardioascular.

2. Artrite gotosa aguda

É uma das manifestações clínicas mais características no âmbito da


reumatologia. A crise aguda da gota manifesta-se por uma artrite, quase sempre
monoarticular de início repentino e rápido desenvolvimento de dor (habitualmente em
menos de 24 horas), edema, aumento de temperatura e eritema. Este quadro tem
duração de 3 a 10 dias. As articulações mais comumente afetadas são (FIGURA 1):

1ª metatarso-falangeana: Nesse local a artrite denomina-se podagra. É a localização


mais típica da gota envolvida em 50% dos casos na crise inicial e em 90% dos
portadores de gota no evoluir da doença.

Membros inferiores: joelhos, tornozelos e tarso, interfalangeanas e outras


metatarsofalangeanas.

Membros superiores: cotovelos, interfalangeanas, metacarpofalangeanas e punhos.

A poliartrite como primeira crise ocorre em apenas 2 a 5% dos casos. Após a


crise gotosa aguda pode ocorrer descamação epidérmica sobre o local afetado (que
geralmente é o pé) e devido a esse fato lesões descamativas cutâneas em mãos e pés
são popularmente associados a "ácido urico", sem ter na verdade nenhuma relação
com hiperuricemia.
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FIGURA 1. Articulações mais envolvidas na gota

A poliartrite como primeira crise ocorre em apenas 2 a 5% dos casos. Após a


crise gotosa aguda pode ocorrer descamação epidérmica sobre o local afetado (que
geralmente é o pé) e devido a esse fato lesões descamativas cutâneas em mãos e pés
são popularmente associados a "ácido urico", sem ter na verdade nenhuma relação
com hiperuricemia.

Fatores desencadeantes da crise aguda: São os que aceleram o catabolismo


aumentando o substrato para a produção de ácido úrico como trauma, infecção,
cirúrgia, estresse emocional, excessos dietéticos, fase inicial ou interrupção de
terapêutica uricorredutora e os que reduzem a sua excreção como ingestão de bebida
alcoólica e uso de drogas como diuréticos, tuberculostáticos e salicilatos.

3. Período intercrítico e ataques recorrentes

Os pacientes ficam assintomáticos após os primeiros ataques agudos,


geralmente sem nenhuma seqüela articular. Alguns apresentam uma única crise
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durante a vida inteira. Outros apresentam mais 2 ou 3 crises, porém a evolução mais
característica é a de crises recorrentes. A periodicidade entre elas é de 2 a 4 meses.
Com a evolução, os ataques tendem a se tornarem mais longos e a envolverem mais
articulações. Em alguns casos o indivíduo entra numa fase poliarticular crônica com
dor nos períodos intercríticos e alterações persistentes ao exame físico e radiográfico
articular.

4. Gota tofácea crônica

Caracteriza-se pela presença de tofos (depósitos de urato) em vários tecidos


principalmente o subcutâneo peri-articular e articular em pacientes com doença de
longa evolução (geralmente mais de 5 anos), após muitos surtos de artrite. Antes da
terapêutica, 50 a 70% dos pacientes desenvolvia tofos, cifra que caiu para 17% após a
introdução do tratamento específico com uricoredutores. Locais mais afetados: bursa
olecraneana no cotovelo, tendão do calcâneo, mãos e pés, principalmente na região
dorsal, joelhos tornozelos, antebraços, punhos e orelha externa. Podem atingir
grandes dimensões em pacientes não tratados (FIGURA 2).

FIGURA 2. Tofos nas bursas olecraneanas e pés

5. Gota renal e urolitíase

O rim é o sítio extra-articular e cutâneo mais comumente afetado na gota e na


hiperuricemia. Manifesta-se sob 2 formas principais: a urolitíase e a nefropatia úrica.

Urolitíase: formação de cálculos constituidos por ácido úrico ou mistos (geralmente


com oxalato de cálcio) no trato urinário verificando em até 33% dos pacientes com
gota. Decorre principalmente do baixo pH verificado na urina desses pacientes o que
diminui a solubilidade do ácido úrico, e em alguns casos pelo aumento da excreção
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urinária do ácido úrico). A urolitíase ocorre também em hiperuricêmicos sem


manifestação articular, porém nesses casos não se define o paciente como gota.

Nefropatia úrica: Decorre principalmente do acúmulo de cristais no interstício renal.


Algumas das alterações anátomopatológicas são semelhantes às encontradas na
hipertensão arterial sistêmica, muito freqüente nos pacientes com gota.

Doenças associadas à gota: hipertensão arterial, diabetes, insuficiência coronariana,


acidente vascular cerebral, hipercolesterolemia e hipertrigliceridemia. Esses quadros
devem sempre ser investigados, mesmo sem manifestação clínica aparente.

EXAMES COMPLEMENTARES

Exames laboratoriais

1. Ácido úrico sérico > 7 mg/100 ml embora existam raros casos de gota com
uricemia normal.
2. Provas de atividade inflamatória: hemossedimentação, proteina C reativa
podem se elevar na crise.
3. Excreção de ácido úrico (uricosúria) na urina de 24 horas. Serve para definir
hiper, normo e hipoexcretores, dado utilizado na escolha e monitorização
terapêutica.
4. Líquido sinovial: presença de cristais de monourato de sódio extra e
intracelulares. Esses cristais são finos e tem pontas afiladas. O citológico
registra mais de 80% de polimorfonucleares
5. Anátomo patológico: presença de granulomas envolvendo massas de cristais
de urato em tofos e articulações comprometidas.
6. Hemograma - pode ocorrer leucocitose na fase aguda (inespecífico)
7. Glicemia colesterol, triglicérides - podem estar alterados no paciente com gota.

Raio X

Verifica-se múltiplas erosões ósseas em saca-bocado com bordos escleróticos e


espiculados como se fossem as valvas de uma concha (imagem em "concha").
Habitualmente o osso afetado é mais denso. Os tofos podem ser vistos como uma
opacificação tênue ao raio X e só muito raramente tornam-se calcificados. Com o
evoluir da doença surgem lesões líticas ósseas disseminadas, perda do espaço
articular, osteófitos e numa fase terminal anquilose e osteopenia. Os achados
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DIAGNÓSTICO

Baseia-se em:

1. História sugestiva: episódio de monoartrites sucessivas, podagra, sexo masculino,


acima dos 40 anos, história familiar de gota, urolitíase são elementos que surgerem
fortemente o diagnóstico.
2. Hiperuricemia.
3. Achado de cristais de monourato de sódio em tofos, líquido sinovial e sinóvia
(principalmente se intracelulares). É o dado patognomônico para o diagnóstico.
4. Quadro radiológico sugestivo, principalmente em saca-bocado.

DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL

1. Artrite séptica - Na primeira crise é fundamental a punção articular para


descartar um processo infeccioso que também manifesta-se como monoartrite
aguda.
2. Artrite reumatóide - Nesta o processo inflamatório é poliarticular, simétrico e
crônico. Mais frequente em mulheres.
3. Artropatias soronegativas - Também apresentam sinovite crônica, via de regra
oligo e poliarticular e com envolvimento freqüente da coluna.

TRATAMENTO

Tratamento da crise articular

1. Antinflamatórios não hormonais. Utilizam-se apresentações injetáveis, nos


casos mais graves.
2. Corticoesteróides - habitualmente na forma injetável de depósito para os casos
refratários ou contra-indicação ao uso de anti-inflamatórios.
3. Colchicina – 3ª opção em virtude dos efeitos gastrointestinais extremamente
freqüentes, na dose máxima de 0,5 mg 3X/dia.

Tratamento da hiperuricemia

1. Uricosúricos - No nosso meio utiliza-se a benzbromarona na dose de 50 a 200


mg/dia. Indicado a priori na maioria dos normo e hipoexcretores de ácido úrico.
Contraindicado em urolitíase e insuficiência renal. Outras: probenecide,
sulfinpirazona.
2. Inibidores de síntese de ácido úrico - alopurinol na dose de 100 a 600 mg (em
média 300 mg) ao dia em tomada única. É mielo, hepato e nefrotóxica e
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portanto deve ser utilizada com cuidado. Utilizado nos indivíduos


hiperexcretores ou com urolitíase .

Observações:

1. O tratamento da hiperuricemia nunca deve iniciar-se nem ser suspenso durante a


crise articular pois a oscilação dos níveis de ácido úrico pode desencadear ou
agravar uma crise.
2. A hiperuricemia assintomática habitualmente não deve ser tratada, a não ser
durante tratamento quimioterápico de neoplasia ou indivíduos com ácido úrico
muito elevado.

G
OTA RESUMO

Epidemiologia
x Idade: incidência - 30 a 60 anos, com pico aos 40 anos
x Prevalência da gota: 0,5 a 1,0 %
x Prevalência da hiperuricemia: 10 % após os 40 anos
x Sexo: homens 7-9 : 1 mulheres

Fisiopatologia
1. Ácido úrico:
Hiperuricemia (ác. úrico > 7 mg/dl) devido a hiperprodução ou hipoexcreção renal.
2. Crise inflamatória: devido a formação de cristais

Classificação
1. Primária:
x Associada à defeito enzimático que determina aumento na produção de ácido úrico
x Hipoexcreção do ácido úrico devido à menor secreção tubular.
2. Secundária:
x Aumento do catabolismo (cirurgia, infecção, jejum prolongado, etc.)
x Redução da excreção (insuficiência renal, drogas como álcool e diuréticos)
x Ingestão excessiva de proteínas (carnes e leguminosas)

Quadro Clínico
1. Manifestações articulares
x Crises de monoartrite aguda (eventualmente oligoartrite) com sinais flogísticos muito
acentuados e de rápida instalação (pico em menos de 24 horas)
x Duração da crise: 3 a 7 dias
x Periodicidade das crises: em média a cada 2 a 3 meses
x Gota tofácea crônica: após inúmeras crises, geralmente com mais de 5 anos de
evolução
x Topografia:
x Periférica - pés: - qualquer articulação
- 1ª metatarsofalangeana (podagra) – 50 % na primeira crise e
90 % no decorrer da doença
- Tornozelos, joelhos, cotovelos e mãos
x Axial – muito rara
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2. Manifestações extra articulares


x Tofos: acúmulo de ácido úrico, geralmente subcutâneo e periarticular.
x Rim - urolitíase - 30 % dos pacientes
- Nefropatia úrica – pode levar à insuficiência renal crônica.
x Cardiovascular - O ácido úrico pode ser um fator de risco. Ainda sob investigação.

Exames complementares
x RX – Erosões em saca-bocado
- Densidade óssea peri-lesional aumentada
- Cistos ósseos
x Tomografia e Ressonância – mais informações sobre cartilagem e partes moles
x Ultrasonografia dos rins: litíase
x Laboratório – Ácido úrico > 7 mg/dl
- Excreção baixa de ácido úrico (normal entre 300 e 800 mg / 24 h)
- Clearence baixo de ácido úrico (normal > 6 ml/min)
- Provas de fase aguda elevadas na crise
- Líquido sinovial: predomínio de polimorfonucleares
pesquisa de cristais de ácido úrico positiva

Diagnóstico
x Manifestações clínicas (crises de mono/oligoartrite)
x Hiperuricemia
x RX característico (ou ressonância / tomografia)
x Pesquisa de cristais positiva no líquido sinovial ou tofo (confirmatório)

Tratamento
1. Não medicamentoso:
x Orientações gerais
x Dieta: abolir bebidas alcoólicas, reduzir ingestão de carnes e leguminosas
x Fisioterapia
2. Medicamentoso:
Na crise:
x Antiinflamatórios não hormonais (1ª opção)
x Corticóide (2ª opção)
x Colchicina (3ª opção)
Preventivo:
x Uricosúricos (bezbromarona, probenecide e sulfinpirazone)
x Inibidores de síntese (alopurinol e febuxostate)

Hiperuricemia assintomática:
x Do ponto de vista do risco de gota e urolitíase deve ser acompanhada sem
tratamento.
x Do ponto de vista cardiovascular, ainda é objeto de discussão se a hiperuricemia
seria um fator de risco, obrigando nesse caso a um tratamento preventivo.
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G
OTA QUESTÕES

1. Mulher com 62 anos, refere dor na primeira articulação metatarso-falangeana, diária,


relacionada à deambulação, e com melhora total ao repouso. O diagnóstico mais
provável é:
a. Artrite reumatóide
b. Osteoartrite num hálux valgo
c. Gota crônica
d. Lúpus
e. Fibromialgia

2. Homem de 58 anos, refere crises de monoartrite nos tornozelos e hálux há 3 anos,


recorrentes, com duração de 5 dias cada crise. Quais dos exames abaixo estariam
mais indicados para fins diagnósticos:
a. hemograma e ácido úrico
b. Hemossedimentação e ácido úrico
c. Proteína C reativa e ácido úrico
d. RX dos pés e ácido úrico
e. RX dos pés e Hemograma

3. No caso acima, quais dados seriam importantes para complementar a investigação


clínica?
a. Pesquisa de dislipidemia e diabetes
b. Pesquisa de urolitíase e hipertensão
c. Interrogatório sobre etilismo e história de infarto do miocárdio
d. Exame à procura de tofos e deformidades articulares
e. Todas as anteriores

4. Homem com 62 anos e ácido úrico de 8,5 mg/100ml (normal= 7mg/100ml). Apresenta
dor articular no joelho direito, crônica e com períodos de piora quando sobe escadas.
Não apresenta outras queixas ou comorbidades. A conduta mais indicada dentre as
abaixo, seria:
a. Iniciar terapêutica hipouricemiante
b. Hiperidratar para evitar a formação de cálculo urinário
c. Abolir ingestão de carnes
d. Não intervir
e. Indicar artroscopia

5. Em relação à gota, assinale a alternativa correta:


a. A urolitíase na gota decorre mais frequentemente de baixo pH urinário
b. É comum a presença de tofos já no primeiro ataque de gota
c. A dosagem do ácido úrico e da uricosúria de 24 h não ajuda no planejamento terapêutico
d. A presença de cristais de urato no líquido sinovial não confirma o diagnóstico
e. A gota predomina nos homens abaixo dos 45 anos

Respostas Gota: 1 - b; 2 – d; 3- e; 4 – d; 5 – a

BIBLIOGRAFIA RECOMENDADA

1. Fuller, R ; Hasegawa, E M . Gota. In: Julio Cesar Moriguti; Alberto de Macedo Soares. (Org.).
Atualizações Diagnósticas e Terapêuticas em Geriatria. 1ª ed. São Paulo: Editora Atheneu, 2007,
v. 1, p. 681-686.
2. Coimbra, IB e Sâmara, AM. Artropatias induzidas por cristais. In Lopes, AC. Tratado de Clínica
médica v1. São Paulo. Ed Roca. 2006. pp 1713-1720.

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