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I SOBRE O SENTIDO E A REFERENCIA Publicado pela primeira vez sob o titulo “Uber Sinn und Bedeutung” em Zeitschrift fiir Philosophie und pbilosophishe Kritik, NF, 100 (1892) pp. 25-50. E republicado em Funktion, Begriff, Bedeutung: Fiinf logische Stu- dien, organizado pot G. Patzig (Géttingen: Vandenhoek & Ruprecht, 1962) pp. 40-65, A igualdade desafia a reflexdo dando origem a questdes que nfo sfo muito féceis de responder. E ela uma relagéo? Uma relacdio entre objetos ou entre nomes ou sinais de objetos? Em minha Begriffsscbrift 2 assumi a Ultima alternativa. As razGes que parecem apoiar esta concepcao sao as seguintes: a= aea= b so, evidentemente, sentengas de valor cognitivo diferentes; a = @ sustenta-se a priori e, segundo Kant, deve ser denominada de analitica, enquanto que sentengas da forma a = 6 contém, fre- qiientemente, extensdes muito valiosas de nosso conhecimento, e nem sempte podem ser estabelecidas a priori. A descoberta de que o sol nascente no é novo cada manha, mas é sempre o mesmo, foi uma das descobertas astronémicas mais ricas em con- seqiiéncias. Mesmo atualmente, o reconhecimento de um pequeno planeta ou de um cometa nem sempre é evidente por si. Assim, se yuiséssemos considerar a igualdade como uma relacao entre aquilo a que os nomes “a” e “b” se referem, pareceria que a = b nao poderia diferir de a = a, desde que a = b seja verda- deita. Deste modo, expressarfamos a relagfo de uma coisa consigo mesma, relac@o.que toda coisa tem consigo mesma, mas que nunca se d4 entre duas coisas distintas. Por outro lado, parece que por a = quer-se dizer que os sinais ou os nomes “a” e “pr referem-se 4 mesma coisa, € neste caso, a discussio versaria sobre estes sinais; uma telago entteveles seria asserida. Mas esta re- lado se mantetia entre os nomes ou sinais, apenas na medida em que denominassem ou designassem alguma coisa. Ela seria mediada pela conexaéo de cada um dos dois sinais com a mesma coisa designada. Esta conexdo, porém, é arbitréria. Ninguém pode ser impedido de empregar qualquer evento ou objeto arbitra- 1.. Uso esta palavra no sentido de identidade e entendo “a = b” no sentido de “a € 0 mesmo que b” ou “a e b coincidem”. 2. Begriffsschrift, eine der arithmetischen nachgebildete Formels- prache des reinen Denkens, Halle, 1879, § 8. (N. do T.) ‘61 tiamente produzidos como um sinal para quaiquer coisa. Com isto, a sentenca ¢ = b nfo mais se referiria a uma coisa, mas apenas 4 maneira pela qual a designamos; nao expressarfamos por seu intermédio, propriamente, nenhum conheciménto. Mas é . _justamente isto o que queremos em muitos casos. Se o sinal “a gh a apenas enquanto objeto (aqui, por sua configuracio), nao en- quanto sinal — isto é, nao pela maneira como designa alguma coisa — entio o valor cognitivo de a = a tornar-se-ia essencial- mente igual ao de a = b, desde que a = b seja verdadeira. Uma diferenca s6 poderd aparecer se 4 diferenca entre os sinais cortes- ponde uma diferenga no modo de apresentagio daquilo que é designado. Sejam a, b, c as linhas que ligam os vértices de um triangulo com os pontos médios dos lados opostos. O ponto de intersecao de a e b &, pois, o mesmo que o ponto de intetsecio de bec. Temos, assim, diferentes designagdes para o mesmo ponto, € estes nomes (“‘ponto de intetsegao de a e b” e “ponto de inter- seco de b e c’) indicam, simultaneamente, 0 modo de apresen- tagaéo e, em conseqtiéncia, a sentengca contém um conhecimento real, E, pois, plausivel pensar que exista, unido a um sinal (nome, combinagao de palavras, letra), além daquilo por ele designado, que pode ser chamado de sua referéncia, ainda o que eu gostaria de chamar de o sentido do sinal, onde est4 contido 0 modo de.. apresentacao do objeto, Conseqiientemente, segundé nosso exem- plo, a referéncia das expressdes “o ponto de intersecio de ae 5” e “o ponto de intersecao de 5 e c” seria a mesma, mas nao os seus sentidos. A teferéncia de “Estrela da Tarde” e “Estrela da Manha” seria a mesma, mas nao o sentido. Neste contexto fica claro que, por “sinal” e por “nome”, entendi qualquer designagio que represente um nome préprio, | cuja referéncia seja um objeto determinado (esta palavra tomada na acepcéo mais ampla), mas nao um conceito ou uma relagZo, que sero discutidos em outro artigo!. A designacéo de um objeto singular pode também consistir em varias palavras ou outros sinais. Pata sermos breves, chamaremos cada uma destas designagdes de nome prdprio. 1, fr. “Sobre 0 conceito e 0 objeto”, nesta edicdo, p. 87 (N. do T.). 62

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