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VALORES. A teoria de valores ou axiolo- apêndice doente deva ser removido é uma boa
gia é uma teoria geral baseada na pressuposi proposição. Mas pergunta-se se é possível
ção de que o valor estético, moral, político e existir uma proposição sem uma mente, ou um
(consistentemente) físico são todos espécies apêndice sem um corpo.
do mesmo género. Meinong foi seguido por Scheler e Husserl.
Uma distinção deverá ser feita. Os critéri Na axiologia norte-americana, foi popularizada
os para se julgar uma obra de arte, os critérios por Ralph Barton Perry, John Dewey (embora
de doença e saúde, e os critérios de ação moral não fosse realista), S. C. Pepper, e outros. C. S.
não são, plausivelmente, espécies de um mes Lewis usa o termo valor num sentido mais res
mo género. Quão freqtientemente temos ouvi trito, próximo ao de Aristóteles ao colocar a
do os estetas reclamarem das normas morais axiologia sob a ética; mas a maioria dos pensa
na arte! Por outro lado, uma combinação de dores coloca a ética sob a axiologia. Em alguns
saúde, prosperidade, moral e arte poderão de casos, boa parte (ou não seria má parte?) de
finir a vida boa. Nesse sentido, o axioma de linguística pedante se mistura.
ética de Aristóteles é axiologia, pois sua idéia Parece que o neo-realismo implica uma te
de uma vida boa incluía a proporção correta de oria de valoração que é tanto cognitiva quanto
cada uma dessas coisas. Isso, porém, não é empírica. O idealismo absoluto e o calvinismo
axiologia no sentido moderno de tornar cada são, ambos, cognitivos, mas não empíricos. As
valor um a espécie de género cxclusi vo. teorias emotivas de A. J. Ayer, Charles L. Stc-
Como movimento moderno distinto, a axi venson, et al, são empíricas, mas não cogniti
ologia veio a ser notada na escola neo-realista vas. Essas últimas tornam os valores arbitrári
de Bretano e Meinong. Os valores, como ca os e irracionais, removendo-os da esfera de dis
deiras e mesas, existem independentemente da cussão. Ayer e Sartre são bons exemplos disso.
consciência. Existe o verde numa cadeira; exis A grande dificuldade com a visão cognitiva
te o bem numa proposição. Quer existam men empírica é seu empirismo. Operações para ex-
te e corpo quer não, a proposição de que um tração do apêndice, mentiras e guerras são tão
VERACIDADE 594
naturais quanto plantas e planetas. Nenhum C3 Brand Blanshard, Reaxon and Goodness, Londres:
deles vem com um rótulo que diz: “Eu tenho 1961; John Dewey, Theory o f Valuation, Chicago:
valor”. Um exemplo é o do terrorismo político. University of Chicago, 1939; R. B. Perry, Realmx o f
A guerra é denunciada como imoral e má, mas Value, Cambridge, MA, 1954, Westport, CN, Gre-
aqueles que a denunciam por meio de protes enwood, 1968.
tos violentos, destruição de propriedade, as GORDON H. CLARK
sassinato e traição, julgam que seus métodos
sejam bons. Outro exemplo é o da luta pela V ER A C ID A D E . Ver tam bém Mentira;
terra; os “sem-terra” denunciam a violência da Verdade. O cristão vive sob um imperativo:
posse de terra improdutivas ou nas mãos de dizer a verdade ou não dar falso testemunho
poucos donos em detrimento do trabalhador (Êx 20.16; Dt 19.18). Esse mandamento não é
rural, mas aprovam a tomada violenta da terra. um a questão arbitrária ou trivial. O próprio
(Dados atualizados por W.M.G) universo foi formado por um Deus cuja ativi-
Na música, ocorre a mesma dificuldade. dade criativa é exercida por meio da fala (Gn 1:
Algumas pessoas valorizam Bach, Beethoven “disse Deus”) e que deseja a verdade (SI 51.6).
e Brahms, enquanto outras preferem metal de A própria revelação, em palavras e em atos,
estilhaçar os ouvidos. é “a Palavra” e “a verdade” (Jo 1). O pecado
O empirismo é incapaz de estabelecer nor entrou no mundo nas vestes da mentira (Gn 3).
mas. Perry pode, até mesmo, dizer que: “Um No último exemplo, o significado da verdade é
objeto, qualquer que seja, adquire valor quando esclarecido, exatamente, ao se considerar o que
qualquer interesse, seja qual for, é demonstrado estaria errado com a mentira, pois a mentira
por ele”. Mas isso poderia tornar a cocaína tão coloca a pessoa acima da verdade e dos outros,
valorosa, ou mais, quanto chocolate ou sorvete, e acima de Deus. É um ato de amor-próprio
quando, na verdade, toma-a, apenas, mais vali desordenado e, por essa razão, a mentira é uma
osa para alguns. Para evitar tal embaraço, Perry constante tentação e se encontra na lista dos
procura demonstrar como um valor é melhor do pecados mais hediondos (Ap 21.8). Em con
que outro. O valor melhor é aquele que harmo traste, o cristão deveria sempre falar a verdade.
niza muitos interesses. Mas, embora essa defi A veracidade envolve uma avaliação tanto
nição complique a observação, não ajuda o em das palavras faladas quanto da pessoa que fala.
pirismo. Poderia haver diversas harmonias, cada Se houver um “engano sincero” de nossa parte,
um a tendo dez diferentes valores. Como então não somos moralmente considerados mentiro
escolher um acima de outro? Uma combinação sos, portanto, é claro que dizer a verdade não é
harmoniosa poderia integrar cinco valores, en apenas uma questão de infalibilidade de pala
quanto outra incluiria vinte. Mas não será pos vras. E um a questão que envolve tanto o agen
sível que uma vida de cinco valores seja melhor te quanto as suas palavras.
do que uma de vinte? O exemplo do vício de A própria verdade, uma congruência entre
drogas mostra o impedimento de uma teoria de palavra e realidade, se posta contra os extremos
defesa de um valor mais alto que englobe tudo. da comunicação incompleta e da palavra impen
Assim, a observação não pode decidir entre as sada que “simplesmente, jorrou”. A meia-verda-
combinações; o empirismo não justifica nenhum de não é verdade nenhuma. Além disso, como as
deveria ser. palavras têm significados diferentes em contex
Diversos empiristas têm tentado defender tos diferentes, uma noção mecânica da verdade,
sua teoria contra essa acusação. Mas não pode uma abstração e a franqueza total são também
rá haver valor em seus argumentos porque sem distorções da verdade. Essa última, embora re
pre e em todo lugar será considerado como sen conhecida com menos frequência, poderá ser
do uma falácia a inserção, na conclusão, de um agressivamente injuriosa e uma violação da res
conceito que não apareça na premissa. A decla ponsabilidade cristã de “falar a verdade em amor”
ração observacional X valoriza o rock, não im (Ef 4.15). Sendo assim, a verdade precisa se tor
plica que X deva valorizar o rock, que Y e Z nar uma palavra viva. Aqui chegamos a uma im
devam valorizar o rock ou que Bach e Brahms portante perspectiva cristã, que é a relação entre
sejam desvalorizados. Se o exemplo de rock não o que fala e o ouvinte diante de Deus, exatamen
convence, tente o exemplo da heroína. te o que é violado pelo falso testemunho, tem
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de, necessariamnte, ser incluída numa descrição A ênfase sustentada pelas Escrituras con
de veracidade. A fala responsável é a extensão da dena a falsidade e recomenda dizer a verdade.
verdade àqueles que têm o direito de conhecê-la. Deus é aquele que jam ais mente (Tt 1.2). Ele
Essa perspectiva relacional capacita o cris não pode negar a si mesmo (lT m 2.13). Somos
tão a contribuir de modo positivo para a solu ordenados a não dar falso testem unho (Êx
ção da “questão da verdade” em sua fronteira 20.16) e a não mentir uns aos outros (Cl 3.9),
atual. Questões complexas de sociedade - como “Portanto, deixando a falsidade, fale cada um a
a verdade nos anúncios e nos empréstimos, verdade com seu próximo” (Ef 4.15). O engano
comunicação privilegiada, segredos governa e a mentira são características da impiedade. O
mentais e o direito do paciente de um médico tentador, no jardim , impugnou a verdade de
saber o que tem - todas são questões da rela Deus e enganou nossos prim eiros pais. Os
ção entre verdade, falante e ouvinte. Assim homens perdidos trocaram a verdade de Deus
considerados, são questões para uma séria ex pela mentira (Rm 1,25).
tensão do âmbito de aplicação da veracidade. Será que é sempre necessário falar toda a
RICHARD DAVIS verdade? “Falar a verdade em amor” (Ef 4.15)
implicaria esconder a parte negativa da verda
V ER D A D E. Quando Pilatos perguntou a de? Deus autorizou Samuel a esconder de Saul
Jesus “O que é a verdade?” (Jo 18.38), ele tinha o principal propósito de sua visita a Jessé (1 Sm
em mente o significado abstrato, intelectualista, 16.2). Não havia falta de verdade implicada
que o termo verdade tinha para a mente grega. A nessa ordem. Uma verdade parcial não será,
verdade era algo para se pensar ou crer. Esse necessariamente, uma mentira. Esconder toda
significado tem influenciado profundamente a a verdade poderá ser a ação correta exigida em
terminologia ocidental. A verdade refere ao real determinadas situações.
estado das coisas, em contraste com um rumor CLARK H. PINNOCK
ou um falso relato. Uma frase é verdadeira se
sua afirmativa concorda com as leis do intelecto J. Douma escreveu (Os Dez Mandamentos,
ou se corresponde ao que é, realmente, fatual. Nono Mandamento, S. Paulo, Os Puritanos,
O uso bíblico não pára por aqui. O termo 2003) sobre a classificação da mentira em três
do AT para verdade ( ‘emeth ) sugere noções de tipos: a mentira maliciosa, a mentira jocosa e a
firmeza, estabilidade, confiabilidade, fidelida mentira por necessidade. Quanto à mentira ma
de. O Senhor é chamado Deus da verdade por liciosa, a questão é clara - ela deverá ser, sempre,
que é o único em quem seu povo pode confiar condenada como violação do nono mandamen
com segurança. Por essa razão, muitas vezes, a to. A mentira jocosa já é uma questão mais com
tradução de ‘emeth aparece como fidelidade (por plexa. Nós nos divertimos com a ficção, com
exemplo, Dt 32.4; SI 146.6). anedotas, com a atuação teatral, etc., e essas
A verdade não é apenas aquilo que se pen coisas, em si mesmas, não configuram pecado.
sa, mas também algo que se faz. Deus opera Contudo, esses veículos legítimos poderão con
para sempre a verdade (SI 146.6). A verdade é duzir tanto à verdade quanto à mentira. Em
um a qualidade da natureza de Deus. Ele é a Provérbios 26.18-19, aquele que engana seu pró
única realidade constante num mundo sempre ximo com malícia e prejuízo, e diz: “ Fiz isso
em movimento. Sua palavra ao homem é, igual por brincadeira” é comparado a um louco lan
mente, confiável e certa (SI 43.3; 119.43). Es çando flechas de morte. Quanto à mentira por
pera-se do povo de Deus que seus homens se necessidade, a questão é ainda mais difícil. Esse
jam “homens da verdade” (Êx 18.21; SI 1; Os tipo envolve a mentira em beneficio do próxi
4.1). O significado dominante de fidelidade con mo. A Bíblia oferece alguns exemplos. As par
tinua no NT. Significa algo a ser feito (Jo 3.21). teiras Sifrá e Pua, quando interrogadas acerca da
Fidelidade e verdade estão em oposição a peca desobediência à ordem do faraó de matar os
do e falsidade (Rm 3.3-7). A verdade é algo que meninos judeus mentiram, dizendo que quan
liberta os homens (Jo 8.32). Por verdade, João do elas chegaram os bebês já haviam nascido e
se refere à divina revelação redentora em Jesus, teriam sido escondidos (Êx 1.15-21); no entan-
e liberdade significa não liberdade de pensa do, elas foram abençoadas pela sua ação (Êx
mento, mas liberdade da escravidão do pecado. 1.17,20). Raabe mentiu para proteger os espias
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de Israel, e foi justificada de sua mentira e louva Na literatura teológica e ética, o termo “ví
da pela sua ação (Js 2.4-6; Hb 11.31; Tg 2.25). A cio” geralmente denota qualquer princípio, prá
mulher, em Baurim, que escondeu os aliados de tica ou hábito que produza caráter e vida im pi
Davi num poço em sua casa, respondendo à per edosa. Durante a Idade Média, os teólogos ex
gunta dos servos de Absalão sobre o paradeiro puseram sete “vícios” - muitas vezes denom i
desses homens, apontou para a direção errada, nados “pecados capitais” ou “mortais” -c o m o
dizendo “Já passaram o vau das águas” (2Sm as categorias sob as quais todas as formas dc
17.19-20). É preciso, porém, distinguir esse tipo pecado poderiam ser classificadas. Todo peca
de mentira daquela que visa apenas à autoprote- do definido poderia ser relacionado a um ou
ção. Tanto Abraão quanto lsaque, quando esta mais desses vícios mortais: orgulho, avareza,
vam no Egito, mentiram a respeito de suas espo lascívia, inveja, glutonaria, ira e preguiça. A las
sas, dizendo que seriam suas irmãs (Gn 12.11- cívia e a glutonaria são males da carne; o orgu
20; 20.2-18; 26.7-11). Tanto a “meia-verdade” lho, a avareza, a inveja e a ira são males do espí
de um quanto mentira deslavada do outro quase rito; a preguiça pode ser tomada como sendo
que levaram suas esposas e outros mais a come lerdeza de corpo ou de espírito, ou de ambos.
terem pecado. É preciso distinguir entre as ações Na maioria dos segmentos da sociedade
diversionárias, como as de batalha, as quais o atual, os vícios são abundantes em suas formas
próprio Senhor recomendou a Josué (Js 8.1 -26; glamurizadas. A imoralidade antiga do paganis
2 Sm 5.22-25), e o engano da língua descrito em mo, mais uma vez, floresce e está na moda, e,
Tiago 3. (Dados atualizados porW .M .G) até mesmo, endossada por alguns profissio
nais das disciplinas sociais e psicológicas, das
V ÍC IO . Ver também Alcoolismo; Crime; ciências naturais, da filosofia e da religião. Um
Drogas; Jogos de Azar. Uma definição restrita novo hedonismo, frequentemente, expresso na
de vício é “um hábito, ou prática, imoral ou filosofia da mídia contemprânea, tem alcança
mau; conduta imoral; comportamento depra do ampla aceitação. As avenidas de expressão
vado e degradante; imoralidade sexual, especi de práticas viciosas se multiplicam com a tec
almente a prostituição” (Dicionário Random nologia. Há uma crescente lista de vícios pes
House). O vício é o antónimo da virtude, como soais e sociais que ameaçam a sociedade mo
as trevas são contrárias à luz, e o erro é contrá derna: sexo ilícito, aborto (q.v.) e divórcio (q.v.)
rio ao que é direito e certo. por qualquer motivo, alcoolismo (q.v.), abuso
Conquanto o termo “vício” não seja usado de drogas (q.v.), pornografia (q.v.), furto (q.v.),
na Bíblia, alguns sinónimos são empregados mentira, engano, jogos de azar (q.v.), fumo,
(porexem plo, Rm 13.13; E f 4.19; ICo 5.8). O maledicência, desperdício de tempo de lazer,
vício dom inava o mundo romano nos tempos poluição ambiental desnecessária (q.v.), depen
do NT. O sexo pré-marital e extramarital (q.v.), dência desnecessária de outros e diverti mentos
e o incesto (q.v.) eram praticados desavergo desmoralizantes.
nhadamente. Desde o palácio do imperador até Muitas pessoas abalizadas crêem que se
os casebres mais humildes, a sociedade era in esses vícios morais continuarem a receber pro
festada de homossexualismo (q.v.) (William eminência contínua, tolerância e justificativas,
Barclay, FleshandSpirít, Nashville, Abingdon, especialmente da parte das ciências sociais, eles
1962, p. 26). Os cristãos primitivos enfrenta acabarão levando nossa sociedade à morte.
vam uma cultura onde a prostituição era sanci Em Efésios 2.8-10, o Cristianismo evangé
onada e ligada a ritos em templos pagãos. Não lico encontra a antítese do problema de vícios
é de se surpreender que o apóstolo Paulo inici da humanidade (Rm 1.29-32). As “boas obras”
asse sua lista com “as obras da carne” como os tornam-se norma na vida diária para aqueles
pecados sexuais de seu tempo (G1 5.19). “Foi que foram redimidos pela graça de Deus.
dito que a castidade era a única virtude com DELBERT R. ROSE
pletamente nova introduzida ao mundo pagão
pelo Cristianismo” (ibid., p.27). Paulo colo VIDA COM UN ITÁRIA . Ver também Co
cou a ética cristã, clara e solidamente, contra abitação; Koinonia. A propriedade com um e
todas as formas de imoralidade sexual (IC o a igualdade de consumo constituem a essência
5.1; 6.13-20; lTs 4.3-8). da vida comunitária. As comunas (às vezes