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FUNDAMENTOS DA CLÍNICA
PROFª.: NATALY MARIZ
R: Por muito tempo a clínica foi entendida como um espaço físico, privado,
fechado e pago. Mesmo que com uma maior sutileza, essa concepção permanece até hoje,
mas com o passar do tempo a ideia de clínica sofre diversas alterações. Ela não diz
respeito tanto ao estabelecimento, ao lugar onde se atende, mas sim àquilo que se passa
dentro desse espaço, onde se estabelece um tipo de relação entre duas ou mais pessoas,
com uma condução teórica e um lugar de ética de trabalho. Não é o consultório de um
analista que vai disparar um processo terapêutico, a clínica se fundamenta no encontro
terapêutico entre duas pessoas.
A ideia de setting terapêutico vem de uma psicanálise inglesa que trazia uma ideia
muito enrijecida a respeito de como trabalhar, mas a clínica não está ligada a uma fixidez.
O setting é um dispositivo, algo que se cria e que opera caminhos, não diz respeito apenas
ao lugar sobre o ponto de vista geográfico, mas principalmente a um lugar de encontro -
é algo que se estabelece no campo de relações entre o terapeuta e seus pacientes - é a
própria situação analítica, composta de processos e variáveis.
A psicologia é, segundo o autor Luiz Alfredo Garcia-Roza, “um espaço de
dispersão”, e diante disso, segundo Figueiredo (1992), os alunos de psicologia podem se
encontrar esperançosos de que “várias disciplinas irão se organizar harmonicamente,
convergindo para uma meta comum, segundo uma concepção compartilhada por todos os
professores do que seja pensar e fazer psicologia” (FIGUEIREDO, 1992, p. 17), mas a
psicologia é pluralidade, e assim como seu objeto de estudo está sempre em constante
mudança.
A psicologia é formada por diversas teorias, e muitas dessas surgem como uma
resposta contrária a uma teoria vigente, mas mesmo com essa pluralidade é necessário
que, independente da linha teórica, o psicólogo seja capaz de sustentar a alteridade e esteja
aberto à experiência. As psicologias não são neutras e imparciais, elas surgem de
determinado contexto histórico e dizem respeito à subjetividade de sujeitos inseridos num
tempo com os aspectos sociais, econômicos e culturais, dentro de um contexto social e
político - cada psicologia parte do seu pressuposto sobre o que é o homem, sendo
atravessada também por uma temporalidade.
De acordo com Figueiredo (1992) dois modos de defesa recorrentes à angústia
que essa pluralidade pode trazer são o dogmatismo e o ecletismo, onde no primeiro há
um fechamento em relação às críticas que as outras teorias tem a oferecer sobre aquela
escolhida, dessa forma não há como refletir sobre essa crítica e resolver o impasse a partir
da elaboração de conceitos inovadores - só é possível promover um movimento de
aplicação da teoria de forma forçosa a cada caso, sem dar muita atenção a qualquer
novidade que a experiência poderia trazer.
O caso do ecletismo serve para ilustrar a importância de haver um rigor técnico
no trabalho do psicólogo, uma vez que nessa situação ocorre o uso indiscriminado de
“todas as crenças, métodos, técnicas e instrumentos disponíveis de acordo com a sua
compreensão do que lhe parece necessário para enfrentar unificadamente os desafios da
prática” (FIGUEIREDO, 1992, p. 18). As teorias servem para embasar nossas
experiências, elas oferecem um método e uma técnica que baseiam a escuta - um amparo
teórico que permite que você construa sua prática. Sem o rigor de uma teoria, o eclético
não pode oferecer mais do que alguém o faria de acordo com o senso comum.
Entretanto, a teoria que serve de base para o fazer clínico não é a única coisa que
fundamenta a clínica: é também necessária a incorporação desse conhecimento teórico às
habilidades do profissional, isso é o que Figueiredo (1992) chama de conhecimento tácito.
Aquilo que diz respeito às maneiras criativas que o profissional tem parar lidar com o
caso a caso, aquilo do trabalho que não está prescrito nos livros, nem pode estar - o que
vale é a apropriação das teorias pelo clínico e o tensionamento destas com seu saber de
ofício (FIGUEIREDO, 2004, p. 127 apud BAIA, 2012, p. 7).
A clínica, além disso tudo, diz respeito a um espaço de cuidado e escuta
especializada:
Para Dutra (2004), o diferencial da escuta clínica está na qualidade da
escuta e acolhida que se oferece a alguém que apresente uma demanda psíquica,
um sofrimento, representando uma certa postura diante do outro, entendendo-
o como sujeito que pensa, sente, fala e constrói sentidos nas relações de
subjetividades. (BAIA, 2012, p. 9)
Essa escuta implica num contato com a alteridade que é muito intrínseco da clínica. De
acordo com Figueiredo (1992) experimentar é entrar em contato com a alteridade, e tal
contato implica numa forma de ser e exige uma ética - um compromisso social do
psicólogo que ultrapassa o consultório, ou seja:
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS