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eM etree ie teeter mete ore terete artic) ee ee Cre rer ese et eee ee ice Renter eer hatte tects siderados, cada um deles emblema uma igreja local com Peart te eee create tour) Pera Cee meee ne eer Trees sees eee ee tee ee re Ree eee ee mee ie Se eno tben rt Sea er tenet ee TE Taree T bea vterterta eet M Ee @e le (itcels BB e seen ite peter re Cue eee ten ee aica rect Peer Peet ee uree ec terete Onto Sree obrigacao de luzir como luz de um mundo que jaz no ma ligno. Se nao reluzirem como os astros no firmamento, 0 testemunho do Evangelho é impossive! PU er Ate Seer corp ter cert eee? eee ers acre nein tere acces cari) Fe tere eterna nee eae Caesars ont Te aes Ces ane Se Creer Cri Correa cs Bea ere a ee Ont eae erence Fee eon eey eters ate erste tm Seer eRe sata Santo nos diz nestes ultimos dias. ISBN 675-85: 263-10575 I) 18520" CERT A PEGA EVAL O PODER DE DEUS PRA SALVACAO os 9 ave en de 3 ee et a tee | A MENSAGEM FINAL DE CRISTO A IGREJA Claudionor de Andrade 3* Impressao Rio de Janeiro 2012 x A igrejas confessantes ¢ martires do Egito, da Nigéria, da Coreia do Norte, da China ¢ do Oriente Médio. Onde Esmirna estiver, af estejam nossos coragées € preces. ao me foi nada facil terminmar este livro. Tive de recorrer a ajuda de Deus, para que me guiasse no assunto € no esti- lo. Por isso, diariamente, orava: “A inspiracao de cada dia, da-me hoje”. E, diariamente, ao descerrar a cortina de minha tenda, 14 estava a minha porcao cotidiana. O mand do Senhor jamais me faltou na urdidura dessa obra. Entao, pegava aquele punhado de inspiragao, retornava & minha tenda. E, ainda tomado pelo sono, punha-me a urdir o texto. Mas como fiar ideias e palavras? E como tecer os pardgrafos que me iam saindo da langadeira? Eu muito sofri para estilizar tudo isso num todo harménico e agradavel. O meu tear nao é rico, nem tenho a habilidade dos tapeceiros persas. Por isso, vejo-me constrangido a trabalhar, pacientemente, cada motivo com os fios ¢ linhas que me estéo ao alcance. E, assim, vou entrelagando linhas e fios até que o tema se desenhe. Na feitura deste livro, contei com a inestimdvel ajuda de minha es- posa, Marta Doreto de Andrade. Ela, que também € escritora, leu-me pacientemente boa parte desta obra. Aqui, emendou uns fios. Ali, cor- tou outros. E, mais adiante, fez alguns alinhavos, a fim de que este livro tivesse algum mérito. Os Sur Castigais pe Ouro Agradeco, ainda, & professora Daniele Pereira Soares pela padroniza- cao editorial desta obra. Ela teve 0 cuidado de zelar pela integridade do texto até a sua editoracao final. Concluo este preficio com as palavras iniciais dos filhos de Coré no Salmo 45: “Ao Rei, consagrado o que compus”. Oro para que este livro venha a edificar a Igreja de Cristo em todos os lugares até a sua vinda. ‘A Deus, toda a gloria. Janeiro de 2012. Claudionor de Andrade Seniece Prefacio... 1. Uma Visita & Ilha de Patmos 2. Ffeso, a Igreja do Amor Esquecido 3. Esmirna, a Igreja Confessante e Martir 4. Pérgamo, a Igreja Casada com o Mundo 5. Tiatira, a Igreja Tolerante .... ©. Sardes, a Igreja Morta -......++++ 7. Filadélfia, a Igreja do Amor Perfeito 8. Laodiceia, a Igreja Morna. Bibliografi sol despontava gentil no horizonte, quando me pus a percor- rer a Ilha de Patmos. Observando-lhe a paisagem que emer- gia da ultima vigilia, conclui que pouca coisa deve ter muda- do desde que Roma ali encerrara 0 apéstolo Joao. Embora sonolento, nao me demorei a cruzar essa fatiazinha de terra inculta e erma que o Egeu, diplomatica e jeitosamente, apartara das costas da Turquia. As casas nao eram muitas e os edificios ainda podiam ser contados. Umas rodovias, sinuosas ¢ orvalhadas, riscavam o chao cinzento e melancélico da ilha. Em que recanto de Patmos os romanos mantiveram recluso o dis- c{pulo do amor? Isso pouco importa. A ilha toda é uma reclusao. Embora a vista aérea do terreno nao fosse nitida, notei que os seus contornos lembravam um dos navios que o cruel Diocleciano emper- rara no mar de Ulisses. La estava um barco sem partida e sem chegada. Um barco sem vela e sem leme. No céu, nenhuma estrela a orienté-lo. A ilha nao carece de muros, nem de grades para apenar seus prisio- neiros. Sua paisagem j4 é uma peniténcia. Mas Joao nao se queixa nem se intimida. Abandonado ai por desafiar os deuses do império, prosse- Os Sere Casticais DE OuRO gue a apregoar um valor mais alto do que César. Um valor infinito ¢ so- berano que, revelando-se no Oriente, desabria-se agora no Ocidente. 4 A geografia da peniténcia A Patmos que vejo acha-se atualmente sob o controle da Grécia € dista 55 quilémetros da Turquia. Sua prefeitura localiza-se num lugarejo deno- minado Hora. Acomodada no arquipélago do Dodecaneso, ocupa uma frea de 34,6 km?, ¢ abriga uma populagio de cerca de trés mil habitantes. Patmos divide-se em duas partes quase iguais: uma no lado norte ¢ ou- tra na banda do sul, ligadas por um istmo acentuadamente estreito. De ve- getacio modesta, relevam-se nela montes nado muito altos. O mais elevado € 0 Profitis Ilias, com 269 metros. Em 1522, Patmos passou a ser controla- da pelos turcos otomanos até que, em 1912, 0s italianos apoderaram-se da ilha. Terminada a Segunda Guerra Mundial, ela foi entregue a Grécia. Uma ilha estranhamente bela Esforcei-me por divisar com mais clareza o relevo da ilha. Nao con- segui. O Google Maps deixou-se cobrir por umas nuvens escuras € tris tes, O que vi, porém, foi o bastante. Patmos continua desértica ¢ sem cor, Nao possui a beleza que, adormecida nos antigos poemas, ainda estonteia e seduz os argonautas. Apesar de sua plangéncia, trés conti- nentes avizinham-se aqui: a Europa, a Africa ¢ a Asia. Nas aguas que a cercam, muitas civilizacdes se esbateram até que vieram a desaparecer. Patmos nao é bela. Sua fealdade, entretanto, embeleza-se nas paginas do Apocalipse. Foi desse chao sem cores ¢ quase desnudo, que o Evange- lista viu a Cidade do Senhor. Dos céus, a Jerusalém Celeste descerd qual noiva que se orna ¢ plena de jtibilo vai ao encontro do amado. A importancia profética de Patmos Buscando conciliar o sono, transporto-me novamente a Patmos. Sob as asas da profecia de Joao, viajo no tempo para conhecer a eterni- dade. Vejo cair os impérios. Desde Babel até a Babildnia do Anticristo, 9s reinos deste mundo péem-se a ruir com grande estrondo, um apds outro, sob o impacto daquela pedra que Nabucodonosor vira dar nos pés da gigantesca e formidavel estatua. 12. Una Visita A ILHa DE Paros Acadia, Suméria e Egito jd nao sao impérios. Sao pé © cinza que os arquedlogos, com paciéncia ¢ cuidado, removern em suas escava- goes. Aqui, um tablete acddio descreve as proezas de Ninrode. Ali, os cacos de um vaso sumério cantam as loucuras de Ur-Nungal. Mais ao ocidente, j4 nas imediagées do Cairo, um académico, manejando as ferramentas da paleontologia, esforga-se por reconstruir 0 Egito que um dia Menés edificou. Mais a0 oriente, alguns arquedlogos cavam um terreno onde, por vol- ta do sexto século antes do advento de Nosso Senhor, florescera a soberba e orgulhosa Babilénia. Seus edificios, dantes véo exaltados, escondem-se agora nos escombros que os académicos buscam classificar. E na terra hoje ocupada pelo Iraque, as civilizagées empoeiram-se e acinzentam-se. Alias, quem poderia cismar que justamente aqui, entre os rios Tigre e Eufrates, ficava o Eden? Hoje, 0 paraiso aqui é impossivel. Voando em direg cada na légica de Aristéreles, deseducou-se incongruence e louca. Neste 0 ao Ocidente, contemplo a velha Grécia. Edu- canto, jazem as ruinas do Areépago, onde ainda ressoa o discurso com que Paulo desconstruiu os argumentos dos estoicos € epicureus. Na- quela colina, esté o que restou do Pantedn. Aqui, mostram-se os gregos politicamente corretos: adoram todos os deuses. Afinal, precisavam das gracas de todos eles. Uns j4 nao tém bracos. Outros perderam a cabe- ca. E todos, igualmente, acham-se desgastados pelo tempo. Somente o Deus Desconhecido sobrevive aos escombros. Os sftios arqueolégicos também sao abundantes nesses locais. Vejo, entre as escavacées ¢ os sulcos que retalham a heranga de Java, um gru- po de turistas americanos. O guia mostra-lhes 0 local onde, presumivel- mente, ficava a academia de Platao ¢ 0 liceu de Aristételes. Voltei o olhar para a Ilha de Patmos antes de fechar 0 iPad. La es- tava ela descolorida e feia. Mas foi justamente ai, em meio a formacées vulcanicas tao singulares, que os céus se abriram ao apdéstolo e ele teve visées de Deus. Num recanto tao desprovido de beleza, ele viu o Cristo glorificado em meio aos sete castigais de ouro. Os sete casticais de ouro Na linguagem do Apocalipse, os sete castigais de ouro representam a Igreja de Cristo. Em seu conjunto, simbolizam a Igreja Invisivel ¢ Universal. Individualmente considerados, cada um deles emblema uma 13 Os Serz Castigais DE OURO. igreja local com as suas virtudes € defeitos. Nem todos possuem a mes- ma resplandecéncia, mas todos sao igualmente valiosos. Se Filadélfia e Esmirna refulgem, Efeso ja nao brilha como antes. Sardes esta quase apagada. Tiatira e Pérgamo bruxuleiam. E Laodiceia esmaece em sua mornidao. Entre os casti¢ais, anda 0 Cordeiro de Deus. Ele conhece a luz de cada lampada. E nao ignora quanto azeite possue cada lampadério. Por serem 0 que sao, os candelabros tém obrigagao de luzir como luz de um mundo que jaz no maligno. Se nao reluzirem como os astros no firma- mento, 0 testemunho do Evangelho ¢ impossfvel. A cada uma dessas igrejas, Jesus enderecou uma carta. O seu obje- tivo é levar os santos a serem mais santos ainda. Foi a tiltima mensagem de Cristo ao seu rebanho. As igrejas atuais so bem semelhantes as da Asia Menor, Se os seus problemas séo os nossos, a solugéo que o Senhor apontou-lhes também nos pertence. Consideremos, pois, 0 que o Espirito Sanco nos diz nestes tiltimos dias. 14 Introducao Ja imaginou ouvir todos os domingos 0 maior tedlogo do Cristianis- mo? Ou as homilias do homem que se reclinou sobre o peito de Jesus? Na igreja de Efeso, isso era possivel. Estabelecida por Paulo e pastoreada por Joao, ela foi assistida ainda por dois outros excelentes obreiros: Timéteo ¢ Tiquico. Congregar em Efeso equivalia a um p6s-doutorado em teologia. A igreja capacitara-se, inclusive, a sabatinar os que a procuravam com credenciais apostélicas. Efeso era a igreja teolégica por exceléncia. No entanto, ela enfrentava um sério problema. Jé nao se lembrava do amor que, nos seus esponsais, prometera ¢ consagrara ao Cordeiro de Deus. Mas como isso lhe veio a acontecer? Nao a edificara o doutor dos gentios? E nao estivera em seu pastoreio o discipulo do amor? Entao, por que a perda da meméria espiritual? As admoestagées do Espirito Santo ja nao lhe vibravam as cordas da alma? A fim de reavivar-lhe as primeiras lembrangas, Jesus envia-lhe uma carta, ultimando-a a retornar ao primeiro amor. Nas entrelinhas, deixa- Qs Sere Castigars pe Quro Ihe o Senhor bem patente: na vida crista, sé 0 primeiro amor é admissi- vel. O segundo pode ser tudo, menos amor. . EFESO, A GUARDIA DA DEUSA DIANA Hé mais de dois mil anos, uma brilhante cidade de origem grega flo- rescia no territério da atual Turquia: a borbulhante e irriquieta Efeso. Seu duplo ancoradouro e as roras comerciais, que confluiam em seus termos, Jevaram-na a erguer-se como a principal metrépole da Asia Menor. Por isso, os romanos houveram por bem elegé-la como a capital proconsu- lar do império naquela regiao, pois a cidade dava-lhes amplo acesso aos mares Egeu e Mediterraneo. Efeso destacava-se também por sua econo- mia, cultura ¢ por ser a guardia do santudrio de Diana. Ela era afamada, igualmente, por suas escolas dedicadas as ciéncias ocultas ¢ 2 magia. No periodo apostélico, sua populagao girava em torno de quinhentos mil habitantes. Terra natal do filésofo Herdclito (540-470 a.C.), Efeso era rica em li- vros, Sua biblioteca tinha um acerve de doze mil rolos; um acervo valioso se levarmos em conta 0 prego dos livros naquela época. Ali também havia uma grande ¢ influente comunidade judaica que, apesar de sua oposigao ao Evangelho, ajudou a divulgar 0 monotefsmo hebreu através de suas sinagogas e de seu intenso proselitismo. © que mais destacava a cidade, porém, era a sua vocagao como guardia de Diana. ‘Tendo em vista a localizagao estratégica de Efeso, 0 apdstolo Paulo escolheu-a como base de sua obra missionaria. 1. A guardia de Diana. De acordo com a lenda, a cidade recebera, do Olimpo, a incumbéncia de custodiar o santudrio de Diana. Constru- ido no século VI a.C. pelo arquiteto crevense Quersifréo, o templo era sustentado por 127 colunas de marmore, com 20 metros de aleura cada uma. Dois séculos depois, 0 edificio seria destruide por um incéndio. ‘Alexandre IIT, da Macedénia, a fim de ganhar as gracas da cidade, pés-se a reergué-lo. Mas a sorte da casa de Diana ja estava selada, Em 262 a.C., ela foi arrasada € nao houve quem se animasse a ajuntar-lhe as pedras. De seu primitivo esplendor, restou apenas uma coluna que, emudecida, cho- raa desdita da grande deusa. Além de Diana, conhecida também como Artemis, outras deusas eram adoradas em Efeso: Epistemé, a rainha da ciéncia, e Sofia, a patrona da sabedoria. 16 Erx80, 4 IGRE{A DO AMOR ESQUECIDO Com a chegada de Paulo & cidade, boa parte dos efésios comega a perceber a nulidade de seu fdolo. Arrependidos ¢ envergonhados, voltam- se a0 Deus tinico e verdadeiro. 2. Os concilios de Efeso. O Primeiro Concilio de Efeso, realiza- do nas dependéncias da Igreja de Maria, foi convocado pelo imperador Teodésio II. Marcado por sérios confrontos e recriminacées, 0 concilio acabou por condenar 0 nestorianismo, 0 arianismo eo sabelianismo. O conclave é reconhecido como o Terceiro Concilio Ecuménico. Duzentos € cinquenta bispos fizeram-se presentes. Reunido em 449, o Segundo Concilio de Efeso nao teve carder ecu- ménico e terminou por reabilitar 2 Eutiques, promotor do monofisismo. Suas decisées seriam revogadas pelo Papa Leio Ie pelo Primeiro Concilio Ecuménico de Calcedénia. 3. A decadéncia de Efeso. No quarto século da era crista, os godos invadiram Efeso, queimaram-Ihe os monumentos ¢ dispersaram-lhe parte dos habitantes. As pedras de seus paldcios ¢ templos, transporta- das a Constantinopla, ajudaram a arrematar a Igreja de Santa Sofia. Em 1308, os turcos conquistaram-na e exilaram os que ainda Ihe choravam a sorte. Hoje, ela é conhecida como Efes. Através do Google Maps, é possivel ver 0 que lhe sobrou do coliscu ¢ dos paldcios outrora tao magnificos. Efeso recepcionou muitos visitantes ilustres. Alexandre, o Grande, € Cleépatra foram apenas alguns deles. Segundo a tradicéo, na cidade teria vivido Maria, mac de Jesus, na companhia do apdstolo Joao. I. PRIVILEGIOS HISTGRICOS E TEOLOGICOS DA IGREJA EM EFESO Paulo Ievou o Evangelho a Efeso durante a sua segunda viagem mis- siondria (Ac 18.19). Mas foi somente a partir da terceira que a igreja comegaria a frutificar na cidade de Diana. Nessa ocasiao, apéstolo en- contra um grupo de discipulos que, embora sinceros e fervorosos, conhe- ciam apenas os rudimentos da doutrina crista. Seu obscurantismo era tal que ignoravam até mesmo a existéncia do Espirito Santo. A narrativa de Lucas € bem esclarecedora por mostrar a diversidade das comunidades cristas na época apostélica: 17 Os Sere Casticars pe Ouro Aconteceu que, estando Apolo em Corinto, Paulo, tendo passado pelas regides mais altas, chegou a Fifeso e, achando ali alguns discipulos. pergun- tou-lhes: Recebestes, porventura, o Espirito Santo quando crestes? Ao que Ihe responderam: Pelo conerétio, nem mesmo ouvimos que existe o Espirito San to. Entio, Paulo perguntou: Em que, pois, fostes batizados? Responderam: No batismo de Joao. Disse-Ihes Paulo: Joao realizou batismo de arrependi mento, dizendo ao povo que cresse naquele que vinha depois dele, a saber, em Jesus. Eles, tendo ouvido isto, foram batizados em o nome do Senhor Jesus. E, impondo-thes Paulo as maos, veio sobre eles 0 Espirito Santo; ¢ tanto falavam em linguas como profetizavam. Eram, ao todo, uns doze homens. (At 19.4-7, ARA) 1, A chegada do Reino de Deus a Efeso resultou num grande avi- vamento. Houve batismos com o Espirito Santo, curas divinas ¢ muitas conversoes (At 19). Os santeiros da cidade logo perceberam estarem con- tados os dias de Di Senhores, sabeis que deste oficio vern 2 nossa prosperidade ¢ estais ven do ¢ ouvindo que nao sé em Efeso, mas em quase toda a Asia, este Paulo tem persuadido e desencaminhado muita gente, afirmando nao serem deuses 08 que sao feitos por mos humanas. Nao somente hd o perigo de a nossa Profissio cair em descrédito, como também o de o préprio templo da grande deusa, Diana, ser estimado em nada, ¢ ser mesmo destruida a majestade da- quela que toda a Asia eo mundo adoram. (At 19.25-27) ni Por isso, puseram-se a gritar: “Grande é a Diana dos efésios!” (At 19.28). Apesar de toda a oposi¢ao, a Igreja prosperou em Efeso como a agéncia por exceléncia do Reino de Deus. 2. Aigreja perfeita. Localmente, nao existe igreja perfeita. No encanto, quando lemos a Epistola de Paulo aos Efésios, somos levados a cret que houve uma excecgéo. Além de viver nas regides celestiais, a igreja em Efeso possuia um ministério completo (Ef 1.3; 4.8-11). Seu preparo biblico € teoldgico era tinico. Afinal, desfrutara o privilégio de ter como mestre, durante trés anos, 0 maior tedlogo do Cristianismo (At 20.31). Nesse periodo, Paulo expés-lhe todo 0 conselho de Deus (At 20.27). Pode haver um curso biblico mais completo? Ea carta que lhe enderecou o apéstolo? (Ef 1.1-5) Os efésios haviam se doutorado na Palavra de Deus. 3. O problema de Efeso. A igreja em Efeso, como embaixadora do Reino de Deus, levara o império das trevas A ruina. Todavia, apesar de sua vocacao eterna, deixou que o tempo the desgastasse o amor. Jé ab- sorta em seu ativismo, ia ela, paulatinamente, esquecendo os madrigais 18 EEESO, 4 [GR&jA DO AMOR BSQUECIDO que outrora consagrara a Cristo, Buscando reavivar-the o fervor inicial, envia Jesus uma carta enérgica ao seu pastor, a quem Jesus chama de anjo, ultimando-a a reaver sua primazia espiritual. III. PASTOR, O ANJO QUE E HOMEM Ao anjo da igreja em Efeso. (Ap 2.1, ARA) Os pastores sie chamados assim pelo Senhor, porque, semelhanca dos anjos, cém eles as seguintes tarefas junto a Igreja de Cristo: 1, Transmitir a Palavra de Deus. Como anjo do rebanho, o pastor tem como incumbéncia primaz: fazer a obra de um evangelista (2 Tm 4.5), anunciar todo 0 designio divino (At 20.27), falar o que convém a sa doucrina (Tt 2.1), pregar, redarguir, repreender ¢ exortar (2 Tm 4.2). 2, Custodiar 0 rebanho de Cristo. Assim como o Anjo do Senhor guardava a Israel no deserto, assim tem o pastor a obrigacéo de custodiar 0 rebanho de Cristo durante a sua peregrinacdo & Jerusalém Celeste (Nm 20.16; 1 Pe 5.2). Nossa responsabilidade é pessoal, urgente e intransferi- vel, conforme exorta Paulo aos anciaos de Efeso: Atendei por vés ¢ por todo 0 rebanho sobre © qual o Espitito Santo vos constituiu bispos, para pastoreardes a igreja de Deus, a qual ele compron com © seu préprio sangue, Eu sei que, depois da minha partida, entre vés penetra- rio lobos vorazes, que nao pouparao o rebanho. E que, dentre vés mesmos, se Icvantarao homens falando coisas pervertidas para arrastar os discipulos atras deles. (Ar 20.28.30, ARA) 3. Agir com sabedoria e discernimento. Se um anjo de Deus é elo- giado pelo saber, por que nao se destacar4 o obreiro pela prudéncia, discer- nimento e ciéncia das coisas divinas? Gabriel, por exemplo, era um exce- lente intérprete dos mistérios divinos e um visitador amével e eficiente (Dn 8.16; Le 1.19,26). Que o nosso falar demonstre sempre a sabedoria divina. Se esta nos falta, busquemo-la em Deus. Fo que nos aconselha Tiago: “Se, porém, algum de vés necessita de sabedoria, peca-a a Deus, que a todos dé liberalmente ¢ nada lhes impropera; e ser-lhe-4 concedida” (Tg 1.5, ARA). Nao agiu assim Salomao em Gibeom? (1 Rs 3.1-15) 4. Portar-se com dignidade e santa distingao. No Antigo Testa- mento, um homem de Deus era, as vezes, confundido com um anjo, e um anjo, nao raramente, era tido como homem de Deus (Jz 13.6). 19 Os Sere Castigais DE Ouro Tanto um quanto 0 outro sobressaiam por um porte digno ¢ nobre, Alias, nado havia titulo mais alto e mais insigne (2 Rs 4.9). Moisés, por exemplo, é reconhecido por varios ¢ elevados titulos: profeta, le- gislador, libertador dos hebreus. Contudo, o que mais o honrava era ser reconhecido como homem de Deus (Dt 33.1). Portanto, o pastor destacar-se-d sempre pela distingao. Ele trata a todos com respeito ¢ consideracao (1 Tm 5.1,2). No relacionamento com o sexo oposto, cuidadoso e ajuizado. Se lida com dinheiro, é orientado por uma ética alta ¢ louvavel. Ele no se irrita quando presta contas. Sabe liderar, porque aprendeu a ser liderado. E apesar de homem, vive ¢ sc conduz como anjo. 5. Ter 0 espirito de servo. Nos céus, as hostes angelicais alegremente cumprem a vontade divina, Nenhum anjo levanta-se contra urna ordem divina nem a toma por indigna. Para anunciar o nascimento de Jesus, prontifica-se Gabriel. E com a mesma presteza ¢ jibilo, apresenta-se 0 Anjo do Senhor, para barrar a jumenta de Balaao. Que os pastores, pois, imitemos aquele a quem todos os anjos ado- ram, Embora tenha a terra por escabelo, curvou-se como servo a lavar os pés aos discipulos, sendo de todos eles Rei ¢ Senhor. 6. Comportar-se com mansidao, coragem ¢ reveréncia. Miguel é 0 principal dos anjos (Dn 10.13). Todavia, ao disputar 0 corpo de Moisés com Satands, portou-se nobremente conforme revela Judas: Contudo, 0 arcanjo Miguel, quando contendia com 0 diabo e disputava a respeito do corpo de Moisés, nao se atreveu a proferir juizo infamatério contra ele; pelo contrario, disse: O Senhor te repreenda! Estes, porém, quanto a tudo 0 que no entendem, difamam; e, quanto a tudo 0 que compreendem por instinto natural, como brutos sem razéo, até nessas coisas se corrompem (Jd 1.9,10, ARA) O arcanjo soube como se conduzir naquele embate. Em vez de cobrir de afrontas 0 adversirio, repreendeu-o em nome do Senhor. Ele houve-se com autoridade e correcao, a fim de honrar o que 0 enviara Aqucla deli- cadissima missio Portanto, 20 repreender 0 Diabo, nao usemos de impropérios. Sigamos 0 conselho do Senhor: “Em meu nome, expelirao demd- nios” (Mc 16.17, ARA). Se langarmos afrontas ¢ injurias no demd- nio, estaremos fazendo o jogo do Adversdrio, que nunca dispensou uma presepada. 20 Exes0, a [ewja 00 Auor Bsquectoo LV. JESUS APRESENTA-SE A IGREJA EM EFESO Estas coisas die aquele que conserva na mdo direita as sete estrelas e que anda no meio dos sete candeeiros de ouro. (Ap 2.1, ARA} Ao pastor da igreja em Efeso, apresenta-se J conserva na mao direita as sete estrelas ¢ que anda no meio dos sete can- sus como “aquele que deeiros de ouro”. Contemplados conjuntamente, os candelabros repre- sentam a Igreja Invisivel ¢ Universal. Individualmente vistos, cada um deles simboliza uma igreja local. Mas quer coletiva, quer separadamen- te, todos pertencem ao Senhor que, desenvolto ¢ soberano, entre eles caminha. Jesus demonstra, assim, ser a cabeca da Igreja. Portanto, que ninguém se arrogue como dono de seu rebanho, mesmo que seja por Ele tratado de anjo. O anjo é da igreja, mas a igreja nao € do anjo. ‘Ao delimitar a eclesiologia do Novo ‘Testamento, escreve Paulo aos efésios: E ele mesmo concedeu uns para apéstolos, outros pata profetas, outros para evangelistas e outros para pastores e mestres, com vistas ao aperfeigoa- mento dos santos para o desempenho do seu servigo, para a edificagio do corpo de Cristo, até que todos cheguemos 4 unidade da f ¢ do pleno conhe- cimento do Filho de Deus, & perfeita varonilidade, 4 medida da escatura da plenitude de Cristo. (Ef 4.11-13, ARA) Os ministros, por conseguinte, s4o um dom que o Senhor Jesus con- cede A sua Igreja, visando ao crescimento dos fiis. Embora houvesse estabelecido muitas igrejas, 0 apéstolo sabia que nenhuma delas lhe pertencia. Alids, nem ele mesmo se pertencia. Hu- mildemente confessa aos corintios: “Portanto, ninguém se glorie nos ho- mens; porque tudo é vosso: seja Paulo, seja Apolo, seja Cefas, seja o mun- do, seja a vida, seja a morte, sejam as coisas presentes, sejam as futuras, tudo é vosso, e vés, de Cristo, e Cristo, de Deus” (1 Co 3.21-23, ARA). O mesmo se aplicava 4 congregacgéo do Senhor no Antigo Testamento. Davi pertencia a Israel, mas Israel néo pertencia a Davi; era heranga € possessio do Senhor (1 Sm 26.19}. Lembremo-nos, outrossim, da exortagao sempre consentanea de Pedro: Aos presbiteros que esto entre vés, admoesto eu, que sou também pres: birero com eles, ¢ testernunha das aflicées de Cristo, ¢ participante da gléria que s¢ hd de revelar: apascentai o rebanho de Deus que esté entre vés, tendo cuidado dele, nao por forga, mas voluntariamente; nem por torpe ganancia, 21 Os Serr Castigats Dz OURO mas de 4nimo pronto; nem como tendo dominio sobre a heranga de Deus, mas servindo de exemplo ao rebanho. E, quando aparecer o Sumo Pastor, alcancareis a incorruptivel coroa de gléria, (I Pe 5.1-4) Embora incensado como principe da Igreja, exorta Pedro aos presbi- teros que néo a considerem sua, nem sobre cla cxergam dominio. ‘A Igteja é de Cristo ¢ Cristo é da Igreja. A mesma relagio, porém, nao se aplica aos pastores, Somos apenas servos ¢ acompanhantes dessa lindissima jovem que, apesar desses dois mil anos percorridos, faz-se hoje mais bela do que a Sulamita dos Cantares. Assim como Eliezer limirou-se a conduzir Rebeca a Isaque, proporcionando-the conforto ¢ seguranga, assim devemos agir em relagao a Igreja. Ele tem citimes por ela ¢ tudo fara para que ela lhe chegue pura, imaculada ¢ sem rugas (T'g 4.5; Ef 5.27). ‘Ao descrever a intima comunhao entre o Senhor e a sua Igreja, escreveu Richard Sibbes: “Cristo é 0 Rei de sua Igreja, ¢ a Igreja ¢ a maior rainha do mundo”. ‘Além de caminhar entre os candeciros, o Senhor Jesus traz sete estre- las em sua destra: os obreiros que se afadigam no pastoreio de sua Igreja. Se os candelabros deve brilhar, as estrelas, por serem estrelas, tém a obrigacio de resplandecer “como o fulgor do firmamento” (Dn 12.3). Aparentemente, Efeso era a estrela mais brilhante da Asia Menor. Pelo menos, era 0 que indicava 0 curriculo de seu pastor. Vv. UM CURRICULO DE EXCELENCIA Conheco as twas obras, tanto 0 reu labor como a tua perseveranga, ¢ que ndo podes suportar homens maus, ¢ gue puseste a prova os que a si mesmos se declaram apéstolos ¢ ndo sha, ¢ 05 achaste mentirosos; e tens perseverdnga, & suportaste provas por causa do men nome, endo te deixaste esmorecer. (Ap 2.2.3, ARA) Se uma igreja pode ser medida pelo curriculo de seu pastor, FEfeso era incomparavel. Distinguido com a dificilima incumbéncia de suce- der a Jodo, num pulpito j4 ocupado por Paulo, saira-se admiravelmen- te bem. Suas qualidades eram téo tinicas, que o préprio Cristo veio a elogid-las. Enumerando-lhe as virtudes ¢ servigos, diz-lhe 0 Senho “Conheco as tuas obras” (Ap 2.2, ARA). O verbo grego eidé nao sig: nifica apenas conhecer; denota também as seguintes agées: discernir, examinar e inspecionar. 22 E90, 4 Leakey DO Axor FsQuecioo Somente Jesus pode desnudar-nos 0 cerne de cada obra. Ele nao se limita A periferia de nossos feitos. Discernindo-lhes a natureza, avalia-os pelo reto juizo. Aos olhos humanos, o pastor da igreja em Efeso era a pré- pria perfeicgao. Aos de Cristo, porém, aquela perfeicao, para ser completa, ainda necessitava de um pequeno, mas imprescindivel ajuste. Todavia, justo como é, nao deixa de reconhecer as realizagées e trabalhos daquele admiravel obreiro. 1. Um ministério marcado pelas boas obras. Se o pastor de Efeso vivesse em nossos dias, jé teria recebido alguns doutorados em divinda- de, em virtude de suas boas obras. Ele se dava em sacrificio ao préximo, porque entendia que o verdadeiro evangelho nao se restringe ao ptilpito. Mas, transcendendo 0 templo, vai em busca dos que anseiam pelo pao do céu ¢ desmaiam por nao cerem o pio da terra. Se o Cristianismo é impossivel sem fé, é invidvel sem as boas obr: 2, Labor extenuante e intenso. © labor do anjo de Efeso vinha ul- trapassando todos os limites da resisténcia humana (Ap 2.2). Se fizermos a exegese do vocdbulo grego kopos, vitemos a constatar: o seu esforco, havendo j4 transcendido as raias da extenuacao, encontrava-se, agora, nas fronteiras da autoimolacao. Se fosse preciso, daria ele a propria vida pelo Reino de Deus. Ele gastava-se ¢ deixava-se desgastar pela causa do Evangelho. Que o labor eclesidstico nao se transtorme em ativismo. Esforcemo- nos pelo Reino, mas nao nos desmemoriemos do Rei. Se colocarmos a obra de Deus acima do Deus da obra, acabaremos por destruir 0 nosso ministério. Que ligéo tiraremos daqui? Por mais que nos entreguemos a seara do Mestre, nao nos esquecamos do Mestre da seara. Nao estou sugerindo que descansemos as maos. Afinal, néo sabemos que semente prosperard. Se esta, ou se aquela. Ou se ambas, conjuntamente. Mas, ainda que o trabalho nos venha a extenuar todas as forgas, nao temos de perder a perspectiva do Reino de Deus. Que em nossa agenda, tenha 0 Senhor Jesus toda a primazia. Perseveranga, a virtude dos grandes herdis. Além de exaurir-se pela Igreja de Cristo, o pastor de Fifeso portava-se com a virtude que trans- forma simples mortais em celebrados herdis: a perseveranga (Ap 2.2). No grego, a palavra ressoa epicamente: bupomone. Somente os grandes varées do universo de Homero, como Heitor e Aquiles, detinham semelhante 23 Os Sere Castigais De Quro qualidade. Foi por isso que o poeta, mitologizando-lhes a humanidade, divinizou-os. Sabia o Senhor Jesus que o seu obreiro, embora homem, esforcava-se mais do que os guerreiros da Iliada. Estes haviam lutado contra a carne e 0 sangue; aquele enfrentava as potestades do inferno nos lugares celestiais. Nao foi por acaso que Paulo, em sua Epistola aos Efésios, recomenda-nos a armadura do Espirito: a tinica defesa eficiente contra o mal ¢ 0 tinico ataque eficaz contra o Maligno (Ef 6.14). 4. O combate aos maus. O pastor de Efeso nao recuava ante a adver- sidade. O proprio Cristo reconhece-lhe 0 espitito guerreiro: “Nao podes suportar homens maus” (Ap 2.2, ARA). Bom soldado que era, movia- Ihes uma guerra que ndo reconhecia tréguas nem armisticios. Sua espada jamais descansava na bainha. O substantivo grego usado por Jodo, para qualificar os adversarios da obra de Deus, ¢ bastante revelador. O termo Aakos descreve alguém irreparavelmente maligno, pernicioso e destruti- vo. Como nao podia tolerar gente com tais adjetivos, o pastor de Ffeso jamais repousava a espada. Invisivelmente, batia-se com © Diabo. Sociologicamente, lutava con- tra posturas € costumes que, apesar de licenciosos, eram prezados como heranga cultural. Legalmente, assestava as armas em diresao aos dectetos imperiais que, debochando das reivindicagées do Criador, impingiam a todos o culto & criatura. E, ceologicamente, via-se as voltas com os que, de modo sutil, rorciam os artigos todos da santissima fé. 5. Exceléncia teolégica. Cobigando as ovelhas do Senhor, os nego- ciantes das coisas sagradas imiscufam-sc entre os figis, E para comercializd- Jas no mercado da f%, que naquele cempo jé era considerdvel, arrogavam uma autoridade superior & do colégio apostdlico. Na Segunda Epistola aos Corintios, Paulo denuncia-os com redobrada energia: “Porque os tais sao falsos apéstolos, obreiros fraudulentos, transformando-se em apésto- los de Cristo. E nao ¢ de admirar, porque o préprio Satands se transforma em anjo de tuz” (2 Co 11.13,14, ARA). Os maus obreiros nao se limitaram a Corinto. Em Efeso, chegaram eles com o mesmo intuito: roubar, matar ¢ destruir. Mas assim como na primeira cidade foram batidos pelo doutor dos gentios, na segunda, viram suas asas cortadas por alguém que sabia manejar, com singular habilidade, a espada da sa doutrina, A exceléncia teolégica do anjo de 24 _ Esso, 4 IGRiA DO AMOR ESQUECIDO Efeso reconhecida pelo Senhor: “Puseste & prova os que a si mesmos se declaram apéstolos e nao sao, e os achaste mentirosos” (Ap 2.2, ARA). O pastor de Ffeso eta intimo das Escrituras. Interpretando-as com admirdvel corregao e equilibrio, era capaz de distinguir a verdade do erro. Assemelhavz se ao escriba que, dos tesouros divinos, sabia como extrair tanto os arcanos dos profetas como as revelagées dos apdstolos que, na- quele instante, consumavam-se com o Apocalipse de Jodo. O anjo de Efeso, renunciando o academicismo frio ¢ insensivel, avultava-se como um tedloge peregrino ¢ mui precioso. Ele nao se impressionou com os supostos apéstolos. Prudente e avi- sado que era, pé-los de imediato & prova, a fim de apurar-lhes a identi- s € © posicionamento dade, a postura, as referencias pessoais ¢ eclesidsti doutrindrio, Somente a ortodoxia nao basta; demanda-se também a orto- praxia. Uma nao pode caminhar sem a outra. Se agissemos assim, nao es- tariamos a acolher, no redil do Senhor, mercenarios e apostatas. Vejamos, pois, como aferir a autenticidade de um apéstolo. Ortodoxia doutrindria. Antes de mais nada, que o pretenso apéstolo professe a doutrina dos santos profetas e dos apéstolos do Senhor — as verdades do Antigo e do Novo Testamento (Ar 2.42). Nao agia assim Paulo, 0 doutor dos gentios? Em momento algum de seu ministério, bus- cou revelacées extravagantes ou ensinas exdticos. Embora chamado diretamente pelo Senhor, somente foi comissionado como apéstolo, apés a Tgreja, primeiro em Jerusalém, e depois em Ancio- quia, haver-Ihe comprovado a conversio, o testemunho ¢ o chamamento. Se em Antioquia, recebeu a imposicao de maos, em Jerusalém, os apéstolos do Cordeiro chancelaram-lhe o apostolado (At 13.1-3; 15.22-30). Paulo jamais prevaleceu-se do fato de o proprio Senhor o haver vo- cacionado, nem por ter sido ungido como apéstolo pelo Espitito Santo. Sua doutrina recebeu o explicito apoio do decano dos apdstolos: “Por essa razio, pois, amados, esperando estas coisas, cmpenhai-vos por serdes achados por ele em paz, sem macula ¢ irrepreensiveis, ¢ tende por salva-~ ¢4o a longanimidadc de nosso Senhor, como igualmente 0 nosso amado irmao Paulo vos escreveu, segundo a sabedoria que lhe foi dada, ao falar acerca destes assuntos, como, de fato, costuma fazer em todas as suas epistolas, nas quais hd certas coisas dificeis de entender, que os ignorantes © instiveis decurpam, como também deturpam as demais Escrituras, para a propria destruigao deles” (2 Pe 3.14-16). Se alguém nao traz a st dou- 25 Os Serr Casticats px Ouro trina, que seja andtema (GI 1.8). Ainda que realize milagres ¢ faga sinais e maravilhas, que jamais receba a destra de nossa comunhao. Comportamento exemplar, Como é a postura desses imaginados apéstolos? Respeitam as ovelhas? Ou andam, de redil em redil, espolian- do a boa fé dos irmaos? Eles nao se afastam dos apriscos. Torcem a dou- fabricam revelacoes ¢ inventam visagens. E como multiplicam 0 uina, seu patriménio pessoal. Nao satisfeitos, semeiam entre os fi¢is adultérios, Prostituigoes, mentiras e roubos. Um apéstolo de verdade nao age assim. Ele tem cuidado de si mesmo e da doutrina que prega. Sabendo quao deletérios eram esses marginais, o pastor de Efeso fazi: questao de lhes conferir pessoalmente a autenticidade apostélica. Ele nao se impressionava com titulos, nem se intimidava com a oratéria dos que, dizendo-se querubins, agiam como velhos diabos. O anjo da igreja em Efeso nao temia a ninguém; sua coragem levava-o a suportar durissimas provagées. 6. Suportando o insuportavel. Como suportar 0 insuportavel? ‘Talvez Odisseu tenha a resposta. Depois da guerra de Troia, 0 sdbio e prudente rei, cujos conselhos levaram os gregos a um imerecido triunfo, empreende o retorno a sua aprazivel [taca, Nessa ilhazinha do Mar Jéni- co, por ele suspirava a fiel ¢ bela Penélope. A sua viagem duraria dez anos como dez anos durou a guerra contra o bravo Heitor, Em seu rerorno, Odisseu. enfienta o mar, 0 canto enganoso das sereias, a estupidez do Ciclope ¢ as forcas do mundo subterraneo. Nem o préprio Netuno foi capaz de conter-lhe as velas. Ignorando todos esses percalgos, ele chega & sua casa € reencontra 0 cao, o filho e a esposa. Nas estrofes de Homero, Odisseu suportou o insuportavel. Mas, como a poesia é a arte do fingi- mento, segundo verseja Fernando Pessoa, nao sabemos até que ponto a tealidade se perde na mitologia Ao contrario de Odisseu, era o pastor de Efeso um simples mortal. Seus desafios, porém, iam além dos versos de Homero. Suas batalhas, sempre duras ¢ renhidas, nao se limitavam ao mar; rompiam as regides ce- Testes, onde guerreava concra o proprio Diabo. Na igreja, suas tribulacdes cresciam; fora da igreja, multiplicavam-se, © proprio Senbor reconhece- Ihe as anguistias: “... suportaste provas por causa do meu nome, e nao te deixaste esmozecer” (Ap 2.3, ARA). Pelo nome de Cristo, ele suportava 0 insuportavel. Se levarmos em conta o original grego, verificaremos que o 26 80, 4 [erty po Amor Esqurcipo __ ‘5 vocibulo kopiad descreve um trabalho gue sé 0s personagens de Homero sao capazes de executar. Mas 0 anjo de Efeso, transcendendo a fantasia do poeta, nado fugia aqueles desafios: enfrentava-os galharda ¢ bravamente. Sim, era um trabalho drduo e aflitivo. Tao aflitivo ¢ tao arduo que até lembrava a paixdo de nosso Senhor. O pastor de Efeso jamais se deixou vencer pelo esmorecimento, como reconhece o prdprio Senhor. No grego, a palavra esmorecer em um sentido bastante forte. Kamnd traz.a ideia de cansago ¢ doenga. Mas 0 obreiro de Cristo, apesar de suas limitagées, tira forcas da fraqueza e, das enfermida- des, nao deixa de suscitar satide e vigor. Na jornada para o céu, levanta-se e pée-se a caminhar, porque nao é aqui o seu descanso. Nisso reside o amor que, na comunhao crista, jamais perderd a beleza de sua primazia. VI. O PRIMEIRO AMOR PASSOU E FOL ESQUECIDO Tenho, poréim. contra ti que abandonaste 0 teu primeiro amor. (Ap 24, ARA) Apesar de seu privilegiado discernimento espiritual, o pastor de Efe- so deixou-se coisificar por um ativismo irracional. Ele se entregava ao Reino, mas nao se dava ao Rei. Ele jf nado amava a Cristo com o amor que supera a fé ¢ é mais forte que a esperanca. Por isso o Senhor censura-o gravemente. Mas por que esse amor, que Jesus chama de primeiro, é tio importante? I. O que € © primciro amor. A igreja em Efeso fizera-se notavel ndo somente por viver nas regides celestiais, mas também pelo amor que santificava ao Senhor Jesus. E 0 que depreendemos da epistola que Paulo Ihe enviou no ano 62: Por isso, também eu, tendo ouvide a fé que ha entre vés no Senhor Jesus © 9 amor para com todos os santos, nao cesso de dar gragas por vés, fazendo mengéo de yés nas minhas oragées, para que 0 Deus de nosso Senhor Jesus Cristo, 0 Pai da gléria, vos conceda espirito de sabedoria ¢ de revelagéo no pleno conhecimento dele, iluminados os olhos do vosso coragao, para saber- des qual € a espetanga do seu chamamento, qual a riqueza da gloria da sua heranga nos santos e qual a suprema grandeza do seu poder para com os que cremos, segundo a eficicia da forca do seu poder; o qual exerceu ele em Cristo, ressuscitando-o dentre os mortos ¢ fazcndo-o sentar 4 sua direita nos lugares celestiais, acima de todo principado, e potestade, e poder, e dominio, ¢ de todo nome que se possa referir nao s6 no presente século, mas tamhém no vindou (EF 1.15-21, ARA) Qs Sere Casrigats pz Ouro Em pelo menos onze ocasides, Paulo menciona a palavra amor ao escrever aos efésios. Abrindo a epistola, declara-lhes que, em Cristo Jesus, clegeu-nos Deus, em amor, antes que 0 mundo fosse criado (Ef 1.4) Mais adiante, rego: Deus, mas também a todos os santos (Ef 1.15), Ao discorrer sobre a sal- Jija-se pelo amor que cles manifestam nao somente a vacio pela graga, mais uma vez o apéstolo destaca o amor divino, que se revela redentivamente a toda a humanidade (Ef 2.4). Paulo também fala de seu amor pelos gentios (Ef 3.1). Ato continuo, mostra que os efésios, por estarem firmes em Cristo, achavam-se arraigados e alicercados em amor (Ef 3.17). Explica-Ihes que 0 conhecimento do amor, que excede todo o entendimento, leva o crente a plenitude em Deus (Ef 3.19). No maravilhoso campo da comunhao crista, exorta os crentes ao fraternal amor (Ef 4,2). Ese quisermos crescer em tudo, “naquele que é a cabeca, Cristo”, temos de seguir a verdade em amor (Ef 4.15). Somente em amor © corpo mistico de Cristo pode consolidar-se (Ef 4.16). Por isso, reco- menda: “Sede, pois, imitadores de Deus, como filhos amados; ¢ andai em amor, como também Cristo vos amou ¢ se entregou a si mesmo por nds, em oferta e sacrificio a Deus, em cheiro suave” (Ff 5.1.2). Despedindo-se dos irmaos de Efeso, Paulo realga uma vez mais 0 amor: “Paz seja com 08 irmaos ¢ amor com #é, da parte de Deus Pai e do Senhor Jesus Cristo” (Ef 6.23, ARA). Nao posso conceituar © primeire amon mas quero senti-lo plena- mente em minha alma, O primeiro amor, para mim, é a alegria que o sal- mista receou perder (51,12). Sim, ume alegria que nos impulsiona a de- clarar toda a nossa afeigao a Deus: “Amo o Senhor” (Sl 116.1). Eo enlevo que, no inicio, fez com que os efésios vivessem nas regiées celesciais (EF 1.3). Ea disposicdo que leva 0 obreiro a semear, num misto de ligrimas ¢ juibilo, a preciosa semente do Evangelho ($1 126.5). Q primeiro amor é © sentimento que constrangeu a Sulamita a prorromper-se em madrigais ao receber, em seu jardim, 0 amado de sua alma. O primeiro amor é a virtude que melhor expressa a imagem divina Revelando o Pai, mostra o Filho. Nao é teoria morta; é pratica vivificante. Se por um lado ¢ ortodoxia, por outro, é ortopraxia. A teologia é impos- sivel sem ele. O primeiro amor constrange 0 evangelista a iniciar a scmeadura logo ao romper da aurora. Ele sai ¢ peregrina. Mas nao sabe se volta. Em sua jornada, vai lancando a palavra de salvacao em todos os solos. Geme € 28 Epeso, A LGRE}4 DO AMOR EX chora, porém nao exclui. Amorosamente, inclui espinhos, pedras ¢ os pés que humilham a boa semente. Ele nao se limita a terra agradecida; ilimita-se no chao ruim, ingrato e estéril. O primeiro amor acredita na germinagao do impossivel. Ha uma palavra no Apocalipse que, apesar de isolada ¢ despossuida de rima, soa irresistivelmente poética: prézos. Ela evoca a ideia de algo que precede o tempo € nao pode limitar-se ao espago. E o item que, numa listagem, precede os demais em virtude de sua prioridade. Distinta ¢ honrada, tem absoluta precedéncia. E por isso que a expresso “primei- ro amor”, usada por Jesus, reveste-se de tanto significado. Ela revela a esséncia da divindade. Se 0 primeiro amor é t40 sublime, por que alguém haveria de abandoné-lo? 2. Quando se abandona o primeiro amor. Entre a Epistola de Pau- lo aos Efésios ¢ 0 Apocalipse de Joao, hd um interregno de aproximada- mente trinta anos. No decorrer dessas trés décadas, foi a igreja em Efeso mergulhando num perigoso ¢ traigociro ativismo. Ela, que no inicio con- gregava-se em Cristo nas regides celestiais, foi abandonando, sem o per- ceber, 0 seu primeiro amor, Nao era um simples incidente teolégico, mas uma tragédia espiritual que, desfigurando-a como rebanho, reduziu-a a um ajuntamento de ovelhas. E estas j4 nao se identificavam como redil. Somente o primeiro amor € capaz de realgar a beleza do aprisco cristao. Verticalmente, 0 amor une-nos ao Cristo. Horizontalmente, liga-nos aos que se deleitam nos pastos sempre verdejantes do Bom Pastor. Embora elogie o pastor de Efeso por seu inigualavel curticulo, 0 Se- nhor Jesus censura-o por causa de um amor que jé nao amava como antes: “Tenho, porém, contra ti que abandonaste o teu primeiro amor” (Ap 2.4, ARA). Como pode um obreiro, com uma folha de servigos tao notavel, vir a abandonar justamente a primeira das virtudes cristis? O verbo aphiémi da-nos a exata dimensao de sua ruina. Abandonar, nesse caso especifico, nao é meramente deixar de lado. Tem implicagées mais fortes. Significa mandar embora, divorciar-se, negligenciar, desconsiderar e deixar alguém ao abandono. Imagine a mae que, absorvendo-se num cotidiano atribulado e cruel, esquece 0 filhinho no banco traseiro do carro, E, quando da por si, a crianga jd est4 morta. Ninguém Ihe questiona o amor, Mas a rotina do dia a dia levou-a abandonar que mais amava. Foi o que aconteceu a Ffeso. Aquele ativismo, que ia além de suas forgas, induziu-a a negligenciar 0 29 Os Sere Casricais pe Ouro primeiro amor. Que perfeita ilustragéo temos em Marta, irma de Maria. Embora o proprio Senhor estivesse em sua casa, desperdicava-se ela em afazeres. Marta se dava em servicos, mas nao se enctegava como servido ra. Em sua agenda, sempre ocupada, nfo havia um instante sequer para Jesus. Enquanto isso, Maria, contemplativa ao pé do Mestre, adorava-o com a sua atengao. Ouvir ¢ ver também é adorar. A igreja em Efeso tinha muito de Marta e quase nada de Maria. Ela destizera-se em servicos, mas nao se rendeu como serva, pois 0 seu amor j4 nao amava como antes. Os muitos cuidados fizeram-na esquecer de um item basico, mas primacial, da devocso crista: amar também € servir, Foi o que Jesus ensinou a Marta. E sé entao a irma de Lazaro veio a compreender que atividade nem sempre é produ- tividade. Por conseguinte, que o pastor de Efeso entendesse de vex que, no coragao divino, uma carta de amor faz mais efeito do que um bom currfculo. O poeta Carlos Drummond de Andrade, lamentando a efemeridade de certos amores, consola-se nestes versos: “O primeiro amor passou,/ O segundo amor passou,/ O terceiro amor passou,/ Mas 0 coragao con- tinua’. No devocional do cristao, porém, sé 0 primeiro amor interessa, porque somente ele ¢ real, O segundo amor jé € indiferenca. O terceiro, esquecimento. E como pode o coragao continuar esquecido e indiferen- te? E a pergunta que 0 anjo da igreja em Efeso tera de responder. Mas a sua lembranga do primeiro amor j4 era vaga. 3. Amnésia espiritual. Pode alguérn esquecer-se do primeiro amor? Os poetas dizem que nao. Os tedlogos, porém, discordam, pois um de- les, apesar de sua intimidade com as ciéncias divinas, desmemoriara-se de suas afeigées por Jesus. Sim, 0 pastor de Efeso j4 néo conseguia trazer & meméria os sentimentos que, no inicio de sua fé, santificara a Jesus Cristo. E para que a sua amnésia nao se fizesse cronica, Jesus exorta-o gravemente: “Lembra-te, pois, de onde caiste, arrepende-te e volta a pré- tica das primeiras obras; ¢, se nao, yenho a ti ¢ moverei do seu lugar 0 reu candeeiro, caso nao te arrependas” (Ap 2.5, ARA). Como péde o anjo de Efeso esquecer-se do pritneiro amor? Sera que ele nao conhecia as implicagdes teoldgicas dessa vircude? Ele nao as igno- rava. A amnésia espiritual, contudo, jd comegava a destruir-lhe os afetos que, no principio, consagrara ao Senhor. O que deveria ele fazer agora? Lembrar-se de onde deixara cair os afeicoamentos de sua fé, 30 Se fizermos uma exegese do verbo empregac concluiremos: a situagao do anjo de Efeso jd era terminal. O grego mnémoneué nao significa apenas relembrar. Primariamente. 32 um sentido mais forte: reavivar a meméria. Logo, as lembrang daquele obreiro urgiam ser ressuscitadas, pois jaziam mortas. E por isso que ele jd nao sentia nem amava como antes. Assemelhava-se aos pacientes que, ligados a complexos suportes de vida, existem, mas j4 nao o sao. Logo, como poderia permanecer & frente do rebanho se a vida esvaia-lhe da alma? Ele pr isava de emergentes cuidados. E a primeira receita que lhe prescreve o Senhor ¢ 0 arrependimento. 4. Arrependimento para um pastor. A igreja em Efeso seguiu a recomendagao do Senhor? Lembrou-se de onde cafra? Arrependeu-se de seu pecado? E voltou ao primeiro amor? Da epjstola que Ihe enviou Igndcio (30-107 d.C.), depreendemos que sim. © missivista, que também fora bispo em Antioquia, elogia-the o trabalho, a seguranca doutrindria o amor que os seus fiéis voltaram a devotar a Cristo. Por conseguinte, nao sao apenas os impios que carecem de arrepen- dimento. Pois os filhos de Deus também pecam. E nem sempre nossas transgress6es so escandalosas ¢ socialmente reprovaveis. As vez, . nem parecem iniquidades. Exibem-se até como sutilezas teolégicas. Afinal, quem perderia tempo, buscando as diferengas entre o primeiro e 0 se- gundo amor? E que juiz se deteria a julgar alguém que jé nao consegue amar como antes? No entanto, quem realmente ama a Cristo sabe que, entre 0 primeito ¢ o segundo amor, vai todo um abismo de indifereng Portanto, se j4 nao 0 amamos com 0 amor que ele requer, é sinal de que estamos em pecado. Logo, carecemos arrepender-nos, para nao perecer- mos na iniquidade, que vem caracterizando a cristandade de nosso tem- po: o esfriamento do amor, 5. Voltando as primeiras obras. As tltimas obras de Efeso nao eram ricas e abundantes? Entao, por que lhe recomenda 0 Senhor a volta as primeiras? (Ap 2.5) A igreja destacava-se pela constincia e por ura ir- resoluca fidelidade a Cristo. Exauria-se em trabalhos. Santificava-se em servigos. E no enfrentamento ao erro, erguia-se apologética e teolégica. O que lhe faltava? Na aparéncia, nada; na esséncia, tudo. Ela carecia da primitiva obra do amor que, em suas derradeiras devogées, achava-se per- dida. E se esta obra jd nao se faz presente, as demais logo se ausentam, ainda que meritérias e elogidveis. 31 Os Sere Castigats pp Ouro. O amor éa primeira das obras. Sem ele nenhuma expressao, quer an- gélica, quer humana, é possivel: “Ainda que eu fale as linguas dos homens e dos anjos, se nao tiver amor, serei como o bronze que soa ou como 0 cimbalo que retine” (1 Co 13.1, ARA). Ele transcende a profecia, 0 co- nhecimento ¢ a propria fé. Sem ele o arcano nao se cumpre, a ciéncia se obscurece ea crenca perde toda a conviccio: “Ainda que eu tenha o dom de profetizar e conheca todos os mistérios ¢ toda a ciéncia; ainda que eu tenha tamanha fé, a ponto de transportar montes, se nao tiver amor, nada serei” (1 Co 13.2, ARA). Ele é mais sublime que a filantropia e mais exal- tado que o martirio. Sem ele pode haver até esmola, nunca porém a mao fraterna que se abre ¢ se estende em boa vontade. Pode haver até martirio © canonizacéo sem cle, entretanto, jamais a entrega completa ¢ incon- dicional a Deus: “E ainda que cu distribua todos os meus bens entre os pobres ¢ ainda que entregue 0 meu préprio corpo para ser queimado, se nao tiver amor, nada disso me aproveitara” (1 Co 13.3, ARA). Eloquente até na lingua dos anjos, Efeso j4 comegava a gaguejar no dialeto simples do amor. Conhecia todos os mistérios, mas ignorava a ci- éncia da genuina caridade. Sua fé movia montanhas, s6 n4o era capaz de remover a campa onde sepultara as feicdes ao Cristo. Profetizava, j4 nao cantava porém os deleites de suas primitivas ternuras ao Salvador. Era ca- paz de distribuir todos os seus bens aos pobres, todavia, nao se dava mais Aquele que tanto a enriquecera. Se necessdrio, entregava-se em martirio, mas jd ndo se rendia ao amor que, em amor, nos consagra a Deus. Urgia- Ihe, pois, voltar as primeiras obras. Na primazia de seu amor, Efeso cumprira zelosamente a Grande Co- miss4o. Evangelizando, consagrou-se em missdes. Mas 0 tempo passou ¢ tudo apagou. Agora, j4 nao se lembra das antigas obras. Talvez, chegasse até a perguntar: “Por que recordar as primeiras se as Ultimas sio também louvaveis?” Se cotejadas, entretanto, estas se apagavam diante daquelas. A sua segunda perseveranca nao deixava de ter méritos. O que era, po- rém, diante da primeira? Ainda continuava a nao suportar os homens maus. No entanto, sem 0 primeiro amor, ela agia mal. Fervorosamente apologética, colocava 4 prova os que se presumiam apdstolos. Contudo, nem a obra de um evangelista fazia mais. Era capaz de sofrer agravadas provacées pelo nome do Senhor. Nao obstante, seu amor j nao podia dar provas de seu primado As duas principais evidéncias do primeiro amor so 0 evangelismo e a obra missiondria. Nenhuma outra obra € superior a estas, Portanto, que 32 Os Sere Castigars DE OURO VII. QUANDO O CANDELABRO E REMOVIDO Enquanto escrevia este livro, assisti a uma reportagem que, jocosa € sutilmente, lamentava a tragédia de uma igreja que tivera o seu castigal re- movido pelo Senhor, Fundada em 1946 pelo reverendo William Augustus Muhlenberg, a Igreja da Sagrada Comunhdo, em Nova York, ofereceu-se, por quase um século, em obras amorosas ¢ sacrificais. Sua Escola Dominical era frequentada por ricos e pobres. Os meninos de rua, sempre bem recebi- dos pelo irmao William, trocavam a criminalidade por uma vida honesta ¢ proveitosa. As conversées nfo eram poucas. No Instituto Sao Paulo, que ela subvencionava, os jovens celebravam semanalmente a santa ceia ¢ diaria- mente punham-se a estudar as grandes doutrinas da salvacio. Muhlenberg, dedicava-se ainda & fundagao de escolas e de hospitais, pois entendia que socorrer os necessitados era também proclamar o Evangelho. Depois de uma trajetéria tao brilhante, a Igreja da Sagrada Comu- nhao pés-se a perder a Suz numa cidade tomada pelas trevas. No inicio dos anos de 1970, 0 imponente prédio foi comprado pela Odyssey House, entidade que se dedicava a reabilitagao de usuarios de dro- gas. A Odyssey, vendo-se em dificuldades financeiras, vendeu 0 edificio em 1982. E nao demorou muito para que o lugar, que um dia celebrara o nome de Deus, fosse transformado numa danceteria. Naquela nave, que agora em nada diferia de um bordéu, ajuntavam-se homens e mulheres para se divertir ao som de muisica gética e consumir drogas. Seus tragos, embora lembrassem wma igreja, j4 evocavam a morada do Diabo. Até ho- micidios aquelas paredes testemunharam., Aquela casa fez-se tao perigosa, que as autoridades decidiram feché-la. Desde maio de 2010, 0 magnifico prédio vem sendo utilizado pelo Marketplace Limelight — um templo do consumo, onde Mamom é incensado pelas mais caras grifes. A igreja em Efeso achava-se na iminéncia de ter um destino semelhante. A adverténcia vem do préprio Cristo: “Lembra-te, pois, de onde caiste, arre- pende-te e volta a pratica das primeiras obras; e, se nao, venho a ti e moverei do seu lugar o teu candeeiro, caso nao te arrependas” (Ap 2.5, ARA). O que P ) Og significa mover um castigal e que emblema este traz & Igreja? 1. A simbologia do castigal. No Antigo Testamento, o castigal sim bolizava o povo hebreu que, separado como propriedade exclusiva de Jeov, tinha como missao resplender a luz divina sobre os gentios. Sua missdo, porém, foi cumprida apenas parcialmence. Eles deram ao mundo 34 Eriso, 4 léaeja Do Amor Esquecibo os profetas, as Sagradas Escrituras e 0 préprio Cristo. Mas a si mesmos no se entregaram testemunhalmente. Nalguns periodos de sua histdria, alids, fizeram-se piores do que as gentes que os rodeavam. Haja vista a apostasia de Salomao ¢ 0 desvio de Jeroboao, filho de Nebate, que nao somente pecou, mas levou as tribos setentrionais ao pecado. O candelabro, feito de puro ouro batido e pesando 34 quilos, ficava no lado esquerdo do Taberndcuio. Era uma pega tio inteiriga e perfeita que, nela, nao havia ligadura ou emenda (Ex 25.36). Suas impadas, em ntimero de sete, resplandeciam plenamente na Casa de Deus, assim como Israel deveria, em plenitude, brilhar entre os gentios como nagao profé- tica, sacerdotal ¢ real, Todos olhavam para os hebreus, pois sabiam que 0 seu Deus, ao contrarie dos idolos das nagées, nao se limitava aos montes como Baal, nem aos mares como Dagon. O scu Deus era o Senhor dos céus e da terra, porquanto tudo criara. No Santo Templo havia dez castigais (1 Rs 7.49), cinco & direita e cinco A esquerda, representando a luz divina que incidia sobre Israel. Diferentemente dos outros povos, os hebreus eram regidos diretamente pelo Deus Unico ¢ Verdadeiro. Que outra nacao possuia um legislador como Moisés? Ou um salmista como Davi? Ou, ainda, um historiador como Samuel? Nos labios de seus profetas, os arcanos eram poesia alta € sublime. Em cada Escritura Sagrada, falava o Senhor a Israel e, através de Israel, a todo o mundo. Nas Escrituras do Novo Testamento, ha duas simbologias no castigal. Num primeiro momento, é a iluminagao do Espirito Santo sobre a Igreja de Cristo. Jé no instante seguinte, avulta-se como o testemunho que o crente em particular, e a Igreja, como um todo, devem prestar acerca da santissima fé, num século que subjaz em crevas. 2. Os sete candelabros. Se no Exodo apresenta Moisés apenas um castical, no Apocalipse Joao mostra sete. E, no meio destes, destaca-se o Senhor Jesus que, desenvolro ¢ soberano, caminha entre eles. [sola- damente, cada candeeiro representa uma igreja local; conjuntamente, a Igreja Invisivel ¢ Universal. Se no conjunto devem brilhar, particular- mente tem, cada um deles, o dever de resplandecer como astros no firma- mento (Mc 5.14; Dn 12.3). 3. A remogao do candelabro. Universalmente, a igreja jamais deixa- rade ser luz. Localmente, porém, nao sao poucas as igrejas que se apagam 35 Os Sere Castigats DE Ouro. ¢ deixam-se esmaccer. Assim, remove-lhes 0 Senhor o castigal. E 0 que delas resta nao é nada agradavel. Lembra-se da igreja em Jerusalém? Se no inicio o seu candeeiro nao era apenas luz, mas luz e chama, nao demorou muito para que o primor de seu brilho faiscasse em Antioquia. Por algum tempo, ambas resplendiam. A primeira, doutrinariamente; a segunda, missiologicamente. J4 no final do primeiro século, com a morte dos san- tos apéstolos e com a destruigéo da Cidade Santa, o castigal da primeira igreja é transferido de Jerusalém para outros hemisférios. E nem por isso a Igreja de Cristo foi despida de seu fulgor. Jesus destacou sete igrejas, dentre a cristandade da Asia Menor, para simbolizar a Igreja Invisivel e Universal. Entre si, diferiam em brilho. Mas nenhuma deixara de ser luz. Umas refulgiam mais, outras quase nada. Se o brilho de Esmirna era martir ¢ confessante, o de Laodiceia, j4 quase apagado, dava os ultimos bruxuleios. E se Filadélfa falgurava em seu pri- meiro amor, Efeso, apesar de todas as suas exceléncias, apresentava uma luz quase desmaiada. Se o seu candeeiro fosse removido, ela até poderia continuar a existir como organizagao, mas perderia toda a sua vida como organismo. A igreja perde o candelabro quando se faz amiga do mundo e in- tima dos poderosos; quando deixa de ser a voz profética de Deus para fazer-se politicamente correra; quando abandona 0 evangelismo biblico e intromete-se a construir uma doutrina social divorciada das Sagradas Es- crituras; quando, em vez de preocupar-se com as almas perdidas, comega a lastimar-se por vores € animais, apequenando-se num ecologismo ra- dical e inconsequente; quando relativiza 0 pecado e abomina-se entre os abomindveis; quando, langando mao da prata ¢ do ouro dos santos, com- pra consciéncias e até siléncios; quando ignora os tiltimos dias, pensando serem estes ainda os primeiros de um movimento que se petrifica num monumento &s obras mortas; quando, entristecendo o Espirito Santo, comunga com 0 espirito do Anticristo que jé atua no mundo; quando elimina os que 4 exortam A santidade e & pureza, manchando de sangue suas mos que jd ndo se estendem as boas obras. A igreja tem o castical removido quando, menosprezando o primeiro amor, ousa substitui-lo por um ativismo histérico e fatal. Se Cristo remove de uma igreja o seu castigal, vai-se dela toda a gloria. Assim ocorreu com o santudrio de Deus em Jerusalém. Em consequéncia das iniquidades de Judd, que jamais se dispusera a ouvir os santos pro- 36 . Er%s0, AIGREA DO AMOR Esqurcipo feeas, resolveu o Senhor destruirlhe o reino, deitar-lhe por terra a mag- nifica capital ¢ derribar a casa que lhe erazia o nome. Desde Babilénia, viu Ezequiel quando a gléria de Jeové orfanava o lugar santissimo para exilarse do Templo de Salomao. A gléria que dera tanta gléria aquela casa, agora ergue-se de seus Atrios, conforme escreve o profeta: “Entio, os querubins clevaram as suas asas, ¢ as rodas os acompanhavam; e a gléria do Deus de Israel estava no alto, sobre eles. A gléria do Senhor subiu do meio da cidade e se pds sobre o monte que est ao oriente da cidade” (Ez 11.22,23). Nao estaré 0 mesmo ocorrendo conosco? VIII. A DOUTRINA DOS NICOLAITAS Embora nao se lembrasse ma s do primeiro amor, 0 anjo de Ffeso ainda dispunha de suficiente tirocinio para diferengar a verdade do erro. Nao pusera ele A prova os que se diziam apéstolos? Por que nao haveria de aferir, agora, a doutrina € a obra dos nicolaitas? Sua ortodoxia, infe- lizmente, jazia sepultada no esquecimento do amor. Mas 0 Senhor Jesus, buscando reviver-the o ardor espiritual, elogia-o pelo zelo demonstrado contra a apostasia: “Tens, contudo, a teu favor que odeias as obras dos nicolaftas, as quais cu também odeio” (Ap 2.6, ARA). Ostentando luz, os nicolaftas espargiam trevas sobre toda a Asia Me- nor, Mas quem eram eles? £ por que as suas obras fizeram-se tio odiosas ao Senhor? 1. Os nicolaitas. Nao podemos levantar-lhes com precisao a identida- de, De uma coisa, porém, estamos certos: sa gente nao era nada recomen- davel. Supdem alguns estudiosos que a seita teria sido fundada por Nicolau que, na igteja em Jerusalém, fora selecionado para compor o ministério diaconal. Descarto tal hipdtese, pois os cristaos primitivos eram bastante criteriosos na escolha de seus ministros, conforme evidencia a recomenda- gio apostolic: Mas, irméos, escolhei dentre vés sete homens de boa re- putagio, cheios do Espirito e de sabedoria, aos quais encarregaremos deste servico” (At 6.3, ARA). Além do mais, algumas décadas se passariam desde a instituigio do diaconato até o aparecimento dos nicolaitas. F nenhuma epistola anterior os menciona, pelo menos nominalmente. 2. A doutrina dos nicolaitas. Vendendo-se e deixando-se comprar, os nicolaitas mercadejavam as coisas santas e sempre auferiam gordos 37 Os Sete Casti¢ais pr Ouro dividendos com as variagées mercadolégicas da fé incauta € desavisada, Profetizavam ¢ tinham visées sob encomenda. E na imensa feira do mis- ticismo, expunham suas teologias tanto no varejo quanto no atacado. In- ventavam curas ¢ forjavam milagres, adoentando as igrejas com imitacées ridiculas ¢ ordinarias do poder de Deus. Usando de artificios hermenéuticos ¢ teolégicos, debilitavam a Igreja de Cristo. Eles sabiam que um rebanho doutrinariamente débil logo se expée a corrupgao. E, j4 corrompido, entregar-thes-ia a la e a gordura, Nao era exatamente assim no Israel do Antigo ‘Testamento? Alguns reis fizeram-se tao promiscuos, que até falsos profetas arrolavam em sua folha de pagamento, a fim de espoliar 0 povo do Senhor. A situacao hoje nao é diferente. Ha pastores que assalariam videntes ¢ pitonisas que, por algu- mas dracmas, inventam sonhos, urdem visées ¢ tramam profecias, para manter um status quo abomindvel e repugnante aos olhos de Deus. Os nicolaitas nao se extinguiram no século de Joao. Quais ervas dani- nhas, rebrotam até mesmo nas searas mais vigilantes. Imperceptivelmen- te, arrastam os santos & prostituigdo e os piedosos 2 idolatria ¢ & avareza, E como amam o dinheiro! Aos simplices, maquiam as consequéncias do pecado ¢ ocultam os rigores do jufzo vindouro. Mitologizam o inferno e desmistificam o céu, recriando um Olimpo na terra onde cada ser hu- mano tem licenca para criar um deus de acordo com as préprias conce- piscéncias. Assim, surgem os supercrentes que, imitando o Aquiles de omero, lancam-se as mais inconsequentes aventur: H lang fragilidade de seu calcanhar. Determinam e confessam, indeterminando- s, esqnecendo-se da se num todo confuso e cadtico. A semelhanea do filho de Peor, os nicolaitas pés-modernos utilizam. a teologia a fim de prosperar suas bolsas, Desfocando a visio do Reino de Deus, focam a visagem de seus impérios e feudos. Neste pulpito, sao académicos; naquele, misticos, E em todas as igrejas, vidos ladrées ¢ ri- sonhos diabos. Num psicologismo afoito, leiloam autoajudas ¢ positivam as mais inconfessdveis e absurdas confissécs. Rodeiam a terra ¢ intrometem-se entre os filhos de Deus, Caluniam descaradamente a Jé ¢ nao se acanham em discutir teologia com o pré- prio Deus. Scu ego € tao desmesurado que, mesmo no deserto de sua espiritualidade, ousam obrigar 0 proprio Cristo a curvar-se diante deles. No pullpivo, fazem-se deuses e como deuses exigern uma adora io propria 4 divindade. Mentem ¢ por suas mentiras recebem generosas somas. E 38 . . Exrso, 4 iereps DO AMOR ESQuECIDO Jo aplaudidos por aqueles que andam & cata de mestres de acordo com as suas concupiscéncias. Reclamam o ouro que a vitiva ndo tem e exigem a prata que o érfao nao possui. 3. O édio de Cristo. Sc as doutrinas dos nicolaitas cram ruins, suas obras nao eram melhores, pois levaram Cristo a mover-lhes um édio im- placavel: “Tens, concudo, a teu favor que odeias as obras dos nicolaitas, as quais eu também odeio” (Ap 2.6, ARA). E a primeira vez que Cristo manifesta semelhante sentimenro. Nem mesmo quando traido por Judas Isacariotes, deixou que o dio Lhe rcomasse 0 coragao, porguanto este sem- pre fora ocupado por um amor que ia além da compreensao humana. Recorramos aos manuscritos de Joao e vejamos o termo “ddio” no grego. A palavra miseo nao significa apenas odiar, mas detestar aberta- mente. Sim, Jesus nado somente odeia, mas detesta as obras dos nicoiaftas. E como 0 pastor de Efeso também as abominava, recebeu do Senhor mais um elogio. Apesar do primeiro amor esquecido, ainda conserva ele a fibra ea dignidade de um genuino obreiro. Afinal, muito sofrera com as investidas desses ministros fraudulentos que, de igreja em igreja, iam se- meando heresias € suscitando apostasias. E 0 dinheiro que arrecadavam? E as ovelhas que langavam na prostituicao ¢ na idolatria? Por que lhes estender a destra da comunhi ? Se o fizermos, nossas obras também serao odiadas pelo Senhor. Nao nos amedrontemos com © seu poder nem com a sua performance. Eles sio convincentes, sim. Sabem como desconstruir a verdade do Evangelho e apresentar suas men- tiras como artigos de Fé. Eles comparecem as festas ¢ nao se ausentam das confraternizacées. Nao irao, porém, adiante: continuarao a enganar e a serem enganados. IX. O ACESSO A ARVORE DA VIDA O que Jesus espera do anjo de Efeso? Que abra os ouvidos & voz do Espirito Santo ¢ que nao se limite a amar como antes. Mas que ame como jamais amou. Logo, nao pode ele conformar-se com uma simples restauraca4o espiritual. Empenhar-se-4, doravante, por um avivamento que o leve a viver a beleza do primeiro amor. A experiéncia de Paulo ha de servir-lhe de modelo, Num primeiro momento, 0 apéstolo elogia os efésios por celebrarem a Cristo nas regides celestes. Num segundo, de- monstra ser poss{vel, mesmo estando na terra, viver no terceiro céu, Isso 39 pr Ouro somente acontece quando amamos a Cristo com o amor que 0 levou a esvaziar-se de sua gléria, para que, em sua humilhagao, féssemas exalta- dos. Que nestes tltimos dias, pois, voltemos a ouvir atentamente o que o Espirito diz as igrejas. 1. A vox do Espirito Santo. Israc} escutava a Deus, mas nao lhe ouvia a voz. E apesar de enxergar-Ihe as obras, no lhe via as operagées que se cotidianizavam em sua histéria. Por isso, ao env terminou o Senhor ao seu profeta: [hes Isaias, de- Vai e dize a este povo: Ouvi, ouvi e nao entendais; vede, vede, mas ndo percebais. Torna insensivel 0 coragao deste povo, endurece-Ihe os ouvidos ¢ fecha-lhe os olhos, para que nao venha cle a ver com 08 olhos, a ouvir com os ouvidos e a entender com o coragia, e se converta, ¢ seja salvo. Entao. disse eu: até quando, Senhor? Ele respondeu: Até que sejam desoladas as cidades ¢ fiquem sem habitantes, as casas quem sem moradores, ¢ a terra seja de rodo assolada, eo Senhor afaste dela os homens, ¢ no meio da terra seja grande o desamparo. (Is 6.9-12, ARA) Israel tem olhos, mas nao vé. Tem ouvidos, porém nao ouve. E 0 seu coragao? E. incapaz de chegar ao arrependimento? Tornaram-se os israelitas semelhantes aos seus idolos. Eles existem e nada séo. Eis porque fizeram-se surdos aos profetas. A experiéncia teolégica do Antigo Testamento mostra que somente se arrepende quem esté disposto a arrepender-se. Com relacéo aos demais, a mensagem lhes agird inversamente no corac’o: quanto mais a ouvem e mais veem, mais empedernecem a cerviz. Foi o que ocorreu com o Faraé que se recusou a libertar os hebreus. Mesmo com todas as pragas que lhe assolavam 0 pais, 0 egipcio resistiu ao Senhor. Mas como se deve ouvir 0 Espirito Santo? © verbo grego akoud de- nota, em primeiro lugar, a capacidade de se ouvir perfeita e distintamen- te. Significa também atender, considerar, perceber o sentido das coisas ¢ atentar 4 doutrina ensinada por um mestre. Como se vé, ouvir € mais do que escutar. Por isto, exorta-nos a Palavra de Deus: “Hoje, se ouvirdes a sua voz, no endurecais 0 vosso coracao. como foi na provocacao” (Hb 3.15, ARA). E por nao ter ouvido a voz do Espirito Santo, toda uma ge- racio pereceu no deserto. Portanto, lembremo-nos do primeiro amor, a fim de darmos ouvidos ao que 0 Espirito nos diz nestes tiltimos dias. Nao ouve voce a voz do Espirito de Deus? Os vencedores. A cada igreja da Asia Menor propusera Jesus um desafio. Se Esmirna tinha pela frente 0 martirio e Pérgamo era obrigada a 40 Evwso, a Torta po AMOR ESQuecioo enfrentar a oposicao do préprio Diabo, Efeso seria constrangida a realizar ume faganha que ia além dos limites do coracao. Ela teria de amar nao somente como antes, mas amar como jamais amara. Superado o desafio, © seu curriculo estaria completo. Somente os vencedores siio capazes de amar com o amor que levou Deus a dar 0 seu Filho Unico para resgatar- nos de nossa va mancira de viver. Se amarmos assim e se assim andarmos em amor, teremos franqueado o acesso & arvore da vida. 3. A drvore da vida. Eis a promessa que Jesus nos chancela: “Ao vencedor, dar-lhe-ei que se alimente da drvore da vida que se encontra no paraiso de Deus” (Ap 2.7. ARA). Jesus nao se refere & arvore da vida que Deus plantara no Eden. Refere-se & vida eterna que nele j4 desfrutamos. Somos mais privilegiados que Adio. Em consequéncia de seu pecado, reve ele negado o seu acesso 20 paraiso. Isso porque, se voltasse a comer daquele fruto, transformar-se-ia num pecador eterno: “Eis que o homem se tornou como um de nés, conhecedor do bem e do mal; assim, que nao estenda a mao, e tome também da drvore da vida, ¢ coma, e viva eterna- mente” (Gn 3.22, ARA). Ja pensou num pecador imortal? Imune a morte ¢ incapaz de receber o saldtio a que faz jus 0 pecado? Como poderia Jesus dar A sua vida a al- guém nessas condicées? O homem certamente seria pior do que o Diabo. Este ndo possui corpo fisico; aquele, além de comunicar-se fisicamente, espiricualmente também se manifesta. Logo, a morte, apesar de todo 0 luto e tristeza que encerra, nao deixa de ser uma bela expressao do amor divino. Imaginemos um impenitente de sete mil anos. Como seria 0 esta~ do mental de alguém nessas condic6es? A morte, no ambito cristao, veio a tornar-se até lucro, pois aproxima-nos do Redentor. Alias, o proprio Cristo a experimentou. Em sua morte, trouxe morte a morte. E foi assim que nos abriu 0 caminho ao paraiso de Deus. 4. O paraiso de Deus. O Eden, apesar de toda a sua beleza, foi in- capaz de reter Addo. Ele caiu na apostasia, supondo ser a sua liberdade de escolha um paraiso em si mesrna. Expulso do jardim de Deus, foi viver © seu préprio deserto. Mas, em Cristo, foi-nos liberado 0 acesso a um jardim superior. Ele nao precisa ser cultivado nem lavrado, porque o prd- prio Senhor cuidou de sua arquitetura e encarregou-se de sua construcao. ‘[rata-se de um lugar real e nao de uma utopia. Nenhum ser humano jamais conseguiu idear cidade mais bela. 41 Os Sere Casticats Dé QuRO No meio desse paraiso, acha-se a drvore da vida. Se o lugar € real, a drvore ndo é quimérica. E se 0 paraiso nao é 0 Eden do Génesis, a arvore a que teremos acesso nao é aquela que se achava plantada naquele jardim que 0 pecado desertificou. Conforme 0 Apocalipse no-la descreve, ela serd oferecida como satide 4s nacées. Ao seu redor, desfrutaremos de uma comunhao eterna. Mas somente chegaremos ao paraiso de Deus sob o manto do primeiro amor. 42 Ao anjo da igreja em Exmirna escreve: Estas coisas diz 0 primeiro e 0 tiltimo, que esteve morto e tornou a viver: Conheco a tua tribulagéo, a tua pobreza (mas tu és rico) ea blasfémia dos que a si mesmos se declaram judeus e nao sao, sendo, antes, sinagoga de Satands. Nao temas as coisas que tens de sofrer. Fis que 0 diabo estd para lancar em prisao alguns dentre vs, para serdes postos & prova, e tereis tribulacao de dez dias. Sé fiel até & morte, e dar-te-ei a coroa da vida. Quem tem ouvidos, ouga 0 que 0 Espirito diz és igrejas: O vencedor de nenhum modo softerd dano da segunda morte. (Ap 2.8-11, ARA) Introducgao John Fox conduz-me 20 Coliseu de Roma. Ao entrar no grande circo, meus olhos desmaiam na arena iluminada pelas chamas que, sem pressa, devoram os corpos de centenas de homens e mulheres. Demonstrando o valor da santissima fé, eles sustentam, até 4 morte, um firme e corajoso testemunho. Sua confissao espanta os algozes e deixa confusa a turba ensandecida e sanguinéria. Mesmo com a dor a excrucid-los, retinem o que lhes resta de forca, para louvar o Cordeiro de Deus. Nao sao a luz do mundo? Que o seu sacrificio resplandega sobre um século que, apesar de todo o brilho, sepulta-se em trevas. Os Sere Casrigars pp Ouro Indignado, adianto alguns capitulos no Livro dos Martires. Aqui Jodo Huss é queimado vivo. Ali, Jerénimo Savonarola é oferecido no altar da intolerincia. Mais além, sao os valdenses perseguidos. Acold, os albin- genses n&o encontram repouso. O inferno, porém, nao consegue deter 0 avango da Igreja de Cristo que, apesar de todas as oposigées, segue local ¢ universalmente triunfante. John Fox (1517-1587) nao foi um mero espectador das perseguicées que cicatrizaram a Igreja de Cristo naqueles dezesseis séculos de peregrinagao. Ele muito sofreu sob o reinado de Maria, a Sangrenta. Para que sangue dos justos continuasse a clamar, foi que ele escreven 0 Livro dos Martives. En- quanto as caravelas de Portugal ¢ da Espanha descobriam novos mundos, a sua querida Inglaterra encobria o sangue dos que cram executados pelo tinico crime de ter a Biblia como a sua suficiente norma de fé ¢ pratica. A perseguigao na Inglaterra sé cerminaria com a ascensio de Elizabeth I. Corajosa ¢ altiva, a soberana inglesa enfienta as investidas da igreja romana que, para conseguir seus intentos, infla as velas da invencfvel armada espanhola e parte em direitura as ilhas britanicas. Mas Deus intervem destroga aqueles navios que, aportades ali, acabariam de vez com a liberdade escrita com o sangue de homens como William Tyndale. John Fox morreu no século XVI. Mas outros martirélogos cormaram o seu lugar, e continuam a registrar os sacrificios das testemunhas que se levan- tam a professar 0 nome de Jesus. O sécuio XXI, apesar de seus admiraveis conhecimentos, nao se fez mais sdbio. As wevas nunca estiveram to espessas. Neste exato momento, algum cristio, em algum lugar, esté selando a { com proprio sangue. A semelhanga de Esmirna, muitas igrejas, no Oriente sempre tio fechado, e no Ocidente tao hipocritamente aberto, mostram o valor de seu testemunho. Elas nada termem, pois sio confessantes € nao receiam o martitio. Antes de fechar 0 Livro dos Mdrtires, volto alguns capitulos e deparo- me com a execucao de Policarpo, bispo de Esmirna, a quem o Senhor Jesus, provavelmente, teria enderecado uma consoladora epistola por in- termédio de Joao, o Divino. I. AIGREJA EM ESMIRNA Alo anjo da igreja em Esmirna escreve. (Ap 2.80, ARA) Se vocé for 4 Turquia, nao deixe de visitar a moderna Izmir. Nessa bela cidade liroranea, localizava-se a biblica Esmirna. Naqueles idos, afa- 44 Bsns, a loneps Convyssanre: & Moinrsa mara-se ela pelas esséncias que exportava para todo 0 mundo. Por causa disso, era conhecida como a cidade do “porto perfumado”. Nao havia como disfargar-Ihe a fragrancia. Nessa mesma Esmirna, havia uma igreja que, apesar de sua pobreza e tribulagio, era conhecida em toda a Asia Menor pelo bom cheiro que exalava. Actedita-se que 0 seu pastor, quando da redacao do Apocalipse, fosse Policarpo, que viria a ser martirizado pelo Império Romano. 1. Esmirna, a cidade-perfume. Esmirna ufanava-se de ser a mais importante cidade da Asia Menor, Embora inferior a Efeso ¢ apesar de nao possuir os atrativos de Laodiceia, suas vantagens nao eram despre- ziveis. Localizada na regiao sudoeste do continente, era valorizada pela importancia de seu porto ¢ pela mirra que produzia. A esséncia que, alids, poetizou-lhe o nome era obtida através de um processo bastante moroso: prensava-se madeira da commiphora myrrha axé obter-lhe o perfume. Nao é um emblema perfeito para uma igreja confessante ¢ martir? A histéria de Esmirna tem cerca de cinco mil anos. Ela comecou a ser escrita por volta do terceiro milénio a.C. Juntamente com Troia, era o mais importante centro cultural da Anatolia. Em 1500 a.C., caiu sob a influéncia do Império Hitita. A cidade, informa Hérodoto, foi ocupada inicialmente pelos edlios e, logo em seguida, pelos jdnios. Nao demorou muito para que ela comegasse a pontificar-se na Federacao Jénica. Segun- do a tradigao, 0 poeta Homero teria ai residido, por volta de 850 a.C. Em 600 a.C., Esmirna foi conquistada pela Lidia. Creso, porém, apesar de sua riqueza e suntuosidade, permitiu que a cidade murchasse até desfazer- se numa aldeia. © rei lidio pouco se importou com a sua gléria. Vieram os persas ¢ a sorte de Esmirna em nada mudou. Mas Alexandre, 0 Grande, no século IV a.C, ao passar pela Asia Menor, conquistou-a e pés-se a reconstrui- la, expandindo-the o perfmetro em diregdo ao Monte Pagos. Séculos depois, chegaram os romanos que, embora uuculentos © brutais, emprestam-lhe um fulgor maior que a sua primitiva gléria. No século seguinte, aparecem os missiondrios cristaos. Conquanto feramente perseguidos, langam em seu chao a semente do Evangelho. A igreja, que se faria notoria por sua confissao, pe-se a germinar e, a partir dai, jamais seria esquecida. Esmirna sempre ha de ser lembrada por haver frutificado a mais perseverante igreja da Asia Menor. A partir do século IV, a cidade passa a fazer parte do Império Bizanti- no, e assim permaneceria até ser tomada pelos seljticidas no século XI. 45 Os Sere Castigats ps Ouro: Sob 0 poder de Mehmed Celebi, Esmirna foi anexada ao Império Otomano em 1415. Dos séculos XVI a XIX, tornou-se um dos mais importantes portos do mundo. Judeus, gregos, italianos holandeses, além de comerciantes de outros continentes, inclufram-na em seus roteiros, Seus produros, agora, chegavam tanto a Europa como ao distante Oriente. Até 0 inicio do século XX, Fsmirna era uma das cidades mais cosmo- politas do mundo. Entre os seus cidadios, havia gregos, arménios e gente da Europa Ocidental, Acualmente, sua populagio judia gira em torno de duas mil © quinhen«: s pessoas. Apés a guerra da Turquia por sua inde- pendéncia, a comunidade helena de Esmirna buscou refiigio na Grécia, Hoje, a maioria de seus habitantes é predominantemente turca, Conhecida também como ea pérola do Egeu, Esmirma é a mais oci- dentalizada cidade da Turquia. 2. A igreja em Esmirna. Informa Lucas que, durante @ estada de Paulo em Efeso, toda a Asia Menor foi alcancada pelo Evangelho: “Durou isto por espaco de dois anos, dando ensejo a que todos os habitantes da Asia ouvissem a palavra do Senhor, tanto judeus como gregos” (Ar 19.10, ARA). Infere-se, pois, tenha sido a igreja em Esmirna estabelecida nesse perfodo, Ela nasceu juntamente com as outras igrejas da Asia Menor. 3. O anjo da igreja em Esmirna, O pastor da igreja em Esmirna, a quem o Senhor Jesus chama de anjo, era provavelmente Policarpo (69- 155). Origindrio de uma familia crista, ele sempre se identificou como discipulo do Evangelista, a cujos pés assentava-se, ainda crianga, a fim de Ihe ouvir as historias do Nazareno. Foi o proprio apésrolo quem o teria ordenado como pastor de Es- mirna, Policarpo era hontado em todo o Oriente em virtude de sua sa- bedoria, justica e amor. Ortodoxo ¢ biblico, jamais parou de combater as heresias semeadas pelos obreitos da iniquidade, Nunca deixou de imolar- se pelo Reino ¢ de oferecer-se em holocausco pelo Rei Ele era amigo intime do tedlogo Irineu ¢ de Ignacio, bispo de Antioquia. Certa vez, viajou para Roma. fim de aviscar-se com Aniceto, Ali, re- presentou as igrejas da Asia Menor num concilio convocado para discutir a data a ser observada na celebracao da Pascoa. Embora jamais tivessem chegado a qualquer acordo, Policarpo ¢ Aniceto mantiveram ume gratifi- 46 Essunos, a Tones Conressan ree MARTIB cante comunhao. Ainda em Roma, deparou-se com o herege Marcion, a quem logo apelidou de primogénito de Satanés. © martirio de Policarpo, ocorrido em 155, foi descrito numa carta que a igreja em Esmirna enderecou a sua coirma em Filomélio. A missiva narra que o procénsul romano, Antonino Pio, tudo fez a fim de persuadi- lo a renegar a santissima fé. Afinal. por que um homem, em sua idade, haveria de enfrentar tamanho softimento? O irmao Policarpo, contudo, sustenta um firme testemunho diante do algoz: “Tenho servido a Cristo por 86 anos. Ele nunca me fez nada de mal. Como iria eu, agora, blas- femar contra o meu Rei? Ele deu a sua vida por mim, salvando-me dos meus pecados. Eu sou um crente!” Ii. A APRESENTAGAO DO MISSIVISTA Estas coisas diz o primeira eo tiltimo, que esteve morto e tornou a viver. (Ap 2.8) A.uma igreja ameacada no tempo, apresenta-se Jesus como a prépria eternidade (Is 9.6). Ele € 0 primeizo ¢ 0 tiltimo. Por isso os crentes de Esmirna nada precisavam temer. Seus inimigos podiam até tirar-lhes a vida temporal, mas cram incapazes de privé-los da eterna. Entao, por que se aborrecer com o império de Satanas se cram cidadaos do Reino de Deus? Logo, os romanos, embora possuissem suficiente autoridade para condené-los A fogueira, nenhum poder tinham para langé-los no lago de fogo. Nao foi o que nos assegurou o Senhor? (Mt 10.28). O pastor da igreja em Esmirna consola-se até mesmo diante da pré- pria morte, pois o seu Redentor “esteve morto ¢ tornou a viver”. E sendo © Primeiro ¢ o Ultimo, protagoniza a Histéria como Rei dos reis e Senhor dos senhores. No princfpio de todas as coisas, fez-se presente; na consu- magao de tudo, nao estard ausente. 1. Jesus, o primeiro ¢ 0 tiltimo. Sé Jesus pode controlar soberana- mente 0 tempo: Ele é 0 Pai da Erernidade. Nessa condi¢ao, apresenta-se ao anjo de Esmirna como o Primeiro ¢ o Ultimo. Fle jé estava no Pai antes que todas as coisas viessem a existir, e estard com os redimidos, em Deus, quando tudo for consumado: “Quando, porém, todas as coisas Ihe estiverem sujeitas, entao, o préprio Filho também se sujeitard Aque- le que todas as coisas Ihe sujeitou, para que Deus seja tudo em todos” (1 Co 15.28, ARA). 47 Os Sen Castigais DE OURO. Se Jesus ¢ 0 Primeiro ¢ 6 Ultimo, que poder tem a morte sobre Ele? © Filho do Homem, de fato, morreu no tempo, mas nunca deixou de existir na eternidade como o Verbo Divino. No principio, Deus criou nFle, através dEle ¢, para Ele, os céus ¢ a terra, Sem Ele, nada existiti “Todas as coisas foram feitas por intermédio dele, e, sem ele, nada do que foi feito se fez” (Jo 1.3, ARA). Alids, a primeira coisa que Fle criouw foi justamente o tempo. E quem melhor para gerar o tempo, senao o Pai da Frernidade? (Is 9.6). ‘Acerca da natureza eternal de Cristo, escreve © tedlogo norte-ameri- cano Thomas Paul Simmon: “A preexisténcia de Cristo significa sua exis- téncia antes da encarnacao. Jesus existiu desde toda a eternidade, a Biblia © ensina mui claramente”. Por isso, nado devemos temer nem o inicio, nem o fim das coisas; nele temos a vida eterna. Se o mundo encara a morte como 2 maior das perdas, 0 cristo a enxerga como o maior dos ganhos. Foi o que declarou Paulo j ximo de seu martirio: bem pr Porque estou certo de que isco mesmo, pela vossa stiplica € pela provisto clo Espirito de Jesus Cristo, me redundaré em libercagio, segundo a minha ardente expectativa ¢ esperanca de que em nada seret envergonhado; antes, com toda a ousadia, como sempre, cambén agora, seri Cristo engrandecide no meu corpo, quer pela vida, quer pela moste. Porquanto, para mim, o viver é Cristo, ¢ 6 morrer é lucro. (Fp 1.19-21, ARA) Jesus consola 0 anjo de Esmirna com a promessa da vida eterna. Aquele pastor sabia agora que, morrendo no tempo, continuaria a viver na eternidade. E, quando do arrebaramento da Igreja, levantar-se-d do pd da terra, para receber a sua incorruptivel heranca. 2. Jesus, 0 que esteve morto ¢ tornou a viver. © bispo de Esmirna viria a glorificar a Deus através do martirio. A morte que o esperava, conquanto indescritivel, destruir-Ihe-ia 0 corpo, mas seria incapaz de desfazer-Ihe a alma. A finn de ungi-lo para essa hora, Jesus apresenta-se a ele como o “que esteve morte ¢ tornou a viver” (Ap 2.8, ARA). A morte € a ressurreis o de Cristo séo a principal doutrina do Nove Testamento. Realcando a importancia deste artigo de f, protesta o apéstolo: “BE, se Cristo do ressuscicou, € va a vossa fé, ¢ aincla permancccis nos vossos pecados” (1 Co 15.17). Se © sepulcro houvesse retido a Criswo, nao teriames qualquer motivacdo para segui-lo, conforme escreve 0 inmao Paulo: “Se a nossa esperanga em Cristo se limita apenas a esta vida, somos os mais infelizes 48 Essinna, a lores Convessanre & MART de todos os homens. Mas, de fato, Cristo ressuscitou dentre os mortos, sendo ele as primicias dos que dormem” (1 Co 15,2021, ARA). O apéstolo deixa bem claro aos corintios: se Cristo morreu ¢ ressus- citou, nds também, embora ainda sujeitos & morte, nao seremos aprisio- nados por ela. Fle acrescenta, igualmenze, que nem todos morreremos, mas todos seremos transformados em glétia quando do arrebatamento da Igreja (1 Co 15.51). Firmados nessa bendita esperanga, os seguidores de Jesus sofrem a morte no presente, porque j4 desfrutam da vida no porvir. O escritor francés Michel Quoist (1921-1997), ao avaliar os efeitos da morte na vida do crente, declara: “Para um cristéo nao existe a morte, ou melhor, ela é um simples ponto de partida, endo um termo”. Por isso, Policarpo encarava gloriosamente o seu martirio. Ele achava-se mais do que cénscio: no exato momento em que fechasse os olhos na terra, abri- los-ia na Jerusalém Celeste. Ill. APOBREZA EA TRIBULACAO DE ESMIRNA Conheco a tua tribulagdo, a tua pobreza (mas tw és rico) e a blasfémia dos que asi mesmos se declaram judeus e nia séo, sendo, antes, sinagoga de Satands. (Ap 2.9, ARA) Domiciano era cultuado divinamente em Esmirna. Sua imagem, sempre talhada em finissimo mdrmore, podia ser vista nos edificios ofi- ciais, nas pragas e até mesmo nas esquinas mais acanhadas da cidade. No templo que lhe dedicara a municipalidade, o cruel imperador recebia os mais exaltados louvores daqueles que, embora lhe conhecessem a tolice, nenhum problema queriam com os romanos. Se alguém néo lhe reco- nhecia a divindade, era despedido de seus empregos, tinha a casa confis- cada e arriscava-se a ser condenado & morte. Os santos de Esmirna, porém, nao estavam dispostos a transigir com a sua £é. Firmados no Deus Unico e Verdadeiro, confessariam o nome de Cristo diante do carrasco. Por causa de seu testemunho, tiveram de aban- donar suas profissées e jd nfo estavam na posse de seus haveres. E, agora, encontravam-se na iminéncia de perder a prépria vida. Sua tribulagdo, porém, nao era desconhecida por Jesus. 1. Tribulagao. Esmirna era a igreja menos atrativa da Asia Menor. Em virtude de sua confissio, perseguiam-na os romanos, e os judeus, inexplicavelmente, a hostilizavam. Até mesmo algumas de suas coirmas a 49 Os Sure Casticats ps QuRo evitavam. Definitivamente, nao era um bom negécio buscar a comunhao com uma igreja pobre ¢ socialmente excluida. Ninguém ajuizado arris- car-se-ia por uma congregacao posta & margem da lei em consequéncia de um posicionamento extremado. Afinal, por que nao admitir, pelo menos formalmente, que César era senhor? Se ela o fizesse, cairia nas gracas das autoridades ¢ tudo ficaria bem. No entancto, uma igreja confessante jamais transigira com a sua fé. Ela estava ciente de que a sua salvacao dependia de uma perseveranga que vai até o fim. O momento nao era de leniéncia ¢ acomodagées; aquela hora exigia um comprometimento singular com o Cristo de Deus. No auge de sua angustia, porém, Esmirna recebe uma carta de Jesus através do Evangelista. Entre outras coisas, garante-lhe o Senhor estar ciente de todas as suas provacées: “Conhego a tua wibulacdo” (Ap 2.9, ARA). Logo, ela ja nao estava sozinha nem isolada. Jesus estava ao seu lado. Onisciente que é, Ele conhecia com exatidao as vicissitudes que lhe acabrunhavam o pequeno e humilhado rebanho. 2. Pobreza. Jé imaginou uma igreja sem dizimos, nem ofertas? Se ri- queza é sinal de aprovago divina, Esmirna ja havia sido reprovada havia muito tempo. Sua pobreza era tal que nao lhe possibilitava, sequer, manter um templo na periferia da cidade. Ela nao possuia tesouro nem tesoureiro Os seus membros, por haverem se recusado a adorar a Domiciano, haviam perdido empregos ¢ status social. E néo eram poucos os que viram os seus bens confiscados pela receita imperial. Na verdade, os irmaos de Esmirna nao contavam nem com o indispensével para a subsisténcia didria. Nao sei que conselhos alguns de nossos tedlogos dariam a Esmirna. Talvez dissessem tratar-se de uma igreja retrégrada e sem visio adminis- trativa. Depois de muito arengar, ensinar-the-iam alguns truques para atrair os mais abastados. E nao deixariam de mostrar-he como induzir os crentes a por de lado os scus compromissos, a fim de atender as de- mandas, sempre crescentes, do capitalismo eclesidstico. Dessa maneira, a igreja seria dirigida como se fora uma empresa. E, para arrematar os seus pareceres, apresentar-lhe-iam um meétodo xevoluciondrio de crescimento financeiro, Nao demoraria muito para surgir mais uma megaigreja: rica, grande e cheia de crentes vazios. A igreja em Esmirna, porém, nao estava interessada nesses artificios e truques. O que ela pretendia mesmo era agradar ao Senhor. Se fosse necessario, oferecer-Ihe-ia a prépria vida. 50 _ Pours, « Joep Conre Numa cidade como Esmirna, onde o status de um homem era me- dido pelos bens que ostentava, os crentes eram vistos como pdrias, Sem emprego, sem teto e sem pao, assemelhavam-se ao Lazaro que mendigava sob a mesa do rico avarento (Le 16.20-25). E ainda corriam o risco de ser detidos por vadiagem. Jesus, porém, estava ciente de sua pentiria: “Co- nhego a tua pobreza” (Ap 2.9, ARA). O vocabulo prdcheia, usado pelo Senhor, descreve alguém que se acha em extrema miséria. Serd que as igrejas da Asia Menor nao se comoviam com as provacées de Esmirna? A Laodiceia nada faltava. Efeso também era préspera. As ou- tras, pelo que consta, ndo enfrentavam problemas financeiros, Entéo, por que nao vieram em socorro da coirma? Apesar de sua vocacéo universal, nao conseguiam transcender-se localmente. Nao estamos nés agindo de modo semelhante? Agarrados as nossas yonas de conforto, recusamo-nos a ver a Igreja de Cristo em seu conjun- to. E, assim, nao mais nos importamos com os irmaos que, diariamente, sao torturados por amor a Cristo. O que temos feito pela igreja mértir? Ou pelas igreja > traradas como se estivessem s que, embora vizinhas, s em outro hemisfério? 3. A riqueza na pobreza. Apesar de sua extrema pobreza, Esmirna era mais rica do que as igrejas que, 4 semelhanga de Laodiceia, profes sam uma teologia capitalista. Os bens destas so contados no tempo; os daquela sao incontdveis na eternidade. E 0 que afirma Jesus ao anjo de Esmirna: “Mas tu és rico” (Ap 2.9). Laodiceia presumia-se abastada, mas nao sabia que era, além de miserdvel, cega. Enquanto isso, Esmirna ex- trata, de sua extrema pobreza temporal, bens eternos ¢ impereciveis. Esmirna nao tinha ouro nem prata. Mas ainda era capaz de professar, com ousadia, o nome de Jesus. E Laodiceia? Com todo o seu dinheiro, podia fabricar sinais ¢ prodigios como Janes ¢ Jambres. Seus embustes, to- davia, logo seriam descobertos. Nao sao poucas as igrejas que andam a in- ventar milagres. E como sao convincentes. Aproveitando-se dos recursos da midia e, tendo sempre & sua disposigao um bom diretor de efeitos especiais, até fogo fazem cair do céu. Mas, quando as luzes se apagam ¢ 0 cenario é desmontado, j4 no podem ordenar ao paralitico: “Levanta-te e anda”, Para ser espiritualmente rica, uma igreja nao tem de empobrecer-se materialmente. Ela s6 precisa fazer uma coisa: reconhecer a suficiéncia de Cristo. Somente os tolos confiam nas riquezas terrenas que, por mais avultadas, sempre acabam batendo asas (Pv 27.24). 51 Os Serr Casticais DE Ouro 4, Blasfémias. Além de sua extrema pobreza, Esmirna enfrentava também uma campanha de difamacao e caltinia, promovida por uns in- dividuos que, mentindo, apresentavam-se como judeus. Nao sabemos exatamente quem era essa gente. Talvez algum grupo herético gentio que, buscando impor os costumes judaicos as igrejas da Asia Menor, esperava, com isso, tirar algumas vantagens econdmicas e sociais. Fizeram-se eles t4o nocivos & obra de Deus que Jesus os chama de “sinagoga de Satanas” (Ap 2.9). Posto que Esmirna nfo Ihes aceitasse as imposigées, puseram- se a blasfemar o bom nome de seu pastor. O que eles nao sabiam é que, atacando o pastor da igreja em Esmirna, estavam, na verdade, ofendendo gravemente o préprio Deus. Movidos por um édio gratuito e inexplicdvel, os falsos judeus fize- ram daquela pobre igreja 0 segmento social mais odiado de Esmirna. Na Segunda Guerra Mundial, algumas igrejas levantaram-se contra a tentativa de Hitler de nazificar o cristianismo alemao. A maioria das comunidades evagélicas, porém, optou por abragar a sudstica, Houve in- clusive tedlogos que se esforgavam por mostrar que Jesus no nascera judeu, mas ariano. Enquanto isso, os pastores que se recusavam a aceitar © nazismo eram enviados aos campos de concentragao, onde muitos fo- ram executados. O caso mais célebre foi o do pastor Dietrich Bonhoeffer (1906-1945). Membro-fundador da Igreja Confessante, uniu-se & resis- téncia € exortou os cristaos alemaes a nao aceitar a nazificagdo da igreja fundada por Martinho Lutero ¢ a condenar, energicamente, 0 holocausto judaico. A situacdo nao mudou. S6 hd uma forma de se evitar a contrariedade € a perseguicéo: tomar a forma do mundo e aceitar-lhe a cultura pecadora ¢ iniqua. Sendo, preparemo-nos para enfrentar caltinias, difamacoes e até a prépria morte. IV. A TRIBULAGAO QUE ESTA POR VIR Nao temas as coisas que tens de sofver. Bis que 0 diabo estd para langar on prise alguns dentre vis, para serdes postos & prova, ¢ tercis tribulacdo de dez dias. (Ap 2.10, ARA) Tribulagées ainda maiores estavam por vir sobre os crentes de Es- mirna. Uns seriam presos ¢ outros, condenados & morte. Mas se 0 Diabo supunha que com as suas investidas langaria a congregagao no atoleiro do 52 Esurews, 4 Isrega Conressanre © MAKIIR desanimo, estava enganado. Aquele aprisco dispunha-se a encarar todas as adversidades por amor a Cristo. Os cristéos ocidentais talvez nao tenham condicoes de avaliar a an- guistia de Esmirna. Afinal, viveros numa democracia que, embora im- perfeita, garante-nos a liberdade de culto. Os orientais, entreranto, sa- bem o que isso significa. Reunindo-se em cavernas ¢ ao descampado, arriscam-se todos os dias por sua fé. Apesar de tudo, nada temem. Os que 0s perseguem no tempo nao podem atemorizé-los na eternidade. 1. “Nao temas”. Quando Hitler fazia 0 que bem entendia por toda a Europa, alguém perguntou ao tedlogo alemao, Martin Niemiiler, se ele nao temia ao cruel ditador. O corajoso cristao foi resoluto e firme: “Temo muito mais a Deus”. Ele era animado pela voz de Cristo: “Nao temas’. Por isso, perseverou até ao fim. Os crentes de Esmirna também nada temiam. Alguns eram presos. Outros tinham os bens confiscados. E ainda outros eram enviados & are- na. Mas todos caminhavam placidamente em diregio ao sactificio final, por jé estarem desfrutando da vida em Cristo. Em sua alma, as palavras do Senhor: “Nao temas”. 2. Diabo, 0 promotor das perseguicées. Paul E. Holderaft afirmou, certa vez, que “o Diabo pode estar fora de moda, mas nao de suas maléficas atividades”. Como discordar de Holderaft? Se num hemisfério, deleita-se em oprimir fisicamente a Igreja de Cristo, no outro, alegra-se em pressionz la cultural e institucionalmente. S6 nos primeiros dois séculos, promoveu dez grandes ataques contra os cristdos. E, hoje, atribula as igrejas da Africa, deprime as da China, ameaga as do Oriente Médio, ¢ no Ocidente, tao livre e democrdtico, acabrunha os filhos de Deus com suaves incursées. Quando as sutilezas falham, parte ele para a truculéncia. Por isso, Jesus previne o anjo de Esmirna: “Eis que 0 diabo esta para lancar em prisao alguns dentre vés” (Ap 2.10, ARA). Se era 0 Diabo, e nao propriamente Roma, que atentava contra a Igreja de Cristo, a luta dar-se-ia nao na esfera fisica, mas na espiritual. Nesse momento, o pastor de Esmirna lembra-se do que Paulo en efésios: a nossa luca revera ac nao é contra o sangue € a carne, ¢ sim contra os principados ¢ potestades, contra os dominadores deste mundo tenebroso, contra as forgas espi- rituais do mal, nas regiées celestes” (Ef 6.12, ARA). Portanto, eles nao deveriam assustar-se com a priséo que os aguardava. 53 Os Sere Casticars pr Quro 3. A prisao e a prova. Os romanos nao tinham como politica pa- blica a ressocializacao dos delinquentes. Suas prisdes eram uma espécie de sala de espera, onde os inimigos do império, sob intensa tortura fisica e psicolégica, aguardavam a morte. As celas mal ventiladas e fétidas nao passavam de um depésito de gente. Haja vista a Prisio Mamertina locali- zada no férum da antiga Roma. Quem a visita, tem a impressao de estar num sepulcro. Segundo a tradigao catélica, o apéstolo Pedro teria ficado af até a sua crucificagio. ‘A prisdo de Esmirna nao diferia muito da Mamertina. Nesta, 0 Dia- bo cm breve encerraria alguns crentes, conforme thes adverte o Senhor Jesus: “Eis que o diabo esta para langar cm prisio alguns dentre vés, para serdes postos & prova, ¢ tereis tribulagao de dez dias.” (Ap 2.10, ARA). Uma leitura superficial do texto dé-nos a impressdo de que, apés os dez dias de encarceramento, aqueles crentes seriam soltos © tudo voltaria ao normal. Mas nao é 0 que o contexto dé-nos a entender. Na verdade, apés 0 aprisionamento, viria a execucdo da pena capital. Foi por isso que © Senhor Jesus consola-os com a promessa da vida eterna. A morte daqueles homens ¢ mulheres seria precedida por uma tribu- Jago singular. E 0 que inferimos destas palavras de Cristo: “para serdes postos a prova”. O vocdbulo grego peirazd nao significa apenas prova; dé-nos a ideia também de um teste a que somos submetidos, a fim de que a nossa fé ¢ virtude sejam devidamente averiguadas. A. tribulagio duraria dez dias, mas naquele cdrcere, ¢ sob aquelas condicées, pareceria um século. Que a morte, entao, viesse, pois no além achariam eles a re- compensa eterna. V. IGREJA CONFESSANTE E COROADA Sé fel até a morte, ¢ dar-te-ei a coroa da vida. (Ap 2.10) Os crentes langados na prisio de Esmirna sabiam muito bem o que os aguardava. Nao haveria livramento. Nenhum anjo apareceria para arrancé-los do calabougo, nem para arrebaté-los da arena. Através do martitio, viriam a glorificar a Deus. No entanto, achavam-se tranquilos. Apesar da expectativa de uma morte lenta cruel, muito em breve have- riam de receber a coroa da vida. Vocé € eu nao sabemos quando seremos coroados com a vida eterna. Mas aquelas testemunhas de Jesus ja estavam em contagem regressiva, para 54 _ Essie oi ToReIA Conressanre Maik entrar no gozo de seu Senhor. Na cela apertada e imida, iam eles compu- rando os dias, de tras para frente, com ansiosa alegria, porque j4 viam 0 Unigénito em pé, a destra de Deus, para recebé-los na casa do Pai. 1. A fidelidade. Afirmou William Gurnall (1617-1679) que “Deus nao quer nada mais do que a fidelidade de nossa parte”. O tedlogo brita- nico busca realcar, nessa curta declaracao, ser a fidelidade um dos princ pais atribucos de Deus, Ele ¢ fiel & sua palavra, as suas criaturas € ao plano de redencio que estabeleceu por intermédio de seu Unigénito. Por isso, demanda de cada um de seus filhos a mesma fidelidade. Naquele momento de agonia, Jesus Cristo, o Fiel ¢ Verdadeiro, esta- belece uma alianca bastante particular com os crentes que, dentro de dez dias, estariam caminhando num circo romano, para selar a santissima fé por meio do martirio, S6 hd uma forma de se escapar ao suplicio: negar © Filho de Deus. Eles, porém, nao estao dispostos a fazé-lo, pois ja visuali- zam as tuas ¢ logradouros da Jerusalém Celeste. Os termos da alianca que Jesus estabelece com a igreja confessante em Esmitna séo simples, mas singularmente eficazes: “Sé fiel até A mor- te, € dar-te-ci a coroa da vida” (Ap 2.10). A palavra grega traduzida em portugués como fidelidade é bastante abrangente. O vocabulo pistos sig- nifica: confianga, credibilidade, fé e fidelidade. Por conseguinte, tinham eles suficiente razao para cter em cada palavra de Cristo. Se 0 Senhor Ihes requeria a vida no tempo, era porque tinha autoridade para dar-lhes uma existéncia infinitamente melhor na eternidade. Ninguém mais, a nao ser Jesus, tem permissao para exigir-nos semelhante coisa. Ele 0 faz, porquanto do Pai recebeu todo o poder nos céus ¢ na terra. “Aqueles crentes foram executados como inimigos do Império Roma- no ¢ parias dz humanidade. Aos olhos de Deus, contudo, eram os mais nobres dos homens. Segundo a histéria, o pastor de Esmirna nao foi executado nessa ocasiao. Ele ainda tinha muitas ovelhas a confirmar até o seu martirio, no ano 155. 2. A coroa da vida. Esmirna era afamada também por suas lar uadigées esportivas, Quando dos jogos ptiblicos, atletas de coda a Asia Menor ali se reuniam ansiosos por quebrarem os préprios recordes, con- quistar uma coroa de louro e, quem sabe, obter uma generosa pensao vi- talicia. Nem sempre aqueles bravos e disciplinados rapazes recebiam um prémio em dinheiro. Entretanto, a expectativa de se chegar a terra natal ostentando um galardio compensava qualquer sacrificio. 55 Os Sera Casti¢als pk Ougo Nesses mesmos estédios, os campedes de Cristo apresenrar-se-iam dentro de dez dias. Como ja estavam todos classificados, nao teriam de submeter-se a nenhuma prova eliminatoria. Necessitavam apenas de uma coisa para obter a coroa da vida: fidelidade até morte. As provas seriam indescritiveis. Uns seriam submetidos ao fogo. Outros enfrentariam as feras. Ainda outros se veriarn frente a frente com as lancas romanas. Nao obstante, deixariam o estédio da provagao para serem introduzidos no pavilhao da gloria celeste. A coroa que estavam prestes a receber era mui- to mais preciosa do que o laurel oferecido aos atletas gregos. Nem 0 ouro todo deste mundo poderia compré-la. Vi. OS DANOS DA SEGUNDA MORTE Quem tem ouvidos, ouca o que o Espirito diz as igrejas: O vencedor de nenbum modo softerd dano da segunda morte (Ap 2.11, ARA) Ambrosio (340-397), discorrendo sobre a brevidade da vida huma- na, afirmou: “A morte €, para o justo, um porto de salvagao; mas aos olhos do culpado, assemelha-se a um naufrigio”. Nao posso discordar do piedoso ¢ douto pai da igreja. Apesar de tudo, a experiéncia terminal jamais deixou de ser traumatizante. Diante da morte, o proprio Cristo chorou (Jo 11.35). E, jd prestes a prova-la, rogou ao Pai: “Se queres, passa de mim este calice; contudo, nao se faga a minha vontade, ¢ sim a tua” (Le 22.42, ARA). Se a morte fisica € algo to indesejavel ¢ terrivel, o que nao diremos da segunda morte? Vejamos, em primeiro lugar, 0 que é a morte como a conhecemos. 1. A primeira morte. A morte é descrita, tecnicamente, como o tér- mino do ciclo vital de um organismo. £ 0 fim de uma vida. Oriunda do vocabulo latino mors, a palavra morte recebe estes sinénimos em portu- gués: dbito, falecimento e passamento. Por acreditarmos na ressurrei¢ao do corpo fisico ¢ na vida eterna, emprestamos a morte alguns eufemismos bastante poéticos. Quando fa- lece um irmao na fé, costumamos dizer que ele passou para o Senhor. Ou que foi recolhido as mansées celestes. Ou, ainda, que foi promovido A gloria. Segundo escreveu Michel Quoist (1921-1997), “para um cristéo 56 a Exsaunna, a Toney Conressanre & Mii no existe a morte, ou melhor, ela é um simples ponto de partida, e nao um termo”, Alids, o que nos deve assustar nao é a morte do corpo, mas 0 que o Senbor Jesus chama de segunda morte. 2, A segunda morte. A morte eterna, ou segunda morte, é a sepa- racéo definitiva e irremedidvel entre o pecador e Deus. E mais do que a morte espiritual. Se esta pode ter os seus efeitos anulados pelo sangue de Cristo, aquela nao, por haver o impenitente rejeitado sistematica e cons- cientemente o sacrificio do Filho de Deus. No Apocalipse, a segunda morte é 0 lago de fogo. Nesse lugar de indescritiveis horrores, os impenitentes, juntamente com o Diabo e seus anjos, serao atormentados dia ¢ noite (Ap 14.11; 20.10). © lago de fogo, onde o préprio inferno seré lancado, é um lugar real ¢ nao um estado de espitito, como supdem alguns tedlogos. Esse local ¢ conhecido também como trevas exteriores (Mt 8.12). Ai, haverd choro e ranger de dentes. 3. A promessa de vida eterna, Tendo em vista os horrores da segun- da morte, os crentes de Esmirna, que em dez dias seriam martirizados, caminharam resolutamence diante do carrasco. Em seus ouvidos, soava a promessa do Senhor Jesus: “O vencedor de nenhum modo sofrerd dano da segunda morte” (Ap 2.11, ARA). Embora cruel e dolorosa, a primeira morte nada era se comparada a segunda, Esta durard enquanto perdurar a eternidade. Aquela, quando da ressurreicao, serd revertida em vida, O que mais motivava os crentes de Esmirna nao era 0 medo da morte eterna, mas 0 incontido amor que nutriam pelo Cordeiro de Deus. Esta é a razao de ser de toda igreja con- fessante e martir. Conclusao Nao eram sete as igrejas da Asia Menor? E nao estavam elas localiza- das numa mesma area? Por que, entao, Esmirna achava-se tao isolada em seus apertos ¢ anguistias? Sua pobreza ¢ tribulagao eram notérias. Todavia, nenhuma de suas coirmas prontificou-se a socorré-la. A rica Laodiceia dis- traia-se com a prosperidade de sua teologia. F-feso, por seu turno, absorvia- se num ativismo insano ¢ fatal. Pérgamo achava-se as voltas com a doutrina de Balaao. Tiatira buscava livrar-se de Jezabel. Sardes havia morrido e ainda nao o sabia. Quanto & Filadélfia, actedito que, amando indistintamente a 57 Os Sere Casricats bk OuRO. codos os irmaos, haveria de estender a mao a Esmirna. Pelo menos é 0 que se espera daqueles que ainda amam com o primeiro amor. Elas faziam parte da Igreja Invisivel e Universal. No entanto, sua perspectiva era ainda bem local. Nosso horizonte, as vezes, nao vai além 10 se abre além de um determinado contexto sécio- das instiruigées en politico. Que a igreja ocidental venha a preocupar-se, de fao, com as suas congéneres que, neste momento, s4o perseguidas no oriente. A semelhan- ca de Fsmirna, essas igrejas sio pobres ¢ atribuladas, mas nao abrem mao de sua confisséo ¢ nao fogem ao martirio. 58 Ao anjo da igreja em Pérgamo escreve: Estas coisas diz aquele que tem a espada afiada de dois gumes: Conheco 0 lugar em que habitas, onde estd 0 trono de Satands, e que conservas 0 meu nome e nio negaste a minha fé, ainda nos dias de Antipas, minha testemunha, meu fiel, 0 qual foi morto entre vds, onde Satands habita. Tenho, todavia, contra ti algumas coisas, pois que tens ai 05 que sustentam a doutrina de Balado, 0 qual ensinava a Balaque a armar ciladas diante dos filhos de Israel para comerem coisas sacrificadas aos idolos e praticarem a prosti- tuigdo. Outrossim, também tu tens os que da mesma forma sustentam a doutrina dos nicolattas. Portanto, arrepende-te; ¢, se ndo, venho a ti sem demora e contra cles pelejarei com a espada da minha boca. Quem tem ouvidos, ouga 0 que 0 Espirito diz as igrejas: Ao vencedor, dar-the-ei do mand escondido, bem como the darei uma pedrinha branca, e sobre essa pedrinha escrito um nome novo, 0 qual ninguém conhece, exceto aquele que 0 recebe. (Ap 2.12-17, ARA) Introdugao Quando Satands nao consegue destruir a Igreja de Cristo como 0 ledo que a tudo devora, esgueira-se, entre os santos, como a velha e ma- treira serpente. Aqui, instila uma heresia. Ali, encanta os desavisados com inovacées e modismos. Mais além, apresenta-se loquaz e irresistivel, in- Os Si Castigats pe Ouro duzindo até mesmo os mais precavidos A apostasia. Finalmente, como a sucuri do Amazonas, constringe e sufoca os ministros do Senhor até inibir-lhes a reagao. Nao demora muito e o adversdrio entroniza-se na casa de Deus. F, dai, quem poderd expuls4-lo? Foi o que aconteceu a igreja em Pérgamo. Primeiro, vieram os discipulos de Balaao que, sob 0 manto de uma espiritualidade afetada e exética, logo acharam guarida naquele aprisco. Depois, chegaram os nicolaitas que, embora atrevidos ¢ afoitos, também nfo encontraram dificuldades para se acomodar entre as pobres ¢ despro- tegidas ovelhas. Quando 0 ministério local deu por si, jd nao havia mais nada a fazer. O terreno jd estava tomado pelo inimigo. E o pastor da igre- ja? Ele sabia que a situagao era grave, mas nao ignorava o que acontecera ao seu antecessor, Ao opor-se aquela situagéo, o destemido Antipas foi assassinado pelo grupo que sustentava 0 trono de Satands. As coisas, porém, nao haveriam de continuar assim. Enojado com aqueles desmandos, o Senhor Jesus envia uma carta ao anjo de Pérgamo, por intermédio de Joao, urgindo-o a retomar 0 cajado ea reconduzir-lhe o rebanho na sa doutrina. Se ele nao 0 fizesse, 0 proprio Cristo batalharia contra os iniquos com a espada que lhe sai da boca. Como estao nossas igrejas? Sera que, de alguma forma, nao permiti- mos que o Diabo se entronizasse entre nés € nao o percebemos? E hora de reagir contra o império das trevas. I. A CIDADE DE PERGAMO As realizagées da cidade de Pérgamo logo se fizeram lendarias. Ela sabia como industriar 0 pergaminho e produzir livros de excelente qua- lidade. Sua biblioteca sé era superada pela de Alexandria. Na medicina, achava-se bastante adiantada, apesar da supersticao que Ihe eivava os hos- pitais ¢ escolas. Quanto 4 arquitetura, que as ruinas lhe testemunhem o bom gosto e a imponéncia. Basta transitar por seus sitios arqueolégicos para impressionar-se com os restos de seu anfiteatro, templos e 0 que the ficou das pracas e ruas. 1. A histéria de Pérgamo. Nao ¢ fécil indicar com exatidao o inicio da histéria de Pérgamo. Suas origens jazem envoltas em densa e confusa mitologia. Diz uma lenda que foi em seus termos que teria nascido Zeus. Dai os muitos templos e altares dedicados ao feitor dos deuses gregos. 60 Percasto, a Torey Casaba com 0. Muxbo Os antigos acreditavam também que a cidade havia sido fundada por Pérgamo, filho de Neoptolemo ¢ Andrémaca. A poesia nao dé ne- nhuma indicagao de onde precisamente morava 0 casal, ¢ em que século comegou a saga de seu filho. A crendice diz apenas que, depois de alguns desgostos na casa paterna, a javem chega 4 Asia Menor, onde enfrenta titas e sernideuses. Jé triunfante em todas as batalhas, Pérgamo funda um reino ao qual da o seu nome. Depois disso, nenhuma noticia hé sobre a vida do intrigante e misterioso heréi. O que sabemos de conereto é que a cidade de Pérgamo j existia no século VII « Numa época quase imemorial, seus guerreiros puscram-se a conquistar a regiéo costeira da Asia Menor ¢ lhe foram alargando os limites em C. Seus primeiros colonizadores cram de origem edlica. diregao a0 Egeu. Mais tarde, atacados pelos gauleses, eles os venceram, encerrando-os no interior do continente. No século II d.C., ainda havia na cidade uma interessante pintura que celebrava a vitéri sobre a Glia. de Pérgamo No periodo helenistico, a cidade foi escolhida como sede da dinas- tia atdlida que, sem poupar investimentos, logra transformé-la numa das mais sedutoras metrépoles da época. Templos e escolas de medicina sio construfdes. Sua acrépole deslumbrava-se ao sol. Em 133 a.C Azallos HII legou o Reino de Pérgamo aos romanos. No século VIII d.C., os arabes invadem a cidade, arruinam-lhe os 5 0 Tei monumentos € lhe vandalizam os edificios publicos. Seus moradores, porém, ignorando a sanha dos adversarios, reconstroem a acrépole. Eles nao permitem que o passado de Pérgamo seja apagado. Em 1330, a cidade passa ao dominio dos otomanos que, na ansia por eliminar-lhe a meméria crista, juncam-na de mesquitas e bazares. Nao demoraria para que a Pérgamo do Apocalipse fosse confinada aos sitios arqueoldgicos, O seu territorio, hoje, € ocupado pelo municipio turco de Bergama. Sobre 0 destino da grande cidade, escreve 0 Dr. Herbert Lockyer: “Hoje em dia Pérgamo é uma cidade insignificante de ruinas imponentes. Como muitas cidades histori s, sua gléria passou. Por entregar-se & adoragao da natureza, o que sempre leva & destruicdo ¢ A corrupeao, Pérgamo ja nao existe como cidade viavel”. 2. A geografia de Pérgamo. Pérgamo localizava-se no antigo terri- tério da Misia, as margens do rio Caico, a 30 quilometros do Mar Egeu. Rodeada por altas montanhas, constituia-se numa fortaleza quase incon- 61 Os Sere Castigais pe Quro quistavel. Sobre suas elevagées, os reis atilides construiram suntuosos edificios e templos. © rio Caico, sempre abundante ¢ presente, fez do territrio de Pér- gamo uma 4rea mui propicia & agricultura. 3. A biblioteca e 0 pergaminho. Buscando superar Alexandria, Ata- lo I (241-197 a.C.) resolveu construir uma grande biblioteca em Pérga- mo. Enciumada e percebendo que poderia, em breve, ser superada por Pérgamo, a cidade de Alexandria levou o governo do Egito a nao mais exportar papiro 4 sua rival. Pérgamo, entéo, foi obrigada a procurar um material alternativo. E foi assim que teria surgido o pergaminho. Procedente do vocdbulo grego pergaméne, a palavra pergaminho & 0 nome que se dé a plataforma de escrita e leitura preparada a partir da pele de ovelha. As peles de carneiro ¢ de cabra também eram utilizadas. O termo pergaminho passou, entao, a ser empregado para descrever os documentos escritos nesse material. © pergaminho foi largamente utilizado até a Idade Média. E 56 co- mecow a cair em desuso com a chegada do papel. Acualmente, ele é em- pregado na confeccao de titulos e letras do Tesouro Nacional, em virtude de suas propriedades naturais que Ihe dificultam a falsificag4o. No Brasil, a matéria-prima é preparada no Nordeste. A biblioteca de Pérgamo, que chegou a possuir duzentos mil livros, reve todo o seu acervo ofertado por Marco Antonio 4 Cledpatra em 30 a.C., enriquecendo ainda mais a cidade de Alexandria. 4. A escola de medicina de Pérgamo. Foi em Pérgamo que nasceu 0 famoso médico romano Claudio Galeno (129-217 d.C.). De origem gre- ga, ele ai fundou o Centro Médico Asclepium. Celebrado também como fildsofo, Galeno escreveu mais de quinhentos trabalhos sobre medicina e satide. Suas teorias dominaram a ciéncia médica do Ocidente por mais de mil anos. Apesar de a maioria de suas obras haver se perdido, sabe-se que as suas investigacées abrangiam as seguintes Areas: terapéutica, fisiologia, patologia, sintomatologia ¢ anatomia. Ele foi um dos mais importantes médicos da histéria. ‘Além do hospital de Galeno, havia em Pérgamo muitas outras cli nicas e escolas de medicina. Mas, conquanto afamadas como centros de pesquisas, eram conhecidas também por suas superstigées. Haja vista os rituais a que se submetiam os pacientes. Eles se deitavam no chao, a fim 62 — Percamo, A lereya Casaba com 0 Muxpo de que fossem tocados pelas serpentes. Acreditava-se que estas tinham po- deres sobre determinadas doencas. F. por isso que o simbolo de Asclépio, o deus da medicina, visivel em toda a cidade de Pérgamo, é usado ainda hoje. Constitui-se num bastao tosco com uma serpente nele espiralada. 5. A religiao de Pérgamo. Apesar de sua biblioteca, escolas e centros culturais, Pérgamo era dominada pela supersticao e por uma idolatria que chegava ao ridiculo, Em 29 a.C,, ela recebeui o privilégio de cultuar 2 Oraviano. Mesmo sabendo que o imperador nao passava de um teles mortal, seus habitantes conferiam-lhe uma adoragao que somente Deus era digno de receber, Todavia, se Roma disse que o homem era um deus, entao que fosse adorado como tal. Pérgamo tinha Atenas por padroeira. Seus altares achavam-se por toda a cidade que, sempre tio religiosa e politicamente correta, jamais deixou de incensar os demais deuses. O templo de Zeus ficava préximo a acrépole. Mais além, erguia-se o altar a Hera, sua esposa. Ao lado © nicho de Dionisio, o deus do vinho. Na acrépole propria- do teatr mente dita, podia ser encontrada a casa de Demétrio, encarregado dos frutos da terra, Um: dos santudrios mais frequentados de Pérgamo era o de Esculé- pio, o deus da cura. Em seu templo, acumulavam-se os enfermos, aguar- dando algum milagre. 6. O altar de Pérgamo. No final do século XIX, 0 arquedlogo alemao Carl Humann empreendeu uma rarefa que parecia irrealizavel. Depois de um cuidadoso planejamento, conseguiu transportar o Altar de Pérgamo, erguido originalmente na entio provincia romana da Asia Menor, para a bela c ilustrada Berlim. Com a persisténcia tao prépria dos germanos, Humann pés-se, j& na capital alem4, a reconstruir o monumento, bloco por bloco, restaurando-lhe a configurag © primiciva. Nao demorou mui- to para que 0 estudioso montasse, na capital filoséfica da Europa, o weno onde se assentara Satand Se o altar ainda hoje causa espanto ¢ admiracao, imaginemo-lo na Pérgamo dos dias de Joao. Nesta obra, cinzelada com tanto engenho, os habitantes da Asia Menor incensavam o imperador romano como se fora um deus. E. ai de quem nao se dispusesse a adord-lo. Mas, na cidade, ha- via um grupo de homens e mulheres dispostos a nao se curvar & criatura, pois nha um firme compromisso com 0 Criador. 63 Os Sern Casticats DE Ouro Il. A IDENTIFICACAO DO MISSIVISTA Ao anjo da igreja em Pargamo escreve: Estas coisas dia aquele (Ap 2.12, ARA) gue wm a espada ufiada de dois gumes © livro de Atos nao registra 0 nascimento da igreja cm Pérgamo. Provavelmente, ela veio a surgir como resultado do trabalho missiondrio desenvolvido por Paulo em Efeso. Nessa ocasiio, toda a Asia Menor foi alcancada pelo Evangelho de Cristo (At 19.10). Quis o Senhor Jesus, cm sua inquestiondvel soberania, incluir Pérga- mo como uma das sete destinatdrias iniciais do Apocalipse. 1.0 como “aquele que tem a espada de dois gumes” (Ap 2.12), Se o momento ssivista. A uma igreja sob intenso ataque, apresenta-se Jesus é de guerra, ele nao acenaré com a paz, Ao comentar a referida passagem, © tcdlogo inglés Matthew Henry € incisive: “A Palavra de Deus é uma espada capaz de cortar pecados € pecadores”. Na cul:ura romana, a espada era simbolo de poder, O yocabulo grego romphaia descreve uma arma longa e bigume, que cevora tanto a direita quanto & esquerd 2. O destinata de Pérgamo, Da carta que lhe enviou o Senhor, por intermédio de Joao, io, Nenhuma informacéo possuimos acerca do pastor infe imos tratar-se de um obreiro fiel e perseverante. Mesmo sob fortis: sima presséo, no recua e jamais renega o nome de Jesus. Mais adiante, volraremos a falar desse valoroso homem de Deus. III. O TRONO DE SATANAS Conheco v lugar em gue habitas, onde estd 0 tono de Satands. (Ap 2.13d, ARA) Ao let a carta que Jesus enderecou a Pérgamo, fico sem saber onde, exatamente, estava o trono de Satands. No remplo de Zeus na acrépole? Ou na igre a de Deus na metropole? De qualquer forma, a intervengdo do Scnhor fazia-se urgente, pois a situacgao dessa igreja insustencadvel. Grande parte dos estudiosos acredita que 0 Senhor Jesus referia-se a0 magnifico altar que os cidadios de Pérgamo haviam consagrado a Zeus em sua ma‘s elevada colina, Quanto a mim, prefiro acreditar que o trono OF we Gat, 4 Tr Casa CoM 0 MUXDO de Satands encontrava-se néo na acrépole, mas na igreja que vinha mili- tando nessa cidade. 1. O dominio de Satanas. © adversério nao poupa esforcos para estender o seu império sobre 0 Reino de Deus. Sendo-lhe impossivel apoderar-se da Igreja Invisivel ¢ Universal, levanta o cetto contra as igre- jas locais. Em Pérgamo, por exemplo, nao teve dificuldades para armar © seu trono entre os santos, pois ali dispunha de eficientes servidores: os discipulos de Balaao ¢ os nicolaitas. O império das trevas, porém, nao contava com a reacao do Reino de Deus. 2. O Reino de Deus reage. Quando oramos ao Pai celeste: “Venha © teu Reino”, o dominio divino manifesta-se poderosamente entre nés, para anular o império do Diabo. No entanto, é indispensavel que tam- bém roguemos a Deus: “Seja feita a tua vontade assim na terra como no céu”, Se nao nos curvamos a essa petigdo, aquela se faz infrutifera, pois o estabelecimento do Reino de Deus esté condicionado ao pleno cum- primento de seu querer. Se este é ignorado, o Rei ausenta-se de nossos negécios. Foi o que aconteceu em Pérgamo, quando o seu anjo optou por conviver com os nicolaitas e os discipulos de Balado. Entretanto, nao podemos ignorar as virtudes desse obreiro. IV. AS VIRTUDES DO ANJO DE PERGAMO vas € Que Conservas 0 meu nome ¢ nao negaste a minha fé. (Ap 2.13b, ARA) Apesar das muitas tribulagées que sobre si recaiam, o pastor de Pér- gamo era um fiel e perseverante confessor. Nao se importava com as ame- acas externas, nem com as adversidades internas. O mais importante para ele era glorificar a Cristo, quer pela vida, quer através da morte. 1, Fidelidade. Sobre a fidelidade, declara Hudson Taylor (1832- 1905): “Podemos trair a Cristo nao somente com a nossa palavra, mas também com 0 nosso siléncio”. O missionario inglés, que santificara 51 anos de sua vida a evangelizagao da China, sabia por experiéncia propria o valor intrinseco dessa virtude. Por isso, encontrou abundantes motivos e, fielmente, nos caminhos de Deus. para mante Fidelidade também era um trago marcante no carater do pastor de Pérgamo, conforme reconhece 0 préprio Senhor: “Conservas 0 65 Os Sere Castigais pr Ouro meu nome”. O verbo grego krated, usado nessa passagem, nao signi- fica apenas conservar; significa, ainda, reter, segurar e perseverar com firmeza. O que conserva 0 nome de Jesus obedece-lhe os mandamen- tos, € cumpre, mesmo com o risco da prépria vida, todos os termos da Grande Comissao. Se nao lhe retivermos 0 nome, o que serd de nds? E hora de nos vol- tarmos ao Novo Testamento, a fim de vivermos a auténtica religido crista. Escreve Samuel T: Coleridge (1772-1834): “O Cristianismo nao é uma teoria ou especulagéo, mas uma vida; nao uma filosofia de vida, mas um processo de vida”. Como discordar do poeta inglés? Quem dessa forma vive o credo de Jesus, retém-he firmemente 0 nome. 2. Perseveranga. Confessar 0 nome de Cristo em Pérgamo equivalia a uma sentenca de morte. Conquanto nao ignorasse o perigo, o pastor daquela intrigante cidade porfiava em professar a santissima fé no Filho de Deus. O proprio Jesus reconhece-Ihe a audaciosa confissio: “Nao ne- gaste a minha f". Por que ele agia dessa maneira? Ele sabia muito bem que, pior do que a morte no tempo, era a morte na eternidade. A palavra grega utilizada por Jesus para expressar 0 ato de negagao é arneoman renegar, rejeitar e abjurar. Logo, quando alguém nega a Jesus, declara que néo 0 conhece ¢ que jamais teve um encontro experimental com Ele. ‘oi o que fez Pedro ao renegar a Cristo. Alids, Joao, em seu evangelho, usa o mesmo termo, acrescido do prefixo apo, para descrever a tripla negagao de peseador. Quem renuncia a sua f em Jesus serd por cle rejeitado: “Portanco, todo aquele que me confessar diante dos homens, também eu 0 confessa- rei diante de meu Pai, que esté nos céus; mas aquele que me negar diante dos homens, também eu o negarei diante de meu Pai, que esté nos céus” (Mt 10.32,33, ARA). 3. Uma fé confessante. Se em Pérgamo era arriscado professar 0 nome do Senhor, no mundo atual nao é menos perigoso. Em nossos dias, muitos so os homens e mulheres executados por confessar a Cristo. Aré mesmo nos paises celebradamente democriticos os cristaos sio perseguidos. Em- bora nao enfrentemos coliseus nem paredées, vemo-nos premidos por uma cultura pecaminosa ¢ por uma liberdade sem liberdade que, usando de sucis artificios, busca amordacar-nos o testemunho cristéo. Que a nossa fé, pois, se levante confessante ¢ que jamais tema o martirio. 66 Iopepa Casaba com 0 Munbo V. ANTIPAS, UM HOMEM CONTRA TODOS va nos dias de Antipas, minha testernunha, meu fiel, 0 qual foi morto entre vds, onde Satands habita, (Ap 2.13c, ARA} Na histéria da Igreja, néo foram poucos os homens que, em mo- mentos de crise, levantaram-se contra todos. Haja vista Jerénimo Sa- yonarola (1452-1498). Em Florenga, 0 corajoso pregador ergue a voz, brada contra 0 pecado e opée-se contra os desmandos da igreja gover- nada por Alexandre VI. Em consequéncia de sua ousadia, € preso e condenado a forca. Ainda nao satisfeito, seus algozes queimaram-lhe o corpo em praga piiblica. Em Pérgamo, também houve um homem que se levantou contra todos. Ele € citado nominalmente por Cristo. Diante da anarquia cria- da pelos seguidores de Balado ¢ pelos nicolaitas, Antipas nada cemeu. Denunciou os hereges, condenou os apéstatas ¢ nao deixou impune os abominaveis. Por isso, resolveram mard-lo Alguns estudiosos acreditam que Antipas foi executado pelas autorida- des romanas. Quanto a mim, cteio que ele foi assassinado na casa de Deus pelos que se diziam irmaos. Mas 0 scu sangue clamou ao céu desde a terra. 1. Uma biografia sem biografia. Quem foi Antipas? Chegou-se a sugerir ter sido ele 0 predecessor do anjo a quem Jesus enderecou a ter- ceira carta do Apocalipse. O que de concreto sabemos ¢ que esse valoroso obreiro era propriedade exclusiva do Senhor, conforme declara 0 préprio Cristo: “Minha testemanha, meu fiel”. © tedlogo espanhol Samuel Perez Millos explica 0 relacionamento de Antipas com Jesus: “Ele pertencia ao Senhor por reden¢ao ¢ o Senhor lhe pertencia por comunhao. Como a esposa dos Cantares de Salomao, podia declarar: ‘© meu amado é meu eeu sou do meu amado”. Dois titulos de nobreza recebe Antipas do Se- nhor Jesus: testemunha e fiel. 2. Antipas, a testemunha. Antipas fez jus ao significado de scu nome: levantou-se contra todos os que acolheram a heresia dos nicolaitas € nao se opuseram a apostasia de Balado. Sem nada temer, testemunhou contra a iniquidade ¢ opés-se firmemente contra os iniquos. Nessa luta, imbusra-se ele daquela coragem que levou os profetas hebreus a bradarem contra a rebeliao de Israel. 67 Os Sere Castigais pp Ouro O vocdbulo grego martys carrega estes significados: testemunha legal, histérica ¢ ética de um fato. Martys, portanto, ¢ aquele que presencia uma ocorréncia. Devido a persegui¢go movida pelas autoridades romanas contra os discfpulos de Jesus, a palavra médrtir passou a significar também aquele que é morto por néo negar a sua fé. No Apocalipse, a testemunha nao é necessariamente 0 que experi- menta a morte. Mas 0 que, motivado por suas conviccées, proclama o nome de Cristo. Tomando emprestadas as palavras de Napoledo Bona- parte, énos permitido concluir: “Nao ¢ a morte que faz 0 mértir, mas a causa que ele abraga”. 3. Antipas, o fiel. Antipas é tratado pelo Senhor como “meu fiel” nao somente por sua crenga firme ¢ bem definida, mas principalmente por sua fidelidade. A palavra pistos era usada pelos antigos escritores gre- gos para descrever 6 que se mantém fiel nos negécios ¢ no desempenho de suas fungées oficiais. Era a primeira virtude exigida de um funciondrio nos antigos reinos helenos. Quando do advento do Cristianismo, 0 cer- mo passou a ser utilizado para caractetizar o crente que, além de professar a sua fé no Senhor Jesus, confessa-o até A morte. Somente os cristéos auténticos € confessantes tm condigdes de ob- servar a recomendacao do Senhor: “Sé fiel até & morte”. Sem fidelidade a Cristo o auténtico cristianismo é impossivel. Ao discorrer sobre essa virtude to cara ¢ téo preciosa, afirmou o missiondrio J. Hudson Taylor: “Todos os grandes homens de Deus foram homens débeis, mas que rea- lizaram grandes empreendimentos, porque Deus levou em conta os seus esforcos e fidelidade”. 4, A morte de Antipas, Quem matou Antipas? As autoridades ro- manas? E 0 que diz a maioria dos comentaristas. Todavia, quando me aprofundo na carta gue o Senhor Jesus enviou a Pérgamo, convengo-me de que ele foi morto pelos crentes apéstatas dessa igreja. Jesus € bastante claro. Denuncia que Antipas foi morto “entre vés” -— os crentes de Pérgamo. Nao estava o Diabo ali entronizado? Se a sua missdo € matar, roubar e destruir, a morte dessa fiel testemunha cra ape- nas mais um assassinato em sua longa folha de homicidios, roubos ¢ des- trui¢gGes. 68 Pércato, A Tenia Casava com 0 Muxpo VI. A HERESIA DE PERGAMO Tenbo, todavia, conzra ti algumas coisas, pois que tens ai os que sustentam a doutrina de Balaao, o qual ensinava a Balaque a armar ciladas diante dos filhos de Israel para comerem coisas sacrificadas aos idolos e praticarem a prostituigae Outrossim, também t tens 03 que da mesma forma sustentam a dousrina dos nicolaitas. (Ap 2.14,15, ARA} Se o pastor de Efeso aborrecia as obras dos nicolaitas, o de Pérga- mo nao somente as toleraya, como também dava acolhida ao ensino de Balado. Assim, permitiu ele fosse a sua igreja invadida por heresias, mo- dismos € maus costumes. Aquela congregacao, agora, em nada diferia de Israel em Baal-Peor. Por isso, insurge-se o Senhor Jesus contra o seu anjo, censurando-o energicamente. Torcendo a Palavra de Deus, invalidando a mensagem da cruz. e in- duzindo os santos 4 iniquidade, os discipulos de Balaio ¢ dos nicolaitas no se limitaram a Pérgamo: acham-se eles bem a vontade entre nds. 1, A doutrina de Balado. Balado ¢ introduzido na Histéria Sagrada como um daqueles gentios que dispunham de um conhecimento privi- legiado de Deus (Nm 22.5-40}. Nao fosse a sua venalidade, pontificaria ao lado de Melquisedeque, Jetro, Agur ¢ Jé. Todos estes, apesar de nao pertencerem A comunidade de Israel, tiveram um encontro experimental com o Senhor (Gn 14,18; Ex 18.1; Jé 1.1; Py 30.1). Sua histéria tem inicio quando Balaque o procurou, oferecendo- the elevada soma para amaldigoar os filhos de Israel. Isso porque os israelitas, qual formidavel exército, vinham desde 0 Sinai, cobrindo a face da terra e espalhando o medo e 0 pavor sobre a regiao (Nm 22.1-5). Vendo o rei moabita as tribos do Senhor, apavorou-se. S6 havia um jeito, segundo pensava, de barrar o avanco daquela gente forte ¢ yalorosa: langar-lhe a maldicgao. Nao se pode, contudo, amaldigoar a um povo a quem Deus co- brira de béngaos. Tedlogo assusto ¢ velhaco, Balado sabia que 0 tinico meio de amaldigoar a Israel era induzi-lo ao pecado. Por isso, ensina Balaque a langar tropegos no arraial dos israelitas. Ja devidamente instruido, o rei de Moabe espalha, entre o povo de Deus, prostitutas cultuais que, utilizando todos os recursos da sedugio sexual, arrastam os varées hebreus a idolatria e A prostituicéo. Em consequéncia, o Senhor mata num sé dia a vinte e quatro mil israelitas (Nm 25.9), Os 69 Os Sere Cas bE Ouro IGAIS filhos de Jacé muito sofreram por causa do episédio de Baal-Peor (Dt 4.3; $1 106.28; Os 9.10). A doutrina de Balaao foi replicada com sucesso em Pérgamo. Indu zidos por falsos mestres e doutores, os santos foram tomando a forma do mundo. E, agora, j4 comungavam com os {dolos e punham-se a tomar parte nos rituais pagios. Agora, tudo era permitido: comer dos alimentos sacrificados aos deuses e até prostituir-se ritualisticamente. J4 nao havia mais diferenga entre o sagrado ¢ 0 profano. Em Pérgamo, a doutrina de Balado no era apenas ensinada; era ze- losamente sustentada, O verbo sustentar significa, também, nesse caso, segurar, manter firme, reter. Isso significa que os discipulos de Balaao j4 Ihe haviam sistematizado 0 ensino, dando-lhe um forte apoio teoldgico. Heresias ¢ modismos continuam a ameagar a pureza doutrinal da Igreja de Cristo. Se nao reagirmos ¢ sc nao brandirmos a espada do Espirito, 0 en- gano tomara o lugar da verdade ¢ nos comprometera os mais caros artigos de fé. Nao nos esquecamos de que os apéstatas sao tedlogos competentes. Torcendo a Palavra de Deus, sempre acabam por apresentar um evangelho que, apesar de convincente, vai muito além daquele que recebemos. 2. A doutrina dos nicolaftas. Se em Efeso os nicolaitas nao iam além das obras, em Pérgamo jé avancavam com uma doutrina bem sedi- mentada. Sua reologia em nada diferia do ensino de Balado. Alias, até o significado das nomes de ambos os heresiarcas séo semelhantes. Balaao significa senhor do povo. F Nicolau, vencedor entre 0 povo. Ambos tinham por alvo dominar a igreja, por intermédio de elaborados artificios profé- ticos e teoldgicos. Eles sabiam como iludir os desavisados. Agressivos e insolentes, eram mestres na arte da sedugao ceolégica. Eles falavam o que os crentes queriam ouvir, e néo 0 que necessitavam escutar. Nao disse 0 apéstolo que, nos tiltimos dias, muitos apostatarao da fé, dando ouvidos a deménios? (1 Tm 4.1) Influenciados pelo gnosticismo, os nicolaftas ensinavam que o im- portante era o espirito, pois a carne para nada servia. Entio, que esta fosse exposta ao pecado ¢ que no pecado sc consumisse. Eles ndo viam © corpo como o templo do Espirito Santo, mas como alge que precisa ser destruido através de uma exposigao fatal ao pecado. Eis porque eles entregavam-se as torpezas ¢ nao se acanhavam em participar dos festivais pagaos, onde sexo e culto faziam parte da mesma liturgia. 70 Percssso, & 1ortia Casana como Munno 3. O perigo da tolerancia. Por causa de sua leniéncia, o pastor de Pérgamo era obrigado, agora, a engolir um ensino perverso, lascivo € cor- rupto. O que em Ffeso era pratica, em Pérgamo fez-se teologia. Em nome da unidade dos santos, tolera-se 4s vezes 0 erro, 0 engano ¢ até a apostasia. E claro que a unidade é valiosa, mas a sa doutrina é inestimavel. A recomendacao do apéstolo nao pode ser desconsiderada: em cuidado de ti mesmo ¢ da doutrina. Continua nestes deveres; por- que, fazendo assim, salvards tanto a ti mesmo como aos teus ouvintes” (1 ‘Tm 4.16, ARA). Consideremos, a propésito, este axioma: a unidade s6 é possivel através da ortodoxia doutrindria. VII. QUANDO JESUS PELEJA CONTRA A IGREJA Portanto, arrepende-te; e, se ndo, venho a ti sem demora e consra eles pelejarei com a expada da minha boca. (Ap 2.16, ARA) O pastor de Pérgamo é conclamado ao arrependimento nao por ter feito alguma coisa errada, mas por haver deixado de fazer a coisa certa. Ele se omitiu diante do avango dos nicolaftas e dos discipulos de Balado. Nao estaremos nés incorrendo no mesmo erro? Em busca do politicamente correto, amparam-se as heresias, abrem-se alas aos costumes pecaminosos ¢ até concedem-se generosos espacos A apos- ta E.o resultado nao poderia ser pior, Corremos o risco de perder a identi- dade como Igreja de Cristo ¢ a vocagao como Reino de Deus. Arrependarno- nos, pois, antes que o préprio Cristo intervenha direta ¢ dolorosamente. 1. A espada de Cristo. A uma igreja que j4 comegava a cait na apos- tasia, Jesus apresenta-se como aquele que peleja com a espada que sai de sua boca (Ap 2.16). Para essa peleja, o Senhor escolhe uma formidavel arma de ataque. Em grego, 0 vocdbulo rhomphaia descreve uma espada urdcia de lamina alongada ¢ que era bastante apreciada pelos legiondrios romanos. Sua lamina bigume eta ideal para cortar ¢ perfurar mortalmen- te. Nao é uma imagem perfeita da Palavra de Deus? (Hb 4.12) O Senhor Jesus haveria de combater os discipulos de Balade ¢ os ni- colaitas. Nao era uma ameaca; era um ultimato: “Contra cles pelejarei”. Neste momento, 0 Cordeiro faz-se Leao. E apressa-se para 0 ataque. Se 0 anjo de Pérgamo nao se posicionasse contra essa gente impia ¢ repugnan- te, também seria alvo da ira do Filho de Deus. 71 Os Srre Casticats DE Quro. 2. A punigéo do Cordeiro de Deus. A punigao nao seria apenas verbal. Alguns morreriam fisicamente, porque espiritualmente ja estavam mortos. O Senhor nao mudou. Continua a batalhar contra aqueles que Ihe querem destruir a Igrej A espada que lhe sai da boca é a sua palavra, Sim, a mesma palavra que criou os céus ea terra, que se fez arcane na boca dos profetas ¢ louver nos lébios de Davi. Agora, porém, a palavra faz-se verbo para combater 0 mal. A mesma palavra havera de desfazer o Anticristo (2 Ts 2.8). VIII. PROMESSAS AOS VENCEDORES Quem tem ouvidos, ouga 0 que o Espirito dis &s igrejas: Ao vencedor, dar-lhe-ei do mand escondido, bem como the darei uma pedrinha branca, € sobre essa pedrinha escrito um nome novo, 0 qual ninguém conbece, exceto aquele que o recebe. (Ap 2.17, ARA) 1. O mana escondido. Diz uma tradigio judaica que, quando da destruic¢éo de Jerusalém em 586 pelos babilénios, o profera Jeremias, com a ajuda de um anjo, escondeu a arca sagrada, na qual havia um vaso de ouro com uma porgio do mand. Acrescentam alguns rabinos que a arca permanecerd oculta até que o Messias se revele a Israel. Nessa ocasiao, a arca seré novamente vista pelos judeus que, para demonstrar a sua comunhao com Jeovd, passarao a alimentar-se do pao dos anjos. Na verdade, a arca da alianga jamais serd encontrada e a porgio do mana que nela se achava nao existe mais desde a destruicao do Santo Templo. E o que afianga a Palavra de Deus (Jr 3.16). A promessa que Jesus fez ao pastor de Pérgamo tem um senti- do muito mais profundo do que supée o folclore judaico. O mand escondido refere-se & perfeita comunhdo que, na Jerusalém Celeste, desfrutaremos com o Senhor Jesus. Se hoje j4 nos é téo prazenceiro participar da Santa Ccia, na qual celebramos a morte, a ressurreig © retornoe do Senhor, 0 que nao diremos da refeigéio que nos aguarda na sala do banquete, onde o seu amor nos scrd estendido como estan- darte? Aleluia! Muitos vit fio e 10 do Oriente ¢ do Ocidente ¢ assentar-sc-Ao com Abraao, Isaque ¢ Jacé, Nessa gloriosa assembleia, que desconhece tempo ¢ espago, desfrutaremos de uma perfeitfssima comunhao com o Pai, com o Filho ¢ com 0 Espirito Santo. 72 PERGAMO, A IGREIA CASADA COMO Muxpo 2..A pedrinha branca. No mundo greco-romano, a pedrinha branca era utilizada em varias ocasides. Servia como ingresso nos jogos ptiblicos. Era usada nos tribunais para indicar a absolvigao de um réu. E, também, era trocada pelos amigos como prova de sua mtitua afeigio. Neste caso, vinha a pedrinha com o nome do amigo. Ao anjo de Pérgamo, o Senhor estava para entregar uma pedrinha assinalando-lhe diversas coisas: a justificagéo ante o wibunal de Deus, 0 acesso ao trono da graca ¢ a prova, nao de uma simples amizade, mas de um amor eterno. 3. O novo nome. Nessa pedrinha, vinha também o novo nome do pastor de Pérgamo, concedendo-lhe a cidadania celeste. Na Jerusalém que desce dos céus, nés também receberemos um novo e glorioso nome, indicando-nos a origem espiritual © a unido com o Senhor, Somente a esposa do Cordeiro é digna de receber a pedrinha branca, pois sabe como ouvir a vor do Espirito Santo. Conclusao Pe 36 precisava de uma cois ra que © pastor de Pérgamo recebesse todas essas promessas, ele adotar a postura de um vencedor ¢ zelar pela igreja que Ihe confiara o Senhor Jesus. O irmao Antipas jd estava de posse de todas essas bem-aventurangas, porque nao temeu expor-se pelo Reino de Deus. E, por isso mesmo, ousou desafiar o império de Satands. Que o exemplo de Antipas venha a calar bem profundamente em nossa alma. Nos dias atuais, nem sempre € possivel, ¢ aconsclhavel, agir politicamente correto. As vezes, as urgéncias da Igreja de Cristo constran- gem-nos a que nos Jevantemos contra todos, a fim de que, em tudo, seja manifestada a gloria de Deus. 73 Ao anjo da igreja em Tiatira escreve: Estas coisas diz o Filho de Deus, que tem os olbos como chama de fogo e os pés semelhantes ao bronze polido: Conbeco as tuas obras, 0 teu amor, a tua fé, 0 teu servico, a tua perseveranca e as tuas tiltimas obras, mais numerosas do que as primeiras. Tenho, porém, contra ti 0 to- lerares que essa mulher, Jezabel, que a si mesma se declara profetisa, ndo somente ensine, mas ainda seduza os meus servos a praticarem a prostituigdo ea comerem coisas sacrificadas aos idolos. Dei-lhe tempo para que se arrependesst; ela, todavia, ndo quer arrepender-se da sua prostituigao. Fis que a prostro de cama, bem como em grande tribulagao 0s que com ela adulteram, caso néo se arrependam das obras que ela incita. Matarei os seus filbos, e todas as igrejas conhecenio que eu sou aquele que sonda mentes e coragées, ¢ vos darei a cada um segundo as vossas obras. Digo, todavia, a vds outros, os demais de Tiatira, a tantos quantos nao tem essa doutrina e que ndo conheceram, como eles dizem, as coisas profundas de Sa- tands: Outra carga ndo jogarei sobre vés; tdo-somente conservai o que tendes, até que eu vena. Ao vencedor, que guardar até ao fim as minhas obras, eu the darei autoridade sobre as nagées, e com cetro de ferro as regerd e as reduzird a pedagos como se fossem objetos de barro; assim como também eu recebi de meu Pai, dar- the-ei ainda a estrela da manha. Quem tem ouvidos, ouga o que o Espirito diz as igrejas. (Ap 2.18-29, ARA) Os Sure Casrigats pz Ouro Introduca4o A igreja em Tiatira vivia um interessante paradoxo. Se internamente enfrentava gravissimos problemas, externamente seu amor fazia-se cada vez mais conhecido. Num circulo de impressionantes virtudes, suas Gltimas obras excediam em qualidade as primeiras. Por isso, ela recebe de Jesus um elogio franco e aberto. © Senhor, porém, nao deixa de censurar-lhe o pastor por estar tolerando uma profetisa, que Ihe vinha desencaminhando as ovelhas com um ensino inspirado nas profundezas de Satands. Sua leniéncia era insuportével aos olhos de Deus. Urgia-lhe, pois, restabelecer a disciplina espiricual do rebanho, e reprimir o grupo daque- la mulher que, figurativamente, recebe do Senhor o epiteto de Jezabel. O momento nao era de contemporizagées. Se o pastor de Tiatira continuasse a agir de maneira politicamente correta, acabaria por perder todas as ovelhas. Além do mais, 0 Espirito Santo néo o chamara para ser homem do povo, mas para atuar como homem de Deus. Portanto, que ele agisse com o rigor que o momento requeria. Que 0 cajado Ihe voltasse 4s méos € néo mais condescendesse com os inimigos da Igreja de Cristo. I. TIATIRA, A CIDADE DO COMERCIO Na era apostélica, Tiatira era mundialmente conhecida por sua pro- dugao de tecidos, entre os quais destacava-se 0 indigo. Af residia a empre- sdria Lidia, convertida a Cristo em Filipos através do apéstolo Paulo. E a semelhanga de outros tiatirenses, dedicava-se ela ao comércio de téxteis (At 16.4). Segundo se actedita, foi por seu intermédio que o Evangelho chegou 4 cidade. ‘Além de sua importancia comercial, Tiatira era respeitada também por causa da base militar que Roma mantinha em seu perimetro urbano, 1. A histéria, Nao se sabe exatamente quando comega a histéria de Tiatira. Supde-se que no, inicio, ela nao passava de um vilarejo consagra- do ao culto de Tirimnos, o deus sol que os Idios tanto veneravam. Por volta do século I] a.C., a cidade foi toralmente remodelada por Seleuco Nicator (301-281 a.C.) que. para dominé-la cultural ¢ etnicamente, im- planta ali uma grande comunidade grega. Sua histéria nao apresenta grandes incidences. Ha que se ressaltar, porém, a incursdo que Ihe fez Antioco, o Grande, em 190 a.C. Apesar 76 Tisrins, + Len dos embates que se seguiram entre as tropas do rei ¢ o exército romano, ela nao sofreu perdas significativas. Fla, finalmente, sepultou-se sob a moderna Akhisar. Com seus mais de setenta mil habitantes, dedica-se hoje & confeccao de tapetes. Em turco, a palavra Afpisar significa literalmente “castelo branco”: uma referéncia as alvas ru{nas de uma fortaleza medieval localizada nas vi- zinhaneas da atual cidade. Sua histéria é tao tranquila que, até agora, nenhum arquedlogo propés-se a escavar-lhe as ruinas, a fim de the re- construir o passado. 2. A religiéo de Yiatira, A religiao de Tiatira inspirava-se nos mitos que Homero e Hesfodo versejaram. Misturando fatos ¢ lendas, seus deu- ses fizeram-se téo numerosos quanto os homens. £, A semelhanga destes, eram profanos, concupiscentes, orgulhosos ¢ vingativos. Em gtego, Tiatira significa sacrificio continuo. Além dos deuses capitaneados por Zeus, o imperador de Roma também possula os seus altares na cidade. B ai de quem se recusasse a prestar-the culto. Além de ter os bens confiscados, podia ser condenado a morte. Na Tiatira dos tempos biblicos, havia um templo dedicado a Samba- te, de onde uma profetisa enunciava suas adivinhacées. Por isso, alguns comentaristas a veem como a Jezabel de que fala Jesus (Ap 2.20). Como yeremos mais adiante, a mulher que pervertia a igreja em Tiatira era, na verdade, uma cristi que, embora apéstata e inimiga de Deus, passava-se por uma crente piedosa. 3. As guildas. Os profissionais em Tiatira, para defenderem seus di- reitos, organizavam~ » numa espécie de sindicato conhecide como guil- da. Cada agremiagao tinha um deus como patrono. Negécios ¢ religito misturavamese de tal forma que as reunides de classe mais pareciam um culto ¢, geralmente, acabayam em abominaveis orgiais. Num ambiente como esse, os profi jonais cristéos sofriam todos os tipos de constrangi- mento. E naéo cram poucos os que, néo suportando o estresse, abando- navam a organizagao, sendo impedidos, a partir daf, de exercer qualquer atividade profissional. 4. O terremoto. Durante o reinado de Oravio Augusto (27 a.C.-14 d.C.), Tiatira foi arrasada por um terremoto. Apesar da devastagao, a ci- dade foi completamente reconstruida pelo Império Romano. No cendrio 77 Os Sere Castigars pe OURO. politico ¢ histérico, porém, ela néo era abalada por qualquer aconteci- mento. Sua rotina parecia inalterada. 5. O Evangelbo chega a cidade. E bem provavel que o Evangelho renha chegado a Tiatira por intermédio de Lidia, Evangelizada por Paulo em Filipos, retornou a cidade naval como portadora das Boas Novas de Salvagdo (At 16,14). Em sua terceira viagem missiondria, o apéstolo ha veria de confirmar o trabalho ali estabelecido (At 19.10). Il. JESUS APRESENTA-SE AO ANJO EM TIATIRA Ao anjo da igreja em Tiatira escreve: Estas coisas diz 0 Filho de Deus, que tem os olhos como chama de fogo e 0s pés semelhantes ao bronze polide. (Ap 2.18, ARA) A uma igreja que se havia conformado com este mundo, apresenta-se Jesus como aquele que nos sonda as mentes € os hemisférios mais escuros da alma. Sua onisciéncia nao pode ser ignorada. Ele é tio Deus quanto 0 préprio Deus (Ep 2.5-8). E, tendo recebido do Pai todo 0 poder, executa 0 juizo divino tanto sobre os impios quanto sobre os que, embora se pre- sumam igreja, nao mais se acham ligados ao corpo mistico de Cristo. Ao pastor em Tiatira, portanto, singulariza-se Jesus como o Filho de Deus € o Supremo Juiz de toda a criagio. 1. Jesus, o Filho de Deus. Durante 0 seu ministério terreno, 0 Se- nhor Jesus apresentava-se como o Filho do Homem, a fim de identificar- se plenamente com a humanidade. Mas ao anjo da igreja em Tiatira Ele exp6e todas as suas credenciais divinas: “Estas coisas diz o Filho de Deus, que tem os olhos como chama de fogo ¢ os pés semelhantes ao bronze polido” (Ap 2.18, ARA). Jesus é 0 Filho de Deus ¢ o Juiz Supremo de todo o Universo. Além disso, faz questao de ressaltar a sua onisciéncia, para deixar bem claro que nada pode fugir ao seu conhecimento. Ele ests no comando de todas as coisas, pois sabe 0 que se passa no mundo, na Igreja, em nossa casa € em nosso Ccoragao. Em Tiatira, havia um grupo que Ihe desafiava aberta ¢ insolentemen- te a soberania. Liderados pela infame ¢ lasciva Jezabel, cles procediam como se Jesus nao passasse de um mero conceito teolégico. Mas, em bre- ve, haveriam de se deparar com o Filho de Deus que, ao contrario do que muitos crentes sup6em, nao ¢ uma abstragao histérica, mas o Senhor da 78 Tiara, a Tora TOLERANTE Histéria. Fle viria julgar ¢ punir a todos os que, profanamente, andavam 2. Jesus, o onisciente Filho de Deus. Devido a situagao lastimavel da igreja em Tiatira, apresenta-se Jesus também como 0 onisciente Filho de Deus: “Estas coisas diz o Filho de Deus, que tem os olhos como chama de fogo” (Ap 2.18, ARA). O Senhor Jesus denuncia abertamente 0 peca- do que era ocultamente praticado. A falsa espiritualidade de Jezabel e dos que com ela adulteravam é desmascarada. Doravante, suas profecias nao receberiam qualquer crédito. Aos olhos humanos, o movimento profético de Jezabel era fervoro- samente espiritual. Aos de Cristo, porém, sé havia um fervor artificial- mente sustentado, Descritos como chamas de fogo, os olhos do Senhor sios os tinicos, em todo 0 Universo, capazes de distinguir perfeitamente © que vem ocorrendo em nossas igrejas. Por isso, ajamos de acordo com a Palavra de Deus. Os homens podem ser enganados por uma postura eclesiasticamente perfeita, mas o Senhor Jesus nao se deixa levar pelas aparéncias. Ele tudo examina e tudo escrutina; nada escapa ao seu olhar investigativo. 3. Jesus, o Justo Juiz. O bronze é um dos emblemas mais perfeitos da justiga divina. Pelo menos é 0 que inferimos desta declaragao do Se- nhor Jesus ao anjo da igreja em Tiatira: “Estas coisas diz o Filho de Deus, que tem os olhos como chama de fogo ¢ os pés semelhantes ao bronze polido” (Ap 2.18, ARA). Nessa afirmacdo, 0 Senhor previne o pastor de Tiatira que Deus esta prestes a julgar os iniquos que, em sua casa, se passam por justos. Por isso, se o julgamento divino tem de comegar, que tenha inicio no arraial dos santos. A semelhanga de Tiatira nossas igrejas vém perdendo rapidamente sua identidade como Reino de Deus. Os falsos doutores, além de espoliar os santos, torcem a sa doutrina e introduzem costumes exdticos e imorais em nossos rebanhos. Levantando vultosas ofertas, os filhos de Balaao co rompem pastores, desviam os jovens da verdade e investem-se contras as santas mulheres, como se estas fizessem parte de seu harém particular. No pulpito, contam mentiras, inventam milagres e, insolentemente, criam um deus segundo a sua ambigao e de acordo com as suas concu- piscéncias. Dao-se ao adultério, deleitam-se com a falsidade, folgam em difamar 0 préximo e eivam de heresias nossas tribunas ¢ catedras. Se 79 wre Casrigais bu Ouro forem contrariados em seu perverso intento, nao vacilam em tirar a vida do préximo. © Justo Juiz, porém, chamard todos a prestar-Ihe contas. E ninguém haverd de faltar a essa audiéncia, nem mesmo os que se acham sobrecarregados de virtudes. III. AS VIRTUDES DO PASTOR EM TIATIRA Conheco as tuas obras, 0 teu amor, a tua fi, 0 tet servigo, a tua perseneranca as tuas iltimas obras, mais mumerasas do que as primeiras. (Ap 2.19, ARA) O curriculo do pastor da igreja em Tiatira era quase tao impressio- nante quanto o do seu colega de Efeso, Em alguns aspectos, até superava as qualidades e virtudes deste. Suas Ultimas obras, por exemplo, avulta- vam-se mais admirdveis e ricas do que as primeiras. Seu amor ainda con. servava a ardéncia dos primeiros tempos. E a sua fé, sempre viva e eficien- te, impulsionava-o a realizar surpreendentes servigos ao Senhor Jesus. Havia, porém, um ponto fraco em seu curriculo. Teologicamente, nao tinha o mesmo preparo do pastor de Efeso. Essa foi a causa que o levou a tolerar a profetisa Jezabel que, sob o apandgio de uma espiritualidade afeta- da e bizarra, havia assumido a vanguarda do ensino naquele redil. A falta de preparo biblico é fatal para o obreiro. Nao resta diivida de que o amor ¢ 0 servico sao indispensaveis ao ministério cristao. A teologia, porém, nao deve ser desprezada. Sem ela, corremos o risco de enfraquecer os lagos da caridade fraternal, debilitar a esperanca escatolégica, contami- nar a santissima fé e inutilizar nossas boas obras, pois tudo o que fazemos reclama uma justificativa teolégica. Além do mais, 0 nosso ministério so- mente sera completo se formos aptos para o ensino. Caso contrario, jamais poderemos edificar a Igreja de Cristo, porquanto esta somente havera de ser fundamentada através da administracao da Palavra de Deus. 1. As primeiras obras. © pastor da igreja em Tiatira via as boas obras ¢ a fé como um perfeito bindmio da vida crista. Ele tinha as primei- ras como evidéncia da segunda. Foi, por isso que 0 seu ministério, apesar da crise que [he assolava a igreja, jamais experimentou descensos. Das palayras que lhe enderecou o Senhor Jesus, inferimos que a sua carreira esteve sempre em franca ascensao. Isso pode ser observado, também, por suas obras. As tiltimas mostraram-se mais perfeitas ¢ abundantes do que as primeiras. 80 Tiarina, 4 Tentps ToLerante Devido 4 énfase que a Reforma Prorestante emprestou a doutrina da salvagao pela fé, a fim de debelar a praga das indulgéncias, os evan- gélicos foram induzidos a nao se importar com as obras que devem caracterizar a vida crista. Martinho Lurero, alias, chegou a tratar com descaso a Epistola de Tiago, por causa do realce que 0 irmao do Se- nhor da as boas obras. Todavia, o reformador parece ter se esquecido de algo muito importante. Fora Tiago quem se expés energicamente, no Concilio de Jerusalém, para combater os judaizantes, que buscavam escravizar os crentes gentios com ritos e ordenangas que diziam respeito apenas & nacdo hebreia. Numa leitura atenta de Tiago, constatamos que, em momento al- gum, ele despreza a fé. Mas, sabiamente, mostra as obras como a ma- nifestacdo de uma fé viva e eficaz em Cristo Jesus. Se recorrermos As epistolas de Paulo, verificaremos que 0 apédstolo, na verdade, fax questo de ressaltar a doutrina da salvagao pela fé. No entanto, jamais despreza a importancia das boas obras. Aos irmaos de Efeso, declara: “Porque pela graca sois salvos, mediante a fé; ¢ isto nao vem de vés; é dom de Deus nao de obras, para que ninguém se glorie. Pois somos feitura dele, criados em Cristo Jesus para boas obras, as quais Deus de antemao preparou para que andéssemos nelas” (Ef 2.8-10, ARA). O pastor de Tiatira, embora nao fosse um tedlogo to profundo quan- to 0 seu colega de Efeso, sabia que a fé ¢ as obras so insepardveis; s4o um binémio perfeito. Através da fé e, por intermédio das obras, demonstrava ele um grande c provado amor tanto a Cristo quanto & sua Igreja. 2. O amor que nao perdeu a primazia. Se Efeso esqueceu o primei- ro amor, Tiatira tinha-o sempre como a prioridade maxima de seu rela- cionamento com o Senhor Jesus. Como imaginar um amor como esse? Sim, como descrever um amor que jamais perdeu seus atributos como a principal virtude da teologia biblica? Infelizmente, convencionamo-nos a ver a vida crist como algo descendente. Hoje, perdemos o primeiro amor, e nos acomodamos. Amanha, deixamos ir embora todo o nosso compromisso com o Reino de Deus, ¢ nao sentimos qualquer remorso. Depois, j4 completamente conformados com o mundo, nao mais nos importamos com os que, celeremente, caminham para 0 inferno, porque nés mesmos j4 nao nos importamos com o destino de nossa alma. Tiatira, porém, apesar de seu fragil alicerce teolégico, jamais deixou de amar a Cristo com 0 primeiro amor. 81 Os Sere Castigais px QuKO Mas qual a evidéncia do amor de Tiatira? Afirmou John Stott que 0 verdadeiro amor cristéo é mais servigo do que sentimento. No enranto, nao podemos confundir servigo com ativismo. Efeso, por exemplo, era mais ativa do que Tiatira. Todavia, permitiu que o servigo a Cristo caisse na perigosa vala do ativismo. Enquanto isso, a igreja em Tiatira, cada vez mais amorosa, tudo fazia por agradar ao Senhor Jesus. Seu amor também se traduzia numa fé viva e atuante. 3. A fé que continuava viva. Tiatira empenhava-se corajosamen- te pela expansio do Reino de Deus Sua fé, agora mais viva e eficiente, traduzia-se em obras e servigos. Apesar de sua debilidade teoldgica, jamais deixou de evangelizar, discipular e fazer missdes. Ela nao se im- portava com os interditos das autoridades locais. O Império Romano era-Ihe apenas um pequeno ¢ desprezivel detalhe, em seu impressio- nante avan¢o como Reino de Deus. Ela nao se deixou mumificar pela burocracia da organizacéo. Organismo vivo que era de Cristo, podia apresentar ao Senhor Jesus, por intermédio de sua fé, uma impressio- nante folha de servicos. 4. Servigo que era abundante. Nao podemos separar a oragéo do setvigo. Quem ora jamais deixa de trabalhar ¢ quem trabalha na seara do Mestre nao pode deixar de orar, porque sabe que 0 crescimento de sua lavoura depende do Senhor. Orar ¢ trabalhar! Que este seja o lema de todo o obreiro cristo. Radicalmente comprometido com 0 avango do Reino de Deus, afirmou J. Blanchard: “Tentar fazer qualquer trabalho para Deus sem oracao € tao inuitil como tentar langar um satélite com um estilingue”. Quantas igrejas que, por falta de uma vida fervorosa de ora- cdo, no foram minguando em seu servigo ao Senhor até desaparecer por completo? Nao passam hoje de meros ajuntamentos sociais sem qualquer expresso como Reino de Deus. Quanto mais oramos, mais somos impulsionados pelo Espirito Santo a nos esforcar pelo Reino de Deus. Todavia, se deixarmos de buscar a face do Senhor, cairemos rapidamente no vale do comodismo e da dormén- cia espiritual. Nao demorar4 muito e substituiremos a evangelizacéo por uma postura social € politica que se acomode aos reclamos deste mundo. Trocaremos a ética crista pela hipe isia que caracteriza este século. E, logo, apesar de nossas cores denominacionais, transitaremos numa drea cinzenta e fatal 82 jarixa, a Foua TOLeRan, Tiatira era uma igreja de abundantes servicos. Apesar de 0 mundo té-la invadido através da perversa Jezabel, ela continuava a avangar contra o mundo, Ela jamais deixou de fo consegui: que as primeiras, Por i as portas do inferno, ¢ estas jé nao m resisti-la, pois suas ultimas obras cram mais abundances do so, foi elogiada pelo Senhor. 5. As diltimas obras. As tiltimas obras do pastor de Tiatira sio con- sideradas, pelo Senhor Jesus, melhores ¢ mais abundantes do que as pri- meiras: “... as tuas ultimas obras, mais numerosas do que as primeiras” (Ap 2.19, ARA). O pastor de Ffeso, ao contr: as primeiras, pois as tiltimas, ainda que perifericamente boas, nao tinham a exceléncia requerida pelo Senhor Jesus. 0, fora exortado a voltar Dos clogios que o Senhor Jesus enderega ao pastor de Tiatira, con cluimos que a sua esp Nao fora a sua fragilidade tcoldgica, seria cle considerado um ministro perfeito. Infelizmente, seu despreparo biblico-teolégico levou-o a tolerar a abomindvel Jezabel. ritualidade foi ascendendo de forma acentuada. Iv. A TOLERANCIA PECAMINOSA Tenho, porém, contra ti o tolerares que essa mulher, Jexabel, que ast mesma se declara profetisa, ndo somente ensine, mas ainda sedwea 0s meus servos a praticarem a prostituigdo e a comerem coisas sacrificadas aos idolos. (Ap 2.20, ARA) Nos templos pagios da Asia Menor, era muito comum a presenga de uma profetisa. Envolta em mistérios e incongruéncias, enganava os devotos que, todos os dias, traziam-lhe sacrificios, interrogagées ¢ luxti- rias, E, ja instrufdas em sofismas e obviedades, despediam seus pobres e tolos consulentes sem nenhuma resposta concreta. Mas todos se sentiam satisfeitos. Assemelhavam-se aos astrélogos que, todos os finais de ano, apresentam previsdes que se enquadram nos contextos mais esdrixulos. Tais mulheres cram mestras na arte da sedugio. Alids, o sexo fazia parte dos tuais que, naqueles templos, cra liturgia ¢ culto. Elas sabiam como arrastar os mogos & prostituigao ¢ os pais de familia ao adultério. Dessa forma, aquelas rameiras ajudavam a cancerar a civilizagao greco- latina, levando a metastase & gloriosa Roma. Infelizmente, uma dessas mulheres conseguiu intrometer-se na con- gregacdo dos santos, e quase levou a igreja em Tiatira 4 ruina. 83 Os Sux Castigats pz Ouro 1. Jezabel, a profetisa. A profetisa que, ardilosamente, se instalara na igreja em Tiatira recebe de Jesus uma alcunha bastante apropriada: Je- zabel. Refere-se 0 Senhor a filha do rei sidénio Erbaal, mulher do leniente e frouxo Acabe (1 Rs 16.31). Sob a influéncia dessa senhora, a nagao hebreia caiu numa apostasia tao grave que acabou por levé-la & ruina. Institucionalizando 0 culto a Baal no reino do Norte, Jezabel orde- nou a matan¢a imediata de todos os profetas do Senhor (1 Rs 18.13). Ela néo poupou nenhum esforgo para tirar a vida do profeta Elias (1 Rs 19.2). Era tao inescrupulosa ¢ perversa, que tramou 0 assassinato de Nabote, a fim de que o marido se apropriasse indebitamente da vinha do jezreelita (i Rs 21.5-14). Seu fim nao poderia ser mais trdgico ¢ vergonhoso (2 Rs 9.31-37). Nao obstante, seu exemplo veio a inspirar uma crente da igreja em Tiatira. Nao sabemos como a Jezabel mencionada pelo Senhor Jesus imis- cuiu-se na igreja. Mas como s6i acontecer nesses casos, ela deve ter come- gado a profetizar o que o povo queria ¢ ansiava ouvir, Uma visio aqui, um sonho ali. Mais adiante, um sinal bem engendrado. S6 faltava ler a mao dos fiéis. Utilizando-se de todos esses recursos, ela conseguiu ludibriar inclusive 0 anjo da igreja. Afinal, que pastor nao gosta de ouvir coisas agradaveis e que lhe afaguem o ego? Nao demorou muito e a “ira” Jeza- bel j4 ocupava o invejvel lugar de doutrinadora-mor do rebanho. Ela, agora, dominava todo o ministério. Tinha 0 controle absolu- to sobre todas aquelas almas. Ninguém ousava fazer qualquer coisa sem consulté-la. © pastor da igreja sabia que algumia coisa estava ertada. Mas, para nao contrarid-la, resolveu omirir-se e tolerar-lhe a agdéo daninha. Afinal, ela ajudava a manté-lo no poder, 2. Jezabel, a tolerada. © curriculo do anjo da igreja em Tiatira seria perfeito sem esta censura do Senhor Jesus: “'Tenho, porém, contra tio tole- rares que essa mulher, Jezabel, que a si mesma se declara profetisa, ndo so- mente ensine, mas ainda seduza os meus servos a praticarem a prostituicdo ea comerem coisas sacrificadas aos idolos” (Ap 2.20, ARA). © que o teria levado a mostrar-se tio leniente para com essa obreira de Satands? Seu des- prepato teolégico? Ou temia que a tal profetisa jogasse a igreja contra ele? Sim, porque ela j4 tinha a todos na palma das maos, inclusive o ministério. Se a esposa de Acabe dominava o trono de Israel, a Jezabel de Tiatira era o grande poder arras do piilpico. Alids, a essas alturas a perversa jd nao fazia tanta questao de se esconder; agia aberta e impunemente. 84 Tiapira, a Teresa TOLeranTe Parece-me que o problema do pastor de Tiatira era a sua falta de preparo doutrindrio. Houvesse ele se fundamentado biblica e teologica- mente, Jezabel jamais teria encontrado guarida naquele puilpito. Infeliz- mente, ele ausentara-se como o tedlogo do rebanho, delegando toda a sua autoridade douttindtia a uma mulher que era a propria apostasia. 3. O ensino sedutors. A doutrina de Jezabel assemelhava-se aos can- ticos das sereias do mundo de Homero. Irresistivel e sedutora, enlagava os servos de Cristo num duplo adultério: reolégico e carnal. Em nada diferia de Balado, que mostrou a Balaque como levar os filhos de Israel ao tropego. Primeiro, induziu-os a comer das coisas sacrificadas aos idolos; depois, enredou-os em pecados sexuais (Ap 2.20). Em Tiatira, nao foram poucos os que se deixaram emaranhar por seu ensino, que vinha ao encontro das concupiscéncias mais escondidas. Hoje, muitos sao os crentes que, por jd nao suportarem a sa doutrina, an- dam 2 caca de mestres que thes aliviem a consciéncia, conforme alerta 0 apéstolo Paulo: “Pois havera tempo em que n4o suportarao a sa doutrina: pelo contrario, cercar-se-do de mestres segundo as suas préprias cobicas, como que sentindo coceira nos ouvidos; ¢ se recusarao a dar ouvidos a verdade, entregando-se As fabulas” (2 Tm 4.3,4, ARA). Com uma doutrina rio atraente, 0 que buscava a tal profetisa? Sincreti- zar 0 cristianismo com as religides pagas, cujos ritos eram vergonhosamente orgidsticos. Naqueles templos pagios, espalhados por Tiatira, a prostituicao fazia parte das liturgias que enalteciam os deuses greco-romanos. As sacerdo- tisas procuravam agradar tanto aos varées do Olimpo quanto aos homens da terra, Quando nao incensavam aqueles, deitavam-se com estes. Iniciavam os rapazes na prostituigao c arrastavam os pais de familia ao adultério. Que tais coisas acontecessem num templo gentio, no gerava nenhuma surptesa, pois 0 mundo jaz no maligno. Mas, na Casa de Deus, isso era intolerdvel. O que fez 0 pastor? Apesar de seu notério amor a Cristo, nao esbogou qualquer reacio. Talvez esperasse que as coisas se resolvessem por si mes- mas. Sua postura, entretanto, desagradou profundamente o Senhor Jesus. Nossas igrejas foram invadidas por muitos ensinos irresistivelmente sedutores. Deliciamo-nos com mensagens que nos massageiam 0 ego ¢ cauterizam-nos a consciéncia. Despendemos vultosas quantias com falsas promessas € expectativas mentirosas. Pagamos regiamente, a fim de que nos deixem os pecados onde estao: escondidos e inconfessados. Se voltar- mos a pecar, nao ha problema. Hé um deus que nos releva o adultério, 85 Os Sere Casrigars px Ouro. a fornicacdo e as apropriacées indébitas. Um deus, aliés, que criamos segundo a nossa natureza maligna. Dos que nos usurpam o ptilpito, queremos ouvir apenas coisas boas ¢ agradaveis. Ansiamos que nos digam que somos principes. E, que, como tais, no precisamos enfrentar afligbes, doencas ¢ necessidades. Afinal, nascemos para ser ricos ¢ poderosos. Logo, por que o nosso céu nao pode ser aqui? Tais ensinos acabaram por engordar um rebanho de impios ¢ blasfemos. Infelizmente, sempre haverd um pastor que, embora piedoso, ja nao tem a coragem de um Fineias, para reprimir o pecado ¢ a heresia no arraial dos santos. 4. As coisas sacrificadas aos idolos. Na igreja em Tiatira, havia uma idolatria téo virulenta quanto aquela que levou Israel & ruina. Muitos eram os servos de Cristo que, seduzidos por Jezabel, prosticufam-se em meio a uma bem elaborada refeigéo oferecida aos deménios. De longe, lembrava uma liturgia tipicamente crista. Fervor era o que faltava. Havia visagens, profecias e aparigdes. Enquanto isso, ia Jezabel, com singular habilidade, manipulando seus amantes e, destes, arrancava havetes, valores ¢ a propria alma. Os que haviam sido libertos dos fdolos eram agora prisionciros da idolauria. ‘As diltimas heresias e modismos acabaram por introduzir muitos deu- ses nos arraiais evangélicos. Eos escandalos financeiros logo apareceram. Como um abismo chama outro abismo, juntamente com o luxe veio a luxtiria. A vontade humana foi posta acima da divina. Blasfemamente, muitos comecaram a indagar: “Se eu quero, por que Deus nao haveria de querer?” Transformando Deus num servigal, ignoraram-lhe a soberania e, agora, a criatura poe-se a destratar 0 Criador. Essa gente conseguiu idolatrar até a propria fé. De repente, a fé ma fé fez-se mais importante que o autor e consumador da santissima fé. Um desses tedlogos chegou a afirmar que foi por meio da fé que Deus criou © Universo. Outras aberracées teolégicas nasceram desses altares que, pouco a pouco, véo invadindo e tomando nossas igrejas. Nao bastasse tanta bizarrice, deificamos tais mestres ¢ doutores, porque dizem o que desejamos ouvir. F, para isso, damos-lhes polpudos cachés. Ato continuo, despedimos de méos vazias os que se afadigam no ensino da sa doutrina. ‘Tememos os idolos de barro, mas néo nos prevenimos quanto aos deuses de carne ¢ 0880, que introduzimos nos templos, onde somente o Eterno deveria ser adorade. Aqueles, pelo menos, nada fazem, mas estes desencaminham preciosas almas, langando-as no inferno. 86 _ arnt, 4 Ferien Tenerarere 5. Fervor nao é espiritualidade. Se observada a distancia, a aposta- sia de Israel no deserto até parecia um culto a Jeové. Havia alarido, sons, vozes ¢ até louvores. E o fervor daquele arraial? Nao havia gente mais animada ¢ alegre. Entretanto, os hebreus jé haviam apostatado de sua fé. E, agora, voltavam-se aos idolos, como se estes os houvessem tirado do Egito. A intervengao divina, porém, haveria de ser dolorosa e levaria muitos israelitas A morte. Na igreja ein Corinto, parece ter ocorrido algo semelhante. Apesar de aqueles irmaos falarem até mesmo as linguas dos anjos, ninguém ali se entendia. Divididos em facgées, levavam uns aos outros as barras dos tribunais. Eos seus atos abominaveis? Chegavam a assustar os préprios pagaos. O seu culto, porém, era marcado por um fervor incomum. Era a mais pentecostal das igrejas da Atica, Tinha todos os dons e até sinais e maravilhas fazia. Para corrigir-[he a postura, foi necessdrio que Paulo lhes escrevesse duas enérgicas epistolas. Muitas igrejas, por nao estarem alicergadas na sa doutrina, vieram a transformar seus cultos num espetaculo bizarro e deprimente. Em suas reuniées, hé sempre um ou dois profetas que, imitando blasfemamente os dons do Espirito, trabalham habilmente arcanos e visées, visando aos mais abjetos ¢ inconfessaveis fins. E os modismos? Todo dia surge uma novidade. Hoje é a ungdo do leao, amanha a do tigre e depois a da dguia. Criatividade é 0 que nao falta. Em seguida, vem o cair no espfrito ¢ a danca de Davi. Enquanto isso, deixamos cair no descrédito a atualidade do batismo com o Esp(rito Santo e dos dons espirituais. E chegado 0 momento de voltarmos ao modelo de igreja apresentado em Atos dos Apdstolos: E perseveravam na douina dos apéstolos ¢ na comunhée, no partir do pao e nas oragées. Em cada alma havia temor; ¢ muitos prodigios ¢ sinais cram feitos por intermédio dos apéstalos. Todos os que creram estavam juntos e tinham tudo em comum, Vendiam as suas propriedades e bens, distribuindo © produto entre todos, a medida que alguém tinh necessidade, Diariamente Pperseveravam undnimes no templo, partiam pao de casa em casa e tomavam as suas refeigoes com alegria ¢ singeleza de coragao, louvando a Deus e con- tando com a simpatia de todo © pove, Enquanto isso, acrescentava-lhes 0 Senhor, dia a dia, os que iam sendo salvos. (Ar 2.42-47, ARA) O poder da Igreja Primitiva residia, em primeiro lugar, na doutrina dos apéstolos. Isso significa que, sem o ensino sisteméatico e persistente da Palavra de Deus, 0 avivamento é impossivel. E 0 que faltava & igreja 87 Os Casrigats pe Ouro em Tiatira. Aproveitando-se dessa falha, Jezabel introduziu-se naquele rebanho ¢, por muito pouco, nao o leva A ruina. Urge, pois, retomar- mos 0 modelo de igreja do Novo Testamento. E hora de perseverarmos na si doutrina e na oracdo. Somente assim viremos a experimentar um poderoso avivamento. A igreja de Cristo necessita de renovagao, e nao de inovagées baratas e despropositadas. V. QUANDO O TEMPO DE DEUS EIGNORADO Dei-the tempo para que se arrependesse: ela, todavia, néo quer arvepender-se da sua prostituigdo. (Ap 2.21, ARA) Nao sei como Elias trataria a Jezabel de Tiatira. Jeti decretar-Lhe-ia a morte como fez com a perversa mulher de Acabe. © Senhor Jesus, po- rém, concedeu-lhe um tempo, a fim de que ela se arrependesse de seus pecados. Ela, porém, o rejeitou. Como pode alguém, prestes a ser langado no inferno, desdenhar um oferecimento tao gracioso? Jezabel, queixa-se o Senhor, “nao quer arrepender-se da sua prostituicao”. Deus & misericordioso tardio em irar-se. Se nos arrependermos, desfrutaremos de todos os favores de sua graca. Caso contrario, teremos de arcar com as consequéncias de nossas inconsequéncias. 1. O tempo de Deus. Embora Deus seja eterno, Ele trabalha no tempo. Por isso, oferece a Jezabel um prazo para que ela se arrependa de sua apostasia: “Dei-lhe tempo para que se arrependesse” (Ap 2.21, ARA). O termo grego usado por Jesus ¢, apropriadamente, chrénos € nao khairds. Talvez ela nao conhecesse as implicagées do kAairds di- vino, mas sabia muito bem como funciona o chrénes humano. Logo, deveria ela, nessa sucessao de dias, abandonar suas abominagées € voltar-se para Deus. 2. A rejeigéo do arrependimento. Jezabel, porém, rejeita no tempo a redengao que Deus, por intermédio de seu Filho, elaborou na eternida- de. Por causa de sua atitude, queixa-se 0 Senhor: “Ela, todavia, nao quer arrepender-se da sua prostituigéo” (Ap 2.21, ARA). A Jezabel de Tiatira cra mais perversa do que a de Samaria. Se esta cra origindria de um contexto pagdo, aquela veio a apostatar da fé num meio onde a graga de Deus manifestava-se, trazendo salvagao € constantes visi- tacoes dos céus. Nao obstante, ela simplesmente nado quis arrepender-se 88 Tiatira, 4 Teresa Tous de sua prostituicgao. O que restava ao Senhor? Um duro juizo sobre ela e sobre os que com ela adulteraram. vi. oyutizo DE DEUS SOBRE OS ADULTEROS Eis que a prostro de cama, bem como em grande tribulacdo os que com ela adulseram, caso ndo se arvependam das obras que ela incita. (Ap 2.22, ARA) Em suas misericérdias, o Senhor tudo faz para retardar seus jufzos so- bre os impeniventes. Ele da-lhes tempo, envia-lhes proferas ¢ mensageiros ¢, através do Espirito Santo, insta-os a que se arrependam de suas iniqui- dades. A Faraé, por exemplo, ofereceu pelo menos dez oportunidades, . Mas, a cada nova chan- ce de arrependimento, o rei do Egito mais endurecia 0 coracéo, forcando Deus a destruir-lhe o pais com todas aquelas pragas ¢ pestiléncias. para que 0 monarca lhe reconhecesse a soberani © mesmo fard 0 Senhor com a profetisa de Tiatira e com os que tomaram parte em suas imundicias. Dois graves juizos o Senhor lhes pre- parou. Sobre Jezabel viré uma enfermidade nao especificada, ¢ sobre os seus amantes uma tribulagéo que recebe 0 epiteto de grande. 1. A enfermidade como juizo divino. Deus usaré uma enfermidade, a fim de punir Jezabel: “Eis que a prostro de cama” (Ap 2.22, ARA). O leito que até aquele momento dera-lhe prazer, doravante proporcionar- The-4 dores, angtistias e desconfortos. Deus nao mudou. Adverte o apéstolo Paul no se zomba; pois aquilo que o homem semear, isso também ceifara. Porque © que semeia para a sua propria carne da carne colhera corrup¢ao; mas o que semeia para o Espirito do Espirito colherd vida eterna” (Gl 6.7,8, ARA). Jezabel teve tempo para arrepender-se, mas 0 rejeitou. Por isso, tera de arcar com as consequéncias de suas apostasias, adultérios e abomina- “Nao vos enganeis: de Deus des. O mesmo aconteceré com os seus amantes. 2. A tribulagao sobre os adtilteros. Se a cnfermidade que se abateré sobre Jezabel nao seré pouca, a uribulagao que vird sobre os seus amantes nao ha de ser pequena. © Senhor Jesus colocara “em grande tribulacao os que com ela adulteram, caso nao se arrependam das obras que ela incita” (Ap 2.22, ARA). S6 havia um jeito de eles escaparem ao juizo divino: arrependimento. Mesmo no juizo, Deus se lembra da misericérdia. Mas como agiré o Senhor se lhe rejeitarmos a bondade? 89 Os Sere Casticgats DE OURO VII. QUANDO JESUS MATA Matarei os seus filhos, ¢ todas as igrejas conhecerio que eu sou aquele gue sonda men- tes e coragoes, ¢ vos darei a cada um segundo as vossas obras. (Ap 2.23, ARA) Pode o meigo Nazareno matar alguém? Apregoando 0 amor por toda a Judeia, constrangeu seus discipulos a exercitar o perdao ea misericérdia. Insultado ¢ descrido, nao reagiu. Na cruz, suportou o insuportavel. Por que, entdo, mararia cle os filhos de Jezabel? Como explicar-the a atitude téo extremada? Se estivéssemos na Tiatira daqueles dias, logo entenderiamos 0 porqué de sua ira. Além do mais, se ele nao suportou a mentira de Ananias e Safar , como haveria de tolerar os adultérios ¢ abominagées de Jezabel? 1. Penalidade maxima. A sentenca jé havia sido lavrada pelo Se- nhor: “Matarei os seus filhos” (Ap 2.23, ARA). Ora, se a impenitente era Jezabel, por que Jesus matar-lhe-ia os filhos? Seriam estes tao abomind- veis quanto a mae? Assim como Jezabel matara espiritualmente os filbos de Deus, arrastando-os ao adultério e & prostituicao, assim também o Senhor faria com ela, matando-lhe fisicamente os filhos. Somente assim ela haveria de sentir o peso do julgamento divino. Além de destruir toda uma igreja com as suas abominacées, ela rejeitara, conscientemente, o oferecimento da graga divina. O que um crente nessas condigées deveria esperar? Jesus continua a punir com a morte os abomindveis. Ele € 0 Juiz que o Pai constituiu, a fim de justigar os que promovem a iniquidade € 0 pecado em sua casa. Portanto, muito cuidado. Deus nao se deixa escarnecer. 2. O reconhecimento da divindade de Cristo. Jezabel conseguira tur- bar ni 0 apenas Tiatira, como também as demais igrejas da Asia Menor. Se Jesus nao interviesse a tempo, todas seriam induzidas a supor que Deus nao faz. bem nem mal e que pouco se importa com a postura espiritual ¢ ética de suas ovelhas. Nao pensavam assim os contemporineos de Jerernias? A fim de que os crentes soubessem que a Igreja de Deus tem go- verno, Jesus interviria dolorosamente no meio de seu povo: “Matarei os seus filhos, e todas as igrejas conhecerao que eu sou aquele que sonda mentes e coragées” (Ap 2.23, ARA). Sera que Jesus precisa matar alguém para lhe reconhecermos a soberania? Nao é a sua palavra suficiente para causar-nos temor e tremor? Quisera Deus agissemos como Habacuque: 90 TiaTtea, a doRija Touekanve “Ouvi, Senbor, a tua palavra e temi; aviva, 6 Senhor, a tua obra no meio dos anos, no meio dos anos a notific (Hb 3.2). Se uma igre : na ira lembra-te da misericérdia” ja loc | nao for disciplinada pelo Senhor, em breve con- raminard a Igreja Invisivel e Universal. Para que isso nfo ocorra, o Senhor Jesus se apresenta néo somente com a sua voz mansa e suave, mas tam- bém com a espada de sua vinganca. VIII. AS PROFUNDEZAS DE SATANAS Digo, todavia, a vds outros, os demais de Tiatira, a tantos quantos nao tém essa doutrina ¢ que néo conheceram, como eles dizem, as coisas profiundas de Satands: Outra carga nio jogaret sobre vds (Ap 2.24, ARA). De vez em quando, aparece alguém em nossos arraiais com uma nova revelacao. Hoje ele apresenta um livro que, segundo faz questao de ressaltar, é mais inspirado que a propria Biblia. Amanha, contaré um sonho, exigindo uma revisio de todos os nossos artigos de fé. E, nao satisfeito, logo demandara uma posicao privilegiada na Igreja de Cristo. Embora tais individuos afirmem ter uma relac4o especial com os misté- rios divinos, na verdade, sio intimos daquilo que o Senhor Jesus chama de “profundezas de Satands”. Nao podemos stbestimar os mercendrios. Fles ludibriam até experi- mentados obreiros. Com pulos, gritos e gestos magicos, vendem mentiras e engodos doutringrios. Lamentavelmente, h4 sempre algném d isposto a comprar essas tralhas teolégicas como as tiltimas revelagées de Dens. FE como pagam caro por essas parolices. Se nao agirmos com energia, como poderemos preservar o remanescente fiel de nossas igrejas? 1. O remanescente de Tiatira. Havia um remanescente em Tiati- ra que se opés com firmeza e coragem aos ensinos de Jezabel. Eles nao se deixaram arrastar por suas profecias nem pelos seus ensinos irresisti- velmente sedutores. A esses herdis andnimos, promete 0 Senhor Jesus: “Digo, todavia, a vés outros, os demais de Tiatira, a tantos quantos nao tém essa doutrina ¢ que nao conheceram, como eles dizem, as coisas pro- fundas de Sacands: Outra carga nao jogarei sobre vés” (Ap 2.24, ARA). Deus sempre reseryou um remanescente que lhe mantivesse os ter- mos das aliancas. Haja vista os judeus que, no tempo de Jeremias, nao 91 Os Sere Casti¢ais DE Quro se deixaram contaminar pela idolatria ¢ iniquidade que acabariam por destruir o Reino de Juda. Outrossim, nao podemos nos esquecer dos sete mil profetas do Senhor que, no turno de Elias, conservaram-se figis ao Senhor, nado se curvando diante de Baal. Apesar da iniquidade que assola a Igreja de Cristo, ha um remanes- cente que resiste ao pecado. Eles brandem a espada do Espirito contra as heresias e os modismos. Nao se deixam levar pelas seduces das riquezas, nem pela concupiscéncia da carne. Homens de Deus ¢ nao do povo, no se preocupam com indices de aceitagdo. O seu compromisso ¢ com © Senhor. Eles falam o que a Igreja precisa ouvir, e ndo o que alguns crentes querem escutar. O remanescente fiel nao faz acordo com Balaao, nao comunga com os nicolaitas e nao se impressiona com o misticismo excéntrico e pecaminoso de Jezabel. Eles nao estéo interessados nas pro- fandezas de Sarands, porque vive n s regides celestiais em Cristo Jesus. No remanescente fiel, hé mogos e mogas que se conservam puros no corpo ¢ na alma. Valorizam a pureza, pois sabem que Deus julgara os adul- teros ¢ fornicatios. Nao se entregam as drogas, pois o seu corpo é 0 templo do Espirito Santo. Nao se deixam seduvir pelas riquezas, pois j4 possuern um bem maior: a certeza de um dia morar na Jerusalém Celeste. 2. As profundezas de Satan4s. A doutrina de Jezabel era mais peri- gosa do que o paganismo. Os gentios limitavam-se a adorar os deuses do Olimpo. Ela nao; ia muito além: rendia culto ao préprio deménio. Eo que deduzo desta adverténcia de Cristo: “Digo, todavia, a v6s outros, os demais de Tiatira, a tantos quantos nao tém essa doutrina ¢ que nao co- nheceram, como eles dizem, as coisas profundas de Satands: Outra carga nao jogarei sobre vés” (Ap 2.24, ARA). Na aparéncia, uma crente arismAtica. Devia falar linguas. Tinha vi- sdes. Profetizava. B, de vez em quando, fazia algum milagre. Com todas essas faganhas, quem haveria de contesté-la? No entanto, como respon- saveis pelo rebanho de Cristo, nao devemos dar crédito a quaisquer espi ritos. Temes de prové-los, para ver se procedem de Deus. Nao diz, Paulo que Satands € capaz de mostrar-se como anjo de luz? Além dis podemos confundir fervor com espiricualidade. Se a tal profetisa vivesse em nossos dias, seria conhecida por um epi- teto nada elogidvel: Jezabel, a Satanista. Mas, naqueles dias de tolerancia mérbida, era tida como uma santa mulher de Deus. E 0 seu ensino? 92 oO, nao Tu pita, A IGREIA TOLERANTE Acobertado por uma retérica falsamente piedosa, lembrava um discurso avivalista. Na esséncia, porém, era uma ardente apologista da prostituigao e da idolatria. Aprofundara-se ela de tal forma no reino das wevas, que havia se tornado intima do Diabo. E, ainda, gabava-se de lhe conhecer as coisas profundas Afinal, 0 que sao as profundezas de Satands? E a espiritualizacio do pecado ¢ a dogmatizacio do erro. A histéria das heresias mostra que esses sio os dois pilares sobre os quais se acham assentadas as seitas. Primeiro mistifica-se a iniquidade que, depois de uns ritos ¢ alguns gestos, deixa de ser iniquidade para fazer-se vircude. Em seguida, aparece um tedlogo a servico do deménio que, sistematizando um erro aqui ¢ esbogando um engodo ali, dé foros de ortodoxia As mais extravaganres aberragées teo- légicas. Acima de todos, estd 0 falso profeta. Amigo de Satands, conta visées e profere incongruéncias. Assim, brora uma heresia, enflora uma apostasia e, finalmente, frutifica-se uma seita. Quase todos os heresiareas dizem ter visto um ente celestial. Este conversou com Miguel, aquele entrevistou Gabriel e aqueloutro falou com um dos querubins. O que todos esses hereges tem em comum é uma vida de engano, pecado ¢ impiedade. Eles sao os antitedlogos, pois tudo fazem por conhecer as profundidades de Satands. Por isso, espiritualizam oe adultério ¢, & sua maneira, “santificam” o assassinato, como o faziam os adoradores de Moloque no Antigo Testamento. 3. Jesus intervém em favor dos santos. Os fidis da igreja em Tiatira estavam sob fogo cerrado. De um lado, Jezabel com um misticismo infer- nalmente sedutor; de outro, as perseguigées que Ihe moviam o Império Romano. Sabia o Senhor Jesus que, sobre eles, recafa uma carga que sé podia ser descrita com grandes superlativos. Por isso, promete-lhes: “Ou- tra carga nao jogarei sobre vés” (Ap 2.24, ARA). Deus nao permitird que sejamos tentados além de nossas forgas. Com a provacao, chegard o escape. As vezes, Ele nao nos livra da fornalha, por- que no fogo tem um encontro conosco. Nao nos isentard da cova, mas na cova revelar-nos-4 0 seu amor. Também nao impedira a tempestade, porque em meio aos vendavais ¢ as chuvaradas, vird Ele caminhando na tormenta, e desafiara cada um de seus filhos a fazer o mesmo. Conhecendo-nos a estrutura, sabe o Senhor Jesus até quanto pode- mos suportar. Por isso, tranquilizemo-nos: a cruz que temos de carregar jamais excederd nossas forcas, apesar de parecer tao pesada. 93 Os Sere Casrigais pz Ouro 1X. CONSERVANDO A FE EM TEMPOS ABOMINAVEIS tio-somente conservai 0 que tendes, até que eu venba. (Ap 2.25, ARA) Tiatira repetia o pecado de Baal-Peor. As trés heresias da Asia Menor acha- ram um fertilissimo terreno nessa igreja, Nela, os nicolaitas germinaram o mer- cantilismo da Palavra de Deus, e os seguidores de Balado, nela, enfloraram a apostasia que levou Israel 4 ruina. Nela, frutificou também a doutrina de Jeza- bel, que acabou por enramar toda a igreja. Até 0 pastor, que tanto se esforgava por Cristo, ndo pdde escapar aos tentaculos daquela abominavel profetisa. Nao era nada facil conservar os bens espirituais num lugar que promovia a idolatria ¢ a prostituigao. Eis porque o Senhor exorta o remanescente de Tiatira: “Tao-somente conservai o que tendes, até que eu venha” (Ap 2.25, ARA). 1. O que temos recebido de Deus. Por intermédio de Cristo, mui- tas coisas temos recebide de Deus. A salvacao é apenas uma delas. Em- bora no tempo, j4 usufrufmos toda uma eternidade ao seu lado, pois Ele colocou todos os poderes do mundo vindouro a nossa disposigao. Se to- dos esses bens se fizessem visiveis, jamais os negociariamos. Mas, invisos que sdo, nem sempre temos suficiente fé para vé-los. Por isso, corremos o risco de negoci-ios na feira das vaidades. Foi o que fizeram alguns cren- tes em Tiatira. © remanescente fiel, porém, que jamais deixou de ver o invisivel, manteve-se firme, retendo firmemente a sua heranga. 2. Até que Jesus venha. Nossa vitéria sé seré completa se perseve- rarmos até o fim. Embora a jornada pareca longa, em breve a comple- taremos, pois tudo nos mostra que Jesus em breve vird. Por isso, nao podemos desistir. Seremos chamados a Casa do Pai, onde o Senbor foi preparar-nos lugar. Conclusao Ao contrario de Efeso, a igreja em Tiatira fizera-se conhecida pelo amor. Mas, se a primeira foi clogiada por odiar os maus, a segunda foi repreendida por tolerar o mal. Aquela faltava amor; a esta, o amor até sobejava. Entretanto, nenhum dos dois amores era perfeito. Efeso ja nao amava como antes. Tiatira, ao contr4rio, amava mais do que antes, porém ainda nao amava conforme Cristo 0 requetia. 94 TisTips, A LGREIA TOLERANTE © seu amor, para ser perfeito, ndo podia ser tolerante para com o erro, © seu amor tinha de apresentar as qualidades que Paulo requer no hino que consagra & virtude das vircudes (1 Co 13). Se accitarmos as reivindicagées divinas, herdaremos a promessa que Cristo fex ao seu pastor cm Tiatira: “Ao vencedor, que guardar até ao fim as minhas obras, eu the darei autoridade sobre as nagées, ¢ com cetro de ferro as regerd ¢ as reduzird a pedagos como se fossem objetos de barros assim como também eu recebi de meu Pai, da (Ap 2.26-28, ARA). Entdo, que ougamos a vox do Espirito Santo. Ihe-ci ainda a estrela da manha” 95 Ao anjo da igreja em Sardes escreve: Estas coisas diz aquele que tem os sete Expiritos de Deus e as sete estrelas: Conhego as tuas obras, que tens nome de que vives e estds morto. Sé vigilante e consolida o resto que estava para morrer, porque nao tenho achado inregras as tuas obras na presenca do meu Deus. Lembra-te, pois, do que tens recebido ¢ ouvido, guarda-o e arrepende-te. Porquanto, se ndo vigiares, virei como ladrao, e ndo conhecerds de modo algum em que hora virei contra ti. Tens, contudo, em Sardes, umas poucas pessoas que nao contaminaram as suas vestiduras e andario de branco junto comigo, pois so dignas. O vencedor serd assim vestido de vestiduras brancas, e de modo nenhum apagarei o seu nome do Livro da Vida; pelo contnirio, confessarei o seu nome diante de meu Pai e diante dos seus anjos. Quem tem ouvidos, ouga 0 que o Esptrito diz as igrejas. (Ap 3.1-6, ARA) Introdugao Ninguém conseguia acreditar que bem ali, entre as congregacées da Asia Menor, jazia uma igreja morta. Deitada naquele luxuoso esquife, lembrava mais a Bela Adormecida. Infelizmente, nao era um conto que se narrava ali. O que se via era um drama desenrolado em tragédia. Con- templando-a mais de perto, tinha-se a impressdo de que ela, estendida Os Sere Castigars pr Ouro placidamente no atatide de seu eclesiasticismo burocr ‘o ¢ inflexfvel, aguardava apenas a chegada do principe. E, que este, com um tinico bei- jo, devolvé-la-ia & vida. A histéria poderia, entao, ter um final venturoso: “F viveram felizes para sempre” A igreja em Sardes fora morrendo aos poucos, até esvaziar-se do Es- pirito Santo. Mas ninguém dizia que estava morta. Sempre bem maquia- da administrativamente, e ostentando ticos ornatos littirgicos, conseguia fingir uma vida que enganava a propria vida. Agora, ali estava Sardes & espera do beijo que a desencantaria do sono fatal. O Principe da Vida nao apareceu. Mas enviou-lhe uma carta, por jntermédio de Joao, buscando reavivar-lhe a particula de vida que lhe remanescia no organise, Um organismo adoentado, mumificando-se organizacionalmente. A carta trouxe ndo sé 0 beijo do Noivo, mas o ha lito do Espirito Santo que, assoprando sobre cla um grande avivamento, ressuscité-la-ia para uma vida de plenitude. Muitas igrejas, hoje, assemelham-se a Sardes. Morreram ¢ ainda nao o sabem. Vivem do passado, pois j4 nao existem no presente. E, apesar de serem admiradas como histéria, sao lastimadas por ja nao fazcrem histéria. I. AIGREJA EM SARDES Quem visita hoje a Turquia, talvez. nao imagine gue 0 vilarejo de Sart jd abrigou, na antiguidade classica, a florescente ¢ exaltada Sardes. De sua antiga gloria, restaram umas ruinas ali, uns sitios arqueolégicos acold ¢ algumas colunas que ainda teimam manter a postura de outrora. A sua volta, porém, somente pedra derribada e cafda. Nessa cidade, havia uma igreja que teve o privilégio de receber uma carta do Senhor Jesus, por intermédio de Joao. 1. A cidade de Sardes, Na época do Novo Testamento, Sardes jd nao era uma cidade tao importante. Nos séculos anteriores, contudo, fizera-se Jouvavel por seus tesouros € pelo luxo que exibia, Era a capital da Lidia. E, dai, o lendario rei Creso (560-546 a.C.) comandava as regides circun~ vizinhas com singular magnificéncia. Vista ao longe, parecia uma fortaleza inexpugnavel. Era impossivel escondé-la, pois se aprumava bela ¢ rica num promontério que se elevava a 500 metros acima do nivel do mar. Apesar de sua edificagao privilegiada 98 _ Sanus, 9 Seas, Monta e quase inacesstvel, foi conquistada em 546 a.C. por Ciro, rei da Pérsia. O mesmo faria Antioco, 0 Grande, em 214 a.C. Este, apés solidificar a sua posse, dd infcio & helenizagio da cidade. Com as suas reformas, Diocleciano (244-311 d.C.) escolhe Sardes como sede administrativa da Asia Menor. F, assim, a cidade permane- ceria até a queda de Roma, ocasiéo em que passou A jurisdicao de Cons- tancinopla. Localizada no fertilissimo vale do rio Hermo, Sardes fazia a ligagdo do Egeu com o interior do continente. Por causa de seu es atégico po- sicionamencto, cra guarnecida, nos dias apestélicos, por uma poderosa guarnicdo do império. Sua principal divindade era Artemis, cujo culto girava em torno da morte e do renascimento. Filha de Zeus ¢ irma gémea de Apolo, a deusa era servida por uma licurgia lasciva ¢ concupiscente. Para nao desagradar aos demais deuses, os habirantes de Sardes tinham altares ¢ nichos para cada um deles. Nenhum olimpiano podia reclamar da liberalidade reli- giosa daquela gente. A principal atividade econdmica de Sardes cra o fabrico de roupas de 14, comercializadas em toda a Asia Menor. 2. A igreja em Sardes. A igreja em Sardes foi estabelecida provavel- mente pelo apéstolo Paulo, quando de sua terceira viagem missiondria. A semelhanea das outras igrejas da Asia Menor, cresceu ¢ desenvolveu-se, refletindo a vida de Deus em suas ages evangelisticas e missionarias. O tempo, porém, encarregou-se de exaurir-Jhe toda a vitalidade espi- riual. Ela, agora, vivia de aparéncias ¢ exterioridades. Embora parecesse viva, jazia morta em suas iniquidades. Apesar da evidéncia de méritos, suas obras nao sao perfeitas nem integras aos olhos de Cristo; so indicios de um organismo que se deixou mumificar Il. A APRESENTACAO DE JESUS Ao anjo da igreja em Sardes escreve: Estas coisas dix aguele que tem os sete Expivitos de Deus e as sete estrelas. (Ap 3.1a, ARA) A uma igreja espiritualmente morta, apresenta-se Jesus como o Prin- cipe da Vida. Nenhum outro ser, em todo o Universo, entende mais da vida e da morte do que Jesus. Ele compreende os mistérios que cercam a primeira, € nao ignora o desconhecido que envolve a segunda. Verdadeiro 99 Os Seve Castigats pp Quro Deus, tem a vida em si mesmo. E, verdadeiro homem, experimentou a morte, triunfando dela na cruz. 1. O Principe da Vida e a igreja morta. Nos trés anos de seu mi- nistério terreno, Jesus curou a muitos enfermos e ressuscitou a diversos mortos. Na casa de Marta ¢ Maria, embora tomado pela tristeza da mor- te, alegrou a todos ao chamar Lazaro ao convivio dos vivos (Jo 11.25). Ressuscitar um morto nao lhe é dificil. Basta-lhe uma tnica palavra a morte logo se faz vida. O milagre independe da vontade do que jaz no esquife ou do querer daquele que repousa na campa. Mas como res- suscitar uma igreja que, embora morta, tem uma yontade que nao é a de Deus e um querer que nao é 0 de Cristo? Para reavivé-la, o Senhor Jesus utiliza-se do Espirito Santo em sua sétupla acao. 2. Os sete Espiritos de Deus. Existe apenas um Espirito Santo. Mas Ele é tao perfeito em seu ministério, que a Biblia no-lo apresenta de ma- neira sétupla. Ao profetizar o aparecimento do Messias, declarou 0 pro- feta: “Repousard sobre ele o Espirito do Senhor, o Espirito de sabedoria e de entendimento, o Espirito de conselho ¢ de fortaleza, o Espirito de conhecimento ¢ de temor do Senhor” (Is 11.2, ARA). O que Isafas revela nessa passagem? A acao do Espirito Santo sé haveria de tornar-se plena com 0 ad- vento de Cristo, pois, somente assim, teria Ele condicées de exercer 0 triplice oficio messianico: profeta, sacerdote ¢ rei. De fato, o Filho so- mente iniciou o seu ministério apés ser ungido pelo Pai (Mt 3-13-17). Embora verdadeiro Deus, necessitou da uncao do Espirito Santo para cumprir 0 seu ministério como o Filho do Homem. Ele nao recebeu 0 4). A-lo Espirito por medida, como acontecia no Antigo Testamento (Jo 3 Ele o recebeu plenamente. Foi o que Joao Batista atestou ao bati no Jordio. Ao sair da 4gua, o Filho de Deus recebeu plenamente o spirico Santo e, plenamente, derramé-lo-ia sobre a Igreja no Dia de Pentecostes (Jo 1.32; At 2.1-4). Desde entéo, o Espirito Santo vem se manifestando setuplamente. Na plenitude de sua ago sobre o Reino de Deus, o Espirito recebe de Jesus 0 titulo de “outro Consolador” (Jo 14.16). O primeiro foi o prdprio Cristo que, em todo 0 seu ministério, sempre operou ¢ ensinou no poder do Espirito (Is 61.1). Assumnpco ao céu, rogou ao Pai que cnviasse sobre os discipulos 0 Consolador. Neste, aqueles se fizeram Reino de Deus. 100 Saves, 4 Loneja Morra E, agora, na confeccao do Apocalipse, evoca Jesus o Consolador, para iP. P que conforte os crentes de Sardes, que, enlutados, lamentam e choram a morte de sua igreja. III. SARDES, UM CADAVER BEM PRODUZIDO Conhego as tuas obras, que tens nome de que vives ¢ estds morto, (Ap 3.16, ARA) Quem visita a Praga Vermelha, em Moscou, tem a oportunidade de constatar 0 quanto a morte, as vezes, engana. Ld esta o Mausoléu de Lé- nin, onde repousa, desde 1930, 0 corpo do lider soviético. Para preservar aquela aparéncia de vida, o seu cadaver é conservado em dlcool, quinina, acetato de potdssio e fenol. Sob uma temperatura de 16°C e umidade entre 80 ¢ 90%, seus restos mortais assim permanecerao por algumas geragées até que alguém se digne a devolvé-lo ao pé. Em Sardes, havia também um mausoléu, no qual era mantido o ca- daver de uma linda igreja. Existindo como organizacao material, ela jd nao tinha vida como organismo espiritual. Aos olhos de todos, contudo, pare- cia viva. Acontece que o Senhor Jesus, que sonda todas as coisas, j4 nao lhe encontrava a pulsacao do Espirito. A vida de Sardes limitava-se ao nome. E © primeiro indicio de sua morte estava, justamente, em suas obras. 1. As obras mortas de uma igreja sem vida. Sardes assemelhava- se a muitas igrejas de nossos dias. Ativas e midiaticas, estao sempre a desfraldar bandeiras sociais. E fazem questao de serem reconhecidas como politicamente corretas. O seu ativismo é impecavel. Hoje, defendem as baleias. Amanha, a biodiversidade da Amaz6nia. E jd se preparam para apresentar uma apologia do homossexualismo. Por que nao? Os seus tedlogos, divorciados da Palavra de Deus, acham argumentos para tudo. Apesar de seus aparentes méritos, tais obras nao sao perfeitas nem integras aos olhos de Cristo; so apenas indicios de um organismo espiritual e moralmente morto. Ao anjo de Sardes, adverte o Senhor: “Conhego as tuas obras” (Ap 3.1, ARA). Jesus nao se deixou impressionar pelo seu ativismo hipécrita € mundano. Se aquele pastor conseguia agradar aos homens, desagradava profundamente a Deus, pois as suas eloquentes e notérias obras de nada valiam: estavam tao mortas quanto ele. Na Ansia pela aceitacao social, muitos obreiros vém substituindo o Evangelho de Cristo por um evangelismo social e comprometido com os 101 Os Sete Castigais px Ouro poderes deste século. Todavia, nenhuma bandeira, quer politica, quer so- cial, pode substituir o estandarte das Boas Novas de Salvacio, Proclamar a Palavra de Deus é a mais viva das obras da Igreja. 2. Sepultada no préprio nome. Martinho Lutero temia que 0 seu nome viesse, mais tarde, a denominar a igreja a ser formada por seus dis- cipulos ¢ seguidores. Receava ele que 0 seu movimento acabasse por ser sepultado na burocracia de uma denominacao. O reformador nao estava de todo errado. Via de regra, 0 avivamento masce como movimento do Esp/rito Santo ¢ termina como monumento A denominagao. Nao sou contra as denominacées. Alias. pelo que depreendemos das cartas que Jesus enviou as igrejas da Asia Menor, nem Ele proprio o ¢. Afinal, a Igreja Invisivel e Universal tem de se manifestar localmente. E, todas as veres que isso ocorre, recebe um nome. Todavia, precisamos tomar cuidado com os ten culos institucionais e burocraticos que, as vezes, ctiamos e que terminam por sepultar-nos. A Igreja Catélica é um exemplo cldssico. Suas organizagées ganharam tanta forga, que vieram a sufocar 0 organismo de Cristo. No entanto, a sua licurgia dé-nos a im- pressio de que cla continua a desfrutar da mesma vida que a animava nos dias apostélicos. Sardes sepultata-se em seu proprio nome. E, por isso, é gravemente repreendida por Jesus: “Conhego as tuas obras, que tens nome de que vives c ests morto” (Ap 3.1b, ARA). A igreja havia morrido; o seu nome, niio. Este servia de mausoléu aquela. Agora, achava-se exposta naquele luxuoso sarcéfago como sea da vivesse. FE que defunto bonito era. Bem maquiada e ornada ricamente, impressionava a todos. Até as suas obras mortas eram impressionances. Ali estava a mrimia de uma igreja local. gue, embora sem vida, sobrevivia gracas ao seu nome. Todavia, entre as suas ovelhas mortas, algumas ainda respiravam, mas 0 seu estado inspira- va cuidados: era gravissimo. IV. CRENTES EM ESTADO TERMINAL Sé vigilante ¢ consolida 0 resto que estava para morrer, porque néio tenho achado Integras as tuas obras na prevenca do meu Deus. (Ap 3.2, ARA) Em Sardes, havia trés grupos distintos de crentes: os mortos, os quase mortos € um remanescente que potfiava em viver para Cristo naquele vale de sombra e morte. Neste momento, o Senhor Jesus insta o seu 102 a Sanpes, a Tore Monta anjo a consolidar o restante que estava para morrer. Ao mesmo tempo, exorta-o a andar em retiddo, porque as suas obras nao foram achadas invegras diante de Deus. Sem integridade o ministério pastoral é impossivel. Infelizmente, os cristaos atuais estéo se conformando tio depressa com 6 mundo, que nao mais se preocupam com determinadas faltas e pecados. Ha alguns que, vergonhosamente, até culto em ago de gracas fazem para agradecer a Deus por terem se apropriado indebitamente de bens alheios. Se um obreiro acha-se nessas condigées, nao poderd ajudar os que se encontram, espiritualmente, em estado terminal. 1. Vigilantes da vida. Vance Hefner nao foi apenas um grande avi- valista. Pensador e tedlogo dos mais admirados, ele comparou a Igreja, certa vez, a um hospital, pois com amor € prontidio, ela acolhe os doen- tes de alma, os enfermos de espirito ¢ os que j4 perderam a pulsacao es- piritual. Se esta imagem reflere a real vocacio do corpo de Cristo aqui na terra, Sardes tinha uma grande UTI e um enorme necrotério. Isso porque muitas de suas ovelhas jd haviam morrido e muitas outras encontravam- se em estado terminal. Diante de um quadro cio desolador, 0 Senhor Jesus requet, com urgéncia, os préstimos de um médico de almas, a fim de reanimar os moribundos que vinham artificialmente respirando. Por isso, o Senhor insta o seu anjo: “Sé vigilante ¢ consolida o resto que estava para morrer” (Ap 3.2, ARA). Mas como poderia o bispo de Sardes reanimar os moribundos, se ele mesmo estava morto? Sendo Je- sus a ressurreigdo ¢ a vida, primeiro aviva o pastor, para que este tenha condigées de reavivar as ovelhas. © principal objetivo do Senhor ¢ evar o avivamento aquele redil. Ele nao estava 14 para velar urn cadaver, mas a fim de chamar os mortos a vida. © verdadeiro pastor de almas age como aquele médico que, entre- gando-se por seus pacientes, vela por estes, a fim de que todos se re- cuperem. Em seu plantao, nao dormita nem se deixa tomar pelo sono. Mas, de cama em cama, repassa 0 histérico dos enfermos € prescreve a terapia mais adequada. E um servigo que exige um desvelo constante. Se néo agirmos com vigilancia, perderemos nao somente os enfermos terminais, mas também aqueles que se acham em vias de recuperagao. Este precisa de fé, pois a incredulidade infeccionou-lhe 0 coragao. Aquele outro carece de esperanga, pois 0 cotidiano das lutas acabou por necrosar- lhe a alma. E, aquele outro ainda, necessita do amor, pois a indiferenga 103 Os Sere Cast comprometeu-lhe 0 espirito. Todos estao para morrer, mas todos haverao de reviver, pois neste vale de ossos sequissimos, o Senhor Jesus enviard do seu Espirito, para reavivar a todos. 2. Aintegridade das obras. © que levou o pastor de Sardes a morrer no espirito? No dbito que the arestou Jesus, esta foi a sua causa mortis: “Nao tenho achado {ntegras as tuas obras na presenca do meu Deus” (Ap , ARA). Diante dos homens, seus atos eram eclesidstica ¢ politicamen- te corretos, Mas, perante Deus, ele vivia uma aguda crise de integridade. Apesar de tudo, conseguia enganat a todos com a sua postura de anjo. © que Ihe corrompeu as obras? A heresia dos nicolaitas? Ou a doucri- na de Balaao? Pelo que depreendemos da carta que Ihe enviou © Senhor, ele nao enfrentava problemas doutrinatios. Na aparéncia era tao ortodo- xo quanto © seu colega de Efeso. Também nao havia nenhuma profetisa para arrastar-Ihe as ovelhas 4 prosticuicgdo © & idolatria. Como se vé, é dificil determinar-lhe a etiologia da enfermidade, que acabou por maté- lo na fé. O que sabemos, de fato, é que as suas obras jé nao eram integras diante de Deus. O pastor de Sardes vivia de aparéncias. Aos olhos humanos, integro isrepreensivel. Aos divinos, porém, estragado corrompido. Em sua alma, havia um cancer, que Ihe vinha corroendo as afeicoes e comprometendo- Ihe, fatalmente, todo o organismo espiritual. A mecastase parecia irrever- sivel. Tudo comecou quando 0 orgulho assomou-lhe a alma. E, como a soberba precede a queda, faltava-lhe apenas um passo para cair na sepul- tura, que ele mesmo abrira. O rei Uzias, a propésito, também se deixara tomar por essa doenga, conforme escreve 0 cronista: “Mas, havendo-se ja fortificado, exalrou-se o seu coracao para a sua propria ruina, e cometeu transgress6es contra o Senhor, seu Deus, porque entrou no templo do Senhor para queimar incenso no altar do incenso” (2 Cr 26.16, ARA). A fim de puni-lo exemplarmente, o Senhor o feriu de lepra, privando-o nao somente do trono, mas também do convivio humano. Do orgulho 4 corrup¢ao, bastou ao anjo de Efeso apenas um pas- so. Agora, jd se colocava acima da Palavra de Deus. No entanto, fazia questao de manter uma postura eclesiasticamente correta, pois muito apreciava a companhia de seus pares. Foi assim que cle veio a falecer diante de Deus. Quanto ao Senhor Jesus, nao restou outra alternativa senao, de forma pesarosa, lavrar-lhe o dbito, determinando-lhe a causa mortis: corrup¢ao generalizada. 104 Sarves, 4 lereja Morta © caso de Sardes replica-sc endemicamente em nossos dias. Nao s4o Poucos os pastores que se deixam corromper no exercicio do ministério. Este, por faltar-lhe o poder do céu, abusa do poder da terra. Aquele, recu- sando-se a prestar contas do tesouro sagrado, entesoura profanagées para si, Aquele outro, dando asas as concupiscéncias, consome-se em grossei- ros © ocultos pecados. Temendo perder as prebendas ¢ os bonus eclesidsti- cos, todos eles mantém uma vida aparente, apesar da morte latente. Suas dissimulagées, porém, nao irdo adiante, pois j4 comegam a cheirar mal. Cristo, porém, nao quer conduzir as exéquias de nenhurn de seus ministros. Ele deseja reaviva-los ¢ trazé-los a plena comunhao com Deus. Mas, para que isso acontega, € urgente que nos lembremos do que temos ouvido e recebido do Senhor. LEMBRANGAS ESPIRITUAIS Lembra-te, pois, do que tens recebide ¢ ouvido, guarda-o ¢ arrepende-te. Porqudnto, se nao vigiares, virei como ladrio, e ndo conhecerds de modo algum em que hora virei contra ti, (Ap 3.3, ARA) Aamnésia da igreja em Sardes era mais grave do que a de Efeso. Esta se esquecera do primeiro amor; aquela, porém, veio a desmemoriar-se por completo do que tinha ouvido ¢ recebido de Jesus. Assemelhava-se ela A Filha de Sido que, j4 adulta ¢ bela, nao mais se lembrava dos espon- sais que, um dia, consagrara a Jeova. Por isso, é severamente repreendida por Jeremias. Mas como lidar com Sardes? Se eu fosse médico, diria que, baseado em sua sintomatologia, a igre- ja em Sardes encontrava-se em estado terminal, por j4 nao possuir lem branga espiritual alguma. Cerebralmente, estava morta. 1. As lembrangas espirituais. Ao anjo de Sardes, exorta Jesus: “Lem- bra-te” (Ap 3.3). Como pode um ministro da Palavra vir a esquecer-se de Deus? Na histéria de Israel, muitos eram os sacerdotes que, simplesmen- te, jd nao se lembravam nem perguntavam mais pelo Senhor. E, por causa disso, queixa-se Deus: “Os sacerdotes nao disseram: Onde est o Senhor? E os que tratavam da lei néo me conheceram, os pastores prevaricaram contra mim, os profetas profetizaram por Baal ¢ andaram atras de coi- sas de nenhum proveito” (Jr 2.8, ARA). Nao eram todos eles levitas? E nfo tinham eles todos como responsabilidade administrar a Lei de Deus? Como explicar, nto, a amnésia espiritual? 105 Qs Serr Casticats DE OURO Se 0 pecado nao for prontamente debelado, terminara por apagat- nos do espirito todas as imagens e recordagées que temos de Deus. E, assim, desmemoriados, nao mais poderemos desfrutar da comunhao com o Pai Celeste. Na vida do crente, por conseguinte, as lembrangas espiri- tuais s40 imprescindiveis. Sem elas, nao passamos de zumbis teoldgicos. Mas © que sao essas lembrangas? Séo as memédrias que, desde a nossa conversao, vimos recebendo graciosamente de Deus, por intermédio do Espirito Santo. 2. Nossa heranga em Cristo, Jesus volta a insistir junto ao seu anjo: “Lembra-te, pois, do que tens recebido e ouvido” (Ap 3.3, ARA). Nao posso ficar indiferente a essas palavras do Senhor, Com amorosa insistén- cia, dirige-se Ele a alguém que, embora haja recebido os mais cobigados bens na eternidade, nao soube como preservé-los no tempo. Mas, agindo qual prédigo, tudo desperdicara, vindo a desprezar profanamente a he- ranca do Pai Celeste. Sim, como 0 pastor de Sardes veio a esquecer-se dos maravilhosos dons que Ihe concedera Deus em Cristo? Além da salvacio de sua alma, fora ele galardoado com as maravilhas da graca. No tribunal divino, foi justificado. Na casa do Pai, recebeu a adocao de filho. No relacionamento com os céus, ja experimentava os poderes do mundo vindouro. E 0 chamamento ministerial? Intimado a pregar o Evangelho, proclamava algo que os préprios anjos anelavam perscrutar. Como se tudo isso nao bastasse, havia ainda a expectativa de um dia romper os portées da Jerusalém Celeste, para estar sempre com o Senhor. Infelizmente, 0 desmemoriado pastor de Sardes j4 nao se lembrava nem do que recebera, nem do que tinha ouvido do Senhor. Era alguém sem passado: suas memiérias espirituais j4 nao existiam. Nessa condigao, © seu futuro também era incerto. Portanto, urgia que ele recuperasse a meméria espiritual. Caso contrétio, seria surpreendido pelo Senhor Jesus que, sobre ele, viria repentina ¢ inesperadamente como 0 ladrao. 3. A chegada surpreendente de Cristo. Jesus, agora, dd um ulti- mato ao seu anjo: “Porquanto, se nao vigiares, virei como ladrao, ¢ nao conhecerés de modo algum em que hora virei contra ti” (Ap 3.3, ARA). Entio, havia uma segunda chance aquele pastor? O Senhor almejava fazé- lo ressurgir do mundo dos mortos. Era urgente, portanto, que cle ouvisse a Cristo e se arrependesse de seus pecados. Doutra forma, os resquicios 106 Sarvs, a Torti Monta de suas memérias espirituais ser-lhe-iam tirados por aquele que rouba mentes, coracées e espiritos. O ultimaro que Jesus apresenta ao seu anjo é escatolégico. O pastor de Sardes vé-se, agora, pressionado nao no tempo histérico, mas na urgéncia dos tiltimos dias. Era-lhe, pois, urgente arrepender-se de seus pecados, e se as lembrangas espirituais. Somente Cristo poderia operar-lhe tal milagre. E.o faria por meio do Espirito Santo. Foi o que Fle prometeu aos discipulos: “O Consolador, o Espirito Santo, rogar 20 Senhor que lhe restabelec a quem 0 Pai enviaré em meu nome, esse vos ensinard todas as coisas € vos fard lembrar de tudo o que vos tenho dita” (Jo 14.26, ARA). Das igrejas da Asia Menor, Sardes é a tinica a ser ultimada escatolo- gicamente por Jesus. A sua situagao era, em certo sentido, pior do que a de Laodiceia. Esta se amornara na fé; aquela, contudo, havia morrido e, mesmo assim, fingia estar viva. Por isso, achava-se tao descuidada quanto aos tltimos dias. Ela j4 no prestava atengao ao cumprimento das profecias, nem aos sinais que assinalavam a iminéncia da volta de Jesus, Sardes vivia como se este mundo fosse a sua eterna morada; ja se conformara com o seu luxuoso atatide. Por conseguinte, se o Senhor yoltasse naqueles dias, ela nao teria percebido. Seré que 0 mesmo nao esté acontecendo conosco? Oremos, pois, para que o Senhor Jesus nos renove a mence. VI. O REMANESCENTE FIEL Tens, contudo, em Sardes, umas poucas pessoas que nao contaminaram as suas vestiduras e andario de bance junro comiga, pois sho dignas. (Ap 3.4, ARA) Na igreja em Sardes, havia uma igreja. Nao era grande nem evidente. Alids, era téo pequena, que os seus membros podiam ser contados nos dedos da mao dircita de Cristo. A bem da verdade, aquele grupo era tao desprezivel que nem podia ser visto. Era invisivel aos olhos daquela maioria pecadora ¢ impenitente. Invisfvel, mas universal e militante. Je- sus conhecia-o muito bem, pois assim o descreve: “Umas poucas pessoas que nao contaminaram as suas vestiduras” (Ap 3.4, ARA). Em Sardes, havia um remanescente, que nao estava disposto a comun- gar com 0 mundo, nem a conformar-se com este século. Em meio aos mortos, destacava-se por uma vida abundante e plena. © proprio Cristo reconhece-os como dignos de andarem com Ele na Jerusalém Celeste. 107 Os Sere Casticais pe Ouro 1. A teologia do remanescente fiel. A doutrina do remanescente fiel evidencia a presenga invisivel do Reino de Deus no mundo. © que isso significa? No Israel apdstata, havia um Israel fiel e piedoso, conforme atesta Paulo: “Mas, relativamente a Israel, dele clama Isafas: Ainda que 0 numero dos filhos de Israel seja como a areia do mar, 0 remanescente & que serd salvo” (Rm 9.27, ARA). No tempo do apéstolo, esse remanes- cente encontrava-se escondido na Igreja de Cristo: “Assim, pois, também agora, no tempo de hoje, sobrevive um remanescente segundo a eleigao da graca” (Rm 11.5, ARA). Afinal, o corpo mistico do Senhor é formado, indistintamente, por judeus e gentios. Isaias ¢ Jeremias trataram largamente o assunto {Is 49.6; Jr 50.20). Em Israel, havia um Israel. E, na igreja, hd também uma igreja fiel € remanescente. Na visivel, acha-se a Invisivel. Na local, a Universal. E, na militante, a criunfante. Quem poderia imaginar que, numa igreja morta e envolvida com o mundo como Sardes, havia uma igreja viva ¢ compro- metida com o céu? Foi por causa desse grupo inexpressivo que o Senhor Jesus nao sepultou, de vez, aquela igreja que, apesar de morta, fingia uma vida que nao tinha vida. 2. A fidelidade do remanescente. Fm Sardes, o remanescente fiel dignificara-se por um viver santo ¢ irrepreensivel diante de Deus. Eles nao esperaram os tempos se consumarem para andar de branco na presenga de Deus. Em sua esperanga, anteciparam-se 4 escatologia, pois j4 viviam, com piedosa intensidade, a realidade da vinda de Jesus. Por isso, recebem do Se- nhor este elogio: “Nao contaminaram as suas vestiduras” (Ap 3.4, ARA). Sardes jazia morta em seus delitos. Suas vestes, manchadas pela ini- quidade, agora lhe serviam de mortalha. O remanescente, porém, andava de vestes brancas diante de Deus ¢ perante os homens, 3. A promessa ao remanescente, © remanescente fiel de Sardes re- cebe no tempo uma promessa eterna: “E andarao de branco junto comi- go, pois sao dignas” (Ap 3.5, ARA). Alids, eles j4 caminhavam de branco diante de Deus € perante os homens. Irrepreensiveis em seus caminhos, sacrificavam-se por um viver digno e¢ excelente. A consumagao das coisas, para eles, era apenas um incentivo para agradar ainda mais ao Senhor. Com o remanescente de Sardes, aprendemas que os bens eternos nao devem ser vividos apenas no porvir. Tém eles de ser experimentados no ptesente, pois somente assim ndo perderemos as lembrangas espirituais. 108 SAgDES, Na linguagem biblica, 0 branco significa justica, santidade e pureza. Tais virtudes caracterizavam os fitis de Sardes. Através de sua postura ili- bada, constitufam-se cles num protesto silencioso, mas eloquente, contra os desmandos e imoralidades que levaram aquela igreja 4 morte. O remanescente fiel tinha 0 rosto de Cristo. A igreja, porém, possuta a cara de Sardes. Além de viver do passado, entregava-se, no presente, aos pecados mais vergonhosos. Por is 0, nao era atacada nem pelas auto- tidades romanas, nem pelos hereges ¢ apdstatas que, de igreja em igreja, semeavam o seu joio. Afinal, por que atacd-la se cla j4 perdera toda a relevancia? VII. O LIVRO DA VIDA PARA UMA IGREJA MORTA O vencedor serd assim vestido de vestiduras brancas, ede mado nenhum apagarei 0 seu nome do Livro da Vida; pelo contrario, confessaret 0 seu nome diante de meu Pai e diante dos seus anjos. (Ap 3.5, ARA) A uma igreja morta, Jesus n4o oferece um atatide, nem lhe acena com uma mortalha. Em seu infinito amor, anseia por escrever-Ihe o nome no Livro da Vida, e dar-lhe brancas vestiduras, a fim de que ela possa caminhar, ao seu lado, na Jerusalém Celeste. Ele nao estd em Sardes, para acompanhar o féretro de seu rebanho. Mas [4 esta para reavivar cada uma de suas ovelhas, a comecar pelo seu pastor. Sepultar é facil. Basta amortalhar 0 cadaver e depositd-lo numa ca- verna e, depois, tapé-la com uma pedra. E tudo esta acabado e, logo, sera tudo esquecido. Ressuscitar, porém, € um trabalho incémodo, principal- mente se o defunto ja cheira mal. Essa era a situacao de Sardes. Apesar de sua aparente vida, o seu mau cheiro j4 comegava a incomodat. Entre- tanto, Jesus queria aviva-la com o seu Espirito Santo, a fim de que ela se reerguesse como a agéncia por exceléncia do Reino de Deus. Para tanto, esperava Ele, de sua amada igreja, uma atitude vencedora. 1, Uma atitude vencedora. Embora derrotada pela morte, a igreja em Sardes € tratada, por Jesus, como herdeira da vida eterna. Logo, o seu rebanho nao precisa ser jogado numa vala comum, pois ld estava o Se- nhor. E, naquele vale de ossos sequissimos, Ele ajuntard cada osso com o seu osso, ¢ uni-los-4 com nervos e tendées. Ja recobertos de carne e pele, 08 esqueletos receberio 0 Espirito de Vida, e por-se-4o de pé como um poderoso exército de Deus. 109 Os Srre Castigats DE Ouro Fis 0 avivamento que Jesus enviard as igrejas que, subjugadas pela iniquidade, jazem espiritualmente mortas. Mas, para que isso acontega, é urgente que clamemos por um aviva- mento. Essa é a atitude vencedora que Jesus espera de cada um de nds. Se nao voltarmas ao cendculo, em breve morreremos como organismo c, como organizagio, seremos mumificados. A partir dai, expiraremos, lembrando-nos do passado, pois o futuro ser-nos-d incerto, A escolha é nossa. © que preferimos? A mortalha de um caddver? Ou as vestiduras brancas do vencedor? 2. As vestiduras brancas. $6 andaremos de vestiduras brancas na eternidade se, no tempo presente, caminharmos com vestidos alvos como testemunhas de Jesus. A exceléncia de nossa vida eterna, por conseguinte, rem de ser provada na efemeridade desse século perverso, abominavel inimigo de Deus. © momento atual exige que os santos sejam ainda mais santos, ¢ que os integros nao se envergonhem de sua integridade. Portanto, que jamais transijamos com os nossos principios. Se o fizermos, o sal tornat-se-é ins{pido ¢ a luz perderé toda a claridade. Se nao tivermos coragem de protestar contra © crro ¢ a corrupgéo que, miuitas vezes, invadem a Igreja de Cristo, perderemos todas as nossas caracteristicas de Reino de Deus. F, se isso acontecer, 0 nosso nome nao serd inserido no Livro da Vida. 3. O liyro da vida. A uma igreja que jd havia morrido espiritualmen- te, nado poderi haver melhor promessa do que a vida eterna: “De modo nenhum apagarci o seu nome do Livro da Vida” (Ap 3.5, ARA). Entao, 0 que podemos concluir? Ainda havia esperanga para Sardes. Apesar de seu lastimndvel estado, ela ainda achava-se inscrita no rol dos que, em breve, estarao desfrutando das bem-aventurancas na Jerusalém Celeste. Aquele velério, Jesus nao wazia mais uma vela. Mas la estava para acender o fogo de um grande ¢ poderoso avivamento. Por conseguinte, que as carpideiras deixassem de chorar, que as coroas de flores nao fossem mais entregues ¢ que as condoléncias fossem caladas. Jesus nao desiste de nenhuma igreja local, porque ama com amor eterno a Igreja Invisivel ¢ Universal. O nome de Sardes ainda estava no Livro da Vida. E Jesus nao queria riscd-lo dai, pois ele a comprara com o seu precioso sangue. Aleluia. 110 Saees, 1 force Ms 4, Jesus, o confessor. Além de manter o nome de Sardes no Livro da Vida, tinha-Ihe o Senhor outra promessa: “Confessarei 0 seu nome diante de meu Pai e diante dos seus anjos” (Ap 3.5, ARA). Almejava Ele confessar o nome de Sardes diante de Deus e dos santos anjos. Jesus ¢ 0 confessor de sua Igreja diante de Deus, porque espera que ela o confesse diante dos homens. No mais sublime dos céus, o Cordeiro de Deus estava prestes a confessar o nome de Sardes diante do Pai. Para muitos, ela j4 havia morrido, mas para Jesus, nao. Ela estava apenas dor- mindo. E, em breve, despertaria daquele sono. Conclusaio Quem tem ouvidos, ouga o que o Espirita diz és igrejas. (Ap 3.5) Jesus ndo queria chorar um cadaver, mas alegrar-se com alguém que voltava a vida. Por isso, exorta com duras instancias a sua igreja em Sar- des, Ele almeja reaviva-la. Que esta, pois, ouga a voz do Espirito Santo. Ha muitas igrejas semelhantes a Sardes. Vivem de aparéncias e so- brevivem de glérias passadas, porque j4 nao tém vida para glorificar a Deus no presente. Mas essa historia pode mudar e ter um final feliz. Sé precisamos de uma coisa, para isso acontecer: angustiarmo-nos por um avivamento. dil Ao anjo da igreja em Filadélfia escreve: Estas coisas diz 0 santo, 0 verdadei- ro, aquele que tem a chave de Davi, que abre, e ninguém fechard, e que fecha, ¢ ninguém abrird: Conhego as tuas obras — eis que tenho posto diante de ti uma porta aberta, a qual ninguém pode fechar — que tens pouca forga, entretanto, guardaste a minha palavra e nao negaste 0 meu nome. Fis farei que alguns dos que sto da sinagoga de Satands, desses que a si mesmos se declaram judeus e nio 340, mas mentem, eis que os frei vir e prostrar-se aos teus pése conhecer que eu te amei. Porque guardaste a palavra da minha perseveranca, também eu te guarda- rei da hora da provagdo que hd de vir sobre 0 mundo inteiro, para experimentar os que habitam sobre a terra. Venho sem demora. Conservd 0 que tens, para que ninguém tome a tua coroa. Ao vencedor, fi-lo-ei coluna no santudrio do meu Deus, e dat jamais saird; gravarei também sobre ele o nome do meu Deus, 0 nome da cidade do men Deus, a nova Jerusalém que desce do céu, vinda da ‘parte do meu Deus, € 0 meu novo nome. (Ap 3.7-12, ARA) Introdugao Jesus afirmou, em Cesareia, que as portas do inferno nao haveriam de prevalecer contra a Igreja. Todavia, quando lemos a carta que Ele or- denou fosse enviada a Filadélfia, assustamo-nos com a oposicao que vi- Os Sere Casti¢ais pz Ouro nha acabrunhando aquela pequena ¢ inexpressiva congregacao da Asia Menor, Além das pressGes externas, que nao eram poucas, internamente via-se ela constrangida a enfrentar um grupo a quem Jesus denomina de “sinagoga de Satands”. Filadélfia, porém, tinha um segredo. Apesar de nao possuir a exce- léncia teolégica de Efeso, nem a riqueza de Laodiceia, dispunha de algo capaz de mover céus ¢ terra. Ela amava perfeitamente a Deus, e nenhuma imperfeicao era encontrada no mor que dedicava aos homens. Vivendo um cristianismo simples, mas eficaz, 0 seu amor fazia-se mais prodigo ¢ abundante a cada manha. Quem ama como Filadélfia, jamais ser derrotado. Nem 0 préprio inferno, com todas as suas tralhas e asticias, ter4 condigées de barrar-lhe os passos. Por isso, promete-Ihe o Senhor Jesus abrir-lhe uma grande e inesperada porta. I. FILADELFIA, A CIDADE DO AMOR FRATERNAL Por causa de seus constantes e devastadores terremotos, Filadélfia nao era um lugar muito aprazivel de se morar, Nao obstante, ela floresceu. E, agora, j4 era chamada de a Pequena Atenas, porquanto muitos eram os seus centros culturais, academias filoséficas e santudrios dedicados aos habirantes do Olimpo. Nessa cidade sismicamente iddlatra, havia uma igreja inabaldvel ¢ que entrou para a Historia Sagrada, em virtude do amor que santificava a Deus e devido & constancia dos servicos que consagrava ao seu Reino. 1. A histéria de Filadélfia. A biblica Filaddlfia localizava-se na drea ocupada, hoje, pela cidade turca de Alasehir, junto ao Mar Egeu. Suas rui- nas ainda impressionam, ¢ déo uma clara ideia de sua primitiva grandeza. A histéria de Filadélfia tem infcio em 159 a.C. Nesse ano, colonos de Pérgamo, estimulados pelo rei Atdlo [, comegaram a estabelecer-se na regio. Por estar situada na confluéncia entre o Ocidente ¢ o Oriente, a aldeia, que viria a ser conhecida como Filadélfia, tornou-se rota obri- gatéria dos correios romanos que, céleres, tinham de cruzar diariamente ambos os continentes. Suas inchiscrias fioresceram ¢ puseram-se a atrair imigrantes de toda Asia Menor e de outras provincias romanas. Nao demorou para que a cidade ganhasse ares de metrépole. 114 Fitapiier, 4 Tertya 20 AMOR PEREE! A cidade recebeu o nome de Filadélfia devido ao amor que Atalo tinha por seu irmao Eumenes, a quem chamava de Philadelphos. To- davia, um amor muito mais alto, e infinitamente sublime, estava para ser conhecido ¢ experimentado naquele terreno que se pressupunha tio fraterno. 2. A igreja em Filadélfia. Jesus incluiu Filadélfia como destinataria do Apocalipse para mostrar o poder de uma igreja que soube como pre- servar 0 seu primeiro amor, num século desumano e indiferente a Deus. A semelhanga das outras igrejas mencionadas no Apocalipse, Fila délfia também foi estabelecida por Paulo, ou por algum membro de sua equipe. Pelo menos é 0 que inferimos desta passagem de Atos: “Durou isto por espaco de dois anos, dando ensejo a que todos os habitantes da Asia ouvissem a palavra do Senhor, tanto judeus como gregos” (At 19.10, ARA). A estada do apéstolo em Efeso impulsionou o Reino de Deus a estender-se por todo o continente. 11. JEsus, O DESPENSEIRO FIEL DA CASA DE DAVI Ao anjo da igreja em Filadélfia escreve: Estas coisas diz 0 santo, 0 verdadeiro, aquele que tem a chave de Davi, que abre, ¢ ninguém fechard, ¢ que fecha. eninguém abrird, (Ap 3.7, ARA) A uma igreja pressionada pelo inferno, mas que ansiava expandir 0 Reino dos Céus na terra, apresenta-se 0 Senhor Jesus como o santo, 0 yerdadeiro ¢ aquele que tem a chave de Davi. A Filadélfia, faz uma pro- messa especifica. 1. Jesus, 0 Santo de Deus. Em seu ministério terreno, Jesus era reconhecido como o santo de Deus até pelos proprios demdnios (Mc 1.24). Detentor dos mesmos atributos do Pai, o Filho separou-se, na eternidade, para cumprir, na plenitude do tempo, a sua missao salvadora. F, no mundo, j4 como o Filho do Homem, separou-se do pecado, mas nao se apartou dos pecadores, porque a sua obra consistia, justamente, em resgaté-los do poder das trevas. Sendo Jesus tio santo quanto Deus, pode reafirmar todas as pro- messas divinas, pois do Pai recebeu tal autoridade. Ao discorrer sobre essa prerrogativa de Cristo, afirmou 0 apéstolo: “Porque quantas sao as promessas de Deus, tantas tém nele o sim; porquanto também por ele é 115 Os Serr Casricais pe Ouro o amém para gléria de Deus, por nosso intermédio” (2 Co 1.20, ARA). Logo, o pastor de Filadélfia podia descansar nas promessas do Filho, por- que cada uma destas traziam a chancela do Pai. ‘A santidade é um dos principais atributos de Cristo. Se Ele é santo, de sua Igteja requer santidade e pureza (1 Pe 1.16). Portanto, Filadélfia deveria fazer-se notéria também pela santidade, pois sem esta ninguém verd o Senhor (Hb 12.14). 2. Jesus, o verdadeiro. Para validar, de vez, a sua promessa ao pastor de Filadélfia, Jesus apresenta-se, agora, como “o verdadeiro”. Nele, nao ba mentiras, nem variacées. Tudo nele é verdade. Alids, o proprio Senhor apresentou-se como a propria verdade: “Eu sou caminho, e a verdade, ea vida; ninguém vem ao Pai senao por mim” (Jo 14.6). Jesus é a verdade absoluta e irtecorrivel. Nele, tudo se inicia ¢ tudo nele se consuma. Sem Ele, o Universo nao tema qualquer sentido. Por isso, deveria a igreja em Filadélfia repousar em suas palavras. 3. O que tem a chave de Davi. Nesta instancia, Jesus apresenta-se a Filadélfia como aquele que tem a chave de Davi, pois somente Ele teve condigées de exercer o triplice oficio messianico: profeta, sacerdote ¢ rei (SI 110.1-7). Por isso, foi distinguido com a guarda da chave de Davi. No reinado de Ezequias, 0 tesouro real ficava a cargo de Eliaquim. Sem- pre que o rei precisava de algo, recorria a ele que, avisada e prudentemente, abria a tesouraria e, dai, tirava 0 que lhe era solicitado pelo ono de Davi. De igual modo, age o Senhor fesus. Ressurrecto dentre os mortos, recebe do Pai todo o poder nos céus e na terra (Mt 28.18). E, assim, so- beranamente autorizado, abre e fecha as portas no mais alto dos céus e na mais baixa das terras. JA ciente disso, consola-se Filadélfia. III. NO REINO DE DEUS, NAO HA PORTAS FECHADAS conheco as tuas obras — eis que tenho posto diante de 8 wma porta aberta, a qual ninguém pode fechar — que tens pouca forca, entretanto, guardaste a minha palavra e nao negaste 0 men nome, (Ap 3.8, ARA) Jesus conhecia intimamente a Filadélfia. Ele sabia que cla, apesar de nao possuir a exceléncia teolégica de Efeso, tinha a necessdria teologia ¢ doutrina para espalhar o Evangelho de Cristo até aos confins da terra. E, que, embora nao fosse rica como Laodiceia, tinha bens suficientes para 116 Fuabti tid, A [okiis Do AMOR PERE! enriquecer um mundo tao pobre de Deus. Tendo em vista o espirito vo- luntario de Filadélfia ¢ 0 servigo por ela apresentado, o Senhor promete abrir-Ihe uma porta ainda maior. 1. A primazia das obras de Filadélfia. Jesus conhecia perfeitamente cada uma das ages ¢ empreendimentos de Filadélfia, pois ao seu anjo declara: “Conhego as tuas obras” (Ap 3.8). Embora 0 Senhor no as de- cline, concluimos estarem elas ligadas, prioritariamente, & proclamacéo do Evangelho. Uma igreja que ainda preserva o primeito amor, jamais terceirizard as urgéncias da Grande Comissao, Se a igreja em Filadélfia, por um lado, empenhava-se na evangeliza- cao, por outro, nao descurava do ensino sistematico da Palavra de Deus, das obras de misericérdia e inclusdo social. Ela era apostolicamente com- pleta. Amava a Cristo ¢ nao podia deixar de amar os homens. Todavia, a anunciagéo das Boas Novas era a sua prioridade maxima. Nenhum proje- to, por mais alto e meritério, conseguia demové-la de sua responsabilida- de missiondria. Ela entendia que a igreja que nao evangeliza nao é digna desse nome. O tedlogo suico Emil Brunner afirmon que “a Igreja subsiste pela mis- sio, assim como o fago subsiste pela queima de combustivel”. Portanto, quando uma igreja deixa de evangelizar, em breve apagar-se-d como orga- nismo espiritual e extinguir-se-d como agéncia do Reino de Deus. Mas, se persevera em evangelizar, uma porta ainda maior ser-lhe-d abet 2. A porta de Filadélfia. A igreja em Filadélfia, abriria Jesus uma grande e espacosa porta de evangelismo e missées. Ele bem sabia que essa pequena, mas operosa congregacao, viria aproveitar ao maximo mais essa oportunidade de expansio do Reino de Deus. Acredito que essa querida igreja muito aprendeu com Paulo, que durante as suas trés viagens mis- siondtias jamais desperdi¢ara 0 ensejo de falar de Cristo a tempo ea fora de tempo (2'Tim 4.2). Na linguagem do Novo Testamento, a porta tem um significado evangelistico muito forte. O apéstolo Paulo, quando encerrava a Primeira Epistola aos Corintios, fala de uma dessas raras, mas abencoadoras por- tas, pata apregoar a Cristo aos gentios: “Ficarei, porém, em Efeso até ao Pentecostes; porque uma porta grande e eficaz se me abriu; ¢ ha muitos adversdrios” (1 Co 16.8,9). Entrando por essa porta, 0 apéstolo logrou evangelizar toda a Asia Menor. 117 Os Sure Castigats pp Ouro Mais tarde, ao chegar a Tréade, percebeu que Jesus abria-lhe outra porta missiondria: “Ora, quando cheguei a Trdade para pregar 0 evange- Iho de Cristo e abrindo-se-me uma porta no Senhor, nao tive descanso no meu espirito, porque nao achei ali meu irmao Tito; mas, despedindo-me deles, parti para a Macedénia” (2 Co 2.12,13). E, foi assim, que o Evan- gelho, chegando & Europa Oriental, nao demorou a conquistar 0 coragio do império — a férrea ¢ insensivel Roma. A igreja que, amorosamente, se entrega 4 evangelizagao, nao tem apenas uma janela aberta. Terd sempre uma porta escancarada, que lhe possibilita- 14, no poder do Espirito Santo, expandir o Reino de Deus até aos confins da terra. No final do século passado, a cristandade evangélica foi desafiada pela janela 10 x 40. Mas, pelo que sabemos, muito pouco foi empreendido para que as dimensoes dessa oportunidade fossem alargadas. O leste europeu nao foi desbravado. Os paises de expressao arabe e muculmana continuam a zombar de nossos esforcos missiondrios. Quanto a China, parece que todos nos amedrontamos com o grande ¢ terrivel dragao. ‘Todavia, nada precisamos temer, pois uma grande porta de evangelizagao se nos foi aberta. Ainda que seja pequena a nossa forga, em Deus faremos proezas. 3. A fora de Filadélfia. O proprio Jesus reconhece que Filadélfia nao é uma igreja forte. Como j4 dissemos, ela nao possui a pujanga te- oldgica de Efeso, nem as riquezas materiais de Laodiceia. Entre os seus obreiros, nao ha nenhuma celebridade. Todavia, eles sabem que hé uma missao ha cumprir. E nao voltarao atras. Dia desses, voltei a ler os Herdis da Fé. Nas paginas desse livro escri- to por Orlando Boyer, deparei-me com alguns homens que, apesar de sua “pouca forga”, fizeram grandes coisas para Deus. Deflagraram refor- mas, acenderam avivamentos e ultrapassaram as mais dificeis fronteiras da evangelizacao transcultural. Impressionei-me, particularmente, com William Carey (1761-1834). Conhecido como 0 pai das missées moder- nas, nao se deixou vencer por suas limitag6es. O seu lema era: “Espere grandes coisas de Deus. Faca grandes coisas para Deus”. O irmao Carey muito contribuiu para a universalizacio do Evangelho na época moder- na. A semelhanga do anjo de Filadélfia, tinha ele a fidelidade como uma de suas mais destacadas virtudes. 4. A fidelidade de Filadélfia. Nao obstante enfrentar provagées ex- ternas e, internamente, estar sendo coagido por uma oposi¢do que desco- 118 nhecia escrtipulos, 0 anjo de Fidaléifia manter: cristas. O proprio Senhor elogia-the a fidelidade: “Guardaste a m palavra ¢ nao negaste o meu nome” (Ap 3.8). Ele observava cada ordenanca ¢ mandamento de Jesus. Era-lhe a Grande Comissio a prioridade das prioridades. Nada lhe parecia mais urgente do que evangelizar e fazer missées. Embora as portas estivessem aparentemente fechadas, ele nao perdia o 4nimo. Com ousadia proclama- va as Boas Novas, apesar de saber que isso poderia custar-lhe a vida. Quem evangeliza no pode negat o nome de Jesus. Mesmo saben- do que o seu testemunho pode custar-lhe a liberdade e a propria vida, expée-se perigosamente, pois o amor que tem pelas almas perdidas leva-o a desprezar os horrores da morte. A fogueira do coliseu ¢ as feras da arena n&o o assustam, pois sabe que o seu testemunho, mesmo naquela hora de suprema provagio, pode arrebatar preciosas almas do fogo do inferno. Nao foi o que ocorreu no martitio de Estévao? O jovem Saulo, pressiona- do por seu testemunho, nao pdde ficar indiferente a fé. Tempos depois, ci-lo eransformado no grande apéstolo dos gentios. A fidelidade de Filadélfia ergui que jamais deixou de se opor A Igreja. -a como testemunha num mundo Iv. A SINAGOGA DE SATANAS Eis frei que alguns dos que sdo da sinagoga de Sarands, desses que a si mesmos se declaram judeus ¢ nito sdo, mas mentem, cis que os farei vir e prostrarse aos teus pés ¢ conhecer que cu te amei. (Ap 3.9, ARA) Junto 2 igreja em Filadélfia, havia um grupo de crentes que movia uma ferrenha oposicéo ao anjo desse pequeno, mas precioso, rebanho. Jesus cognomina-o de a sinagoga de Satands. Identificando-se como ju- deus, essa gente buscava introduzir elementos heterodoxos & sa doutrina. B, assim, seduzir os fiis, a fim de lograr proveitos materiais. O Senhor Jesus, entretanto, intervém em favor de sua igreja. Fle promete ao seu pastor forcar aqueles fmpios a prostrar-se-lhe aos pés € a reconhecer que aquele redil contava com todos os favores divinos. 1. A sinagoga de Satands. Na igreja visivel, ndo se encontra apenas a Igreja Invisivel ¢ Universal. Acha-se nela, também, as vezes, a sinagoga de Satands. Esta, todavia, nao faz tanta questao da invisibilidade, nem se limita a uma localidade. Quando the convém, mostra a cara, € pas- 119 Os Sere Castigais pr. Ouxo sa a confrontar, ostensivamente, os fi¢is. Para impressionar os incautos, tais individuos declaravam-se judeus. Mas nao desfruravam de nenhum parentesco com o patriarca Abraéo, conforme faz questao de ressaltar 0 Senhor Jesus: “Esses que a si mesmos se declaram judeus € ndo s4o, mas mentem” (Ap 3.9). Fles se diziam judeus, para dar a entender de que desfrutavam de uma relagao privilegiada com Jeova. Dessa forma, iam constrangendo 9s crentes a observar o cerimonial judaico ¢ outras praticas mfsticas. No entanto, o que eles, na verdade, desejavam era cativar ¢ subjugar os san- tos. Em Esmirna, haviam causado muitos dissabores ao pastor daquela cidade. Agora, comegam a atribular a igreja em Filadélfia. Nao sao poucas as igrejas que sofrem com tais grupos. Dizendo-se mais santos que os outros, arroram uma espiricualidade afecada e falsa. Urdem profecias, fabricam vis6es ¢ inventam sonhos. Habil e astutamen- te, jogam a igreja contra o pastor ¢ o pastor contra o rebanho. Eles sabem que, dividindo © rebanho, ser-lhes-d mais facil escrayizar as pobres ¢ ja indefesas ovelhas. A partir dai, arrastam-nas para os seus currais, onde Ihes arrancamn a la ¢ devoram-Ihes a gordura. Hoje, criam uma igreja. Amanha, acendem um movimento. Mais adiante, dao estratura a uma seita, Enquanto isso, prosperam teologias ¢ positivam suas confissdes. Eles, porém, nao irao adiante. O Senhor Jesus for¢d-los que tanto Esmirna quanto Filadélfia contam com todos os favores divinos. a reconhecer 2. A exaltagio de Filadélfia. Em Esmirna, os pretensos judeus ha- Maotivados por essa viam blasfemado impunemente do anjo da igrej aparente impunidade, resolveram dar os ares de sua presenga em Filadél- fia. E, af, com todo o scu aparaco mistico ¢ legalista, passaram a afrontar a igreja ¢ © scu pastor, Agora, fazem-se ainda mais ousados. Afinal, até aquele momento, nenhuma disciplina haviam sofrido. Dessa vez, porém, Jesus decide intervir ¢ colocar um ponto final em sua delevéria carreira. Eles haveriam de reconhecer que tanto Esmirna, quan- vo Filadélfia, contavam com a protecdo divina. O Senhor promete ao seu anjo, que Woda essa oposigao cairia de joelhos diante dele: “Eis que os farei vir € prostrar-se aos teus pés ¢ conhecer que eu te amei” (Ap 3.9, ARA). © pastor de Filadélfia nao precisaria lucar, nem estabelecer um plano de acao, para combater aquela sinagoga de Satands que, desde Esmirna, nao havia parado de crescer em ntimero e influéncia. O proprio Cristo encarregar-se-ia por aquela gente impia e futil em seu proprio lugar. 120 FiLabéiria, + IGRELs DO AMOR PERERITO A HORA DA PROVACAO Porque guardaste a palavra da minha perseveranga, também en te guardarei da hora da provagio gue hd de vir sobre 0 mundo inteiro, para experimentar os que habitam sobre a rerva, (Ap 3.10, ARA) Jesus tinha duas promessas especificas para a igreja em Filadélfia: uma temporal ¢ outra escatolégica. A primeira referia-se ao livramento quanto aos ataques, que ela vinha sofrendo dos falsos judeus. A segunda dizia respeivo 4 Grande Tribulacéo que, apés o arrebatamento da Igreja, vird sobre o mundo inteiro. Por que 0 Senhor faz-lhe a segunda promessa de forma tao especifica e clara? Talvez porque o pastor de Filadélfia tivesse alguma diivida quanto as Ultimas coisas, © pensasse que os figis também haveriam de atravessar pela Grande Tribulagéo. Semeihante consolo somente recebe quem guar- da a palavra da perseveranga de Jesus. 1. A palavra da perseveranga, © que é a palavra da perseveranca de Jesus? E 6 comprometimento que tem o crente de cumptir ¢ obser- var cada mandamento ¢ ordenanga do Senhor. Naqueles dias, portar-se como discipulo de Cristo nao era uma tarefa nada facil. Em primeiro lugar, tinha-se de fazer uma escolha que podia custar, ao fiel confessante, a propria vida. Se o cristéo declarasse, ante os potentados romanos, que somente Jesus era Deus ¢ Senhor, arriscava-se a terminar os seus dias numa arena. Mas se ele, para agradar aos homens, renegasse o Filho de Deus, um castigo infinitamente maior aguardava-o na eternidade. Embora nao enfrentasse perigos imediatos como Esmirna, era Fila- délfia igualmente confessante. E viam-se ambas, agora, na contingéncia de suportac o insuportavel, por causa de sua fidelidade ao Senhor Je- sus. As outras igrejas, posto nao observarem tao fielmente a palavra de Cristo, nao eram tao pressionadas assim. Que pressio do mundo sofria Laodiceia? Tendo esta a cara do mundo, no mundo adaptava-se perfeita- mente, porque ela amava o mundo, e este, por ela, cafa de amores. Mas a recomendagao de Jesus 4 sua Igreja é que [he observemos a palavra da perseveranga. Caso contrdrio, sofreremos a hora da tentagao que ha de vir sobre o mundo inteiro. 2. A hora da provagao. Os proferas do Antigo Testamento alertaram a Israel, em diversas ocasides, acerca da proximidade do Dia do Senhor. Os judeus, porém, achavam que a tribulacto vindoura estava destinada 121 Os Sure Casticats px Ouro. apenas aos gentios. Quanto 4 semente de Abraao, por mais perversa € impia, esperava-a todas as bem-aventurancas dos céus e da terra. No entanto, vem o profeta Jeremias, e demonstra que a ira divina haveria de cair, igualmente, sobre todos os impios, quer israelitas, quer estrangeiros. E, provando serem verdadeiros os arcanos que, inspirado por Deus, anuncia- va, o profeta vaticina a queda de Jerusalém e a desttui¢zo do Santo Templo. O exilio & Babilénia, por conseguinte, era apenas uma figura do que estava prestes a abater-se sobre o Israel apdstata e sobre as nagées iniquas. A teologia do Dia do Senhor foi chancelada tanto por Cristo quanto por seus apéstolos. No Sermao Profético, Jesus detalha alguns lances da “tribulacéo daqueles dias”. O mesmo fazern Paulo ¢ Pedro, em suas epis- tolas, e Joao, no Apocalipse. ista, o Dia do Senhor é convencionalmente chamado Na ceologia « de a Grande Tribulacao. E, tendo como principal fundamento a promes sa que Jesus endereca ao pastor de Filadélfia, acreditamos que a Igreja nao sera constrangida a experimentar essa hora de singulares provacdes ¢ disciplinas. Por conseguinte, que a igreja em Filadélfia descansasse no tempo, porque na eternidade teria perfeita paz. VI. A COROA DA VIDA Venho sem demora. Conserva 0 que tens, para que ninguém tome a tua coroa (Ap 3.11, ARA} Filadélfia é a mais escatolégica das igrejas da Asia Menor. Ela traba- thava hoje, como se Jesus viesse amanha. Ela nao desperdigava nenhuma oportunidade evangelistica, pois trabalhava com urgéncia missiondria. Na carta que lhe enviou o Senhor, podemos detectas, pelo menos, quatro doutrinas referentes aos tiltimos dias: a volta de Jesus, a Grande Tribula~ cao, o galardao dos fiis ¢ a realidade da Jerusalém Celeste. O versiculo, que ora consideramos, é essencialmence escatolégico. Além de anunciar a proximidade do arrebatamento da Igreja, urge-nos a © ao Reino de Deus, a fim de nao perdermos a coroa da vida. Se nos aprofundarmos um pouco mais nessa passagem, con- conservar a devog cluiremos: somente as igrejas fi¢is sao escatolégicas. Porque somente elas tém a necessdria motivagao de entregar-se & evangelizacdo ¢ a dar-se, sem reservas, ao labor missiondrio. Elas agem assim por acreditarem piamente na brevidade da volta de Cristo. 122 Fuanetrns, a lene oo AMOR Perreiro 1. A iminéncia da volta de Jesus ¢ a evangelizagéo. © alerta do Senhor 4 Filadélfia nao admite adiamentos: “Venho sem demora” (Ap 3.11). Ao instar dessa forma ao seu anjo, nao visava Jesus levd-lo 4 con- templagao infrutifera, nem induzi-lo a um estresse improdutivo. Ele tam- bém nao queria que Filadélfia se perdesse em especulagées quanto aos tiltimos dias. © que o Senhor Jesus realmente pretendia era impulsion4- la a trabalhar enquanto ¢ dia. A Doutrina das Ultimas coisas nao tem como objetivo levar-nos a especular quanto ao futuro, mas a expandir o Reino de Deus no presente. Portanto, nossa tarefa basica nao ¢ a futurologia, mas a proclamacao do Evangelho até aos confins da terr: jamais descansa as maos. Quem espera pela volta de Cristo, 2. A coroa de Filadélfia. O maior bem de Filadélfia nao era a salva- cao, mas o privilégio de salvar o mundo pela proclamagao do Evangelho. Em vez de ver a Grande Comissio como a tarefa ardua e enfadonha, Filadélfia contemplava-a como o galarddo dos galard6es. Cumprindo-a, fazia-se ela Reino de Deus e corpo de Cristo. E, quanto mais se com- prometia com a obra evangelizadora, mais portas missiondrias abria-lhe Jesus. Por isso, soa-lhe como suave mtisica a exortagdo do Senhor: “Con- serva o que tens, para que ninguém tome a tua coroa” (Ap 3.11, ARA). A coroa de algumas igrejas é 0 evangelismo social, que nao evangeliza nem socializa o pecador. Filadélfia, porém, tinha como coroa o Evangelho Completo de Cristo. Proclamado no poder do Espirito Santo, ele nao se limita a ressociali- zar © pecador; vai além: transforma-o numa criatura nova ¢ titil. Por conseguin- te, na coroa de Filadélfia, as obras de misericérdia e a inclusao social nao eram a pedra principal, mas apenas adornos de uma ac4o evangelizadora plena. VII. A CELEBRIDADE DE FILADELFIA NO TEMPLO DE DEUS Ao vencedor, fé-lo-ei coluna no santudrio do meu Deus, e dit jamais sairds gravaret também sobre ele 0 nome do mex Deus, 0 nome da cidade do meu Deus, a nova Jerusalém que desce do céu, vinda da parte do meu Deus, 0 meu novo nome. (Ap 3.12, ARA) A Capela Sistina, situada no Vaticano junto ao Paldcio Apostélico, é a mais célebre igreja da cristandade. Inspirada no templo de Salomao 123 Os Srre Casticats pp Ouro ¢ aprincesada pelos mais celebrados mestres da Renascenca, deslumbea a todos que a visitam. La, encontramos os tragos de Michelangelo, os matizes de Rafael, as nuances de Bernini e as cores de Sandro Botticelli. Definitivamente, nao ha santuario como a Capela Sistina. Filadélfia, entretanto, nem templo possufa. Era tao desprezada, que artista algum se prontificaria a emprestar-lhe um pouco de beleza a hu- milde casa, onde ela, as escondidas, reunia-se a servir e a adorar a Cris- to. Mas, diante de Deus, Filadélfia, juntamente com a martir Esmirna, desfrutava de uma celebridade que ia além do tempo. Nao obstante suas limitagdes, tornou-se a mais célebre das igrejas da Asia Menor. 1. Filadélfia, a igreja vencedora. Filadélfia jamais perdera uma ba- talha, nem havia desperdigado qualquer oportunidade evangelizadora ¢ missiondria. Por isso, Jesus exorta-a a nao perder o foco de sua missio: “Ao vencedor” (Ap 3.12). Era-lhe urgente, pois, que continuasse a proclamar a Palavra de Deus até aos confins da terra a tempo ¢ a fora de tempo. Uma igreja é derrotada quando abandona a sua missao urgente e basica, e passa a dedicar-se a coisas que, diante de Deus, nao tém valor algum. Nessas condigées, assemelha-se ao Israel do tempo de Jeremias. Em vez de se deleitar com as 4guas vivas e distribui-las entre os sedentos, pGe-se a cavar cisternas rotas que, por sua propria natureza, nao conse- guem reter 4gua alguma. 2. Filadélfia, a igreja célebre diante de Deus. Quando chegarmos aos céus, veremos o nome de Filadélfia nalguma das colunas da Jerusalém Celeste, conforme promete Jesus ao anjo dessa amantissima igreja: “Fa- lo-ei coluna no sancudrio do meu Deus, ¢ dai jamais saird; gravarei tam- bém sobre ele 0 nome do meu Deus, 0 nome da cidade do meu Deus” (Ap 3.12, ARA). A promessa era futura, mas j4 comecava a ser desfrutada no presente, pois o nome de Deus podia ser visto nas obras, na postura ¢ no testemu- nho de Filadélfia. Na eternidade, seria ela uma das colunas da Cidade de Deus, mas, naquele momento, jd era reconhecida como baluarte divino na cidade dos homens, Ha muitas igrejas que se destacam apenas pelo testemunho individual de seus membros. Filadélfia, porém, realgava-se tanto individual quanto coletivamente como povo de Deus, pois o nome do Pai, do Filho e do Espirito Santo, podia ser lido em todas as suas acdes. Era uma carta viva. 124 FILADELFIA, A IGRE)A BO AMOR PERFELTO F, em seu rosto, havia a firme determinagio de quem peregrinava em diregao a Jerusalém Celeste. 3. Filadélfia, a igreja na Jerusalém Celeste. Na eternidade, Filadél- fia estard na Jerusalém Celeste, mas no tempo histérico, a Jerusalém Ce- leste jA podia ser vista em Filadélfia. Ela caminhava decididamente para Siao, e de ninguém escondia a sua determinagaéo em chegar aos portais da Casa do Pai. A sua peregrinacio era proclamadora e testemunhal, pois vivia um permanente avivamento. Enquanto a Jerusalém Celeste nao baixava a terra, Filadélfia subia aos céus, através das primicias de suas obras: evangelizagio ¢ missées. Conclusao Quando uma igreja local ama como Filadélfia e, como Filadélfia, proclama o Evangelho de Cristo, logo Deus a universaliza. Foi o que acontecen a essa amada ¢ amante igreja. O seu trabalho floresceu além dos limites da cidade que Ihe emprestou 0 nome. O seu exemplo floresce através desses dois milénios de cristianismo. Alguns historiadores dao-Ihe o nome ao periodo dureo das missées mun diais, que abrange os séculos XVIII, XIX ¢ parte do XX. Filadélfia é 0 padrao. Para alcanga-la no amor ¢ no testemunho € sé amar testermunhalmente. 125 Ao anjo da igreja em Laodiceia escreve: Estas coisas diz 0 Amém, a testemunha fiel e verdadeira, o principio da criagao de Deus: Conheco as tuas obras, que nem & Srio nem quente. Quem dera fosses frio ou quente! Assim, porque é morno e nem é quente nem frio, estou a ponto de vomitar-te da minha boca; pois dizes: Estou rico e abastado endo preciso de coisa alguma, e nem sabes que tu és infeliz, sim, miserdvel, pobre, cego ¢ nu. Aconselho-te que de mim compres ouro refinado pelo fogo para te enriqueceres, vestiduras brancas para te vestires, a fim de que néo seja manifesta a vergonha da tua nudez, e colirio para ungires os olbos, a fim de que vejas, Eu repreendo ¢ disciplino a quantos amo. Sé, pois, zeloso e arrepende-te. Bis que estou 4 porta e bato; se alguém ouvir a minha voz e abrir a porta, entrarei em sua casa e cearei com ele, e ele, comigo. Ao vencedor, dar-lhe-ei sentar-se comigo no meu trono, assim como também eu venci e me sentei com meu Pai no seu trono. Quem tem ouvidos, ouga 0 que o Espirito diz as igrejas. (Ap 3.14-22, ARA) Introdugao Louvo a Deus pelas noticias que me chegam das igrejas confessantes € mirtires. Nao sei se, algum dia, terei oportunidade de comunicar-lhes alguma dadiva. Mesmo porque clas se acham perdidas e oprimidas nos paises que compéem a jancla 10 x 40. O seu testemunho, porém, é capaz de abalar todas as portas do inferno. Os Sure Casticais DE Ouro Se no Oriente vejo o semblante de Esmirna, no Ocidente, envergo- nho-me com a cara despudorada de Laodiceia. Amornada em sua zona de conforto, ela ndo somente tomou a forma deste mundo, como secula- rizou-se também, perdendo toda nogao de eternidade. Laodiceia deixou-se coisificar. Nao mais possui as qualidades de luz e as propriedades de sal. Por isso, Jesus j4 no a suporta. Ela Ihe causa néu- seas € provoca-lhe Ansias de vémito. ‘Tal linguagem, embora forte e nada elegante, retrata com admirdvel exatidao boa parte da cristandade destes Ultimos dias. Entretanto, nem tudo esta perdido. Apesar do cendrio desa~ nimador, Jesus ainda nao desistiu da igreja em Laodiceia. 1. LAODICEIA, UMA CIDADE SOBERBA Centro financeiro da Asia Menor, Laodiceia destacava-se também pela industria téxtil ¢ por uma escola de medicina especializada em of- talmologia. No entanto, via-se em grandes dificuldades, por causa de scu precario abastecimento de dgua. Fundada em 250 a.C., a cidade ocupava uma posigdo estratégica, ¢, por isso mesmo, muito cobigada na Asia Menor. De leste a oeste, era cortada pela estrada Pérgamo-Sardes. E, do fértil Vale do Licos, tirava o necessdrio para o florescimento de sua agricultura. No ano 60 d.C., Laodiceia foi abalada por um grande terremoto. Mas, soberba e prepotente, recusou-se a reconstruir-se com 0 auxilio do Império Romano. Ela mesma encarregou-se de reergner-se do pé, e fez questio de mostrar que nada poderia destruir-lhe a formidavel riqueza Afinal, era a cidade dos banqueiros e miliondrios. Sua influéncia estendia- se por toda a regido, e acabou por afetar até mesmo a igreja estabelecida em seus termos. Il. UMA IGREJA CERCADA POR LAODICEIA Quando Israel chegou as cercanias de Jericéd, a cidade foi tomada pelo terror, ndo porque o exército hebreu fosse numeroso. Ela foi aterro- rizada porque os israelitas eram precedidos por um testemunho profético ¢ sacerdotal, E isso fez com que Jericd se encerrasse em seus muros, pois sabia que Israel tinha um firme compromisso com o Deus santo ¢ ver- dadeiro. © cerco daquela impenitente cidade era implacavel, conforme informa o autor sagrado: “Ora, Jericé estava rigorosamente fechada por causa dos filhos de Israel; ninguém saia, nem entrava” (Js 6.1). 128 Laonrerts, 4 Lars Mora A igreja em Laodiceia, porém, jd nao tinha testemunho, nem profecia, nem sacerdécio. Ao invés de sitiar, deixou-se sitiar. Em vez de transformar, conformou-se. E, agora, j4 nao havia difereng ela e Laodiceia. Sobrepujada por esta, j4 nao tinha forga testemu- entre nhal para levar a opulenta e orgulhosa cidade a receber 6 Evangetho de Cristo. Apesar de haver sido estabelecida como resultado de um grande avi- vamento, a igreja em Laodiceia acabou por conformar-se iquela atraente, mas infqua metrépole. Foi por isso que Jesus escolheu-a como uma das destinatérias do Apocalipse. Com isso, visava o Senhor a duas coisas. Em primeiro lugar, corrigir a postura daquele rebanho © reconduzi-lo na Palavra de Deus. B, também, alertar as demais igrejas a que fujam da mornidao espiritual, Ill. A TESTEMUNHA FIEL CONTRA UMA IGREJA INFIEL Ao anjo du igreja em Laodiceia escreve: Estas coisas diz. 0 Amém, a restemunha fiel ¢ verdadeira, 0 principio da eriacao de Deus. (Ap 3.14, ARA) A uma igreja presuncosa, infiel ¢ que vivia de mentiras, apresenta- se Jesus como o “Amém, a testemunha fiel ¢ verdadeira, 0 principio da criacto de Deus” (Ap 3.14). Nessas poucas, mas enérgicas palavras, o Senhor censura duramente Laodiceia porque, desprezando ela a suficién- cia divina, deleitava-se em prezar a suficiéncia humana. Jesus mostra-lhe também que Ele, ¢ nao ela, é a tiltima palavra de todas as coisas, porque nEle tudo se fez ¢ nele tudo se consumard. Nessa passagem, a cristologia é particularmente rica. Devido & situacao espiritual de Laodiceia, viu-se o Senhor Jesus constrangido a revelar-se nao somente como 0 cabeca da Igreja, mas também como 0 soberano do Uni- verso. Por isso, mostra seus atributos ¢ nao esconde suas atribuicées como Deus, Diante da pretensao da criatura, mostra as credenciais de Criador. 1. O Amém, a tiltima palavra de todas as coisas, A palavra “amém”, em hebraico, significa: verdadeiramente e assim seja. Durante o seu mi- nistério terreno, Jesus servia-se desse termo para iniciar e encerrar seus pronunciamentos. Todas as vezes que Ele, ao introduzir uma declaragao, dizia: “Em verdade, em verdade”, isso soava, aos ouvidos judeus, como se 0 129 Os Sere Casti¢als DE Ouro proprio Jeové afirmasse: “Amém, Amém”. Era uma afirmagio irrecorrivel, ¢ que possuia a forga de um decreto proclamado em tltima instancia. Ao apresentar-se & orgulhosa Laodiceia como o Amém, Jesus deixs Ihe bem patente ser Ele a tiltima palavra de todas as coisas. Por conse- guinte, deveria cla, como serva, reconhecer-lhe imediatamente 0 senho- rio. Ele € 0 Amém, porque todas as promessas nele se cumprem e, porque nEle todas as profecias fazem-se Histéria. 2. A testemumha fiel ¢ verdadeira. Identificando-se, agora, como a testemunha fiel e verdadeira, Jesus denuncia a infidelidade, a mentira e a auséncia testemunhal de Laodiceia. A situacdo dessa igreja era pior do que a de Sardes. Se esta vivia de aparéncias, aquela nao se preocupava em mantélas, porque ostensiva e publicamente j4 havia renunciado a sua alianca com Jesus. Sardes havia sido morta pelo pecado, Laodiceia, por seu turno, matava pelo pecado, pois deste tornara-se promorora. Se compat rmos, agora, Laodiceia a Pérgamo, constataremos que a situacdo da primeira era pior do que a da segunda. Pérgamo fora invadida por duas perigosas heresias, j4 Laodiceia, em sua apostasia, fizera-se mais nociva do que a doutrina de Balaao ¢ mais deletéria do que 0 ensino dos nicolaitas. Pelo menos a igreja em Pérgamo. apesar dessas ameagas teolé gicas, manteve o seu testemunho, ao passo que a igreja em Laodiceia, em- bora nao tivesse sofrido qualquer amea: teologia ¢ nesta prosperou até renunciar a santissima fé. Laodiceia é a unica destinatdria do Apocalipse sem testermunho. Sua auséncia testemunhal era tao grave, que sequer podia ser identificada doucrinaria, criou sua propria como igreja. Ela supunha que as suas muitas riquezas eram suficientes para substituir o testemunho que, outrora, dava diante dos homens e de que, perante Deus, desfrutava. 3. O principio da criagéo de Deus. Laodiceia vangloriava-se do ouro que nao possuia ¢ da prata que nao tinha. Aos seus olhos, porém, era rica ¢ de nada tinha falta. Para arranca-la dessa iluso, Jesus apresenta-se ao de Deus” (Ap 3.14). © Senhor Jesus nao é apenas o principio da criagao, m ao seu anjo como “o principio da cri o criador de tudo 0 que existe, porque todas as coisas Deus fez por Ele ¢ para Ele. Se tudo pertence a Jesus, 0 que sobra a Laodiceia? Apenas uma teologia falida e ridicula. Ela teria de saber que, se dependermos da suficiéncia di- vina, de nada teremos falta, mas se confiarmos em nossa autossuficiéncia, 130 Laovsickis, A Iertja Mor viremos a mendigar 0 prdprio pao. Na verdade, Laodiceia nada possuta, até as suas obras eram pobres. IV. AS OBRAS DE UMA IGREJA MORNA Conhega as tas obras, gue nem és frio nem quente. Quem deva fosses frio ou quente! (Ap 3.15, ARA) O termémetro de uma igreja sao as obras. Ao nao sentir a pulsacdo das obras de Sardes, por exemplo, Jesus, pesaroso e jd enlurado, vé-se constran- gido a lavrar-lhe o bito. E, agora, enoja-se das obras de Laodicei , porque elas sao tao mornas quanto esta. Logo, n4o estamos numa igreja, mas puma confortavel banheira de Aguas tépidas. Assim, relaxadamente, iam aqueles crentes vivendo o seu cristianismo despojado de Cristo. 1. As obras sem obras de Laodiceia. Tanto Filadélfia quanto Esmir- na sobressafam pelo evangelismo confessante. Se formos a Efeso, encon- trd-la-emos plena de obras teolégicas e apologéticas. Pérgamo, embora sob ataque de duas virulentas heresias, havia buscado a perfeigao de suas obras. As obras de Tiatira, embora imperfeitas, nao eram de todo descar- tdveis. Até a defunta Sardes tinha um restinho de vida em suas obras. Mas em que consistiam as obras ¢ ages de Laodiceia? No actimulo de bens materiais! Afinal, aquela era a cidade dos mi- liondrios, industriais e banqueiros. Por que mio acomodar um evangello para essa gente? Uma concessao aqui, uma abertura ali ¢, mais adiante, uma lenidade. Ai esté uma tcologia que préspero algum rejeitard. 2. A mornidao de Laodiceia. Apesar de seu invejdvel progresso, a cidade de Laodicéia enfrentava um sério problema quanto ao abasteci- mento de agua. Por isso, tinha de recorrer aos préstimos de duas cidades vizinhas: Colossos e Hier4polis. Da primeira, recebia 4guas frias ¢ poté veis de excelente qualidade; e, da segunda, Aguas quentes ¢ medicinais. Como eram conduzidas por aquedutos de até catorze quilémetros, am- bas, muiras vezes, chegavam-the mornas. E, assim, perdiam suas qualida- des primarias. Tal era a situagao de Laodiccia. Deixara-se ela conduzir pelos dutos de um eclesiasticismo inflexivel, e que néo contemplava nem as urgén- cias, nem as demandas do Reino de Deus. Dessa maneira, foi ela perden- do a capacidade de matar a sede aos pecadores, pois j4 no proclamava o 131 Os Sere Casricats pe Ouro Evangelho de Cristo — a tinica fonte de aguas vivas, Como se isso nao bastasse, também jd nao conseguia curar os ferides de alma, porque as propriedades terapéuticas ¢ termais de sua doutrina nao mais existiam. Laodiceia, agora, néo passava de uma banheira de 4guas mornas. 3. Entre Sardes e Filadélfia. Diante da lamentivel situacio de Laodiceia, suspira o Senhor: “Quem dera fosses fio ou quence!” (Ap 3.15, ARA). O ideal era que Laodiceia experimentasse 0 avivamento que aquecia © amoroso coracio de Filadélfia. Qu, entao, que fosse tomada, devez, pela frialdade cadavérica de Sardes. Mas que, de maneira alguma, permanecesse naquele estado de indiferenga ¢ letargia como se tudo estivesse ben. Por conseguinte, havia mais esperanga para a definta Sardes do que para a apdtica © inerte Laodiceia. Seu desinteresse para com as coisas de Deus era tao irritante que o Senhor Jesus estava prestes 2 vomiré-la de sua boca. Vv. QUANDO UMA IGREJA SE TORNA INTRAGAVEL Astin, porgue & morno e nem és quente nem frio, estou a ponte de voniitar-te da minha boca, (Ap 3.16, ARA), As aguas mornas sao eméticas, Néo matam a sede, por mio serem frias e, &s vezes, nem potdveis, Também nao curam, por ja haverem per- dido suas propriedades terapéuticas. Flas s6 tém uma utilidade: provocar vémito. Muitas pessoas, ainda hoje, usam-nas como vomitério. Assim estava a igreja em Laodiccia na boca do Senhor: na iminéncia de ser eje- tada, por haver se tornado incragdvel. 1. Uma carta nao conhecida. Na Epistola aos Colossenses, Paulo menciona uma carta que escrevera a Laodiceia (Cl 4.16). Por alguma raz4o, nao permitiu o Senhor que essa missiva fosse incluida no canon do Novo Testamento. Nao sei se real contetido dessa enciclica foi preser- vado. Em algumas versdes da Vulgate Latina, circula um texto que tem a prerensdo de sera reférida obra. Eu a li, mas estou quase certs de que aquelas palayras néo sairam da lavra de Paulo. Segundo sugere 0 redlogo alemao Adolf von Harnak (1851-1930), essa carta, na verdade, € uma obra apécrifa produzida por Marcion, no segundo século de nossa era. Todavia, néo posso evitar a pergunta. O que, de faro, escreveu o apéstolo aos laodicenses? Que exortacdes lhes fez? Que recornendacées 132 Laowrcets, a farep Mars: e adverténcias Ihes deixou? O que posso dizer &é que, por volta do ano 62 d.C., a igreja em Laodiceia desfrutava de um excelente testemunho. Além disso, podia contar com as solicitudes de um pastor como Epaftas, segundo inferimos desta passagem de Paulo aos colossenses: “Saiida-vos Epafras, que é dentre vés, servo de Cristo Jesus, 0 qual se esforga sobre maneira, continuamente, por vés nas oragées, para que vos conserveis perfeitos ¢ plenamente convictos em toda a vontade de Deus. E dele dou testemunho de que muito se preocupa por vés, pelos de Laodiceia e pelos de Hier4polis” (Cl 4.12,13, ARA). Nesse ano, Paulo recomenda a igreja cm Colossos que envie a epis- tola que ele lhe dirigiu & Laodiceia. Esta, por seu turno, deveria passar aos colossenses a carta que 0 apéstolo hes havia escrito. E, assim, todos os crentes daquela regido seriam edificados em Cristo. Certamente, os irmaos de Laodiceia tomaram conhecimento do teor da Epistola de Paulo aos Colossenses. Mas sera que nada aprenderam desse livro de Deus? O tema dessa epistola gira em torno da supremacia de Cristo. Logo na abertura da carta, Paulo entoa este belissimo hino para enaltecer a divindade e a obra do Filho de Deus: Ele nos liberrou do império das trevas ¢ nos transportou para 0 reino do Filho do seu amor, no qual temos a tedengio, a remissio dos pecados. Este éa imagem do Deus invisivel, o primogénito de toda a criacao; pois, nele, foram criadas todas as coisas, nos céus e sobre a terra, as visiveis e as invisiveis, sejam tronos, sejam soberanias, quer principades, quer potestades. Tudo foi criado por meio dele ¢ para ele. Fle é antes de todas as coisas. Nele, tudo subsiste. Ele € a cabeca do corpo, da igreja. Ele ¢ 0 principio, 0 primogénito de entre 0s mortos, para em todas as coisas ter a ptimazia, porque aprouve a Deus que, nele, residisse toda a plenitude e que, havendo feito a paz pelo sangue da sua cruz, por meio dele, reconciliasse consigo mesmo todas as coisas, quer sobre a terra, quer nos céus, (Cl 1.13-20, ARA) Ninguém que lé essa passagem fica indiferente & soberania de Jesus Cristo nao somente sobre a Igreja, mas também sobre toda a criagdo. Nao obstante a sua magnificéncia, o Senhor Jesus dispde-se a confessar-nos o nome diante do Pai. 2. Quando a igreja perde o seu confessor. Até aquele instante, 0 Senhor Jesus ainda confessava 0 nome de Laodiceia diante do Pai e dos santos anjos, como Ele mesmo havia prometido aos discfpulos: “Portan- to, todo aquele que me confessar diante dos homens, também eu o con- 133 Os Sere Casticas pr Ouro fessarei diante de meu Pai, que esté nos céus; mas aquele que me negar diance dos homens, também eu o negarei diante de meu Pai, que esté nos céus” (Mr 10.32,33, ARA). Ja imaginou o privilégio que vocé ¢ eu desfrutamos de ter os nossos nomes confessados pelo Filho diante do Pai? Isso significa que os nossos nomes esto, permanentemente, na boca e nos lébios de Jesus. Ele nos confessa nos céus perante Deus, porque na terra nés 0 confessamos ante os homens. Jesus é 0 nosso Confessor. Sim, até aqucle momento, © Senhor ainda confessa o nome de La- odiceia diante de Deus, mas estava prestes a nao mais fazé-lo, devido a mornidao dessa igreja. Ela fi Zee se emética na boca de seu Confes- sor, conforme o préprio Cristo declara: “Assim, porque és morno e nem és quente nem frio, estou a ponto de vomitar-te da minha boca” (Ap 3.16, ARA). Caso o Senhor vomitasse Laodiceia de sua boca, ela nao mais seria con- siderada heranga e propriedade sua. Quando isso ocorre, a criatura isola-se do Criador ¢ perde-se no nada. No Antigo Testamento, ha uma passagem que mostra Jeové vomitando nao um homem, mas toda uma nacido de sua boca. Ja descontente ¢ amargurado com as atitudes de Esau, esbraveja o Altissimo: “Amei a Jac6, porém aborreci a Esai” (MI 1.2,3, ARA). Depois disso, foi Esati desaparecendo até sumir da terra dos viventes. ia de vomitar de sua boca toda uma Agora, o Senhor esté na iminén congregacio. E, pelo que podemos inferir do texto, ndo havia em Lao- diceia qualquer remanescente. Toda uma igreja havia caido na apostasia. Mesmo a defunta Sardes podia contar com alguns que ainda respiravam. Em Laodiceia, contudo, nao ha remanescéncia nem resto de vida; tudo & mornidio ¢ morte. Ela é 0 exemplo classico do que pode fazer um arremedo de doutrina numa igreja. Hoje, modismo; amanha, heresia; ¢, depois, uma yirulenta apostasia que pée tudo a perder. Entéo, n&o resta ao Senhor outra alternativa sendo cjetar de sua boca o ajuntamento de gente que deixou de ser i areja. 8) © préprio Jesus dé-nos uma mostra de como vomita de sua boca “Apar- tai-vos de mim, malditos, para o fogo eterno, preparado para o diabo os que apostatam da santissima fé. Ele simplesmente lhes diz € seus anjos” (Mt 25.41). Palavras duras e implacaveis? Mais duras ¢ implacaveis foram as palavras que Laodiceia pronunciou contra o Senhor. 134 Laopiceia, a larkia Moris VI. A PROSPERIDADE ENGANOSA E FATAL s+» pois dizes: Estou rico e abastado ¢ ndo preciso de coisa alguma, ¢ nem sabes que tt & inféliz, sim, misentuel, pobre, cego e nu. (Ap 3.17, ARA) Quando Paulo escreven a sua carta aos colossenses, a igreja em Laodiceia reunia-se na casa da irma Ninfa, a quem o apéstolo envia consoladoras saudagdes: “Saudai os irmaos de Laodiceia, e Ninfa, e A igreja que ela hospeda em sua casa” (C] 4.15). Tratava-se de uma congregacio humilde e, que em tudo, dependia da suficiéncia divina. Alids, nem chegava a ser uma congregacéo. No meu tempo de crian- ga, a essas residéncias, geralmente localizadas nas periferias, dava-se 0 nome de ponto de pregagao. Ai, reunia-se um punhadinho de crentes que, comprometidos com o Reino de Deus, ia crescendo até fazer-se 0 ¢, mais tarde, até uma catedral, Acredito que o mes- congrega mo acontecera em Laodiceia. Infelizmente, bastaram-lhe trés décadas para que cla viesse a csquecer-se de suas origens, ¢ cair numa soberba crénica ¢ fatal. 1. De igreja de Deus a igreja do povo. Laodiceia, agora, nao se Jembra mais da igrejinha que se reunia na casa da irma Ninfa, onde, certa noite. o seu pastor leu, em vor alta, a carta que Ihe enviou Paulo. E, em seguida, pds-se a fazer a locugao da carta que 6 apéstolo havia endere- gado a Colossos, mas que recomendara fosse conhecida também pelos laodicenses. Agora, Laodiceia faz jus ao seu nome que, em grego, significa, direitos do povo. Noutras circunstancias, esse pequeno detalhe até passaria desper- cebido, ou ser-lhe-ia aplicado doutra maneira, Mas, neste momento, ven bem a calhar. Agora, Laodiccia s6 pensa em scus direitos. Ela nao busca mais o Reino de Deus ¢ a sua justica em primeiro lugar, porque procura mpor © scu império em todos os lugares. Quanto aos interesses univer- sais do Evangelho, mostra-se indiferente, porque os seus interesses locais, agora, fazem-lhe muita diferengs Em menos de ués décadas, Laodiceia deixou de ser igreja de Deus pata coisificar-se como igreja do povo. Ela, agora, reivindica, determina e positiva suas ambig6es. Orgulha-lhe do ouro que nao tem e da prata que nao possui. Se a linguagem nao fosse tao pesada, diria que essa igreja foi contaminada pela mesma doenga que levou 6 mais alto dos anjos a mais baixa ruina. 135 Os Sete Casti¢ais DE Ouro. 2. A sindrome de Liicife: © seu anjo pés-se a esvaziar-se do fervor espiritual, Afinal, a igreja é 0 . Laodiceia comecou a amornar-se quando reflexo de seu pastor. Se o pulpito é quente, a congregacao sera calorosa. Mas se é morno, nao demora muito para que 0 fogo do altar se apague. O que percebo, ao ler a carta que Jesus enviou a Laodiccia, € que o orgulho que the adoentou © pastor deixou-a espiritual © moralmente enferma. Toda aquela igreja deixou-se contaminar pela sindrome do pecado que causou a queda do ungido querubim. © mestre Houaiss define a sindrome como um conjunto de sinais e sintomas observaveis em. varios processos patolégicos. De acorde com essa definigio, os mesmos sinais que levaram Licifer A ruina sao facil- mente detectados em Laodiceia: orgutho, apostasia, ¢ descrenga na sufi- ciéncia e no poder divino. Em sua insuficiéncia, © pastorzinho Davi salmodiou a Deus: “O Senhor é 0 meu pastor, nada me falrara” (S] 23.1). O pastor de Laodi- ceia, contudo, em sua autossuficiéncia e, apascentando-se a si mesmo, blasfema do Filho de Jeova: “Estou rico ¢ abastado e nao preciso de coisa alguma” (Ap 3.17). Somente alguém atingido pela sindrome de Lucifer ousaria pronunciar tais palavras. Ele, porém, nao sabia quao miserdvel era. 3. A felicidade infeliz. O pastor de Laodiceia tornara-se uma figura grotesca. Pelo menos, foi assim que Jesus o descreveu: “E nem sabes que tu és infeliz, sim, miseravel, pobre, cego e nu” (Ap 3.17). Nao sei qual seria a minha reagao se encontrasse um homem nessas condigoes pelas ruas de minha cidade. Minha primeira rea¢do seria de compaixao. Afinal, ali estava um homem que, além de cego ¢ pau- pérrimo, achava-se descoberto ¢ nu. Quem nao se condoeria de uma pessoa nessas condigoes? Mas se esse mesmo homem, apesar de seu miseravel estado, presu- mir-se tei e, nao obstante a sua necessidade, desdenhar da ajuda que se Ihe oferecem os circunstantes, que juizo farei dele agora? Tal era a situ- agao do pastor de Laodiceia e da igreja que ele pastoreava. A prata e 0 ouro fizeram dele uma figura grotesca diante de Deus. Nao podia haver infelicidade tao infeliz como a sua. 136 Os Sere Castigais pe Ouro expunha-a diante dos céus € perante a terra. Nisso muito se parecia com a Virgem Filha de Sido que, ao apostatar-se de Jeova, expds-se vergonho- samente diante de todas as nacées (Ez 16.36). Laodiceia, agora, nao é mais reconhecida como feitura de Deus, porquanto se descobrira das obras divinas. Todavia, é-lhe oferecida uma segunda oportunidade de agasalhar-se com as vestiduras brancas de justica que lhe oferece o Senhor. E, assim, podera ser reconhecida novamente por sua postura santa e piedosa, como declara 0 apéstolo: “Pois somos feitura dele, criados em Cristo Jesus para boas obras, as quais Deus de antemdo preparou para que andassemos nelas” (Ef 2.10, ARA). Nessa passagem, a palavra “feitura” é a traducdo do vocdbulo grego poiema. Isso significa que a igreja que vive a Palavra de Deus ea pratica é um poema que o Senhor Jesus escreveu com o proprio sangue. S6 nao vé quem ja perdeu a visao espiritual. 3. Colirio para uma igreja sem visao. A cidade de Laodiceia era afa mada por suas escolas de medicina ¢ hospitais, cuja principal especialidade era a oftalmologia. Gente de toda a Asia Menor e de outras regides procu- ravam-na em busca de cura para as mais diversas enfermidades dos olhos. Os colirios que essas instituigoes produziam eram muito eficiente: ‘Tendo como plano de fundo a evolucao médica de Laodiceia, pres- creve Jesus 8 sua igreja um colirio, para que ela passe a contemplar, nov: mente, a gléria de Deus: “Aconselho-te que de mim compres colirio para ungires os olhos, a fim de que vejas” (Ap 3.18, ARA). Isso porque ela j4 havia perdido a visto do Reino de Deus, tomada que fora pela contem- plagao de seu império. Laodiceia j4 nao enxergava os campos brancos para a ceifa. A semelhanga de Geazi, nao conseguia ver a suficiéncia divina na insu- ficiéncia humana. E, j4 nao vendo distintamente como aquele cego que Jesus curara de cegueira, ainda confundia homens com Arvores. Mas, agora, que ja trocou a missiologia pela ecologia, vé as arvores como homens, porque é capaz de chorar por uma planta que cai, mas ja nao tem sensibilidade de verter uma lagrima por uma alma que se precipita no inferno. Por isso, é urgente que unja os olhos com o colirio que Ihe prescreveu o Senhor Jesus. Que os seus olhos vejam missiologicamente e, que, escatologicamente, ergam-se para contem- plar a vinda de Jesus. 138 LAODICEIA, A IGREIA MORNA VIII. A DISCIPLINA AMOROSA Ex repreendo e discipline a quantos amo. Sé, pois, celoso ¢ arvepende-te. (Ap 3.19, ARA) Laodiceia néo ¢ um caso perdido. Afinal, também fora escolhida como uma das destinatarias do Apocalipse. Jesus a ama. Sim, de tal ma- neira Ele a ama que a submete a uma dolorida, mas amorosa disciplina. O Senhor poderia té-la ignorado como cla o ignorou. Ou mostrar-se-lhe indiferente, porque cla com indiferenga o tratara. No entanto, Ele vence- the o desamor com o amor que o seu Espirito, localmente, universaliza sobre coda a sua Igreja. Jesus, embora do lado de fora da porta, a semelhanga do Esposo de Cantares, insta para que a sua amada receba-o em sua recamara: “Abre- me, minha irma, querida minha, pomba minha, imaculada minha, por- que a minha cabega estd cheia de orvalho, os meus cabelos, das gotas da noite” (Cr 5.2, ARA). IX. QUANDO JESUS FICA DO LADO DE FORA Fis que estou a porta e bato; se alguém ouvir a minha voz.e abrir a porta, entrarei em sua casa ¢ cearei com ele, e ele, comigo. (Ap 3.20, ARA) Jesus é um perfeito cavalheiro. Ele néo arromba portas nem apa- rece onde nao é convidado. Lembra-se das bodas de Cana? Diz Joao que o Mestre compareceu Aquele casamento, porquanto fora convi- dado pelo noivo. Acho que Ele aprendeu boas maneiras com José, seu pai terreno. Agora, encontramos Jesus do lado de fora da igreja em Laodiceia. Ele esta A porta e bate. Se alguém abrir-Ihe a porta (eu espero que seja © seu pastor), Jesus nela entrar e haverd de multiplicar 0 pao e o vi- nho, a fim de que todos experimentem um verdadeiro avivamento. E todos se alegrario como em Cana; 0 tiltimo vinho sera melhor do que 0 primeiro. O Filho quer partilhar tudo o que recebeu do Pai com a indiferente Laodiceia, inclusive o seu trono. 139 Conclusao Ao vencedor, dar-the-ei sentar-se comigo no meu trono, assim como também ew venci 2 me sentei com meu Pai no seu trono. Quem tem ouvidos, ouga 0 que o Expivito diz as igrejas. (Ap 3.21, ARA) Inexplicavelmente, a nenhuma das sete igrejas Jesus promete com- partilhar o seu trono, a nao ser para a indiferente Laodiceia. A con- fessante Esmirna, alids, promete Ele a vida eterna, mas precedida pelo martirio no tempo. Mas por que essa deferéncia? Talvez, porque dese- jasse arrancé-la daquela letargia pecaminosa e fatal. Terd ela ouvido a vor. do Espirito Santo? A sindrome de Laodiceia parece replicar-se em boa parte da cristan- dade ocidental. O luso deste mundo, embora efémero, acabou por amornar a men- sagem eterna em muitas igrejas que, para manter scus membros, criaram um céu alternativo. E, nesse céu, quem manda ¢ 0 cliente que, via de regra, exige um paraiso set compromissos espirituais ¢ sem exigéncias éticas. Um céu que mais parece os jardins da antiga Pérsia, nos quais a moral ¢ os bons costumes eram apenas um detalhe desprezivel. Um céu, alids, comandado pelas regras de um capitalismo selvagem ¢ injusto, onde 9s ticos sao bajulados, apesar de suas iniquidades, ¢ onde os pobres, nao obstante sua comprovada piedade, sao desprezados. Por causa disso, Lao- diceia havia se tornado intragavel. No enranto, o Senhor Jesus, através do Espirito Santo, quer avivar as igrejas que se deixaram amornar pelos cuidados deste mundo, Busque- mos, pois, o refrigério de um avivamento. 140 ADEYEMO, Tokunboh, editor. Comentdrio Biblico Africano. 1. ed. 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