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FAJE – Departamento De Filosofia

ALUNO: ÍTALO CARVALHO PEREIRA


PROFESSORA: MARÍLIA MURTA DE ALMEIDA
DISCIPLINA: SEMINÁRIO FILOSÓFICO II: FILOSOFIA NO BRASIL
DATA: 22/06/2019

Resumo
Neste trabalho será apresentado brevemente fragmentos do desenvolvimento do
ceticismo de Oswaldo Porchat Pereira, a relação entre fenômeno e argumentação, fenômeno e
vida comum, fenômeno e ceticismo. Como a Visão Comum de Mundo é o resultado de
inquietações filosóficas de nosso autor, parte da exposição terá caráter biográfico. É
importante ter em mente que trataremos apenas de pequenos aspectos da genialidade que
expressa o pensamento de Porchat.
Palavras-chave: Ceticismo; Visão Comum De Mundo; Oswaldo Porchat Pereira; Fenômeno.

Apresentação
Oswaldo Porchat de Assis Pereira da Silva (1933 – 2017) carrega consigo o status de
maior influência cética (neopirrônica) do Brasil. Conhecido pela sua originalidade, Oswaldo
publicou os livros: A Filosofia e A Visão Comum De Mundo1; Vida Comum E Ceticismo2;
Ciência e Dialética Em Aristóteles3; e Rumo Ao Ceticismo4. Porchat possui graduação em
Letras Clássicas pela USP (Universidade de São Paulo) (1956) e doutorado em Filosofia pela
mesma Universidade (1967). Lecionou na USP de 1961 a 1975 e de 1985 a 1998, quando se
aposentou; lecionou na Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) de 1975 a 1985. Fez
estágio pós-doutoral na Universidade da California em Berkeley (1969-70) e na London
School of Economics and Political Sciences (1983). Participou de inúmeros Colóquios e
Congressos de Filosofia no país e no exterior. Proferiu conferências em numerosas
Universidades brasileiras e estrangeiras. Publicou artigos em revistas de filosofia no Brasil e
exterior e pertence aos conselhos editoriais de várias delas. Tem experiência na área de
Filosofia, com ênfase em História da Filosofia e Epistemologia. Há vários anos, tem
trabalhado preferencialmente sobre o ceticismo filosófico antigo e moderno. Orientou
inúmeras teses de mestrado e doutoramento.
A Doutrina na vida de Oswaldo Porchat Pereira
Oswaldo despertou sua vocação à filosofia graças à sua experiência religiosa cristã.
Formado na tradição filosófica tomista, Porchat acreditava que Deus é Amor, Criador e,
sobretudo, a Verdade. Porém, a sua racionalidade se colocava constantemente em confronto à
sua fé. A Verdade da doutrina cristã lhe fornecia o conforto acerca da Realidade, como ele
mesmo diz: O cristianismo me transmitiu o senso do mundo comum da experiência, o apego à
realidade que o senso comum reconhece5.
Porchat, angustiado pela busca da Verdade como o que está no mundo, se afastou dos
dogmas que acreditava e se empenhou a busca-la através da investigação racional. Um dos
preços desta tarefa que Oswaldo se propôs a fazer foi a perda de sua fé. Isto se concretiza na
seguinte passagem pela qual o autor transmite o alívio do abandono da inconsistência
dogmática que lhe impunha exaustivas tentativas de conciliar com a razão crítica (Porchat não
se propôs a sustentar as suas crenças com a razão, mas a procurar uma explicação de como de
fato o mundo é):
“Minha fé religiosa e perdeu porque sobrepus a tudo o primado de minha razão
crítica, como um imperativo da minha mesma racionalidade. E lembra-me bem, o dia
que, só comigo mesmo, me confessei ateu. Particularmente sereno e tranquilo,
descobri minha espantosa solidão. Minha mente percorria os espaços infinitos que
nenhum deus mais habitava. Pensei na ínfima pequenez de nosso sistema solar
perdido numa galáxia imensa, pensei no minúsculo planeta de que eu era um mísero
habitante, apenas um entre centenas de milhões de homens. Considerei a
grandiosidade do universo e pensei na vida e na morte. A minha vida e a minha morte
me interessavam a mim e a muitos poucos, a Realidade não precisava de mim nem me
conhecia. Nenhum infinito me amparava. E eu me senti só com minha mente e meu
corpo, em meio a coisas, mentes e corpos. Também uma enorme alegria me possui,
por ter sido fiel a mim mesmo, por ter assumido a minha humanidade racional. Creio
que, nesse dia, me tornei um Homem.”6
Neste momento, Oswaldo Porchat começa a se dedicar exclusivamente à filosofia. Seu
intuído agora é encontrar o que a razão humana pode conhecer e seus limites. A ausência da
Verdade que a religião o preenchia lhe forneceu um espaço vazio, um espaço que passou a ser
reservado para a Verdade descolada de vieses.
Pré-filosofia
No primeiro momento, Porchat se propôs a estudar profundamente alguns dos
principais filósofos da tradição filosófica buscando apenas a verdade. Sua intenção não é fazer
história da filosofia, mas fundar uma edição definitiva do Lógos filosófico. Assim, o autor
percebe que não se trata de filosofia, mas filosofias. Cada filosofia interpreta o mundo à sua
maneira, com a sua estrutura própria, molda conceitos que sustentam seu ponto de vista e
invalida a outra; ou, como o próprio Oswaldo Porchat afirma “‘Inventando’ seu universo
próprio, cada uma se instaurava como negação e recusa inexorável das demais, condenadas a
uma radical desqualificação”.
A conclusão de que cada filosofia possui sua própria verdade, Oswaldo passa a ver
textos filosóficos como romances intelectuais, sem uma postura acrítica, mas também sem
aderi-las a si. Desta forma, lhe permitindo apontar as diafonias, incoerências e
incompatibilidades contidas nas filosofias entre si. Mesmo a coerência das grandes filosofias
se demonstra não persuadível com a justificação que cada uma se propunha de seu próprio
sistema. Pois Oswaldo conhecia as razões das outras.
Um dos pontos chave de Porchat é a conclusão de que assim como a ciência e o senso
comum não são capazes de resolver questões filosóficas, pois tais sistemas são circulares, as
leituras filosóficas se baseiam em enunciados do senso comum e dos resultados da ciência.
Diante desta conflitante perturbação intelectual, Oswaldo opta em recuar-se à vida
comum. Com influência dos escritos de Sexto Empírico, Porchat encontra a praticidade da
vida cotidiana, longe da ambição filosófica. Neste ponto está o recuo ao saber comum, um
posicionamento de Porchat no qual os céticos antigos entendiam como phainómenon pelo
qual o critério de ação são os ditames da vida. Mas diferente aos céticos antigos, que
fracassaram ao tentar entrar integralmente à vida da não-filosofia, Oswaldo regressou-se à
humanidade comum integralmente.
O contato com a atmosfera cultural e o cotidiano de um homem comum proporcionou
ao Porchat a redescoberta da vida comum. Afastado da filosofia, o saber comum e as crenças
inconsistentes favoreceram-no a cessão da angústia conflitante. A vida no Mundo comum o
deu a experiência que muitos filósofos renunciam e a complexidade que a abstração não é
capaz de captar.
A vida comum possibilitou a retomada à filosofia com um compromisso mais
consistente com a Verdade. Nesse momento, não há mais uma busca pela Verdade definitiva,
mas trazer a epokhé à “verdade” dogmática que tantos filósofos se apegam sem perceber
incompatibilidades com o Mundo em si e a blindam, usando de sua razão a proteção contra a
“verdade” de outras filosofias.

Sobre ceticismo e Visão Comum de Mundo em Oswaldo Porchat Pereira


O ceticismo de Oswaldo Porchat Pereira é, em primeiro lugar, uma experiência
biográfica, uma tensão entre filosofia, dogmatismo e vida comum. Sua trajetória possui um
grande e angustioso percurso pelo qual o autor não renuncia a sua ambição de originalidade
filosófica.
A principal influência de Porchat é o filósofo e médico, da Grécia antiga, Sexto
Empírico. Sua originalidade é reconhecida no mundo e, principalmente, no Brasil por trazer a
tradição cética e incentivar pesquisas na área. Assim como Robert Fogelin, Oswaldo Porchat
Pereira é considerado um filósofo neopirrônico por apresentar pensamentos que tratam de
problemas filosóficos da atualidade.
É importante ressaltar que o ceticismo não é uma corrente filosófica definida. Porchat
segue uma argumentação que se apropria da filosofia contra ela mesma para sair da Verdade,
levando à epokhé. Suas premissas não se baseiam em dogmas, mas em palpites seguidos de
um raciocínio baseado em tal apropriação.
Também é relevante ter em mente que, apesar de algumas semelhanças entre os
neopirrônicos, não é apropriado encaixá-los como uma corrente de pensamento. Tanto os
pirrônicos quanto os acadêmicos, os neopirrônicos e os pragmatistas, possuem nuanças de
pensamentos e, comumente, discordâncias.
A segunda fase da visão comum de mundo é mais filosoficamente elaborada, e é nela
que Porchat, livre dos dogmas filosóficos, contempla à Realidade que ele chama de Mundo. O
autor utiliza a expressão “Mundo” para facilitar o discurso no qual se refere à totalidade das
coisas que a Realidade o manifesta.

Tò phainómenon: sobre o que parece e a argumentação cética


Toda argumentação cética é feita para demonstrar que o dogma é impreciso,
precipitado, parcial e, como Porchat diz em seu discurso “tético”, profundamente falhos.
Desta forma, nenhum dogma é capaz de afirmar categoricamente acerca do mundo (afirmar
objetivamente como as coisas que conhecemos são de facto).
Mas se os dogmas são isso, como um cético pode afirmar algo? A solução para Sexto
estava em dizer que o cético vivia de acordo com o “fenômeno” ou com o que “lhe
aparecia”, e assim ele podia agir sem dogmatizar. Para Sexto, o fenômeno era o guia da vida
cética.7
O fenômeno exerce o papel principal no pensamento de Porchat, pois esse se encontra
na vida, no Mundo. O filósofo reconhece o fenômeno como independente de crenças e
dogmas. Neste sentido, Oswaldo caminha na linha naturalista, na qual ele apresenta o
fenômeno como c critério de ação e, assim como as situações podem variar, a ação também
pode.
Porchat usa o fenômeno para explicar como é a vida comum, ele começa a
desenvolver seu pensamento acerca do fenômeno seguindo os critérios do Sexto Empírico: a
orientação da natureza que serve-nos espontaneamente de nossos sentidos e de nosso
intelecto; a necessidade das nossas afecções e de nossos instintos; as artes (théknai); e, por
fim, a linguagem comum, que une todas as esferas citadas anteriormente.
Mas Porchat expande o fenômeno ao nível sensível e o chama de ceticismo empírico.
Podemos dizer que Oswaldo Porchat desenvolveu a ciência do fenômeno, pois busca um
empirismo sem dogmas e ciente das causas que condicionam ações que possuem lógicas de
ocasião.
Usando o fenômeno, Oswaldo apresenta um ceticismo que se encarrega a deslocar a
verdade de uma tese filosófica para o interior da esfera fenomênica. Este movimento aponta a
inconsistência da verdade do dogma, uma vez que a tradução do mundo fenomênico não
condiz com entidades de processos transcendentais postulados pelo filósofo dogmático.

Principais observações
Antropologia
Há uma descrição antropológica na Visão Comum de Mundo. Porchat expõe as
diferenças pessoais (cultos ou ignorantes, inteligentes ou medíocres, honestos ou perversos,
ricos ou pobres...) e pontos de vistas (crenças, opiniões e doutrinas) que diferenciam o homem
individualmente e coletivamente; e, embora que alguns dos homens se preocupam um com o
outro, todos se preocupam egoisticamente apenas com seus problemas. Seguindo esta
premissa, Oswaldo, ainda na Visão Comum de Mundo, conclui:
“A vida humana é, em verdade, de prazer e dor, de alegrias e tristezas. Os homens
amam-se e odeiam-se, confraternizam-se e guerreiam-se. O Mundo humano encerra
muito de sofrimento. E a violência de uns contra outros e a exploração de uns por
outros. E a brutalidade de opressões e repressões, das torturas e das guerras. Os
homens têm a dura experiência de uma realidade por vezes brutal. Ainda assim,
encontra-se neles muita esperança.”I
Frutos do rumo ao ceticismo de Porchat
A dedicação de Oswaldo Porchat em seu percurso resultou em grandes contribuições à
filosofia. Oswaldo publicou dezoito artigos ao longo de sua vida, tratando de temas como
realismo, racionalismo, Verdade e, os dois temas mais trabalhados por ele e reconhecidos pela
academia, a filosofia de Aristóteles e o ceticismo (a própria contribuição, o pirronismo, a
argumentação e a importância do ceticismo).
Acerca deste trabalho
O intuito deste trabalho é expor o pensamento de Porchat brevemente. O ceticismo é
essencial ao conhecimento e, principalmente à filosofia e Oswaldo Porchat Pereira o trouxe
para o Brasil de forma original e inspiradora que fomenta o pensamento crítico no país.
Não apenas a filosofia de Dr. Oswaldo Porchat Pereira, mas também a linha de
pesquisa do Dr. Bruno Batista Pettersen que me incentivou a mergulhar nas águas da epokhé e
contemplar ao conhecimento não como verdade, mas como uma profunda dimensão de
possibilidades formais acerca da nossa compreensão do mundo.

Bibliografia principal
PORCHAT PEREIRA, Oswaldo. Vida comum e ceticismo. 2. ed. São Paulo:
Brasiliense, 1993. v. 1. 255p.
PETTERSEN, Bruno Batista. A narrativa pirrônica: uma análise de Robert Fogelin e
Oswaldo Porchat; 2012; Tese (Doutorado em Filosofia) - Universidade Federal de Minas
Gerais, Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico.
Dados biográficos da apresentação
CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico);
http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4783577H4, acessado em
09/06/2019 às 13:29.
Citações
1. PORCHAT PEREIRA, Oswaldo. A Filosofia e A Visão Comum do Mundo, 1981.
2. PORCHAT PEREIRA, Oswaldo. Vida comum e ceticismo. 2. ed. São Paulo:
Brasiliense, 1993. v. 1. 255p.
3. PORCHAT PEREIRA, Oswaldo. Ciência e dialética em Aristóteles. 1. ed. São
Paulo: EDUNESP, 2001. v. 1. 416p.
4. PORCHAT PEREIRA, Oswaldo. Rumo ao ceticismo. 1. ed. São Paulo: EDUNESP,
2007. v. 1. 350p.
Notas
5. PORCHAT PEREIRA, Oswaldo. Vida comum e ceticismo – PREFÁCIO A UMA
FILOSOFIA, 1975, p. 23.
6. … PREFÁCIO A UMA FILOSOFIA, p.27.
7. PETTERSEN, Bruno Batista. A narrativa pirrônica: uma análise de Robert Fogelin
e Oswaldo Porchat; 2012; Tese (Doutorado em Filosofia) - Universidade Federal de Minas
Gerais, Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – “2.3.2.1. Tò
phainómenon: aquilo que aparece”.
I. PORCHAT PEREIRA, Oswaldo. Vida comum e ceticismo – A VISÃO COMUM
DE MUNDO. Publicado em Manuscrito III, 1, em Campinas, 1975; também em Filosofia e
Epistemologia III, em Lisboa.

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