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qe ese er a ie . | Tecnologia de Reproducao aoc a aA eleclaccares Perguntas basicas sobre Tecnologia de ReproducGo © 2004, Editora Cultura Crista. Publicado em inglés com o titulo Basic Questions on Reproductive Technology: When Is It Right to Intervene? Copyright © 1998 by The Center for Bioethics and Human Dignity. Todos os direitos s4o reservados. 1? edigéo em portugués — 2004 3.000 exemplares Tradugao Suzana Klassen Revisdo David Aratjo Rita de Cassia Pampado do Canto Editoragao Maria Eterna Gomes Malta Dedone Rissato Editoragao Capa Magno Paganelli Publicagao autorizada pelo Conselho Editorial: Claudio Marra (Presidente), Alex Barbosa Vieira, André Luis Ramos, Mauro Fernando Meister, Otavio Henrique de Souza, Ricardo Agreste, Sebastiao Bueno Olinto, Valdeci da Silva Santos €DITORA CULTURA CRISTA Rua Miguel Teles Junior, 394 - Cambuci 01540-040 — Sao Paulo — SP — Brasil C.Postal 15.136 — SAo Paulo - SP — 01599-970 Fone (0**11) 3207-7099 — Fax (0°*11) 3209-1255 www.cep.org.br — cep@cep.org.br Superintendente: Haveraldo Ferreira Vargas Editor: Claudio Anténio Batista Marra Sumario Colaboradores 5 Introdugao 6 ODJebIVO eee ee cree re ce eeae te teteeteniens 8 . Por que as pessoas voltam-se para as diversas formas de reprodugao assistida? 9 . Aesterilidade é minha culpa? . 10 O que € esterilidade secundaria 12 O que devo fazer se sou estéril? 13 O que € casamento? 0... 16 O que significa ser pai e mae? . 18 O que é a relagdo sexual? . . 21 O que é um embriao?...... . 23 Devo considerar 0 uso de tecnologia de reprodugao? . 10. E quanto ao uso de drogas para aumentar a fertilidade? . . 28 I 1. E quanto a inseminacao artificial 12. E quanto a fertilizagao in vitro? 13. E certo usar os évulos ou esperma de u um ORM AWERWH doador para conceber uma crianga?...... 36 14. E quanto a transferéncia intrafalopiana de gametas (GITF)? 0... cence 4] 15. E quanto a transferéncia intrafalopiana de ZigOtOs (ZIFT)? «oc eeeeeeeeeeseeeseeeeeeees 43 16. E quanto a injegao intracitoplasmatica de esperma e as opgdes relacionadas a ela? 45 4 Colegdo Bivética 17. Quais as questdes legais relacionadas as tecnologias de reprodugao? v0... 50 18. E quanto as gestagdes em maes substitutivas? 54 19. Quais s&o as questées legais relacionadas ao uso de uma mae substitutiva? .......... 59 20. O meu embrido deve ser geneticamente testadO? occ eeccseereecteceneeestenenenens 65 21. E quanto a clonagem de seres humanos? 68 22. Devo considerar a adogdo como uma possibilidade? . 23. Quais sao as questées legais envolvidas se eu optar pela adog4o? oo. 76 24. Quantos filhos devemos ter? ....ce eee 81 25. Quais formas de contracep¢ao séo eficazes na prevencao da gravidez? ........ 83 26. Existem outras formas de contracepcdo? 88 27. F certo usar qualquer forma de controle de natalidade? ooo eects 91 Conclusaéo NOUS veecececceeceeeeceeeeeeees Colaboradores Linda K. Bevington, M.A., € administradora de projeto do Center for Bioethics and Human Dignity, Bannockburn, Hlinois. Paige C. Cunningham, J.D., escreveu varios artigos sobre aborto e a lei. Ela é co-autora do artigo que a juiza O'Connor citou em sua discussao sobre a viabilidade de sobrevivéncia da crianga fora do ventre materno sem suporte artificial no caso Webster v. Reproductive Health Services. William R. Cutrer, M.D., trabalhou por muitos anos como obstetra e ginecologista, especializando-se no tratamento da intertilidade. Atualmente cle é diretor da area Dallas/Fort Worth para a Christian Medical and Dental Society. Timothy J. Demy, Th.M, Th.D., € capelao militar, co- autor e autor de varios livros e artigos. Ele é membro da Evangelical Theological Society. John F. Kilner, Ph.D., é diretor do Center for Bioethics and Human Dignity, Bannockburn, Illinois. Ele também € professor de Bioética e Cultura Contemporanea na ‘Trinity International University, Deerfield, Illinois. Dona! P.O’ Mathtina, Ph.D., é professor associado de Etica Médica e Quimica no Mount Carmel College of Nursing, Columbus, Ohio. Gary P. Stewart, Th.M., D.Min., é capelao militar e co- autor de varios artigos e livros. Ele é membro da Evangelical Theological Society. Introducao A intervengdes médicas que ajudam a lutar ontra 0 cancer so aplaudidas como gran- des descobertas cientificas. O mesmo acontece com tecnologias que ajudam pessoas a sobreviver a ferimentos graves ou derrotar os muitos virus que ameagam a humanidade. Mas, e quanto a pes- quisa médica e as intervengdes que buscam supe- rar a aparente impossibilidade de um individuo em ter filhos? Serd que a esterilidade é uma questao de satide que possa ser medicamente corrigida? Ou sera que € sempre um estado causado por Deus e, portanto, fora dos limites da pesquisa médica? Os autores créem que a esterilidade é uma questao de satide e que. como muitas outras ques- tdes desse tipo, pode ser tratada com a orienta- ¢do do Deus misericordioso e onisciente. Assim, aqueles de nés que querem ter filhos, devem pro- curar fazé-lo de maneira a respeitar os proposi- tos de Deus para 0 casamento, 0 ser pai ou mae e a sexualidade. Pode muito bem ser apropriado que facamos todos os esforgos possiveis para satisfazer nosso desejo — ou o sentir que fomos chamados — a ter filhos. No processo, porém, é preciso que proteja- mos 0 nosso bem-estar ¢ a vida de nossos filhos Tecnologia de Reprodugdo 7 em cada um de seus estagios. Independente do resultado, nossa fé e dependéncia em Deus nao devem vacilar, mas sim ser fortalecidas através de qualquer caminho moralmente aceitavel que ve- nhamos a tomar. Num mundo caido que tantas ve- zes € injusto e cruel, Deus sabe o que é melhor. Como é 0 caso com todas as decisdes (ndo s6 aquelas que envolvem ter filhos) a atitude de nosso coracao deve refletir as palavras de Proverbios: Confia no Senhor de todo o teu coragao ¢ nao te estribes no teu préprio entendimento. Reconhece-o em todos os teus caminhos, e ele endireitara as tuas veredas. (Provérbios 3.5,6). Objetivo ste livro nao tem o objetivo de reproduzir to- das as informagdcs disponiveis sobre o as- sunto, mas sim, de simplificar, complementar e suplementar outras fontes acessiveis, as quais os leitores so encorajados a consultar. Alguns des- ses materiais estado listados no final deste livro. Esta obra nao tem a intengao de tomar o lugar do aconsclhamento ou tratamento teoldgico. legal. médico ou psicoldgico. Caso se faga necessaria a assisténcia em qualquer dessas areas. por fa- vor, busque o auxilio de um profissional especi- alizado. Os pontos de vista expressos neste livro sao exclusivamente aqueles dos atitores ¢ 140 re- presentam ou refletem qualquer posigaéo ou en- dosso de quaisquer agéncias ou departamentos governamentais, militares ou outros. 1. Por que as pessoas voltam-se para as diversas formas de reprodugio ussistida? Aproximadamente 15% dos casais que de- sejam ter filhos nao conseguem fazé-lo depois de um ano de relagdes conjugais normais. De acordo com a definigao mais comum de fertilida- de, esses casais sao esféreis. Por diversos moti- vos, mais casais sofrem de esterilidade nos dias de hoje do que em qualquer outra época. Alguns deixam para tentar ter filhos mais tarde, quando os indices de fertilidade diminuem. Outros sofrem as conseqiiéncias de doencas sexualmente trans- missiveis que podem causar diftculdades na con- cep¢ao ou em levar a gestagao a termo. Quando ocorre a esterilidade, € preciso que haja algum tipo de intervengao para que a concepgiio acontega. As pessoas fazem de tudo para conceber uma crianga, pois o desejo de ter um filho é uma forga muito poderosa. Uma lista biblica de coi- sas nunca satisfeitas inclui “a madre estéril” (Pro- vérbios 30.16). A necessidade de ter filhos aqui mencionada é uma generalizagao e nao uma or- dem para toda mulher: porém, sugere que o de- sejo de ter filhos pode ser intenso e duradouro. Assim, muitos casats impossibilitados de conce- ber naturalmente buscam a orfentagao da comu- nidade teoldgica e o auxilio da comunidade médi- 10 Colegdo Bioética ca. Uma visdo teista do mundo nos permite con- cluir que Deus tem permitido grandes avancos cientificos. Tais avangos nos mostram um pouco do quao complexo € 0 processo de fertilizagao. Aqueles que nao créem em Deus normalmente aplaudem a pesquisa e a genialidade em reco- nhecer e resolver problemas reprodutivos. No momento, ha diversos remédios e procedimentos 4 disposigao dos casais que desejam satisfazer seu desejo de ter filhos. Assim, as pessoas pro- curam a reproduc4o assistida para dar continui- dade a linhagem ou ao nome da familia, para contri- buir com a proxima gerac4o ou simplesmente para preencher o lar com o amor de uma crianga. De uma perspectiva cristé, cada uma das tecnologias deve ser entendida a luz dos principios biblicos, com a devida atengao dada a santidade da vida humana. 2. A esterilidade é minha culpa? Esterilidade é a incapacidade de conceber depois de um ano de relagdes sem medidas con- traceptivas ou de levar adiante a concepg¢ao além do primeiro trimestre (doze semanas menstruais). Nos Estados Unidos, pode-se tragar as se- guintes origens da esterilidade: em um terco dos casais chamados de estéreis, o homem tem um problema fisico diagnosticado. Em outro tergo, 0 problema ¢ com a mulher; e, no tergo restante, ha dificuldades em relagéo a ambos. Mas, na verdade, em uma pequena porcentagem dos ca- Tecnologia de Reprodugdo 11 sais, nao é possivel detectar qualquer anormali- dade em nenhum dos dois. Historicamente, quan- do um casal sofria de esterilidade, supunha-se que a mulher era a origem do problema médico. Os especialistas supunham que, se um homem podia ter uma eregao e ejacular, entao era “fér- til”. Testes mais precisos e uma melhor compre- ensao das muitas variaveis envolvidas na fertili- dade tém demonstrado a grande complexidade da mesma. Felizmente, muitos dos problemas di- agnosticaveis que causam a esterilidade podem ser tratados com eficacia. Sera que os problemas de esteritidade sao culpa de uma pessoa? Normalmente, nao. E 0 caso, por exemplo, de problemas e desequilibrios hormonais, baixa contagem de esperma, anorma- lidades genéticas e incompatibilidade genética. Entretanto, certas doencas sexualmente transmis- siveis como gonorréia e clamidia podem ser re- sultado de sexo antes do casamento ou extra- conjugal, ¢ podem causar danos e esterilidade. A decisao de se esperar até mais tarde para tentar engravidar também pode influir em alguns casos. Mesmo que a Biblia nao seja um livro de instrug6es sobre esterilidade, algumas referéncias gerais do Antigo Testamento descrevem a este- rilidade como sendo um julgamento de Deus — porém, essas parecem ser o julgamento de toda a nacdo por sua desobediéncia. Em outros ca- sos, o casal estéril é mostrado e até mesmo descri- to como sendo justo. Tanto no Antigo quanto no 12 Colegdo Bivética Novo Jestamento, nos casos que aparecem como exemplo — Sara, a me de Sans&o, Ana, Isabel —, cada uma dessas mulheres tem um papel essenci- al no plano redentor de Deus. Cada uma é descri- ta de maneira favoravel e abencoada por sua fé e oragdo enquanto suporta a esterilidade.' Na cul- tura dos tempos biblicos, nao ter um herdeiro era motivo de grande vergonha e pressupunha-se (nem sempre corretamente) que era resultado de um castigo de Deus sobre o casal. Deus certamente poderia usar a esterilidade ou qualquer outro meio para chamar a atengao dos seus filhos. Entretanto, o que sabemos sobre o seu carater e sobre o trabalho do Espirito San- to sugere que 0 crente que estivesse passando por tal afligdo teria consciéncia de sua rebeldia e, portanto, poderia buscar perdao e¢ restauragao. Restauragao, entretanto, nfo garantiria a gravi- dez. Da mesma forma, nos casos espectticos de sexo fora do casamento que causaram a esterili- dade através de complicagées resultantes de do- engas sexualmente transmissiveis ou nas com- plicagdes depois de um aborto. 0 ato pode ter conseqiiéncias duradouras. Porém, para a maio- ria, a esterilidade nao é nem uma questao de cul- pa, nem de julgamento divino. 3. O que é esterilidade secundaria? Normalmente esse termo é usado para ca- sais que ja tiveram um ou mais filhos, mas que, entéo, nao conseguem conceber dentro de um Tecnologia de Reproducgdo 13 ano. Esse segmento da populagao recebe pouca solidariedade daqueles que sofrem de esterilida- de primaria, mas 0 sofrimento emocional tam- bém pode ser consideravel. O fato de ja ter um filho nao satisfaz, necessariamente, o desejo por uma familia. Pelo fato de os parametros de fertilidade mu- darem com 0 tempo, casais com esterilidade se- cundaria podem ter que passar por um amplo espectro de exames, diagnésticos e opedes de tratamento. Tanto a idade cronolégica da mae como a idade biolégica dos ovarios pode contri- buir para o problema. A produgao ciclica e preci- sa de hormdnios tende a reduzir com a idade. Endometriose ou outras doengas tubarias podem acabar se desenvolvendo. Com o aumento dos divorcios e segundos casamentos nos dias de hoje. pessoas que antes eram férteis podem experi- mentar a esterilidade no novo relacionamento. 4. O que devo fazer se sou estéril? Se um casal descobre que preenche certos critérios para o diagndstico de esterilidade, seja ela primaria ou secundaria, 0 que pode ser Feito eo que deve ser feito podem ser bem diferentes. Para as mulheres com irregularidade menstrual pronunciada, esperar um ano para ser diagnosti- cada como clinicamente estéril é perda de um tempo valioso. A esterilidade pode trazer var formas de desgaste para 0 casamento ~ emocio- nal, financeiro e espiritual. O casal precisa deci- AS, 14 Colegdo Bioética dir se vai procurar tratamento com um médico, apoio e aconselhamento com um profissional (psi- célogo ou conselheiro) ou amigos e se vai ou nado contar aos outros sobre o diagndstico. Prosse- guircom uma avaliacao médica ou comegar uma série de terapias requer deliberagdo cuidadosa. Muitos decidem nao usar tecnologias de re- produgao ou limitar sua participacao nesse tipo de tratamento. Alguns decidem que ter criangas agora no esta nos planos de Deus para sua vida (ver questao 24). Mas, para muitos, um diagndés- tico claro de esterilidade, quando possivel, pode ser de ajuda ao considerar as op¢des de trata- mento ou escolher aceitar a vida sem filhos bio- ldgicos. Alguns resolvem a questao da esterilida- de buscando o processo de adogao. Adotar uma crianga, entretanto, pode custar mais de 20 mil dolares e, de forma alguma, ¢ um processo ga- rantido (ver questées 22 e 23), Uma vez que um casal resolve buscar um tratamento para a esterilidade, a selegao de um médico ou clinica pode ser crucial. Muitos médi- cos tém o conhecimento e a competéncia neces- sarios para investigar as causas da esterilidade, mas ha aqueles que nao tém ao menos o interes- se ec nem © treinamento para ajudar o casal a passar pelo labirinto de exames e planos de tra- tamento. A maioria dos ginecologistas/obstetras pode fazer a avaliacdo inicial ou recomendar para o casal um especialista em fertilidade. Clinicos gerais, urologistas ¢ outros especialistas podem tecnologia de Reprodugdo 15 orientar o casal a consultar um médico que tenha o preparo para fazer um tratamento mais longo. A fase inicial da investigac4o diagndostica é relativamente direta e barata. Pode incluir 0 exa- me do sémen do homem para avaliar a qualidade e quantidade de esperma, avaliag4o da ovulagao e produgdo hormonal da mulher e exames da pélvis com ultra-som para determinar se esta ocorrendo a seqiiéncia correta de eventos no ovario. O uso de técnicas simples, que requerem registro de temperatura feito em casa e exames de urina, muitas vezes oferece informagées im- portantes. Para aqueles que estao dispostos a comegar o processo de testes, essa série de ava- liagdes pode, com freqiiéncia, indicar a categoria geral de esterilidade e ajudar o médico a criar um plano de tratamento. Para decidir os passos que podem ser tomados para tornar o ambiente mais propicio a concepgio e a gravidez, pode ser necessario realizar outros exames que mostrem se as trompas de Falépio estao normais e aber- tas, uma avaliagado laparoscopica dos orgdos pél- vicos na mulher e exames sofisticados de imuno- logia (problemas com anticorpos). Tendo em vista que cada um desses procedi- mentos é bastante complexo, 6 preciso que 0 ca- sal tenha um conhecimento basico da terminolo- gia e dos procedimentos envolvidos a fim de po- der tomar uma decisao esclarecida e ética. Cada casal deve discutir seus vatores e crengas com a equipe médica que esta cuidando de seu tratamento 16 Colegdo Bioéticu antes de continuar com qualquer intervengao, por mais simples que seja. Algumas vezes, um trata- mento com antibidticos resolve a esterilidade cau- sada por infecgdes ou doses extras de horménio para alguém com baixos niveis de hormOnios ti- reoidais podem corrigit a anormalidade que esta impedindo a gravidez. O primeiro e mais impor- tante passo € realizar um diagnostico correto para que o melhor plano de tratamento possa ser esta- belecido, sendo que isso pode significar nao fazer tratamento algum. A maior parte dos casais é be- neficiada ao fazer no minimo a avaliacao mais ba- sica antes de decidir se querem ou nao optar por uma intervengao; porém, para tomar decisdes re- lativas a intervencdes, pode ser preciso mais do que informagGes médicas € técnicas. E preciso que o casa] esclareca sua compreensao do que ¢ © casamento e o ser pai ou mae. Conforme de- monstram as respostas as duas proximas pergun- tas, as formas de reprodugao assistida que sao mo- ralmente aceitaveis dependem dessa compreensao, 5. O que é casamento? Definir e compreender 0 casamento dentro de uma cultura é essencial para a formulagdo de uma posigao ética em relagao as questées repro- dutivas. Do ponto de vista cristao, o casamento é uma instituigdéo ordenada por Deus, e nao de ori- gem humana. Antes de consultar os intimeros li- vros filosdficos ou psicologicos de auto-ajuda, considere a revelacao biblica do que é 0 relacio- fecnologia de Reprodugdo 17 namento matrimonial. Mesmo para aqueles que nao estio familiarizados ou nao se preocupam com os ensinamentos biblicos, os aspectos cultu- rais do casamento ainda tém efeitos abrangentes sobre cada sociedade. Para os norte-america- nos, 0 casamento envolve um contrato legal tes- temunhado e validado por um juiz de paz, pastor, rabino ou outra pessoa licenciada pelo Estado para realizar a cerimOnia Jegal. Devido ao grande nti- mero de divércios nos Estados Unidos, a maioria das pessoas reconhece que, em todo casamento, existem implicagoes legais e responsabilidades. Do ponto de vista biblico, o casamento é uma alianga, um acordo feito diante de Deus. E Deus quem une marido e mubher. Jesus disse: “Portanto, o que Deus ajuntou, nado o separe o homem” (Mateus 19.6). De acordo com as instrugdes de Deus em Génesis, 0 casamento envolve duas coisas: dei- xare unir. “Por isso, deixa o homem pai ¢ mae e se une a sua mulher, tornando-se os dois uma sé carne” (Génesis 2.24). Assim, Deus cria uma nova unidade familiar que tem prioridade sobre os relacionamentos familiares anteriores. Surge entao a nova. tinica uniao de uma sé carne. Para construir alguns paraémetros éticos é essencial reconhecer o relacionamento biblico de uma so carne. Segundo a cosmovisao crista. a ligagao entre marido e mulher é um relacionamento tini- co que traz consigo varias instrugdes de como os cdénjuges devem viver juntos (Genesis 2.18; Efe 18 Colegdo Bioética sios 5.21-33; 1 Pedro 3.1-7). A ilustragao de uma s6 carne mostra que Deus criou o casamento para ser uma uniao que vai além do aspecto fisi- co. Ainda assim, 0 casamento prevé que a intimi- dade fisica seja um de seus aspectos centrais. Deus une marido e mulher para que tenham inti- midade de corpo, alma e espirito. Do ponto de vista cristéo, uma compreensao de como Deus planejou o casamento oferece a base para decisdes éticas nas areas de sexualida- de e reprodugao. Da mesma forma, outras pers- pectivas tém em alta consideracao 0 casamento e a familia, e muitos consideram a familia como a plataforma moral para se ter e criar filhos. 6. O que significa ser pai ou mde? Depois de termos considerado a origem e plano biblico para o casamento, podemos agora nos voltar para o ser pai ou mae na perspectiva crista. Independente de como se vé o mundo, paternidade e maternidade bioldgicas consistem em se passar material genético de uma geracao para a proxima — pai ou mae bioldgico comparti- lha sua construgdo cromossdmica, ou genes, com seus filhos. Os filhos sao o fruto do relaciona- mento de uma so carne. Assim como os dois cén- juges tornam-se um, seus gametas (espermato- zoide e évulo) também se tornam um, resultando numa crianga pela qual sao responsaveis. Por definigao, ser pai ou mae implica tanto produzir um filho quanto cuidar dele. Entretanto, fecnologia de Reprodugdo 19 nesta era de tecnologia de reprodug¢ao, a capaci- dade de misturar e compartilhar gametas de do- adores e usar maes de aluguel para levar gesta- ¢des a termo torna confusas essas definigdes. O uso das palavras pai e mde envolve mais do que apenas 0 ato procriativo. Também significa o tem- po, esforgo e amor envolvidos em se criar os fi- lhos, independente de sua origem biolégica. No caso de pais adotivos e padrastos e madrastas, estes tém um papel significativo que amplia nossa compreensao do que é ser pai, mae e familia. Ha cada vez mais familias com um sd dos pais, ¢ a tecnologia disponivel abre as possibilidades de se ter um filho também para casais do mesmo sexo. Ao longo deste livro, ao considerarmos a complexidade das origens biolégicas, procuramos expressar grande apreciacdo quanto aos papéis de pai e mae, independente da medicina e dos procedimentos especificos usados para originar a crianga. Homens e mulheres com visdes de mundo totalmente diferentes dedicam-se a de- senvolver o carater de seus filhos. Iremos expor em detalhes as questdes éticas € teoldgicas so- bre doadores, receptores e maes de aluguel. Antes que sigamos em frente, entretanto, por favor observe um esclarecimento que podera pou- pa-lo de uma consideravel frustragao. Ter filhos ¢ mais um privilégio do que um direito. Um casal que acredita que ter um filho é um direito seu, fi- cara cego para qualquer coisa além de ter um fi- Iho e, como resultado, correra o risco de tomar 20 Colegdo Bioética decis6es pouco razoaveis. Os possiveis males que um tratamento prolongado pode trazer ao corpo da mulher, as despesas financeiras resultantes de diversas tentativas de engravidar e 0 prego emo- cional do tratamento extensivo podem custar caro para um casamento, sendo que isso é possivel de se evitar quando os conjuges entendem que ter um fitho é um privilégio — nao um direito, Uma figura biblica do Antigo Testamento que pode nos esclarecer nessa questao é Ana, a espo- sa amada de Elcana. As Escrituras afirmam que “o Senhor havia cerrado a madre” de Ana. Hoje em dia, dirfamos que Ana era estéril (ver questao 2; de acordo com Samuel |.5-7, esse estado per- sistia “ano aps ano”). F. importante observar que Ana nao sabia se esse “cerrar” era permanente ou temporario. Por isso, ela “com amargura da alma orou ao Senhor, ¢ chorou abundantemente” (1 Samuel 1.10), na esperanga de que seu clamor fosse ouvido e sua esterilidade, curada. Para Ana, as oragées resultaram na abertu- ra de sua madre € no nascimento do filho a quem ela chamou de Samuel, que significa “do Senhor © pedi”. Seu nascimento era uma Iembranga de todas as béngaos que estavam por vir como re- sultado de se clamar ao Senhor. Ele nado era um direito: ele foi um privilégio oferecido. Esse pre- sente nado custou pouco a Ana, pois ela propés uma condi¢ao sobre a qual sua gravidez estaria baseada: quando Samuel! losse desmamado (pro- vavelmente com dois ou trés anos de idade), ele Tecnologia de Reprodugdo 21 seria dedicado ao Senhor e criado pelo sacerdo- te El. A esterilidade de Ana foi curada de modo que ela desse a Juz uma crianga que iria se tornar um grande profeta do Senhor (ver também Sara em Génesis 16.12; 21.2-7). Essa historia maravilhosa deve nos levar a refletir sobre as razGes pelas quais queremos fi- Ihos. Independente de rossay razGes, os filhos sao ulm presente de Deus e ele pode permitir a esteri- lidade ~ até mesmo a permanente — por motivos que sao desconhecidos por nds. Voce pode dese- jar e orar para ter filhos, mas o fruto do ventre, no fim das contas, esta nas maos de Deus e nao na tecnologia. A atitude com a qual encaramos o ser pai ou mae e especialmente como vemos a tecno- Jogia de reprodugao determinam desde o prinet- pio se os procedimentos descritos neste livro sao ou ndo moralmente acettaveis. 7. O que é a relagdo sexual? Nesta era de sexo por telefone, cibersexo e sexo em realidade virtual. devemos reconsiderar até mesmo a definicao de nossa sexualidade. O termo “relagado sexual” geralmente aplica-se ao ato fisico do coito em que o pénis é inserido na vagina. Os cristéos reconhecem dois propositos para a relagdo sexual: o unitivo (para o prazer e aprofundamento do relacionamento) e © procria- tivo (para a geragaio de filhos). Os cristdos dife- rem sobre a exata relagdo entre esses dois pro- positos e sobre as implicacdes que essa relagdo 22 Colegdo Bioética tem sobre as formas de contracep¢ao e na re- produgao assistida (ver as questdes seguintes), Entretanto, ha muito em comum naquilo que os cristaos acreditam. Do ponto de vista cristao, a sexualidade é um presente maravilhoso de Deus, com o propésito de oferecer prazer fisico, apoio emocional e unidade espiritual.* A relagao sexual é 0 meio natural de reprodugao e a grande maio- ria dos bebés é resultado da concepe¢ao natural. Entretanto, avancos médicos tém permitido a fer- tilizagdo sem relagao sexual. Alias, nos dias de hoje a fertilizagdo pode ocorrer até mesmo sem que o pai e mae bioldgicos se conhegam! A sexualidade tem dimens6es que vao além da reprodugao e foi criada para evocar sensagdes prazerosas muito fortes, incluindo a liberacao de endorfinas no organismo. As endorfinas sao subs- tancias quimicas potentes como narcoticos, que uma vez dentro do cérebro provocam poderosas sensacdes de euforia. Assim, é a busca por essa sensacao prazerosa que torna a relagdo sexual tao desejavel. A relagdo sexual foi criada para ser uma experiéncia agradavel entre individuas casados de sexo oposto. A Biblia proibe relagdes pré-conju- gais, extraconjugais e homossexuais. No Sermao do Monte, Jesus ensinou que o comportamento sexual agradavel a Deus vai além dessas diretri- zes basicas e inclui pensamentos e atitudes (Ma- teus 5,27-28). Jesus interpreta a ordem biblica sobre pureza sexual, estendendo-a também para o controle do que se passa na mente. Tecnologia de Reprodugdo 23 Algumas cosmovis6es que negam a existén- cia de um Criador ou rejeitam a responsabilidade do homem sobre seus atos podem apoiar uma permissividade sexual mais ampla. Nos Estados Unidos, as relagdes pré e extraconjugats sao co- muns. O crescimento dramatico do ntmero de doengas sexualmente transmissiveis e da AIDS reflete essa maior permissividade. 8 O que é um embritio? A confusao da terminologia exata pode cau- sar desacordo entre individuos preocupados com avangos médicos. Antes de considerarmos os di- versos procedimentos e op¢des disponiveis atra- vés da reproducao assistida, vamos esclarecer os termos usados. Tecnicamente, quando um es- permatozoide e um dvulo se juntam, ocorre a con- cepeao, formando-se um zigoto. Depois de uma semana, 0 zigoto desenvolve-se ¢ transforma-se num embriado. Entao, oito semanas mais tarde, o embriao passa a ser considerado um feto. Usa- remos 0 termo embrido para nos referirmos as primeiras oito semanas do desenvolvimento de um ser humano, exceto nos casos em que ¢ ne- cessario fazer uma distingdo entre zigoto e em- briao (ver questao 15). O embriado é um ser humano no estagio ini- cial de desenvolvimento. E separado de um ou- tro grupo de células em desenvolvimento que se tornam a placenta ou tecido de suporte. Depois que o espermatozéide penetrou o évulo c que os 24 Colegde Bivética cromossomos do pai e da mae alinharam-se den- tro do ovulo, diz-se que ocorreu a fertilizagao. Num ciclo natural, isso acontece dentro de uma das trom- pas de Falopio da mulher. Muitas clinicas de ferti- lidade chamam 0 tecido vivo e em desenvolvimento resultante de “pré-embriao” pois, 4 medida que esse grupo de células cresce, ainda nao é possivel precisar quais se transformaréo no bebé e quais formarao a estrutura de suporte. Alias, pode acon- tecer de varias dessas células morrerem ¢ ainda assim a gravidez continuar, baseando-se na satide de uma outra célula. Acredita-se que as primeiras células sao indiferenciadas, isto é cada célula pode gerar todo 0 tecido necessario para o desenvolvi- mento do bebé. Nao ocorre a adigéo de nenhum material genético depois do momento da fertiliza- cao. Cada individuo, desde o momento da fertili- zacio, representa um ser de tremendo valor, cria- do & imagem de Deus. O salimista descreve Deus criando uma crianga: “tu me teceste no scio de minha mac” (Salmo 139.13). Deus vé o embriao com o maior cuidado e atengao. O salmista afir- ma que todos os dias de uma pessoa, da fertiliza- ¢ao até a morte ja estao pré-ordenados “quando nem um deles havia ainda” (Salmo 139.16). Em aproximadamente sete dias o grupo de células em crescimento fixa-se na parede do titero no processo chamado “nidagdo”. Mesmo que as pessoas as vezes associem a concepgao a nida- cao, a concepgao (“o comeco”) é mais bem com- preendida se for referida como fertilizagao. Ten- Tecnologia de Reprodugdo 25 do em vista que todo 0 equipamento genético que torna cada individuo tinico origina-se com a lerti- lizagdo. qualquer intervengaa depois da fertiliza- cdo, mas antes da nidagdo, que destrua a nova vida é um aborto ~ e ndo um método contracep- tivo. O uso do termo pré-embrido nao deve nos dessensibilizar quanto a humanidade e individua- lidade dos évulos fertilizados e em processo de divisdo que sao criados pelas técnicas de repro- dugdao assistida. Alguns podem argumentar que nao € possivel abortar (separar da mae) o que ainda nao [oi ligado. Entretanto. do ponto de vis- ta cientitico e genético. a vida comega de forma singular para cada individuo no momento da fer- tilizagdo. O acontecimento da nidagdo represen- ta apenas a figacdo nutricional - 0 elo vital entre a mae ¢ a crianga em desenvolvimento — ¢ nao o ponto inicial para aquele ser humano, Sendo os embrides pequenos seres huma- nos, o destino dados a embrides congelados (pre- servados criogenicamente) ¢ uma questo séria. Eles sao criangas cujos pais devem fazer tudo o que puderem para sustenta-las e permitir que se desenvolvam no tempo apropriado. Como essa questao bem ilustra, tomar decisées sobre as muitas tecnologias reprodutivas disponiveis é algo que se baseia numa compreens&o e comunica- cdo do vocabulario singular que se refere de for- ma precisa a reprodugao. Depois do chamado esfdgio embriondrio, que dura aproximadamente doze semanas conta- 26 Colegdo Bioética das desde a ultima menstruagdo, o ser humano em desenvolvimento ¢ chamado de feo. Esse ter- mo € usado para o restante da gestac4o, indepen- dente de sua duragdo. Nao existe um aconteci- mento significativo que separe o estagio embrio- nario do estagio fetal. E simplesmente uma conti- nuagdo do crescimento e desenvolvimento. Da mesma forma, do estagio chamado pré-embriona- rio para 0 estagio embrionario ha apenas o pro- cesso gradual de diferenciagao e maturagao. As- sim, faz sentido ter a mesma consideracao por este ser humano tmico e individual desde o principio da vida, quando o material genético (genoma) esta com- pleto. O que sucede é apenas parte do processo de crescer, amadurecer e, num dado momento, deixar o ventre para ocupar um lugar no mundo. 9. Devo considerar 0 uso de tecnologius de reprodugdo? A quest&o basica aqui ndo é€ se certas inter- vencdes médicas séo ou nao morais. Alguns tém divulgado a idéia de que a f¢ deveria ser suficien- te para resolver todas as areas da vida, inclusive a esterilidade. Esses individuos se negariam a rece- ber intervengaio médica para qualquer problema fisico © iriam apoiar-se somente nas oragées de fé. Cristaos, e alguns outros, créem que Deus criou a humanidade e nos permitiu uma certa visio, mesmo que limitada, das complexidades e do fun- cionamento do corpo humano. A terapia médica é apropriada desde que nenhum principio biblico seja Tecnologia de Reprodugdo 27 violado. A maioria das visdes de mundo que nao levam Deus em consideragao aplaude a visdo e as descobertas cientificas e, portanto, permite a livre experimentagao e utilizacdo de terapias para o bem comum. No caso do uso de antibidticos para infeccdes, cirurgia para apendicite e quimiotera- pia para cancer, essas sao respostas apropriadas e morais para enfermidades que assolam o ser humano. A intervengao médica € aceitavel para os casais que estao enfrentando a esterilidade, desde que outros principios fundamentais nao es- tejam sendo violados. Quando ha desacordo a res- peito do uso de uma determinada tecnologia de reprodugao, normalmente € porque se discorda nos principios fundamentais, como a santidade da vida embrionaria ou 0 quao apropriado é 0 uso de tec- nologia para alterar o processo natural de fertiliza- ¢ao dentro do corpo. Conforme foi discutido na questao anterior sobre embrides, a convicgado de muitos cristaos ¢ de que a vida embrionaria €, de fato, sagrada ~ que a individualidade comeca no momento da fertilizagdo. Assim, a preservagao criogénica (congelamento) de embrides lida com pessoas vivas em seu estagio embrionario. Descartar ou destruir esses embrides ou usa-los para pesqui- sas sem o consentimento dos pais — a menos que o beneficio para o embriao seja maior que o risco —éeticamente inaceitavel. Porém, o congelamento de esperma ou de dvulos nao levanta as mesmas questdes morais do congelamento de embrides, ten- 28 Colegdo Bivética do em vista que ainda nao sao vidas humanas cri- adas. Diversas outras tecnologias podem trazer 0 mesmo tipo de dilema ntoral para aqueles que acre- ditam que a interveng¢do médica é uma resposta adequada para © problema da esterilidade. Ques- tSes pralicas como os aspectos legais e financei- ros, entre outras, devem ser tratadas caso a caso, mas ¢ possivel que certos procedimentos sejam tealizados com 0 maior respeito 4 vida humana e a dignidade, desde que embrides ou seres huma- has em outros estagios nao sejam desvalorizados durante 0 processo. Pode ser que alguns cristéos questionem se qualquer tecnologia que altere o modo de fertili- zacao natural é¢ apropriada ~ como, por exemple, permitir que a fertilizacdo acontega numa prove- ta em um laboratorio. Essa preocupagado com a vida humana e o plano de Deus é louvavel: po- rém, uma intervengao tecnoldgica desse tipo nao precisa ser um problema para os cristéos, desde que a tecnologia torne possivel algo que esta em harmonia com a vontade de Deus (que um ho- mem e uma mulher casados tenham filhos) 70 caso de o corpo ndo estar funcionando da maneira como Deus planejou. 10. E quanto uo uso de drogas para aumentar a fertilidade? Dependendo da condigéo médica do casal, ha um ntimero enorme de drogas que podem au- mentar a fertilidade. Para um homem que tenha Tecnologia de Reprodugdo 29 infecgao da préstata, um simples tratamento com antibidticos pode ser considerado um tratamento de fertilidade. Para a mulher com baixas taxas de horménio da tiredide, a reposigdo desse hor- ménio também representa uma droga para a fer- tilidade. Partindo do pressuposto que, de um modo geral, a intervencdo médica e o tratamento com drogas sio opg¢des morais (ver a questao anteri- or), muitos tratamentos alternativos sao aceita- veis e aumentam a fertilidade. Alias, qualquer me- dicamento ou procedimento cirurgico que leva o paciente a um estado mais saudavel podera me- lhorar sua fertilidade. Entretanto, vamos aqui nos concentrar nas drogas usadas para induzir a ovu- lagdo (produgao e/ou liberagao de évulos) ou para melhorar a qualidade, quantidade ou funciona- mento dos espermatozoides. Para a mulher que nao ovula. a introdugao de drogas que induzem a ovulagao tornou a gravidez possivel. Antes do desenvolvimento do citrato de clomifeno (Clomid, Serolene e outros) nao havia nenhuma terapia eficaz para as mulheres que nao ovulavam: o unico recurso era a adogao. O clo- mifeno pode estimular a ovulag¢ao em muitas mu- Iheres e n§o traz o risco de gravidez de gémeos multiplos, como acontece com outras drogas. O numero de foliculos (estruturas cisticas dentro do ovario que abrigam 0 évulo em estagio de amadu- recimento) pode ser monitorado atraves de ultra- some, assim, a gravidez de gémeos multiplos pode ser evitada. Tambéin estado disponiveis horméntos 30 Colegdo Bioética mensageiros especificos como o Horménio Foli- culo-Estimulante (FSH) e o Horménio Luteizante (LH), os quais constituem 0 que maioria conside- ra drogas para fertilidade. Esses horménios esti- mulam diretamente o ovario — evitando os meca- nismos interiores de protegao — para que diversos ovulos possam amadurecer. Isso pode ser neces- sario para que sejam colhidos diversos ovulos, es- pecialmente nos procedimentos de alta tecnologia em que amadurecer dez ou vinte évulos pode fa- cilitar a obtengao de alguns évulos bons (“sauda- veis”) e maduros para a fertilizacdo. A terapia com drogas para homens, por ou- tro lado, nao é téo encorajadora. Mas naqueles individuos em que um problema com o esperma foi corrigido, nao existe o dilema de produzir-se multiplos embrides. Um ovulo normalmente nao € penetrado por mais do que um espermatozdide. independente de quantos haja ao seu redor. Il. E quanto a inseminacdao artificial? Por definig&o, esse é um procedimento que envolve a insergao de esperma na vagina por um outro meio que nao seja através do pénis. O es- perma usado nesse procedimento pode vir de duas fontes diferentes: algumas vezes vém do proprio marido que tem problemas como uma baixa taxa de espermatozdides ou dificuldades ejaculatorias; outras vezes vem de um doador, possivelmente através de um banco de esperma. Tecnologia de Reprodugdo 31 Como ja foi mencionado de maneira bem-humo- rada em shows de comediantes e em filmes, o meédico usa uma seringa esterilizada para injetar o esperma. Uma pequena cobertura, como um diafragma, serve para “segurar” 0 esperma no lugar por algum tempo. Outras vezes, porém, 0 esperma precisa ser lavado através de um pro- cesso especial, para depois ser injetado direta- mente no utero ao invés de na vagina. Esse pro- cedimento todo se chama Jnseminugdo Intra- Uterina (UI) e é cuidadosamente coordenado com o ciclo ovulatério. Antes da prolileragao de doengas como AIDS, hepatite e outras doengas sexualmente transmissiveis (DSTs), aqueles que escolhessem usar o esperma fresco de um doa- dor normalmente obtinham esse esperma de um doador local. Apesar de 0 esperma fresco ofere- cer uma probabilidade de concep¢ao um pouco mais alta do que o esperma congelado, hoje em dia, o esperma geralmente é congelado por seis meses, periodo apés 0 qual o doador faz um exa- me para AIDS. Uma vez que 0 esperma é decla- rado seguro, ele é liberado para uso. A inseminagao artifteial é simples, relativa- mente indolor e tem altos indices de sucesso. uma op¢fo eticamente aceitavel dentro dos pa- rametros de intervengao tecnoldgica ja discuti- dos (ver quest&o 9). Entretanto, ¢ ético e legal usar o esperma de um doador? Depois de intro- duzir a tecnologia de fertilizagao in vitro na pré- xima questao, trataremos desse assunto. So wo Colegdo Bioética 12. E quanto a fertilizacdo in vitro IVF)? In vitro significa “em vidro” em contraste com 0 sistema de tecido vivo (i7 vivo). Mesmo sendo chamada de fertilizagao de proveta, nao se usam tubos de proveta nesse procedimento, Ao invés disso, 840 usados recipientes rasos de cultura facilmente acessiveis aos microscdpios e instrumentos de micromanipulagao. A fertilizagdo in vitro consiste em expor o 6vulo ao esperma em um ambiente esterilizado e cuidadosamente controlado. Assim, a fertilizacdo ocorre do lado de fora do corpo humano ao invés de acontecer dentro das ttompas de Falépio, como seria na forma natural, O esperma pode ser obtide de amostras de sémen fresco ou congelado, tanto do marido quanto de um doador. O médico obtém (recupera) os dvulos, nor- malmente de dentro dos ovarios da mulher (que so hiperestimulados por horménios) com o au- xilio de.uma agulha (agulha de aspiragao trans- vaginal). Varios évulos podem ser colhidos e é possivel congela-los ¢ depois usar alguns deles. A fertilizagao normalmente ocorre sem que haja manipulagao. Porém, no caso de 6vulos mais velhos ou com baixa contagem de espermatozoi- des, procedimentos especiais podem ser usados para aumentar as chances de fertilizagao (para uma descrig&o dessa técnica, ver questao 16 so- bre injecao intracitoplasmatica de esperma), Tecnologia de Reprodugdo 33 Aqueles que estao considerando a possibili- dade de fertilizagao in vitro vao querer saber o indice de sucesso das diversas clinicas. Tendo em vista que o sucesso significa ter um bebé, ¢ preci- so perguntar sobre o indice de nascimentos e ndo o indice de fertilizagdo. O indice de nascimentos na maioria das clinicas varia entre 20% e 40%. E preciso ter em mente que algumas das melhores clinicas podem ter indices de sucesso mais baixos, pois tratam de pacientes mais velhos ou de paci- entes com miultiplas complicagdes médicas. Uma vez que a fertilizagdo acontece fora do corpo, um determinado numero de divis6es celu- lares ocorre durante o periodo de horas antes que os embrides em crescimento (ou pré-embrides, como alguns preferem chama-los) sejam transfe- ridos para o titero da mulher que levara adiante a gestagao. O processo € chamado de trunsferén- cia do embrido. Esse é um termo importante, pois a mesma designagdo ¢ usada na procriacgéo ani- mal quando um embrido ¢ transferido do ttero de um animal para outro (o utero “emprestado”). Al- guns confundem o procedimento realizado em hu- manos com essa técnica bem diferente usada em animais. Nas clinicas de reproducao, a transfe- réncia de embrido € 0 procedimento de remover um grupo de células que estao se dividindo no re- cipiente de vidro no laboratorio e inseri-lo na mae. Geralmente, esse é um procedimento relativamente indolor ¢ rapido. sendo que pouca ou nenhuma anestesia & necessaria. 34 Colegdo Bioética Quando 0 esperma do marido e o évulo da mulher sao usados, a fertilizagdo in vitro sim- plesmente pula o estagio que deveria ocorrer na trompa de Falopio. Assim, no caso de danos nas trompas. doengas ou para algumas pessoas com esterilidade de causa indeterminada, esse proce- dimento oferece um caminho para que o marido ea mulher contribuam com seu proprio material genético e tornem-se pais bioldgicos. Da mesma forma, a fertilizagdo in vitro pode permitir que homens com baixa contagem de espermatozdi- des sejam pais bioldgicos de seus préprios filhos. Como cura para a esterilidade, a fertilizagao in vitro esta dentro dos parametros éticos consi- derados anteriormente (ver questao 9). Cuda embrido pode ser respeitado e tratado com dig- nidade. Nao ha nada nos aspectos técnicos do procedimento que o torne antiético, a nao ser para aqueles que créem que 0 ato fisico da relagao sexual (propésito unitivo) ndo pode ser separado, mesimo temporariamente, da procriagao (posigao do Vaticano). Ainda assim, camisinhas com pe- quenas perfuragdes estéo disponiveis para que catdlicos romanos possam continuar de acordo. mesmo que parcialmente. com a posi¢ao do Va- ticano, ao permitir pelo menos uma chance de concepgao ao recolher esperma dentro da cami- sinha durante a relagao. O fato de a fertilizagdo in vitro ser uma op- cao a se considerar nao significa que é certa para todos os casais estéreis que poderiam ser benefi- lecnologia de Reprodugdo 35 ciados por ela. E um procedimento que toma tem- po, é caro e tem alguns riscos relacionados coma terapia que é feita com o uso de drogas e os pro- cedimentos invasivos, como a coleta de ovulos ea colocagaéo dos embrides na vagina e através do cérvix com 0 auxilio de uma agulha. Esse risco pode ser diminuido 4 medida que os procedimen- tos para congelamento ¢ descongelamento dos ovulos tornam-se mais eficientes, implicando um menor indice de perda. Assi, também, o conge- lamento ¢ o armazenamento dos évulos aumenta- rao a disponibilidade, o que reduzira os custos. Ha, ainda, algumas escolhas importantes que devem ser feitas sobre a mancira como a fertilizagdo in vitro é realizada e que podem mudar alguns aspectos éticos dos procedimen- tos. Essas decisdes precisam ser discutidas com o médico especialista em fertilidade que ira res- peitar e apoiar seu ponto de vista teoldgico e filo- sofico. Limites podem e devem ser colocados sobre o numero de 6vulos fertilizados, o numero de embrides reimplantados e o destino dos em- brides congelados (se essa for a op¢ao escolhi- da). A luz da importancia especial da vida embri- onaria, vocé provavelmente desejara evitar a re- ducao seletiva apds a implantagao, ou seja, a des- truigéo dos embrides a mais para garantir a so- brevivéncia dos remanescentes. Da mesma for- ma, também é inaceitavel transferir tantos em- brides para o titero de modo que a probabilidade de todos eles se implantarem é significativamen- 36 Colegdo Bivética le reduzida. Uma boa forma de resolver essa questao é determinar que seja feita a transferén- cia de apenas dois ou trés. Quer alguns dos em- brides produzidos sejam congelados ou nao. 0 numero total de ovulos fertilizados ndo deve ser maior do que o ntimero de Nihos que vocé quer ter. F essencial que os casais compreendam os procedimentos especificos. as possibilidades, os riscos, os beneficios e a seguranga antes de con- siderar se a fertilizagao in vitro € certa ou nao para eles. Até aqui, partimos do pressuposto de que o casal ira usar 0 esperma do marido e os ovulos da mulher, Na questéo seguinte, voltamo- hos para o uso de esperma ou dvulos de doadores. 13. E certo usar os dvuos ow espera de um doador pura conceber uma crianga? O que voce faria se as circunstancias médi- cas exigissem o uso de gametas de doadores? Ou, © que vocé acrescentaria as caracteristicas genéticas de sua familia se vocé pudesse esco- ther? Quais séo as questdes éticas envolvidas em se incluir uma terceira pessoa, normalmente and- nima, no relacionaimento conjugal? Os grandes programas de doagio de esper- ma selecionam cutdadosamente scus doadores em relagdéo a doengas sexualmente transmissiveis e tém informagées sobre seu tipo sanguineo, carac- teristicas fisicas e background genético. Ter aces- so a esse conhecimento pode aliviar um pouco a preocupagaéo com os riscos médicos. Mas alguns Tecnologia de Reproducgéo 37 siio contra o uso de gametas de doadores, pois consideram que 0 que acontece no processo é um tipo de adultério. Essas pessoas argumentam que, apesar de nao haver contato fisico, a inseminagao com o gameta de um doador viola a santidade do matrimOnio: porém, nem tudo o que viola a santi- dade do matriménio é adultério. E melhor reser- var o termo acultério para relacionamentos se- xuais, quer verdadeiros ou fantasiados. sendo que estes, sim, violam a uniao matrimonial. Dentro da comunidade crista, as opinides sao divergentes e baseadas em varios fatores, inclu- indo a maneira em que se interpreta a histéria de Onan e 6 “casamento de levirato” (Génesis 38) no Antigo Testamento. A Biblia descreve em li- nhas gerais circunstancias em que, quando um homem morria sem deixar um herdeiro, seu ir- mao tinha a obrigagao de prover um filho a vid- va. Onan teve uma relagéo sexual com a vitiva de seu irmao, mas ele interrompeu a relagao, “lan- ¢ando sua semente ao chao”. Deus o matou por seu ato de desobediéncia. As pessoas tiram diversas conclusdes e apli- cagées dessa interessante passagem. Nessas cir- cunstancias limitadas, a geragéo de um herdeiro tem importante precedéncia sobre a scxualidade ligada exclusivamente ao casamento tradicional, Entretanto, mesmo nesse acordo ~ uma uniao de levirato (do latim /evir, que significa “cunhado”) — é um cascimento. A viliva torna-se a (talvez segunda) esposa do homem. A proibigao quanto 38 Colegdo Bioética a sexo pré-conjugal ou extraconjugal nao € sus- pensa nesta situacdéo — na verdade, a estrutura da familia adapta-se as necessidades da nayao de Israel em seus primérdios.* Esse principio tem sido usado para apoiar o uso de inseminagao com material de um doador, no caso da esterilidade do marido. Porém, na comunidade do Antigo Testamento, ndo era qual- quer homem que servia. Era preciso que fosse um irmao do falecido, um descendente da mes- ma tribo,. Come povo de Deus, Israel estava nos primeiros estagios de sua existéncia e, naquele momento, 0 sistema de tribos, clas e familias era extremamente importante e ainda estava no pro- cesso de estabelecer-se. Portanto, ha diferencas significativas entre essa circunstancia excepcio- nal nas Escrituras e a situagao atual em que é usado o esperma de um doador. A Biblia oferece ainda menos apoio ao uso de évulos de doado- ras. Por exemplo, quando Abraao teve um filho com sua serva Hagar — infelizmente com a bén- cao de sua esposa ~ é mostrado que isso aconte- ceu contrariamente a vontade de Deus (Génesis 16; ver questéo 18 sobre maes de aluguel). Quanto a questao de Ovulos de doadoras, a disponibilidade e as despesas sao ainda uma ou- tra questao. A possivel doadora dos évulos preci- sa estar hormonalmente sincronizada com a mae recipiente, o que € possivel através do uso de medicamentos fortes que estimulam os ovarios para que possa ser feita uma coleta de multiplos Tecnologia de Reproducdo 39 ovulos. Essa coleta é feita com o uso de um ul- tra-som transvaginal e uma agulha guiada atra- vés da vagina (antigamente, era preciso fazer uma laparoscopia para coletar os 6vulos, o que au- mentava muito os custos do procedimento e en- volvia os riscos decorrentes do uso de anestesia geral e procedimentos cirtirgicos). Uma vez co- letados, os dvulos sdo usados quase que imedia- tamente, ja que a mulher que vai recebé-los pre- cisa estar no estagio certo de seu ciclo para re- ceber os 6vulos fertilizados. A medida que o con- gelamento e descongelamento de évulos tornam- se mais eficientes (ver questao anterior), essa sera uma alternativa mais atraente. Ainda no ho- rizonte do desenvolvimento, existe a possibilida- de de coletar 6vulos dos ovarios de fetos aborta- dos ¢ amadurecer esses 6vulos em laboratério para futuras doagées. Um dos muitos problemas desse procedimento é que a mae biologica ja- mais podera cumprir com a responsabilidade de cuidar de seus filhos, tendo em vista que ela pro- pria sequer chegou a nascer. E compreensivel que 0 uso de gametas de doadores seja tao atraente. O uso de esperma doado tem certas vantagens, inclusive um custo menor quando comparado a adogao ou a outros procedimentos de alta tecnologia. Ele também oferece segurancga em relagdo aos doadores que, supostamente, sao testados quanto a fatores ge- néticos e ao histérico médico. Os casais podem apreciar o fato de que a crianga sera genetica- 40 Colegdo Bivélica mente ligada a pelo menos um deles e de que a mae pode passar por uma gestagao normal e con- trolar o ambiente pré-natal. Quanto a doagao de évulos, a selegdo de candidatas pode reduzir al- guns dos problemas genéticos. Além disso, a cri- anga ira carregar a carga genética do pale a mae receptora vivera a gestagao, tornando-a, assim, ligada a crianga. Entretanto, as quest6es emocionais ligadas ao uso de gametas de doadores sio complexas. Pode se desenvolver um estresse emocional den- tro do casamento, quando um dos cdnjuges nao esta biologicamente ligado a crianga, mesmo que © procedimento tenha acontecido com o total consentimento de ambas as partes. Sob uma pers- pectiva bastante realista (bioldgica e genética), um dos cénjuges teve uma crianga junto com outra pessoa e esse aspecto pode alimentar um interesse emocional acerca do doador (mesmo que este seja andnimo). Ha também o risco de que o cénjuge que nao tem nenhuma ligacao ge- nética com a crianga acabe, num momento de maior pressao, sentindo-se menos responsavel por ela do que aquele que tem a ligagao genética. Um dos ensinamentos mais basicos das Es- crituras é 0 principio de “tornar-se uma 86 car- ne”, baseado na declaragao em Génesis, quando um homem deixa sua familia. toma para si uma esposa € os dois tornam-se uma s6 carne. Na opinido dos autores, esse principio permite que marido e mulher fagam uso de tecnologias de re- Tecnologia de Reprodugdo 41 producdo para ter filhos, mas exclui 0 uso de es- perma ou dvulos de doadores para junta-los a gametas do marido ou da mulher. 14. E quanto a trausferéncia fatrafalopiana de gametas (GIFT)? O termo gameta refere-se a célula masculi- na ou feminina (espermatozdide ou dvulo) que contém metade dos cromossomos tipicamente encontrados numa outra célula qualquer do cor- po. Quando o espermatozdide junta-se ao dvulo, écriado um conjunto completo de cromossomos (genoma ou cédigo genético) para o novo em- briao e para cada célula que ira se desenvolver durante 0 periodo de gestagao e depois. A técnica de transleréncia intrafalopiana de gametas envolve o uso da laparoscopia, um pro- cedimento que requer anestesia geral. Esse pro- cedimento usa uma incisdo bem pequena e 0 pa- ciente recebe alta. do hospital ou clinica, no mes- mo dia. Durante este procedimento o cirurgiao pode ver os 6rgaos da pelvis inserindo uma pe- quena video camera que permite que o procedi- mento seja visto em um monitor de video. O pro- cedimento é cronometrado precisamente para co- incidir com o amadurecimento do dévitlo, o que € geralmente controlado por estimulagao hormo- nal, de forma que nao se perca a liberagaéo do 6vulo. Quando um ou mais foliculos pré-ovulato- rios surgem, os Ovulos (um por foliculo) sao aspi- rados (isto é, retirar ou remover por sucgao) com 42 Colegdo Bivética uma agulha (similar a outra técnica usada para coleta de évulos através da vagina usando o ul- trasom para guiar a agulha). Cada évulo 6 exa- minado imediatamente num laboratério proximo e altamente qualificado e, apds isto, € recarrega- do dentro de uma seringa especial. A amostra de esperma é especialmente preparada para inten- sificar a percentagem de espermatozdides sau- daveis. Os especialistas colocam o esperma na mesma seringa com, pelo menos, um dvulo. O cirurgiao transfere esse material, gentilmente. para dentro da trompa de faldpio (do tubo falopi- ano) com o auxilio da pequena camera. O tubo falopiano é a localizagao precisa onde normal- mente ocorre a fertilizagaio. De fato, a quimica das células do revestimento tubario parece au- mentar a habilidade do embriao em seu implante na parede uterina. Algumas clinicas de fertiliza- ¢ao estao tentando duplicar esse fator de cresci- mento durante as horas antes do reimplante. Coma GIFT, a fertilizagao ocorre na trom- pa de faldpio, caso ocorra, Ha um elemento de incerteza, mas com trompas normais, dovulos maduros e um esperma adequado, a percenta- gem de gravidez é boa. O custo € significante por causa do procedimento cirtirgico envolvido, e das reoperagGes necessarias em cada ciclo, até que ocorra a fertilizagao e a concepcao. Os mé- dicos agora podem ter acesso as trompas de fa- {6pio com mintsculos alvos através da vagina e do cérvix, Um dia, os médicos estarao capacita- Tecnologia de Reprodugdo 43 dos a eliminar a loparoscopia do procedimento e realizar a GIFT no consultério. Para se certificar, € medicinalmente possi- vel fixar, no interior da seringa, esperma e dvulos de doadores sem parentesco e transferir a mis- tura para engravidar a esposa, produzindo uma crianga sem relagao genctica com o marido ou a esposa. Contudo, os médicos podem executar a GIFT usando gametas de maridos e esposas e fazé-lo sem comprometer qualquer embriao. Con- sequentemente, o procedimento pode ser adap- tado acerca dos preceitos morais, relatados nas questées 9, 13 e 18. Para algumas pessoas, a GIFT ¢ ainda menos condenavel que a IVF, ja que a fertilizagao é feita naturalmente na forma € posigao corporea normal. Para o tratamento da infertilidade masculina e, ocasionalmente. para a infertilidade sem uma causa perceptivel, a GIFT tem uma taxa de nascidos vivos aceitavel. Nao ha embrides extras ou embrides congelados para considerar, e um controle absoluto do ntimero de dvulos transferidos da ao casal uma sensagio de realizacao interior consciente. 15. E quanto 4 transferéncia intrafalopiana de zigotos (ZIFT)? O zigoto é a célula formada pela unt&o dos dois gametas (espermatozdide e dvulo). O esta- gio de zigoto é a primeira fase do desenvolvi- mento humano depois da fertilizagao e vai até o final da primeira semana de gestacao. E do zigo- 44 Colegdo Bivética to que vem todas as células que irao formar o individuo ¢ as estruturas de suporte da gestagado (placenta, cordao umbilical, membranas amniou- cas). O zigoto contém o cddigo genético comple- to, metade vinda do espermatozdide e a outra metade do ovulo. As vezes, no caso de gémeos idénticos e clonagem (a ser discutida mais tar- de), esse material genético é duplicado, forman- do um outro individuo, O procedimento para a transteréncia intrafa- lopiana de zigotos é semelhante ao usado para a transferéncia intrafalopiana de gametas, incluindo a preparacao hormonal da mulher e a coleta de évulos (geralmente através de uma agulha guiada por ultra-som) ao mesmo tempo em que esta acon- tecendo a preparacdo do esperma. O ovulo é en- tao exposto ao esperma fora do corpo da mae em um recipiente de vidro, onde acontece a lertiliza- cao. Uma vez que o espermatozdide penetrou o dvulo e as mudangas microscopicas podem ser observadas. através de uma laparoscopia o médi- co insere 0 zigoto na trompa da mae. Numa gravi- dez normal, o zigoto normalmente desenvolve-se na trompa: esse procedimento tenta duplicar tanto quanto possivel og eventos naturais em casos nos quais 6 ambiente mais controlado de um laborate- rio se faz necessario para obter a Jertilizagdo. O casal pode evitar as questées relacionadas a conservacdo criogénica ¢ ao numero extra de embrides através do controle do niimero de zigo- tos formados. Isso permite que o procedimento tecnologia de Reprodugdo 45 seja realizado com alto grau de respeito a vida e dignidade de cada zigoto que se desenvolve. Des- de que seja evitado 0 uso de doagdes de gametas (ver questao 13) e que sejam levadas em conside- ragdo as precaugdes sobre uma mae de aluguel (ver questao 18), essa tecnologia pode se encai- xar nas diretrizes de uma intervengdo médica eti- camente aceitavel (ver questdo 9). Ainda assim, pelo fato de essa tecnologia, como a fertilizagdo in vitro, Urar a fertilizagao do seu lugar natural no corpo (a trompa de Faldpio) e envolver diversos custos de ordem pratica, deve-se recorrer a ela apenas quando for a op¢ao menos custosa e com uma boa probabilidade de sucesso. 16. E quanto @ injecdo intracitoplasmatica (ICSI) de esperma e as opcées relacionadas a ela? Tomemos como exemplo, apenas para fim de esclarecimento, um ovo de galinha, Sua es- trutura principal inclui uma casca facilmente iden- lificavel. uma clara e uma gema. O dvulo huma- no é pequeno demais para ser visto sem 0 auxtlio de um microscopic. mas ele tem componentes semelhantes: uma “casca”, uma substancia cha- mada citoplasma (como a clara de ovo) e um nucleo (como a gema de ovo). Apesar de a “cas- ca” do évulo nao ser tao dura quanto a casca de um ovo, ela ¢ mais espessa do que o citoplasma que cla contém. A medida que a mulher enve- lhece, os dvulos restantes normalmente sao en- 46 Colegdo Bioélica voltos por “cascas” ainda mais resistentes. A injegio intracitoplasmatica de esperma é um procedimento que envolve a injecdo de um unico espermatozdide num dvulo humano, atra- vessando a membrana citoplasmatica com uma agulha microscépica especialmente preparada (um procedimento chamado de “micromanipula- tivo”). Os dvulos sao coletados da mesma ma- neira que foi descrito no caso de transferéncia intrafalopiana de gametas. Geralmente, os 6vu- los sfo coletados da mulher que sera a mae bio- Idgica. Porém, 0 uso de dvulos de doadoras ou, dentro do que a tecnologia permite, de évulos des- congelados, também é possivel. O esperma é obtido do homem (geralmente, mas nao neces- sariamente, através de masturbag4o) e € prepa- rado, O embriologista seleciona e separa um uni- co espermatozdide que parega normal, colocan- do-o no equipamento de microinjegao. A fonte de esperma usada nesse procedimento pode ser tanto o marido como um doador. Uma vez que o esperma esta na microagu- tha, o 6vulo é estabilizado sob 0 microscdpio ea membrana € rompida com a agulha. O esperma- tozdide é injetado diretamente no citoplasma (como a clara do ovo). A partir desse ponto, os cromos- somos do espermatozoide devem alinhar-se com os cromossomos do dvulo. En uma seqiiéncia de acontecimentos maravilhosamente complexa e muito pouco compreendida, 0 6vulo sabe que ocor- teu a penetracdo e os cromossomos do évulo, lo- tecnologia de Reprodugdo 47 calizados em seu nucleo (como a gema do ovo), desenrolam-se e alinham-se com os cromossomos masculinos. S6 entaéo € que surge um individuo, com a estrutura cromossémica completa neces- saria para que haja vida e crescimento. Rompimento assistido. Uma outra técnica micromanipulativa relacionada a injegao intraci- toplasmatica de esperma € 0 rompimento assisti- do. Com o aumento da idade dos évulos, pode haver problemas para que ocorra a penetragao do espermatozoide. Uma mulher ja nasce com todos os 6vulos que tera ao longo da vida, sendo que estes se encontram em estado imaturo. Nor- malmente, os évulos mais responsivos aos hor- monios sfo os que amadurecem primeiro, num estagio mais jovem da vida. Assim, mulheres mais velhas que queiram conceber podem encontrar algumas dificuldades relacionadas a fertilizagao e rompimento da membrana dos évulos. A fim de auxiliar essas mulheres, a membrana do évulo pode ser raspada ou riscada, criando uma regido mais fraca que permitira 0 rompimento, A major parte das pessoas ja viu um pintinho fazendo um buraco na casca do ovo e, em questdo de minu- tos, conseguir se libertar completamente da cas- ca tao resistente. Nos seres humanos, logo apos a fertilizacdo, a célula comega a se dividir e ex- pandir dentro dos limites da membrana e, portan- to, precisa que esta se rompa a medida que o numero e tamanho das células crescem. Se a membrana for dificil demais de ser rompida, 0 48 Colegdo Bioética embriéo morre. Ao auxiliar microscopicamente esse processo, riscando de eve a membrana du- tante a micromanipulagao, o procedimento au- menta as chances de sucesso. O rompimento da membrana nao levanta nenhuma questéo moral diferente daquelas geradas pela propria inj intracitoplasmatica de esperma. Injecdo intranuclear de espermatozdides. Nos casos de esterilidade do homem, quando es- permatozdides maduros nao sao produzidos ou li- berados, os médicos podem fazer uso da injegdo intranuclear de espermatozdides. Esse procedi- mento raramente é necessario, mas alguns homens certamente beneficiam-se da injecao intranuclear de espermatozoides. Ela ¢ util no caso de homens que nao tém o canal delerente (canal que traz os espermatozoides dos testiculos) ou quando esta bloqueado. O esperma é produzido nos testiculos, mas nao amadurece corretamente ou néo pode ser ejaculado de forma normal. O médico coleta espermatozdides imaturos do epididimo (uma es- trutura tubular ligada a parte de tras do testiculo, onde os espermatozdides sao armazenados e ama- durecem antes da ejaculagao) ou do proprio testi- culo através da aspiragdo com uma agulha. Esses espermatozoides ainda néo estéo maduros, mas mesmo assim podem ser injetados no citoplasma do évulo através de um procedimento micromani- pulativo semelhante ao descrito na injecdo intraci- toplasmatica de esperma. Os médicos recomen- dam esse procedimento quando o marido ndo tem do Tecnologia de Reprodugdo 49 nenhuma possibilidade de produzir um filho biold- gico sem a assisténcia de alta tecnologia. As ques- t6es éticas relevantes estdo relacionadas aquelas da injecAo intracitoplasmatica de esperma. As questées morais que envolvem a injecao intracitoplasmatica de esperma nao so novas. A tecnologia e capacidade de colocar um unico es- permatozoide dentro de um tnico ovulo repre- seniam a maior evolugéo do ponto de vista do tratamento de esterilidade do homem. 4 nao é mais preciso haver uma grande quantidade de esperma para produzir a gravidez. Homens com contagens baixas de esperma tém uma boa chan- ce de ter um filho. Assim, diminui a tentagao de se usar um doador com maior contagem de es- perma. A injegao intracitoplasmatica de esperma também pode ser usada para eliminar o segundo motivo pelo qual algumas pessoas usam 0 doa- dor de esperma. No momento, o esperma de um doador pode ser usado com a finalidade de evitar determinadas doencas hereditarias. Futuras des- cobertas sobre a estrutura genética do esperma- tozdide podem permitir o teste genético do mes- mo, bem como sua selecao a fim de evitar a trans- missao de certas anomalias cromossdmicas con- tidas no cddigo genético de apenas alguns dos espermatozdides do homem. Mesmo que todo o esperma seja afetado, no futuro, terapias genéti- cas poderao muito bem tornar possivel a corre- yao genética da deficiéncia antes de se usar a injegao intracitoplasmatica de esperma. 50 Colegdo Bioética Independente do estagio de desenvolvimen- to da tecnologia genética, o uso de gametas de doadores nao é eticamente aceitavel (ver ques- téo 13; ver também questo 18 sobre maes de aluguel). Entretanto, dentro da unido matrimoni- al, a injecdo intracitoplasmatica de esperma pode ser uma intervencao médica justificavel pelos mesmos motivos que a transferéncia intrafalopi- ana de zigoto e fertilizagao in vitro (ver questao 9). Alias, pode ser preferivel do ponto de vista ético. Com a injegao intracitoplasmatica de es- perma, os médicos tém controle total sobre o namero de embrides a serem reimplantados, nao havendo preocupagdes com gravidez miltipla nao-intencional, preservagao criogénica ou redu- ¢ao seletiva de embrides. 17. Quais séo as questées legais relacionadas as tecnologias de reproducdo? A principio, os casais podem ter dividas se o plano de satide cobre ou nao os tratamentos de esterilidade. Nos Estados Unidos, por exemplo, s6 alguns Estados obrigam as empresas de plano de sade a oferecer esse tipo de cobertura. Para informagées mais especificas sobre cobertura de planos de satide, entre em contato com o Jnter- national Council on Infertility Information Dissemination, P.O. Box 6836, Arlington, VA 22206 (http://www. inctid.org) . Tecnologia de Reprodugdo 51 Existem varias outras questdes legais acer- ca do uso de tecnologias de reprodugao que po- dem ser potencialmente complicadas, incliindo: (1) Qual é a identidade legal da crianga? (2) Quem pode realizar procedimentos de reprodug4o as- sistida? (3) Que tipo de consentimento € neces- sario? (4) Quais sao os parametros para a sele- ¢do de doadores? (5) Quem deve ser responsa- bilizado pelos procedimentos? Para os casais que estéo considerando a pos- sibilidade de langar mao de técnicas de reprodu- ¢do assistida usando seu prdéprio esperma.e évu- los para engravidar a esposa, algumas questdes- chave do ponto de vista legal inchiem a producao in vitro de varios embrides e decisdes sobre o que fazer com os embrides preservados por cri- ogenia. As clinicas exigem um planejamento de- talhado no caso de divorcio, morte de um cénju- ge ou abandono dos embrides guardados. Quais direitos devem ser concedidos 4 prole congela- da? De que forma lidar-se-a com eles em ques- toes de custédia ou responsabilidade financeira? De que maneira a clinica deve decidir como des- cartar embrides excedentes, indesejados ou aban- donados? O que o casal pretende fazer se con- seguir completar gestagdes com sucesso e ainda tiver varios embrides congelados? Quando as técnicas de reprodugao assistida fazem uso de gametas de terceiros, quer sejam eles doadores de esperma ou évulos, surgem ain- da outras questdes. Nessas situagdes, as ques- 52 Colegdo Bioética tdes legais mais comuns sao em relagdo a adul- tério, legitimidade da crianga e problemas relaci- onados ao sustento da crianga, custédia e heran- cas. Apesar de a crianga ser tecnicamente ilegi- tima, pelo fato de os pais biolégicos nao serem casados, @ maior parte das jurisdigdes conside- rard essa crianca legitima se ela for gerada du- rante 0 casamento ou até dez meses depois da dissoluc4o da uniao por morte ou divércio. Esta- dos que possuem estatutos que tratam diretamen- te dessa questao consideram a crianga legitima se 0 pai tiver consentido com a inseminacao. As dificuldades geralmente s6 aparecem se 0 casa- mento ¢é desfeito. A doacio de esperma tem uma longa histé- ria e a maioria dos Estados nao considera 0 doa- dor legalmente responsavel pela crianga. Porém, alguns filhos resultantes de inseminagdes com doadores estao procurando descobrir a identida- de de seu pai bioldgico. Os doadores pagos de esperma historicamente nao tém tido nenhum contato com seus filhos e nenhuma responsabili- dade em relagdo a eles. A situagdéo em relacdo as doadoras de 6vulos parece ser um pouco mais complexa. Com freqiiéncia, a coleta de dvulos envolve tralamentos com drogas e intervengao médica ou cirurgia laparoscopica. [sso aumenta os riscos e os Custos para a doadora e pode in- terferir com o anonimato. Técnicas avangadas mais recentes de congelamento e descongelamen- to de ovulos aumentam a possibilidade de esto- a Tecnologia de Reproducdo 53 car ovulos em grande quantidade para uso bem depois da coleta. Alias, alguns pesquisadores estao explorando a possibilidade de fazer a coleta de ovarios dle fe- tos abortados com a finalidade de amadurecer esses Ovulos para uso posterior num programa de doagao de dvulos. Enquanto esse é um caminho que pode gerar uma grande quantidade de dvulos, é possivel que uma crianga venha a ter uma mae genética que nem chegou a viver fora do Utero. A capacidade de se obter esperma postumamente ou de homens com doengas terminais ja tem Je- vantado questdes legais relativas a responsabili- dades, direitos e herangas para um individuo con- cebido apés a morte do pai bioldgico. Um consentimento informado por parte dos pais é um dos requisitos sempre que a concep- gdo envolve o esperma ou dvulos de um doador. O cénjuge cujos gametas do serao usados deve entregar um consentimento por escrito para evi- tar futuras queixas de adultério ou a justificativa de negligéncia de responsabilidade em relagao a crianga. Mesmo quando o consentimento dos pais é obtido, ainda assim pode haver complicagdes legais. Existem, de fato, varias situagdes em que os pais ou o doador podem dar entrada a um pro- cesso legal. Um doador de sémen pode requerer a paternidade, obter direitos de visitagao ou ter acesso as propriedades da mie (para beneficio da crianga) se a crianga for menor de idade. Os pais podem processar por “nascimento injusto” 54 ColegGo Bioética caso a crianca tenha uma deficiéncia, conside- rando a possibilidade de que essa crianga nao teria nascido se os médicos tivessem avisado os pais sobre testes pré-natais. Parte-se do pressu- posto de que o casal iria abortar qualquer feto “insatisfatorio” e nao levar a gestacdo a termo. Os médicos também correm riscos Jegais por outros motivos. O médico que esta assistindo na reproducao pode, por exemplo, ser processado por negligéncia na hora da escolha de um doador. Ja aconteceu de mulheres contrairem infecgdes por causa de sémen contaminado. Os médicos nor- malmente nado fazem a selecio genética, mas po- dem ser responsabilizados caso a crianga nasga com uma doenga hereditaria (ou, como ja aconte- ceu, seja uma crianga de etnia diferente da mae). Nao é de se surpreender que as formas de emprego de tecnologia de reproduc4o menos jus- tificaveis (eticamente falando), muitas vezes sao as que mais trazem problemas legais. Mas, algu- mas formas de uso possivelmente éticas também trazem riscos legais que podem tornar sua apli- cacao pouco prudente. Em todos os casos, deve- se saber quais os riscos legais envol vidos e leva- los em consideragao. 18. E quanto as gestagdes em mies substitutivas? Algumas vezes, casais consideram 0 uso de uma outra mulher, caso a esposa nao possa levar a termo uma gestagao devido a idade, anomalia Tecnologia de Reprodugdo 55 fisica, doenga, ferimento ou problemas imunoldgi- cos (anticorpos reagentes a gestac4o). Em muitos casos, essa mae substituta nao apenas serve de hospedeira dentro da qual a crianga ira crescer, como também oferece os dvulos (procedimento tradicional); mas nem sempre 6 necessariamente dessa forma. Com o desenvolvimento da fertiliza- c&o in vitro, da injecao intracitoplasmatica de es- perma e de outras técnicas micromanipulativas, é possivel que a hospedeira nao tenha nenhuma li- gacdo genética com a crianga que esta carregan- do (substituta gestacional). Nesses casos, ela ser- ve de incubadora viva para a crianga de outros. Como tal, o relacionamento pode ser estritamente financeiro ou mais altruista— quando alguém da familia ou uma amiga passa pela gravidez como um gesto de amor. Mesmo que essas situacdes possam ser legalmente bastante complicadas (ver questo 19), do ponto de vista bioldgico elas sao simples. A gestagao em uma mae substitutiva tem como objetivo uma nova vida. Para mulheres que, por motivo de uma cirurgia ou problemas imunold- gicos, nao podem levar a termo uma gestagao, 0 objetivo de ter um filho com suas caracteristicas genéticas ¢ alcangado. Ainda assim, esse tipo de procedimento é eticamente inaceitavel em dois casos. O primei- ro é quando existe um acordo comercial (mae de aluguel). E moralmente inaceitavel alugar um ate- ro com a finalidade de ter uma crianga. O con- trato financeiro envolve a compra de um ser hu- 56 Colegdo Bioética mano e torna-se uma forma de uma pessoa ter posse de outra. Como a venda de qualquer 6r- gio, o uso do titero como um orgao de aluguel comercializa algo que jamais deve ser vendido ou comprado. E uma situagdo especialmente opressiva para mulheres pobres que podem ser financeiramente coagidas a dispor de seu titero. A segunda circunstancia na qual esse tipo de procedimento é antiético é quando é feito uso de esperma ou évulos de um doador (ver ques- tao 13), especialmente se este é juntado com o esperma ou Ovulos de um dos cénjuges para cri- ar actianca. O ovulo e 0 espermatozoide podem ser fertilizados in vitro oua mae substituta pode ser fertilizada artificialmente com o esperima do marido (no caso do procedimento tradicional), evitando assim o adultério - no sentido de que os dois nado tém uma relagao sexual. De qualquer forma, a fatha ética crucial é que a crianga gera- da nao é produto da uniao matrimonial. Dizer que uma crianca € pelo menos wma parte nossa ¢& incorreto. A unido matrimonial é a jungao de dois individuos em uma s6 carne. Uma crianga gera- da por um dos conjuges Fora dessa uniao nao per- tence a essa ligagdo de uma sé carne e, portanto, nao pode ser considerada preduto dessa uniao. A crianga seria produto de wna oufra unido nao sa- cramentada pelos votos matrimoniais e por um compromisso. O uso de gametas de doadores enmprega tecnologia fora dos limites do casamento para criar aquilo que a uniao em si nao pode. fecnalogia de Reprodugdo 57 O procedimento em questao pode ser mo- ralmente aceitavel se os gametas (espermatozdide e évulo) forem juntados in vitro e originarios dos cénjuges de uma uniao matrimonial? Para ser considerado moral, esse tipo de procedimento deve estar livre dos problemas comerciais e de game- tas de doadores, conforme ja foi mencionado an- teriormente. Além disso, nao deve ser algo im- prudente a luz de todas as questdes legais e pra- ticas envolvidas. Quanto ao primeiro requisito, em situagdes nas quais a fertilizagado in vitro é con- siderada moral (ver questao 12) ea mae ndo pode carregar o feto, o uso de uma me substitutiva pode ser uma forma moralmente aceitavel de per- mitir que o embrido sobreviva. Se a fertilizagdo in vitro apenas substitui o trabalho de trompas que nao funcionam, o uso de uma mae substituti- va pode ser visto como a substituigéo de utero e trompas que nao funcionam. Porém, para que esse procedimento torne-se moral, é preciso que a mae substitutiva oferecu seu titero sem impor qualquer condigao, além de receber cuidados médicos apropriados durante a gestagao. E louvavel, e ndo condenavel, que uma mu- ther, por amor a vida, oferega o uso de seu ventre para salvar um embrido congelado que de outra forma seria destruido. Nés elogiamos quando al- guém doa um rim ou um pulmao para salvar a vida de um ente querido. Devemos também elogiar a iniciativa de uma mulher que, sem desejo algum de lucro pessoal, doa o uso de seu ventre para 58 Colegao Bioética que um casal que ela ama possa ter um filho que é fruto de sua unio matrimonial. Se seus motivos sAo puros, a doa¢do de seu ventre é um ato sacrificial de amor. A diferenga entre a doa- cao de um pulmo ou um rim e a doagao tempo- raria do utero é que, no caso da mulher que doa o titero, ela “recebe de volta” o orgaio doado e ela mesma continua a usa-lo. Porém, mesmo nessas ocasides, quando o procedimento nao € imoral, ainda assim pode nao ser 0 caminho certo a seguir por varias razGes legais e praticas. As consideragGes legais serao discutidas na proxima questao. Quanto as ques- tées praticas, elas nao sio apenas financeiras, mas também profundamente emocionais. Esse procedimento requer que a mulher quebre ou, no minimo, altere radicalmente o relacionamento que ela vinha desenvolvendo com a crianga em seu ventre durante nove meses. Algumas mies substi- tutivas nado conseguem terminar esse relaciona- mento, apesar de suas boas inten¢ées iniciais, ¢ recusam-se a entregar 0 bebé apds o parto. Esse problema tem menor probabilidade de ocorrer se a mae substitutiva 6 um membro da familia, por- tanto esse é 0 tipo mais adequado de acordo. De qualquer maneira, 0 uso de uma mae substitutiva coloca em cena uma terceira pessoa —o que pode acabar distanciando emocionalmen- te a mae da crianga. Também se torna mais facil para um ou ambos os pais nado assumir responsa- bilidade pela crianca, caso fiquem sabendo que Tecnologia de Reprodugdo 59 ela tem alguma deficiéncia (que pode ter sido causada por algum comportamento insalubre da mae substitutiva). No procedimento tradicional, as dificuldades emocionais sao ainda maiores, pois a crianga é fruto da uniao genética entre o dvulo da mae subs- titutiva e o esperma do marido e nado da uniao entre o marido e sua esposa. Lagos emocionais imprdéprios desenvolvem-se com facilidade entre o marido e a mae substitutiva ~ pelo menos na mente da esposa. A historia biblica que mais se parece com esse caso esta no Antigo Testamento e fala de como Abraio e Sara usaram uma mae substitutiva, Agar, para que Abraao tivesse um des- cendente genético (Génesis 16). Fica claro atra- vés do texto ndo apenas que essa foi uma atitude desesperada e sem a orientagao de Deus, como também o resultado foi um conflito entre Sara e Agar que continuou, através dos irmaos (Isaque e Ismael) e que persiste até os dias de hoje. 19. Quuis sto as questées legais relacionadas ao uso de uma mae substitutiva? Esta pergunta € extremamente compiexa, pois, em paises como os Estados Unidos, por exemplo, a resposta pode variar de um estado para o outro. Alias, esse tipo de procedimento nem é legal em alguns estados. Outros estados tém leis que reconhecem o uso de uma mae subs- 60 Colegdo Bioética titutiva, enquanto muitos mantém uma posigdo neutra. Portanto, este breve resumo nao deve ser considerado como conselho legal sobre um cam- po que esta em constante mudanga. O procedimento tradicional envolve a fertili- zacgao de um ovulo da mae substitutiva com o esperma do marido através de técnicas de inse- minagao artificial. Nesse caso, a “mae gestacio- nal” (aquela que esta carregando a crianga) tam- bém é a mae biolégica e genética. A “possivel mae”, esposa do homem que doou o esperma, nao tem nenhuma ligagado genética com a crian- ga e nao participa da gestagdo. Nos estados que permitem esse tipo de procedimento, a “possivel mae” deve dar entrada em papéis para adogao legal uma vez que a crianga nasce, pois, pela lei, aquela quem da a luz a crianga é normalmente considerada sua mae. Por outro lado, quando a hospedeira s6 empresta seu Utero, mas ndo con- tribui com o évulo, ela nao tem nenhuma ligagao genética com a crianca — so 0 elo da gestagao. Ainda assim, € possivel que a nova mae precise requerer a adogao legal da crianga. Esse tipo de procedimento ¢ cada vez mais comum. Alguns afirmam que ja ocorreram em torno de quinze mil nascimentos através desse método. Desses, pelo menos uma duzia terminou cm processos legais. Muitos ainda se lembram do caso do “Bebé M” e de Mary Beth Whitehe- ad, a mae gestacional que mudou de idéia na hora de entregar sua filha para William Stern — 0 doa- Tecnologia de Reprodugdo ol dor do esperma ~ e sua esposa. Apesar de, no fim das contas, a mae gestacional ter perdido a custédia da crianga, a Suprema Corte de New Jersey declarou que os contratos para uso de uma mae substitutiva ndo sao legalmente validos. Esses casos giram em torno da recusa da mde gestacional em abrir mao dos seus direitos de maternidade e da crianga antes ou logo de- pois do nascimento. As questdes legais podem ser decididas de acordo com (1) leis de contra- tos, (2) leis que proibem o mercado negro de be- bés, (3) leis de adogdo que proibem pagamento para carregar uma crianga (a mae precisa adotar o bebé, pois ela nao é biologicamente ligada a ele), (4) leis da familia relacionadas ao pedido de cus- todia do pai bioldgico (e contratual) ou (5) direitos e obrigacgdes de doadores de esperma. Um dos episddios mais estranhos relaciona- dos a determinagao de paternidade envolve o caso de Jaycee Buzzanca que, por algum tempo, ficou sem pais. Ela foi concebida através de daagacs anonimas de évulo e esperma e nasceu em 1995 de uma mae contratada por John e Luanne Bu- zzanca. A mae gestacional (mae substitutiva) abriu mao de todos os seus direitos legais. O ca- sal separou-se antes de 0 bebé nascer e Jaycee, de dois anos, vive com Luanne. John recusou-se a pagar pensao, afirmando nao ser o pai da cri- anga. A corte que julgou a causa decidiu que Jaycee ndo fem pais e, portanto, nao tem direito a pensao. Recentemente, a corte de apelagdo 62 Colegdo Bioética decidiu que John Buzzanca é 0 pai legal e orde- nou que pagasse a pensdo.* Tendo em vista as possiveis combinacdes do ovulo de uma doadora com o esperma do mari- do, ou do dvulo da esposa e o envolvimento de uma mae substitutiva, a complexidade social e legal desse tipo de procedimento é enorme. Pen- se num casal que obteve o dévulo de uma doado- ra, fertilizou-o in vitro com o esperma de um do- ador e implantou o embriao no titero de uma hos- pedeira. Cada um dos individuos envolvidos — 0 possivel pai ea possivel mae, os dois doadores e a hospedeira — pode ter direitos legais sobre a crianca resultante. Ainda tomando como exemplo os Estados Unidos, alguns estados sao considerados mais favoraveis para esse tipo de procedimento, pois eles nado tém estatutos que proibam ou regula- mentem a pratica. Alguns estados tém legisla- ¢des pendentes que podem mudar de forma dra~ matica a validade dos contratos ligados ao uso de uma mae substitutiva. Esses documentos com~ plicados detalham as intengdes de todas as par- tes envolvidas, sendo que a mae gestacional abre mao dos seus direitos legais sobre a crianga an- tes da fertilizagéo. Mesmo que esses contratos possam ser meticulosamente redigidos, ainda nao esta claro o seu valor legal. Mais uma vez, a lei supde que a mulher que deu a luz é legalmente a mae. Em alguns casos, o contrato foi simplesmen- te ignorado, pois a mae gestacional nao pode abrir tecnologia de Reproducdo 63 mao de seus direitos antes da concepgao da cri- anga. Os direitos legais do marido da mae substi- tutiva também nao estao ainda muito claros. Em certos casos, a mae substitutiva pode temer que os possiveis pais mudem de idéia, deixando-a com a crianga. Outras maes gestacionais podem mu- dar de idéia e entrar com um pedido legal de cus- todia do bebé. Até mesmo os nomes na certidado de nascimento podem ser contestados. Para complicar ainda mais, alguns estados declaram ilegal o recebimento de uma soma em dinheiro maior do que as despesas médicas (o que € costumeiro quando é usada uma mae subs- titutiva). Essa complicagaéo pode surgir quando oS possiveis pais entram com o pedido formal de adogao. Muitas vezes, eles serao perguntados se pagaram alguma quantia 4 mae gestacional para facilitar a adocao. Até mesmo o pagamento das despesas médicas pode ser uma violagao da lei. Quando da elaboragao deste texto, dezeno- ve estados tinham leis especificas sobre o uso de uma mae substitutiva. Cinco estados (Arizona, Michigan, New York, Utah e Washington) e tam- bem no Distrito de Columbia consideravam 0 pro- cedimento um crime. Porém, as leis nem sempre sao aplicadas. Em outros seis estados (Arkan- sas, Florida, Nevada, New Hampshire, Dakota do Norte e Virginia) 6 permitido o uso de maes substitutivas, apesar de trés deles (Florida, New Hampshire e Virginia) proibirem a organizacao de programas que promovam esse procedimen- 64 Colegdo Bioética to. Contratos entre possiveis pais e maes substi- tutivas nao so considerados validos em cinco estados (Indiana, Kentucky, Louisiana, Nebraska e New Jersey). Nesses casos, 0 casal que con- tratou a mae substitutiva corre o risco de perder todo seu investimento caso ela mude de idéia e nao abra mao de seus direitos sobre o bebé. West Virginia, considerado um estado fa- voravel a esse tipo de procedimento, tem uma excecéo em sua lei que proibe a “compra ou venda” de uma crianga ou o pagamento pelo consentimento de adogdo. Essa excegao per- mite, entretanto. pagamento de “taxas e despe- sas que fagam parte de qualquer espécie de acordo” no qual uma mulher concorde em ser mae substitutiva. Assim, West Virginia reconhe- ce o uso de uma mae substitutiva como uma forma de contrato legal. Outros estados reco- nheceram os direitos dos pais genéticos no caso de hospedeiras que pediram a custddia. Outras complicacgdes legais surgem em caso de deficiéncia, divorcio ou morte. As partes en- volvidas podem acabar na justiga quando a cri- anga nasce com uma deficiéncia e nenhuma das partes quer assumur a responsabilidade de pater- nidade. Quando os possiveis pais se divorciam ou um deles morre, nao ha ligagao genética entre nenhum dos pais e a crianga, caso os gametas tenham vindo de doacées. Assim, a responsabili- dade legal no caso de um divorcio ou morte fica com 6 possivel pai ou mae determinado pelo con- Tecnologia de Reprodugdo 65 trato. Mas, como ja foi observado, alguns desses contratos podem nao ser considerados legais. A agéncia que faz todos os preparativos para o uso de uma mae substitutiva pode ser proces- sada se nao selecionar adequadamente a mae substitutiva ou os pais doadores. Em um caso, uma mae substitutiva contraiu um virus do pai doador. Em outro, a mae substitutiva se recusou a manter-se celibataria e deu a luz uma crianga de seu namorado. O casal fez pagamentos para a mae substitutiva durante quatro meses, até que a paternidade da crianga foi determinada. As complexas questes legais sio reais e¢ qualquer um que esteja considerando o uso de uma mae substitutiva deve procurar o conselho de especialistas legais para entender o que esta em jogo. do ponto de vista da lei. 20. O meu embrido deve ser geneticamente testado? Os testes pré-natais sdo uma area em ex- pansao no tratamento obstétrico. Médicos de outros tempos baseavam-se no ritmo de cresci- mento. na movimentacao da crianga e nos bati- mentos cardiacos, detectaveis a partir do quinto més, para determinar o bem-estar do feto. Pouca coisa podia ser discernida antes do nascimento. Hoje em dia, os médicos podem realizar amnio- centese (teste do liquido amnidtico) para detectar diversos problemas. Através do uso de equipamen- tos de ultra-som de alta precisdo, podem observar 66 Colegdo Bioética grande parte do processo de desenvolvimento. O teste do liquido amnidtico, o exame de tecido da placenta e/ou do sangue do feto podem revelar determinadas informagées genéticas e metabdli- cas. Certos problemas hereditarios podem ser di- agnosticados, mas ainda nao ha muitos tratamen- tos disponiveis. Algumas vezes, essas informag6es sdo usadas para se recomendar um aborto, espe- cialmente aqueles procedimentos que diagnosticam problemas logo no inicio da gestacao. Nesta era de reprodugao assistida de alta tecnologia, 0 espermatozoide e o d6vulo podem se encontrar in vitro ea primeira divisdo celular pode ocorrer fora do corpo. Ja é possivel testar uma das células dos grupos em desenvolvimento e encontrar informagdes importantes antes da ni- dagao (implantagao). O Projeto Genoma, que atualmente esta mapeando todo o cddigo genéti- co dos seres humanos, podera permitir que se preveja, desde os primeiros estagios de vida, as probabilidades de a crianga desenvolver um de- terminado problema ou anomalia. Quais os beneficios decorrentes desse tipo de informagd4o? Quais os riscos de selecao e testes genéticos para o embriao? Cada um dos procedi- mentos invasivos traz um risco. A amniocentese e amostragem sangiiinea podem desencadear o aborto durante uma gestagao normal. Apesar de esse tisco ser baixo (aproximadamente uma em mil gestagdes com o direcionamento de agulha sonograficamente orientado para a realizagado de Tecnologia de Reprodugdo 67 amniocentese e um pouco mais para a amostra- gem sangiiinea), ele € real. O congelamento e des- congelamento de embrides também acarretam grande risco (mesmo que em declinio nos dias de hoje) para o embrido. Quanto risco é aceitavel? Uma pergunta-chave que deve ser feita em relagdo a esses procedimentos invasivos é: de que maneira a informagdo obtida ird benefi- ciar o embriGo? A experiéncia da Alemanha nazista deve ter nos ensinado alguma coisa. O Cédigo de Nuremberg foi criado e internacional- mente reconhecido para proteger contra experi- éncias que podem ser nocivas aos envolvidos.’ O cédigo especifica que s6 as experiéncias po- tencialmente benéficas aos envolvidos sao con- sideradas éticas, a menos que se obtenha 0 con- sentimento informado destes. Tendo em vista que nao se pode obter o consentimento de um em- brio, os testes genéticos devem ser para o bem do embrido e nao com a finalidade de aborta-lo, pois 0 embriao tem o mesmo valor moral de uma pessoa (ver questéo 8). Para aqueles que pensam que a verdadeira individualidade nao comega no momento da fer- tilizagao, mas sim com a nidacao, com as primei- tas ondas cerebrais, com os primeiros batimen- tos cardiacos ou qualquer outro marco, a situa- cdo 6 bem diferente. Se o embrido nao é consi- derado uma vida humana unica, conseqiientemen- te, nenhuma pessoa esta correndo risco durante os testes no embriao. Assim, quaisquer experi- 68 Colegdo Bivética éncias que possam vir a ser titeis para a socieda- de ou qualquer teste que ajude uma mulher a decidir em favor do aborto podem ser realizadas sem qualquer impedimento moral. Porém, para aqueles que consideram que a individualidade do embriao comega no momento da fertilizagao, os testes embrionarios precisam oferecer um beneficio para o embriao que exce- da os riscos. A medida que as terapias genéticas se desenvolvem, certos problemas hereditarios poderaio ser diagnosticados e, possivelmente, tra- tados ainda no estagio embrionario, Esse é um objetivo de grande valor, mas precisamos alcan- ¢a-lo por meios éticos. Sempre que possivel, in- formagées e experiéncia técnica devem ser obti- das através de experiéncias realizadas ao nivel de estruturas celulures ao invés de embrides humanos. Entretanto, se é preciso fazer uso de embrides humanos, eles proprios devem ser be- neficiados pelas experiéncias realizadas. Uma vez estipulados esses parametros, podemos manter o respeito pela dignidade da vida humana mesmo na forma embrionaria. 21. E quanto @ clonagem de seres humanos? No momento, a clonagem nao é uma op- ¢ao reprodutiva disponivel para os casais; mas um dia pode vir a ser. Portanto, merece algu- ma atengao aqui. Tecnologia de Reprodugdo 69 A publicidade em torno da clonagem da ove- tha Dolly tem gerado debates publicos acalora- dos. Em janeiro de 1998, 0 presidente dos Esta- dos Unidos Bill Clinton reafirmou publicamente sua rejeicao a clonagem de seres humanos — uma pratica chamada de “brincar de Deus”. No mes- mo més, um médico de Chicago prometeu que, num futuro relativamente proximo, comegaria a oferecer a clonagem de humanos para o puiblico e. num encontro de dezenove paises da Europa em Paris, Franga, fot assinado um acordo proi- bindo a clonagem de seres humanos. As pesquisas feitas com rebanhos ja rende- ram conhecimentos importantes sobre gémeos pesquisas genéticas. Mas 0 caso de Dolly vai além da produgao de gémeos. Os relatorios afirmam que, pela primeira vez, os pesquisadores obtive- ram sucesso na clonagem de-um animal usando uma célula nao-reprodutiva (isto é, nem esper- matozdide, nem ovulo) de um animal adulto. Para isso, eles extrafram material genético da célula através da remogao de seu nucleo. Esse nucleo foi, entao, inserido em um dvulo cujo nucleo tam- bém havia sido removido. Através da aplicagao de energia elétrica, esse 6vulo com o mesmo cddigo genético da ovelha adulta foi estimulado a se dividir. A nova célula comegou a divisdo e, por fim, resultou numa ovelha madura idéntica 4 ove- Ilha doadora. Assim, Dolly era um clone, uma ré- plica genética exata da ovelha da qual foi tirada a célula original. 70 Colegdo Bioética A manifestagaéo publica contra o processo de clonagem normalmente vem do medo de que 0 procedimento seja aplicado em seres humanos. Para que isso acontecesse, o clone e a pessoa de quem o clone seria originado, assim como géme- os idénticos, teriam a mesma configuragao cro- moss6mica, mas teriam uma diferenga de idade de muitos anos. A possibilidade de doagao de 6r- gaos, reposicdo de individuos mortos e de selegado e criagdo de uma “super-raga” de individuos idén- ticos torna-se bastante real. Os governos estéo debatendo a ética da clonagem, mas n4o querem servir de empecilho para a pesquisa cientifica. Lideres religiosos tem mostrado a tendéncia de repudiar 0 procedimento, afirmando que a clo- nagem € uma violacao do dominio e autoridade de Deus. Deus confiou a sua criagado as maos da humanidade. Deus fez o homem a sua imagem e nao deu a ele autoridade absoluta sobre a vida humana, apenas sobre plantas e animais. Por- tanto, aclonagem de animais ou plantas esta den- tro dessa categoria, mas nado o uso deste proce- dimento com seres humanos. Plantas e animais podem ser usados para alcangar propdsitos hu- manos, mas pessoas nao devem ser usadas des- sa maneira. Pessoas tém dignidade, pois sao cri- adas 4 imagem de Deus (Génesis 1.27; 9.6). Outra questao teoldgica 6: um clone humano teria alma? Nao ha motivos para pensar que ndo, tendo em vista que, no caso de gémeos idénticos, cada um tem uma alma. Poucos acreditam que Tecnologia de Reprodugdo 7\ gémeos compartitham uma mesma alma e que, por isso, s4o inferiores. Apesar de a clonagem nAo alterar 0 materi- al genético, seu atrativo esta no fato de que se pode produzir uma pessoa com determinado cé- digo genético. E um primeiro passo num empre- endimento muito maior de planejamento genéti- co de carater moralmente dabio. Uma coisa ¢ intervir medicamente ou de mancira a ajudar as pessoas; outra coisa bem diferente é alterar se- res humanos sem o seu consentimento para o beneficio de outra pessoa (ver questao anterior). Produzir o clone de uma crianga, quer para subs- tituir um filho que morreu ou para doar érgaos para uma crianga doente pode, a principio, pare- cer nobre. Entretanto, agdes desse tipo abrem a porta para uma forma de ver e tratar as pessoas (usando-as) como instrumentos e néo como indi- viduos singulares. Se vamos justificar a clonagem tomando por base a maneira como os clones podem ajudar outras pessoas ~ ou seja, com base nas conseqti- éncias — entéo, uma grande variedade de outras conseqiiéncias deve ser levada em consideracao. Sera que uma pesquisa recente que tornou pos- sivel a produgao de ratos sem cabega também nao seria tentadora— no sentido de produzir pes- soas sem cabega para serem meros doadores de orgaos? Se a clonagem de humanos pudesse cri- ar urna geracdo de individuos com caracteristi- cas desejaveis, nao seria possivel, entao, impedir 72 Colegdo Bioética que pessoas com caracteristicas menos atraen- tes se reproduzissem? Sera que nao seriamos ten- tados a madar o genoma do mundo de forma a agradar nossos gostos ¢ preferéncias? O que im- pediria as grandes poténcias mundiais de repovo- ar o mundo com uma raga considerada superior, condenando os demais a extingdo? Se resultados atraentes justificam o uso de pessoas, entio nao ha limite para as possibilidades. Muito além disso tudo, porém, esta a questio de desenvolver a capacidade de se clonar huma- hos com seguranga. Para produzir o clone de uma ovelha toram teitas 276 tentativas que fracassa- ram, incluindo a morte de diversos clones defeitu- osos. Nao importa o quanto alguém queira uma crianga. quer através de clonagem ou outra for- ma, ninguém tem o direito de submeté-la a morte quase certa por causa de tais experiéncias. 22. Devo considerar a adogdéoe como una posstbilidade? A maior parte dos casais faz bem em tentar satistazer seu desejo de ter um filho bioldgico antes de procurar a adocdo. Tentar a reprodu- cdo assistida e a adocao ao mesmo tempo tem- se mostrado muito estressante do ponto de vista emocional e bastante pesado financeiramente.° Mesmo sendo legal. de forma alguma a adocao é facil ou previsivel e seus custos podem passar de US$ 20 mil. Nao ha garantias. Apesar de a tecnologia de Reprodugdo 73 maioria das adogées resultar na dadiva de uma crianga, ha casos demais em que a mae biologi- ca muda de idéia quando a crianga nasce. Tendo em vista Os riscos, os futuros pais devem procu- rar a adocao com cautela, estando sempre a par dos progressos alcangados no processo. A perda de uma crianga adotiva ~ mesmo que tenha sido adotada ha pouco tempo — pode ser tao trauma- tica quando a perda de um filho biolégico. A adogao traz para dentro da familia uma linhagem genética totalmente diferente. Os ca- sais que adotam precisam suportar certas per- das ao longo do caminho. De acordo com Pat Johnson, autor do livro Adopting After Infertili- ty (Adotando Depois da Esterilidade). os pais estéreis experimentam a perda de controle, a perda da continuidade genética individual. a per- da de uma crianga gerada em conjunto, a perda da experiéncia de gestacao € nascimento, a per- da das experiéncias emocionais ligadas a gesta- cao € ao nascimento e a perda da oportunidade de se cuidar de uma nova geragdo. A adocao resolve essa Ultima perda, mas ao as outras cin- co, Aqueles que estiverem considerando a possi- bilidade da adogdo devem se lembrar de que ela pode nado preencher todas as suas necessidades e nem desfazer todas as suas perdas.’ Os tedlogos que estudam a questao da ado- ¢ao normalmente sdo a favor. Eles baseiam seu apoio nos exemplos biblicos de Moisés, Ester, e no processo de adocgao do Novo Testamento atra- 74 Colegdo Bioética vés do qual o cristao torna-se parte da familia de Deus (Romanos 8.23). E necessario que a deci- sao de ficar com uma crianga ou deixa-la para adogao seja de responsabilidade exclusiva daque- les que deveriam cuidar dela. O amor as crian- cas inclui a capacidade concreta de prover bens, assim como a ligagdéo emocional. Se o pai, a mae, ou tanto um quanto outro nao podem cuidar bem da crianga, deixa-la para adocdo nao é vergo- nhoso e nem imoral. Entregar a crianga para pais que podem suprir suas necessidades materiais ¢ emocionais pode ser um responsavel ato de amor. De qualquer maneira, a ado¢4o separa os aspectos genéticos dos aspectos ligados a cria- cao, duas coisas que normalmente andam juntas. Os pais adotivos nao foram responsaveis por tra- zer a crianga ao mundo e isso poderia resultar numa sensa¢ao de enfraquecimento da respon- sabilidade dos pais para com a crianca — e vice- versa. Assim como outras alternativas de repro- dugao ja discutidas, as criangas ndo devem ser intencionalmente concebidas em situagdes den- tro das quais 0s pais genéticos nao poderao cui- dar delas (ver questao 13). Entretanto, uma vez que a crianga foi concebida numa situagéo em que € praticamente impossivel que os pais gené- ticos cuidem dela, ha dois gestos de carinho que podem ser realizados por outras pessoas ou gru- pos (como, por exemplo, uma igreja). Em primei- ro lugar, pode-se prover 0 encorajamento e os recursos para que os pais possam cuidar da eri- Tecnologia de Reprodugdo 75 anga que eles conceberam. Em segundo lugar, quando os pais ndo podem ou nao querem ficar com a crianga, outros podem adota-la ou ajudar financeiramente pessoas que estejam dispostas acuidar dela. Sob tais circunstancias, a adocao é um gesto nobre. Uma crianga precisa e merece o melhor am- biente que lhe possa ser oferecido. Isso se aplica independentemente de raga, anomalias fisicas ou genéticas, e idade. O fato de que cada crianga deve ter um lar nao significa que um determina- do lar seja apropriado para qualquer crianga. Ao considerar a adogdo, um casal deve examinar suas crengas, forgas, recursos e desejos. Nem toda situacao de adogao encaixa-se com a situagao do casal. Algumas criangas com necessidades especiais ou criangas que vém de certos contex- tos podem se dar bem somente em lares onde os pais tém determinadas habilidades. A adogdo aberta (que nao deve ser confundida com 0 cui- dado da crianga em conjunto), em que os pais bioldgicos conhecem e selecionam a familia ado- tiva, normalmente é considerada por agéncias ou assistentes sociais como a situacao ideal. Entre- tanto, ha também as adogées fechadas, em que os pais bioldgicos nao conhecem a familia que ira adotar a crianga. A adogao oferece uma oportunidade mara- vilhosa de ser pais de uma (ou mais de uma) cri- anga que precisa de amor incondicional e orien- tacao. Lembre-se de que uma familia saudavel é 76 Colegdo Bioética fruto de amor e comprometimento mutuo, quer haja ou nao uma ligacdo genética entre os pais ¢ a crianga. Observe, porém, ao contrario do que popu- larmente se acredita, que a deciséo de um casal estéril de adotar normalmente nao fara com que eles logo em seguida sejam capazes de conceber uma crianca naturalmente. Esse mito é desfeito pelo fato de que apenas 5% dos casais que ado- tam conseguem conceber naturalmente depois ~ sendo que a mesma porcentagem vale para os casais que conseguem conceber simplesmente deixando o tratamento de esterilidade sem ado- tar. Portanto, a decis&o de adotar deve ser base- ada numa compreensao completa do processo e dos possiveis problemas. 23. Quais sao as questées legnis envolvidas se eu optar pela adogdo? Nos EVA, as leis relativas a adogaéo vari- am bastante de um estado para outro. Existe um projeto altamente controverso para uma Let de Uniformidade de Adogdo, que ivia padroni- zar as leis de adogao de todos os estados. Entao, por hora, os requisitos de cada estado devem ser preenchidos para a adogio dentro daquele esta- do. Se ocorrer um erro, por menor que seja. a adogao pode ser revogada. As diretrizes a seguir sao para adogdes em que nao ha lagos de san- gue (a crianga adotada nao é biologicamente Ii- tecnologia de Reprodugdo 77 gada a nenhum dos pais adotivos) e em que a rianga é nascida nos Estados Unidos. As ado- ¢6es internacionais tém outras quest6es legais envolvidas como a emigrag4o da crianga de seu pais de origem e a imigragao para dentro dos Es- tados Unidos, mas este livro nao ira tratar das questdes desse tipo de adogiio. As adogdes po- dem ser realizadas por particulares (advogados e um médico) ou por uma agéncia (governamen- ta] ou particular). Entretanto, alguns estados pro- ibem a adogao feita por particulares. Existem dois passos diferentes que devem ser tomados em qualquer adogao. O primeiro passo 6 0 encerramento dos direitos dos pais na- turais. E nessa ocasiao em que todas as devidas questdes relacionadas ao processo (seguindo os procedimentos constitucionalmente requeridos) sao de importancia maxima. O encerramento dos direitos dos pais naturais deve ser levado extre- mamente a sério. A mae bioldgica deve dar o seu consentimento de modo consciente e nao sob coergao, Deve-se obter também o consentimen- to do pai bioldgico ou uma citagado legal adequa- da deve ser emitida. O segundo passo ¢ a criagdo de uma nova relagadv pais-crianga. Aqui, ha questoes sérias que podem surgir quando os pais adotivos tentam desfazer esse relacionamento legalmente criado. Alguns pais adotivos ja tentaram “devolver” cri- angas diagnosticadas com Sindrome de Down ou diagnosticadas como hiperativas, declarando que 78 Colegdo Bioétlica nao foram devidamente informados do histérico médico da crianga ou dos riscos envolvidos. De qualquer forma, as leis estaduais sao bas- tante claras para um casal que esteja se prepa- rando para adotar. Pode ser que vocé seja res- ponsavel pelo pagamento do advogado e que nao receba de volta pagamentos feitos por honorarios médicos, mesmo que a adogao nao se concreti- ze. E preciso que o casal seja aprovado para a fungao de pais adotivos e todos os estados exi- gem que a pessoa que esta adotando seja de uma determinada idade — normalmente vinte e um anos ou mais. Para finalizar a adogao, os direitos de pater- nidade (dos pais bioldgicos) devem ser comple- tamente encerrados. Normalmente, isso se ba- seia no consentimento dos pais biolégicos. Estes também devem assinar um formulario de “con- sentimento voluntario para adogaéo” em, no ma- ximo, trés a quatro dias apdés o nascimento da crianga (periodo especificado pela lei de cada es- tado). Alguns estados permitem aos pais biologi- cos que mudem de idéia, outros nao. O formula- rio de consentimento permite que o bebé fique com os pais adotivos até o processo de adogao ser finalizado. Se um dos pais bioldégicos nao assinar o for- mulario de consentimento, ent&o os direitos pa- ternos ou maternos (normalmente paternos) de- vem ser encerrados por uma ordem judicial, a fim de que a adogao possa prosseguir. Isso pode tecnologia de Reprodugdo 79 acontecer tanto de forma voluntaria quanto invo- luntaria e pessoalmente ou através de um docu- mento legal (o pai ou mae que estejam abrindo mao de seus direitos nao precisam comparecer diante do juiz). As regras para o encerramento involuntario da paternidade podem variar de um estado para outro. Os pais adotivos entrarao, em seguida, com uma peticao de adogao; mais uma vez, o periodo de espera varia de um estado para outro. Durante esse periodo é feita uma avaliagao em domicilio. Se toda a documentacao estiver completa e nao houver objegGes (tais como o pai bioldgico decla- rar que nunca foi notificado), uma ordem de ado- cao final e irrevogavel é emitida pela corte. Porém, mesmo uma ordem de adocao final pode ser revertida se os direitos processuais de qualquer um dos pais bioldgicos forem violados. Em casos conhecidos publicamente, tais como os do bebé Jessica e do bebé Richard, a custédia da crianga foi devolvida aos pais biolégicos ba~ seando-se numa falha em obedecer a todos os aspectos da lei aplicavel, e nao nos costumeiros “interesses pelo bem da crianga”. Nao ha um acordo entre a comunidade de adogao e a comu- nidade legal sobre qual é a definigdo dos “inte- resses pelo bem da crianga™. Se os pais que estéo abrindo mao ou ado- tando a crianga sao de estados diferentes, deve- se consultar os requisitos do Codigo Interesta- dual. Pode ser mais complicado e caro fazer 80 Colegdo Bioética isso através de um advogado particular do que com uma agéncia. Depois que a adogao é concretizada, podem surgir questées sobre Aerancau e confidenciali- dade dos registros de nascimento, Normalmen- te, uma crianga pode ser herdeira dos pais adoti- vos. Alguns estados nao permitem que a crianga herde propriedades que sao limitadas aos “her- deiros corp6reos”. Nem todos os estados permi- tem que os pais adotivos recebam heranga do fitho. Outras questées pendentes incluem se a crianga pode ou nao herdar de seus pais biologi- cos © se a crianga © os parentes adotivos (sem contar os pais) podem herdar uns dos outros. Existe um debate acalorado dentro da co- munidade de adogao quanto a quest&o de confi- dencialidade dos registros. Organizagées que pro- curam familias biologicas querem ter acesso nao s6 a informagées médicas como também a infor- magées sobre os pais biolégicos da crianga. As agéncias de acdlocdo argumentam que essa amea- ¢a de invasao da privacidade dos pais bioldgicos por parte de um filho adotivo adulto pode servir de impedimento para adogdes e encorajar o aborto. Mesmo assim, a confidencialidade dos re- gistros de nascimento é protegida em quasc to- dos os estados. Esses registros sdo lacrados no momento da adocao e sé esto disponiveis para os pais adotivos através de ordem judicial. A- guns estados incluem clausulas que dao aos pais bioldgicos total poder de veto sobre contatos so- lecnologia de Reprodugdo 81 licitados pelos seus filhos naturais, outros nao. Os estados do Alaska, Hawai, Kansas e Tennes- see 16m registros de adogdo abertos: um filho adotivo adulto pode obter sua certidao original de nascimento. Alguns estados 1ém Orgaos de re- gistros passivos ou ativos que podem facilitar o contato entre pats biologicos e seus filhos natu- rais, caso haja interesse de ambas as partes. 24. Quantos fithos devemos ter? N§o existe um nimero correto de filhos que um determinado casal deva ter. O simples fato de que 15% dos casais sao estéreis e, portanto, nao podem ter filhos sem intervengao médica, torna qualquer numero especifico inatingivel para muitos. A possibilidade de falha dos métodos con- traceptivos © a crescente taxa de gestagdes in- desejadas demonstram como é dificil controlar com preciso o nimero de fithos por casal. Além disso, algumas pessoas esiao mais bem equipa- das para as responsabilidades de uma familia grande do que outras. As presses sociais, circunstancias financei- ras e preferéncias pessoais séo fatores que in- fluenciam na decisao de quantos filhos ¢ que ta- manho de familia ter. Com freqiiéncia, os cris- tdos procuram orientacdo na Biblia. O Salmo 127.3 diz: “Heranca do Senhor sao os filhos; 0 fruto do ventre, seu galardéo.” Alguns interpre- tam essa passagem como sendo um argumento contra o planejamento Familiar, estertlizagao per- 82 Colegdo Bioglica manente ou outros métodos de evitar que a bén- cao de Deus se evidencie através dos filhos que ele da. Os textos biblicos, de fato, apdiam a idéia de que muitas vezes, mas nao sempre, os filhos sao evidéncia do prazer de Deus. Assim, casais que tém essa visdo e que sao confrontados com a esterilidade, estarao, de um modo geral, abertos para considerar quaisquer técnicas de reprodug¢ao assistida que se encaixem com seu sistema de valores (ver questéo 9) e situagao financeira. Outros podem argumentar, também sob uma perspectiva crista, que as criangas sao uma da- diva ou heranga do Senhor, mas que a dadiva é Jesus Cristo (Joao 3.16; Romanos 6.23). Assim, para estes, o servir em obediéncia tem priorida- de sobre a reprodugao biolégica. Seguindo a co- missao (Mateus 28.19-20) de “fazer discipulos”, eles desejam produzir “filhos espirituais” ao com- partilhar as boas novas com pessoas que podem renascer para uma nova vida assumindo um com- promisso com Cristo. Tais pessoas podem per- mitir a orientagao divina em suas vidas no que diz respeito ao tamanho da familia. Estes, de um modo geral, irao buscar uma forma de conceber que de fato reafirme e nado coloque em perigo a vida humana. Eles podem observar que, assim como Deus orienta alguns para se casarem e outros para ficarem solteiros (de acordo com seus diferentes ministérios e responsabilidades: | Co- rintios 7), assim também Deus pode dar diferen- tes orientacées sobre ter filhos ou nao. Tecnologia de Reprodugado 83 Muitos também levam em consideragao al- guns outros fatores como sua responsabilidade de suprir as necessidades materiais ¢ emocio- nais de seus filhos. Alguns chegam a calcular o custo aproximado de se criar uma crianga da pri- meira infancia até o fim de sua educagao acadé- mica e tomam as decisées baseados na renda e nas despesas. Outros podem argumentar visan- do a questao dos recursos do mundo e afirmam que casais preocupados e instruidos limitem o ta- manho da familia para limitar o crescimento po- pulacional do mundo. Os adeptos desse ponto de vista véem na superpopulacao a razao pela qual grandes porgdes do mundo nao conseguem ob- ter recursos vitais como comida, agua limpa e cuidados médicos. Alguns paises estipularam o tamanho maximo de uma familia e exigem pro- cedimentos abortivos para gestantes que chega- ram a esse limite. Devido a essas restrigées rigi- das, alguns casais decidem interromper a gesta- ¢ao quando o sexo do bebé nao é o desejado. Tais acontecimentos mostram os problemas que surgem quando o tamanho da familia é limitado por leis em vez de ser determinado pela respon- sabilidade e bom senso de cada casa]. 25. Quais formas de contracepcdao sdo eficazes na prevencdo da gravidez? Atualmente, ha muitos métodos contracep- tivos disponiveis. Eles variam em eficacia e em 84 Colegdo Bioéticau funcionamento. Para aqueles que créem que qualquer interferéncia na béncdo da concepgao é uma violagdéo da vontade de Deus, nenhum método contraceptivo (nem mesmo o da tabela) pode ser usado. Muitos casais cristéos, entre- tanto, afirmam com plausibilidade que Deus vai orienta-los no exercicio do planejamento de fi- Ihos (ver questo anterior). Meétodos de tabela. Alguns consideram o uso de qualquer tecnologia quimica ou mecanica com uma forma de contracepcao que nao é na- tural e, portanto, contra a vontade de Deus. Para eles, o Unico método aceitavel de se evitar a con- cepcao é o método da tabela, que é baseado na abstengao de relagdes sexuais durante o periodo de cada més em que ha mator probabilidade dea esposa engravidar. Eles identificam esse periodo medindo as flutuagdes da temperatura do corpo da mulher e/ou o muco cervical. Quiao eficaz é esse método? A eficacia dos métodos contraceptivos € determinada por uma observagao de cem mulheres durante um ano de uso. Ou seja, se uma centena de mulheres usas- sem uma determinada técnica durante um ano, quantas engravidariam? Para fins de compara- cao, 80% dos casais que nado usassem nenhum método contraceptive iriam conccber em um ano, Com o uso do método da tabela, com abstengdes periddicas, usando a medicao da temperatura ¢ observagao do muco cervical, de 10 a 15% con- ceberiam em um ano. Tecnologia de Reprodugdo 85 Métodos de barreira, Uma segunda forma de contracepgao envolve o uso de técnicas que procuram evitar que o esperma chegue até o ovulo, através de meios mecanicos e/ou quimi- cos. Essas técnicas incluem camisinhas, diafrag- mas com espermicida e a camisinha feminina. Elas sao tao eficazes na prevencao da gravidez quanto os métodos de tabela. A pilula. Para um contraceptivo mais efi- caz, alguns casais usam pilulas anticoncepcionais. Os contraceptivos orais sao criados basicamen- te para prevenir a ovulagdo ou a liberagio do évulo. A maioria das pilulas é uma combinagaéo de um derivado do estrégeno e outro da proges- terona que regulam o ciclo menstrual da mulher artificialmente — normalmente sem permitir que o ovulo amadurega e seja liberado. A pilula é bas- tante eficaz na prevengao da gravidez, com apro- ximadamente uma gravidez para cada cem mu- lheres por ano, Para que a pilula tenha esse grau de eficacia na prevencgao da ovulagao é neces- sario 0 uso correto (administragao diaria, aproxi- madamente no mesmo horario todos os dias). A confiabilidade da pilula também é influen- ciada por alteracgdes na absorcao de horménios e pode ocorrer quando a mulher adoece e/ou toma remédios. Além de prevenir a ovulagao, a pilula torna mais espesso 0 muco cervical, fazendo com que seja mais dificil a penetragao de esperma. A pilula também altera o movimento ciliar (de es- ruturas semelhantes a pélos) dentro das trom- 86 Colegdo Bioética pas, alterando o transporte do é6vulo. Um ultimo efeito da pilula é que ela deixa mais fino 0 reves- timento do utero, o que o torna menos favoravel para a nidacao caso a fertilizagdo venha a ocor- rer, causando assim a morte do embriéo. Esse efeito é mais comum em pilulas que contém ape- nas progesterona, ao invés de uma combinagao de progesterona e estrogeno. Nas pilulas s6 com progesterona também é maior a probabilidade de que ocorra a ovulagao, aumentando a possibili- dade de que um dvulo fertilizado chegue até o utero e tente se implantar ali. Norplant. Um outro método de contracep- cdo que usa baixas taxas de progesterona libera- das continuamente é o sistema Norplant. Peque- nos implantes com o formato de uma agulha sao colocados logo abaixo da pele. Estas agulhas libe- ram determinadas doses de progesterona para pre- venir a ovulagdo. Essa técnica também é bastante eficaz do ponto de vista contraceptivo, mas alguns efeitos colaterais — como sangramentos imprevisi- veis — podem causar a insatisfagdo das pacientes. Esterilizagdo. A esterilizagaéo ¢ 0 procedi- mento que torna o corpo incapaz de gerar uma crianga através da relagdo sexual. Existem varios procedimentos disponiveis que alcangam esse objetivo. Alguns deles sao reversiveis, outros pra- ticamente nao; entretanto, com a existéncia de tantas formas de reprodugao assistida nos dias de hoje, sempre existe uma gama de op¢des para se conseguir a gravidez. Tecnologia de Reprodugdo 87 Na mulher, o procedimento mais comum é a esterilizagao tubaria. Ela consiste em amarrar, cauterizar ou algum outro meio de interromper as trompas, evitando que o esperma chegue até o évulo. Os ovarios continuam a produzir horm6- nios de forma ciclica e os 6vulos ainda sao libe- rados. Eles so no sao expostos ao esperma, ex- ceto em casos raros de falha no procedimento. Além disso, a remocio dos ovarios (oforectomia bilateral) ou do itero (histerectomia) também tor- na a concep¢aio muito pouco provavel através dos meios normais. Porém, os custos € riscos ci- rurgicos fazem destes procedimentos formas menos apropriadas ce esterilizagao. No homem, a esterilizacéo normalmente impli- caa interrupgao do tubo deferente, o tubo que trans- porta o esperma da area de armazenagem do testi- culo (as vesiculas seminais, logo abaixo da prosta- ta). Geralmente 0 cirurgiao remove uma porgao do tubo ¢ amarra cada uma das pontas resultantes. Esse procedimento é chamado vasectomia. Os procedimentos de esterilizagdo trazem al- guns riscos. Enquanto para a vasectomia a anes- tesia local é suficiente, as outras formas de este- rilizagaéo necessitam de anestesia geral, que traz riscos maiores, mas ainda assim, pequenos. Al- gumas mulheres afirmam ter ciclos irregulares e menstruagdo mais dolorosa apos a cirurgia tuba- ria. Pode ainda haver uma ligacdo entre a vasec- tomia e alguns problemas imunoldgicos. Essas 88 Colegdo Bivética possibilidades devem ser investigadas com a orientacao de um especialista qualificado, 26. Existem outras formus de contracepgao? Na questao 8, discutimos o embriao. La, es- tabelecemos a diferenca entre fertilizagao (quan- do surge uma nova pessoa) e nidagao (quando esta pessoa em forma embrionaria implanta-se no tite- ro para ser sustentada). Também observamos que a palavra concepgdo geralmente refere-se ao momento da fertilizagao. Entretanto, algumas pes- soas usam 0 termo corcepgdo de forma dileren- te. para se referir ao momento em que o embriao (a nova vida) liga-se fisicamente a mae através da implantagado. De acordo com essa definigao di- ferente, qualquer coisa que bloqueie a nidagdo (evi- te que o embriao implante-se na parede do titero) pode ser considerada uma forma de contracepgao. Nés rejeitamos o uso desse termo, pois ele implica que a vida humana nao comega até que haja a implantagao. Aqueles que reconhecem que um nove ser surge na fertilizagao consideram as formas contraceptivas que impedem a implanta- cao como sendo uma forma de aborto ¢ nao de contracepcao. Tais contraceptivos evitam que a pessoa ja concebida e em forma embrionaria con- siga se implantar — resultando na morte do embriao. DIU. Os métodos que usam DIU (Disposi- tivo Intra-Uterino) sdo um pouco mais eficazes que os métodos de tabela. Os DIUs sao pedagos Tecnologia de Reprodugdo 89 de plastico, de diferentes formatos, que sao inse- ridos na cavidade uterina onde ficam durante um determinado periodo de tempo. Alguns contém horménio (progesterona) enquanto outros contém cobre, um elemento que, estatisticamente, eleva acticacia do dispositive. Existe atualmente um debate acalorado so- bre como ¢ exatamente o funcionamento do DIU. Através da historia, acreditou-se que o DIU agia permitindo a fertilizagdo, mas evitando que o embriao se implantasse no titero. Daf vem a teo- ria de que o DIU gera um ambiente uterino hostil para o embrido. Pesquisas recentes e ainda em andamento tém levantado a possibilidade de que o DIU também pode evitar a fertilizagado ao alte- rar 0 desempenho do esperma dentro do ttero. Essas pesquisas ainda nao sao convincentes e exigem estudos com grupos de teste maiores. Estudos laparoscépicos em pequenos grupos nao encontraram esperma viavel nas trompas das mulheres com os DIUs corretamente posiciona- dos. Isso pode sugerir que um DIU afeta direta- mente o esperma, além de criar um ambiente in- tra-uterino hostil. Ainda nao esta claro com que fregiiéncia o DIU evita a concepgao e com que treqiiéncia ele aborta o embriao. Alguns médi- cos continuam colocando DIUs em mulheres de- pois que elas tém uma relacdo sexual como for- ma de prevengao da gravidez, através do “efeito dia seguinte”, o que reflete sua confianga no efeito abortivo do dispositivo, 90 Colegdo Bioética Independente de seu funcionamento, o DIU é bastante eficaz na prevengao da gravidez com falhas em torno de duas a quatro mulheres para cada cem em um ano de uso. A mulher que esteja usando o DIU deve considerar 0 pequeno risco de infec¢4o intra-uterina que pode levar a esterilida- de, perfuracgao do utero ou 0 corpo expelir o dis- positivo sem que a mulher tenha conhecimento. A pilula do dia seguinte. Uma vez que ocor- reu a relagdo sexual, é tarde demais para impe- dir que o esperma chegue até o ovulo. Se ocor- rey a fertilizagdo, a tinica forma de impedir o pros- seguimento da gravidez é evitando que ocorra a nidagao. Para isso a mulher pode tomar pilulas que contém doses altas de horménio dentro de um periodo de quarenta e oito horas depois da relagdo sexual. Esse tratamento altera o ambi- ente intra-uterino de forma que, se ocorreu a fer- tilizagdo, a nidacdo torna-se pouco provavel. Blo- quear a implantagdo € uma forma de abortar o embriao quando medidas contraceptivas adequa- das nao foram tomadas, como por exemplo, no caso de estupros, incestos e sexo casual. RU-486 ¢ drogas semelhantes. Drogas abortivas como 0 RU-486 e seus derivados sao usadas por algumas mulheres como forma de controle de natalidade (nao anticoncepcional). Essas drogas permitem se livrar do embriao ou feto antes do nascimento, mas depois da con- cepgdo ¢ nidagao. Essas drogas funcionam blo- queando a produgio de progesterona no ovario, Tecnologia de Reprodugdo 91 sendo que esse hormGnio é essencial para a so- brevivéncia do embriao dentro do utero durante as primeiras semanas de gestagao. Se esse hor- ménio for bloqueado, ocorre um aborto esponta- neo. O RU-486 e seus derivados podem até mes- mo interromper uma gestacdo de varios meses. Essa técnica pode ser praticada em casa, sem intervengao cirtirgica. Porém, ha o risco de falha ou de um aborto incompleto. Essa técnica é legal na Europa e, quando da elaboracdo deste texto, estava prestes a tornar-se legal nos Estados Uni- dos. E dificil limitar essas drogas, pois, tipicamen- te, elas tém outros usos que nao o aborto. 27, E certo usar qualquer forma de controle de natalidade? A primeira decisdéo a ser tomada é ter ou nao relagdes sexuais (ver questao 7) e interferir ou néo no tempo e numero de criangas que po- dem resultar (ver questéo 24). Para aqueles que consideram moral ser sexualmente ativo e usar alguma forma de controle de natalidade, ha trés intervengdes a se considerar. Primeiro, sao as verdadeiras formas de contracepgao — aquelas que, de fato, evitam a concepcao. Métodos que evitam a concepgao incluem a tabela, métodos de barreira, a pilula, Norplant e esterilizag4o, Fora a excecéo mencionada a seguir, esses métodos respeitam a vida ao agirem antes que um novo ser humano venha a se formar. Ainda 92 Colegdo Bioélica assim, para determinar se € correto usar um desses métodos, é preciso levar em consideracdo fatores como o custo financeiro, conforto e outras ques- tOes pragmaticas levantadas na pergunta 25. Ha mais duas quest6es relativas ao método de tabela que devem ser mencionadas. Em pri- meiro lugar, existe uma distingao valida entre as praticas contraceptivas que alguns créem impe- dir os propdsitos reprodutivos de Deus e o méto- do de tabela? O uso da tabela nao seria também uma forma de alterar as conseqiiéncias naturais da relagdo sexual no casamento? Em segundo lugar, o método da tabela requer a abstinéncia das relagdes sexuais por um periodo nao tao cur- to de tempo. Os casais talvez desejem conside- rar a admoestacdo de | Corintios 7.5 quanto a sensatez de tal abstinéncia. Os métodos de barreira nado trazem preocu- pac6es diferentes, desde que nao haja a ilusao de que esses métodos ofereceriio protegiio ab- soluta contra doencas sexualmente transmissiveis ou gravidez. O uso da pilula, entretanto, requer mais alguns comentarios. Como foi explicado na questdo 25, ha mais de um tipo de pilula. As pilu- las que so contém progesterona tém maior pro- babilidade de permitir que ocorra a ovulacdo eo posterior aborto do embrido ao impedir a nida- ¢ao. Aqueles que consideram o aborto como uma pratica moralmente inaceitavel (ver questao 8) devem evitar esse tipo de pilula. E discutivel se as pilulas com varios horménios tém um risco sig- Tecnologia de Reprodugdo 93 nificativo de causar aborto impedindo a nidagao, é preciso que sejam feitas mais pesquisas para responder a essa importante pergunta. Entretan- to, sabe-se com mais certeza que a mulher pode aummentar a capacidade dessas pilulas de impedir a ovulagdo, tomando-as todos os dias no mesmo hordrio e evitando relagdes sexuais durante peri- odos de doenga, especialmente quando esta to- mando outros medicamentos. Ela também pode resistir 4 tentagdo de minimizar a dose de estr6- geno. A reducdo do estrégeno pode parecer uma opg¢ao atraente, pois minimiza os efeitos colate- rais desagradaveis; entretanto, essa reducgdo au- menta os perigos descritos acima para as pilulas de progesterona. Consulte seu médico. A ultima forma verdadeira de contracepgao, a esterilizagdo, também levanta algumas ques- toes. F certo sacrificar a capacidade de se re- produzir e, se sim, sob quais condigées? Alguns poderiam argumentar que qualquer intervengao que venha a obstruir o favor divino (provisao de mais filhos) é tmoral. Essas pessoas questionam como alguém poderia tentar evitar a demonstra- cao do amor de Deus ao impedir o plano divino de oferecer “heranga sagrada”. Outros poderiam argumentar que a ordem di- vina de ser frutifero e multiplicar-se, povoando a terra (Génesis 2) ja foi obedecida. De qualquer maneira, eles acrescentariam, essa ordem nao de- termina exatamente quantos filhos cada casal deve ter. Essas pessoas créem que Deus deu as suas 94 Colegdo Bivetica criaturas a percepc4o e os principios divinos da sensatez para permitir que cada um avalie suas necessidades, recursos ¢ objetivos e, assim, con- sidere a possibilidade de esterilizagao quando 0 “nt- mero certo” de criangas ja tiver nascido. Aqueles que est&o abertos a esterilizacao também podem argumentar que Deus nao julga homens e mulheres pelo tamanho numérico de suas familias, mas sim pela forma como eles cuidaram dessas familias. De qualquer forma, é preciso ter em mente duas precaugées. Em primeiro lugar, a esteriliza- cao é uma questo pessoal. Sob nenhuma cir- cunstancia ela pode ser imposta legalmente con- tra a vontade da pessoa. No caso de pessoas mentalmente incompetentes cujos desejos nao sao conhecidos, qualquer um que esteja agindo como representante delas deve fazé-lo tendo em vista o bem-estar dessas pessoas. Em segundo lugar, tendo em vista o baixo grau de irreversibilidade desses procedimentos, eles podem tornar-se mo- ralmente problematicos, pois, caso as circunstan- cias mudem, a pessoa estara impossibilitada de exercitar a atividade recebida de Deus de ter criangas (caso ocorra, por exemplo, a morte tra- gica de um filho ou cénjuge). As tecnologias de reprodugao humana po- dem ser dadivas maravilhosas — ajudando a su- perar a esterilidade e a moldar o planejamento familiar — desde que nao destruam qualquer for- ma de vida durante 0 processo. Conclusao QO: avancos nas tecnologias de reprodugao cri- am oportunidades inéditas que geram novas quest6es éticas. Fazer as escolhas corretas re- quer uma compreensao clara e precisa de cada novo procedimento médico. Os principios teolé- gicos oferecem o apoio fundamental e a orienta- cdo necessarios para guiar nossa maneira de pen- sar. Quer as pessoas acreditem ou nao, nds so- mos criados a imagem de Deus. A maneira como tratamos a nds mesmos e aos embrides que produzimos € importante para o Criador e deve refletir sua preocupagéo e seu cui- dado com a vida humana. Ele nos tem dado a cu- riosidade e © intelecto para buscar novas tecnolo- gias que melhorem a saude e 0 bem-estar do ho- mem, mas devemos cuidar para usar essas ferra- mentas de forma n&o-egoista, dentro dos limites do amor. Devemos viver com um senso auténtico de responsabilidade para com Deus, nds mesmos € as criangas com as quais somos abengoados. we a Notas Para os textos biblicos. veya) Genesis 16.17 © 21 (Sara) furzes 13 (mae de Sansao). | Samuel |e 2 (Ana): e Lucas I (Isabel) . Para mais informagées sobre sexualidade ¢ casamento, veja CURTER, William: GLAIIN, Sandra. /ntimidade Sexual no Casamento, Fditora Cultura Crista . Veja Deuteronédmio 25.5-10 para informagoes a respeito da Lei Mosaica sobre 0 casamento de levirato. Talvez o casamento deste tipo mais bem conhecido na Biblia seja o de Rute ¢ Boaz, que esta na ascendéncta de Jesus cm Ma- teus | No jornal Chicago Tribune, (09/1997, 20/09/1997 © de BECK. Joan. Careless Intentions: Have We Fully Thought Out All of the Consequences of Reproductive Medivine? 02/1998. segdo de Comentarios. Veja LIFTIN, Jay . The Nazi Doctors: Medical Killing and the Psychology of Genocide. Nova York. Basic Books, L986 Para maiores informagdes a respeito de questdes sobre casais ¢ infertilidade, veja CURTER. William, GLAHN, Sandra. When Empty drms Become ao Heavy Burden fashville; Broadman and Holman, 1997 JOHNSON, Pat. Adopting tfler Infertility Indianapolis Perspective Press. 1992 As perguntas relativas a sexualidade, reprodu- ¢ao e infertilidade sao algumas das mais pes- soais e dificeis para um casal enfrentar. E um enorme elenco de novas tecnologias desafia nossas mais arraigadas tradigSes sobre concep- cdo e paternidade: 1. E certo usar 0 esperma de um doador? 2. E quanto a mae de aluguel? 3. Quais sdo os aspectos legais da tecnologia reprodutiva? 4. Posso usar alguma forma de controle de natalidade? 5. E quanto 4 clonagem humana? EDITORA CULTURA CAIS' i fc i

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