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Manuel Castells A SOCIEDADE EM REDE Volume I 2 Edigdo Tradugdo: Roneide Venancio Majer com a colaboragio de Klauss Brandini Gerhardt PAZ E TERRA ©Manuel Castells “iaduzido do originals The rise of the network society Para Emma Kiselyova-Castells, ‘cujo amor, trabalho e apoio foram decisivos para a existéncia deste livr. CP-Brasl, Catslogagio-Na-Fonte (Gindicato Nacional dos Edtores de Livros, R), Brasil) (Castells, Manuel, 1942- [A sociedade em rede/Manuel Castells radugio: Roaeide Vendncio Majer — (Aces dainformagio: economia, sociedade e culcuts; 1) ‘Sto Paulo: Paz e Tera, 1999. ISBN 85-219.0329-4 Incui bibliografi casts 1. Tecnologia dainformasio ~ Axpectossocias. 2. Teenologia da infor magio = Aspects conémicos. 3. Sociedade da informagio. 4, Redes de informagio. 5. Tecnologia civilzagio 1 Teale 1, Série 99.0358 cpD-303.483 epu316.422.46 EDITORA PAZ E TERRA S.A. Rua do Triunfo, 177 (01212-010 — Sto Paulo-SP Tels (011) 223-6522 Fax: (011) 223-6290, Sumario Ilustragdes Tabelas Agradecimentos. Prologo: A Rede ¢ o Ser. : ‘Tecnologia, sociedade etransformagio histérica Informacionalismo, industialismo,eapitalismo,estatismo: modes de desenvolvimento e modos de produto. 0 informacionalismo ea peresiroya capitalists, (0 Serna sociedade informacion. Algumas palavras sobre 0 método. . Noted seu me 8 95 : 1. A Revolugio da Tecnologia da lnformasio Que revolugio? LigGes da Revolugio Industrial : ‘A seqiénciahistécca da Revolug da Teenologa da Informagio - “Macromudangas da microengenharia:eletrénica ¢ informagio O divisor teenolégico dos anos 70 Tecnologias da vida. O context social ea dnimica da tansformasio tenolésicn Modelos, atores ¢ locais da Revolugio da Tecnologia da Informagio (© paradigma da tecnologia da informagio Notas 7 2. A economia informacional ¢ o processo de globalizacaio. Introdugio . 12 4 7 au 24 31 36 38 41 a 49 49 33 ST 58 64 65 68 a) 1 81 87 87 5 sumo Produtividade, competitividade ea economia informacional........... 88 O enigma da produtvidede.... 88 {A prodatvidae baseada em conhecimentos 6 especiica da ecenomia informacional? 90 Informacionalismo ¢capaliso, produividadee hcratvidade..... 100 Arepolitzaglo 6ocapitalismo informacional .. 107 ‘A especificidae histrica do informacionalismo 109 A economia plobal: g6nese, estruturaedindmica.......++++ I limites da globaizagao. : us {A diferenciagdo regional da economia global. i 7 ‘A segmentagio da economia global 120 [As fonts de competviade na economia seb. 11 ‘A mais nova divisio intemacional do trabalho : 123 ‘Muang dos modelos da dvisto interacioal do taba na economia informacional/global: 0 poder datriade, a ascensto da repido do Pacifica © fim do Teresiro Mundo « 124 Fontes de crescimento ¢estagnacio na divisto internacional do trabalho: a mudanga do destino éa América Latina a BI {A dinimica de exclusio da nova economia global: 6 destino da Africa? 148 ‘Atma fronteira da economia global: a incorporagdo segmentada da Rissiae das ex-repiblicas soviticas 151 A arquitetura e a geometria da economia informacional/global. 159 ‘Apéndice: Alguns comentitios metodolbgicos sobre as politicas de ajuste da Africa e sua avaliagio .. fase : 161 Notas eda 164 3. A empresa em rede: a cultura, as instituigbes e as organizagdes da ‘economia informacional. .... ius sda 173 Introdugaio 13 “Trajetriasergaizacionais na reestruturag do captalismo ema transigdo do industialismo para o informacionalismo ........ 174 ‘Da produgio em massa A produslo flexivel 195 ‘A empresa de pequeno port ea erise da empresa de grande pore: mito ¢realidade 176 “oyotismo”: cooperagio gerentes-trabalhadores, mlo-de-obra ‘multfuncional, controle de qualidade total e redugdo de incertezas ... 178 Semiro Formagio de redes entre empresas 181 Aliangas corporatvasestratégieas. ....... aes 18 ‘A empresa horizontal eas redesglobais de empresas 184 A crise do modelo de empresas vericais © o desenvolvimento das redes de empresas . 187 ‘A tecnologia da informaglo e a empresa em rede dagen 188 Cultura, nstinigbes e organizagto econdmica:redes de empresas do Leste asiftico veveeseees 192 Tipologia das redes de empresas do Leste asitico, 193 Cultura, organizagbese institigBes:redes de empresas asitices 0 Estado desenvolvimentista ....... 199 “Empresas multinacionsi, empresas transnacionsis e redes internacionais .. 208 0 esprto do informacionalismo i ich sierra OU Notas. § ae seston = 218 48 transformagt de do trabalho ¢ do mercado de trabalho: trabalhadores ativos na rede, desempregados ¢ trabalhadores com Jommada flexivel. ........ REE Eo 2B A evolugio histérica da estrutura ocupacional e do emprego nos paises capitalistas avangados: 0 G-7, 1920-2005......... 224 ( pés-industrialismo, s economia de servigas ea sociedade informacional. ... 225 ‘A tranformagio da estutura do emprego, 1920-70 e 1970-90 230 ‘A nova estrutura ecupacional 7 = 238 (© amadurecimento da sociedade informacional: projesaes de emprego para o séeulo XI 243 Resumo: sevolugfo da estrtura do empregoe sus conseqiéncias para uma andlise comparative da sociedade informacional . 249 Hauma forga de trabalho global? ......... ater aoe 0 processo de trabalho no paradigma informacional 262 0s eftitos da tecnologia da informagto sobre o mercado de trabalho: rumo uma sociedade sem empregos? ...... ce oars trabalho e a divisto informacional: trabalhadores de jomada flexivel .. 285 A tecnologia da informagao e a reestruturagiio das relagSes capital-trabalho: ddualismo social ou sociedades fragmentadas? a =. 293 Notas Apéndice A: Tabelas de dados estatisticos referentes ao capitulo 4 Apéndice B: Observagdes metodolégicas e dados estat Notas... 5. A cultura da virtualidade real: :ainegragdo da comunicagio eletrénica, ‘fim da audiéncia de massa e o surgimento de redes inteativas Introdugdo 299 305 335, 352 353 353 a galéxia de Gutenberg dgaléxa de MeLuhan:o surgimento da cltua da midia de massa. A nova midia ea diversificago de auditncia de massa ‘Comunicagao mediads por computadores, controle institucional, redes sociais ¢ comunidades virtuais. : ‘Aistria do Mintel: ate amowr Acconstelagdo da Intemet ... A sociedade interativa ss A grande fasfo: a mulmidia como ambiente simbslico ‘A cultura da virtualidade real . Notas . 6.0 espago de faxes. Introdugio Servigosavangados, faces da informagio e a cade global ‘O novo espaco industrial... (© cotiiano do domiitio eetnico:o fim das cidades? ‘A transformapdo da forma urbana: a cidade informacional Avitima frontcira suburban dos Estados Unidos . O charme evanescente das cidades européias, Urbanizagio do terceiro milénio: megacidades ...... ‘A teoria social de espago ¢ a teoria do espago de fluxos A arquitetura do fim da histéria....... Espaco de fluxos © espaco de lugares Notas .. 7.0 limiar do etemo: tempo intemporal . Introdugio 355 362 366 367 369 1382 387 394 398, = 403 403 405 412 419 23 424 425 + 428 - 435 442 447 452 457 457 Sumtso ‘Tempo, histiria e sociedade. ...... Tempo como fone de valor: o casino global. A flexibilidade da jomada de trabalho e a empresa em rede O encolhimento ¢ a alteragio do tempo de servigo. .. A indeterminagao dos limites do ciclo de vida: tendéneia para a arritmia social? Nogacio da morte Guerra instantineas Tempo viral Tempo, expagoe sociedad: 0 linia do eterno. Notas eae Conclusfo: A sociedade em rede Nota... Bibliografia ... indice remissivo +457 461 464 466 an an 481 486 = 488 - 492 497 506 . $07 sm Manuel Castells A SOCIEDADE EM REDE Volume I 2 Edigo Tradugdo: Roneide Venancio Majer coma colaboragao de Klauss Brandini Gerhardt | Meters Arivanclld [ [Protesss zz | [ane GA 10L Date: 7 | PAZ E TERRA O espago de fluxos Introdugdo O espago e o tempo sio as principais dimensoes materiais da vida humana. Fisicos jé desvendaram a complexidade existenteatris da falaciosa simplicidade inuitiva desses conecitos. Criangas em ide escolar sabem que 0 espago © 0 tempo relacionam-se entre si. E a teoria de supercordas, altima moda em fisica, ‘antecipa a hip6tese de um hiperespago que articula dez dimensdes, inclusive 0 tempo.' £ claro que nao hé lugar para uma discussio desse tipo nesta andlise, rigorosamente voltada para o significado social do espago e do tempo. Mas mina referéneia a tal eomplexidade vai além do pedantismo retérico. Convidae nos a refletir sobre as formas sociais de tempo e espago que no se limitam és percepgdes obtidas até agora com base nas estruturas sociotécnicas, suplantadas pela experiencia histérica atual Ja que 0 espaco ¢ 0 tempo estio interligados na natureza © na sociedade, também o estario em minha andlise, embors, para maior elareza, enfoque se= icncialmente primero o espago, neste capitulo, e depois o tempo, no préximo. A ordem da seqiiéncia nio é aleatéria: a0 contririo da maioria das teorias s0- ciais clissicas, que supSem o dominio do espago pelo tempo, proponho a hi- potese de que © espaco organiza o tempo na sociedade em rede. Espero que essa afirmagao faga mais sentido no final da jornads intelectual apresentada 20 leitor nestes dois capitulos. “Tanto 0 espago quanto o tempo estio sendo transformados sob o eftito combinado do paradigma da tecnologia da informacio ¢ das formas e processos sociais induzidos pelo processo atual de transformacao histérica, apresentado neste livro. Contudo, o perfil real dessa transformagio ¢ profundamente diverso das prudentes extrapolagdes do determinismo tecnolégico. Por exemplo, parece bvio que as telecomunicagBes avangadas tomariam a localizagdo de escritorios Ubiqua, assim permitindo que empresas transferissem suas sedes de bairros co- zmetciais centrais caros, congestionados ¢ desagradaveis para instalagdes perso 8 Ocspaco de Mares ralizadas, em bonitos lugares ao redor do mundo. Porém, a anélise empirica de Mitchell Moss sobre 6 impacto das telecomunicagdes nas empresas de Manhattan rros anos 80 descobriu que essas novas facilidades de telecomunicagBes avan- ‘adas estavam entre os fatores responsiveis pela lentidio da relocacio de em- presas para longe de Nova York, por razBes que exporei posteriormente. Ou, utilizando outro exemplo sobre um dominio social diferente, supunha-se que & comunicagio eletrnica domicitiae induztia 0 declinio de formas urbanas densas ¢ iminuiria a interagio social localizada espacialmente. No entanto, © primeira sistema de comunicagio mediada por computadores difundido para a massa, 0 Minitel francés descrito no capitulo anterior, originou-se na década de 80 em ‘um ambiente urbano intenso, cuja vitalidade ¢ interacio por contato pessoal nio foram abaladss pelo novo meio de comunicaglo. Na verdade, os estudantes fran- ceses usavam 0 Minitel para organizar manifestagdes de rua contra 0 govern. No inicio da década de 90, a telecomutagdo, ou sea, o trabalho on-line em casa, cera praticada por uma fragio muito pequena da forga de trabalho dos EUA (en- tre 1% 2% em um dia determinado), Europa ou Japio, se nio contarmos a velha e costumeira pritica de profssionais liberaistrabalharem em casa ou o- ganizarem suas atividades em tempo e espaco flexiveis, quando contam com tempo disponivel para isso Embora trabalhar meio-expediente em casa parega estar se tomando um futuro modo de atividade profissional, essa modelidade desenvolve-se a partir do surgimento da empresa integrada em rede e do proces- 0 de trabalho flexivel, conforme analise em capitulos anteriores, ¢ no como cconseqiiéncia direta da tecnologia disponivel. As conseqiiéncias tebricas e priti- ‘cas dessa definigdo precisa sio cruciais. E esta complexidade de interagdo entre a tecnologia, a sociedade e o espaco que abordarei nas péginas seguintes. Para prosseguir nessa deci, examinarei o material empirico sobre a trans- formagio dos padrdes de localizacao das principaisatvidades econdmicas s06 © rove sistema tecnoldgico, tanto em relagio servigos avangados como & in- istria, Depois, tentareiavaliar as poucas informacées sobre a interagdo entre 0 surgimento da casa eletrdnica e a evoluglo da cidade, bem como me estenderci 2 respeito da recente evolugdo das formas urbanas em varios contextos. Entio, resumirei as tendéncias observadas sob uma nova légica espacial que chamo de espago de flucos. Em oposigio a essa légica, apresentarei a organizaco espacial historicamente enraizada de nossa experiéneia comum: 0 espaco de lugares. E rmencionarei o reflexo dessa oposigao dialética entre © espaco de fluxos ¢ 0 espaco de lugares nos debates atuais sobre arquitetura ¢ projeto urbane. O ob- jetivo desse itinerrio intelectual ¢ desenhar o perfil deste novo processo es- pacial, 0 espago de fluxos, que se esté tornando a manifestaglo espacial pre- dominante de poder ¢ fungdo em nossas sociedades. Apesar de todos os meus esforgos para ancorar a nova légica espacial no registro empirico, receio que O espago de Nunes 405 seja inevitavel, no final do capitulo, apresentar 20 leitor alguns fundamentos de uma teoria social de espago, como forma de abordar a atual transformacao da base material de nossa experincia. Mas minha capacidade de comunicar uma teorizagio um tanto abstrata das novas formas e processos espaciais certamente serd melhorada com um breve levantamento dos dados disponiveis sobre a re- cente padronizagdo espacial das fungGes econdmicas e das priticas sociais pre- dominantes? Servigos avancados, fluxos da informacio ea cidade global ‘X economia glotallinformacional &organizada em torno de centos de con- trole e comando capazes de coordenar, inovar © gerenciar as aividades interli- zadas das redes de empresas.‘ Servigos avancados, inclusive finangas, sepuros, bens imobildrios, consultorias, servigos de assessor jurdica, propaganda, pro- §etos, marketing, relagdes piblicas, segurenca, coleta de informacdes e gerenci bbem como PAD e inovaco cientitia, es no ceme de todos 0s processos econdmicos, seja na indistria, agriultura, ener sia, seja em servigos de diferentes tipos.? Todos podem ser reduzidos & gerapio de conhecimento e a uxos da informacao.* Portanto, os sistemas avangados de telecomunicagdes poderiam possibiltar sua localizagio dispersa pelo globo. Mais de uma década de estudos sobre o assunto, no entanto,estabeleceu um modefo espacial diferente, caracterizado pela dispersio e concentragdo simultineas de servigos avangados.’ De um lado, 0s servigos avangados aumentaram substan- cialmente sua participagdo nos indices de empregos no PNB da maioria dos paises, ¢ apresentam 0 maior crescimento de empregos e as taxas mais altas de investimento nas principais éreas metropolitanas do mundo. Sao abrangentes © esto localizados em toda a generafia da planeta, com excerlo dos “uracos negros” de marginalidade. De outro, tem havido uma concentraglo espacial da camada superior dessasatvidades em alguns centros nodais de alguns paises.” Tal concentragio segue uma hierarquia entre as camadas dos centros ucbanos ‘com as fungSes de nivel mais alto, tanto em termos de poder quanto de qualifi cagio, e esta localizada em algumas importantes éreas metropolitanas.© O es- tudo clissico de Saskia Sassen sobre a cidade global mostrou 0 dominio con- junto de Nova York, Tquio e Londres nas finangas intemacionais € na maior parte dos sevigos de consultria © empresariais de ambitointemacional." Jun- tos, esses trés centros cobrem o espectro de fusoshoririos no que diz respeito a transagées financeiras e funcionam em grande parte como uma unidade no mes- mo sistema de transagdes continuas. Mas outros centros sio importantes ¢ até superiores em alguns segmentas especficos do comércio, por exemplo, Chicago 406 © expago de unos € Cingapura em contratos de futuros (aliés, praticados pela primeira vez em Chicago, em 1972). Hong Kong, Osaka, Frankfurt, Zurique, Paris, Los Angeles, Sio Francisco, Amsterdi ¢ Mildo também so centros importantes tanto em servigos financeiros quanto em servigos empresariais intemacionais."? E varios “centtosreyionais” esto rapidamente aderindo & rede, enquanto “mercados emer- gentes” se desenvolvem por todo 0 mundo: Madri, Sio Paulo, Buenos Aires, México, Taipei, Moscou, Budapest entre outros, ‘A medida que a economia global se expande e incorpora novos mercados, também organiza a produgdo dos servigos avangados necessérios para 0 geren- ciamento das novas unidades que aderem 2o sistema © das condigdes de suas conexdes em mudanga continua.!® Um bom exemplo para ilustrar esse processo & Madri,relativamente atrasada em relago a economia global até 1986, Na- quele ano, a Espanha aderiu & Comunidade Européia, abrindo-se totalmente a0 investimento de capital estrangeiro nos mercados das bolsas de valores, em ope- ragBes bancirias e na aquisigao de patriménio das empresas, bem como em bens iméveis. Como ficou demonstrado em nosso estudo," no periodo de 1986-90, 0 investimento estrangeiro direto na bolsa de valores de Madr forvaleceu uma fase de répido crescimento regional ao lado de um boom no setor imobilidrio ¢ ré- pida expansiio dos niveis de emprego em servicos emapresariis. A aquisi¢go de agdes por investidores estrangeiros em Madri entre 1982 © 1988 saltou de 4 bilhdes © 494 milhdes para 623 bilhdes @ 445 milhoes de pesetas, Q investi ‘mento estrangeiro direto em Madri subiu de 8 bithdes de pesetas em 1985 para quase 400 bilhdes de pesetas em 1988, Assim, a construc de escritérios no centro de Madri e de iméveis residenciais de alto nivel, no final dos anos 80, experimentou o mesmo entusiasmo frenético ocorrido em Nova York e Londres, A cidade foi transformada de forma profunda pela saturagio do valioso espaso na metrapole e também por um processo macigo de suburbanizacio que, ate centio, fora um fenémeno de certa form limitado em Madr. 'Na mesma linha argumentativa, 0 estudo realizado por Cappelin sobre a formagio de redes de servigos nas cidades européias mostra a crescente interde- pendéncia e complementaridade entre os centros urbanos de tamanho médio da Unido Européia."* Cappelin concluiu que: A importineiarelativa das relagBes entre eidades e regides parece diminuit quando comparada & importincia das relagGes que interligam viras cidades de rides e paises diferentes... As novas aividades concentram-se em pélos expecificas ¢ isso implica um aumento das disparidades entre os plas ut= ‘banos eas respectivas hinterlindas."* O espace de unos 407 Dessa forma, o fenémeno da cidade global nfo pode ser reduzido a alguns niicleos urbanos no topo da hierarquia. £ um processo que conecta servigos vangados, centros produtores e mercados em uma rede global com intensidade diferente © em diferente escala, dependendo da relativa importéncia das ativi- dades localizadas em cada rea vis-d-vis a rede global. Em cada pais a arqui- tetura de formacao de redes reproduz-se em centros locas e regionais, de forma ue o sistema todo fique interconectado em ambito global. Os terrtérios em tomo desses nés desempenham uma fungo cada vez mais subordinada, as ve- 22s, perdendo a importincia (ou até mesmo a funcio). Um exemplo so as colo- nias populares da Cidade do México (originalmente, assentamentos de possei- 03) que representam cerca de trés tergos da populagio das megalépoles sem esempenhar nenhum papel distinto no funcionamento da Cidade do México como centro intemacional de negécios.)"” Ademais, a globalizardo estimula a regionalizagao, Em seus estudos sobre regides européias na década de 90, utili- zando os dados disponiveis, Philip Cooke mostrou que a intemnacionalizagio crescente das atividades ezonémicas na Europa tomou as regies mais depen- dentes dessas atividades. Assim, as regides, sob o impulso dos governos elites empresariais, estruturaram-se para competir na economia global e estabelece- ram redes de cooperagdo entre as insttuigSes regionais e entre as empresas lo- calizadas na area. Dessa forma, as regides e as localidades nao desaparecem, mas ficam integradas nas redes intemacionais qu ligam seus setores mais dindmicos."* Michelson e Wheeler, a pedido de uma das principais transportadoras, a Federal Express Corporation, obtiveram uma aproximagdo com a arquitetura de uxos da informagio em desenvolvimento na economia global com base em anilise de dados do trifego." Estudaram o movimento de carta, pacotes © caixas enviados pelo sistema overnight (enttegas na manhi seguinte) nas éreas me- tropolitanas dos EUA, durante a década de 90, bem como entre os principais centros remetentes norte-americanos e os destinos internacionais. Os resultados dda anise, ilustrados nas figuras 6.1 e 6.2 mostram duas tendéncias bisicas: (a) dominio de alguns nés ou centros especialmente Nova York, seguido de Los Angeles, aumentando com o tempo; (b) selecionados circuitos de conexo ni cionais e internacionais. Segundo a conclusio ‘Todos os indicadores apontam para um forialecimento da estrutura hierir- Aquica de fungdes de comando e controle ¢ do resultanteintercimbio de informacdo... A concentragdo localizada da informagdo resulta de altos ni veis de incerteza, por sua vez motivada pela transformagdo teenolbgica, per- sonalizagao, desregulamentagio ¢ globslizagdo do mercado... (Contudo) & medida que a épaca atual for se desenvolvendo, persistri a importincia da Fexibilidade, come mecanismo hisico de tuagio, e das economias de aglo- a8 rp de acs Origem Destine Los Angeles Nova York Nova York feacerrams seep Washington Washington Nova Yor Los Angeles Sto Francisco Nova York Boston Nova Vork Piaaetia Boston Nova York Finda Nova York Actas Tiss] Nova York Sio Francisco Nova York Nova York = Atlanta Dallas xm Los Angeles Chicago {iss | [Las Angeles Figura 6.1 Maior crescimento absoluto dos fluxos da informagio, 19 Fonte: Dados da Federal Express. Elaborada por Michelson e Wheeler ‘meragdo, como fator preeminente de localizaglo, Portanto, aimportineis da cidade como centro de gravidade para as transagBes econémicas nao desa. pareceri. Mas com a iminente regulamentagio dos mercados intemacionis. ‘com menos incerteza sobre as regras do jogo ecandimico ¢ seus partcipan- tes, a cancentrago do setor da informacao softeré uma desaceleragdo, € certos aspectos da producio ¢ distribuigdo filtrario em niveis mais baixos de uma hierarquia urbana internacionalizada” De fato, a hierarquia na rede nio é de forma alguma garantida ou estvel esta sujeita & concorréncia acirrada entre as cidades, bem como a aventura de investimentos de alto risco em finangas ¢ bens imobiliirios. Assim, P. W. Daniels, em um dos estudos mais abrangentes sobre o assunto, aribui o fracasso parcial do O espage de Naxos 08 g e 3 ae eek 4 2 Ba a8 ay a s nue: Dados da Fede 40 espago de Muxos grande projeto de redesenvolvimento urbano de Canary Wharf, nas Docklands de Londres, a estratégia superampliada de sua empreendedora, a famosa em- presa canadense Olympia & York. A empresa foi incapaz de absorver 0 excesso de desenvolvimento de escritorios das anos 90, na esteira da redugdo do nivel de temprego em servigas financeiras de Londres € Nova Yark. Daniels conclu que: ‘A expansio de servigos no mercado internacional inroduziu, poranto, um ‘rau maior que no passado em termos de flexbilidadec, em iltima anise, de concorréncia no sistema urbano global. Como a experiéncia com Canary ‘Wharf demonstou, essa ampliagdo também fez que o resultado do plane Jjamento e redeserwolvimento urbanos em larga escala lease refém de faores ‘entemosintemacianas sb os quais se pode ter apenas controle limitado”* Portanto, no inicio dos anos 90, enquanto, de um lado, cidades como Bang kok, Taipei, Xangai, México D.F. ou Bogoté desfrutavam um crescimento ur- bano explosivo fomentado pelos negécios, de outro, Madri, Nova York, Londres ¢ Paris experimentavam ums queda que causou profunda diminuig2o nos pregos de imbveis e paralisou novas construgGes. Esta montanha-rissa urbana, em dife- rentes periodos nas diversas reas do mundo, ilustra a dependéncia e a vulnera- bilidade de qualquer local, inclusive das principas eidades, em relagdo aos flu- 0s globais em tansformacao. Mas por que esses sistemas de servigos avangados ainda devem ficar de- pendentes da aglomeragio em alguns grandes nés ou centros metropolitans? A esse respeito, Saskia Sassen, novamente, coroando anos de pesquisa em trabalho de campo dela mesma ¢ de outros pesquisadores em diferentes context, dé respostas convincentes, Afiema que: |A combinagdo de dispersio espacial e integragdo global eriow novo papel ‘etratégic para as principiseidades. Ae de sua longa histria com mies fe comércio © avidades bancirias intemacionais, esas cidades agora fun- cionam em quatro novas formas: primeira, como pontos de comando al- tamente concentrados na orgenizaglo da economia muneial; segunds, como localizageschave para empresas financeiras ¢ de servos especialzados.; terceira, coma locas de producto, inclusive a produdo de inovegdo nesses importantes setores; © quarta, como mercados para os produfos e as ino vasdes produzidas.”> Essas cidades, ou melhor, seus bairros comerciais, so complexos de pro- ‘Um clemento-chave desse modelo de localizagio & a importancia decisiva dos complexos produtivos de inovagdes tecnol6gicas para todo o sistemia. £0 que Peter Hall e eu, bem como o pioneito neste campo de pesquisa, Philippe ‘Aydalo, chamamos de “meios de inovagao”.* Pelo que entendo, meio de ino- vagdo € um conjunto especifico de relagbes de produgdo e gerenciamento com ‘base em uma organizacéo social que, de modo geral, compartlha uma cultura de trabalho e metas instrumentais, visando gerar novos eonhevimentos, novos processos e novos produtos. Embora o conceito de meio nio inelua nevessaria- mente uma dimensio espacial, aficmo que no caso das indistrias de tecnologia da informagdo, pelo menos neste século, a proximidade espacial é uma condigde material nevesséria para a existéneia desse meio devido & natureza da interagdo no processo de inovagéo, O que define a especifcidade de um meio de inovagio & sua capacidade de gerar sinergia, isto é 0 valor agregado resultante ndo do feito cumulativo dos elementos presentes no meio, mas de sua interaglo. Os meios de inovagio si as fontes fundamentais de inovagdo e de geragio de valor fgregado no processo de produglo industrial da era dt informagio, Durante vvrios anos, Peter Hall e eu estudamos a formagao, a estrutura ¢ a dindmica dos principais meios de inovagdo tecnologica reais e imaginaveis em todo o mundo. Os resultados de nossa investigagdo acrescentaram alguns elementos a com- preensio do modelo dc localizagao do setor de tecnologia da informagio.™ O eepage de Nazos ais eee | Figura 6.3 Sistema de relagdes entre as caracterstcas da indistria de tecnologia da informagio ¢ 0 modelo espacial do setor Fonte: Elaboraéa por Casells (1989). 416 0 expaye de axor Em primero lugar, 08 meios de inovagio industrial de alta tecnologia, que chamamos de “teenépoles”, apresentam-se em varios formatos urbanos. Nota- damente — claro que na maioria dos paises, com as importantes excegdes dos Estados Unidos e, em certa medida, da Alemanha — as principais tecnépoles sem divida ficam nas éreas metropolitanas mais destacadas: Téquio, Paris-Sud, corredor M4 de Lonaes, Milo, Seul-Inchon, Moseou-Zelenograd e, a uma distin cia considerivel, Nice-Sophia Antipolis, Tape Hsinchu, Cingapure, Xangai, So Paulo, Barcelona etc. A excegd0 parcial da Alemanka (afinal Munique ¢ uma importante rea metropolitana) esti diretamentereiacionada &histria politica: a destruigdo de Berlim, o preeminente centro industrial ¢ cientifico europey, ¢ a transferéncia da Siemens de Berlim para Munique nos ilkimos meses do Ter- ctiro Reich, sob a prevista protegao das forgas de ocupagto norte-americanas € com 0 apoio subseqiente do partido CSU bévaro, Dessa mancira, contra as excessivasfantasias das modemas tecndpoles,na verdade existe continuidade da bistoria espacial da tecnologia e industralizaydo na era da informagao: os pi cipais centros metropolitanos em todo o mundo continuam a acumularfatores indutores de inovagio e a gerarsinergia na indstria e servigos avancades. Contudo, alguns dos mais importantes cents de inovagdo para a fabri- cagio de teenologia da informagio sio realmente novos, em especial, no lider ‘mundial em tecnologia, os Estados Unidos. O Vale do Silicio, a Route 128 de Boston (renovando uma estrutura industrial antiga e tradicional), Tecn6pole do sul éa Califérnia, oTriingulo de Pesquisas da Carolina do Nore, Seatle e Austin, entre outros, estavam de forma geral lgados & onda mais recente de industrial zacio com base na tecnologia da informagio. Mostramos que seu desenvol- vimento resultou do agrupamento de varios dos Fetores especificos habituais de producio: capita, trabalho e matéria-prima reunidos por algum tipo de empre- tendedor institucional © constituides por uma forma particular de organizagdo Social, Sua matériacprima era formada de noves conhecimentos relacionados & campos de aplicagdo estrategicamente importantes, produzidos pelos principais centros de inovagdo como a Universidade de Stanford, CalTech ou as equipes de pesquisa das faculdades de engenharia do MITT e pelas redes construidas em tomo desses centros. Seu trabalho, além do fator conhecimento, exigia a con nists € engenhitos altamente quali tados de vérias escolas locas, inclusive as jé mencionadas, mas também de outras como Berkeley, San Jose State ou Santa Clara, no caso do Vale do Silico. Seu capital também era especifco, pronto a assumir os altos riscos ineventes 20 investimento no pioneirismo da alta tecnologia: ou devido ao imperativo do de- sempenho militar (gastos com defesa), ou entdo por causa das altas apostas do capital de rseo, acreditando nas recompensas extras desse tipo de investimento, ‘A artculacdo desses fatores de produglo foi o fato de, no inicio do processo, contra io de um grande mimero de CO epage de faxoe a7 lgum ator institucional, a exemplo da Universidade de Stanford, langar 0 Par- aque Industral de Stanford que inspirou o Vale do Silicio; ou os comandantes da Forga Aérea que, confiando no progresso de Los Angeles, ganharam para o sul da California 0s contratos de produtos bélicos que tomariam a nova metrépole cocidental 0 maior complexo de indistia bélica de ata teenologia em todo 0 ‘mundo, Finalmente, as redes sociais de diferentes espécies contribuiram de fo rma iniensa para a consolidacio do meio de inovaclo e seu dinamismo, assegu- rando a comunicagio de idéias, circulagdo de trabalho ¢ troca de experiéncias sobre inovagio tecnolégicae iniiativas empresariaisarrojadas, "Nossa pesquisa sobre os novos meios de inovasio nos EUA ou em outro lugar demonstra que, embora realmente haja continuidade espacial em dominios retropolitanos, ela também pode ser revetida caso a& condigdes sejam ade- ‘quads. E que as condigdes adequadas dizem respeito & eapacidade de concen- ‘ragdo espacial dos ingredientes apropriados para promoversinergia, Se for esse 0 caso, como nossos dados parecem confirma, tems mesmo um novo espago industrial marcado por descontinuidade fundamental: 0s meios de inovagao no- vvos e antigos constituem-se com base em sua estrutura e dindmica intema © mais tarde atraem empresas, capital e trabalho para os canteiros de inovagio por eles constituidos. Uma vez estabelecidos, os meias de inovagio competem e cooperam em diferentes regibes, criando uma rede de interago que os retine em ‘uma estrutura industrial comum, superando sua descontinuidade geogrifica. A pesquisa realizada por Camagni e pelas equipes pesquisadoras organizadas em tomo da rede do GREMP mostra a creseente interdependncia desses meios de inovagao por todo 0 globo e, ao mesmo tempo, enfatiza quio decisiva para seu destino é a capacidade de cada meio para intensificar sua sinergia. Finalmente, (0s meios de inovacio comandam a redes globais de produgdo e distibuiglo, fque estendem seu aleance por todo o planeta, Por iss, alguns pesquisadores, ome Amin e Robins, afimmam que 0 nova sistema industrial nfo é global nem local, mas “uma nova articulagdo da dindmica Tocale global”.” ‘Contudo, para ter um panorama claro do novo espago industrial consti tuido na era da informagio, devemos acrescentar algumas definigdes precsas Porque, com muita frequénci, a énfase da andlise reeai na divisio espacial hie- rrquica do trabalho entre as diferentes fangBes localizadas em territérios diver- sos. Isso & importante, mas nao & essencial na nova logica espacial. Hierarquias territorais podem ser misturadas ¢ att revertidas, & medida que o setor se ex- pande pelo mundo e conforme a concorréncia intensifica ou enfraquece aglome- ragbes inteiras, inclusive os prOprios meios de inovagio, Também, meios se- ‘oundétios de inovagio s20 constituides,&s vezes como sistemas descentalizados desmembrados de eentros primérios, mas freqientemente encontram seus ni- chos na concorréncia com suas matrizes originais, a exemplo do que aconteceu as O espago de unas ccom Seattle em relagio ao Vale do Silicio © Boston em software, ou Austin, ‘Texas, vis-d-vis Nova York ou Minneapolis em computadores. Ademais, na dé- cada de 90, 0 desenvolvimento da indtstria eletrnica na Asia, principalmente ‘sob 0 impulso da concorténcia japonese ¢ norte-americana, complicou muito a ‘geografia do setor em sua maturidade, como ficou demonstrado nas anélises de Cohen e Bormas e de Dieter Ems. Por um lado, houve melhora substancial do potencial tecnol6gico das subsidirias das multinacionais norte-americanas, e5- ppecialmente em Cingepura, na Maldsia ¢ em Taiwan, e essa melhora difundiu-se por suas subsididrias locais. Por outro, as empresas eleiréicas japonesas, como ja foi mencionado, descentralizaram macigamente sua produgéo na Asia para exportar em mbito global e suprir as matrizes sediadas no Japio, Em embos os casos, construiu-se tuma grande base de fomecimento na Asia, o que tomou obsoleta a velha divistio espacial de trabalho na qual as subsididrias do Leste Sudeste asiatico ocupavam o nivel inferior da hierarquis, ‘Ademmais, com base na revislo dos dados disponiveis até 1994, inclusive das pesquisas de sua empresa, Richard Gordon faz uma defesa convincente do surgimento de uma nova divisio espacial de trabalho, caracterizada por sua ge0- reitia varidvel e conexdes de ida e volta entre as empresas localizadas em diferen- tes complexos territoriais, abrangendo os prineipais meios de inovagio. A ani~ lise minuciosa dos desenvolvimentos da década de 90 no Vale do Silicio mostra ‘2 importincia das relagdes extra-regionais para as interagSes tecnoldgicas mais sofisticadas ¢ com uso intensivo de transagGes, realizadas por empresas regionais de alta tecnologia. Desse modo, ele argumenta que: Neste novo contexto global, a aglomoraso Tocalizada, longe de constitit ‘ua alterativa& dispersio espacial, trna-se base principal para a partici- pagdo em uma rede global de cconomias regionas... As regiBes e redes realmente constituem polos interdependentes dentro do novo mosaico es pacial da inovagdo global, A globulizagio neste contexte no envolve o im pacto Fomentador dos processas universais, mas, 0 contririo, a sintese cal- culada da diversidade cultural sob a forma das lagicas e das capacidades de ‘novagdo cegional diferenciada.”® © novo espago industrial ndo representa 0 fim das velhas éreas metropoli- tanasjé esiabelecidas eo inicio de novasregides caraterizadas por alta teenolo- gia. Nem pode ser compreendido com base na oposiedo simplista entre auto- magdo no centro e faricaco de baixo custo na periferia. £ organizado em uma hierarquia de inovagdo e fabricagio artculadas em redes globais. Mas'a direco a arquitesura dessasredes eso sujeitas as constantes mudangas dos movimen- tos de cooperegdo e concorréncia entre empresas € locais,algumas vezes histor- O cspavo de Naxos ag ‘camente cumulativos, outras, revertendo o modelo estabelecido mediante delibe- rada iniciativa empreendedora institucional. O que resta como légica caracteristica «da nova localizagio industrial ¢ sua descontinuidade geogréfica, paradoxalmen- te formada por complexos teritoriis de produgdo. O novo espaco industrial & ‘organizado em tomo de fluxos da informagao que, ao mesmo tempo, reiinem € separam — dependendo dos eiclos das empresas — seus componentes territo- riais. E, & medida que a logica da fabricagdo da tecnologia da informagio vai passando dos produtores de equipamentos de tecnologia da informacao para os usudrios desses dispositivos em toda a esfera da industria, também a nova l6gica espacial se expande criando uma multiplicidade de redes industriais globais, cujas intersegdes e exclusdes madam o proprio conceito de localizaglo indus- tral de fbricas para fluxos industrias. O cotidiano do domicilio eletrénico: o fim das cidades? © desenvolvimento da comunicagdo eletronica ¢ dos sistemas de infor- ‘magio propicia uma crescente dissociacdo entre a proximidade espacial e 0 de- sempenho das fungdes rotineiras: trabalho, compras, entretenimento, assisténcia 4 side, educagdo, servigos pablicos, governo e assim por diante. Por isso, 08 futurologistas freqiientemente predizem o fim da cidade, ou pelo menos das ‘idades como as conhecemos até agora, visto que estio destituidas de sua neces- sidade funcional. Como mostra 2 histéria, os processos de transformago es- pacial sio, & claro, muito mais complicados. Portanto, vale a pena analisar © pareo registro empirico sobre o tema." Um aumento impressionante do teletrabalho & a suposiglo mais normal sobre o impacto da tecnologia da informacdo nas cidades e representa a tiltima ‘esperanga dos planejadores de transportes metropolitanos antes de se renderem 2 inevitabilidade de megacongestionamentos. Mas, em 1988, em importante pes quisa européia sobre telecomutagéo, divulgou-se, no em tom de brincadcira, que “Hé mais pessoas fazendo pesquisas sobre teletrabalho do que teletrabalha- dores reais”.*' Sem divida, como foi apontado por Qvortup, todo 0 debate & pateial devido a falta de preciso na definigdo do termo teletrabalho, levando a uma grande incerteza na avaliacao do fendmeno*® Apés rever as informagies dispo- niveis, Qvortup faz uma distinedo apropriada entre tés categorias: (a) “Substitui- dores, aqueles que substituem 0 servigo efetuado em um ambiente de trabalho tradicional pelo servigo feito em casa”, Esses sto trabalhadores & disténcia no sentido exato, (b) Auténomos, trabalhando on-line de suas casas. (c) Comple- mentadores “que trazem para casa trabalho complementar do escritério conven- cional”.lém disso, em alguns casos esse “trabalho complementar” toma a maior 20 expo de Naxos parte da carga de trabalho como, segundo Kraut? acontece com professores Uuniversitérios. De avordo com a maioria dos relatos confidveis, a primeira cate- goria, ou seja, 05 trabalhadores & distincia stricto sensu com empregos regulares para operar on-line em casa, € muito pequena no conjunto e provavelmente ndo teré grande crescimento em um futuro previsivel.* Nos Estados Unidos, a8 est tmativas mais altas avaliaram cerca de 5,5 mithdes de trabalhadores a distancia instalados em casa em 1991, mas deste total apenas 16% trabalhavam 35 horas ou mais por semana, 25% trabalhavam menos que um dia por semana, sendo dois dias semanais 0 padréo mais comum. Assim, a percentagem de trabalha- dores que em um dia determinado executam trabalhos a distincia varia, depen- dendo das estimativas, entre 1% e 2% do total da fora de trabalho, e as princi pais éreas metropolitanas da California ostentam as percentagens mais altas:* Por sua vez, 0 que parece estar surgindo é a telecomutagdo em telecentras, isto 6 instalagdes com computadores em rede espalhadas nos subirbios das areas ‘metropolitanas para os trabalhedores atuarem on-line com suas empresas.© Com & confirmagio dessas tendéncias, as casas no se tomariam locais de trabalho, ‘mas a atividade de trabalho poderia espalhar-se consideravelmente pela area ‘metropolitana, intensificando a descentralizagio urbana, O aumento do trabalho em casa também podera resultar de uma forma de trabalho eletrnico terceiti- zado executado por trabalhadores tempordrios subcontratados mediante acordos individuais © pagos pelo volume do servigo executado em processamento da informagio:” & interessante notar que, nos Estados Unidos, uma pesquisa na- cional de 1991 mostrow que menos da metade dos trabalhadores & distancia instalados em casa usavam computadores: o restante trabalhava com telefone, caneta e papel." Exemplos dessas atividades sio os assistentes sociais ¢ os vestigadores de fraudes na previdéncia social do Condado de Los Angeles." 0 que certamente € significativo, ¢ esti aumentando, € o desenvolvimento do tra- balho auténomo e dos “complementadores”, quer em horario integral, quer em meio expediente, como parte da tendéncia mais ampla & desagregacdo do tra- balho € & formacio de redes virtuais de negocios, conforme foi indicado nos capitulos anteriores. Isso nio implica o fim do escritério, mas a diversificagdo dos locais de trabalho para uma grande frago da populacio e, especialmente, para o segmento mais dinmico de profissionais liberais. Equipamentos de tele- computacio cada vez mais portiteis intensificardo essa tendéncia para o escri- trio mével, no sentido mais literal. ° ‘Como essas tendéncias afetam as cidades? Dados dispersos parecem indi- car que os problemas de transporte, em vez de melhorar, piorario porque o aumento das atividades © a compressio temporal possibilitados pela nova or- ganiza¢io em rede transformam-se em maior concentragio de mercados em cer- tas dreas ¢ em maior mobilidade fisica de uma forga de trabalho, antes confi- O espago de Naxos a nada a scus locais de trabalho durante 0 expediente*! 0 tempo de destocamento fem raaio do (rabalho mantéon-se em um nivel constante nas areas metropoli- tanas dos EUA, niio devido a melhora da tecnologia, mas por causa de um mo- delo mais descentralizado de localizacio de empregos e residéncias que permite fluxos de trifego mais facil entre os subirbios. Nessas cidades, principalmente dda Europa onde um modelo radioconcéntrico ainda predomina nos deslocamen- tos didrios (como Paris, Madri ou Mildo), 0 tempo de deslocamento para a ida ‘ao trabalho ¢ a volta & casa é enorme, em especial para 03 ferrenhos adeptos do automével. Quanto as novas e sempre crescentes metropoles asiticas, sua en- trada na era da informagio é paralela & sua descoberia dos piores congestiona- rmentos da historia, de Bangkok a Xanga {As telecompras também nfo esto se desenvolvendo a altura das expectati- vas, Embora em crescimento na maioria dos paises, na verdade estio substi- tuindo os tradicionais pedidos por catélogos via correio, e nfo a compra direta em shopping centers ¢ ruas comerciais. Como acontece com outras atividades de rotina on-line, telecompras mais complementam do que substtuem as éreas comerciais. Pode-se dizer © mesmo da maior parte dos servigos on-line de atendimento 20 consumidor. Por exemplo,o telebanco™ esti se difundindo com rapidez, especialmente sob o impulso de bancos interessados em eliminar agén- cias e substitu-las por servigos on-tine de atendimento ao consumidor e caixas cletrénicos. Contudo, as agéncias bancérias consolidadas continua como cen- trais de atendimento, para vender produtos financeiros aos clientes, mediante um relacionamento personalizado. Até on-line, as caractersticas cufturas das ocalidades podem ser importantes como fatores de localizacio a transagies vol- tadas pera a informagao. Assim, a First Direct, teleagéncia banciria do Midland Bank na Gri-Bretanha, situou-se em Leeds porque pesquises “revelaram que 0 sotaque neutro de West Yorkshire com diceio clara e aparente auséncia de carac- {ciisticaindicativa de classe social era 0 mais facilments compreendido © accito em todo o Reino Unido— um elemento vital em qualquer negécio com base em comunicagao tclefénica”.% Dessa forma, ¢ 0 sistema de agéncias vendedoras, caixas automiticos, servigos de atendimento ao cliente por telefone e transacdes ‘on-line que consttui o novo setor bancétio. (0s servigos de saiide representam um exemplo ainda mais interessante da dialéticn emergente entre a concentracdo ¢ a centralizacdo de atendimento de usuérios. Por um lado, sistemas especializados, comunicayées on-line ¢ trans- missio de video de alla resolugio permitem a interconexio de assisténcia mé- dica a distincia, Por exemplo, em uma prética que jé se tomou comum, se no rotineira, em 1995 cirurgides altamente qualificados supervisionaram por meio de videoconferéncia uma cirurgia realizada no outro lado do pais ou do mundo, uiando literalmente a mio menos especializada de outro cirurgido em um corpo a 0 espe de Naxos hhumano, Check-ups regulares também so conduzidos via computador ¢ tele fone com base em informages computadorizadas atualizadas dos pacientes. Cen- tros de assistincia médica de bairos tém o apoio de sistemas de informacao para melhorar a qualidade e eficiéncia de seu atendimento de nivel primar. Mas, por outro lado, na maioria dos paises os principais complexos médicos ssurgem em locais especificos, em geral, nas grandes dreas metropolitanas. Nor- ‘malmente organizados em torno de um grande hospital, com freqténeia conce- tados 2 faculdades de medicina e enfermagem, incluem em sua proximidade fisica clinicas particulares chefiadas pelos médicos mais importantes do hospi- tal, centros radiolégicos, laboratrios para exames, farmacéuticos especializados ¢, no raramente,Iojas de presentes ¢ funerdrias para atender @ toda a gama de possibilidades. Na verdade, esses complexos médicos representam importante forga cultural e econémica nas areas e cidades em que esto localizados e ten- dem a expandir-se pelas vizinhangas com o passar do tempo. Quando forcado a sudar de localizagio, vai todo o complexo.** Escolas e universidades, paradoxalmente, so as instituigdes menos afe- tadas pela Idgica virtual embutida na tecnologia da informagio, apesar do uso provisivel quase universal de computadores nas salas de aula dos paises desen- volvidos. Mas elas no desaparecerio no espago virtual. No caso de escolas de ensino fundamental e de ensino médio, isso no ocorterd porque sio centros de stendimento infantil e/ou repositério de criangas na mesina proporeio em que io insttuigdes educacionais. No caso de universidades, porque a qualidade da ceducasio ainda esti ¢ estar por um longo tempo, associada & intensidade da in- teragdo pessoal, Por conseguinte, as experigncias em larga escala de “universi- dades distancia”, independentemente de sua qualidade (mi na Espanha, boa na Gri-Bretanha), parecem posicioné-las como uma segunda opglo em formas de ceducagio, desempenhando papel significativo em um futuro sistema aperfeicoa- do de educagdo de adultos, mas nfo como substitutas das atuais intituigées de ceducagio superior. Por outro lado, a comunicagio mediada por computadores esté se dfun- dindo em todo o mundo, embora apresente uma geografia extremamente irregular como foi mencionado no capitulo 5. Dessa manera, alguns segmentos das socie- dades de todo o globo, invaravelmente concentrados nos estratos profissionais su- periotes, iteragem entre si reforgando a dimensio social do espago de fluxes.” ‘io é necessério esgotar a relagio de ilustragSes empiricas dos impactos reais da tecnologia da informagéo sobre a dimensio espacial da vida cotidiana O resultado de observagdes diversas € um quadro similar de dispersio e coneen- tragdo espacial simultdneas, via tesnologias da informagio. Cada vez mais, as pessoas trabalham e administram servigos de suas cases, como mostra 8 pes- espace de fuxos 23 quisa realizada em 1993 pela Fundagdo Européia para a Melhoria da Qualidade de Vida e Ambiente de Trabalho.* Por conseguinte, a “centralidade na casa” é uma tendéncia importante da nova sociedade, Porém nao significa o fim da ci- dade, pois locais de trabalho, escolas, complexos médicos, postos de atendi- ‘mento ao consumidor, dreas recreativas, ruas comerciais, shopping centers, es- tidios de esportes e parques ainda existem e continuardo existindo. E as pessoas deslocat-se-Zo entre todos esses lugares com mobilidade crescente, exatamente devido a flexibilidade recém-conquistada pelos sistemas de trabalho e integra- ‘do social em redes: como o tempo fica mais flexivel, os lugares tornam-se mais singulares & medida que as pessoas citculam entre eles em um padrio cada vez ‘mais mével, Contudo, a interagdo entre a nova tecnologia da informacao e os processos atuais de transformagio social realmente t&m um grande impacto nas cidades e no espago. De um lado, @ layout da forma urbana passa por grande transfor magio, Mas essa transformagdo nfo segue um padrdo tinico, universal: apre- sonta variaglo considerivel que depende das caracteristicas dos contextos his- ‘toricos, teritoriais ¢ insttucionais, De outro, a énfase na interatividade entre os Ingares rompe os padrées espaciais de comportamento em uma rede fluida de intercimbios que forma a base para o surgimento de um novo tipo de espaco, 0 espago de Hluxos. Em ambos os easos, devo fazer uma anslise mais rigorosa elevé-la a um nivel mais teérico. A transformagao da forma urbana: a cidade informacional ‘A era da informagdo esté inttoduzindo uma nova forma urbana, a cidade informacional, Contudo, como a cidade industrial ndo foi uma réplica mundial dde Manchester, a cidade informacional emergente nao seri uma e6pia do Vale do Silicio, muito menos de Los Angeles. Por outro lado, como na era industrial, apesar da diversidade extraordindria dos contextos fisicos e culturais, hé algu- mas earacterstcas comuns fundamentais no desenvolvimento transcultural da cidade informacional. Defenderei que, por causa da natureza da nova sociedade baseada em conhecimento, organizada em tomo de redes ¢ parcialmente for- sada de fluxos, a cidade informacional nfo 6 uma forma, mas um processo, um processo caracterizado pelo predominio estrutural do espago de fluxos. Antes de desenvolver essa iia, penso que primeiro & necessério apresentar a diversidade das formas urbanas emergentes no novo periodo histrieo, para contrapor uma visio teenolbgica primitiva que vé 0 mundo através das lentes simplificadas de auto-stradasinterminiveise de redes de fbras6tices as O espago de Mares A tiltima fronteira suburbana dos Estados Unidos ‘A imagem de um crescimento homogéneo ¢ interminavel dos subirbios € freas metropolitanas como a cidade do futuro & aceita até por seu relutante modelo, Los Angeles, cuja complexidade contraditéria € revelada pela maravi Ihosa obra de Mike Davis, City of Quartz.* Mas esta sugere uma tendéncia poderosa nas ondas continuas de deserwolvimento suburbano da mettépole norte americana para o este € 0 sul, bem como para o norte e 0 leste, até 0 fim do rilésio, Joel Garreau captou as semelhangas desse modelo espacial nos EUA. ‘em seu relato jomalistco do desenvolvimento da Edge City, como 0 miicleo do novo processo de urbanizagdo. Sua definicdo empirica de Edge City (Cidade is Margens) combina cinco eritéios Edge City & qualquer lugar que: a) tenha 465 mil metros quadrados ou mais, de espaco com escritérios de aluguel — 0 local de trabalho da Era da infor- ‘magio... 6) tenbe $6 mil metros quadrados ou mais de espaco pare ser alu ‘gado por lojas varejistas..c) tenha mais empregos que dormitérios.d)seja pereebido pela populacio como um lugar. e) lo se parecesse com uma “cidade” pelo menos trnta anos ards autor relata a proliferacio desses lugares ao redor de Boston, Nova York, Detroit, Atlanta, Phoenix, Texas, sul da California, érea da Baia de Si Fran- cisco e Washington, D.C. Sio areas de trabalho ¢ centros de servigos a0 redor dos quais quilémetros e quilémetros de unidades residenciais cada vez mais densas e de uma s6 familia organizam a vida particular “centrada na casa”. O autor destaca que essas constelagdes das dreas metropolitanas: ‘%o ligndas, nfo por locomotivas ¢ metrbs, mat por auto-estradas, core. dores de acesso a aviges ¢ antenas parabslicas de 9 metros de didmetro nos terragos dos prédios. Seu monumento caracteristico no é um herdi mon- tado a cavalo, mas os dtrios acu aberto que absigam irvores sempre folhades ‘em sedes comporativas, centres de condicionamento fico ¢ shopping centers. xtas novas reas urbanas nio sio marcadas peas coberturas dos antgos rcos ‘nem pelas casas de cémodos dos antigos pabres urbanos. Em vez disso, 0 que caracteriza sua estrutura € a famosa residéncia independente para uma dnica famitia, a casa suburbana cercada de gramado que fez dos Estados Unidos a civilzago possuidora das melhores easas que o mundo ja conheccu.*” Naturalmente, onde Garreau vé o incansivel espirito fronteirigo da cultura norte-americana, que sempre ctia novas formas de vida e espaco, James Howard Kunstler vé 0 dominio lastiméve! da “geografia do lugar nenhum",* assim tea- espa de Muxce 25 cendendo um debate existente fit décadas entre os defensores 0s contestadores da profunda separagéo espacial dos EUA em relagio a seu ancestral europeu. ‘No entanto, para o propésito de minha andlise, dete-me-ei apenas em dois pon- tos principais desse debate. Primeiro, o desenvolvimento dessas constelagdes livremente interelacio- nadas nas Areas metropolitanas enfatiza a interdependéncia funcional de uni- dades © processos diferentes em um determinado sistema urbano por longas distincias, minimizando o papel da contigiidade territorial e maximizando as redes de comunicacZo em todas as suas dimensGes. Fluxos de intercdmbio so ‘0s componentes essenciais da Edge City norte-americana.* Segundo, essa forma espacial & sem diivida muito especifica da experién- cia nort-americana. Pois, como Garreau admite, esté embutida em um padtio clissico da histéria dos Estados Unidos, estimuladora da busca continua por uma terra prometida em novos lugares. Embora o extraordinirio dinamismo que {sso representa, sem divida, tenha construido uma das nacées mais importantes da histéri, 0 prego a pagar foi a geragao de problemas sociais e ambientais assustadoces 20 longo do tempo. Cada onda de escapismo fisico € social (por exemplo, o abandono dos centros das cidades, deixando as classes sociais infe- riores e as minorias étnicas presas, encurraladas em suas ruinas) aprofundou @ crise das cidades norte-americanas® e dificultou ainda mais a administragio de uma infra-estrutura superampliada e uma sociedade superestressada. A menos que 0 desenvolvimento de “celas particulares de alugue!” a oeste do Texas soja considerado tum processo bem-vindo para completar 0 ndo-investimento sociale fisico nas dreas centrais das cidades norte-americanas, a faite en avant da cul- tura e do espago norte-americanos parece ter alcancedo os limites da recusa do cenfrentamento de realidades desagradaveis. Dessa forma, o perfil da Cidade In- formacional norte-americana ndo totalmente representado pelo fendmeno da “Bdge City”, mas pela relagio entre o desenvolvimento répido das ércas metro- politanas, decadéncia dos centros das cidades e obsolescéncia do ambiente cons- truido nos subirbios. ‘As cidades européias entraram na era da informagio de acordo com uma linha diferente de reestraturacdo espacial ligada & sua heranga histrica, embora tencontrassem questdes novas, nem sempre diversas daquelas surgidas no con- texto norte-americano. O charme evanescente das cidades européias \Varias tendéncias constituem a nova dit metropolitanas eurapéias na década de 90. ica urbana das principais éreas 25 O eapago de anos (© centro de negécios é, como nos Estados Unidos, 0 motor econdmico da cidade em rede com a economia global. O centro de negécios € formado de uma infra-estrutra de telecomunicagdes, comunicagdes, servigos avancados ¢ esp2- 08 para escritrios baseados em centros geradores de tecnologia ¢ instituigdes educacionais, Prospera em processamento de informagdo e funcées de control. Geralmente & completado por instalagdes de turismo e viagens. E um n6 da rede intermetropolitana.® Portanto, o centro de negécios néo existe por si mesmo, ‘mas pela sua conexdo com outros locais equivalentes organizados em uma rede que forma a unidade real de gerenciamento, inovacéo ¢ trabalho: ‘A nova elite poltica-empresarial-teenocritica realmente cria espagos ex- 10 a1 Fonte: ONU (1992). 432 O espago de fuxos ingyvan CE Cissieimermecisia ° Centro urbano de pequeno porte CConexiio rodovisia em km Rodovias a serem completadas Figura 6.5 Representagio diagramitica dos principaisn6 ‘los na regio urbana de Pearl River Delta Fonte: Elaborada por Woo (1994). O cspaze de faxos a (3) Contudo, a capacidade de exportacio de manufaturados de Hong Kong nao desapareceu: simplesmente houve uma modificagio de sua orgeni- zaco industrial e da localizagio espacial. Em cerca de dez anos, entre 08 meados da década de 80 ¢ os meados dos anos 90, os industriais de Hong Kong promoveram um dos maiores processos de industralizagdo em lar~ ga escala da historia humana, nas pequenas cidades de Pear! River Delta No final de 1994, 0s investidores de Hong Kong, usando freqiientemente relagdes familiares e locais, haviam estabelecido 10 mil joint ventures € 20 mil fabricas de processamento em Pearl River Delta, que empregavam cerca de 6 milhBes de trabalhadores, dependendo das virias estimatvas ‘A maior parte dessa populacio, abrigada em alojamentos de empresas em. freas semi-rurais, vinha das provincias vizinhas além das fronteiras de Guandong. Esse sistema industrial gigantesco estava sendo adminisirado diariamente a partir de uma estrutura administrativa de multicamadas,ba- seada em Hong Kong, viajando regularmente para Guangzhou, ¢ 0 es- coamento da producio era supervisionado por administradores locais em toda a drea rural. Hong Kong ¢ Shenzhen enviavam materais, tecnologia ¢ administradore, os produtos manufaturados, em geral,eram exportados de Hong Kong (realmente ultrapassando o valor das exportagies de Hong Kong), embora 2 construcio de novos portos para movimentasao de cargas em Yiantian e Gaolan visassem a diversiticagdo dos loeais de exportaglo, Esse proceso acclerado de industrializado direcionada para a exportagdo ¢ de conexdes comerciais entre a China e a economia global levou a uma ex- plosto urbana sem precedentes. A Zona Econémica Especial de Shenzhen, na fronteira de Hong Kone, crescen de zero a 1,5 milhBes de habitantes entre 1982 € 1995. Os governos locais de toda a area, abarrotados de dinheiro dos investi- dores chineses do exterior, embarcaram na construedo de grandes projetos de infra-estrutura, dos quais o mais impressionante, ainda em fase de planejamento na época da elaboragdo deste livro, foi a deciséo tomada pelo govero local de ‘huhai a respeito da construgdo de uma ponte de 60 km sobre o Mar do Sul da China para ligar Zhuhai a Hong Kong por rodovia ‘A Metropole do sul da China — ainda em formacdo, mas uma realidade garantida — & uma nova forma espacial. Nao é a Megal6pole tradicional identi- ficada por Gottman nos anos 60 na costa nordeste dos Estados Unidos. Ao con tririo desse caso clissico, a regito metropolitana de Hong Kong-Guandong ndo € composta da conurbagao fisica de unidades urbanas/suburbanas com relativa autonomia funcional em cada uma delas. Esti, rapidamente, se tomando uma a O copago de Musas unidade econémica, funcional socialmente interdependente, e essa interde- pendéncia aumentaré com a incorporacio formal de Hong Kong & China em 1997, e com a unio de Macau mesma bandeira, em 1999. Mas hi descon- tinuidace espacial considersvel na Area, com povoados rurai, terras cultivaveis « freas subdesenvolvidas separando os centros urbanos €, assim, as fabricas industria ficam espalhac:s por toda a regio. As conexdes intemas da area ea indispensével conexio de tod 0 sistema com a economia global via miltiplos elos de comunicagao sfo a verdadeira espinha dorsal desta nova unidade es- pacial. Os fluxos definem a forma ¢ os processos espaciais. Dentro de cada cidade, em cada area, ocorrem processos de segregagdo e segmentacdo em um padrdo sempre variével. Mas essa diversidade segmentada depende de uma uni- dade funcional marcada pelas infra-estruturas gigantescas com uso intensivo de tecnologia, que nao parecem conhecer nenhum outro limite @ no ser a quanti- dade de fgua doce que a regito ainda consegue recuperar da area do East River E provvel que a Metrépole do sul da China, hoje pereebida apenas vagamente na ‘maior parte do mundo, se tore a face urbana mais representtiva do século XXI. 'As tendéncias atuais apontam na diregio de outra megacidade asiitica em escala ainda maior quando, no inicio do século XXI, 0 corredor Téquio-Yoko- hhama-Nagoya (jé uma unidade funcional) estiver unido a Osaka-Kobe-Kyoto, do a maior aglomeracéo metropolitana da histéria humana no apenas em termos de populagdo, mas também em poder econdmico ¢ tecnologico, ‘Dessa forma, apesar de todos os seus problemas sociais, urbanos ambi= centais, as megacidades continuario a crescer tanto em tamanho quanto em atra tividade para a localizagdo de fungdes de alto nivel e para as escolhas pessoais. 0 sonho ecoldgico de pequenss comunas semi-rurais sera transportado para a rmarginalidade contracultural pela mart hist6rica do desenvolvimento das me- gacidades. Isso porque as megacidades sio: (2) centros de dinamismo econdmico, tecnoligico ¢ social em seus paises em escala global. Sio os verdadeiros motores do desenvolvimento, O des- tino econdmico de seus paises, seja os EUA, seja a China, depende do desempenio das megacidades, apesar de a ideologia da pequena cidade ‘ainda continuar difundida em ambas as nagBes; (2) centros de inovagai cultural e politica; @) 05 pontos conectores as redes globais de todos os tipos. A Internet nio podera desviar-se das megacidades: ela depende do sistema de telecormuni- ‘cagbes € dos “telecomunicadores” desses centro. Sem divida alguns fatores diminuitio o ritmo de erescimento das megaci- dades, dependendo da acuidade e efetividade das politicas destinadas a limitar O espaso de Naxos ws seu erescimento. O planejamento familiar esta sendo utilizado apesar do Vati- ano, Portanto, podemos esperar a continuago do declinio que a natalidade ja std tendo, Politicas de desenvolvimento regional talvez possam diversificar a concentragio de empregos e populacdo para outras éreas. Também prevejo epi- demias em larga escala e a desintegrayio do controle social, que tomario as megacidades menos atrativas, Contudo, no geral, as megacidades crescerio em tamanho ¢ predominio porque se alimentam da populaglo, da riqueza, do poder dos inovadores de suas hinterlandias. Além disso, elas so os pontos nodais de conenio as redes globais. Portanto, o futuro da humanidade e do pais de cada ‘egacidade depende fundamentalmente da evolugdo e gerenciamento dessas ércas. ‘As megacidades sZ0 0s pontos nodais eos cetros de poder da nova forma/proces- 0 espacial da era da informacao: 0 espaco de fluxos. Feita a exposigdo do cenario empirico do novo fenémeno territorial, agora temos de entender essa nova realidade espacial. Para tanto, precisamos fazer uma inevitivel digressio pelas pistas incertas da teoria de espago. A teoria social de espago ea teoria do espaco de fluxos Espaco € a expressio da sociedade, Uma vez que nossas sociedades esto passando por transformagoes estruturais, € razodvel sugerir que atualmente es- Wo surgindo novas formas e processos espaciais. A finalidade desta andlise & identificar 2 nova légica que fundamenta essas formas e processos. ‘Nao é uma tarefa facil porque o conhecimento, aparentemente simples, de uma relagio significativa entre sociedade ¢ espago esconde uma complexidade fundamental, uma vez que 0 espago niio é reflexo da sociedade, & sua expressao. Em outras palavras: o espago no é uma fotocdpia da sociedade, é a sociedade As formas e processos espaciais sfo constituidos pela dinimica de toda a estru- fura social. HA inclusio de tendéncias contraditérias derivadas de conflitos & estratégias entre atores sociais que representam interesses ¢ valores opostos. Ademais, os processos sociais exercem influéncia no espago, atuando no ambi- ente construido, herdado das estruturas socioespaciais anteriores. Na verdade, espago é tempo cristalizado. Para abordar tal complexidade nos termos mais, simples possiveis, vamos prosseguir passo a passo. (© que espagu? Ko tisiea, espago mio pode see definide fora da dinamiea da matéria. Em teoria social, espago nio pode ser definido sem referéncia is priticas sociais. Como no passado jé me dediquei a este campo de teorizagio, ‘ainda abordo o tema admitindo que “espago & um produto material em relagdo a ‘outros produtos materiais — inclusive as pessoas — as quais se envolvem em relagSes sociais [historicamente] determinadas que dio a0 espago uma forma, 436 ( espago de Muxos uma fungdo © um sentido social”. Em formulagio convergente e mais clara, David Harvey, em seu recente livro The Condition of Postmodernity, afirma que, sob uma perspectva materiaista, podemes argumentar que concepg6es tem- porais © espacias objetives sio necessariamente criadas por meio de prit- ‘ca processos materiais que servem para reproduzit a vida social. Um ‘axioma fundamental de minha investigagio & que o tempo ¢ 0 espago no podem ser entendidos independentemente da agdo social.”™ essa forma, temos de definir, em nivel geral, 0 que € espaco do ponto de vista das priticas sociais; depois, deveremos identificar a especificidade his- torica das préticas sociais, por exemplo, as da sociedade informacional que é a base do surgimento ¢ consolidagdo de novas formas e processos espaciais. Do ponto de vista da teoria social, espago ¢ 0 suporte material de priticas sociais de tempo compartlhado, Imediatamente acrescento que qualquer supor- te material em sempre sentido simbélico. Por priticas sociais de tempo compar lthado, refiro-me ao fato de que o espago reine essas prticas que slo siml- tineas no tempo. £ a articulagdio material dessa simultaneidade que da sentido 40 espago vis-a-vis a sociedade, Tradicionalmente, essa idéia foi assimilada & contigidade. Mas ¢ essencial que separemos 0 conceito bisico de Suporte mate- rial de priticas simultaneas da nogio de contigiidade, a fim de justificar a pos- sivel existéncia de suportes materiais de simultancidade que néo dependam de ccontigiidade fisica, visto que ¢ exatamente este 0 caso das priticas sociais pre- ddominantes na era da informacdo. Afirmei, nos capitulos anteriores, que nossa sociedade esté construida em tomo de fluxos: fluxos de capital, fluxos da informagao, fluxos de tecnotogia, fluxos de interagio organizacional, fluxas de imagens, sons e simbotos. Fluxos nl representam apenas um elemento da organizacio social: si0 a expressio dos processos que dominam nossa vida econémica, politica e simbdlica. Nesse caso, © suporte material dos provessos dominantes em nossas sociedades seré 0 con Jjumto de elementos que sustentam esses fluxos e propiciam a possibilidade ma- terial de sua articulacdo em tempo simultinco. Assim, propono a idéia de que 1 uma nova forma espacial caracteristica das praticas sociais que dominam & ‘moldam a socicdade em rede: 0 espaco de Muxos. O espago de flucos & a or- ‘ganizapao material das praticas sociais de tempo compariithado que funcionam por meio de fluos. Pot fluxos, entendo as seqiéncias intencionais,repetitivas e programéveis de intercdmbio ¢ interacdo entre posigSes fisicamente desarticu- ladas, mantidas por atores sociais nas estruturas econdmica, politica e simbélica da sociedade. Priticas sociais dominantes so aquelas que esto embutidas nas estruturas sociais dominantes. Por estruturas sociais dominantes, entendo aque- espace de Mares a7 les procedimentos de organizag6es e instituigdes cuja ldgica intema desempenha papel estratégico na formulacdo das priticas sociais ¢ da consciéncia social para a soviedade em geral ‘A abstraglo do conceito de espaco de fluxos pode ser mais bem-entendida com a especificacéo de seu conteido. O espago de fluxos, como a forma mate- rial de suporte dos processos e fungdes dominantes na sociedade informacional, pode ser descrito (em vez de definido) pela combinagio de, pelo menos, ts camadas de suportes materiais que, juntas, constituem o espago de fluxos. A primeira camada, 0 primeiro suporte material do espago de fluxos, & realmente constiuida por um circuito de impulsos eletrénicos (microeietrdnica,telecomu- nicagdes, processamento computaciona, sistemas de transmissto e transporte em alta velocidade — também com base em tecnologias da informaco), formando, em conjunto, a base material dos processos que verificamos serem estratezi- camente cruciais na rede da sociedade. Esse ¢, na verdade, um suporte material de préticas simultineas. Portanto, é uma forma espacial do mesmo modo que poderia ser “a cidade” ou a “regio” na organizagio da sociedade mercantil ou a sociedade industrial, A articulagdo espacial das fangSes dominantes ocorre em nossas sociedades na rede de interagdes, possibilitadas pelos equipamentos de tecnologia da informagao. Nessa rede, nenhum lugar existe por si mesmo, i que as posigBes sio definidas por fluxos. Conseqiientemente, a rede de comuni- ‘ago € a configuragao espacial fundamental: os lugares no desaparecem, mas sua légica © seu significado slo absorvidos na rede. A infra-estrutura tecno- Togica que constréi a rede define 0 novo espago como as ferrovias definiam as “cegides econémicas” e os “mercados nacionais” na economia industrial; ou as regras institucionais de cidadania especificas das frontcras (¢ seus extritos tec- nologicamente avancados) definiam as “cidades” nas origens mercantis do capi- talismo c da democracia, Essa infra-estrutura tecnoldgica € a expressio da rede de fluxos, cuja arguitetura © eonteiido sv determinados pelas diferentes formas de poder existentes em nosso mundo. A segunda camada do espaco de fluxos & consttuida por seus nés (centros de importantes funcdes estratégicas) e ceniros de comunicagéo. O espaco de ffuxos no & desprovido de lugar, embora sua estruturalogica 0 sea Est Toca zado em uma rede eletrinica, mas essa rede conecta lugares especificos com caracteistcas sociais, culturais, fisicas € funcionais bem-definidas. Alguns Iie gares sio intercambiadores, centros de comunicagao desempenhando papel co- ordenador para a perfeita interagio de todos os elementos integrados na rede. Outros lugares so os nés ou centros da rede, isto é, a localizagdo de fungdes estrategicamente importantes que constroem uma série de atividades ¢ organi- zagdes locais em toro de uma fungio-chave na rede. A localizacdo no né co- necta a localidade com toda a rede. Os nds € os centros de comunicagdo sepuem os expo de Mucor ‘uma hierarquia organizacional de acordo com seu peso relativo na rede. Mas ‘essa hierarquia pode mudar dependendo da evolusdo das atividades provessadss. [Na verdade, em alguns casos, alguns lugares podem ser desconectados da rede, fe seu desligamento resulta em declinio imediato e, portanto, em deterioragao econémica, social ¢ fisica. As caracteristicas dos nds dependem do tipo de fun- Bes desempenhadas por uma rede determinada, ‘Alguns exemplos de redes e respectivos nds ajudario a passar o conceit. O tipo de rede de visualizagio mais fécil para representar 0 espago de fluxos é a rede constituda pelos sistemas de processos decisérios da economia global, es- pecialmente os do sistema financeiro, Envolve a andlise da cidade global como lum processo em vez de luger, conforme foi apresentado neste capitulo, A and- lise da “cidade global” como o local de produsao da economia global informa- ional mostrou o papel decisive dessas cidades globais em nossas sociedades © a dependéncia que as sociedades e economies loeais tém das fungBes direcionais Jocalizadas nessas cidades. Mas além das principaiscidades globais, outras eco- nomias continentais, nacionais ¢ regionaistém os préprios nds que conectam & rede global, Cada um desses n6s requer uma infra-estnutura tecnoldgica ade- quada, um sistema de empresas auxiliares fomecendo os servigos de suport, ‘um mercado de trabalho especializado eo sistema de servigos exigido pela forca de trabalho liberal ‘Como ji demonstrei, o que é valido para as altas fungbes administrativas € rmercados financeiros também € aplicivel a indistria de alta tecnologia (tanto aos setores produtores de alta teenologia como aos que a utilizar, ou sea, toda 4 indistria avangada), A divisio espacial do trabalho que caracteriza a indiistria de alta tecnologia transforma-se na conexo muncial ene 0s meios de inovaedo, os Jocais com indistrias cuja mio-de-obra é qualificada, a linhas de montagem e as fbricas voltadas para o mercado, com uma série de conexdes inra-empresas entre as diferentes operagGes, nas diferentes localizagdes a0 longo das linhas de pro- dugio; © oura série de coneades ene fungdes semelhantes de produgdo sinuadas em locais especificos que se tomam complexos produtivos. Nés direcionais, locais de produgdo ¢ cents de comunicacio so definidos a0 longo da rede e aticulados em uma légica comum pelas teenologias de comunicacao e pela fabricagio inte- grada flexivel, programsvel, baseada na microeletrOnica [As fungées a serem preenchidas por cada rede definem as caracteristicas dos lugares que se tomam seus nés privilegiados. Em alguns casos, os locais mais improvaveis tomam-se nés centrais por causa da especificidade historica que acabou centrando uma rede determinada em tomo de uma localidade es- pecifica. Por exemplo, era improvavel que Rochester, Minnesota ou o subirbio parisiense de Villejuif se tornassem 0 nds centrais de uma rede mundial de pesquisas e tratamentos médicos avancados, mantendo estreita interagdo entre O espago de fuxos oy si. Mas a localizagao da Clinica Mayo, em Rochester, ¢ de um dos principais centros da Administragio Francesa de Saiide para o tratamento de cancer em Villejuif — em ambos os casos por razdes histéricas fortuitas — arficulou um complexo de geragio de conhecimento ¢ tratamento médico avangado ao recor desses dois locaisinusitados. Lima vez estabelecidos, esses lugares atrairam pes- quisadores, médicos e pacientes de todo 0 mundo: transformaram-se em um n6 da rede médica mundial, Cada rede define seus locais de acordo com suas fung0es e hierarquia de cada local e segundo as caracteristicas do produto ou servigo a ser processado ra rede, Assim, uma das redes mais poderosas de nossa soviedade, a producio © distribuigio de narcéticos (inclusive seu componente de lavagem de dinheiro), construiu uma geografia especifica que redefiniu 0 sentido, a estrutura ¢ a cul- tura das sociedades, regides ¢ cidades conectadas & rede." Dessa forma, na pro- dugio © comércio de cocaina, os locais de producio de coca em Chapare ou Alto Beni, na Bolivia, ou Alto Huallanga, no Peru, estio conectados as refi- narias e aos centros de gerenciamento da Colémbia, que até 1995 eram sub- sidiirios das sedes de Medellin ou Cali, E estas tltimas, por sua vez, estayam conectadas a centros financeiros como Miami, Panam, Ilhas Cayman e Luxem- bourgo ¢ a centros de transporte, @ exemplo das redes mexicanas de tréfico de drogas de Tamaulipas ou Tijuana e, finalmente, mantinham conexo com os Pontos de distribuigo nas principais éreas metropolitanas dos Estados Unidos e da Europa Ocidental. Nenhum desses locais consegue existir por si s6 nessa rede. Os cartéis de Medellin ¢ Cali ¢ seus grandes aliados norte-americanes e italianos logo estariam fora dos negécios sem as matérias-primas produzidas na Bolivia ou Peru, sem os produtos quimicos (precursores) fornecidos pelos labo- ratérios suigos ¢ alemies, sem as redes financeiras semilegais dos paraisos fis- cais e sem as redes de distibuigdo que se iniciam em Miami, Los Angeles, Nova York, Amsterdi ou La Cora, Conseqiientemente, embora a anilise das cidades globais fomega a ius tragdo mais direta da orientagio localizada do espago de fluxos em nds e centros cde comunicagio, essa l6gica ndo esti em absoluto limitada aos fluxos de capital. Os principais processos dominantes em nossa sociedade slo articulados em re- des que ligam lugares diferentes ¢ atribuem a ceda um deles um papel ¢ um peso fem uma hierarquia de geragio de riqueza, processamento de informacio e poder, fazendo que isso, em iltima analise, condicione o destino de cada local. A terceira camada importante do espaco de fluxos refere-se & organizagao espacial das elites gerenciais dominantes (e ndo das classes) que exercem as fungSes direcionais em tomo das quais esse espaco é articulado. A teoria do espaco de fluxos parte da suposigio implicita de que as soviedades so organi- zadas de maneira assimétrica em torno de interesses dominantes especificos a 40 O cspago de aos cada estrutura social. O espaco de fluxos niio ¢ a tinica logica espacial de nossas sociedades. E, contudo, a légica espacial dominante porque & a ligica espacial dos inleressew/fungdes dominantes em nossa sociedade, Mas essa dominagao io & apenas estrutural. E estabelecida, na verdade, concebida, decidida ¢ imple- mentada por atores sociais. Portanto, a elite empresarial tecnocritica e finan ceira que ocupa as posigdes de lideranga em nossas sociedades também teré cxigéncias espaciais especificas relativas ao suporte material/espacial de seus interesses e priticas. A manifestagdo espacial da clite informacional constitul outta dimensio fundamental do espaco de fluxos. O que é essa manifestagdo espacial? AA forma fundamental de dominago de nossa sociedade baseia-se na ca- pacidade organizacional da elite dominante que segue de mios dadas com sua capacidade de desorganizar 0s grupos da sociedade que, embora constituam maio- ria numérica, véem (se & que véem) seus interesses parcialmente representados apenas dentro da estrutura do atendimento dos interesses dominantes. A articu- ago das elites © a segmentagdo e desorganizagio da massa parecem set os mecanismos gémeos de dominacdo social em nossas sociedades."" 0 espago de- sempenha papel fundamental nesse mecanismo, Em resumo: as elites sio cos- ‘mopolitas, as pessoas sio locais. O espago de poder e riqueza € projetado pelo ‘mundo, enquanto a vida € a experincia das pessoas ficam enraizadas em luga- res, em sua cultura, em sua histéria, Portanto, quanto mais uma organizacio social baseia-se em fluxos aistricos, substituindo a logica de qualquer lugar specifica, mais a légica do poder global escapa ao controle sociopolitco das sociedades locais/nacionais historicamente especificas. Por outro lado, as proprias elites no desejam ou nio podem transformar- sc em fluxos, ¢as0 queiram preservar sua CoeSio social, desenvolver o conjunto de regras ¢ cédigos culturais por intermédio dos quais clas conseguem entender- se e dominar 06 outros, assim estabelecendo as fronteiras “interns” e “enter nas” de sua comunidade cultural/politica. Quanto mais democriticas forem as instituigBes de uma sociedade, mais as elites tém de tomar-se claramente distintas do populacho, evitando, dessa forma, a penetragio excessiva dos representantes politicos no importante mundo do processo decisério estratégico. Contudo, mi- nha anélise ndo compartilha a hipdtese sobre a improvavel existéncia de uma “clite do poder” & mancira de Wright Mills. Ao contririo, a verdadeira domi- nagio social provém do fato de 0s cédigos culturas estarem embutidos na estri- ‘ura social, de tal forma que a posse desses cédigos abre o acesso A estrutura do poder sem que a clite precise conspirar para impedir 0 acesso a suas rede. A manifestagdo espacial dessa ldgica de dominagio assume duas formas Principais no espaco de fluxos. De um lado, as elites formam sua sociedade e constituem comunidades simbolicamente segregadas, protegidas atris da pré- O eaparo de axos “1 pria barreira material dos pregos dos iméveis. Elas definem suas comunidades como uma subcultura em rede interpessoal ligada ao espace. Proponho a hi- pétese de que © espago de Mluxos & formado de microrredes pessoais que pro- jetam sous interesses em macrorredes funcionais em todo 0 conjunto global de interagdes no espago de fluxos. Esse é um fendmeno muito conhecido nas redes financeiras: decisdes estratégicas importantissimas so tomadas durante almo- ‘gas de negécios, em restaurantes exclusives ou em casas de campo nos fins de Semana, enquanto se joga golfe, como nos velhos tempos. Mas essas decisées serdo executadas nos processos decisérios instantineos de computadores conec- tados pelas telecomunicagdes, que podem tomar as préprias decisbes para reagit as tendéncias de mercado. Dessa forma,.os nds do espaco de fluxos incluem ‘espagos residenciais ¢ de lazer gue, juntamente com a localizagio das sedes das empresas e seus servigos auxiliares, tendem a agrupar funges dominantes em espacos cuidadosamente segregados, com ficil acess0 aos complexos cosmo- politas de artes, cultura e entretenimento, A segregacdo ocorre tanto pela locali- ‘ago em diferentes lugares quanto pelo controle da segurana de certos espagos abertos apenas &clite. Do auge do poder ¢ de seus centros culturais, onganiza-se uma série de hierarquias socioespaciais simbélicas, de forma que os niveis ad- ‘ministrativos inferiores possam refletir os simbolos de poder e apropriar esses simbolos, construindo comunidades espaciais de segunda ordem. Estas, por sua vez, também tendero a isolarse do resto da sociedade em uma sucesséo de processos hierirquicos de segregacdo que, juntos, sdo equivalentes & fragmen- tagdo socioespacial ‘Uma segunda tendéncia importante da distingfo cultural das elites na so- ciedade informacional é a de eriar um estilo de vide © de projetar formas ¢s- paciais para unificar o ambiente simbélico da elite em todo 0 mundo, conse- qienternente substituindo a especificidade historica de cada local. Assim, surge f construsio de um espago (relativamente) sceregndn no mundo ao longo das Tinhas conectoras do espago de fluxos: hots intemnacionsis cuja decoragio, do design do quarto & cor das toalhas, é semethante em todo 0 planeta para criar uma sensagio de familiaridade com o mundo interior ¢ induzit & abstragdo do mundo ao redor; salas VIP de aeroportos, destinadas a manter a disténcia em relagdo a sociedade nas vias do espago de fluxos; acesso mével, pessoal ¢ on- line's redes de telecomunicagBes, de modo que o Viajante nunca se perca; ¢ um sistema de procedimentos de viagem, servigos secretatais e hospitalidade re- ciproca que mantém um citculo fechado da elite empresarial pot meio do culto de ritos similares em todos os paises. Além disso, ha um estilo de vida cada vez ‘mais homogéneo na elite da informagdo, que transcende as fronteires cultursis de todas as sociedades: 0 uso regular de spas (mesmo em viagens) e a pritica de “Jogsing, a dietaobrigatéria de salmio grethado e salada verde com udon e sashimi rs espago de Mates como equivalente funcional japonés; a cor “de camurga clara” da parede com 0 objetivo de eriar a atmosfera aconchegante do espago intemo; 0 ubiquo laptop; & ‘combinagdo de ternos ¢ roupas esportes; estilo de vestir unissex, ¢ assim por diante. Tudo isso so simbolos de uma cultura internacional cuja identidade ndo esta ligada & nenhuma sociedade especifica, mas aos membros dos circulos em- preseriais da economia informacional em ambito cultural global. (0 apelo a conectividade cultural do espago de fluxos entre seus diferentes nds também se reflete na tend8ncia para a uniformidade arquitetSnica dos novos centros direcionais de varias sociedades. Paradoxalmente, a tentativa da arqui- tetura pos-modema de quebrar os modelos e padrdes de disciplina arquitet6nica resultou numa monumentalidade pés-moderna imposta que se tomou a regra generalizada das novas sedes corporativas de Nova York a Kaoshiung, durante (08 anos 80. Portanto, o espago de fluxos inclui a conexio simbdlica da arqui- tetura homogénea nos lugares que constituem os nds de cada rede pelo mundo. esse miodo, a arquitetura escapa da histria e cultura de cada sociedade e toma-se refém do novo ¢ admirivel mundo imaginério das possibilidades ilimitadas que cembasam 2 logica transmitida pela multimidia: a cultura do surfing eletrénico, ‘como se pudéssemos reinventar todas as formas em qualquer lugar, apenas sob a condigdo de mergulhar na indefinigdo cultural dos fluxos do poder. O encerra- mento da arquitetura em uma abstragdo historica ¢ a fronteira formal do espago de fluxes A arquitetura do fim da histéria Nomade, sigo siendo un nomada. Ricardo Bofill™ Se o espago de fluxos realmente for a forma espacial predominante da sociedade em rede, nos proximos anos a acquitenura ¢ 0 design provavelmente serdo redefinidos em sua forma, funglo, processo e valor. Na verdade, eu diria {que em toda a histdria a arquitetura tem sido o “ato fracassado" da sociedade, a expresso mediada das tendéncias mais profundes da sociedade, daquelas que rio poderiam ser declaradas abertamente, mas eram fortes o suficiente para ser ‘moldadas em pedra, em conereto, em ago, em vidro e na percepgio visual dos seres hnamanos que iriam morar,trabalhar ou participar de cultos nessas formas. Panofsky nas catedrais goticas, Tafuri nos arranha-céus norte-americanos, Venturi na cidade norte-americana surpreendentemente kitsch, Lynch nas ima- gens de cidades e Harvey no pés-modemismo, como a expressio da compressio temporal/espacial pelo capitalismo, so alguns dos melhores exemplos de uma tradigdo intelectual que utilizau as formas do ambiente construido como um dos O espago de Muxes “3 Figura 66 Centro de Kaoshiung (Fotografia: Professor Hsia Chu-joe) cédigos mais significativos para ler as estruturas basicas dos valores dominantes da sociedade."” Na verdade, no ha interpretagdo simples e direta da expresso formal de valores sociais. Mas como foi revelado por pesquisa conduzida por estudiosos ¢ analistas © demonstrado por trabalhos de arquitetos, sempre houve uma forte conexdo semiconseiente entre o que a Sociedade (em sua diversidade) dizia e 0 que os arquitetos queriam dizer.* Isso ja ndo acontece mais. Minha hipétese & que 0 surgimento do espago de fluxos est misturando as relagGes significativas entre a arquitetura e a so- ciedade. Como a manifestagdo espacial dos interesses dominantes ocorre em todo o mundo e por intermédio das culturas, 0 abandono da experiéncia, historia ¢ cultura especifica para a formagdo de significado esté levando & generalizagao dda arquitetura aistorica, acultural Algumas tendéncias da “arquitetura pés-modema”, a exemplo das repre- sentadas pelos trabalhos de Philip Johnson ou Charles Moore, sob o pretexto de derrubar a tirania dos cédigos, como 0 modemnismo, tentam cortar todos 0s la {508 com ambientes sociais especificos. O modemismo fez 0 mesmo em sua Epoca, mas como a expresso de uma cultura de raizes histéricas que afirmava a renga no progresso, tecnologia e racionalidade. Ao contririo, a arquitetura pos- ‘moderna declara o fim de todos 0s sistemas de significados. Cria uma mistura de elementos que procura a harmonia formal por provocagio estilistica trans- a (© expago de faxoe Figura 6.7 Saguio do aeroporre de Barcelona. Fonte: Deseno original de Ricardo Bofill eproduzido com sua permissio historia, A ironia toma-se 0 modo preferido de expresso. No entanto, 0 que a maior parte do pos-modemismo realmente faz @ expressar, em termos quase diretos, «nova ideologia dominant: o fim da historia e @ suplantagao de lugares no espago de fluxos.” Porque, apenas se estivermos no fim da historia, podere- ‘mos misturar tudo 0 que conhecemas antes (ver figura 6.6: Centro de Keoshiung). Como nio pertencemos mais a nenhum lugar, a nenhuma cultura, a versio ex- ‘tema do pés-modernismo impée sua ligica codificada de ruptura de cédigos ‘em qualquer lugar onde se construa alguma coisa. Sem divida, a libertagio dos cédigos culturais esconde a fuga das sociedades historicamente enraizadas. Nessa Beripectiv, 0 peimodemismo pera ser onsderado a arguitsura do espago Quanto mais as sociedades tentam recuperar sua identidade além da logica global do poder nio controlado dos fluxos, mais precisam de uma arquitetura ‘que exponha sua realidade sem imitar a beleza de um repertrio espacial trans- histérico. Mas, ao mesmo tempo, @ arquitetura excessivamentesignificativa que tenta passar uma mensagem muito definida ou expressar 0s cbdigos de uma determinada cultura de maneira direta & uma forma primitiva demais para poder penetrar nosso saturado imaginirio visual. O significado de suas mensogens seré perdido na cultura do surfing que caracteriza nosso comportemento simbélico, E or isso que, paradoxalmente, @ arquitetura que parece mais repleta de signifi cado nas sociedades moldadas pela Logica do espago de fluxos & o que eu chamo de “a arquitetura da nudez”. Ou se, a arquitetura eujes formas sio tao neutas, tio O espago de axes ats puras, to didfanas, que ndo pretendem dizer nada. E a0 nada dizer, elas com- param a experigncia com a solitude do espago de fluxos. Sua mensagem & 0 silencio. Para melhor comunicaglo, usarei dais exemplos retirados da arquitetura espanhola, meio arquiteténico amplamente reconhecido na vanguaréa do design da atualidade, Ambos dizem respeito, ndo por acaso, 20 design de importantes nds de comunicagao, onde 0 espaco de fluxos se materaliza de forma efémera As festividades espanholas de 1992 motivaram a construgio de grandes edi ficios funcionais projetados por alguns dos melhores arquitetos. Assim, 0 novo aeroporto de Barcelona, projetado por Bofil, é a simples combinagao de um bonito piso de mérmore, fachada de vidro escuro e vidro transparente separando paingis de um imenso espago aberto (ver figura 6.7). Nenhum éisfarce do medo e ansiedade que as pessoas experimentam em um aeroporto. Sem carpetes, sem salas aconchegantes, sem iluminaca0 indireta. Em meio a beleza fri desse acro- porto, os passageirs tém de encarar sua terrvel verdade:estio sozintos em pleno espaco de fluxos; podem perder sua conexo; esto suspensos no vazio da tran- sigio. Estio,lteralmente, nas mos da Iberia Lineas Aéreas. E nfo ha escapatéria, ‘Vejamos outro exemplo: a nova estacdo Madrid AVE (trem de alta veloci- dade) projetada por Rafael Moneo. & simplesmente uma estagio antiga e ma- ravilhosa, reformada com o maior cuidado ¢ transformada ern um parque in- temo com palmeiras e muitos passaros que cantam e voam no espago fechado a estagio, Em uma estratura préxima, adjacente a esse espace lindo e mone rental, fice a verdadeira estagdo com o stem de alta velocidade, Portanto, as pessoas vio & pseudo-estagio pata visita, passear pelos seus diferentes niveis fe caminhos, como se fossem a um parque ou muse, A mensagem mais do que @bvia € que estamos em um parque, néo em uma estacdo; que na velha estagdo nasceram drvores ¢ passaros, operando uma metamorfose. Dessa forma, 0 trem de alta velocidade & que fica estranho nesse espaco. E, na verdade, ¢ esta a pergunta que todos fazem: o que um trem de alta velocidade esté fazendo ai, s6 para ir de Madria Sevilha, sem nenhuma conexdo com a rede de alta velocidade européia, por um eusto de USS 4 bilhdes? O espetho quebrado de um segmento do espaco de fluxos fica exposto, e 0 valor de uso da estagdo & recuperado em tum design simples ¢ clegante que nio diz muito, mas mostra tudo, Alguns arquitetes famosos como Rem Koolhas, 0 projetista do Centro de Convengées Little Grand Palais explica a necessidade de adaptagio da arqui- tetura 20 processo de deslocamento e & importncia dos nés de comunicagio na cexperiéncia das pessoas: sem diivids, Koolhas v8 seu projeto como uma ex pressio do “espaco de fluxos”. Ou, em outro exemplo de uma crescente auto- conseientizacio dos arquitetos sobre a transformagao estrutural do espago, © a6 CO cspago de aces Figura 6.8 Sala de espera da D. E, Shaw & Company: sem ficus-benjamins, nem sofis modulares, nem quadros com motivos empresaiais nas paredes. Fonte: Muschamp (1992), design que ganhou o prémio da Instituto Norte-Americano de Arquitctos, pro- jetado por Steven Holl para os escritérios da D.E. Shaw & Company, na West 45M Street de Nova York, oferece — nas palavras de Herbert Muschamp — uma interpretacdo poética de..espago de fluxos...O design de Holl leva os escritéios da Shaw a um_ lugar lo novo quanto a teenologia da informagio que pagou sue constr «0, Quando entramos pels porta da D.E. Shaw (Figura 6.8] sabemos que no estamos na Manhattan dos anos 60 nem na Nova Inglaterra Colonial. [Nesse sentido, deixamos até grande parte da Nova York de hoje bem pare tris. Em pé dentro do dtrio de Holl sentimos nossa eabega nas muvens © snossos pésno a! B verdade que podemos estar atribuindo « Bofill, Mono e até a Holl dis- cersos que nio slo dele. Mas o simples fato de que sua arquitetura permitiria que eu, ou Herbert Muschamp, relacionéssemos formas com simbolos, com fun- G5es, com situagdes sosias significa que sua arqutetura contida e austera (em CO espage de Muses 47 estilos formalmente diferentes) € repleta de significado, Na verdade, arquitetura « design — porque suas formas ou resistem & materialidade abstrata do espago dominante de fluxos, ow a interpretam — poderiam torar-sc dispositivos essen- ciais de inovagio cultural e autonomia intelectual na sociedade informacional através de duas avenidas principais. Ou a nova arquitetura consiréi os palicios dos novos senhores, assim expondo sua deformidade escondida atris da abs- tragdo do espago de fluxos, ou cria raizes nos lugares, portanto na cultura e nas pessoas." Em ambos os casos, sob formas diferentes, a arquitetura ¢ o design podem estar cavando as trincheiras da resisténcia para a preservagio do signifi- cado na getagio do conhecimento. Ou, o que & a mesma coisa, para a con- ciliagdo da cultura e da tecnologia Espago de fluxos ¢ espaco de lugares (0 espaco de fluxos no permeia toda a esfera da experiéneia humana na sociedade em rede, Sem diivida, a grande maioria das pessoas nas sociedades tradicionais, bem como nas desenvolvidas vive em lugares e, portanto, percebe seu espago com base no lugar. Un lugar é um local cuja forma, fungao e signif cado sio independentes dentro das fronteiras da conigiidade fsica. Por exem- plo, o bairro de Belleville em Paris & um lugar. Belleville foi, como para tantos imigrantes em toda a sua historia, meu onto de entrada em Paris, em 1962, Exilado politico com 20 anos de idade © sem muito a perder exceto meus ideais revoluciondrios, recebi abrigo de um trabalhador espanhol do setor de construgio, lider sindicalista anarquista, que ime apresentou & tradigd0 do lugar. Nove anos mais tarde, dessa vez como 50- jlogo, eu ainda andava por Belleville, atuando em comités de trabalhadores imigrantes ¢ estudando os movimentos sociais contra a renovagio urbana: as, ltas do que chamei de La Cité du Peuple, relatadas em meu primeiro livro.™ ‘rinta anos apés nosso primeiro enconto, Belleville e eu mudamos, Mas Belleville continua sendo um lugar, enquanto receia que eu mais parego um ux. Os novos imigrantes (asiticos, iugoslaves) uniram-se a uma antiga leva de judeus, tunisianos, mugulmanos do Maghreb e pessoas do sul da Europa — os suces- sores dos exilados intra-urbanos empurrados para Belleville no século XIX pelo projeto do prefeito Haussmann, para a construgio de uma Paris burguesa. O proprio bairro de Belleville foi atingido por virias ondas de renovacdo urbana, intensificadas na década de 70." Sua paisagem fisica tradicional de subirbio pobre, mas harmonioso ¢ hist6rico, foi misturada com pés-modernismo plistico, modernismo barato ¢ jardins saneados em meio a casas ainda de certa forma em a8 © espace de furor af A oul fs Figura 6.9 Um lugar urbano: Rambla de les Flors. Barcelona, 1996 Fotografia: Olga Torres. rulnas. E assim mesmo, Belleville em 1995 é um lugar claramente identficdvel, tanto na aparéncia quanto no conteddo. Comunidades étnicas, que freqientemente

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