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ME E-CEREB FILOSOF FUNDAMENTOS PARA A COMPREENSAO CONTEMPORANEA DA PSIQUE mente NT ROG < ia PMs 0 yy nae WW ssse 0) Gil ey Cae) INA) est Was (HTM Seay cL RETRATAR A CONDIGAO ANGUSTIANTE DO INDIVIDU E DA SOGIEDADE SOB 0 CAPITALISMO CONTEMPORANEO iin ADORNO esi) aay ae) , a WT 4 otters) OP Oe mie Me es Mya oes ~ Lanwotoce om EDITORIAL ARMAS DA CRETICA. srebro 5 primeiros seis volumes dk sétie Mente, Filosofia mostraram 1 importincia clas reflexdes filo- sOficas para os estudos do psiquismo. Tal proposta € etomada ¢ aprofundada com 0 langamento de Mente, Cérebro & Filosofia ~ 0 século XX, aum didlogo cada vez ais intenso € enriquecedor entre as diferentes comentes da filosofia, da psicologia e da psicanilise contemporineas, Numa indicacao da continu dade entre ss duas séries, a numeragio de Mente, Gérebro & Filosofia - 0 seeulo XX vai de 7 a 12. jas cada colegio pode ser lida separadamente. sie volume aborda a contiibuigo para pensimento. contempo- sineo feita por Max Horkheimer, Theodor Adomo © outros integrantes Social, fundado na década de 20 na cidade de dlo Instituto de Pesqui Frankfurt, Um dos pontos que unificam os diversos autores que sto abar- cados com a etiqueta “Escola de Frankfurt” & a tentativa de eriar um nove paradigma teérico capaz de pensar criticamente a vida social mascada pelos antagonismos produzidlos pelo capitalismo de entio. Seus frutos mais fascismo ¢ a Segunda Guerta Mundial, que, aliis, acarretaram a transferéncia do instituto para a Suiga e depois amargos foram a ascensio dona para os Estados Unidos, 0 exilio de muitos de seus integrantes € a morte de um dos mais brilhantes membros dessa corrente: Walter Benjamin. Para configurar o novo paradigm, foi realizada uma nova leitura de filésofos como Hegel ¢ Marx, assim como foram assimilados aspectos eri- ticos de fildsofos como Schopenhauer ¢ Nietzsche, A soma dos diversos cesforcos empreendidos com esse fim resultou naquilo que ficou conhecido, por volta clos anos 30, pelas maos de Horkheimer, como Teoria Critica A tradigio do pensamento da Escola de Frankfurt - ou em conexdo — manteve uma relagio ampla também com a psicandlise. A riqueza desse entrelacamento se mais ou menos direta com os seus interesse manifestaria sobretudo nas andlises de Theodor Adorno, Erich Fromm ¢ de um pensador to particular como Walter Benjamin. As categorias sic contemporinea, franquearam espago para perceber 1s maze analitieas ajudaram @ selletir sobre diversos aspectos da sociedade nas quais © individuo ¢ a sociedade se encontram quando es molded pela cir- culagio e reproducio do capital Ney BRANCO DE MIRANDA own em flesofav stan Consaitor de Mente, Cérebro & Filsofia ~ 0 século XX MENTE-CEREBRO FILOSOFIA ‘muestra be DETOR GER: et ta DETER AUTO Erion DETORADO GRUPO CNHECMETO Am Cura ORGAO NET, Reno FLOSOAR DORs nur aes (ONGLTON Ney Sac en EXTRA DATE Smee cea ire DSSSTEMTESDE ARE uaa Fes. ocala ht Tats Ses de lar. PESOUSAOOIDGRE Sie Nas acre. Neca, hee Fos un ose iss Me & eb, pcan sown Spry bat Eo Ut, cm cme ener lords a 688 sae ce Sei rat, ha Gin 42g 3 —Prbias Sin Pauo $0542 CO, 11271 8100 Fax) 309 come excunvo ore Cane, hoon Coe Fan Pat legs san uum sr BS er Pio ATES ara Nero a DEASSATIRAS Deed 5 ni as 6 Ae 3 VENDAS AAAS: Ca Lames re u.eo ward CERENTE Mra Met FEDATOR. Stra er ruwcas ecesTiO DBTOR MONS Goes CENTRAL arENDIVENTO 0 ASANTE BRIS (1) 305-6300 aendmeniovetoetora coms NODS ASSEUTURAS GowcassnarOetoutoralcomb) DRESAVULSAS EESPECAS ftensanlsxOdetoxctlcom ty) gor, 8 92 45-9586-88 Ostia com excise rate BRAS: DRAP Sua Dal Ker Sinul, 167, fare aes pose se soletaés 2 jal, central de ‘iota lr - 1) 2864200- peste worded com. oa read tina ai aeeta doses paige, IFRESSO:eiica Parma [DRETOARESPONSAVEL: Ate Masta MA NER FIPP Da Petty cones Ceo fs rsa parry cia Re Ra ee preety ererany Peery pesrerireretine Certo Pos rors Perris Pious DIALETICA DO WALTER BENJAMIN EDITORIAL ESCLARECIMENTO. 4 questo dla memoria & Adorno ¢ Horkbetmer insepanivel da reflexiio ‘examina o tmpulso sobre a narragies de ume Nonssnacx 4 mortficagao do bome bist6ria ficcional, des MAX HORKHEIMER sua manifesiagao prépria vida, de wma epoca O formuttador da Teoria «ao tongo da historia ‘ut de une povo ica e do programa de materialismo interdiseiplinar dl stitute Pesquisa 5 > wasn ‘THEODOR ADORNO: ‘05 SONHOS DA HISTORIA MINIMA MORALIA nbora nacabado, 0 ‘A CRISE DATEORIA ‘pecente € obj te andlie dia besorta em Passigens critica, rum text porta ima obra dem rc BENJAMIN: EXPERIENCLA si ERICH FROMM EVIVENCIA quatro tipos psico- Jogos enconiridos mais comumente ni sociedade da época: a) dependéncia masoquisa de outros ou de uma (sa) storia; b) explonio e degradagio sidica dos outs com o fim de ampiar © sentimento de poder do. suieto; «) destatvdace; €) adaptaclo imefeida a norma e pressdes socks. O wlio tipo & tido como earacerisieo do. capitals- ‘mo nore-americano; fas manifestagdes neurdicas ¢ agressivas prevaleceriam. nna Europa, antes © depois do fascismo, FEsses tpos servido part que Fromm analse & ‘psicologla do nazismo" © as caracersicas dos Estados. Unidos 10 ‘comego dos anos 40. © nazismo & pensado com a combi- nagio de impulos sidias & masoqusts E quase desnecessétioenftizar a importncia da letura de Erich Fromm ara os inteessados nos estudos do psiqusmo, Basta lembrar que ee, ‘ormado em socologia, psicoogia € filosfia, pscanalsta eescipuo de Freud, ‘eve um papel decisivo na aproximagéo centre a Teoria Grea frankfurtana e 1 concetos da psicaaise, Numa evidéncia dessa aproximagéo, 0 Instituto Psicaalitioo de Frankfurt, funda em 1829 por Fromm e outa psicanalisas, funcionava nas instalagées do Instituto de Pesquisa Socal Pera mim, porém, a obra de Fromm ‘em um significado adicionak: ea srve de passeporte para uma viagem ao passado. ‘Meu primeir contato com Fromm ‘correu ao fugar uma prateleia de livros empoeirados no apartamento em que viv durante mina infncia © adolescéncia, endo por referéncias, ‘20 autor nos inmeros textos los nessa época @ nas anos de formacéo univrsitiia Nas estantes mais alas, armazenados nae firs de trs,fcavam ‘guartados os livros menos consuttados da biblioteca familia; reunida por dois 56 MENTE, CEREBRO 6 FILOSOFIA ¥ whew. pais universitrios sem nenhuma ligagdo ‘com a comunidade de psicéiogos e psleanalistas, Al na déceda de 90, encontrei alguns livros de Erich Fromm, Nessa biblioteca altamente seleionad, tanto em razao da falta de recursos financeiras quanto da fata de espago, havi trés os do autor, adqitdos por meus pais devido 20 ieresse nos temas tratados, mas também, com toda a certeza, em funcéo do renome de Fromm nos anos que ciam, Ao escrever estas linha, tenho ‘ante de mim os exerplares da época de (med a literdede, Andis do homeme Psicandlse da sociedede contemponea, ‘que estéo entre os mais famosos e mals treluzidostrebaltos do autor, Escrever esta breve introdugdo a0 pensamento de Erich Fromm, além de servir 2s letores interessads em compreender as relagées entre psicanlise Teoria Critic, serve a um objetivo eminenterenteprvado, a saber, fazer ‘arqueclogia da pequena biblioteca de rina familia, Formada entre os anos 60 @ 80 peta primeira geragao univesitéia dos Rodriguez, esta biblioteca, hoje misturada 20s lvos que venho adquirindo ao longo os anos, esta na origem dos pendores Intelectuais que, tempos depos, me levarem a escrever este texto Por todas essasrazies, a0 falar de Erich Fromm, falo de uma pessoa de case; de um autor em que esbarrei durante as leituraserdticas da adolescéncia e que volte a encontrar nos estudos para meu doutorado em filosofia dedicado, justamente, & Teoria Critica, fo adotar esse forma de escrita, em ‘que meméria pessoal e temas de teoria deixamtse espelhar uns nos outros, pretendo ser fel as idias de Fromm e a Teoria Critica, paraa qual a opresséo sobre os homens se crstliza em formas {de dominagéo politics e econdmica, mas ‘também na supressio da individualidade € da espontaneidade dos agentes sooias, justamente para dar conta desse ponto de extrema atualidade, a relagdo entre indviduo e emancinagao social, ene psiqusma e revolugao, que rich Fromm dedicara seus maiores esforgos, una cartera intelectual niciada nos ‘anos 20 do século passado @ encerrada com sua morte em 1880, 2s 80 anos. sremeroast smas_no hd no livre uma explicagio persuasiva des se histérica € socioecondmica, No que diz respeito 2s patologias da sociedace capitals nonte- americana, a explicacio € mals convin- cente: 2 completa comercalzagio da vida provoca efeitos devastadores sobre 1 seres hummnos e sobre a sociedad Tudo fica 3 venda, sentimentos genuinos ‘80 suprimidos ¢ a percepgao humana & manipulada pelos meios de comunicacio, sempre pera canformarse & ortlem vigen- te. O mundo se apresenta como fragenen- tado e impassvel de mudanga,perdende se completamente a visio do todo, Diante desse quadro desolador, pare- ce mo haver sta para @-humanidade O ddevir social € identificado por Fromm coma desintegrado do human: no lvro nao hé sinal ou indicagio de qualquer possibilidade de mudancas positvas. A ‘www mentecerebro.com.br A sexualidade pode estar associada 4 morte, como mostra Klimt em sua tela Judite despeito disso, hii nele a esperanga de ‘que mudangas acontegam. Para Fromm, clas seriam resultado da retomada, indi vidual e coletiva, da espontaneidade, ou soja, da aco humana auténtica e criativa, ‘Tais mudangas deveriam se dar a par de aleragdes na estrutura socioecondimica, voltadas para a planificago da econo- mia, Esta deveria ser desenhada para saisfazer os interesses de todos, em contraste com © capitalismo inracional, smarcado pela manipulacio e pela explo- ragio do homem pelo homem. UMA QUESTAO DE SANIDADE -Ap6s esta longa exposilo, espera que os leftoresconcordem que 0 pensarmento de Erich Fromm no merece ficarrelegido a0 passido, Com eft, alguns de seus argumentos 16m fotes marcas dos acon tecimentos de Segunds Guera Mundial € por iso mesmo, slo profundamente pessimists, No entar, tanto no plano da teoria manasa. quando no campo da picnilise, as questes abordadas por Fromm permanecem incmodas. © estu- do psicaraico dos fenémenos socais com a utilzacio do conceito de carter, 2 ertica ao conceit freudano de pulsio de mone seus desdobramentcs (em especial a historicizagho € relavizagio os conceitos freudianos e sua ligagio com a emaneipagio humana), o cariter supostamente adapraivo e conformistn dda terapia.psicanaiica, entre outros temas, fazem dele um autor bem interes- sanve pari letor contemporineo Nu nots mus pessoal, esse elenco de temas problemas teicos permite ‘que ex compreends melhor 0 apelo que seus livros ivram para meus pais, ecm admits na universidade, ¢ para mim, um letor adolescente; desorentado, mas exuremumente vorzz. Os us livros de Fromm jazem neste memento na minha freme, juntameme com pedagos de con- vers, observes, cts alguns fas & ariudes que parecer revelar deseos ¢ dis posigbes de carter, perfeios par fsa (© HOMEN NO CAOS BO CAPITALISM MODERNO 57 visas das concepgbes de Erich Fromm. Este texto revela 0 desejo de evitar que minha meméria, que também € a meméria de minhe biblioteca, se pera no vazio e deixe de fazer sentido em minha vida, obscurecida por compro- rissos de trabalho, problemas familiares fe mais tantas outras exigencias da vida adulta © (pés) moxiema, Da mesma forma, os escrits e, principalmente, os problemas abordados por Exch Fromm precisam ser discutidos « tatados peta sociedade contemporinea. A meu ver, tal necessidade no se lign apenas 20 interes intelectual de escrever ¢ esudar ‘um autor importante; tampouco 20 dese- jo deste letor,aftivo e enviesado, Trata- se de uma questo de sanidace. @ Jost rongo RONG en de {Gnesi Pnk eden Bea {Vane stata dconps) yest ora debage Bia Die {i nda Gio nea ne Dieloe enact CoB eee Plaeaneto— Gp, fee ee oe Fat (Dra ac) Dien de el iad {Ren eo mode ems er we a) (0 PONTO DE PARTIOA * Psicandlisee eancipaio na Toa rita. Ira Luiza Manne Curso Tia (rea Pasi 2008, © Teoria Cia epsicandie Seca Paulo Poutnet Tengo resi, 1968, ‘© Afseoado Frankfurt A ist, ‘osemvovimanto toric sigifeagso oiica Ao Wiggers, Of, 2002 CD ESSENCIAL 00 AUTOR. "© 0 dogma de Cristo Ech From 1, 1978 The working lass in Weimar Gemany 2 psjcolosical and sorolageal study Ech From. Hana, 1964 edo aliverdade. ch Form. 1,198, © Pecans da sociedad contmporine, teh Fromm, Zaha, 1976. Ter cu se? En Fam. L0, 1987, PARA BAIS LONGE © Prophetic analyst Ech Fromm's ‘conbutos to psychoanajsis, Maurice Catia, ch Fromm, Michael Maceo. son Benson, 186, ih Fromm: his fe and ideas. ane Fur. Conénuu erator Pubisting Group, 208, © Andlse do carder Vifeln Rech. Marins Fores, 2001, Wa [cies Benjamin Para Benjamin, a questo da memoria € inseparavel de uma teflexao sobre anarracao: de uma. hist6ria ficcional, da propria vida, da hist6ria de uma época ou de um povo EM SINTESE ‘ft anigo mosia como, moa de Waller Berjani, «probes da memria& Anseperel a queso da narra teri hse, no send dehisoriogai, ‘Narra hii identdade sto concetns qe soem wansionages ives gas is tralorneages isrcaseecondmias mas als Modemidade econtemporancade se ‘eracerizam por ua del dade crescent ‘denamar ede embrar Suge nos formas de membre de nara cyjos paradigasterios eso primes dos de Freud de Prout, "WE ISAAEL MUSEUM, SELLE OR JEANNE MARIE @GNESIA NUMA casa Do isicto DE ataio de 1940 a sua amiga Gretel Adorno (esposa de Theodor W. Adomo), Walter Benjamin comenta seu texto recém-escrto, intitulado “Sobre 0 conceito de historia”, dizendo que nao pensa em publicé-lo ainda porque, nessa prime ra versio, poderia acarretar muitos mal-entendidos; e anuncia: “A questio do lembrar (e do esquecer) vai me ocupar ainda durante muito tempo”. Ora, esse texto, as famosas “Teses", foi o tiltimo ue escrevev, Em junho de 1940, o exércto alemo ocupou Paris, Refugiado na cidade desde que 0 nazismo chegou ao poder na Alemanha (em 1933), Benjamin fugiu no ihimo momento para fo sul da Franca, ainda no ocupado. Tentou de la atravessar 2 pé os Pireneus € chegar 4 Espanha. Dali teria embarcado para 05 Estados Unidos, onde 0 esperavam Adorno ¢ Horkheimer, que mantinham no exilio o Instituto de Pesquisa Social (nticleo da chamada “Escola de Frankfurt”). A fuga clandestina fracassou na fronteira entre a Franca ¢ a Espanha, Faltava a Benjamin um “visto de saida" da Franca, que ele, na sua condigao de refugia- do, de judeu alemio de esquerda, jamais conseguiria do governo colaboracionista de Vichy. Desesperado, Benjamin suicidou-se ‘em Port-Bou, na fronteira espanhola, em 26 de setembro. 39 3ENJAN Qual teria sido o desenvolvimento da questio do lembrar © do esquecer no seu pensamento? Digo desenvolvimento Porque qualquer leitor de seus eserios, mesmo inicante, sabe que tal problema atravessa sua obra. Ela se coloca em dois contextos principas: um contexto ‘que podemos chamar de te6ricoriteriio, ligado 2 teoria da namagio e da transfor magio dos génerosliterdtios,reflexto evie Casaea 4 sone Passes. Poatce © easto Suez. ‘ofeavo nsavrdwo a remucsvas Rizr LixgiamTo De sux TRABUCO Do PRIERO YonuMe De Zi csc bo Taito rent, DE PROUsT. 194 Com & Tos DO roDER FELD Pat Pans. ConA 4 Ear (Gc bE, VERSO BIEN, De Wsivcu eu Besa rR vow vs 1900. Tonto vo IsstruT0 be Prsaust Soa. ramen 4 vERso HRANESA De on 2 am a Eta Dest RIVE AS TRS "SOME O CONCEITO Dm HISTOR, ADDS \ BRIROTA DA ERAN Nb Sect Guta MUNDIAL, Texts LGR PARA ESPANA BAS RIO Ao Sem. SFORUADO De QUE Sea SSTIEGUE A POL NAT, Baagans COMETE SIDI, (0 HOMEM NO AOS DO CAPITALISMO MODERNO 65 BENJAMIN ~ , receptividade interpretada agora nao fem termos de inércia, mas em termos positives de disponibilidade atenta. VERDADE FRAGIL O inicio de Am busca da tempo perdido pode ser lido como a ilustrag4o exem- plar desse processo de desagregaclo de uma concepdio classica do sujeito cconsciente e soberano € de ums mem6- ria obediente, E exatamente isso que Benjamin, leitor € tadutor apsixonaco de Proust, ressalta, Nao se trata de tentar aleangar uma lembranga exata de um momento do pasado, como se esse fosse uma subsstincia imutivel, mas de estar atento as ressondincias que se produzem entre passado € presente, entre preseme € passido, aquilo que Benjamin chama de “experiéncia’ com © pasado, Enquanto a historiografia “purguesa’, 0 historicismo. procuraria estabelecer “a eterna imagem do pas sado”, descrevé-lo “como ele realmente foi’, postulanco sua identidade substan- cial, como se se tratasse de um objeto 66 MENTE, CEREBRO ¢ FILOSOFIA Quem pretende se aproximar do prdprio passado soterrado deve agir como um homem que escava’ observou Benjamin atemporal, a historiografia critica de Benjamin busca uma nova apreensio conjunta do passado e do presente, uma intensficagto do tempo que per- mite salvar do passado outra coisa que sua imagem habitual, aquela que a rnaragio vigente da histéria ~ pessoal fou coletiva — sempre repete, aquilo que a meméria domesticada sempre conta, Procure-se salvar do passado nao ‘uma imagem eterna, mas uma imagem mais verdadeira e frigil, uma imagem fnvoluntéria ou inconsciente, no sen tido de um elemento soterado sob ‘© habio, esquecido e negligenciado, “recaleada? talvez, uma promessa que nao foi cumprida, mas que © presente pode reconhecer € retomar, Agora, 0 = presente como momento precioso desse reconhecimento no dora mals que um relimpago, cle vibra durante um atimo como, em Prous, oscilam as imagens do despertar ou estemece 0 sabor da madeleme (esse bolinho misturado 20 cxf que, no primeico volume da Busca, desencadeia uma avalanche de lem Drancas involuntiia). Essa fugacidade do momento pre- sente, que toda tradigio filosfica real: 3, deve sec = umn instante ~ suspense, para que essa outra verdade inaudita nao se perce, para que outta imagem do passado seja apreendlida no kairas do instante presente. Gesto de inter rupgo e de suspensio, gesto de cestira que caracteri2a 2 taela. do historiador materialist ertco, gesto préximo 20 de Brecht na sua teoia do teatro épico, ‘quando recomenda a interrupgao da historia e sew questionamento, para evie tar que o espectador se deixe levar pelo fluxo nanativo e se identifique 20 per sonagem, para obrgi-lo a uma toma da de posigio cfitca. Gesto que nio dleixa de lemrar a “pontuag20" analt quando o terapeuta sabe interromper © paciente no momento oportuno que ia passat despercebido. ARQUEOLOGOS DA PSIQUE Essa inferupgto.poca e redertor Cexjo modelo & a inerupgio “messi ca’, diz 0 fidsofo) questora 3 tempe- ralidade da hiss dominant e,igal- ment, soa memtria dominant. Ingaura O dese a porsblidade de um outro tempo ede um outro lembr. Beant Gita 0 gesto dos revolucionrios parsien- ses de julbo de 1830, quando aiarim nos relgios de varies monuments da cade, 20 car da ate, mateando asim seu desacordo com a cronologia em vigor No seu comentiio a esa cig, Michael Lowy compan esse episio da Revolugo de 1839 com « mantexago de ovens fdiosbnsetos em 2000, por aasto da comemorigto dos 500 anos do “descobrieno’, exempo paradig DELAGROD, A Mberdade ro, 1890, gland (s revoluclondros prtsiensesdlspararam ‘ontra os rldgios, sto 6, contra 2 cronelogl em vigor ‘www mentecerebro.com.be rmatico de uma historia eserita pelos vencedores: amados de arcos € ects, cles atiraram no gignntesco rel6gio que a Rede Globo de Televisto havis engui- do na praia para contar 6 tempo oficial do aniversitio. Benjamin retoma, portano, a cisin- fo proustana enire memviria voluntia © meméria involuntiria, mas ele o faz dentro do quacro de uma. histéra erica {és humanidade oprimida, e nio dentro de uma construgio individual e estética ‘como o narrador francés. Bsa transpo- Sicio mao € desprovida de dificuldades, ‘como as apresentam todas a8 analogias entre tajetria individual e atta cole~ tiva (um problema que os leitoes de Freud também conhecem). A nog de meméria involuntria € transposea para a edfera hstorogrfica, porque ela per- g mle uma imerupeto do feo narivo 3 dominante, mas ela € acompanhade da 2 cxigincia de uma presenga de espisto © aguda, por pare do. sujeto histéxco, ww wrmentecerebro,com.br ‘CAPA DAS Flores do mal de Baudelaire, odigio 1938. Benjamin ‘escroveu sobre o poeta ‘anes o waduaia sous versas isto €, tanto a classe ‘dominada (em 1940, Benjamin nao podia colocar em questio © conceito marxisa dléssico de classes sociais) quanto tam- bém_ 05 movimen- tos de esquerda € 0 historiador extico, de uma tomada. de conscignciaripi- da do momento de perigo e da necessi- dade de imervenca0, ssa allanga parado- sal de_dispontbili- dade € de decisto remete & estrutura paradoxal do kaos, momento de apreen- Sto de tima ocasito Xinica que se oferece a0 suit: uma opor- runidade que 0 sujeto. no procuziu, pelo menos conscientemente, mas que Ihe cube reconhecer e aprovetar Esse gesio de intervencdo citca, em Benjamin mais politica © historia, mas também ligada & narragao da pro= pria vida, como 0 mostram seus textos aulobiogrficos, aproxima 0 pensamen- to de Beajamin da busca por um novo paradigma terapéutico em Freud, Em ambos os autores temos a necessidade de uma desconstrugio da versio nar- rativa vigente, isto é, de uma menméria repetitive, para permitir a emengéncia de outras lembrancas ¢ 2 consirugio de outta histéria. Em ambos trata-se de estar atento as imagens (mnémicas) do sujeito que, até ai, nio tiveram diteito ‘nem & palavra nem @ consciéncia, que ‘ilo podiam/deviam ser lembradas, mas que posiem esclarecer os softimentos presentes € ser 0 inicio de outta possi bilidade de vida e de histéra De maneira notivel, anto Benjamin (0 HOMEM NO CAOS DO CAPITALISHO MODEANO 67 quanto Freud retomam metafora do arquediogo que procura os vestigios do passado nas diversas camadas do pre- sente, sem saber se encontraré somente aguas cacos, uma este quebrada, 0 torso de uma figura desaparecida, Mas imo pode temer remover terra do pre- sente, isto 6, colocar talvez em perigo as elilicagdes que al se erguem, “Quem pretende se aproximar do proprio pas- sado soterado deve agir como um hhomem que escava’ observa Benjamin; , num ouxo fragmento: *Pois aquilo que alguém viveu & no melhor dos casos, compacivel & bela figura a qual, «em wansportes, foram quebrados todos fos membros, € que agora nada mais oferece nfo ser 0 bloco precioso a partir do qual ele tem de esculpir a imagem de seu faruro”. @ TENN WR GARE ss Laie {Si an 9 ta ef id “tee er Ce iii cana Uveitis ‘Me 97 hes ken ra ese Us reno psa ‘Berlin Paris. iular de Bilosotia na Pcp pba fr Gost mos ar He yas ea) er ond Usted Hein (Sl 92 ere ama er tg Pos 18, tela ite moras ler rp Sp See tained, 15h deine rer xe 3 ad, 208), (PONTO De PARTIOA ‘Escola de Franurt. Fau-Lawert son, ‘ica, 1981, (ESSENGIAL DO AUTOR "Doras esclhidas Walter Benjamin Tés welumes, reins, 1685 187. ‘Origem do drama baroen aldo, Water Baran Basenss, 1809 Passagens Vater Benjamin JFGAnprensa Esta, 206. Reflexes sobre a cianga,o brinqueda e ‘educa, Wat: Benjamin, Lina Duas iieosira 24, 2002 PARA IR MAIS LONGE. Walter Benjamin, 0 marvimo da melaneli, Leandro Wand Campus, 1868. ‘ Histrae naragdo em Welter Benji, eam Mere Gagnein Perspective, 1689. Qs sonhos da historia das Passagens uma das obras de Walter Benjamin principais de ‘ pensadorq que “ ousou filosofar mesmo contra i apr6pria filosofia tox asain eReris So8 4 FORMA DO PaRADOXO da possibilidade do impossi- vel, ele reuniu pela tiima vez a mistca e a Aufelarung, © racionalismo emancipador. Baniu 0 sonho sem otrait, EM SiNTESE Feo My ; Consider cm espe, ce sem se fazer ctimplice da unanimidade permanente * © a pene dos filésofos segundo a qual isso & impossivel.” @ AS eng por Wer Bejan palavras so de Theodor Adorno ~ colega, interlocutor Seeupet un RS € ctitico afiado de Walter Benjamin, dos primeiros aos ina area de fant himos escrtos. Nao deixa de ser curioso que sin (nego ncea tas homenagem péstuma ao autor de obras polémicas modes aperago d ems como roped jar ‘como Origem do drama barroco alemdo © Passagens ——cenigiaco do desperar ja. pontuad: ljetivos bastante elogiosos, Lac dae seja pontuada por adjet aie elogosos, que, sumac até certo ponto contrascam com o tom éspero ¢ “cle alms moments desnko —¢ J2 poucos amigos* do qual Adorno se yale para Jigar a my ee product benjainian tarda, regia sob encomen- taro soils A emenoragio postin & Fda do Instituto de Pesquisa Social - posteriormente hrm Mt > referido como Escota de Frankfurt, pris eoluconsa er Mars. o SENJANIN Esertor orginal, lbirinico € muliesrat- ficado, Benjamin mantém sua opglo pela told) extrawitoriaidade em relagio. digio flossfea oficial, permanecenco ligado & academia “com mesma irons dd atragio de um Kafka pelas companhias de seguro’. Como mostra Adomo, sua plangjada turginalidade € proporconal & “suave iesistibdade” que emana de seus cescrtes. Inspirado pelos Paratas art ‘iais de Baudelaie, em Harvie, Benjamin now: “AS verdades mais profurdas tém a poderosa propriedade de se adaptarem a tudo 0 que ¢ indisito e vulgr, refitindo- se sua manei até mesmo na fantasia dhe tum sonhador imesponsivel’. Ao explodir 5 limites ene 0 tatado filssico, 0 sistema Genifico © 0 enstio Itertio, 0 auor desafia os enones académicos em nome da fidelidade ao objeto, colocando fem xeque a pretensiosa univesalidace prima philosopbia, "Gostaria de escrever algo que fosse exraco las cosas como 0 vino € ewido das uvas’, ele compara Certament, sua aide no €isenta de rie 0s, Ene 0s extremos ca “magnetic atra- ‘lo" € da “rejeio horworizada’, Adomo ro se furta em censuirir 0 que chama de carter “esottioo" dos textos de juventur de € “fragmenta” dos cle matured, ‘mas, por fim, reconhece em Benjamin o *pensador inesgotive” que ousou flosofar mesmo conta a prépia fos ENTRE O REAL £ 0 ONIRICO Insisindo na inexisténcia de perio- dos historiograficamente decadentes, Benjamin formaliza a intengao de levar dante uma apreciagio Wo produtva do tempo de Baudelaire, quarto aquela realizada, anos antes, em relagao 4 €poca de Gryphius, Lohenstein e Calderon de la Barca. © trabalho das Passages, apresentado como; "Uma tentative de vero século XIX de maneins to postva quanto procure! ver 0 século XVII no tuabalho sobre 0 druma banoco", & 0 resultado deste seu “querer filosdfico’ Escrito entre 1927 & 1940, o projeto ina~ cabado sobre as galerias de Pais reine grande pare dos temas trtados em su fase tarda ~ tanto quanto Origen do drama barroco alemdo, antes dele, ‘compilara as questées de juventude. Ao ecusar procedimento more geometrico 70 MENTE, CERESRO & FILOSOFIA Aastiicia de Benjamin consiste em apresentar o mundo material como se fosse um mundo de coisas sonhadas de Descartes # © sistema floséfieo do séeulo XIX, esse letor nio-ontoxioxo de Aeibniz adere a0 registro categoral, ora da défour, ore do fragmento, levanco 2s limos eonseqléncias a aversio pela esteilidade das construgdes-monoliti- cas, “A representacio como desvio € a cuncteristica metodokigica do tratado, A renincia@ intencio, em seu movimento consinuor isso. consiste sua natureza bisica. Incansivel, o pensamento come- ca sempre de novo, © vol sempre, Iminuciosamente, 2s proprias coisas Enguanto, no livro do Barroco, Benjamin equipara 4 composigio do tra- tado 2 do mosaico, defendeado o valor das citagdes autorizadas, nas Passagens, ele constréi um verdadeito mébile de imagens, inspirandose na técnica da ‘montagem dachaista, "Método deste raba- Iho: moncagem litera. Nao tenho mada 4 dizet. Somente a mostrar, No suimu- pisrei coisis valiosas, nem me apropria rei de formulagées espirituosis, Porérn, em a pblcldade, it hae na oletara a Pare te Império, como a co (6s fartapos, os residhios: no quero invertasiios, e sim fazerthes justicn a unica maneira possivel: uttzando- (s" Para isso, © autor abre mo las ti- buas transcendentais dos mandamentos académicos, preferindo, em seu lugar, captar a esséncia no detris ow acima ‘das proprias coisas, mas nelas mesma. Coerente com 0 “Preficio epistemologi- 0" da lvro do Baroco, ele busca obter ‘0 “teor de verade” da imersio no “teor factual’ — ou seja, revelar 0 universal com base em sua singubsridade histrica, Seja em relagio a0 drama baroco, seja ds arcadas parisenses, a motivagao de Benjamin € 56 uma: demonstra até que pponto se pode ser concreto, sem sucum- bir a mera factcidade imediata, Portanto, ‘nem magia, nem positvismo. Seu pro- cedimento € estritamente metidico, conta com 0 apomte ca alegoria, no ivro do Barroco, e das imagens inléticas, nas Passagens. Enquanto no primi o ator se empenh em despertar 0 Trawerspiel (rama baraco, em alemiio) do “sono” da recepgio classicsta, no segundo ele bbusea “acordar” 0 potencial revoluciond so adormecido no cotian. nine 0 real € 0 oniico, sua técnica ~€, por que nio, asticia— consiste basi- camente em apresentar 0 mundo mate- rial como se fosse, no limite, um mundo ©.me maces — LaTsToCK (sdaguerdtps mudaram 0 modo d ero mand de coisas. sonhadas. No por acaso, a exposiglo benjaminiana do Barroco toma como seu “visual objeto” Caldersn de Ja Barca — 0 dramatuigo por exce Yéncia do desengario. Ao tatae 0 sono ‘como fundamento ontoldgico do Fado, ele investe 2 providencia do elemento onitico, conferindo-the 0 ar de f goria, Ja is Passagens, Benjani lum triplo modelo, Como propedéutica, Aragon ea nogio d realidade absoluta, em que 0 sonho € a viglia ndo se opdem, constituindo, antes, coavesso & 0 dlreito de um imanente, tal qual uma tira de Moebius. Em seguida, Proust e a busea do tempo perdido como 0 “trabalho de Penélope da reminiscéncia” ~ a revicavolta dialé- =1 da rememoracao. Finalmente, Marx ea énfase no “esperar do mundo" como praxis revoluciondiia, Tes auto- res, trés cegistros epocais, trés. matt: zes intelectusis.radicalmemte E, no entanto, a compreensio da pre senga do sonho aa obm de Benjamin seria preciria, se nto levasse em conta 10 apenas 0 contraste, mas 2 propria justaposigao ent Surréalté ~ wma SONHOs EM RUINAS cfu de v do nas. arcax das dasa a Biblioteca Nacional de Paris estendeu seu cobestor cego e sonhador sobre a. primogenitura da kléia deste texto", escreve 0 autor. Como se pode deproender da afirma- ‘G0 acima, o impeto para a reds *Passagens parsienses” provém, ini mente, de Aragon e sua onda inspira de sonhos, © proprio Benjamin local suas origens: “No comeco hii Ze pasa de Paris, lvto do qual eu nao podia ler 0 pin de eit mais do que duas ou trés piginas 8 noite na cama, meu coracio batendo to forte que me fazia deixé-lo de lado”. Tendo encontrado © amigo em Paris, em 1927, Scholem coments que os manifestos € revisizs surrealisias haviam despertado fem Benjamin um “interesse ardente’, vindo a0 encontro de algumas idéias centrais aventadas por ele, aproximada- mente no mesmo periodo. ‘Como em “Kitsch onitico;” por exem: plo, Mesmo que 0 pequeno texto de 1925 nto posst ser tomado como um escrito tedrico no sentido Forte do termo, seu significado para a “eviravolta coper- nicana” softida pela produglo. benja- miniana tardia nfo deve ser de modo algum subesimado, Até porque seu afi de precipitar uma certa “desordem pro- dutiva® fundamental para uma posterior reotientacio da experiencia hist6rica &, nesse momento, indssocivel do recurso ‘a0 regime onisico para revelar © “estrae rho" no cotidiano, Como uma espécie e prolegomeno as Passagens, *Riscb ima importante hipowese de trabalho, que viria a ser desenvoli da, mais tarde, também no ensaio sobre ‘© sonho participa do bre mais para um azul ¢ cinzento, Sua melhor © Surrealism: historico, no s dlistante, Tomou- parte & a camada de povim sobre as coi- sis", Ji em 1929, Benjamin observa que 0 fe 4 AS 2, Petar tics Peer eee Poros UL . r Fie {EM NO CAOS DO CAPITALISMO MODERNO 72 grupo de Breton foi o primeiro a ter per- cebidor “As energas revohucionsrias que insparecem no ‘antiquado, nas prime is consirugoes de fero, nas primeiras fotografias, nos objetos que comegam a extinguir-se, nos pianos de cada roupas de mais de cinco anos, nos locas mundanos quando a moda comega a abandlondlos", Num cero sentido, € 0 ‘que Benjamin tem em mente quando inicia a claboragto do trabalho sobre as galerias de Paris ~ construgbes arqui- tetnicas tipicas do Segundo Império, estrus pelo processo de urbanizagto da cidade conhecido como “haussmani- zagio", Antecipando 0 tratamento mate- rialisa dos times iabalhos, 0 autor sinetiza: “A hisiéria do sonho ainda esta por ser escrta e compreendé-la significa ria dar um golpe decisivo na superstgio do estar preso a Natureza, por meio de uma iluminacao histrica' Sem injusti, a sentenca pode ser tomada como a divisa mesma de sua obra, partcularmente no period com preendido entre meados de 1926 ¢ © verlo de 1929. Tendo por none a conselugio Proust-Anigon, os escrtos benjaminianos dessa época sto prédigos em referéncias explicitas. a8 configura- des onfrcas, quase sempre numa. rea lo inalienivel com os dispositvas da memiria ~ seja nos relatos protocolares de Rua dle mao iinica, aa compilagao de experiéncias *propedéuticas” em Haxixe, no ensaio sobre o Surreaismo ou em °A imagem de Proust’, Nas Passagens, © autor compara: “Assim como Proust ini cia a histria de sua vida com 0 desper= 72 MENTE, CEREBRO 6 FILOSOFIA tar, toda apresentaglo da historia deve também comecar com © despertar, no fundo, ela no deve tratr de outra coisa, Esta exposiglo, portanto, ocupa-se com © despertar do séeulo XIX", Do ponto de vista metodologico, suas notas preli- minares anteeipam 0 modelo mesmo de tuma peculiar apresentagio da hiséri, le forma a anicular trés registro aparen: {emente incomunicaveis entre sis a teoria do conhecimento, a critica da_ moder (© om outras manfostagbes do antiquada" nidade © a aio polfica, Tanto € assim ‘que, 20 caracterizar o reclame e 2 moda, (0s panoramas e os interiores, as expos (bes e as passagens como ruinas de um mundo de sonho, Benjamin configura uma visio da modemidade wo mesmo tempo imagética © clalética, avessa as figuras tanto do “historicismo nareétieo’ quanto da teoria do progress. No arquivo “K," ele escreve: “A revo- hugo copemicina na visio histrica € 2 seguinte: considerava-se como ponto fixo ‘o ocorrde!¢ confera-se ao presente © esforgo de se aproximar, tateante, do cconhecimento desse ponto fixo. Agora esa relagio deve ser invertla, € © cor ido, tomarse a reviawolta dial lromper da consciéncia despera, Atribui- se 2 poltica o primado sobre a hist, 0s fatos tomam-se algo que acaba de nes tocar, ¢ fixidos € tareit da. recordaglo, © que Proust quer dizer com mudan- ILUMINAGAO PROFANA Entre 1926 e 1934, Benjamin faz ‘anotagées sobre seus experimentos “Era como Se a vida houvesse sido posta om conserva num pote fechado. ‘sono era o lquido que a conservara ‘ que agora se despejava na pia, repleto de todos os seus odores.” A droga era um dos instrumentos pata a moditicagdo da consciéncia, ‘mas ndo 0 nico: Benjamin chamou “busca de uma iluminagéo profana” o projeto surealista de proourar uma expansao do spirit, fora do Extase religioso ‘01 daquele provocada polo consumna de substincias como o haxixe ‘ou a cocaina, por vezes recorrendo a téonicas como a escrita automética. (0 J0G0 LOGUBRE, pintado sureatita atoll Salado Dl 1929 etuseue ‘ct experimental dos moves no estado de semidorméncia matinal, o que Bloch peteehe como a obscurdade do insane vivido, nada mais € do que aquilo que se estabeleceri aqui n0 plano. da his- Wéria, e coletvamente, Exite um saber ainda-ndo-consciente do ocomido, cuit promocio tem 4 estunuta do despertar” ‘Ao aproximar Proust © Marx, Benjamin acrescenta: “Existe uma experiencia da sfalética totalmente singular. A experi@ncia ccompulséria, drisica, que desmente toda ‘progressivdade’ do devir & comprova toda aparente ‘evolucio! como reviravol- ta disléiea eminente © cuidadesamente composta & 0 despertar do sono, Para © cesquematismo dialtico, que esti na base este processo, os chineses encontaram em S12 fteratura de contas maravilhosos expresses altamente acertadas. © metodo novo, daltico de escrever a hisria apre- sentise como a arte de experienciar 0 presente como o mundo da vig ao qual se refere 0 sono que chamamas de 0 ‘corido, Baborar 0 ocomido na recordt- o do soho! ~ Quer dizer: recordagao esperar eso inimamente relacionados, © despenar €, com eftto, « revolucto copemicans ¢ daltica da rememericlo" Para Benjamin 0 método dialético de escrever a historia consiste em elaborar 0 ocorrido na recordacao do sonho CONSTELACAO DO DESPERTAR Infelizmente, essa proposigbes encontram uma recepeo nada amisiosa por parte has colegas frankfurtianos, © que obriga 0 fié- sofo a rever drasticamente sss iis. Vale Jembrar que, a panir de 1935, ele passaria a desenvolver seus estudos em regime de Colzboraclo com o Instituto de Pesquisa Social, cuja expectatva era de um estudla materials sobre a hiséra inconsciente do séeulo XIX. Assim, na. primeira versio do texto programitico referido como "Exposé de 1935", Benjamin excreve: "A forma do novo meio de produsio, que no inicio ainda & dominada por aquela do antigo (Mar), conespondem na conscitncia cole- ‘iva imagens nas quais se interpenetram 0 novo € © antigo, Essas imagens sio im gens do desejo ¢ nelas 0 coletivo procura tanio superar quanto tans!igurar as imper- feigdes do produto social, bem como as ONIROCRITICA HISTORICA Em "Passagens horizonte propriamente da reremoragéo: seu parisienses” Benjamin tedricoe, ao investi na novo método calico ensala os primeitos _transposigéo do plana de fazer hstria, passes no sentido do individual para ocoletvo, Apresentando a figura trasladar suas reflexdes esboga o que chama de do historiador “onrotilas" para.o —_“reviravoltacopernicana” matrilista como cnirortico ou “ntéprete politico dos sonhos dda histéria", Norbert Bolz mostra que Benjamin | tentarepetir no plano ‘do conhecimento histérico aquilo que Freud realiza apsicandlise dentro ds limites da pscoogia individual. (ENADA REVOLUGAO de 1848 a Eugene Hagnaver, (0 HOMEM NO CAOS DO CAPITALISMO NODERNO 73 ficiéacias da ordom social de procugio. ‘As experidndlas desta sociedad, que tém ‘seu depésito no inconsciente do coletivo, _geram, em interco com 0 novo, a wtopit “que deixou seu rst em mil configuragoes da vida". Aber pela epigrafe de Michelet, cada Epoca sonha a sequinte”, 0 texto € enexgicamente conestido por Adomo — que supostamente falaria em nome do Instituto, Para ele, categories como “consciéncia coletiva" ou “inconsciente do caletivo” sio incompativeis com operagoes _genuunsamente diakticas, Constemado peli aproximagio da teoria junguiana, Adomo insste que as “imagens diléticas’ nto deriva de um “ego coletvo areaico", mas, cem vez dis, de “indivios burgueses alienados’. Como se percebe, 0 fikisafo @ absolutumente refntirio 2 aceitagio de qualquer insdincix supr-individual ref Fida como sito, ulegando, nesse caso, traarse necessiramente de uma infeliz recada no pensimento mitco to tipico de ores como Jung ¢ Klages. “Se o desen- catamento da imagem dialtica como um ‘sonho’ a psicologiza, 20 mesmo tempo, cai s0b 0 fekigo da psicologia burguesa Pais quem ¢ 0 sueito do sono! Em linhas gerais, as recomendagdes de Adomo cobram de Benjamin a posi ‘gio da figura do sujeito ~ sem a qual 0 movimento dialétco seria imerrompido reenviado A positividade nao-dialética de um estigio pré-kantiano préxime 20 mito, Assim, o nticleo duro das objecdes adomianas diz. respeito ao problema da hipésase das “imagens arcaicas" Segundo ele, tal equivoco teria 0 der tito de desviar a atengao da “verdadeira bjetividade" e seu correlato, a “subje- tividade alienada’. As citicas atingem Benjamin frontalmente. Isso porque sua teoria das imagens dialétcas € nesse ‘momento indissociével de apresentagio das passagens, inférieurs, exposigoes panoramas como “resquicios de um mundo onirico”. Desta forma, ao des tiuir a validade do modelo do sonho, Adorno compromete a utlzagio de um motivo no apenas metafGrico ou ilus- trativo no projeto das Passagens, mas ratégico mesmo part a sustentacdo de sua ainda incipiente ~ elaborasio teérica, Tanto @ assim que no menus crito em que discute t6picos relativos epistemologia ¢ & teoria do progresso, Benjamin anota: “Seria o despertr simtese da tese da consciéncia onitica eda antitese da consciéncis desperta?” Apesar da pontuac0 interrogativa, a sentenca tem 0 mérito de indiar o wéter central do. aspecto onitico na configuragio da teoria benjaminiana, chamando atencao para sua relagio ina- lienivel tanto com os estudos marxistas, quanto com a constelagio das imagens dialéticas = ambos certamente funda- mentais para a ariculagao de sua con- twovertida “dialetica na imobilidade A ese respeito, Benjamin esclaece: “No € que 0 passado langa sua luz sobre © presente ou que 0 presente Langa sta luz sobre © passado: mas a imagem € aguilo em que 0 ocomido enconira 0 agora mum lampejo, formando wma cons- telagdo, Em outras palavras: a imagem & a dialéic na imobilidade. Pois, enquanto a relagao do presente com 0 passido € ppuramente temporal, a do acoso com © agora € diakética — niio de natureza temporal, mas imagética. Somente 2s imagens léticas 0. aenticamente histéricas, ito & imagens nio-arcaicas, A imagem lida, quer dizer, a imagem no agora da cognoscibilidade camega no sais ako grat 2 marca do momento

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