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Capitulo 2 Das incivilidades do dia a dia as violéncias nos estabelecimentos de ensino: calibragem dos termos usados e seus efeitos Raymundo de Lima’ Pois os problemas filosoficos nascem quando a linguagem entra de férias. (L. Wittgenstein, LF., § 38), Intredugio Neste texto pretendo distinguir alguns termos — ou palavras — que induzem 4 confusio sobre alguns tipos de transgressGes entre seres humanos, principalmente no ambiente escolar. Os termos sao: indisciplina, incivilidade, ato infracional, violéncia ‘na’ escola, violencia ‘da’ escola, violéncia ‘contra’ a escola, violéncia simbélica, assédios moral ¢ sexual, massacres (crimes amoks, que eventualmente ocorrem nosestabelecimentos de ensino) ¢ barbarie. Além de precisar os termos acima, levantaremos hipéteses sobre as causas de cada um, os efeitos de cada transpesiic eas possibilidades de pesquisa cientifica. E, por fim, cabe um minimo de considerag3o sobre as possibilidades de prevengiio destes no ambiente escolar. Vejamos, entao, os termos: 1 Raymundo de Lima ¢ formado em psicologia, mas adota a concepeo psicanalitica que dialoga com. outros saberes. ‘Indleciptina, ato infracted violéncia(s) x escola A “indisciplina’ na escola, sem divida, hoje “é o inimigo nimero um do professor” (AQUINO, 1996, p.40), porque ela engloba um modo de comportar do aluno resistente para aprender ou aceitar as regras da escola — chamado de Regimento Escolar — e da sala de aula. O aluno indisciplinado € 0 que néo consegue permanecer quieto, falta~ the paciéncia para prestar atengdo na aula, usa palavras e atos para interferir de forma distoante do trabalho pedagdgico, seus movimentos fisicos ¢ sons podem levar os colegas a distragao e até causar irritagaio no/a professor/a, Tal indisciplina ndo tem limites, podendo resvalar para um ato infracional, por exemplo, n&o respeitar a autoridade do professor, desviar a atengao da aula, contagiar os outros para inibir 4 aprendizagem etc. A indisciplina na escola pode ser a ‘bagunga’ de um grupo, geralmente localizado no fundo da sala, ou é visivel em um aluno estigmatizado como aluno-problema, aluno-dificil, aluno- desinteressado, aluno-sem-limites, aluno-desrespeitador ete. Apesar destes sinais, a indisciplina geralmente é considerada como conduta ‘normal de transgressio de um individuo ou grupo, especialmente criangas, adolescentes © jovens, que se encontram num ambiente de convivéncia, como & a escola, universidade, clube, residéncia etc, O regulamento convencionado para gerir esses espacos puiblicos tende a nao ser totalmente observado ou respeitado pelas criangas ¢ adolescentes porque elas ndo tomaram 4 ‘sua’ consciéncia moral o sentido de respeitar normas, OU porque © encontro em grupo gera um ‘estado de transe” que as leva aos exeessos no falar e agir (WOOD, 1985). Nos estabelecimentos de ensino, os agentes desse regulamento ou regimento interno (diretores, professores, \écnicos, inspetores) precisam dar visibilidade ao regulamento, tanto para que os membros do grupo assimilem as regras como para preencher neles © respeito a autoridade, orientando assim sua boa convivéncia social, Acompanhamos La Taille (1996, p. 19) que analisa a indisciplina na sala de aula como decorrente do enfraquecimento do vinculo entre moralidade ¢ sentimento de vergonha. “Toda moral pede disciplina, mas toda disciplina nado é moral”. Por isso, o autor alerta para termos cuidado em condenar a indisciplina sem ter examinado a razdo das normas impostas e dos comportamentos esperados (¢ sem, também, termos levado em conta a idade dos alunos: nao se pode exigir as mesmas condutas e compreensfio de crinngas de 8 anos ¢ de addlescentes de 13 ¢ 14). om — - sempre imitando a contends ot contriria a0 reguiamento interno do estabelecimento, primeiro, ‘porque tal atitude no chega a ser ilegal’, isto ¢, nao € contra 4 lei, segundo, porque algumas regras ou normas. impostas pela escola podem nao set justas ¢, sim, anacrOnicas*. Mas, por outro, cabe a escola, observar e educar os alunos para que os mesmos ndo avancem os limites convencionados no Regimento Escolar. Ou seja, quando a indisciplina fere o Regimento Escolar (agride alunos, professores ou funcionarios) caracteriza um ‘ato infracional’, No slide da conferéncia do professor convidado pela Semana de Pedagogia da UEM, Roberto da Silva (2007), define as ‘infragdes disciplinares* (sic) como os atos cometidos por alunos que ferem o ‘fegimento da escola, Di As infragdes disciplinares devem estar contempladas no Regimento Escolar, que deve ser de amplo conhecimento da Comunidade Escolar, * Acompeténcia para aprecid-los ¢ das préprias instancias escolares, sendo o Conselho de Escola a ultima instancia recursal, « A falta disciplinar pode ser objeto da mediagao, pactuagao, negociagao ete. * A falta disciplinar cometida por profissionais da Educagao deve ser apurada mediante sindicancia instaurada pelo Conselho da Escola (SILVA, 2007, slide n.16) Roberto da Silva (2007) define ‘ato infracional’ como “andlogo a crime, portanto, alguns nao podem ser negociados, pactuados ou mediados. Se cometido por crian¢a a comunicagdo é sempre ao Conselho Tutelar, Se cometido por adolescente a comunicagao é sempre a autoridade policial”. Ento, a responsabilidade da escola é: * Manter livro préprio para o registro de TODAS as ocorréncias. 2 Michel Foucault traballue com dois sentidos do termo ‘disciplinal "Um na orem do saber (forma discursiva de contysle da producio de novos discussos) ¢ outro na do poder (o conjunto de técnicas em virtude em virtude das quais os sistemas de poder tem por objetivo resultado a) idade dos inddividuos” (GASTRO, 2009, p.110-116, grifo do autor), Resuminde: o primero sentide trata da isciplinarizacko. dos saberes’ [conbecimentos sistemticos], cada qual com cannterndas como verdadeiras,tenicas¢ instruments de produzin chentificos © téenicos, que acontece 4 partir do sé 18, O Hit teenicas ¢ normas, para formar ‘corpos doceis’ ou sujeitos 60 avesso, que a “indisciplina’ tende « der definida, e Elaborar seu Regimento Interna ou M previsdo dos possiveis atos de indisciplina ¢ atox infracionais. * Informar a comunidade escolar sobre as normas. = Comunicar ao Conselho Tutelar os casos obrigatorios (Art. 55, 1, IT ell), = Lavrar BO nos casos de violéncias cometidas por adultos contra criangas ou adolescentes (SILVA, 2007), Muitas vezes, a indisciplina tem como origem a in lade. Ou seja, a ‘ineivilidade’ é aonde a educagdo ainda nfo se efetivou no aprendiz; nfo é propriamente um ato de indisciplina, ndo ¢ ato infracional e nem violencia, mas efeito da ignorancia do sujeito que ainda ndo aprendeu as boas maneiras ou bons modos de convivéncia social. Existe um minimo de regras sociais para se conviver em sociedade, & ‘estas sempre devem ser aprendidas primeiramente com os pais. Portanto, haverd uma lacuna de boas maneiras ¢ bons modos naquela pessoa cujos pais foram ausentes, fisica, afetiva ou moral. Claro, que existe uma civilidade —sindnimo de ‘urbanidade’ e de ‘aburguesamento” dos modos de se relacionar, que aqui nao pretendemos discutir. Mas, sem diivida, os seres humanos sem excecao, esto assujeitados 4 aprender um cédigo minimo de conduta de convivéncia social, Dar ‘bom, dia’, ‘pedir desculpas’, ‘visitar um colega enfermo’, evitar falar palavrio, saber se comportar mesa, etc, éum jeito minimo necessario de convivéncia social. Os socidlogos franceses entendem que a incivilidade ndo contradiz com a lei, nem com o regimento interno de um estabelecimento — como a escola. Assim, nao é civilizado se faltames com o respeito, deixamos de cumprimentar um conhecido, pronunciamos palavrio em public, nao pedimos desculpas, fazemos brincadeiras de mal gosto etc. Portanto, i incivilidade ¢ a falta de educagaio — ou fracasso da educagiio, ou incapacidade radical para ser educado (refiro-me aos dotados de caréter defeituoso, proprio dos psicopatas ou perversos). Observamos no cotidiano pessoas bem educadas nao dando conta das suas incivilidades. Por exemplo, tirar caca do nariz em piblico, até mesmo na rainha da Inglaterra foi fotografada assim se distraindo (LIMA, 2012). Escapar um gesto ou palayra obscena em publico pode acontecer a qualquer pessoa. Portanto, ‘a ineivilidade é antes de tudo sinal instintivo resistente & educagao ou as regras da civilizagao. Assim, ivilidade no é indisciplina porque nao rompe regras € limites impostos pela sociedade. A incivilidade éa falta reprimir sous impulsos instintivos ou pulsdes, para ada adequados ou civitizade, Conforme analisa Freud, civilizar-se exige que 0 4ujeito reprima seus instintos primitives cujo resultado & um mal-estar no sujeito © na civilizagdo (FREUD, 1974). Acivilidade esté no plano das relagdes sociais (respeito-consideragao- empatia), assim como a cidadania esta no plano politico (tolerancia para ouvir ideias do outro, respeito nos debates, decoro entre parlamentares),, diz Cohn (2004, p. 83). Lembrando Simone de Bevoir, na sua famosa frase sobre a mulher, podemos dizer que “[...] 0 ser humano nao nasce humanizado mas toma-se humanizado, pela educag4o dos bons modos da consideragio em relagdo ao outro”. Neste sentido, a indiferenga €m nosso tempo pode ser contada come uma forma de incivilidade ou desumanidade, observa Cohn (2004). Nao apenas a indiferenga que nds. podemos mostrar diante de uma foto de uma crianga faminta da Somalia, imas também a indiferenga de um colega de trabalho que silenciosamente ignora um colega s6 porque ha discordancias de ideias e atitude politica ‘entre ambos. Ou seja, no fundo, todos carregamos um resto de incivilidade, ainda que nos esforcemos para sermos educados, sensibilizados em relagao 4 proximo, ou mobilizados contra a ignordncia e a indiferenga sentida no mundo contemporaneo. J4otermo ‘violencia’ indica o recurso a forga, para submeter alguém (contra sua vontade). Chaui (2000) observa que: (ua) em nossa cultura a violéncia ¢ entendida comoo uso da forga fisica ¢ do constrangimento psiquica para obrigar alguém a agir de modo contririo @ sua natureza © a0 Set ser, A-violéncia ¢ violaglo da integridade fisiea e psiquica, da dignidade humana de alguém. Bis que 0 assassinate, a tortura, a injustiga, a mentira, o-¢stupro, caliinia, a maefé, © roubo s80 considerados violéncia, imoralidade € grime, (CHAUI, 2000, p. 337). Ou seja, “[...] a violéncia se ope a ética porque trata seres racionais © sensiveis, dotados de linguagem e de liberdade, como se fossem colsas, isto é, irracionais, insensiveis, mudos, inertes ou passivos". (CHAUL, 2000, p. 337). Zaluar (2000) observa ser proprio da violéncia perturbar acordos © 24, 0 que Ihe confere uma carga negativa, A _ vitima, Estes danos podem ser ‘fisicas’ mortes, ¢ também danos ao wa patrimOnio piblico ou particular), *morais: intimidagio através de extorsilo, assddios, ia forma de violéncia provoca na vitima sofrimento de mids ‘difiao, como a baixa autoestima, mal-estar, angustia, fobia, depressio, pensamentos suicidas, Todavia, os psicdlogos distinguem violéncia de ‘agressividade’. A violéncia é caracterizada como uma forga excessiva que visa a destruig¢ao do outro, enquanto que a agressividade ¢ expressao instintiva de luta do ser humano (individual ou em grupo) para sobreviver. Ainda é assim: para sobreviver no mundo contemporineo, o ser humano deve recrutar certa dose deagressividade instintiva para vencer os obsticulos externos ou subjetivos, ig, ‘ser agressivo’ vem associado com “ser naturalmente dinamico’, ‘ser competente’, entio, existe um vale-tudo no mundo capitalista para ser um ‘cidadao vencedor’. (MARTIN-BARO apud OLIVEIRA, 2007, p. 91). Reforcando o ja dito: a agressividade é determinada pela biologia (instinto) e a violéncia € sintoma do sujeito em conflito com a cultura e suas contradi¢ées. Parece que a escola denega o lado positivo do uso da agressividade para ser um ‘aluno esforgado’ ¢ “aluno vencedor’. Esta atitude da escola termina fundindo a agressividade ¢ a violéncia em atos, sendo que a segunda € efeito de noticiario, hoje. Acompanhando a distingao proposta por Bernand Charlot (2005a), existe a violéncia ‘na’ escola, a violéncia ‘da’ escola, ¢ a vieléncia ‘a escola. A violéncia ‘na’ escola é aquela que se produz dentro do espaco escolar, sem estar ligada 4 natureza e as atividades da instituigao escolar: por exemplo: quando um ‘bando* entra na escola para acertar contas de disputas do narcotrafico, Neste ato transgressivo ao espaco escolar, no minimo, fica evidenciado que a escola deixou de ser um lugar de plena seguranga para se ensinar e aprender, Também é um sintoma de que a escola se tornou um espago social como outro qualquer, vulnervel a violéncia urbana. O conhecimento sistematico proporcionado pela escola, o discurso proferido por ela sobre cidadania ¢ ¢tica parecem insuficientes ¢ impotentes para barrar a invasao da violéncia social ¢ urbana no ambiente da escola. E ingenuidade ou despreparo intelectual pensar que uma disciplina ou tema sobre a violéncia na escola alocada nos curriculos tem o poder de *barrar’ a violéncia social pra dentro da escola. A formagdo moral-ética dos futuros cidadaos € necessaria, mas ¢ imperioso fazer debates continuos para além da escola, tanto no sentido de defesa da escola, como para defesa de uma sociedade justa, sem chanee para violéncias ¢ barbaries, = 40 — a proposta acima, Também existe a violéneia oléneia institucional, simbéliea, reproduzida através dos agentes da escola (professores, serventes). Antigamente a escola praticava a violéncia fisica com palmatéria e outros castigos fisicos em nome da disciplina dos alunos. Hoje esta violéncia ‘da’ escola é considerada “negativa’, tanto porque reproduz a violéncia costumeiramente praticada na sociedade desigual, como porque se pretende que a escola pratique atos ‘pedagogicamente corretos’ e na direcfo de uma cultura de paz. Todavia, em nossa €poca, ainda persiste uma forma sofisticada de violéncia ‘da’ escola, chamada por Pierre Bourdieu (2001) de ‘violéncia simbélica’. Por exemple, na atribuigao de notas, distribuigdo das classes, nos atos sutis de exelusdo, na atitude do professor para com os alunos “dificeis’, “lentos, ‘sem relagdo-com-o-saber’ que geralmente sao criados num ambiente familiar com baixo capital cultural. (BOURDIEU, 2001). Se tomamos como verdade 0 fato de a escola reproduzir um tipo Sofisticado de violéncia ‘negativa’ para a formagio do sujeito, do cidadio, também ¢ verdade que a fun¢o precipua da escola nao deixa de reproduzir uma violéncia *positiva’, através da atuagdo do professor, Observa Aquino (1996) que a agdo docente, no fundo, dirige 0 modo de pensar, sentir e agir do aluno “em vez de tdo-somente ‘importar’ efeitos de violéncia exdgenos a ela, os institui quase compulsoriamente”, Mas este tipo de violéncia ‘positiva’ da escola ¢ do seu principal agente, o/a professor/a, nao € considerado, porque se trata de uma violéncia necessaria ‘para o bem’, “primeito’, se considerarmos 0 sentido ambiguo do termo violéncia: a {..] qualidade do que atua com forga ou grande impulso: forca, impeto, impetuosidade [...] // intensidade [...] // irracibilidade // forga que abusivamente se emprega com o direito // opressio, tirania // agdo viotenta // [ue.] constrangimento exercido sobre alguma pessoa para obrigit- Jaa fazer ou a deixar de fazer um ato qualquer; coagio, (CALDAS AULETE, 1964, p, 4231-4232 apud AQUINO, 1996). Segundo, acompanhando o raciocinio freudiano, para o qual o ato educative, logo, zatorio, consiste em reprimir os impulsos primitivos, © ‘mal-estar’ é 0 prego que pagamos para sermos civilizados (FREUD, 1974). Portanto, © conflito entre as duas forgas — natureza e cultura — faz parte do trabalho educativo da escola, que para os analistas sempre deixa rastros de violéncia repressora (em nome da civilidade) ou negativa (contra a civilizagio). Portanto, @ violencia ‘da’ escola ¢ ambigua; hoje tende em fungiio de um “bem' coletivo, ou da isico-onipotencial ¢ perverso, 4. ‘contra’ a escola, Silo casos em que alunos provocam ing ‘Ou causam danos ao patriménio fisico da escola; ameacam, insultam ou agridem os professores ou funciondrios da escola. Ouse da palmatéria ¢ de outros castigos fisicos praticados pela escola tradicional-autoritaria vem sendo substituida por uma nova forma de violéncia dos alunos contra os professores, contra sua autoridade e oficio de ensinar, € contra o patrimGnio da escola. Hoje, professores de toda o pais sofrem desrespeito, ameagas e agress6es fisicas dos alunos e até dos pais. Escolas séo depredadas, pichadas, roubadas, aparentemente como simples vandalismo, ¢ nao € exagero da imprensa, Muitas vezes, falta envolvimento da comunidade local para evitar que a escola seja violentada por seus proprios alunos ou por estranhos, ¢ que os professores continuem sendo desrespeitados ¢ ameagados, Também o aumento da violéncia ‘na’ ‘contra’ a escola parece ser insuficiente para a tomada de consciéncia de alguns professores-pesquisadores que desconhecem a realidade concreta da escola. Suspeito que estes professores-pesquisadores ainda reproduzem o abstracionismo pedagégico que resiste escutar as queixas dos professores, para pelo menos confrontar sua opinitio ¢ reconhecer o que dizem as Pesquisas cientificas sobre o assunto, Por outro lado, parece também que as pesquisas ja realizadas, nesse sentido, ainda nao repercutiram em forma de debates e medidas preventivas na propria escola. Ente, a escola precisa superar seu ponto- cego ¢ surdo para enfrentar tal debate sobre a relagdo violéncia x escola, © a universidade precisa ter coragem para observar, escutar ¢ investigar as causas da violéncia ‘na’, ‘da’ ¢ ‘contra’ a escola. Por que se preocupar com tais distincdes? Porque essas distingdes podem orientar os professores para pensarem a relagao efeito/causa da violéncia, para além do psicologismo, do sociologismo, do historicismo e do politicismo-ideolégico. A prudéncia de bem usar as categorias ¢ conceitos nos previne sobre como operar 0 campo desta investigag’io complexa. Isto é, ao estudara violéncia associada ao meio escolar, pelo menos devemos ser prudentes quanto a aqueles atos que nao devem ser criminalizados ¢, por isso mesmo, apresentamse como desafio da educagao contemporanea, Existe uma tendéncia de os agentes da escola niio se responsabilizarem pela violéncia que ocorre no seu interior, muitas indisciplinado como questionador, critico, sugerindo ser ele um possivel revolucionario. Parece que essa tendéncia confunde atitude revoluciondria com atitude revoltada ou rebeldia pulsional-narcisista (LIMA, 2008), Pode até ser valida esta concepgio se o aluno for consciente politico de seus atos, mas ndo procede se o mesmo for um indisciplinado pulsional-nareisista, porque sua rebeldia sem causa ¢ inconsciente e individualista, proxima ao ato bullying. Assim, 9 equivoco psicologizante pode estar mais 4 direita (quando stigma o aluno como dnico culpado), ou mais 4 esquerda romiinticn (quando acredita que a indisciplina do aluno € uma forca natural que devemos compreender ¢ até respeitar). Jd 0 equivoco sociologizante considera a violéncia como uma mera ‘reprodugao’ da violéncia das desigualdades produzida pela sociedade capitalista, A propésito, Charlot (200Sa) alerta que ‘parece que ninguém compreendeu o livro de Bourdieu e Passeron, La reproduction’, pois terminaram usando suas ideias como se fossem uma ‘evidéncia intuitiva’, porque “o que entra cada manhi na escola nao ¢ 0 ‘sistema’, ‘o capitalismo’ [mas, sim] os alunos ¢ professores, seres que ttm um psiquismo”, (CHARLOT, 2005a, p.11). Entio, o autor sugere que esse estudo deve ser Complementado com uma leitura psicanalitica, que pode compreender — e aplicar — melhor conceitos como habitus, violencia simbélica ete, Nesse sentido, tanto os seguidores da tendéncia sociologizante como a psicologizante insentam-se da responsabilidade, quer projetando a ‘culpa’ fas contradigdes da sociedade de classe, no capitalismo ou neoliberalismo, Como jogando a ‘culpa’ nos alunos, pais, midia etc. Nao se trata de isentar © capitalismo de responsabilidade pela violéncia, Ele é causador, sim. Mas ¢ preciso ir para além desse discurso, i.é., porque entéo sé em algumas ‘eseolas acontece violéncia e em outras nao? ‘Se por um lado, a explicago sociologizante da violéncia no meio educacional aponta como causa maior as forgas macroestruturais du Sociedade em geral, por outro, a explicagio psicologizante aponta como causa maior a subjetividade do alune constitucionalmente violento, Entio, © psicologismo explicativo, também é reducionista, porque pontifica um diagnéstico de carater eyolutivo, quando nao patolégico, de “quadros’ ou mesmo ‘personalidades’ violentas determinado pela genética ou influenciado pela ma convivéncia entre os pares escolares. Em ambas, violéncia portaria uma faix essencialmente exdgena em relagdo a pritica institucional 4 perspectiva sociologizante, nas TENSORE NO DAPACO HACOLAR coordenidas politicas, econdmicas ¢ oulturais pelo tempos historicos atuais; j4 na perspectiva clinico-psicologizante, na estruturagdo ica prévia dos personagens envolvidos em determinado evento itivo. Vale lembrar que uma combinagdo de tais perspectivas também pode surgir como alternativa 4 compreensio de determinada situagio escolar de carter conflitive, por exemplo, num diagndstico sociologizante das causas acompanhado de um progniéstico psicologizante em torno de determinados ‘casos-problema’—o que, inclusive, acaba ocorrendo com certa frequéncia no dia a dia escolar. [Assim,] a escola e seus atores constitutivos, principalmente o professor, parecem tornar-se reféns de determinagdes que em muito thes ultrapassam, restando-lhes apenas um misto de resignagdo, desconforto e, inevitavelmente, desincumbéncia perante os efeitos de violncia no cotidiano pritico, posto que a génese do fenémeno ¢, por extensdo, seu manejo tedrico-metodoldgico residiriam fora, ou para além, dos muros escolares (AQUINO, 1998). Tentando superar tal reducionismo, Charlot (2006) volta a criticar a tendéncia sociologizante que ele entende ser sustentada mais por discurso politico ‘militante’ do que por investigagdes de “pesquisa cientifica’. A perspectiva sociologizante, principalmente quando analisa a relagdo violéncia e escola, tende a ignorar as diferentes ordens e escalas dos fenémenos que ocerrem na escola, Ora, existe uma cultura escolar que ndo ¢ reconhecida, porque a explicacao desta concepgdo € ampla, ‘macro’, ¢ de modo totalizante pretende dar conta de todas as ordens de fenémenos, incluindo a dimensao ‘micro’. Para a tendéncia sociologizante-militante, tanto no fazer pesquisa como na divulgagao dos resultados da propria, ‘a resposta ja estd dada’. Por exemplo, a crenga que considera que as criangas s4o violentas na escola em razao das politicas neoliberais para a educagiio. Nao que no exista uma rela¢do entre politicas neoliberais ¢ a escola, mas tal concepedo ‘macro’ ignora 0 fato de que existem escolas pouco violentas ¢ escolas com alto indice de violéncia. Assim, “[...] explicar diretamente o ‘micro’ © 0 ‘macro’, ou o ‘macro’ pelo ‘micro’, é um erro epistemolégico ¢ metodoldgico, que deve ser tratado como tal, quaisquer que sejam as boas intengGes politicas desse erro”. (CHARLOT, 2006, p. 13). Charlot (2006) considera que ‘Devemos perguntar por que a escola, hoje, nao esti mais ao abrigo de violéncias que outrora eram detidas em suas portas’. O que ‘legalmente’ a escola deve e nao deve praceder face a tais situagdes? Resumindo: a violéncia ‘na’ escola é aquela que se produz dentro do espago escolar, sem estar ligada 4 natureza ¢ ds atividades da instituig’o escolar, A violéneia ‘da’ escola ¢ a violéncia institucional, simbélica, 4 i | DAN TCHILIDADES AO DIA A DIA reproduzida pela propria. -tlunos © professores, Ba violéncia ‘contra’ a escola produzida por alunos, funciondrios, professores, pais ¢ eidadaos em geral, que causam danos tanto ao patriménio escolar como ao trabalho eminentemente ensinante da escola, Consciente desta distingiio conceitual cabe a professora levar considerar a normalidade de algumas transgressdes dos alunos, sobretudo, considerando 0 aumento elevado de pais negligentes e permissivos para com 0s filhos. Refiro-me a pesquisa de Lidia Weber, da Universidade Federal do Parana, que aponta 45% de pais negligentes, 12% de pais permissivon, 33% de pais participatives e 10% de pais autoritérios (WEBER, 2009), Também devemos levar em considerag3o a geragiio de pais. sem Vocagdo para essa fungdo, cujos filhos sfo apenas criados ou ‘malcriados"; eles se sentem abandonados pelos pais vivos, dai é facil deduzira motivagio dos atos de rebeidia, ressentimento, geralmente projetados na figura do professor. Sua rebeldia, no. fundo, é contra este abandono e transferéncia de responsabilidade dos pais para a escola. O ressentimento dos filhos desta geraco é reforgado também pelas regras injustas da escola, pelos professores ndo preparados para dar conta da caréncia afetiva dos alunos, principalmente quando ha atuagao (acting out) na sala de aula. Apsicandlise conceitua acting out[...] um comportamento impulsivo [inconsciente] que se exprime sob a forma de uma aedo [atuagio]” (CHEMAMA, 1995, p, 8), Também distingue acting out da “passagem ao ato’. deting out é uma conduta de um sujeito que se dirige para alguém, querendo dizer algo em ato [atuando], na impossibilidade de dizer o seu sentimento, A ‘passagem ao ato’ “[...] € um agir impulsive inconsciente, ¢ nao um ato [...]; ela esta situada do lado do irrecuperdvel, do irreversivel, sobre o fundo de desespero, demanda feita por um sujeito que s6 consegue Se viyenciar como um dejeto a evacuar’. (CHEMAMA, 1995, p. 9). O Sujeito em passagem ao ato “[.,.] escolhe pagar um prego muito caro, para Sustentar uma posigdo de dominio, na alienagao mais radical, pois o sujeile esta mesmo prestes a pagd-la com sua vida”. (CHEMAMA, 1995, p, 9-10), A escola tem responsabilidade, sim, pelo menos de dar conta de parte desta demanda dos alunos ‘atuantes’, porque cla prépria quis fazer do professor um ‘educador’, que como tal pretendia ir para além de ensinar os contetidos do curriculo. Nao podemos esquecer que na década de 1980 0 diseurso usado para formagiio dos professores forgave eles serem ‘educadores’, Nesta época, cra pedagogicamente correto conceber 0 professor came tim educador, metaforizado por Rubem Alves (1984) como *jeguitibit' (grande drvore, com ratzes profundas, ete), ¢ niio “eucaliptos’, ——ee™ apenas para ele (professor) justificando, assim, ser impossivel ser relceiee tanto pela ecurledede e risco do trabalho pedagégico, como pelo baixo salario que recebe, a falta de reconhecimento da fungdo docente pelos governantes daquele estado da federagao (Rio Grande do Norte) ¢ pela propria sociedade, Neste sentido, a escola contempordnea convive com varios dilemas: educar ensinar ou educar, preparar para o mercado ou preparar para a vida, ¢laborar um curticulo pragmatic voltado para passar no vestibular ou um curricula alheio ao vestibular (profissional, por exemplo), ser professor ou educador ou mestre ou ‘protese de pai e mae"? Em nossa poca o/a professor/a convive cotidianamente o seguinte impasse: por um lado, sente-se pressionado/a pelas circunstincias para ser ‘educador/a’, porque os alunos se apresentam na escola sem um minimo cédigo de boas maneiras convivéncia, porque os pais foram displicentes ‘ou nao souberam como educé-los. Diante desta falta de educagao caberia aos professores corrigir as falhas e auséncias dos pais na educacdo, até Porque uma parcela significativa dos alunos ne convive com pai ¢ mie, restando 4 escola a tarefa de ser ‘protese educativa dos pais’. Mas, por outro lado, a * educagdo, no sentido lato, nao € responsabilidade da escola. Ela € to somente um dos eixos que compdem 0 processo como um todo [,..]", (AQUINO, 1998, p. 46). Que fazer, entiio: ser prtese dos pais ou ser aquele que ensina conhecimentos sistematicos e programados nos curriculos? Para sair deste dilema, primeiro caberia aos professores ‘bem formados* saber distinguir um ato de indisciplina de uma condi¢ao incivilizada marcada pela auséneia da fungdo paterna e materna, que demanda algo mais da fungao docente previsto pelo curriculo, Atos que configuram ‘ato infracional’ (insulto, trifico de drogas, depredacio, lesio corporal, etc) implicam em agées para além do campo pedagogico, porque se configuram delinquéncia. Trata-se de uma situacio que primeiro devem ser convocados os pais, mas se os prdéprios se consideram impotentes ‘ou nao comparecem ao chamado da escola, que fazer? Ora, na falta de agdo dos pais ou responsaveis é preciso convocar os agentes (policia e justiga), distinguindo esta ago entre preventiva e corretiva, Por exemplo, o xingamento de um aluno dirigido para a professora primeiramente deve ser examinado pela equipe pedagégica da escola, Trata-se de um caso ‘interno” que nao justifica chamar a policia ou abrir um processo na justiga, ainda que seja este um direito da professora ofendida, A escola pode determinar que os professores reeduquem este aluno dentro dos limites do sistema = 46 i ——. oe de ensino-aprendizagem, para que ele supere # incivilidade em relagie a autoridade docente, Principalmente, nestas situagSes-limite, cabe a escola seguir estritamente o Regimento Interno, observar 0 Estatute da Crianga ¢ do Adolescente (ECA), promover didlogos entre colegas professores ¢ pais, entre outros cuidados pautados na prudéncia, s6 assim a escola pode calibrar sua ag&io pedagogica. Os professores hoje observam um aumento da incivilidade entre 03 alunos, O quadro fica sombrio quando essa incivilidade ¢ adotada como modo de ser de um grupo social, tribo ou gangue..A formagio de professores (original ¢ continuada) deveria estudar e pesquisar os grupos informais que atuam no interior da escola, alguns com indicios de pré-delinquéncias. Contudo, nossos professores esto totalmente despreparados para lidar om grupos informais em sala de aula, na hora do recreio, que se articulam has redes sociais da internet, que atuam fora da escola praticando bullying. ‘Os antropololos urbanos, psicdlogos sociais e psicanalistas observam tuma forte tendéneia entre criangas © jovens para o convivio em tribos, para. o uso de novos cdigos ou linguagens, simbolos e senhas, gestos e uso estilizado do corpe (tatuagem, piercing). customizacdo do uniforme, bem come atuagées (acting out) marcadas pela insensibilidade em telagiio a aquele que se encontra fora da tribo. Ha os que usam dessas ‘novas linguagem e estilos apenas como identidade grupal ou busca de twa perfomance diferenciada da maioria, mas também ha aqueles que ‘sam dos mesmos para expressar sua intolerdincia ¢ aversdo para com os ‘diferentes’ que vivem fora do grupo de iguais ou narcisico, Esta condigfio tribal contempordnea tanto pode ser um modo de expresso perfomatico como um modo teativo e ‘barbaro’, avesso ao que os membros tomam como ‘civilizagao careta’, portanto, a escola precisa estar ciente tanto dos determinantes inconscientes ¢ culturais como também saber ‘que fazer’ no limbito pedagdgico, prevenindo, assim, evitar a ocorréncia de violéncias *autorizadas’ pela escola quando se omite, Os conceitos e a pratica transgressiva Como ja foi dito, a professora escolar consciente deve considerar que algumas transgressGes dos alunos sio ‘normais’, sobretudo, se levarmos em: south): sunmenio do mimero de pais negligentes ¢ sem duear os filhos. Noutros termos, como ne numa sociedade marcada por ave autoritiria € repressora, tinha como propési eorpos mentes. Ela vigiava e punia (FOUCAULT, 1977), erat controle sobre ‘0 tempo e agdes, para obter a disciplinarizagio dos corpos € mentes. Mas a escola contemporinea se pergunta ‘como disciplinar’ sem ser autoritaria? ‘Os professores se perguntam: devemos educar ou ensinar? Devemos ensinar as criangas como o mundo é” ou “instrui-las na arte de viver”? (ARENDT, 2001, p. 246). Especialmente os adolescentes estéo sempre testando os limites (seus e dos outros); eles recusam seguir as regras que o sistema escolar e a sociedade impdem. Alguns adolescentes, que se consideram esclarecidos, se recusam ser submetidos 4 violéncia simbélica praticada na escola. Parece ser dificil distinguir a violéncia simbélica praticada pela escola que reproduz injustigas da sociedade classista, e a violéncia simbélica da chamada civilizagdo contra as pulsdes primitivas que tendem 4 barbarie que habitam a subjetividade humana, estudada por Freud (1974) em Mal-estar na Civilizagdo. Ou seja, no primeiro caso, temos a rebeldia consciente contra o sistema de imposigdes e de exclusdo, no segundo temos uma rebeldia sem causa politica, mas sim, que reage defendendo o desejo de ser ‘natural’ ¢ ‘tinico’. Convenhamos, existem regras injustas nas escolas/universidades © professores mal educados, como também existem regras justas nas escolas/universidades e professores esclarecidos e criticos. O mal-estar da educagdo contemporinea parece estar associado ao mal-estar da civilizagiio moderna e contempordnea, o discurso capitalista que produz sujeitos insaciaveis em sua demanda de consumo e sujeites inadimplentes, em eterna busca de pagar uma divida com seu sintoma neurdético (QUINET, 2002), Se por um lado, pai, mae e filhos hoje nao escapam do discurso capitalista, no sentida de ser décil para consumir bens, objetos ¢ fetiches de gozo, por outro, os mesmos deixam seu lugar vazio de pai ¢ de mie para cumprir com as obrigagdes do superego pos- moderno bem sintonizado com o discurso capitalista, Conforme Harris (1999) postula, pais deixaram de ser importantes na educagao dos filhos, ora porque scu sentido de gozo pessoal (made in discurso capitalista) supera o sentido de responsabilidade proprio da tradi¢do educativa, ora pela sedugio da falsa consciéncia de que a creche ¢ a escola os substituirao, até porque a geragdo de pais de nossa época revela baixa vocagdo para ser pai ou mie, Com o declinio da autoridade paterna ou do sistema patriareal, a educugio dos filhos ~ suas filhas ¢ até deseducagdo — deslocou-se para deer nn secnctt MURINE pei Grete emorcicionen {que parece que todos educam, ninguém educa”, (AQUINO, 2010), A educagdo denominada *pos-modermista’, gerenciada pelo ‘superego pos-modemo’ (ZIZEK, 1999), autoriza criangas ¢ jovens a exacerbarem sua wubjetividade, isto é, faz com que eles passem por cima de determinados valores universais (respeito aos pais © aos professores, consideragdo em telugio ao proximo, ndo depredar o patriménio ptblico), cujos atos so considerados normais ou naturais, ¢ até sdo aceitos pelos defensores da sociedade influenciada pelo psicologismo anarquista. Assim, pais € prolessores parecem unidos na pseudofilosofia da; [...] nBo-interferéneia, a respeitarem a autonomia dos filhios -¢ dos alunos, Sto instados a execrar qualquer instrumento ‘ou parimetro regulador de comportamenios, pois qualquer medida neste sentido nio é 56 considerada uma invasto de rivacidade como um abuso de autoridade, (NAGEL, 2009, p. 135) Ent4o, como exigir que a nova geracao de filhos tenham bons modos, Sejam respeitosos ¢ sensiveis em relagdo aos seus proximos, quando subernos que hoje existe um vazio de autoridade como porta-voz de valores universais ¢ indispensaveis para a boa convivéncia social? Ser um bad boy OU uma bad girl, pata a concepgio pés-modema faz o garoto ou a garota se sinta popular no seu grupo social. O bad boy e-a bad girl & valorizada, ‘Snquante o nerd ou ‘CDF’ tendem a ser vitimas de estigmas negativos ¢ bullying, terminam se isolando do grupo, restando apenas saber se saa reconhecidos no seu esfoga para aprender pelos professores ¢ pais. Entiio, até que ponto a niio interferéncia, o respeito 4 autonomia defendida e individualismo exacerbado devem ser considerados come dticos ou legitimos? Sozinha, a escola contemporanea no tem o poder de reverter © processo de violéncia entre os jovens. E preciso o trabalho em corresponsabilidade dos pais, comunidade ¢ conselhos, Também € preciso adolar novos mecanismos coibidores de violéncia des alunos, Se tais Meeanismos ou regras ficarem somente concentrados no ato docente, além de tender para cfeitos autoritarios, camufla 0 despreparo do docente para ‘estabelecer vinculos transferenciais com cada aluno, sobretudo o aluno fesistente 4 civilidade, Alunos incivilizados ¢ resistentes em relago ao ‘aprender, podem reagir consciente © inconscientemente com indisciplina eaté violéncia, A | professores precisa enfrentar este desafio: € ressentimento para com alunos que sabotam a aula), Portanty, é urgente preparar os professores para saber interpretar ¢ lidar com @ nova geragio de alunos resistentes para aprender e alunos ‘paixonados pela ignoriincia’. (MRECH, 1999, p. 90-91; LIMA, 2011), Nao se trata de ‘curar’ ambos da ignordncia, ou inculcar em ambos valores da classe dominante que os fazem submetidos ou alienados da sua condigio de sujeitos ativos, mas sim, transmitir os valores ‘universais’ da civilizag&o tais como: convivéncia, respeito, tolerincia, simpatia, o valor de aprendizagem, saber/conhecer, buscar esclarecimento, realizar pesquisas, participar de debates racionais ete, Critica 4 justifieativa da violéncia. sobre a violéncia simbélica Conforme argumentamos, no minimo ¢ um equivoco de andilise tanto a naturalizagao, o psicologismo ¢ o sociologismo sobre a indisciplina e a violéncia na escola. Especialmente a perspectiva sociologizante parece compreender um certo tipo de violéncia como se fosse um embrido de atitude revoluciondria. Ora, tais sociélogos deveriam ampliar sua perspectiva © aprofundar seus estudos sobre as causas da violéncia, inclusive aquela entendida como produzida historicamente ¢ de cardter revolucionario racional; deveriam levar em conta a possibilidade de 0 ato violento ser narcisico e nada revoluciondrio (por exemplo, usar uma arma de fogo contra colegas ¢ professores, ou armar uma bomba para explodir um banheiro). Até porque a propria sociologia considera que a violéncia pode ser andémica. A “[...] violéncia-anomia que resulta do reaparecimento dos desejos recalcados, a liberagao paroxistica das pulsdes origindrias — tanto da libido como do ‘instinto de morte”. (BOUDON; BOURRICAUD, 2001, p. 607)’, Entio, qualquer tipo de violéncia nao combina como projeto 3 Os autores do Dicionirie Critica de Sociologia consideram avioléncia-anomis’ 9 movimento “irracional’ dos eperirios desorganizados politica « sindicalmente, que no inicio de perioda da industrializagio destruiram maquinas até pessoas, No periodo da Revolugio Industrial, mais Precitamente em 1881, na Inglaterra, surge um movimento contrrio a mecanizagio do trabalho, ‘chamados ludistas, que pattiram para destruir as miquinas que estavam ocupando os lugares Got Buble ts habe Os Inde tis Tembrados como ‘quebrasiores de méquinas, Com outra atitude, civilizada ou politizada, oc operirios organizados em sindicstos arientayam as companhelros 4 evitar a violincia fisica, optande assim por uma luta baseada cm esiralégias © liticas; coin reves, passcatas, ¢, sobretude, "]..| no destruir pessoas como seres vivian, mas sim, ‘camio aLores politicos’, (BOLIDON: BOURRICAUD, 2001, p. 612}. Be ii = © univerititio Frietaae Maat wacer aateaes Veet ripen com aTgUMeNtOs facionais, Consistentes © demonstrativos da. verdade, portanto, sem o uso da violéncia, Diferente da indisciplina, a violéncia tem outro sentido, talyez. mais grave © mais danoso tanto para o mal como para o bem do sujeito ¢ da Sociedade, Em nossa cultura a violéncia € entendida como 0 uxo da fiorga fisica © do constrangimento psiquico para obrigar alguém a agit dé mode contrario 4 sua natureza ¢ wo Ket ser. A violencia ¢ violagdo da integridade fisiea © psiquica, da dignidade humana de alguém, Eis que 0 assassinato, & tortura, a injusti¢a, a mentira, o estupro, a calinia, a miefé, © roubo so considerados violéncia, imoralidade ¢ crime. (CHAUI, 2000, p. 337). [Ou seja] “...] a violéncia se opde a ética porque trata seres racionais © sensiveis, dotados de linguagem e de liberdade, como se fossem coisas, isto ¢, irracionais, insensiveis, mudos, inertes ou passives”. (CHAUI, 2000, p. 337). Ainda é preciso acrescentar ser proprio da violéncia perturbar acordos © regras que pautam as relagdes, o que lhe confere uma carga negativa (ZALUAR, 2000). Portanto, qualquer tentativa de justificar um ato Violento, ndo passa de falacia, que, no fundo, esconde uma moral cinica, Porque néo se justifica um ato imoral como se fosse moral ou ¢tico, ainda que a causa seja justa. A violéncia gera sofrimento, causa danos fisicos ¢ psicolégicos, humilhagao, desespero, desamparo, desesperanga e anuncia a barbarie onde todos podem ser vitimas. No caso de léncia do tipo massacre, terrorismo, genocidio pode ser considerada ‘crime contra a humanidade’, porque o criminoso criminaliza a todos — sem distingdo — impondo-thes a pena de morte. Alguém disse que o terrorismo ¢ um punhal solto ao vento, isto €, atinge qualquer um que esté no lugar errado e na hora errada, Para a perspectiva de Hanna Arendt (2001, p. 44) “[...]a violéncia pode destruir o poder, mas ¢ totalmente incapaz de crid-lo”. Carregando nas tintas, para destruir um poder tirdnico ou um regime tolalitario ¢ imprescindivel fazer uso de uma violéncia Icgitimada pelo movimento popular, Mas uma vez no Podeeaamaanes -cuja origem é popular, saber3o se conter na violencia pry de Direitos? Aqui, yale afirmar que qualquer ito Mi mesmo democratico —usam de um certo ordem © sua manutengio no poder, Um oe WO RNPACO MCOLAR caso bem especifico ¢ © totalitarismo porque “[...} a complexa da violéncia exercida pela sociedade contra seus membros; essa violéncia é exercida por dirigentes que procuram legitimar seu uso pela necessidade de construir ou de reconstruir a unidade do corpo politico [...]". (ARENDT, 2001, p. 609). Esta violéncia pode ter um objetivo minimo: impedir a expresso de certas preferéncias (verbais ¢ ndo-verbais). Pode também ter um objetivo mais ambicioso: os dirigentes totalitarios se propdem a tornar as consciéncias individuais 0 mais semelhantes possivel ¢, de qualquer maneira, absolutamente receptivas as instrugdes do “grande Irmo’, lembrando o livro de George Orwell (ARENDT, 2001). Mas também no Estado democratico, onde prepondera o pluralismo politico e de expressao, também é usado a violéncia ‘constitucional’, policial ¢ judiciaria, exemplos: 0 ato de prender suspeito ou criminoso, o regime supressao da liberdade das prisées, entre outros. Uma palavra sobre a violéncia simbélica, que talvez seja forma mais praticada nos estados democraticos. Autores como Michel Foucault ¢ Pierre Bourdieu ampliam o sentido da violéncia. O primeiro, ne seu estudo Vigiar e Punir, pretende fazer uma ‘histéria da violéncia nas prises’ ¢ até mesmo da violéncia nas escolas dos séculos 18 € 19, Jd, Bourdieu forja o conceito de ‘violéncia simbélica’ para esclarecer 0 papel da escola para além de ‘boazinha’. Para Bourdieu (apud PILLETI; PRAXEDES, 2010), a violéncia simbolica expressa-se na imposi¢o ‘legitima’ ¢ dissimulada, com a interiorizagao da cultura dominante, reproduzindo as relagdes do mundo do trabalho ¢ do ambiente escolar. Ou seja, a violéncia simbélica seria exercida por diferentes instituigdes da sociedade: no Estado, no trabalho, pela midia, na escola etc, O Estado age desta maneira, por exemplo, ao propor leis que ‘naturalizam’ a disparidade educacional entre brancos e nhegros, como a Lei de Cotas para Negros nas Universidades Publicas. pratica violéncia simbélica a0 impor a indiistria cultural como nica’, por um lado massificando a cultura popular, ¢ por outro, indo cada vez mais 0 acesso a uma cultura, por assim dizer, ‘elitizada” ou ‘elevada’. E no ambiente escolar que a violéncia simbélica nao € percebida como violéncia, mas sim como uma espécie de interdigdo desenvolvida com base em um respeito que ‘naturalmente’ se exerce de um para outro (BOURDIEU, 1998), Como exemplo disto temos a atitude de professores tidos como autoridades em um determinado saber, a qual pressupée o uso legitimado de estratégias punitivas em relagao aos alunos (como Teprovagies © castigos) que atualmente néio se enquadram nos moldes da = 32 ANAS WO WIA A OA). rvstituiglho: também ¢ reproduzida em sala de-vila qiand profatotlaianairon stunos para Jerem apenas um autor ‘consagrado, inculear neles a preferéneia por uma determinada teoria, que geralmente tem a contrapartida de ignorar ou desprezar outras. O uso de ironias, que na verdade¢ sarcasmo, faz parte do estilo de alguns professores nos curses de humanidades, tem o objetivo de desqualificar e impedir a livre escotha dos alunos quanto a ler, estudar © pesquisar determinados autores € sistemas de pensamento. Tal violéncia simbdlica geralmente passa despercebida por alunos incautos ou fascinados pelo carisma do docente, geralmente investiga da autoridade de doutor, especialista ou expert num tema. © depoimento escrito em forma de ensaio do professor Antonio Ozai da Silva* ilustra 0 efeito da violéncia simbélica, Escreve ele: © professor tem o poder de influenciar 0 olhar do aluno, direcionando leituras. E dessa forma que eles instilam @ ‘yeneno’ contra os autores malditos, expulsos de pantelio, Claro, nem sempre isto ocore € 0 aluno pode resistir. [.-] Foi assim que introjetei uma relativa desconfianga ¢m relacdo a autores como Nietzsche, Baudelaire, Walter Benjamin, etc. Nao € por acaso que 86 agora, anos depois de terminada a graduagio, que me aventuro a ler uma obra do filésofo alemae criticado nas hostes marxistas, [...}, Sim, é fundamental fer Marx, mas & prudente no tornarese Jeitor de um nico autor, de uma dniea obra ~ e, a mancira Teligiosa, tami-lo como profeta ¢ seus escritas como ac fosse o livro sagrado. Leitores assim so perigosos: ¢, geralmente, propensos a intolerincia, N3o suportam 0% *espiritos livres’! (OZAL DA SILVA, 2010, grifo nossa), Noutro ensaio, o autor alerta para uma nova forma de violéncia simbdlica ‘legitimada’ e difundida nas universidades brasileiras, Estudioso da trajetéria de Mauricio Tragtemberg, Ozai da Silva publica um ensaio cujo titulo € Somos todos delinquentes académicos?, em que denuncia como a universidade publica hoje é ‘assediada’ permanentemente por priticas ¢ ideologia mercantis. Tudo se torna mercadoria. A docéncia por vocagio, o amor ao conhecimento e o desprendimento dio lugar ao interesse egoista enquanto fator direcionador da praxis académica, Ie ey a seminoma oo peed! ‘© utilizamse do yale tudo para ‘enriquecer @ Lattes’, pode i pr rsd ue impssone «05 dene beim a oe certamente no ¢ dice [...), Come afi Max Weber “Nos meios cientificos © universitirias, [9 vaidade] chega a constituir-se numa espécic de moléstia profissional’, A vaidade pode até mesmo desempenhar um papel positivo, mas, a partir de determinades parimetros, como no mito de narciso, torna-se patologia e envenena as relagdes humanas, (OZAI DA SILVA, 2008). Assim, a violéncia simbdlica nas escolas ¢ universidades vem. se aproveitando da liberdade e do pluralismo propiciado pela democracia, tanto para reproduzir desigualdades sociais na pritica docente do dia a dia, como na escolha de autores sustentados apenas no seu carisma ou autoridade do saber. O perigo desta violéncia simbdlica na didatica e no contetido é ‘passar batido’ como sendo nao violenta, além de boicotar 0 aluno de ser livre para ler, estudar, pesquisar e adotar a filosofia que se sente melhor esclarecido para as coisas demasiadamente humanas e do mundo em geral. A violéncia extrema: 0 massacre-amok Os primeiros ‘massacres’ em escolas pareciam sintomas do mal- estar da cultura anglo-saxénica: Estados Unidos, Escécia, Alemanha. Mas depois ocorreu em Israel, na Russia, na Argentina, no Quénia ¢ até na China. Como os chineses nao tém facil acesso ds armas de fogo, facdes foram usados contra criangas, o que poderia ser considerado um sinal de barbarie. Na Russia, na cidade de Beslan, em 1° de setembro de 2004, terroristas tchechenos assassinaram 386 mortos, ¢ 186 criangas © centenas de feridos. O ‘Massacre de Beslan’ ¢ considerado 0 maior nimero de vitimas fatais em uma escola do planeta, Os massacres em escolas ¢ universidades vem ocorrendo em periodos cada vez mais curtos ¢ em qualquer parte do mundo. Deveriam ser obra de psicopatas, sociopatas ou psicéticos, agindo a esmo, aparentemente sem motive e sem sentido? Niio necessariamente, E sempre dificil apurar as causas dos atos demasiamente humanos: suicidios, serial killers, massacres aparentemente sem motivo ou sem. sentido etc. Parecem que estes tipos de violéncia extrema c barbara esto associados aos seguintes fatores: um tipo personalidade = 54 — Partindo desses pontos, o psiquiatra chinés P.M. Yap, em 1965, estudando sindromes ligadas A cultura, levantou uma hipdtese sebre determinados assassinatos multiplos, que poderiam ser uma reaglo racional do criminoso as humilhagdes ¢ as intimidagdes sofridas de modo continuo ‘ho seu ambiente de convivencia, Assim, essa foi a primeira hipdtese ‘boa’ sobre os efeitos drasticos do bullying, que deu origem ao movimento de conscientizagiio & Pteven¢do internacional, focado nas escolas. (Como aprendemos em Metodologia Cientifica, hipétese é uma afirmagao proviséria para ser investigada com os critérios da ciéncia, Ou seja, uma hipdtese pode ou nao ser comprovada). Por enquanto, a relagdo massacre-amok © bullying parece predominar como a melhor hipétese para explicar 6 ato [criminoso] que antes parecia nao ter sentido, nao ter explicagio, ou ser lum ato de loucos ou psicopatas. Amok € uma palavra de origem malaia, significa raiva cega, Yap (1965) usou Amok para designar as sindromes exdticas e raras de poves Supostamente ‘primitives’, cm que um individuo armado de faca, corria gritando Amok! Amok, e matava indiscriminadamente todos aqueles que cruzassem seu caminho (ZUIN, 2010, p. 67-8). O sociolégo marxista alemao, Robert Kurz, em 2001, escreveu um ensaio usando 0 conceito Amok (‘amouco”, conforme a tradugao da Folha de §. Paulo) tentando analisar os massacres espetaculares ocorrides em ¢scolas, universidades, shoppings pragas. Apoiado em parte pelas ideias de Hannah Arendt, Kurz oberva que: [.] hoje a principal tarefa oficiat da escola é [J transformar as criangas em méquinas produtivas abstratas; mais precisamente, “empresérios de si mesmos’, portanto sem nenhuma garantia |...) Os alunos do primérie ji silo entupides com psicofirmacos para que possam competir no ‘vai ou racha’. O resultado ¢ uma psique perturbuda de pura insociabilidade, para a-qual a auto-afirmago © a autodestruigio se tornaram idénticas, Eo amoueo que eoeasariamente vem A luz.atras do ‘automanager’ da péry- -———iodlemmidade, a democracia da economia de mercado ru lgrimas de cracodilo por suas criangas perdidas, que THNKOMA WO HEPACO RECOLAR Psiquiatas e psicanalistas também passarama a done amok um ser humano tomado por firia cega (ou furia narcisica) que sai matando pessoas ¢ animais, aparentemente sem motivo ¢, na maioria dos casos, suicidam-se no final. Que contribuic¢do a psicanalise pode fornecer para formamos sentido sobre os massacres-amok? A perspectiva psicanalitica entende que o massacre ou violéncia- amok fica do lado da ‘passagem ao ato’, Por definig3o, ‘passagem ao ato’ é um agir impulsivo inconsciente, influenciado por um desespero, para se ver livre de algo que o atormenta, um “dejeto a evacuar’, A ‘passagem ao ato’ se situa do lado do irrecuperavel, do irreversivel, sobre o fundo de desespero ¢ da recusa a toda possibilidade de autocritica. “FE a vitéria da pulstio de morte, o triunfo do ddio ¢ do sadismo. © sujeito em passagem ao ato escolhe pagar um prego muito caro [pagar com a vida dos outros ¢ de si] para sustentar uma posigio de dominio [...].” (CHEMAMA, 1995, p. 8-10). Conforme ja definimos, aqui, enquanto que 0 acting out o sujeito que se dirige para alguém, querendo dizer algo em ato [atuando]; por seu lado, 0 sujeito em passagem ao ato, na impossibilidade de dizer 0 seu sentimento, vive uma alicnagdo radical de sua condigao existencial no mundo, eseolhendo pagar um prego muito caro, para sustentar uma posigdo de dominio ou de vinganga sobre todos. Entao, © massacre-amok é a mais pura expressdo da ‘passagem ao ato’ de uma vinganga ‘em ato’ no sujeito cujo ressentimento se saturou. Ou seja, décadas atris a vingangado aluno ressentido [e reprimido pela autoridade do professor] acontecia de modo imaginario ou através dos filmes ¢ situagdes de violéncia ficcionadas. Em nosso tempo esse mecanismo sublimatério nao consegue dar mais conta para impedir a passagem ao ato. Portanto, 0 adiamento da vinganga tende a virar ato concreto do aluno, porque o aluno se tomnou pega da indistria cultural, inaugurando assim “uma nova forma de oaluno expressar o ressentimento reprimido no cotidiano desse processo, a saber: “[...] o assassinato espetacular de agentes educacionais transmitido globalmente, e em tempo real, pelos atuais meios de comunicagio de assa”, (ZUIN, 2010, p. 69). Conforme pensa o autor, seguinde o ponto de vista da Teoria Critica: [i] © arrefecimento da capacidade de sublimagio, suas fantasias de grandeza delirantes [do ressentido} foram deslocadas da esfera do virtual para a concretizagho real € efetiva. A flirie natcisiea desse aluno exprime-se da sepuinte = 56 =. ideal Nevad aid pide ver iclasds vhmtoe as com a seiedadte, entto se volte contra ela’, (KISENBRERG, 2002, p, 44 apud ZUIN, p, 69), Kehil (2004) analisa que 0 ressentido que antes sustentava no siléncio da sublimagio eternamente adiada, mas, agora — depois de saturado pelo Sistema sublimatirio e possivelmente inspirado pela midia ~ parte para a vingsinga a qual “[,..J permitiria gozar do sofrimento daquele que o ofendeu sem ler que se confrontar com sua propria crueldade”. (KEHL, 2004, p, 92), Assim, © massacre-amok faz com que o sujeito rompa 0 siléncio com ‘um estilo espetacular; um ‘exereicio da fiiria narcisica*; no fundo, mais que matar muitos em escala espetacular ele espera causar remorso em dimensdo midiitica, que, de fato termina acontecendo com as reportagens, anilises, debates etc. Portanto, devemos reconhecer que o ressentimento em tempos de indistria cultural toma a dimensdo cada vez mais reativa e assim, 0 Sujeito projeta sempre a responsabilidade de seu softimento “[...] no ‘outro contra © qual ele dirige insistentemente um rosario de queixas ¢ hcusagGes, € insenta o eu, covardemente, de ser responsdvel pelo menos em parte pela sua condi¢ao ressentida”. (KEHL, 2004, p. 33), Desse modo, # ressentido termina forjando uma moral ressentida ¢ publicizada, em que ele sente revestido de uma superioridade moral inquestiondvel, onde nio hi lugar para a autocritica prévia ¢ nem sentimento de culpa ou vergonha @ posteriori (porque geralmente os criminosos-amok se suicidam). Essa. ‘Superioridade moral atuada faz do sujeito alguém incapaz de esquecer, OU feagir ‘agressivamente’ de modo civilizado ou ficcionado, ou até perdoar © outro que the fez mal, conforme recomenda a moral cristd, Parece que 4 moral cristé de ‘amar o préximo’ ¢ ‘amar o inimigo’, analisados por Freud ¢m Mal-Estar na Civilizacao, nao funcionam mais em nossa cultura, Fixiste uma estrutura de personalidade especifica (que precisa ser melhor ‘entudada) na qual “ruminagdes acusadoras ¢ fantasias vingativas” (KEHL, 2004, p.12) passam da fantasia ao desejo de vinganga “em ato’ criminose- amok de modo espetacular e divulgado em escala global. Zuin (2008a) ainda observa que essa violéncia extrema ao ocorrer fo espa¢o escola/ universitario denuncia o sadismo ¢ o masoquismo que fizem parte da tradigdo nos ambientes de ensino. O sadismo docente’ yeralmente atua com sareasmos justificando ser um inocente humor ou irdnia; sa de humithagdes como se fossem brincadeiras inocentes para com alune, ou Phen se “aulores para que os alunos reproduzam sua aversilo ©, assim, sigam o ) Mestre. Pelo lado aluno, o sadismo 7 i ee i oi en eee masoquismo predomina nos alunos que sio co us escolar a extrair gozo de modo passive ou ative, é 0 violéncia simbélica. O crime-amok parece incluir, ao mesmo tempo, no mesmo ato, tanto o sadismo como o masoquismo da violéneia intra- escola e intracultura reprodutora de contradigdes histéricas. Contudo, a cultura desses ambientes de ensino tradicionalmente ainda insiste em denegar tal violéncia que é geralmente “[...] varrida para debaixo do tapete do jogo de cena entre professores ¢ alunos, cujos alicerces sao rétulos € esteredtipos estabelecidos e, muitas vezes, dolorosamente experimentados por ambos”. (ZUIN, 2008b, p. 603). Portanto, os crimes-amok podem estar diretamente associados ao bullying ¢ outras formas de violéncias que ocorrem nos estabelecimentos de ensino, conforme sugerem os estudos que viraram filmes e decumentdrios: ‘Elefante’, ‘Tiros em Columbine’, ‘Bang-bang’, ‘Vocé morreu’, entre outros, Mas, nos perguntamos: porque 0s 99,9% das pessoas que sofreram bullying nao saem por ai matando pessoas € animais? Qual ¢ 0 fator psiquico, genético, sociolégico ou antropolégico que motiva e faz disparar a matanga-amok? Existe uma cultura cujos membros sao estimulados para praticar este crime espetacular em vez de apenas imaginar, reprimir, sublimar ou fundar um movimento politico de transformacio radical do ambiente ou da sociedade? Nao procede o fundamento da declaragao do governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, depois do massacre na escola de Realengo, em 2011, que considera o criminoso-amok um psicopata ou sociopata. Embora nio sejam produzidos necessariamente por psicoticos, o massacre-amok é um ato perverso, sustentada por uma razao delirante, como parece indicar a conduta do responsavel pelo ataque 4 escola do Realengo, em 2001 O bilhete suicida escrito pelo criminoso-amok — ¢ as mensagen gravada por Cho-Seung Hui — levanta a hipdtese de transtorno de personalidade e reagdo desproporcional onde o criminoso condena a todos por humilha- lo ou estigmatizi-lo como fracassado (ingl.: /oser), No caso de Seung- Hui 0 seu video divulgado pela National Broadcasting Company (NBC), acusava Mr. Browstone, seu professor de matematica, como um sadico que humilhava seus alunos a ponto de um deles dizer que “[...] gostaria de mata-lo, de vé-lo sangrar”, (DAVILA, 2007, p.10). Por que esse aluno preferiu dizer que ‘gostaria de mati-lo’ € nfo o fez, mas Seung-Hui passou ao ato criminoso? E necessario ainda distinguir 0 massacre-amok, praticade por um individuo ressentido © vingative ‘com sua causa solitaria’, e terrorismo, eat - Aunalise do terrorismo é complexa c tal vex ainda seja impossivel thedsto ei nossa época, porque existe mais diferenga do que semethangas de luta, causa, modus operand! dos grupos pro terror da década de 1970, por exemplo, o grupo palestine Setembro Negro ¢ grupo alemio Baader-Meinhof e as atuagées pis 2000 do grupo espanhol ETA & do grupo da Al Qaeda, que atacou os EUA, em 11 de setembro de 2001, Pareee que o terrorismo atua ao mesmo tempo de modo racional-calculado © influenciado por uma causa tornada mistica ¢ fanatizada. Situamos 0 terrorismo do lado da ‘passagem ao ato’, porque em nome de sua causa desesperada condena indiscriminadamente todos & morte Fanaticos hoje 0 lutar por uma causa politica ou religiosa, justa ou injusta, terminam Sendo porta-vozes do “super-ego pds-modero” escolhendo um vale tudo para divulgar seu desespero e sua causa‘em dimensio global noticiando pela midia em tempo real. E preciso estudar © novo estilo do fanatismo fundamentalista, que abandona a pregagdo compulsiva tradicional em tempos € espacos de idoragao por uma atuagao teatral mididtica, valendo-tudo desde a pregagao histérica até a atuagaio do crime espetacular calculado para ser transmitido pela midia. Talvez dois pontos séo comuns entre o massacre-amok e 0 lerrorismo: (a) “[...] ambos estiio igualmente longe de um ‘idealismo’ tchissico que poderia justificar o sacrificio de si mesmos com objetivos Soviais reais” (KURZ, 2001); (b) ambos produzem um espeticulo de Violéncia extrema ¢ sem limites como abjeto de gozo; onde os que se encontram no seu caminho sdo condenados a morte sem compaixao sem direito 4 defesa. Parece que estas duas modalidades de violéncia extrema, inimaginvel © aparentemente louca sé poderia acontecer numa Sociedade plenamente midiatizada e ditigida para produzir espetaculos (DEBORD, 1997); tanto ha midia como na politica, ou até mesmo nos momentos mais dificeis ¢ desesperadores do ser humano, por exemplo, em que os filhos stio vitimas de sequestro ou assassinados no ambiente escolar, a imprensa acompanha, afinal, ‘alguém precisa fazer este trabalho de divulgagfo’. Parece que a -violéncia que ocorre nas grandes cidades ¢ sua reprodugao nas escolas que deixaram de ser um lugar protegido dela, também se insere como produto da sociedade contemporinea, Basta acompanhar os massacres ocorridos em todas as 080 aS ami cades: a fromeira entre o drama real ¢ os mNOUS NO BAPAC Breve perfil do assassino-amok Os estudiosos hoje trabalham com um perfil do criminoso amok: 61% ocorre por vinganga (bullying), 61% so depressivos reativos, 83% sofrem dificuldade para lidar com perdas, 93% demonstram comportamento estranho, 95% dos ataques so planejados com armas de fogo adquiridas de parenies ou conhecidos (dados obtidos numa reportagem da TV Globo/2011). Qualquer lugar onde ha facilidade de conseguir armas, aumenta a probabilidade de ocorréncia de atos deste tipo. Foi elaborado um perfil dos crimes-amoks, indicando que: a) todos os assassinos eram homens; 'b) tinham personalidade esquizo (mas n§o eram psicdticos), eram calados, ressentidos, fora do controle da familia; ¢) predominam viciados em jogos eletrénicos, seriados de tv ¢ filmes violentos; d) sabiam manejar as armas como se fossem profissionais; ¢) antes do crime, no apresentam qualquer sinal de comportamento desviante ou histérico de delinquéncia, mas tinham histérico familiar complicado; f) escolheram uma escola, universidade ou shopping, ou seja, os massacres 80 planejados para serem piblicos: no se trata de alvejar os passantesa partir de uma janela escondida, como acontece nos franco atiradores; também nfo se trata de ir assassinando um a um, cuidando para nio deixar pistas do criminoso serial killer: O crimineso-amok produz uma ‘matanga teatral’, analisa Calligaris (2009), indicio que reforga a hipétese de ‘crime espetacular’. Apés o massacre na Escola Tasso da Silveira, em Realengo/ 2011: a licio da dor e do sofrimento dos alunos, pais e professores No Brasil € sempre assim: passada a comogdo nacional de um acontecimento trégico (massacre, enchente, acidente), vem o esquecimento, a falta de medidas preventivas e o afastamento das ‘se organizaram para fazer um protesto pelo descaso das autoridades Rio de Janeiro, tanto dirigida para os danos causados como para prevengilo), Qualquer sobrevivente de violéncia humana extrema, mais os sobreviventes das catistrofes da natureza, se so dotados de resiliéneia, conseguem retornar 4 reconstrugdo de sua existéncia marcada pela dor ¢ ‘tocar’ a vida como pode, Outros, porém, passam a conviver com angiistia em excesso, medo difuse, paranéia, principalmente no ambiente gerador do trauma, enfim, a sombra do ato criminoso iri acompanhar toda sua existéncia esvaziada de sentido. Este autor vem observando pessoas — até pesquisadores no campo di educagio — que minimizam o massacre na escola de Realengo, como se fosse apenas um “caso isolado’, ‘coisa de esquizofrénico’, ou fazem discurso reducionista de lugar comum, projetando toda a responsabilidade a algum grande Outro: © governo local ou federal, o capitalismo, 0 neoliberalismo, a pés-modernidade. HA também aqueles que se declaram “acostumados’ com a violéncia das metropoles do Brasil, reproduzida também dentro escola. Alé certo ponto é compreensivel fazer uso dos conhecidos meeanismos de defesa do ego, afinal, cada um precisa controlar o estresse, contornar ‘a8 Situagdes-limite, mas ¢ imperioso buscar um novo método e uma nova teoria que explique a complexidade de tal violéncia extrema € que possa ferar medidas preventivas eficazes para além daquelas convencionais, ‘Quando comegamos a discutir a relagao escola e violéncia, foi baixo © retorno dos professores da universidade. Foi extremamente baixa a purtivipagado dos professores na 17°, Semana de Pedagogia, em 2007, cujo tema ‘violéncia na/da escola’ foi escolhido pelos alunos do curso. Afinal, por que profissionais supostamente tio esclarecidos insistem em ignorar esta pauta de investigagdo cientifica’ e/ ou promover debates nas escolas © universidades? Apés o massacre de Realengo, o assunto violéncia ainda esti fora da pauta dos eventos universitarios (semana de pedagogia, formagio continuada de professores, etc) como se este assunto nfo fosse importante para andlise, alerta e debate. Felizmente algumas escolas ¢ Secretarias municipais de educagao promovem palestras ¢ debates nesse sentido, sque-em quinze anos, entre 1980 © 1995, foram gives de mestrade, Desse expressive volume: de ja vidiincla que atinge a escola (SPOSITO, 2001), Também hi questOes que deveriam estar na) formagio dos professores: antes de reconhecer a discussdo sobre a violéncia na escola, por que nao discutimos a qualidade das relagdes humanas nas escolas € has universidades? Por que cresce o individualismo produtivista nas universidades publicas? “Por que os professores, pais ¢ educadores nfo se irmanam, de modo mais disciplinado, em uma luta a favor de relagdes humanas mais respeitosas?” (NAGEL,2009, p.127). Houve uma época em que educar os “bons modos’, “as boas maneiras’, ou a ‘polidez’ - que em filosofia ¢ ‘uma virtude menor mas necessaria’, conforme analisa Comte-Sponville (1995), ou promover a ‘cultura da paz’ pareciam temas de perfil *conservador’. A perspectiva ‘progressista’ ao explicaros problemas do campo educacional, nasdécadasde 1970-80, tendia a.um “abstracionismo pedagdgico” (AZANHA, 1992, p. 42, LIMA, 1995), entendendo esta expresso como a desconsideragao para as determinagdes especificas de sua coneretude, por exemplo, a cultura de cada escola; assim, em vez de reconhecer as ‘miultiplas determinagdes do conereto’, tal perspectiva ‘progressista’ se contentava em “[...] ater-se a ‘principios” ‘ou ‘Ieis’ gerais que na sua abrangéncia abstrata seriam, aparentemente, suficientes para dar conta das situagdes focalizadas”. (AZANHA, 1992, p. 24), Essa perspectiva, ainda hoje, continua com o mesmo olhar ao analisar- sea relacio entre escola X violéncia: persiste um certo desprezo pela busca de dados empiricos, ¢ persiste a indistingao ¢ generagao sobre os diversas formas da manifestagao dos atos agressivos humanos, © tentam ‘explicar tudo’ usando ‘explicagdes gerais ¢ consagradas’ (PRAXEDES, 2001), em primeiro lugar, reduzida a critica do capitalismo ou ao neoliberalismo ¢ seus efeitos danosos, Parece existir hoje um esgotamento desse modo dogmitico de ‘explicagiio panoriimica’ que pretendia explica ‘tudo’, A boa noticia é 0 aparecimento de novos estudos ¢ pesquisas cientificas pautadas na coragem para investigar novos problemas, com nova perspectiva, humildade epistémicas, ¢ disposigdo para debate. Pesquisas e possibilidades de prevengio sobre a violéncia ‘na’ escola ‘A pesquisa do Instituto SM para a Edueagio (ISME), em 2006, coordenada pela professora. Maria Isabel Leme (USP), compara 0 Brasil, = 62 - d “Aingamentos (33,1); 20,1% dizem sofrer fisicas dos colegas, ¢ 17,1 sofre rejeigio. Para a maioria dos professores (58.8%), a auséneia de limites impostos pelos pais na educagio oe ae responsdvel pelos conflites entre professores © alunos (ISMB, ). ‘Ouitra pesquisa realizada pela UNESCO, em 2002/3, revela que existe violéncia em 83.4% das escolas brasileiras. Os furtos ocorrem em 69.4% delas, Cerca de 60% disseram ocorrer roubo em sua sala de aula, 37% declara que ja foi furtade ¢ 69% no sabe a razdo. Enquanto a depredagio do patriménio ¢ fendmeno que expde © vandalismo, os cases de bullying e a violéncia moral ainda silo eonsiderados simples *brincadeiras de mau gosto’. Os professores devem ficar atentos para reconhecer os indicios e agir preventivamente contra violéncia psicolégica. Estudos, palestras e debates ajudam a desenvolver uma consciéncia critica ¢ geram cobrancas de medidas preventivas que beneficiam a vitima ¢ 0 coletivo da escola, mas, silo necessdrias medidas criativas ¢ efetivas que revertam © desenvolvimento da barbarie. Um ato criminoso que causa comacdo entre alunos, professores ¢ funciondrios, ou quando é constatado © aumento da violéncia no espago da escola, so improvisadas medidas supostamente preventivas visando coibir novos atos de violéncia na escola. (Nos EUA, em 1994, cerca de 20% dos colégios norte-americanos revistayam seus alunos na entrada e faziam inspegdes inesperadas em salas de aula, Falta saber se tais medidas tém sido suficientes para evitar atos de violéncia ¢ de barbaric nas escolas daquele pais), Entio, instalar cimeras na escola, detector de metais, contratar segurangas etc. siio as medidas mais frequentes e, muitas: yezes, tém inspiragio politiqueira ou marketing do gestor da escola ou da seeretaria de educagio, A resposta ‘preventiva’ baseada no senso-comum € no sustentada em estudos sistematicos, na-escola publica ¢ particular, ainda nfo gera mobilizagao dos sindicatos dos professores ¢ funcionarios ¢ associagdes de pais, no Brasil. O massacre da escola de Realengo pode ter aberto a caixa de Pandora, isto é, pode acontecer hovamente em escolas e universidades do territério. brasileiro, ae inlo € exagero se Secretarias de educacto elaborassem em algumas partes do planeta, O treino on am aks e terrorismo ¢ obrigatério nas escolas © universi ii, Cuba, Cordia do Norte e Israel, a violéncia real ou imaginada, fobia escolar e ‘See Professores funciondrios com transtornos psiquicos costumam pedir licenga ou entram na condi¢io de readaptados, que ¢ uma medida insuficiente se nado proceder @ uma psicoterapia. Muitas yezes, os transtornos psiquicos tem como resposta o estigmas ou criticas negativas de ‘falta de comprometimento", ‘absenteismo" ¢ ‘falta interesse’, personalidade ‘ressentida’ etc ‘Como ja foi dito, a indisciplina tomada como ato infracional pode ser considerada “|...] andloga ao crime, portanto, alguns nao podem ser negociados, pactuados ou mediados” (SILVA, 2007). Portanto, existe a necessidade de se fazer registros das ocorréncias cotidianas, sobretudo daquelas que envolvem alunose professores, alunos ¢ patriménio escolar (causar danos a carteiras, paredes, quadros, aparelhos, roubos, etc), visto que com tal documento se constitui a meméria do estabelecimento escolar. O histérico das ocorréncias pode pesar nos argumentos e na tomada de decisdes acertadas em situagdes que envolvam as distingdes que registramos nesse escrito, Outras medidas preventivas devem der analisadas e discutidas junto a comunidade escolar, ¢, em alguns casos € prudente consultar a promotoria da infancia e da adolescéncia, porque hem sempre os professores sabem o que prevé a lei ¢ 0 Estatuto da Crianga e do Adolescente. Qual educacio pode evitar a barbarie? Foi Adorno (1995ab) em didlogo com Becker, publicado com o titulo Educacdo contra a barbdrie quem alertou para a escola ser a tinica instituigdio capaz de evitar a ‘barbaric’, Entendo por barbérie algo muite simples, ow seja, que, estando na civilizagio do mais alto desenvolvimento tecnoldgico, as pessoas se encontram strasadas de um modo peculiarmente disforme em relagdo a sua prépria civilizagao =e mio apenas por ndo terem em sua arrasadora maioria experimentado a formagiio nos termos correspondentes 90 conceito de civilizagdo, mas também por se encontrarem tomadas por uma agressividade primitiva, um 6dio primitivo ‘ou, na terminologia culta, um impulso de destruigao, que contribui para aumentar ainda mais 0 perigo de que toda clvilizagho venha a explodir, ‘lids uma tendéncha ‘itmanente ai - 69 TAN INCIVIVIDADRY DO BIA A DIA, joterizh, Considero Wo urgente © innpericke tate CINEREA rice vn tron, chervoe roamed or esta prioridade. (ADORNO, 1995a, p. 155), Em Educagdo apés Auschwitz 0 pensador da teoria critica alerta para a possibilidade de novos genocidios, massacres de populagdes, barbiries que parecem ser imunes aos avangos da civilizagaio. Caberia um novo projeto educacional criar mecanismos preventivos nesse sentido. A psicandlise tem: um papel imprescindivel junto com a educagio, para: [ ease em S set. 2011 AQUINO, Julio Groppa (Org.). A violéncia escolar ea crise da autoridade docente, Cadernos Cedes, Campinas, v. 19,n. 47, p, 7-19, dez. 1998, ARENDT, Hannah. A crise na educago, In: ARENDT, Hannah, Entre o passado e 0 futuro, Sto Paulo: Perspectiva, 1972p. 221-247. ARENDT, Hannah. Sobre a violéncia. Rio de Janeiro: Relume Dumard, 2001. AZANHA, José Mario Pires, Uma idéia de pesquisa educaciomal, Sdo Paulo: Edusp, 1992. BOUDON, Raymond; BOURRICAUD, Francois. Diciondrio critica de sociologia. Sao Paulo: Atica, 2001, BOURDIBU, Pierre. Escritos de educagio, Petrépolis: Vozes, 1998, BOURDIEU, Pierre. 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