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As revolugGes russas Daniel Aarao Reis Filho Professor titular de Histéria Contempordnea da Universidade Federal Fluminense A SANTA RUSSIA IMPERIAL E AS TRADIGOES REVOLUCIONARIAS ntre 1905 e 1921, a Santa Rissia Imperial Tzarista transformou-se em Unitio Soviética, o que foi consagrado juridicamente, em 1922, com a apro- vaio de uma primeira Constituicgéo da Unido das Reptblicas Socialistas Soviéticas (URSS). Como a Revolugdo Francesa, em fins do século XVIII e comegos do século XIX, as revolug6es russas que levaram a fundagao da URSS modificaram a face do mundo. Para muitos, deram inicio ao século XX. Seja qual for nossa opiniao a respeito, é inegdvel que imprimiram sua tarca a um século que sé terminou com o desaparecimento dos resultados criados por elas, fA narragio e & interpretacdo dessas revoluc6es que se dedica o presen- te texto. A Santa Rissia Imperial Tzarista era marcada por violentos contrastes. Ne um lado, a impressao de solidez, de permanéncia. De outro, uma crénica inntabilidade, prenunciando hipéteses de convulsées. A permanéncia seria celebrada em duas datas memorveis: 1912 e 1913. Nu primeira, a sociedade festejou o centendrio da derrota da invasdo napo- leOnica, que projetou a Rissia como poténcia européia. Na segunda, exal- fou-se o tricentendrio da dinastia reinante, os Romanov. Mitos pretéritos, presentes e futuros. Continuidades. © poder tzarista, de fato, apoiava-se em poderosas tradigées e estruturas politicas e sociais. O nexo rural constituia sua base principal de sustentac4o, apesar do des- juute do tempo e das insatisfagdes acumuladas. Os proprietdrios de terra e os eamponeses (mujiques), aferrados a tradig6es imemoriais, representavam iain de 80% da populagao existente. Baixos niveis de produtividade, altas tuxan de exploragao, miséria, fomes periddicas: a forga do Antigo Regime, através das fronteiras do tempo, tindo 4 modernidade capitalista e as re- a7 © SECULO Xx formas ocidentalizantes. Bolsées de progresso tecnolégico nao escondiam a realidade maciga do atraso, simbolizado pelo largo uso ainda do arado de madeira e das maos nuas do camponés como instrumentos principais de tra- balho. Freqiientemente absentefstas, os proprietarios, de modo geral, viviam em outro tempo, endividados, parasitando a sociedade, cultivando as glérias eos valores do passado, sem alternativas de futuro. Antigas tradig6es religiosas amarravam com seguros nés esta sociedade agraria, mesclando-se os ritos e as estruturas hierarquicas da Igreja Ortodo- xa com os costumes animistas e magicos da religiosidade popular. Dos mos- teiros recolhidos e austeros aos popes embriagados das aldeias havia abismos de cultura, mas também denominadores comuns, construindo identidades, sobretudo entre os eslavos, e entre os russos, em particular. Porque o império era multinacional, abrigando, como se vera, um caleidoscépio de povos, re- ligides e culturas. Com a religiao, entrecruzando-se com ela, havia a figura do tzar, venera- do como representante de Deus na Terra, considerado pelos mujiques ao mesmo tempo como chefe todo-poderoso, a quem se devia cega obediéncia, e como bondoso Paizinho, a quem se devia filial reveréncia. O tzar estava em toda parte, em retratos e santinhos, em quadros e medalhas e estatuas, na memoria e nos coragGes das gentes. Presente ainda através de uma burocra- cia tentacular (seus olhos e seus ouvidos), famosa por seus niveis de arbitra- riedade, ineficiéncia e corrup¢ao. E de uma policia politica terrivelmente efi- caz na identificagao e neutralizagdo de eventuais oposicdes. Uma fé, uma nagao, um tzar. O lema nao deixava espaco ou margens para questionamentos e contestagdes. Unanimidade e imobilidade. Era como se o tempo houvesse parado, congelado (Werth, 1992). No entanto, a sociedade se movia. Antes de tudo, o movimento demogrdfico. Entre 1860 e 1870, uma pro- gresso anual de 1 milhado de habitantes. Desde entdo, e até 1914, 2,4 mi- lhGes a mais por ano. Como conter estas massas crescentes nos limites rigi- dos dos regulamentos do Antigo Regime? Havia ainda a expansao politico-militar, suscitada pelo proprio regime, em todas as diregdes da rosa-dos-ventos. Ao ocidente, a captura de territ6- rios da Polénia, partilhada com o Império Austro-Hungaro e 0 Reino da Prissia desde fins do século XVIII. E também os estados balticos e a Finlan- dia. Ao sul, a regiao do Caucaso, sempre insubmissa, mas integrada. Ao leste, as vastidées siberianas, as regides usurpadas ao Império do Meio, a ins- a8 AS REVOLUGOES RUSSAS talacdo de uma 4rea de influéncia no nordeste chinés, na Manchtiria, com 0 arrendamento de Port Arthur, Em trezentos anos, o Império registrara um avango permanente, sistematico, como se dele dependesse sua sobrevivéncia. Foi assim que se constituiu como império multinacional abrangendo miltiplos grupos lingiifsticos, religides, costumes e tradicdes. Cristaos orto- doxos, protestantes e catélicos, mugulmanos xiitas e sunitas, judeus, animis- tas, eslavos e nao-eslavos, europeus e asidticos, povos com consciéncia nacio- nal consolidada, outros sem meméria definida, Naquela babel de linguas, nacionalidades, tribos e clas, o centro moscovita impunha-se segundo os pa- drées asiaticos: submissao politico-militar e autonomia cultural. Entretanto, de acordo com as conjunturas concretas, quase sempre como reacdo a revol- tas de povos insubmissos, perpassavam surtos de russificagdo, com propos- tas ambiciosas de tudo homogeneizar. Um outro movimento, profundamente subversivo, e também suscitado pelo Estado, abalaria as estruturas tradicionais: a modernizac4o industrial, de tipo capitalista. O Estado acordou para ela obrigado por imposigGes estratégicas, em vir- tude da Guerra da Criméia, nos anos 50 do século XIX, quando foi incapaz de vencer ingleses e franceses e de impor suas vontades ao Império Otomano. Foi entao que as elites imperiais se surpreenderam no comando de uma gran- de poténcia... atrasada. E compreenderam que era tempo de assimilar refor- mas e técnicas ocidentalizantes, Numa primeira ofensiva modernizante, aboliu-se a servidio, em 1861, introduzindo-se, com ela, um conjunto de reformas em miiltiplas areas: for- gas armadas, educagdo, justica, administracao central etc. Ambigdes gran- diosas, resultados mitigados. Para uns, as reformas tiveram éxito, pois afas- taram o fantasma da revolugao por mais de cingitenta anos. Para outros, per- deu-se ali uma chance histérica de o Império ingressar plenamente no século XIX europeu (Reis Filho, 1997). Uma nova onda reformista varreria a sociedade, principalmente as cida- des, a partir de 1890. Aceleraram-se ent&o os ritmos de desenvolvimento capi- talista, impulsionados pela construgao de uma rede de estradas de ferro, sob iniciativa estatal. A metalurgia, a siderurgia, o petréleo e o carvao, setores de ponta da economia internacional da época, puxaram um crescimento médio anual de 5% entre 1888 e 1913. Apesar das crises, entre 1901 e 1905, e do fato de a agricultura e a indiistria leve nao terem acompanhado essas médias, 0 im- pério parecia ter ganho dinamismo, despertando de sua tradicional letargia. a9 © SECULO xx Em dois periodos, sobretudo, presididos respectivamente por S. Witte (1892-1903) e por P. Stolypin (1906-1911), uma série de mecanismos garan- tiu altas taxas de desenvolvimento. Elevadas barreiras alfandegarias, estimu- los fiscais, encomendas do Estado, moeda forte, arregimentacao agressiva do capital estrangeiro, conferiam ao capitalismo russo um perfil especifico — ativa participagao e controle estatais, forte presenca do capital estrangeiro, sobretudo nas finangas ¢ nos setores tecnoldgicos de ponta, burguesia nacio- nal pouco expressiva, mas ganhando terreno, sob a protegao das reservas de mercado impostas pelo Estado. A Rissia dotava-se de importantes setores industriais, mas continuava apresentando, as vezes aprofundando, desigualdades gritantes. Ao lado do que havia de mais moderno no mundo de ento, como as inddstrias de instru- mentos de preciso de Sao Petersburgo, persistiam condig6es de trabalho dig- nas da primeira grande revolucio industrial, ocorrida em fins do século XVII. A agricultura atrasada, com suas tradig6es arcaicas, resistia as intengdes e as politicas modernizantes, como as de P. Stolypin, que pretendeu, sem sucesso, criar no império uma préspera camada de pequenos proprietarios privados, que poderia ser um elemento dindmico para a constitui¢do de um mercado in- terno de consumo de massas e uma base social slida para 0 capitalismo russo. Progresso e atraso, combinando-se mutuamente, num processo de desen- volvimento desigual e combinado, como analisou ja na época Leon Trotski (Deutscher, 1966-68). O Império agigantava-se, mas era um gigante de pés de barro. Fermentavam, por isso mesmo, as insatisfagdes e os ressentimentos. E explodiam, periodicamente, revoltas nas Areas rurais, tomando as vezes a forma de movimentos de massas, como na conjuntura que precedeu a aboli- ao da serviddo, agitando o fantasma de uma guerra camponesa. Desde os anos 80, movimentos grevistas nas cidades indicavam que os mujiques migra- dos dos campos e transferidos para as fabricas davam demonstragdes de im- paciéncia. E nesse quadro social que se formarao as tradigGes da intelligentsia revoluciondria russa. Elas se estruturaram em torno de duas vertentes, A INTELLIGENTSIA REVOLUCIONARIA RUSSA, De um lado, e principalmente, as propostas de um socialismo rural, baseado na nacionalizago e distribuigao eqititativa da te , sob controle dos campo- 40 AS REVOLUCGOES RUSSAS neses. A idéia basica era fazer com que a Comuna Rural, instituigéo ances- tral e igualitarista, reforgada no processo da aboligao da serviddo, se consti- tuisse como o organismo de base de uma sociedade nova e revolucionada. Assim, o Estado seria formado por uma federag&o de comunas agrarias, con- iroladas e dirigidas pelos préprios camponeses, convertidos em senhores da terra, da sociedade e do préprio destino. i ; A utopia igualitarista russa encontrava af sua tradugao politica, evitan- dlo-se 0 modelo europeu ocidental, abominado pelas desigualdades que gera- va e pelos sofrimentos que impunha 4s grandes maiorias proletarizadas. Essa corrente bifurcava-se em numerosos afluentes, que poderiam ser ugrupados em duas grandes tendéncias: os partidarios de um trabalho perse- verante de propaganda que seria capaz de ganhar as consciéncias a longo prazo, € os adeptos da aco direta de vanguarda, especializados em abater as cabegas do regime no sentido de desestabilizd-lo e de provocar, em conse- «liéncia, as brechas por onde haveriam de vir as ondas revolucionérias. Pela sua decisao de ir ao povo (narod) para despertar a sua consciéncia revolucio- iiria — supostamente latente —, passariam para a historia como os narod- uiks, ou populistas. Seriam responsdveis por muitas agitagoes nos campos e pela morte de nao poucos dirigentes do Estado imperial, inclusive um tar, Alexandre Il, abatido em 1881, depois de varias tentativas frustradas (Berlin, 1988). Em comegos do século XX, em 1902, seus grupos, embora enfraque- cidos pela repressao sistematica, formariam um partido de grande influéncia jos meios rurais, o partido socialista revoluciondrio, muito mais uma confe- ileragdo de grupos do que propriamente um partido. . A outra vertente constituiu-se em torno do pensamento de Marx, através ilo filtro da social-democracia alemi, e filiou-se 4 Internacional Socialista, {undada em 1889. Discordava dos populistas, considerando-os utdpicos, por )roporem projetos irrealizaveis, e reaciondrios, no sentido proprio da pala- vru, ou seja, aferrados a uma tradigo que jd nao tinha condi¢6es histéricas de sobrevivéncia. Para a social-democracia russa, constituida em partido desde 1903, oca- pitalismo era uma realidade incontornavel. Embora ainda nao dominante, era o fator dinamico por exceléncia da sociedade russa. Impossivel ignora-lo ¢ desconsiderar as transformagées que j4 provocara na sociedade. Os que se encontravam reunidos r tendéncia apostavam nos operarios, e nao mais Hoy Camponeses como principal classe revoluciondria, e consideravam quea revolugtio na Russia passaria por duas etapas. A primeira, sob diregéo da a) © SECULO xx burguesia, realizaria as tarefas do tempo historico burgués: reptiblica demo- cratica, reforma agraria e soberania nacional, criando as melhores condigées para que as lutas proletarias pudessem colocar na ordem do dia a proposta da revolucao socialista. Dessa etapa o proletariado e seu partido participa- riam ativamente, resguardando sua autonomia e se preparando para os em- bates futuros. Entretanto, apesar desse consenso fundamental, os social-democratas russos divergiriam em outras questdes, como a forma de organizacao parti- daria, Assim, desde o proprio congresso de fundagao, em 1903 (a rigor, uma refundagao, jé que 0 projeto definido pelo primeiro congresso, em 1898, fora rapidamente dizimado pela policia politica), formaram-se duas correntes: os bolcheviques (majoritarios) e os mencheviques (minoritarios). Os primeiros, mais rigorosos do ponto de vista organizacional, argumentavam que as con- digGes russas exigiam um partido de revoluciondrios profissionais, centrali- zado, como um exército. Os segundos, temendo que uma op¢ao desse tipo pudesse conduzir a uma dindmica fechada e sectaria, pretendiam construir um partido nos padrées da social-democracia européia ocidental, mais aber- to e flexivel do ponto de vista organizacional. Essas divergéncias, talvez superdimensionadas pela aspereza do exilio e das condicdes de clandestinidade, impostas pela repressdo, envenenaram a at- mosfera e radicalizaram os animos, fazendo com que a social-democracia russa, as vésperas da revolucao de 1905, aparecesse como um partido permea- do de querelas e imerso em Iutas fratricidas, ou seja, enfraquecido para enfren- tar as imensas tarefas que os desafios de uma revolugao social iria apresentar. AREVOLUGAO DE 1905 Os grandes movimentos sociais que se formaram em 1905 apareceram de forma imprevista, como é usual em processos revoluciondrios, surpreenden- do o poder e os préprios protagonistas. Foi uma aventura militar no Extremo Oriente, promovida pelo Estado tzarista, que esteve na raiz de tudo. Como ja se referiu, os russos haviam es- tabelecido no nordeste chinés uma 4rea de influéncia, inclusive ganhando a concessao de um porto: Port Arthur. Nessa regido, com 0 tempo, intensifica- ram-se as contradi¢Ses entre os interesses russos e japoneses, também ali pre- a2 AS REVOLUGOES RUSSAS sentes. Negécios em concorréncia, pretensdes competitivas, os animos tende- ram a se acirrar, Do lado russo, apesar das adverténcias de conselheiros mais licidos, prevaleceram concep¢6es arrogantes, subestimando-se a capacidade militar e industrial japonesa. Assim, quando os japoneses atacaram de surpresa, no inicio de 1904, destruindo a esquadra russa em Port Arthur e desencadeando ofensivas ter- restres, 0 Império Tzarista comecou a acumular derrotas e desastres. Nao seria facil, considerando a debilidade dos meios disponiveis, mobilizar exér- citos, material de guerra e logistica para batalhas que se desenrolavam num teatro de operagées longinquo. Cedo comegou 0 cortejo de provacées: as mortes, o medo das mortes, as dificuldades de abastecimento, a desorganizagao dos circuitos econdmicos, tensionados pelas necessidades da guerra. A insatisfagéo era tanto maior quanto as populagGes nao conseguiam compreender exatamente 0 que esta- va na verdade em jogo. A Patria russa, sua honra e integridade certamente no estavam ameagadas pelos japoneses. Como justificar ento os sacrificios que estavam sendo exigidos, até mesmo 0 da prépria vida? Foi ent&o, num contexto de insatisfagdes e protestos, que se organizou, na capital cultural e politica do império, em Sao Petersburgo, uma grande passeata popular. Tinha propésitos pacificos, apenas desejava reivindicar e propor © didlogo as autoridades e por isso mesmo os manifestantes — ho- mens, mulheres e criancas — dirigiram-se naquele domingo, 9 de janeiro de 1905, para o Palacio de Inverno, sede e simbolo do poder. Iam como se fos- sem para uma festa, e nao para um enfrentamento. Entretanto, em vez de acolhimento e conversa, receberam balas de me- tvalhadora. Foi o panico. E a matanga. O dia passou a Histéria como o do- mingo sangrento. E provocou payor, surpresa, indignacdo e revolta. Sem que ninguém tivesse previsto, estava ali comecando a revolugao de 1905. Ao longo do ano, o império foi estremecido por trés grandes ondas de preves operdrias: a de janeiro, em protesto contra a brutal repressdo a pas- seata; a de maio e junho, centrada em reivindicagées sindicais e politicas; e, finalmente, a de setembro e outubro, quando organizagoes populares preten- m, sem éxito, confrontar-se com 0 governo. Em termos programaticos, os operdrios reclamavam o acolhimento de reivindicagdes ha muito defendidas, e que correspondiam, em larga medida, ao que ja tinham conseguido os sindicatos da Europa Ocidental: liberdade de organizagio sindical, direito de greve, jornada de trabalho de 8 horas, férias, aa © SECULO xx previdéncia social etc. E um quadro constitucional definido. Os mais radicais falavam em repiblica. Os moderados se contentavam em ver 0 tzarismo con- vertido em monarquia constitucional, As inovagées mais radicais, no entanto, vinham por conta das formas de luta adotadas, em especial a greve politica de massas, e das formas de orga- nizag4o, como a criada pelos trabalhadores de Ivanovo-Voznesensk, ao norte de Moscou: um soviete (conselho) de representantes. Agil, flexivel, colado aos sentimentos e aspiragdes da base de eleitores, sem mandatos fixos, nem remuneragGes especiais, conjugando aspectos politicos e sindicais, 0 soviete adquiriu rapidamente projegio em todo o império, tendo sido assumido como modelo de organizagdo em muitas cidades. O de Sao Petersburgo, en- quanto durou, conseguiu grande prestigio, fixando-se na memoria historica. Mas 0 processo revoluciondrio de 1905 nao se restringiu aos operarios, nem apenas as cidades. Mobilizaram-se igualmente as camadas médias urbanas, constituindo suas associagGes, as unides profissionais, formulando seus interesses especi- ficos e um programa liberal-democratico. E as nagdes no-russas, aprovei- tando as brechas para defender programas de autonomia cultural e politica. Os mais radicais, visiveis sobretudo entre as nacdes mais consolidadas, no ocidente no império, chegavam a falar em secessao, anunciando a hipétese da desagregacao politica. Por outro lado, agitavam-se soldados e marinhei- 10s, principalmente os das bases navais do Golfo da Finlandia (Kronstadt) e os do Mar Negro, estes ultimos protagonistas do episddio do levante do en- couracgado Potemkin, celebrizado pelo classico filme de Eisenstein. Finalmente, e mais importante, os camponeses, a partir do inicio da pri- mavera, também comegaram a entrar em ebulicdo, formando associagGes € invadindo terras. Em julho de 1905, houve um ptimeiro congresso campo- nés, reunindo representantes de 22 provincias. Exigiram a nacionalizagao da terra e a eleig&o de uma Assembléia Constituinte, As brechas se multiplicavam, ameagando a estabilidade da Ordem, agra- vando um quadro deteriorado por novas derrotas, algumas catastréficas, como a do estreito de Tsushima, onde uma nova esquadra russa foi afunda- da por uma desconhecida armada japonesa. O regime tzarista sentiu-se acuado. E comecgou a negociar. No plano in- ternacional, abriram-se conversa¢des com os japoneses. Estabeleceu-se um armisticio. No 4mbito do império, o tzar editou um manifesto, em outubro de 1905, onde se prometiam concessées, entre as quais a convocagao de elei- ¢6es para um Parlamento (Duma). 44 AS REVOLUGOES RUSSAS Os movimentos e as organizacg6es mais decididas e radicais, como 0 so- viete de Sao Petersburgo, ainda tentaram continuar as lutas em ritmo ofensi- vo. Foi em vao. A convocacao de uma greve geral, em outubro, resultou em fracasso, ensejando uma contra-ofensiva repressiva que desmantelou o so- viete e prendeu suas liderangas. Em toda parte, as lutas comegaram a refluis, registrando o impacto das promessas do tzar e, principalmente, o alivio sus- citado pela suspensdo da guerra. ; Um iltimo arranco ainda veio de Moscou na forma de uma insurreigao protagonizada pelo soviete local, em dezembro de 1905. Ficou isolada e ore- ime péde destruf-la, empregando tropas que voltavam do front, ja dispont- veis para as tarefas de repressao da populacdo civil. Apesar de muitos ainda tcrem ficado na expectativa de outras — e novas — ondas revoluciondrias, aquele ano vermelho tinha chegado ao fim. No entanto, as questées que suscitara ganharam alcance mundial e se tor- naram temas de debates histéricos no Ambito da social-democracia interna- cional e, em particular, no dos revoluciondrios russos: a greve politica de mas- sas, OS sovietes, © programa de nacionalizagao da terra, as revoltas de solda- dos e de marinheiros, os movimentos nacionais no interior do império, as am- bigitidades dos liberais, a questao das relagdes entre guerra e revolugao. Ali estava toda uma gama de novas interrogagdes, ou de velhos problemas colo- cados de uma forma nova, a desafiar a imagina¢ao dos revolucionarios. A burguesia liberal nao agira de forma demasiadamente moderada? o processo histérico confirmava ou desmentia sua vocagao revolucionaria? Nao tinham ficado evidentes os lagos entre os liberais e um regime que eles comba- (iam retoricamente, mas sem demonstrar ousadia pratica quando na hora de atacd-lo? Nessas condig6es, como imaginar que a burguesia pudesse liderar uma revolugo republicana democratica? Mas nio era esse o papel que lhe re- servara © programa da chamada primeira etapa da revolug&o russa? Um outro aspecto crucial: a participagdo ativa dos movimentos campo- ticses. Enquanto duraram, haviam constituido, pela sua massa e pela sua ra- dicalidade, uma poderosa arma da revolucao. Seria o caso de considerd-los uliados preferenciais dos operdrios na luta pela derrubada do regime? Deslo- cando a alianga urbana, com os liberais, para uma alianga operdrio-campo- nesa? Mas o que dizer do programa camponés de nacionalizagao e distribui- (io igualitéria da terra? Nao significava ele o triunfo das teses populistas para a revolugao russa? Seria possivel pensar um socialismo russo rural, au- uropa Ocidental? tOnomo e oposto 2 © SECULO Xx E os povos nao-russos? Também haviam constituido, embora por um breve momento, uma grande forga social desagregadora. No seria valido aproveita-la para explodir o tzarismo? Entretanto, como conciliar o progra- ma socialista internacionalista, comprometido com o futuro, com o estimulo a movimentos nacionalistas, apegados ao passado? Poder-se-ia conceber uma Russia socialista cercada pela ressurgéncia de estados nacionais, even- tualmente néo-comprometidos com 0 socialismo? Questdes perturbadoras, abalando as ortodoxias, algumas apenas esbo- cadas, até mesmo pela celeridade com que passou a revolugao pela cena his- torica, surgindo de siibito, surpreendendo e despertando as maiores esperan- ¢as e paixes, para cedo desaparecer nas dobras do tempo. Diante delas, a maioria preferiu manter-se aferrada 4s concepcées ja de- finidas. Mas houve lugar para a formulacdo de heresias ousadas. L. Trotski passou a defender a proposta de uma revolugdo permanente, com énfase no carater internacional da revolugao. V. Lenin escreveu sobre a hipétese de uma revolucao ininterrupta, refletindo sobre o potencial revoluciondrio dos camponeses. Em questo, para os dois, a vocac4o revoluciondria da burgue- sia. E os dois sugeriam, cada um a seu modo, que a luta por uma reptiblica democratica se encadearia, sem etapas intermedidrias, com a luta pelo socia- lismo, 0 processo todo sob hegemonia do proletariado. Do ponto de vista das aliancas, V. Lenin discorreria, com énfase, sobre a necessidade de procurar 0 apoio dos camponeses, aceitando-se 0 programa baseado na nacionalizagao da terra, e das nagdes nao-russas, mesmo que fosse 4 custa da desagregag&o do império. Todas estas formulagées, no en- tanto, nado foram propostas no sentido de modificar 0 programa da revolu- ¢4o em duas etapas aprovado em 1903. Elas ficariam no ar, em estoque, a es- pera de circunstancias novas, revolucionarias (Reis Filho, 1997). Tais circunstancias custariam a se concretizar. Desde 1906, contrariando as expectativas dos mais otimistas, sempre 4 espera de novas ondas revoluciondrias, os movimentos sociais refluiram. As eleigdes para a Duma Imperial foram afinal convocadas, mas o poder do Parlamento nunca alcangou amplitude maior. Nao teve poderes constituin- tes, nem sequer margem para legislar e fiscalizar de modo eficaz. Reinstalou- se assim 0 regime tzarista com sua forca aparentemente invencivel. Somente a partir de 1910-12, comegaram novamente a surgir movimen- tos de reivindicagées sindicais e politicas, intensificados no primeiro semes- tre de 1914. O regime reagiu como de habito: auséncia de didlogo e repres- 46 AS REVOLUGOES RUSSAS sio. Do ponto de vista dos partidos revolucionérios, a policia politica levava a melhor, prendendo e desterrando grande parte das liderangas. Longe, no exilio, os que estavam ainda em atividade pareciam imersos em intermina- veis querelas. A prépria social-democracia, depois de tentar um processo de rcunificagdo, em 1906 e 1907, voltou a cindir-se em meio a furiosas diver- yéncias e invectivas. Em 1912, numa conferéncia realizada em Praga, a ala dos bolcheviques optou por um processo de reorganizagao, assumindo-se como tnica representante da social-democracia russa. Mas a proposta nao seria reconhecida por nenhuma instancia do socialismo internacional. De sorte que quando explodiu a Primeira Grande Guerra, em agosto de 1914, nada parecia indicar uma revolucio préxima, inclusive porque a socie- dade reagiu quase undnime ao chamado do regime para defender a Patria (los tradicionais inimigos ocidentais: as hordas teuténicas, Como nos demais paises beligerantes, formou-se a Unido Sagrada. Com excegao de alguns pequenos grupos de intrataveis, quase todos, apostando numa luta curta e vitoriosa, dispunham-se a partir para as trincheiras e para \ guerra. /\ PRIMEIRA GRANDE GUERRA E A REVOLUGAO DE FEVEREIRO DE 1917 lntretanto, a guerra nao foi curta, ao contrario, alongou-se no tempo. Nem vitoriosa, Sucederam-se os desastres. E a matanca superou todos os horrores 10s quais aquelas gentes guerreiras estavam habituadas. Milhdes e milhées de mortos, incontaveis (as estimativas variam de 5 a 8 milhdes), sem falar dos feridos, dos mutilados na carne e no espirito. O desabastecimento, as ca- réneias, a inflagdo, a escassez, a desorganizaco geral da vida econémica, provagdes sem fim, submetendo o patriotismo e a paciéncia a duras provas. Contra a inépcia do governo, a sociedade comegou a formular criticas e propostas alternativas. Ainda em 1915, um grupo de parlamentares na Duma manifestou-se em favor da formagdo de um governo responsavel pe- rante o Parlamento, Em seguida, foi a vez das assembléias representativas existentes se federarem, 0 que era proibido pela Lei, assumindo tarefas que, em principio, competiam ao governo. Organizac6es tradicionais, como a Cruz Vermelha, coordenavam-se com 0 movimento cooperativo e outras as- sociagdes para atender ds exigéncias do esforco de guerra. a7 © SECULO Xx Desde 1916, a situagdo comegou a decompor-se de forma acelerada. Reapareceu um movimento grevista. Entre as elites, medrava a desconfianga em relacao ao governo, suspeito de abrigar em seu seio traidores da Patria. A populacio, e os trabalhadores, em particular, estavam cada vez mais descon- tentes. Embora poucos entrevissem a hipétese de uma revolucao iminente, os relatrios da policia politica atestavam claramente a radicalizagao das tensGes. Elas desaguariam afinal nas chamadas jornadas de fevereiro. Em cinco dias de crescentes movimentos sociais, entre 23 e 27 de fevereiro*, 0 povo da cidade de Petrogrado (a cidade fora assim rebatizada, com um nome russifi- cado, pelo regime tzarista ainda no comego da guerra) derrubou uma dinas- tia eterna de trés séculos de existéncia (Carr, 1977). Foi a revolugao da harmonia e do congracamento. Todos irmanados contra um inimigo comum, devidamente identificado: o tzar. A crucificagao do chefe todo-poderoso e do paizinho reverenciado na retomada da forte e antiga tradicdo do bode expiatério. E assim a sociedade péde reencontrar-se pacificada: do alto comando ao soldado, do grande capitalista ao humilde operario, do proprietdrio de terra ao mujique, dos russos aos nao-russos, muito poucos ousando exprimir desacordo com a deposigao do tzar e da di- nastia tricentendria dos Romanov. Na improvisacdo provocada por aquela inesperada inversio de mao, constituiu-se um governo provisério, formado pelos partidos da Duma Imperial. No mesmo momento, em outro lugar, inspirando-se no exemplo re- volucionario de 1905, constituiu-se uma outra instituigdo: 0 soviete de ope- rarios e soldados de Petrogrado. Contudo, um processo social ainda mais relevante tomava pé: a palavra estava solta e livre nas ruas. Das bocas amordagadas e represadas pela timi- dez, pelo medo, pela censura e pela repress4o, comegou a fluir toda uma gama de anseios e de reivindicagées. O que desejavam aqueles que vinham de derrubar a autocracia russa? De modo geral, houve uma retomada dos temas e dos programas avan- cados na revolugao de 1905. * As datas correspondem ao calendario entao em vigor no Império Tzarista, o calendario juliano, com uma defasagem de 13 dias em relagao ao calendario gregoriano, adotado em quase todo o resto da Europa. A Riissia ajustou-se & hora do Ocidente a partir de 1° de fevereiro de 1918. Assim, as datas aqui referidas, ¢ até fevereiro de 1918, correspondem ao calendario juliano. 48 AS REVOLUGOES RUSSAS Entre os trabalhadores urbanos, muito poucos falavam em revolugao e socialismo. Queriam sobretudo liberdade de organizagdo e de manifestag3o, jornada de trabalho de 8 horas, saldrios minimamente decentes, descanso se- manal remunerado e garantias previdencidrias, como aposentadorias e pro- tegdo contra o desemprego, a invalidez e a doenga. Também solicitavam o fim das multas escorchantes e das humilhagdes sem fim, que aparentavam o trabalho industrial 4 serviddo da gleba. Em suma, tratava-se de fazer a Ruissia aplicar a legislacao social j4 conhecida nos centros capitalistas avan- gados da Europa Ocidental. Os camponeses queriam a terra, toda a terra. Nacionalizada, deixaria de ser uma mercadoria, sujeita 4 compra e a venda, e deveria ser distribuida de forma igualitdria, pelas préprias organizacgdes que os camponeses estavam lormando em cada aldeia, os comités agrarios. Os soldados foram cautelosos. Estavam conscientes de que a guerra mu- dara de carater. Nao se tratava mais de defender o regime tzarista, inepto e irbitrario, e seus designios expansivos, mas a revolucao, agora vitoriosa. Untretanto, insistiram no sentido de que tudo se fizesse por uma paz justa, sem indenizagGes e anexagées. Mas foi no ambito da se¢ao militar do soviete «de Petrogrado que um grupo de representantes dos soldados formulou uma verdadeira revolugao na organizacao interna das forgas armadas, editando uma chamada Ordem de Servigo n° 1. Sob um titulo anédino, subverteram e ucrrubaram os dois pilares de sustentago das forcas armadas: a hierarquia e 1 disciplina. Entre outras mudangas, estabelecia-se que nenhum tipo de deci- siio envolyendo tropas e munigdes poderia ser aplicado sem 0 acordo do co- mite dos soldados das unidades concernidas. Finalmente, também as nagGes nao-russas puseram-se em movimento, Do extremo ocidente ao extremo oriente daquele vasto império, os diferen- ‘cs povos solicitavam o reconhecimento de sua personalidade, alguns ja ndo a questao da independéncia. itretanto, comegou a aparecer uma clara contradi¢ao entre os clamores da sociedade e€ as disposig6es do governo provisério, estabelecido pela Du- Enquanto uns reivindicavam aquilo que lhes parecia de direito, 0 outro iio dava nenhuma demonstragdo de que desejava, de fato, atender aqueles pleitos. E batia-se por um outro tipo de agenda: primeiro, era necessdrio obter a vit6ria na guerra contra o alemdo; em seguida, convocar uma Assem- hléia Constituinte, soberana para resolver todas as questdes levantadas pelo debate que se instaurava na sociedade. De imediato, o governo se dispunha apenas a criar comissbes de estudo (Ferro, 1976). avan m. a9 © SECULO Xx Instaurou-se um didlogo de surdos. De um lado, movimentos sociais vi- brantes, cada vez menos cautelosos, mais criticos e exigentes. De outro, um governo insensivel, apegado a seus préprios critérios. Como duas paralelas, nao se via a hora em que se encontrariam. Como consegqiiéncia, as crises foram se sucedendo, A primeira explodiu em abril, menos de dois meses depois da derrubada da autocracia. O ministro de Relacdes Exteriores do governo provisério veio a ptiblico declarar que a Riissia continuava na guerra perseguindo os mesmos fins que os defendidos pelo regime tzarista. Pelo menos foi assim que suas pa- lavras foram interpretadas. Os soldados sairam as ruas, exigindo um compro- misso claro do governo com a paz e a queda do ministro. Ele de fato caiu e, na recomposi¢ao politica que entao se articulou, surgiu uma novidade que teria conseqiiéncias imprevistas: a entrada de seis representantes do soviete de Petrogrado no governo, formando o que se chamou a primeira coalizao. A maré dos movimentos sociais crescia e se organizava. Em maio, reuniu-se um primeiro congresso panrusso de representantes dos camponeses: mais de mil delegados reafirmaram as propostas distributi- vistas e igualitaristas — terra a quem nela trabalha, terra sé a quem nela tra- balha, distribuida pelos comités agrarios em cada aldeia. No campo, a tem- peratura subia, Em margo foram registradas 49 rebelides em 34 distritos. No més seguinte, 378 rebelides em 174 distritos. Em maio, 678 rebelides em 236 distritos. Em junho, 988 rebelides em 280 distritos. Nesse mesmo més, reu- niram-se os sovietes urbanos de todo o império em Petrogrado. Entre mais de mil delegados, os representantes dos partidos moderados ainda tinham fol- gada maioria, mas na manifestacao publica organizada por ocasidio do encer- ramento do congresso era visivel a forca cada vez maior que adquiriam as propostas mais radicais, formuladas pelos bolcheviques e por outros grupos, resumidas no subversivo slogan: todo poder aos sovietes, 0 que significava realizar imediatamente todas as reivindicagdes dos movimentos sociais sob diregao e controle de suas proprias organizagées: sovietes de operarios e sol- dados e comités agrarios, Em outras palavras: o fim do governo provisério e a mudanga do regime social e econdmico vigente. Em julho veio uma outra crise, mais grave. Sucedeu a uma ofensiva mili- tar desastrada desencadeada pelo governo provisério. Os animos exaltaram- se € os marinheiros da base naval de Kronstadt vieram a Petrogrado para, de armas na mio, exigir a derrubada do governo provisério. Houve choques violentos e, pela primeira vez, desde fevereiro, repressio a manifestagdes de 50 AS REVOLUCOES RUSSAS rua. Os bolcheviques foram acusados de estar por tras do movimento, ten- tando desestabilizar o governo. Na verdade, tratou-se de uma revolta fora de seu controle. Contudo, seriam perseguidos como responsdveis e tiveram lide- rangas presas e jornais depredados. O préprio Lenin foi obrigado a cair na clandestinidade para evitar a prisdo. Foi necessdrio, ento, recompor mais uma vez 0 governo. Depois de lon- gas articulagSes, formou-se uma nova coalizdo, prevendo uma participagao mais intensa dos partidos socialistas moderados, ainda majoritdrios na estru- tura soviética, Pouco mais de um més depois, entretanto, em fins de agosto, o pais seria abalado por uma nova crise. Agora, a ameaga ao governo provis6rio tomou a forma de uma tentativa de golpe de direita, dirigida pelo general Kornilov, con- siderado pelo lider do governo, Kerenski, um aliado fiel e um adepto da Repiblica. Para debelar a aventura golpista, o proprio governo convocou e mo- bilizou todas as energias e organizagées populares, os sovietes em particular. O polpe foi contido. Na esteira, os bolcheviques presos em julho foram soltos. E se fortaleceram enormemente os sovietes e a autoconfianga dos movimentos so- ciais, reatualizando-se a proposta de entregar todo o poder aos sovietes. Kerenski, 0 seu Ministério e a sua politica de aliangas sairam profunda- mente desgastados. Muitos dos ministros, a comecar pelo proprio Kornilov, estavam implicados, diretamente ou indiretamente, na tentativa do golpe. Organizou-se mais uma, a terceira, coalizao. Desde fins de fevereiro, quando © tzar fora derrubado, em cerca de seis meses, era 0 quarto governo que se constituia... O quadro social e politico que ele teria que enfrentar nao podia ser pior: forgas armadas em decomposicao, sociedade em ebulig&o, crescente adesao a propostas radicais de resolver os impasses através de enfrentamentos. A har- monia, a confianga e o congragamento de fevereiro tinham dado lugar as di- visdes, 4 desesperanga, 4 desconfianga (Carr, 1977). Quatro grandes processos sociais estavam em curso, decidindo uma mu- danga fundamental na correlagdo de forgas. Desde agosto, uma onda avassaladora do movimento camponés realiza- va uma revolugdo agraria no pais, invadindo terras de proprietarios priva- dos, grandes e médios, da Igreja e do Estado. Em julho, batendo todos os re- cordes até entao, houve o registro de 1.777 casos de violéncia no campo. Pois bem, entre 1° de setembro e 20 de outubro nada menos de 5.140 novos casos foram registrados. Cansados de esperar pelas instituig6es e pelas leis, os cam- grupados em torno de seus comités agrarios, realizavam, na prati- poneses, a a © SECULO XX ca, o ancestral sonho igualitarista: tudo expropriar e tudo dividir, segundo as necessidades (bocas a alimentar) e as possibilidades (bracos disponiveis para o trabalho). A terra nacionalizada, subtraida ao mercado, nao poderia ser mais comprada ou vendida. Além disso, ficava proibido também o trabalho assalariado. Cada camponés usaria as proprias maos e seus instrumentos de trabalho, podendo contar, no maximo, com a ajuda da familia. Desapareceu um dos pélos tradicionais do nexo rural: os proprietarios privados da terra, nobres e burgueses. Emergiu a comuna rural igualitarista como a grande vi- toriosa (Linhart, 1983). Esse processo levou de roldao 0 que restava de coesdo das forgas arma- das russas. Nas frentes militares, os soldados desertavam em massa. Em sua grande maioria, eram camponeses fardados. Tratavam agora de abandonar as trincheiras para participar da distribuicdo igualitaria da terra. Quanto aos soldados aquartelados, estavam muito mais propensos a se manifestar nas ruas do que a combater nas trincheiras. Nas cidades, entrecruzavam-se as greves operdrias e os lock-outs dos patrdes. Em muitos locais de trabalho constituiram-se comités de fabrica, formando redes préprias, assumindo o controle da produgao (Brinton, s/d). Milicias operdrias surgiam nas ruas, realizando treinamentos paramilitares, ocupando e vigiando prédios por conta prépria. Finalmente, as nag6es nao-russas proclamavam seu direito 4 autodeter- minagao e a independéncia politica. Cada povo julgava-se no direito de esta- belecer sua prépria Assembléia Constituinte para decidir, soberanamente, seu futuro. Em fins de agosto, delegados de 13 nagGes, reunidos em Kiev, ca- pital da Ucrania, aprovaram por unanimidade a proposta de que cada nagao seria livre e soberana para tracar seus destinos. Para a grande maioria, a questo da secess4o estava resolvida: tratava-se de deliberar sobre o momen- to e as modalidades da separacdo. E nesse quadro de extrema desagregacio, vizinho ao caos, que se reali- zou a insurreicao de outubro e sé a percepcao desse processo multiplo é que permite compreender a rapidez fulminante com que se tornou vitoriosa. A REVOLUGAO DE OUTUBRO DE 1917 Ao contrario das Jornadas de Fevereiro, que se desdobraram numa sucessao de manifestacdes, em varios dias, sem uma diregao politica visivel, uma revolugao AS REVOLUGOES RUSSAS an6nima (Deutscher, 1966-68), a insurreigdo de outubro seria previamente de- cidida por um partido — 0 partido bolchevique —, organizada por institui sob seu controle — principalmente o soviete de Petrogrado e seu comité mili- tar —e desencadeada sob a chefia de seu dirigente maior — V. I. Lenin. Os bolcheviques consideraram 0 conjunto de processos sociais em curso, a desagregacao geral da sociedade, a decomposigao do governo, mas tam- bém o cansago e o desgaste da populacdo, e as ameagas de uma ofensiva 1 litar alema, que péderia levar a uma derrocada do pais, e da propria revolu cao. Desde o comeco do més de outubro, Lenin insistia no sentido de que 0 partido bolchevique, majoritario em varios sovietes, inclusive no de Petro: grado, assumisse a condugao de uma insurreicdo no centro nervoso do pais, destituisse 0 governo provisério, passasse 0 poder aos sovietes, cujo congres: so estava programado para se reunir em fins de outubro, e formasse um go verno revolucionario, responsdvel apenas perante os sovietes. Este governo, sustentava Lenin, teria condigées, através de uma legislagio adequada, de re conhecer as principais reivindicagées dos movimentos sociais em luta ¢ dar uma saida revoluciondria para a crise que se abatia sobre o pai O partido hesitou ante as propostas de Lenin. Afinal, no dia 10 de outu- bro, o Comité Central decidiu pelo imediato desencadeamento da insurreigAo, A\s dtividas, no entanto, persistiram. Dois veteranos dirigentes bolcheviques, Ka- menev e Zinoviev, chegaram a denunciar na imprensa que os bolcheviques preparavam um bote revoluciondrio. Quase foram expulsos do partido por causa disto. Entretanto, L, Trotski, que ingressara no partido bolchevique em julho, e se tornara desde setembro o principal dirigente do soviete de Petrogrado, manobrou com habilidade, esperando o melhor momento, o que veio a acontecer dias mais tarde, quando 0 governo provisério, alarmado com as noticias de uma iminente insurreicao, resolveu o que ja nao tinha forgas para resolyer: fechar a imprensa bolchevique e prender certos respons partido. Sob a cobertura de uma operacao de defesa das instituigdes ¢ da lega- lidade revolucion4ria, o comité militar do soviete mobilizou as tropas sob seu comando, neutralizou a ordem de Kerenski, ocupou os pontos estratégicos da cidade, cercou, invadiu e tomou o Palacio de Inyerno, sede formal do poder, Kira a noite de 24 de outubro de 1917. No dia seguinte, quando 0 congresso los sovietes abriu suas sessdes, deparou-se com o fato consumado de uma in i deputados, mencheviqu » vitoriosa. Apesar dos protestos de algur ¢ socialistas revolucionarios, a grande maioria referendou a iniciativa dos pa tidirios de Lenin: 08 sovietes assumiam todo o poder, O SECULO Xx Ato continuo, os bolcheviques apresentaram a aprovagao do Plendrio a proposta de constituicéo de um governo revoluciondrio, responsavel perante a organiza¢ao soviética, um Conselho de Comissdrios do Povo. Dele fizeram Parte, no inicio, os bolcheviques, naturalmente, ¢ os chamados socialistas re- voluciondrios de esquerda, cisdo radical do grande partido socialista revolu- cionario. Em seguida, foi submetida 4 aprovacdo uma série de decretos revo- lucionarios. O Decreto sobre a Terra legalizou a avalanche camponesa reali- zada nos meses anteriores de agosto e setembro. O Decreto sobre a Paz esta- beleceu um armisticio imediato e propés a abertura de negociagdes com as Poténcias Centrais que pudessem levar a uma Paz justa, sem indenizagoes e anexag6es. O Decreto sobre o Controle Operario incorporava as reivindica- Ges dos comités de fabrica. Finalmente, a Declaracao dos Povos da Russia proclamou a igualdade das nagées e o direito de cada uma delas constituir um Estado nacional préprio. Ai estavam contemplados, em sintese, os gran- des interesses que lutavam por serem reconhecidos desde a queda do tzar. Assim, se a vitéria /ocal da insurreicao fora decidida por uma esmagado- ra superioridade militar dos bolcheviques, no controle do comité militar do soviete de Petrogrado, e por uma grande audacia de seus ditigentes, que sou- beram apostar tudo num lance arriscado, ela se tornou politicamente vitorio- sa apenas na medida em que soube sintonizar-se com as aspiragées dos gran- des movimentos sociais, em especial dos camponeses, que constituiam a maioria esmagadora da populacao. Golpe ou revolug&o? O debate politico e historiografico, desde a data mesma da insurreigao, tem trabalhado exaustivamente esta questo. O exame acurado das circunstancias, contudo, nao parece recomendar a escolha de um desses termos com a excluso do outro. E inegdvel que ocor- reu uma revolugao, materializada na transformagao radical da correlagio de forgas sociais, na mudanga brusca das instituig6es politicas, na subversio das estruturas econémicas. Uma revolucdo, sem divida, que mudou a face do pais e do mundo. Mas introduzida por um golpe, decidido e realizado sem consulta as tinicas instituicgdes que, segundo os proprios protagonistas da in- surreico, tinham legitimidade para autorizd-lo — os sovietes. Um golpe vitorioso, mas nao vitorioso pela arte com que foi conduzido, mas porque soube comprometer-se com uma revolucao social em andamento. A rigor, a insurreigéo de outubro, com seus decretos revoluciondrios, para além de seu valor simbdlico, foi apenas um elo. Decisivo, sem dtvida. Entretanto, para se consolidar, ainda s rios mais de dois anos, riam necess AS REVOLUGOES RUSSAS uma guerra civil de permeio e uma outra revolugao, dessa vez esmagada, em 1921, a revolugdo de Kronstadt. A GUERRA CIVIL E A REVOLUGAO DE KRONSTADT Aos decretos revolucionarios ja referidos, editados logo apés a insurreicao, ucrescentaram-se outros, expropriando os capitais estrangeiros, abolindo as Jividas contrafdas pelo regime tzarista, retirando a propriedade da Igreja, reorganizando a administrago do pais, em suma, o mundo de ponta-cabega. Assim, os interesses contrariados eram por demais consideraveis para se manterem inativos. Num outro plano, o governo revolucionério comegou também a entrar cm choque com outras tendéncias e partidos socialistas. Por exemplo, quan- do mandou fechar a Assembléia Constituinte, logo depois de instalada, em jinciro de 1918. Eleita no més de novembro anterior, a maioria de seus de- putados vinculava-se as correntes socialistas moderadas, contrarias 4 insur- ivigdo de outubro, sem contar os representantes dos partidos centristas e de direita. Em seguida, em margo de 1918, quando, depois de longas negocia- (es, assinou-se o tratado de paz com os alemies, em Brest-Litovsk. Ao con- \nirio do que defendiam os revolucionarios, os alemaes conservariam deter- ininados territ6rios e ainda receberiam reparagdes de guerra. Fora desconsi- derado o programa original, baseado numa paz sem anexagGes e sem indeni- ucoes. Houve muitas reservas dentro do préprio partido bolchevique, sem (ular na fratura da alianca governante. Com efeito, os socialistas revolucio- ivirios de esquerda, em protesto contra o tratado, simplesmente retiraram-se do governo. Os bolcheviques, cujas bases sociais de sustentagdo estavam quase que exclusivamente nas cidades, encontraram-se isolados no poder. Em maio, em inicio ao combate a especulaco de graos e de géneros alimenticios, tentaram \itroduzir divisdes entre os camponeses, atraindo para 0 lado do governo os camponeses mais pobres. Sem sucesso. O tinico resultado foi deteriorar de ver as relagées com os socialistas revolucionrios, que passaram a conclamar © povo a derrubar os bolcheviques do governo. O incéndio da guerra civil pegaria com forga e arrasaria 0 pais. De um lado, os exércitos brancos, com apoio de capitais € assessores estrangeiros. © SECULO xXx De outro, o exército vermelho, organizado pelos bolcheviques e chefiado por L. Trotski. Numa improvavel terceira margem, tentando abrir um espaco proprio, diversos matizes revolucionarios, alternativos aos bolcheviques: dos socialistas revoluciondrios aos mencheviques, sem contar os anarquistas, que foram capazes de organizar na Ucrania um exército de guerrilheiros sob a bandeira negra da liberdade. A guerra civil radicalizou 0 atraso. Retrocesso econémico, queda brusca em todos os indices. A producao de energia elétrica caiu em mais de 75%. Na grande indiistria a queda chegou a 80%. Na producdo agricola, quase metade. E além disso, as epidemias, as mortes intiteis, o encadeamento das represdlias, as atrocidades macicas, a brutalizagao das relagdes sociais (Werth, 1992; Claudin, 1984). No quadro dessas misérias sem fim, a propria moeda desapareceu, decre- tou-se a interdicdo de qualquer empreendimento privado e se expropriaram os camponeses de todos os excedentes. Nesse ambiente sombrio, surgiu a es- tranha teoria do comunismo de guerra. Do conceito criado para dar conta de uma sociedade de abundancia, derivou-se um outro, para nomear o raciona- mento, 0 igualitarismo da escassez. Os bolcheviques, os vermelhos, ganharam, afinal, a guerra civil. Ven- ceram 0s exércitos contra-revoluciondrios e os outros revolucionarios, alter- nativos. As tropas estrangeiras, que tinham chegado a desembarcar em va- rios pontos do pais, foram obrigadas a voltar para seus paises de origem. Na desolagao que entao se instaurou, alguns passaram a sustentar, como L, Trotski, que era necessdrio agora travar outras guerras: contra a fome, contra 0 atraso. E para isto a sociedade deveria se manter mobilizada e mili- tarizada. No entanto, desde que a vitéria contra os brancos pareceu consoli- dada tornou-se mais dificil impor as restrigdes tfpicas do perfodo da guerra. Desde 0 inicio de 1920, comegaram a espocar revoltas camponesas. Elas se tornariam mais sistemdticas no segundo semestre do ano, inquietando o go- verno bolchevique. Em fevereiro de 1921, surgiram greves nas fabricas, for- mulando reivindicagées sindicais e politicas. No préprio corag4o da revolu- ao, a cidade de Petrogrado, a insatisfag&o dos trabalhadores crescia, protes- tando contra as condigGes de trabalho e de remuneracio. Foi nessas condigées, em 2 de margo de 1921, que teve inicio um movi- mento dos marinheiros de Kronstadt. Declararam-se soliddrios com os gre- vistas de Petrogrado e reclamaram, em manifestos publicados, liberdade de manifestagao para todas as correntes politicas, a liberta o de todos os pre- AS REVOLUCOES RUSSAS sos politicos e a formagao de uma comisso independente para investigar as dentincias sobre a organizacao de campos de trabalhos forcados. Exigiram também eleigdes para renovar a estrutura soviética, baseadas no voto univer- sal e secreto, e controladas por instituigdes pluripartidérias, independentes do Estado. © governo revoluciondrio foi tomado de surpresa. Atendeu a algumas das reivindicacoes dos grevistas e conseguiu que 0 movimento refluisse. Mas os marinheiros nao se satisfizeram com medidas parciais. Queriam o atendi- mento do seu programa politico. Diante do impasse, os bolcheviques formularam um ultimatum, 72 horas depois do inicio do movimento. Rendigao ou aniquilamento. Como nao houve rendicao, partiu-se para o aniquilamento. Comegou, j4 em 7 de margo, o bombardeio da base. A revolta converteu-se entao em revolugdo. Num novo manifesto, os ma- rinheiros anunciaram o inicio de uma terceira revolugao. Contra o regime burgués, j4 enterrado, e contra o regime do Partido Comunista (os bolchevi- ques tinham assumido este nome desde 1918) e sua policia politica, associa- do ao capitalismo de Estado. Para os bolcheviques, era a contra-revolugao. Aproveitando-se do apoio politico que as forcas brancas no exilio davam a revolugao, amalgamaram os marinheiros revoluciondrios com os brancos, falsificando deliberadamente os fatos, apresentando os marinheiros como agerttes da contra-revolugao inter- nacional, Sinistro prentincio, A manobra voltaria a ser utilizada no futuro con- tra todos os que se opusessem ao Estado soviético e ao partido bolchevique. A luta continuou até 18 de marco, quando a terceira revolugdo foi des- trocada, deixando milhares de mortos e feridos de ambos os lados. E mais de 2.500 presos, deportados ou fuzilados (Avrich, 1975). Entretanto, embora vitoriosos, os bolcheviques teriam que considerar, ao menos parcialmente, os interesses defendidos pelos vencidos, Em relagdo ao campo, suspenderam a politica de requisig6es, restabeleceram as relagdes mercantis e reconheceram o triunfo da Comuna Rural. Em suma, a volta ao respeito da alianga com os camponeses, que levara a vit6ria em outubro de 1917. Num plano mais geral, abandonaram as utopias sinistras do comunis- mo de guerra e da militarizagao do trabalho. Houve uma distensao geral na economia. E af, gradativamente, foi tomando corpo, aos solugos, a chamada Nova Politica Econdmica, a NEP. 87 © SECULO XX Mas os bolcheviques nao abriram mao do controle e do poder politicos. Ali estavam, e permaneceriam, 6s. Partido tinico no poder, vontade tinica no Partido. Seria possivel sustentar aquela mescla de abertura econémica e ditadura politica? $6 0 futuro iria ser capaz de deslindar esta questao. Quanto ao presente, nao faltavam enigmas, a desafiar a imaginagao. Contra tudo e contra todos, uma revolugao inesperada vencera os mais terriveis inimigos e parecia, ao menos temporariamente, estabilizada, Contudo, isolara-se num sé pais, embora tivesse, desde o inicio, uma voca- ¢4o internacionalista declarada. Comprometida com o reino da abundancia (0 comunismo), tinha de gerenciar uma sociedade faminta e miseravel, regi- da por uma atroz escassez. O sonho de uma profunda democracia, esbogada pela estrutura soviética ao longo do ano de 1917, convertera-se numa dita- dura politica de partido tinico. Quanto ao programa de respeito a autodeter- minag¢io dos povos nao-russos, também se esfumara. A independéncia poli- tica s6 foi obtida no extremo ocidente do antigo Império Tzarista, onde houve forga militar para impé-la, mas quase sempre os Estados nacionais que ali se constituiram (Polénia, Finlandia e Estados balticos: Lituania, Letdnia e Est6nia) descambaram em regimes terrivelmente ditatoriais. A classe operdria, base social principal da insurreigao de outubro, min- guara com a guerra civil e a desorganizac3o da produgao industrial. Jao camponés, seu colossal aliado, parecia triunfante nos campos. Como se fosse uma vinganga histérica do populismo russo. Os bolcheviques ainda se figuravam como vanguarda de uma revolugao mundial, mas eram apenas sobreviventes, Sob 0 comando de Lenin, a nau nao sogobrara, mas mudara de rumo e ninguém mais sabia o destino daque- la viagem. BIBLIOGRAFIA Avrich, P, 1975. La tragédie de Cronstadt, 1921. Paris, Seuil. Berlin, I. 1988. Pensadores russos. S40 Paulo, Companhia das Letras. Brinton, M. S/d. 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