You are on page 1of 42
(Cad Est.Ling., Campinas, (25):25-65, Jul./Der. 1993 AS FUNGOES MODAIS DA ENTOACAO * IVAN FONAGY, Universidade de Paris HI CNRS ENTOAGAO E PONTUACAO. © ponto de interrogasao e 0 pont de exclamagdo figuram desde o séulo XVI entre os primeirs sini de pontuaio = juntamente como pont, a ving, os dois Pontes, 0 pono e virgla, os parenteses eo travessto, Geoftoy Tory (1529/1951) opbe © pontointerrogativo ao ponto “que responde™e a0 pono admirativo, E interessante ola que ese sistema nfo evolu, contenando-se invarivelmente a ortogafia das linguas modernas com ease pequeno nimero de siais para suprir a auséncia dos fendmenos prosédicos. Pouca informagdo tonal pasa portano pelo canal visual, a prosédia vendo-se ai redurida 8 funglo demaratva e 3 fungdo modal Isso sigifien que, apesar dessa redugio brutal, a ortografia ndo_podia preseindir de sinais expecais tendo por dnica funeio a distingdo. dos modos de enunciagio~ interogatvo, declraivo, imperative (eexclamativo) MODALIDADES, ATITUDES, EMOGOES Entretanto, o estatuto lingtistico da modalidade nao esté ainda estabelecido dde maneira clara. Os limites entre as modalidades e as atitudes, e entre as atitudes € as ‘emogdes permanecem bastante difusos. AAs distingdes gramaticais entre frases como: (a) Ble vem. / Ela vem, ou (b) Ela vem. / Elas vém. ro parecem ser de mesma natureza que as que opdem os enunciados: (©) Bla vem. / Ela vem ? ou “0 presente text € 2 tradug20 de um capita da obra india “Intonation”. As abseragtes € as transergdesemeacionis eeretes a0 portiguts so de nossa responsibilidade (N do) (@) Voce vem. / Vena ! Os primeiros pares de frases (a,b) correspondem a realidades diferentes. Nos ‘outros pares (c,d), é a atitude do locutor em relaco 4 situagio indicada no enunciado que muda radicalmente. © enunciado Ela vem. assinala um fato ao interlocutor. O enunciado Ela vem ? apresenta o mesmo fato como uma eventualidade ¢ pede sua confirmagao ou infirmacdo. Em Venha !, 0 evento figura como um ato que deve ser cumprido, como ‘uma ordem portanto, Segundo a terminologia da cori lingbistica de Karl Buhler (1934) essas oposigdes situam-se em niveis diferentes. Os pares (a) ¢ (b) opdem-se no nivel da fungdo representativa (Darstellungsfunktion), os dois outros (c) ¢ (d), no nivel da fungio de apelo (Appelfunktion). Os enunciados (a) representam uma oposigio de sexo, 0s ‘enunciados (b), uma oposicdo quantitativa. J4 nos pares (c) (A) fazemos ou nao apelo 0 interlocutor, No primeiro enunciado desses pares, contentamo-nos em relatar um ‘evento; no segundo, ao contrério, exigimos uma reagdo verbal (c) ou factual (d) do interlocutor. Esse parentesco funciona entre os enunciados interrogativos imperativos permitiu a F. Dane3 (1960) reuni-los na classe da modalidade apelativa, que ele opde A modalidade enunciativa. ‘© modelo de K. Buhler sugere uma terceira modalidade, correspondendo fungdo expressiva(auistica). Na gramética clissica encontramos, com feito, modalidades que no slo descriivas, nem tampouco apelativas, mas puramente expressivas, como a modalidade optativa, marcada Seja por um morfema especial (Iatim utinam, hingaro béresak), seja por uma oracio introdutéra ("Eu gostaria que...") As frases exclamativas, que se filiam, por exceléncia, a fungdo expressi constituem, segundo a gramética tradicional e certos autores contemporaneos (cf Kéroly, 1963), uma classe modal independente. ‘Com o auxilio de morfemas integrados 20 verbo, de conjung6es, de orages introdutérias, pode um enunciado ser apresentado de diversas maneiras: como certeza, ‘como necessidade, ou como uma eventualidade, eventualidade essa mais ou menos provavel, mais ou menos descjével. A tradigdo gramatical parece reservar as tmodalidades “probabilitiva”, “dubitativa’, “necessitiva’, etc, unicamente as linguas que as distinguem por processos lingstcos estabelecidos, consiantes, de preferéncia Aquelas em que a marca modal apresenta-se integrada a flexdo verbal Atribui-se assim ao vogul as modalidades necessitiva, probabilitiva, precativa (comunicagfo afctuosa)e pejorativa (enunciados exprimindo 0 desprezo, @ ‘oposicao). "A oragto intadutra transforma se facilment por elise (sopressio) em marca opmaiva: “Tomara «que ce vena!" “Se ev pudesse a0 menos revo". Numa obra dediada ao aspect modal do enunciado, § Kdoly (1963) ditinguc as seguintes marcas: morfema modal integra a verbo, b) monemaslexicas, ©) ordem das palavras, a) entoagso 26 Em linguas onde a atitude do locutor exprime-se unicamente com 0 auxitio de oragbes introdut6rias, considera-se a expresséo das diversas atitudes como diferentes especies da modalidade declarativa ef. Ross, 1970). ‘A flutuagio seméntica que caracteriza 0 uso dos termos "modalidade “atitude", “emogdo", explica-se provavelmente pelas relagdes intimas que unem os {fendmenos designados. A existéncia independente dos tres termos sugere entretanto que 0s tés voedbulos referem-se a fendmenos que, embora aparentados, so distintos. Antes de encetar a discussio sobre a entoagdo modal ou sobre a entoagio emotiva, toma-se necessério tentar por em evidéncia © que distingue a atitude da emocio, ¢ a modalidade da atitude Nos estudos psicol6gicos ¢ fonéticns, usam-se indiferentemente os termos emogdes” e "atitudes emotivas". O simples fato de julgar-se iil acrescentar um Para uma outa definite de modalidae, ver Cult (1975 1976) * 1 distingto entre os verbs (ou enuncados) “constativos (Jescriivo)¢ 0s verbs ou enna) *performativos® (aves) permit # Austin op os enunclados que represenam ou eonstatan algo € que podem se verdadeiros ¥ fos, x04 enunclads que parcpam direamente du alvidade J lcutor © que ‘lo podem ser nem verladeios nem flsos, mas apenas "Tlzes” ov" felzs”- Os vers performativos podem ser" veredictvos" (absolve, analsr et), exercvos” (era. aula, cass, et), "eamisivos" (prometer, se propor, esposar 4 causa, et), “eomporamentis” (desculparse, saudi, deaf, et.) “expostvos"(afiomar,descrever, informa, et.) Esa tora est, desde sv primeira formulago ein 1939, em plea evolucio. Apesar da sesibilade verbal exeepcional do aor ede sua grande maleabidade, ov lalver por caus dela, a teria nto pode ser eosiderada como defintivamentestabelecla, ow claraene ormutada, Sua apicaao & anise snticaexige uma pradénciacomparive a de Austin, 28 modalidade interrogativa se caracterizasse pela atuacdo global ¢ total dos meios pros6dicos e articulatérios - compardveis & expressio da c6lera ov do medo - seria inconcebivel. Este contraste marcante entre as diferentes formas de expressio verbal ndo cexclui, et pour cause, a possibilidade de uma transicdo. Ao contrério, a passagem da ‘comunicago por indices ndo articulados & comunicaco por signos artculados devia se dar necessariamente, ¢ a linguagem humana conservou os vestigios dessa transicdo. As linguas possuem, por um lado, signos articulados, monemas, como as interjeiges, que ‘ndo provém do pensamento conceptual (os “frasillons” de Tesniére, 1966:96), e, por ‘outro lado, padres entoacionais que veiculam contetidos muito elaborados. AS FRASES INTERROGATIVAS © que & uma questo? A 6gica clissica considerava-se um enunciado imperfeito, sem validade (“geltungsloses Uneil" segundo Benno Erdmann, 1892:271 4s.) 00 um enunciado problemdtico (Karpov 1856, cit. por Ladanyi, 1965). Seria com feito dificultoso distinguir-se “questio" e “problema” partindo-se da estrutura Iogica ddo enunciado, sem levar-se em conta a tolalidade da situagdo, a interacao verbal dos dois interlocutores. A questao distingue-se de outros enunciados sobretudo pelo fato de, 2. um tempo, exigire fornecer informagdes (Firbas 1972). Ela especifica de diversas rmaneiras 0 género de informagio pedido pelo locutor. ‘A classe modal das frases interrogativas est longe de ser homogénea, ‘Quantos tipos de questio podem-se e devem-se distinguir? A resposta dependerd do ponto de vista da anlise adotada do nivel em que os situamos. A. A andlise da estrutura Wégiea do enunciado poderia servir como ponto de partida de referéncia, Reinchenbach (1947) distinguetréstipos de questdo segundo aestrutura légica do enunciado: 1. A formula ? p simboliza um enunciado global, no analisado, que & posto em ‘questo (“Rodrigo, tens coraclo?") ‘Outros tipos de questo exigem a distingdo dos componentes essenciais do enunciado - a fungdo (f ) (0 “predicado") € o argumento (x,y) (0 “sujeito”), isto é, cexigem a andlise do enunciado enquanto fungo proposicional (Frege, 1962). 2, Assim em (2 x) £( x), temos: “qual é esse x que € £7" ("Quem te disse iso ?") 29 3. Em ( 2f) f(x), temos: “Qual é a qualidade (ou atividade) de x ? ("0 que € que ele estd fazendo ?*, “Mas onde estdo as neves de antanho ?*). Reinchenbach mostra ainda como se pode aperfeigoar a formalizacéo para distingvir, no interior dessas trés classes fundamentais, questdes como "De que cor é casa 7", ou "Como ele construiu a ponte 7". Em lingiistica designa-se o grupo 1 pelas expressdes “questo global", “questio decisiva” (al. Entscheidungsfrage, cf. von Essen, 1956 a), “questio sim ou ilo” (ing. "yes or no questions"), opondo-o ao conjunto das questbes “parciais", completivas” (al. Ergdnzungsfrage)’, "pronominais” (ing. “wh-questions”, uma vez {que a maior parte dos pronomes interrogativos ingleses iniciam-se por *wh"), sem levar em conta a sua estrutura légica, que ndo parece exercer nenhuma influéncia notével sobre o comportamento gramatical e mel6dico da frase ‘AristOteles enxerga af igualmente uma oposi¢do bindria: ele considera as questdes totais como quesides dialéticas, ¢ as opde as que no podem ser respondidas ‘por um simples *sim" ou “no” (Topica 158 a:14-20). [Nos dois outros casos (2 € 3) 0 foco da interrogagdo desloca-se ao longo da frase, pondo em evidéncia uma lacuna ¢ atraindo para ela as informagoes suscetiveis de preenché-1a, Precisa-se 0 género de informagdo que se espera, substituindo-se a palavra 4que falta por um pronome interrogativo que indique a classe dessa palavra. (Onde ? - “Indicar 0 local da ago", Quanto ? - *Queira precisar a quantia”.) Encontramos uma distincao andloga a essa em certas antlises lingbistcas das frases interrogativas, Huddleston e Uren (1969) opdem as questdes que dizem respeito 40 sujeto (“subject-questions”) as que concemem outras partes do discurso (“nonsubject questions") ‘As lacunas no leque das alternativas teoricamente possiveis quanto a0 objeto dda questio sio mais ou menos numerosas segundo as diferentes linguas. © advérbio interrogativo de onde indica que a questio se refere a um lugar de origem. O érabe almanijju("de que regio") reduz consideravelmente o campo interrogativo.(E possivel fem qualquer lingua, evidentemente, restringir-se esse campo, complementando 0 pronome ou 0 advérbio interrogativo com outras palavras: "De que regio vocé & origingrio?"). ‘Uma frase interrogativa pode conter duas ov mais “casas vazias”. Segundo 4 formula de Reinchenbach, terfamos: + Yorio nfo esconde esse inconvenient: itonation contours are ofen difficult diferente ad in many cases the sume or very similar contour might be used with diferent meanings” (p-117)« usta ease fino com um didlogo imagindrio * (vita cerain como CC: "No, it isa warning (© aor supe, entetana, que mima stage normal, 0 verbo “perfomativo" qe fo supemido pe ser econsiido 3 parti da enous (118) 30 (PRY) FCxyt) 0? (EX) fOKy). Vejase a respeito a viva discussfo que suscitou a imerpretagto da frase inglesa “Who remembers where we bought which books?* (Quem se lembra onde ‘compramos que livros?) (Kuno e Robinson, 1972) ‘Um jogo de sociedade difundido nos paises danubianos consiste em ‘ransformar um verso conhecido (ou um provérbio, um ditado, um dito célebre) em uma série de pronomes ¢ advérbios interrogativos. O hingaro permite a transformacdo de ‘cada classe de vocdbulo lexical em seu substitute (Dubois 1965:169-178) relativo- interrogativo, inclusive o verbo.* Independentemente do mimero de morfemas interrogativos que a lingua istingue, © niimero das diferentes estruturas interrogativas deve corresponder 90 rnémero dos tipos de enunciados subjacentes, conforme 0 principio formulado por Arist6teles: “podemos fazer tantas perguntas quantas coisas podemos saber" (Anal. Post. n® 1, 89 b, 23, cit. por Ladanyi, 1962:203). 4, Reinchenbach nfo _menciona os enunciados disjuntivos no capitulo dedicado & modalidade dos enunciados. Ora, as disjungdes assertivas opdem-se regularmente, na ‘comunicaglo, as disjungOes interrogativas. Seguindo os principios de notagdo propostos por esse autor, poder-se-ia simbolizar frases do tipo a) Voce vem ou nifo vem? por: 2p VB) conde o trago horizontal exprime a negagSo e "p" representa um enunciado qualquer. A ‘questdo alterativa b) Vocé vem ou vai ficar em casa ? apresenta uma estrutua: 2(pVa) ‘onde “p* e “q" representam dois enunciados diferentes. Distinguindo-se os componentes principais do enunciado, toma-se necessério salientar que se trata de uma alternativa que ‘concere as fungées f (vir) g (ficar em casa). * Hermann Paul (1920:135, nom 2) chama a atengdo para as contradiges que carcerzam a catgorizagt dos enonciados interrogatvos: “Ainda nfo se contegui ué hoje encontrar una terminologia ‘propria para ests dis tips de questo. Delbrick (Synaktische Forschungen 1:75) cham 4s prime “perguntas de explicago™ (Verdeuichungstragen) ¢ 44 segundas,“pergunas de confirmaglo* (esttigungstragen) mm, lugar ciado 1.15, alot o segundo temo, sbstivindoo pineir por “oragtes de dterminagdo™ Mas a mim parece-me ser precsamente a expresso “perpunas de confirmacio" pouco ‘propia, porque ela implica &expecaiva de uma respstapostiva. Suchier diz-me qu o seu professor Feusunerempregou as expresdes"imerrogasa de frase” (Satage)¢ "inerrogas de palava”(Wortage) que de qualquer forma sto melhor adapadas realidad, Ours expresses mais ov menos apropiads S20 “Tucste de dis” (Enucheidungfagee “questo de complemen” (Erganzungefage) A. Noteen coupe se dessestipos de frase no seu estado “Tvs olka slags fagesazer™(Sprik ach stil 1.1) Prope os eos ogativ ¢ quaesitiv” 31 (78) 00) Vg ‘A formula abrange igualmente questdes alternativas como "0 telhado é vermelho ou cinzento 2". ‘A mesma fungio pode ser também atribuida alternativamente a dois sujeitos diferentes, *Foi o telhado ou a chaminé que desmoronou?” Tay) FO) VEO) conde "x" corresponde a "tethado” e “y” a “chaminé*, 5. Dentre os termos logicos de capacidade pragmética ("terms in a pragmatic capacity"), Reinchenbach considera a modalidade imperativa:! p simboliza uma ordem positiva ("Va embora !"), 1 p uma ordem negativa ("Nao val"). A modalidade imperativa no & incompativel com a modalidade interrogativa. Hermann Paul (1920:135) chamou a atengo para a existéncia de ordens interrogativas ("Frageaufforderungen"). V-V. Vinogradov (1950-675) concede igualmente a elas um Tugar de destaque. Segundo os mesmos prineipios, poderiamos representar frases como “Devo vir?” por ? (1p), ou "Que devo fazer ?" (Quid faciam) por (?f)(! f x) ) 6, Péter Ladényi (1965) distingue, a partir dos principios formulados por Bolzano (1914-15), as questOes determinadas (bestimmt) das quesides indecisas (unbestimmt), AAs primeiras tém uma estrutura sinttica nftida, correspondendo a um tipo determinado de enunciado. As quest6es precedentemente analisadas pertencem todas a essa primeira classe. A estrutura légica das questOes indecisas é, a0 contrério, ambigua. Uma questio como *O que ha de nove?" ndo corresponde necessariamente a0 que aparenta ser, isto 6, uma questo sobre 0 argumento, & qual terfamos de responder por "hé x de novo" Da mesma forma a questio francesa "Ca va?" (Tudo bem?) poderia ser interpretada sejt como uma questio total ? p, a partir de sua forma lingdistica, seja como uma questac parcial do tipo (? f) f(x), como ocorre com sua variante "Comment ca va?" (Como vai?) (Ladényi, 0.¢.). B. A andlise sinttica determina as relagdes entre os elementos do enunciado. A an: seméntica (na acepeo que a metaldgica dé a esse termo) importa os elos existentes entre o enunciado € seu sujeito. Nao se (rata aqui, esté claro, do sentido concreto dos enunciados, do qual faz-se abstragao, mas do aspecto global da enunciag0, do ‘modo de empregar 0 enunciado Deve-se também distinguir o nivel objetivo do nivel linguistica da andtise distingao preconizada jé por S. Tomas de Aquino, que opde os julgamentos de re aos jjulgamentos de dicto: um cdo que tem quatro patas e um "co" composto de trés letras, 32 Essa distingdo conceme igualmente as frases interrogativas € nos permite por ‘em evidéncia a diferenca fundamental que hé entre questdes que se referem a objetos, 4 eventos (ao universe nio verbal), ¢ questdes que se referem a enunciados precedentes. ‘A pergunta "Que entrada?", por exemplo, pode ser feita a respeito de uma ‘entrada de teatro pelo Sr. Silva a sua esposa, que comenta o prego de uma entrada ‘(questio objetiva), ou a propésito da frase precedente da Sra. Silva (“Que entrada?"), ‘que finge ignorar de que entrada se trata, Nesse dltimo caso, é uma questio (objetiva) ue € posta em questio, é uma questio & segunda poténcia: 2° pt, ow ainda ?"(2x) f(x)" [As quesides a segunda poténcia exprimem-se freqientemente através de ‘qustdes indiretaselipticas: “(Voc€ esté me perguntando) se eu reeebi olivio?", "(Wook tf me perguntando) 0 que foi que eu reezbi?”. As questOes que visam uma questto total (?"p") serdo sempre introduzidas por se, ¢ as que se referem a ume questio Parcial, por um pronome, adjetivo, ou advérbio interogativos ‘A. questio metalingifstica diz respeito frequentemente uma assergio anterior. 0 interlocutor pode ter dividas quanto a0 enunciado como um todo: ?"p", ov colocar em questdo uma s6 parte desse enunciado: ? "(3)", ou ? x "lx)" Pilipenko (1965) distingue com razo os pedidos de verificagto dos pedidos de preciso, Enunciados como ing. “I beg your pardon ?, fr. "Pardon 7", port. "Como € que voce disse?" deverdo supostamente desencadear a repetigho do enunciado precedente. Os pedidos de precisio se fazem de duas manciras diferentes: seja com 0 concurso de pronomes interrogativos - "I'ai vu qui 2" (ef. Huddleston e Uren, 1969:11), “Peter went where?* (cf. Schmidt-Radefelt, 1973); seja por uma espécie de aspas tonais sobre a passagem em questéo ("Eu ? Seu amante 2", “Perdod-lo 2"). Evidentemente a escolha entre os dois processos ndo ¢ arbitréria. Repetindo ‘ passagem que pretendemos nio ter escutado bem, dramatizamos a incompreensio moral (“Nao possoacreditar no que ougo! Voct ousou dizer que... ). A "questdo eco” € portanto necessariamente uma questdo metalingiistica afetiva, que exprime a incredutidade, a indignagdo - um verdadeiro “questionamento*. Em diversas linguas a ‘questo incrédula exprime-se como auxiliode um morfema interogativo particular. Em rTusso, rasv’e associa & modalidade interrogativa a atitude de desconfianga, newze't a de surpresa, de indignacdo. Ne... lexprime a quase ceteza (Fougeron 1974:14 ss). Em ‘ilgaro temos ao lado de i (particula imerrogativa nio marcada), nim, exprimindo 2 7 sas feses consis por subsitts interog prestum se admiravelmenten cers experénia, Pu femmos de uma dessts tases “vaviat” e determiner probabidade das pauses em fungdo da esrtira Sina, fazendo se wbsteagso do conteido conereto das pavers (Pénagy. 981). As frases “vasa Promunciadas sugerndo diferentes emogies sites paler servi eave A undie da expressive scl de clases de playa sem contd comer sass, media fects das pasa ene 08 Jos 33 surpresa, e nali implicando a siplica. O morfema i - em substituigéo & paricula interrogativa neutra U/ U/W / i - exprime em mongol o espanto, a divida. C. A relagdo entre 0 enunciado € o locutor constitui a terceira dimensio da anélise, ‘conhecida como pragmatica (cf. Camap 1939:5 ss). Em sua andlise perspicaz das frases interrogativas, Péter Ladényi (1965) nos oferece uma matriz. pragmdtica permitindo encarar-se os enunciados interrogativos sob um novo Angulo, Para situarmos um enunciado numa ou noutra “casa", temos de determinar se o locutor ¢ seu interlocutor conhecem ou ndo a resposta & questo em causa: Situagoes Locutor Interlocutor (A) (B) o + + (2) + 8 + @ : Matric pragmitica das stages interrogativasO sil “+ ada que 0 Hoeuo (ou o ikeracutor) conhece stresposn, "inca que le ignore Dentre essas quatro categorias uma inica apenas, a terceira (-A, +B), apresenta as condigbes pragmaticas necessérias e suficientes a génese de uma verdadeira ‘questo, Seria de se esperar que todas as questOes - totais, parciais,alternativas e outras «= pertencessem a essa categoria e que as outras categorias permanecessem vazias. Ora, no € 0 que se passa. A classe (1) € particularmente densa. Ela regrupa as questdes facticias Ladanyi distingue dois tipos dessas questOes: as litirgicas - que perpetuam um didlogo entre padre e figis e que fazem reviver descobertas a0 longo dos séculos - as retricas. Durante o jantar ritual da pascoa dos judeus (Seder), cabe ao mais jovem dos convivas fazer uma série de perguntas (p.ex. "O que distingue esta noite das demais?”) perguntas essas que permitem ao anfitrido evocar cenas histéricas e interpretar 3 ‘A ceriménia nupcial dos besisis (Malai) consiste em um longo didlogo cantado, durante o qual a jovem noiva faz uma série de perguntas ao seu futuro esposo 'AS quesides ciceronianas permitem ao orador subjugar os ouvintes por mein de questdes formais de extensio crescente, ulilizando 0 possante mecanismo da tensio e da distensio, fonte principal, sendo a tinica, das sensagdes agradaveis segundo De Ia Grasserie (1892). Com efeito, a propria existéncia da questo poética enquanto figura de rel6riea poe em evidéncia 0 carster Iddico, estético, da modalidade interrogative, geradora de tensio. oy (0 sistema inglés das "tag-questions", as quais se acrescenta seja do you, se se espera uma resposta negativa, seja don’t you, na expectativa de uma resposta positiva, supSe uma previsio das reagBes do interlocutor que exclui de inicio estas ‘questdes do grupo (3), o das questdes verdadeiras, (-A, +B), asimilando-as as questdes ciceronianas do grupo (1). ‘A lingua inglesa no tem certamente 0 privilégio de engendrar questdes tetbricas cotidianas. Diversas linguas, aparentadas ou no, utlizam diferentes espécies de questdes factfcias (do tipo +A, +B): 2) oconvite polido: fr. * Voulez-vous entrer?*, ing. *Why wouldn't you have ‘lunch with us ?", a. "Kann ich Sie un Feuer bitten? (Posso the pedir fogo?), hung “Megkérhetném valamire?” (Posso the pedir uma coisa?), port. "Passo the ser itil?” JEM. Saddock (1970) designa essas frases pelo termo whimperatives. Esse tipo de frase ¢ interpretado pelas criancas americanas de dois anos (¢ provavelmente pelas criangas inglesas, francesas, alemds) como um pedido (ef. S. Ervin-Tripp, 1970:82) ) @ ameaga: fr. "Veux-tu une paire de claques?” (Voce quer um pat de palmadas?), "Combien de fois fautil que je te dise...2” (Quantas vezes eu tenho que te dizer...?), hung. *Voltél_ mir fenéken rigva?” (Voce jf recebeu pontapés no traseiro?), russo "Ne stydno Ii tebe tak menja mucit’™ (Voce ndo tem vergonha de me atormentar assim?) Essa espécie de frase - como as questdes retbricas em geral - contém regularmente, em russo, a particulainterrogativa que raramente aparece na conversaco cotidiana nas questdes “verdadeiras", do tipo (-A, +B) (cf. Fougeron 1971:85). ©) a suposiglo gratuita, absurda, exprimindo uma desconfianca irdnica: te. “Tu y crois encore au Pére Noel, toi?" (Vocé acredita ainda em Papai Noel”), hung. “Talin a szomszédék macsksja vitte el?" (Seré que foi o gato do vizinho que sumiu com le?), port. *Vocé ainda acha que ele é um santo?". © hiingaro utiliza uma marca specifica (czak, “somente") em um tipo de hipétese absurda, sobretudo nas que nio sao suficientemente absurdas para poder dispensar marcas: *Csak nem vagy rém feltekeny?" (Mas voct ndo esté com citimes de mim, eu espero...) 4) 0 insulto (suposicéo injuriosa) fr. "Tu nes pas un peu cing, dis?” (Voce ‘no € um pouco biruta nao?), hung, "Nines benned egy esbpp szemérem sem?" (Voce nao tem um pingo de pudor nao?) [No grupo (2) (+ Ay B) temos uma curiosa inversdo: a pessoa que conhece ‘a resposta interroga quem a ignora. Gracas & grande complexidade das relagdes socias. nao € dificil encontrarem-se situagées que preencham essas condigdes. Esse esqueina ragmético, como o sugere Ladényi, presta-se admiravelmente as alivinhas e a sua forma ancestral, o enigma, ‘As questdes pocticas pertencentes ao grup (4) destacamt se clara questdes ret6ricas propriamente ditas do grupo (1) pelo seu carater indagagoes sem resposta da tragédia antiga (Esquilo, Sete contra Tebas, ou Séfocles, Ecipo Rei) fazem pairar a divida ou uma vaga ameaga; nas questées que caracterizam as ceriménias mortuérias dos pigmeus das florestas equatoriais (*Onde estdo as suas 35 almas?") a poesia anagégica contribu para criar uma atmosfera preahe de mistéros (0 famoso poema emblemitico de Blake, “The Tiger", contém, em vinte ¢ quatro versos, ‘quatorze questbes do tipo (-A, -B); em outros poems lircas as questdes sem resposta refletem uma atitude nostélgica, melancélica ("Mas onde esto as neves de antanho?”). ‘Certas linguas caracterizam as questées problematicas servindo-se de ‘morfemas interrogativos especificos. Essa é a tinica fungo que 0 hiingaro atribui ao rmorfema vajon. Em bilgaro, é o morfema interrogativo dali que implica a idéia de incerteza ("Eu me pergunto se...", "Serd que € mesmo..."). Em outras linguas € a 4questio indireta, separada da oracdo principal, que desempenha esse papel (al.: "Ob wir uns je wiedersehen?", literalmente "Se nés nos revirmos algum dia?", com 0 sentido ‘de "Quem pode dizer se nés nos reencontraremos?"). CARACTERISTICAS MELODICAS DAS FRASES INTERROGATIVAS ‘A. As marcas da modalidade interrogativa ‘A andlise 1ogica dos enunciados interrogativos nao se justiica, no ambito de uma anélise pros6dica, senio na medida em que prepara ¢ facilita a andlise linglistica dos seus meios de expressio. ‘Quanto a0 aspecto verbal da modalidade interrogativa, pode-se distinguir, em prinefpio, quatro meios de expressio: 1, A modalidade imerrogativa pode ser expressa por signos que se caracterizam pela dupla articulagdo: “frasillons" (fr. est-ce que, ing. do you, don’t you, por. seré que), particulas (ltim -ne, russo I'i, polonés ezy); pronomes, adjetivos ou advérbios interrogativos. 2. A inversio, a mudanga na ordem das palavras em relagéo a frase declarative neutra pode igualmente ser associada modalidade interrogativa € ddesempenhar uma fungéo modal (*Vous venez." / "Venez-vous?"*, "You are ready." 1 "Are you ready?*). 3. Em muitas linguas a entoagdo basta para transformar uma assergo em interrogagao (p.ex. em aleméo, russo, hiingaro, portugués, etc). 4. E preciso incluir, finalmente, o contexto verbal entre esses processos, haja vista o niimero importante de casos onde a modalidade de uma frase deixa de ser univoca a partir do momento em que se suprime seu context. * Hoddeston © Uren (1969:11) mostram bem 4 oposic que Bf entre of dois tps de metquestio screscenam ainda uma nova dimensto distnguindo as metagustes com ums elemen desconheci, das (que possuetn mais de um: "0 que ev disse a Paulo”, versus "O que eu de a quem” 36 BB. Estrutura, fungdo, expressio Existria uma relagao entre a estrutura I6gica do counciado imesrogativo, sua funglo, seu caréter pragmético, de um lado, ¢ a sua expressdo verbal de outro lado? (s meios de expressio dos enunciados do tipo ? p (questdes totais) variam segundo as diferentes linguas e alé mesmo dentro de uma s6 lingua. O somali, como ruitas linguas africanas, caracteriza a questo total pela utilizagdo de um morfema ‘especial, sem recorrer a meios pros6dicos. O aleméo serve-se da inversto, da entoacio, ou de ambas (von Essen, 1956 a). O vogul e o ziriano marcam preferentemente a questio total por uma particula interogaiva. Esta particula € por vezes suprimida ¢ substituida por uma entoasio interrogativa (ef. Kannisto e Liimola, 1951-59; Fokos Fuchs, 1951), 0 érabe clssico nlo pode se privar do morfema interrogativo; a entoagao interrogativa ganha entretanto terreno no érabe dialetal (Kahwaji, 1970:31 ss, Guirguis, 1983). A particulainterrogativa€ de uso corrente na maior parte dos dialetos hingaros; ‘a entoagdo € no entanto a marca principal das questdes totais nas grandes cidades. Nos dialetos, assim como na linguagem citadina, os dois processos sio equivalentes, 0 ‘mesmo ocorrendo no tcheco (Romportl, 1973:147 s8). A particula interrogativa russa - ri restringe-se & lingua escrita. ‘A auséncia ou a presenga de uma particula, da inversfo, ou de uma certa configuragao mel6dica ndo assertiva basta para provocar uma resposta positiva ov negativa do interlocutor, para resolver um problema que admite apenas duas solugdes sim ou no ( p V p ). Um simples gesto - um movimento da mio, um piscar de olhos poderia igualmente resolver a situagdo. Aliés tais gestos inerrogativos existem em diversas "nguas": um gesto manual como virar a palma das mAos para cima, ou a clevacdo das sobrancethas (cf. Uldall, 1962). (© mesmo nao se dé quando se trata de uma questio "parcial", isto é, quando la deve orientar as respostas numa diregéo precisa, dentre uma vintena de orientagGes possiveis. Néo slo enlGo bastantes nem um gesto sintético (uma inversio), nem {ampouco um gesto tonal para indicar que se espera uma informacao a propésito seja do sujeito do enunciado, seja de uma de suas qualidades, da €poca, do lugar, da causa de sua atividade, etc. Compreende-se sem dificuldade que nesses eas0s recorrer-se-é a signos de dupla articulagio, sobretudo a substitutos interrogativos das partes. do discurso, Sabe-se eniretanto que um certo género de quesibes “parciais* pode apresentar uma entoagdo interrogativa. So as questoes ditas de controle, isto é, as ‘questbes metalingisticas, como por exemplo: 37 ‘A. entoardo interrogativa distingue a questio metalingOistica de sua “homénima", a questdo parcial objetiva correspondente, A questo metalingtistica tem ‘uma marca dupla, posto que se trata de uma interrogacdo & segunda poténcia: ?"? p Sua configuragdo mel6dica corresponde exatamente & da questo total, para evidenciar, contrariamente as aparéncias enganadoras, que ndo se trata de uma questio “parcial”, ‘mas sim de uma pergunta feita globalmente, nio pedindo sendo uma confirmacio ou ‘uma infirmagdo (uma decisSo bindra): "Sim, claro, eu Ihe perguntei ‘Que entrada’ (isto 6, de que entrada se trata)". A questio metalinglisticaé necessariamente uma questio “total", independentemente do fato de ela visar a) uma questo parcial do tipo (20 f (x) ‘ou (2x) f(x), ou b) uma questio total precedente do tipo ? p. Em ambos os casos sua estrutura légica deve ser simbolizada por ? "tp". Nio hé, na realidade, diferenca alguma, do ponto de vista l6gico, entre a metaquestio "O que foi que eu fiz?" (Voce est me perguntando 0 que foi que eu fiz!) ou “Que entrada?" (Voce esté me perguntando "Que entrada?"?), onde as questdes a que se faz referéncia slo questdes parciais, € "Se eu estou contente??" (Vocé esté me perguntando se eu estou contente?), ‘onde a questio subjacente € “total”. ‘Aeentoacio leva ainda mais adiante essa indiferenca, ignorando a modalidade {do enunciado que ¢ posto em questo. A entoagso da questio metalingtistica que se refere a.um enunciado assertvo serd idéntica de uma metaquestdo provocada por uma questio total ou parcial do interlocutor. Isso 6 vilido para o francés, portugués, espanhol, alemio, russo, tcheco ou hhingaro. [Uma metaquestio como "Eu, amante dela?" pode corresponder tanto & questdo prévia “Voce € amante dela?", quanto a uma assergdo calegérica “Voce € amante dela Teriamos portanto de simbolizar a questo metalingiistica por ?" p", onde "p” representaria qualquer enunciado assertivo ou interrogativo. Em varias linguas (o tcheco, o hiingaro), a questo total marcada por uma particula interrogativa nio o é pela entoa¢do. Nessas linguas, a entoaclo interrogativa transforma a questo total objetiva (de re) em uma questo a segunda poténcia, em uma ‘metaquestio (de dicto). Tal fato parece estar perfeitamente de acordo com as regras da ‘economia lingiistica e da l6gica. Hé entretanto outras linguas, como 0 russo (Fougeron, 1974), o polonés, nas quais podemos (¢ devemos) conferir uma entoacio interrogativa as questdes marcadas pelas particulas interrogativas (rus. I", pol. ezy), sem que por isso a frase se transforme numa metaquestao. 38 Seria sem divida prematuro concluir da a partir de certasrelagdes entre a estrutura sinttica do enunciado e sua expressto verbal, que h4 uma correspondencia perfeita entre andlise l6gica ¢ comportamento tonal. ‘A entoacdo das questdes “alternativas” (disjuntivas) contrasta em francts, ‘assim como em portugués, inglés, russo, hingaro, com a entoaglo interrogativa que temos na questio total. Mas é, por outro lado, espantosa a negligéncia, a indiferenca com a qual certas linguas toleram a homonimia ou a quase homon{mia mel6dica entre disjungdes assertivas (*E branco ou preto.") e disjungdes interrogativas ("E branco ou preto?"), sem falar na oposicéo fundamental que hé entre a disjungio concessiva, que admite simultaneamente a validade das duas altemativas ("branco e / ou preto") € a disjungdo exclusiva, que nio admite essa eventualidade ("branco ou preto, mas no ambos ao mesmo tempo"). Deveriamos esperar que as linguas distinguissem, com 0 auxilio da entoagdo - na auséncia de outros meios - quatro alternativas: sina no Meee elise = 7 7a Cn LA ra, nos damos conta de que essas quatro alternativas se sobrepdem parcial ou totalmente no plano da expressto pros6dica, Néo é assinalada distingdo alguma para s enunciados disjuntivos, assertivos e interrogativos, do inglés. Uma andlise acurada dos enunciados disjuntivos do hiingaro revela no existir um trago mel6dico constante, de cardter lingUfstico, suscetivel de distinguiras disjuncOes interrogativas das disjungbes assertivas. As tentativas, mais ou menos bem sucedidas, de diferencié-las situam-se sobretudo no plano da fala, e praticamente nfo ultrapassam 0 nivel da improvisacdo (Fonagy © Magdics, 1963). As questdes disjuntivas do francés, por outro lado, demarcam-se com bastante nitidez das assergdes disjuntivas, embora haja uma certa semethanga entre as curvas da entoagdo desses dois tipos de frase (Fonagy e Bérard, 1980), © locutor pode dar a uma questo disjuntiva a melodia da questdo total: Deux 9 ou 39 ‘A disjungo nesse caso seré apenas aparente. A alternativa "dois ou trés* nfo staré em jogo. O enunciado opor-se-i globalmente a outras possibilidade viruais nfo explicitadas: “dois ou trés (ou mais)", "dois ou trés (ou nada)*, etc.: (a Vb) Ve. Ou seja,tratase efetivamente aqui de uma questio total, conforme indica a entoagao, ‘A entoagio nfo € indiferente, por outro lado, ao aspecto pragmatico da imerrogagdo. A auséncia de uma expectativa real de solugio pode levar a um ‘enfraquecimento ou mesmo & perda total da tensio tonal que caracteriza as verdadeiras ‘questdes (nf marcadas por morfemas) do grupo (3). As pseudo-quesides (+ A, +B) do grupo (1), € especialmente as questdes imperativas ou os convites polidos € as ‘questdes que amearam ou sio injuriosas, deixam frequentemente transparecer através dos meios pros6dicos a atitude real do locutor, camuflada por uma expressto interrogativa. As questbes totais potticas do mesmo grupo, 20 contréri, conservam geralmente a entoacio interrogativa, que permanece funcional, embora mudando de fungdo, a fungdo lidica subsituindo a fungéo modal. ‘As questdes totais (ado marcadas) do grupo (4) (-A, -B) utiizam-se frequentemente, em francés como em outras linguas, da queda mel6dica suave, propria da atitude resignada: "Mais viendra-il vraiment?" (Mas ele viré mesmo?), "La vie est - elle un songe?" (Seria a vida um sonho?). (Alisa inversio sujeito / verbo esta longe 4e ser incompativel com a entoagao interrogatva). ‘A entoacio depende ainda da resposta que o locutor espera. Nas questdes (otais neutras russas,o tom sobe até o final da silaba acentuada. O locutor no prevé nesse caso, a resposia do interlocutor. A expectativa de uma resposta positiva reflete-se ‘numa melodia ascendente-descendente (Fougeron, 1971:61) ‘A inversdo dos papéis que caracteriza a situagdo ( +A, -B ) (quem conhece 1 resposta é quem faz a pergunta) parece ter originado uma configuragio melédica particular. Em diferentes linguas no aparentadas temos nas questOes parciais uma subida tonal progressiva,lenta: Encontramos, curiosamente, essa configuragdo melédica em inglés, alemio, ‘espanhol (Guzmén, 1973), russo (Bratus, 1972; Fougeron, 1971), hingaro (Fénagy Magdics, 1963), japonés.* ‘gnorando (volunariamene?) as formas interogativas ais wuais 40 (QUESTOES PARTICULARES, DECLARATIVAS, IMPLICATIVAS No que tange a essas questdes, tampouco ha uma simples correspondé direta entre formas mel6dicas as categories sugeridas pela andlise I6gica. Na realidade ‘a configuragdo melédica das questdes "professorais", a melodia das adivinhas, aparece em muitas outras situagSes. Ela parece relacionar-se com a presenga da conjunclo "e” inicia. (B no ano que vem 7) “Trata-se de uma questo eliptca, alusiva que diz respeito a algo que f0i dito anteriormente. Esse tipo de questfo faz referéncia ao assunto em pauta e no a sua expressio lingtistica, como ocorre nas questdes metalingUfstcas. Essas questdes alusivas sio objetivas (de re) e reais (do tipo -A, +B) e nada tém em comum com as adivinhas. Sto antes as questOes precedentes, “professorais", que poderiam ser assimiladas as questdes alusivas ("Acaba-se de dizer que se tratava de um rei. Esté correto. Seria necessirio no entanto previsar que rei € esse"). A posi¢do inicial da conjungdo “et” nao desencadeia esse padrio mel6dico num frase ndo eliptica, no alusiva, como "E vocé deixou-a sozinha?” ‘Acrescentemos que a subida mel6dica gradativa nas questOes alusivas, que nio se afasta muito da configuragio metédica das questdes totais do francés ou do inglés, difere inteiramente da entoagdo interrogativa do usso, do alemao ou do hingavo. [As quesies hipottieas também apresentam particuardades met6dicas Tratase ainda aqui de uma frase cliptic. E preciso distinguir cuidadosamente as questeshipotéticas metalingisticas das quesides hiptdias objeivas (distngdo que nem sempre € bservada, cf. Huddleston e Uren, 1969:24). Em francs, onde esse ténero de frase € muito difundio e€ altamente gramatializao, a entoapto no deixa Subsistirambigidadealgumar nas quests objtivas (dee), o fom ca suavemene, por quarios de tom, localizando-e num nivel mio 41 [Nas questées metalingiisticas (de dieto), 0 tom sobe, como na questio total: tendo essa questdo o valor de "Vocé esté me perguntando” se a gente bebesse alguma coisa?"?". Nenhuma dessas duas frases poderia ser confundida com a frase interompida, comrespondente: "Se a gente bebesse alguma coisa...". As ts curvas de entoagdo sto nitidamente distints.. [Em francés, como em outras linguas, utliza-se a frase interrompida, fragmentéria, para provocar uma reacao verbal, a continuacio do enunciado que Permaneceu inacabado: “Se a gente bebessealguma coisa...” (O que aconteceria entéo? que vocé quer dizer exatamente?).'* ‘As frases. fragmentérias tém um cariter imperative e ndo podem ser assimiladas as frases interogativas eliptcas Nao se poderia entreianto recusar 0 estatuto de frases interogativas 20s vocabulos-frases do tipo “questionério",caracteristcos dos empregados das repartcoes pablicas: (dade) "© Uma anedots clissice, muito conecde nos pases danubianos As véspors da Prime Cierra Mundas a porns os conasespragnicos ms Frases ierrpatv game, Bachanch, porque ido soldade deve, a qualquer momento e de bom grad sacificar sua vida pelo imperador? “Com efeto, meu ten, porque deveria le fzt-o? ‘A ambigdidade pragmitica da primeira questo, que peri ser tanto Jo tips (4.8, B) (questo do ‘examinador) quanto do po (+ A, + B) permie ao ceca interpret, na auséacia de Indices melds, ‘seu modo a As frases interrogativas do tipo questionério (ou “preenchimento de lacuna”) slo frequentes em todos 0s paises “civilizados” (administrados), ¢ a entoagdo dessas frases rudimentares € comparavel 4 das questdes alusivas introduzidas por “e"."" ‘As suposigdes podem igualmente assumir um carter interrogativo. Uma frase ‘como "Voce no esté sendo um pouco indiscreto, por acaso?” opde-se claramente & suposi¢do explicita assertiva correspondente ("Eu acho que voce esté sendo um pouco indisereto"). Em francés, a entoagao das suposigdes interrogativas praticamente ndo difere dda das questdes totais. O seu movimento mel6dico pode entretanto ser um pouco freado, seu intervalo tonal reduzido. Em outras linguas uma divergéncia qualitativa reflete o estatuto particular do sub-grupo supositivo, Assim, no hingaro, a questo total “Nem vagy rim féltékeny ?* (Voc€ nio esti com citmes de mim ?) tem uma melodia ascendente-descendente, enquanto a suposicao interrogativa correspondente “Csak nem ‘vagy rim féltékeny* (Mas vocé nio esté com ciimes de mim, eu espero) apresenta uma melodia ascendente: Precisamos que 0 advérbio esak nem (iteralmente “io somente") pode ser onsiderado como uma marca especial propria as frases supositvas, interrogativas, negativas. ‘A anilise de dois corpus diferentes, um gravado em Michigan, o outro em Paris, compostos de conversas espontineas e de jogos verbais (jogo das personagens) levou 0s autores (Fénagy € Bérard, 1973) aadmitirem uma classe de quase-questdes, de quesibes assertvas, ou de assergdes interrogativas (cf. Fries, 1968, Grundstrom, 1973). A classe das quase-questOes regrupa, segundo Grundstrom, a) pedidos de confirmacio, b) suposigdes,c) voedbulos sugerdos (que o interlocutor parece procurar ‘mentalmente), d) quests fragmentrias, das quais pronunciamos somente a primeira parte. [As assergdesinterrogativas encontradas durante um ‘jogo das personagens* formam uma classe homogénea tanto do ponto de vista do contedido como do da expressio, Trata-se sempre de uma astereio um tanto hesitante, pedindo sua confirmagao ou infrmagio. A entoagio dessas frases difereintiramente da das questes "Segundo 0 estemunho de Fias magnticas, meu fio Pedro sevi-se dese procedimento 28 cinco sos para lembrar x sua irmd (qu ina eno ste anos) que ela nde rerminara uma frase cu contin ‘vinvigavavisvelmente "Ep megetk a alt” ¢ *. a totais simples, sem no entanto coincidir com a das frases assertvas (Fénagy e Bérard, 1973:59 ss, 73) Encontramos assereSes interrogativas em outras linguas, como em alemio (von Essen, 1956a, 1956b), em hingaro (Fénagy e Magdics, 1963). Em inglés, constituem elas a formula interogativa por exceléncia, composta de uma assercdo, apresentada como hipstese, seguida obrigatoriamente de um complementointerrogativo (do you, don’t you, have you, haven't you, etc.). CARATER ESPECIFICO DA QUESTAO TOTAL A filosofia cléssica identificow a interrogagdo com a assergio incompleta ou problemética. Tentativas mais recentes assimilaram-na & frase inacabada (Malmberg, 1966, Hultzén, 1962), & primeira parte da assergao disjuntiva (Stockwell, Schachter, Hall-Partee, 1973), ou ainda a atitudes emotivas como a surpresa, a divida (cf. Mettas, 1966, Huttar, 1967.75 ss, Hoffe, 1960), Frase interrogativa - Frase inacabada ‘Segundo Bertil Malmberg (1966), a entoagio deve ser interpretada no nivel lingaistico como um sistema nitidamente binério, possuindo uma tinica oposigio: centoagdo terminal versus no terminal. Essa ltima engloba a um tempo a entoacio das frases inacabadas a das questdes totais. Essa concepedo corresponde & de Hultzén que, nna sua contribuigio apresentada ao Congresso Internacional de Fonética de Helsinki, distinguiu duas grandes categorias: a das frases "aberias” e a das frases "fechadas" Com © mesmo espitito, embora de forma menos categérica, Brysgunova (1969:86) ropde que se grupe a frase interrogativa e a frase inacabada. O modelo tensional da frase - unidade de tensio e de distensdo - proposto por Karcevskij (1931) poderia estar nna origem dessas teorias. A busca da tensio que parece caracterizar a entoagio das frases interrogativas as associa de forma evidente aos enunciados inacabados. Essa relagio evolutiva entre as duas categorias situa-se no plano da linguagem humana, Seria entretanto injustificado fundir-se, numa descrigao sincronica do sistema prosédico do russo, do tcheco, do alemio, do francés ou do portugués, a dimensto "inacabada/acabado” com a dimensio “interrogativo/nio interrogativo". Uma frase interrogativa pode ser acabada ou ndo acabada, tanto quanto 0 pode uma frase assertiva, A validade © a importincia dessas distingdes foram salientadas por Otto von Essen (1956a) para o alemo; para o tcheco € para o russo por Milan Romporil (1973:142, 145); para o francés por Pierre Delattre (1966, 1969). Segundo testes de percepeo, a confusio entre uma frase inacahada ¢ a questio total neutra é, no francés, negligenciavel, da ordem de 0,8% a 3.3% (Fonagy ¢ Bérard, 1973:83). [Em linguas onde a questio total termina por uma descida a0 nivel tonal de base - como o russo, o alemio ou o htingaro - a confusio entre as questdes totais e as frases dectarativas inacabadas é inconcebivel. B. Questées totais - Assercdes disjuntivas Outros autores (Stockwell, Schachter e Hall-Partee, 1973; Chafe, 1968; Bolinger, 1978) tentaram ver mais de perto a relagdo entre a subida melédica da interrogagao e a frase inacabada, derivando a subida caracteristica da questo total do amo ascendente do primeiro membro do enunciado disjuntivo - Either you tell him (RISE), or I will (FALL) (Ou vocé diz a ele, ou eu o farei) - conforme a proposta de Katz. € Postal (1964), que interpretam a questdo total do tipo "Did you give a book to John?" como *You gave the book to someone” + morfema interrogativo. Essa interpretacdo tem a vantagem de levar em conta simultaneamente a expressio verbal (a subida tonal) ¢ 0 seu conteido, isto é, a relacio seméntica que hé entre um enunciado alternativo (disjuntivo) e uma questio. Além disso, ela aproxima esas duas categorias sem por em questdo sua independéncia respectiva no plano das realizagOes concretas. Os inconvenientes persistem todavia tanto no Ambito da interpretagao semintica como sobretudo no de sua expresso melédica. A coincidéncia mel6dica entre “ither) you tell him..." ¢ "You tell him?", ainda que ndo seja puramente casual, no Constitui um fato universal. Assim, no enunciado disjuntivo hingaro o tom é *flutuante” nha primeira parte do enunciado, independentemente do seu mimero de sflabas: te fe fe kek fe hee fekowe Ye, "tote hae zal ov branco branco ou peeto reo. ow branco 46 a entoagio da frase interrogativa depende, ao contrério, do nimero de silabas. As tr8s configuragdes melédicas das questdes totais correspondentes serio sempre qualitativamente diferentes das que essas palavras assumem enquanto primeiros ‘membros de uma frase disjuntiva: é ke- k? b fe" ¢ fe K 2 e? aa? branco ? Preto? (monessilabo) (issilabo) (isslabo) 45 Downing (1974) rejeita, baseando-se em frases inglesas, a interpretacio proposta por Chafe. Enoontramos dificuldades andlogas em russo, em francés, entre outras linguas. Quanto & interpretagio semintica, tanto a questio total quanto a questio disjuntiva apreseatam uma alternativa e exigem uma decisfo do tipo bindrio ("sim" ou *nfo", “isto" ou "aquilo"). Uma questio total como Vocd vem? poderia contudo ter como alternativa "Voc® niio vem’ tanto quanto "Voct val". Assim, varios enunciados disjuntivos poderiam subtender a mesma questo total (cf. Hirst e Ginesy, 1974). Hirst e Ginesy nio tem razlo, no entanto, quando identificam a entoayio descendente das questdes fetas no "jogo das personagens” com a parte descendente, dessa vez, de um enunciado disjuntivo subjacente. Esta interpretagio parece-nos arbitrria. A auséncia de uma entoacdo interrogativa explica-se pela situaplo particular fem que essas questdes aparecem: a pessoa que faz as perguntas formula, de um lado, antes hipéteses (produto portanto de metéforas mel6dicas) e, de outro lado, a situaglo por si mesma determina o caréter interrogativo do enunciado. Isto é, sendo a rmodalidade determinada pela situagdo e pelo contexto, podemos fazer economia da centoagio interrogativa. , Entoagdo interrogativa - Entoagdo emotiva ‘Tentamos precedentemente distinguir, no plano do contetido, a modalidade (interrogativa, imperativa, desiderativa) das emogbes. ‘As interferéncias que existem no plano da expresso poderiam entretanto indicar que a linguagem nfo faz essa distingao de maneira tio n{tida, to categérica, quanto nossa descricdo poderia fazer supor. ‘Odette Mettas, a quem devemos os primeiros testes de percepeao entoacional bascados na apresentagio de frases francesas sintetizadas, chega & conclusdo de que a expressio da modalidade interrogativa ndo se distingue claramente da de certas cemopdes. A partir de resultados obtidos com testes de percepeto utilizacko frases que apresentam ligeiras modificagSes.graduais, sucessivas, da curva da freqiéncia fundamental, sustenta essa autora que "uma frase ligeiramente interrogativa passa sucessivamente por matizes de simples questio, de divida, de surpresa” (Mettas, 1964:184). O histograma que resume as informagdes fornecidas pelos testes mostra uma sobreposicio parcial de duas categorias, a da questio ¢ a do espanto: "a surpresa no era na realidade", segunda 2 autora, “sendo uma nuance mais ou menos presente da interrogacao” (p.187) (cf. Lyons, 1977). ‘Dada a importincia tedrica dessa conclusdo, nfo poderemos evitar uma breve iscussio do método utilizado por Mettas. A autora, apresentando as variantes sintetizadas de uma frase francesa, pediu a seus ouvintes que precisassem "que nuance auditiva eles percebiam" (p.184), sem propor a eles categorias emotivas ou modais. Os cuvintes poderiam portanto assinalar” seja a atitude emotiva sem precisar a sua ‘modalidade, seja a modalidade sem indicar a atitude emotiva que a acompanhava. E Portanto teérica e praticamente impossivel saber-se se um determinado ouvinte que assinalou, para um dado enunciado, a categoria "surpresa", tnha-o percebido como uma pergunta ou como uma resposta surpresa, ou se um outro que indicou “questo” atribuia ‘ou ndo a essa questo uma nuance emotiva. ‘A interseordo que os histogramas mostram no pode portanto confirmar nem infirmar a ambighidade modal da entoacao francesa: a sobreposicio ¢ inevitavel devido a escotha arbitréria de dez categorias “reunidas na diagonal em ordem crescente” (.184) onde se acham lado a lado categorias que sobrepdem-se forgosamente, tais como a interrogacio, o espanto. Com efeito, qualquer questo pode ser dita com espanto ou ‘io. A atitude de espanto admite a interrogagéo sem impé-la. ‘A ambigiidade € portanto aqui de natureza antes metalingiistica que Tingtistica e as confusbes apontadas pela autora no decorrer da andlise poderiam set Aevidas a causas de ordem metodolégica Tal fato ndo exclui uma superposigfo efetiva da entoagdo interrogativa neutra «© da entoagio exclamativa (emotiva) nio interrogativa, ou da entoacto interrogativa ‘emotiva (implicativa) e da entoagto declarativa neutra ‘ais superposigdes foram analisadas, com efeito, em vérias linguas Elisabeth Uldall (1962) chamou a aten¢do e quantficou a ambigUidade de uma determinada entoacto assertiva, implicativa, do inglés: queda tonal progressiva, seguida de uma subida final moderada, padrio melodico esse que parece justificar plenamente a frequéncia observagto: “Are you asking or telling me?" (Vocé esté perguntando ou afirmando?) que a autora escolheu como subtitulo de seu artigo. Certos testes preliminares de George Lee Huttar (1967:69-87) indicam da mesma forma que a entoagto emotiva assertiva pode sugerir uma questo (neutra ou emotiva) e vice-versa. ‘Sio sobretudo as asseredes que exprimem surpresa ou alegria que os ouvintes tém tendéncia a interpretar como uma questo (neutra ou surpresa). Por outro lado as questdes exprimindo tristeza sdo frequentemente tomadas por frases declarativas ‘As asserg0es interrogativas do francés modemo slo corretamente idenificadas (Gsto é, como questdes) no seu contexto natural. Isoladas do seu contexto 54,6% das questdes so interpretadas como asserodes (Fénagy ¢ Bérard, 1973). Da mesma forma, 36,2% das questdes implicativas, isto , contendo mensagens latentes, foram interpretadas como "exclamapdes" (assergdes emotivas ou implicativas). As confusBes slo extremamente raras, por outro lado, entre as asserges € a5 questdes neutras. Irina Fougeron (1971, 1974) assinalada casos de homonimia parcial a prop6sito da entoagdo de frases interrogativas rssas. A entoacio da questéo total "Mo} brat pr'id’ot?* (Meu irmao saiu?) ¢ a da asserco categérica "Moj brat pr'id’ot" (Eo ‘meu irmdo que acaba de sait.) parecem sobrepor-se. Apresentando-se aos participantes "As formas melicas das quesides alsivasdotpo “lacuna a preencher"assemelham se entre si bem ‘mais, nas lingua em que foram aralisadas, que as das questes wis nets, "7 do teste de percepefo apenas a primeira metade da frase, que contem a sflaba acentuada apré-acentuada (Moj brat), ndo sio eles capazes de distinguir a modalidade das duas frases, sendo a distribuigko dos votos aleatéria (1971:33). Os mesmos individuos determinaram sem dificuldade a modalidade das frases completas. Ou seja, havendo coincidéncia mel6dica da parte central das duas frases, sBo as sflabasfinais, étonas, que passam a distinguf-as. rece provavel que em tais casos as frases nominais Mo] brat?" e Mo} brat!" seriam confundidas fora de seu contexto, em uma situagdo experimental andloga, ‘Mesmo em linguas como 0 alemdo ou o hiingaro, que dio as assergSes © as questbes totais neutras configuragbes qualitativamente diferente, evitando dessa forma qualquer confusio, temos a quase homonimia melédica nos enunciados implicativos. ‘Assim, o htingaro, o esquema entoacional descendente-ascedente corresponde a0 mesmo tempo A frase interrogativa monossilébica ("16 2°, Esté bem 2) ¢& asserpdo implicativa que exprime uma atitude bem caracterfstca: "Bem, se vocé quer assim, por mim tudo bem, mas...". Da mesma forma, o esquema ascendente-descendente corresponde simultaneamente asserglo categérica e A questo implicativa que exprime a ineredulidade. E necessério precisar, entretanto, que no primeiro caso a homonimia 6 apenas aparente. Trata-se, na verdade, de duas formas de entoagio diferentes. Nas questdes, a subida ultrapassa sempre 0 nivel inicial, o que nfo ocorre nas assergBcs implicatvas. A confusto € possivel, no entanto, no caso das frases com melodia asoendente-descendente (Fonagy, 1969). EM BUSCA DOS TRACOS DISTINTIVOS PROSODICOS ‘Antes de tentarmos interpretar do ponto de vista funcional (lingiistica) e psicol6gico essas confusSes embaracosas, parece-nos itil debrugarmo-nos sobre 0s rmeios e 0s métodos que o foneticista dispde para tentar determinar os tracos distintivos rosédicos.” ‘As primeiras andlises da entoagio - como os estudos sugestivos e substanciais, de Heléne Coustenoble ¢ de Armstrong (1934), de Maurice Grammont (1924), de ‘Armstrong e Ward (1926), de B'alint Csiry (1925), de Trager e Smith (1951), de Kingdom (1958), de Maria Schubiger (1958), de Kenneth Pike (1945), de Georges Faure (1962), de Otto von Essen (1956a), de PeSkovskij (1928), etc - baseiam-se na abstragio mental das relagdes existentes entre estruturas sintéticas e contedidos mentais, de um lado, e as modulagdes mel6dicas pertinentes de outro lado. ‘A objetivago, a formulagdo consciente de um conhecimento prético, preconsciente, que constitui a nossa *competéncia lingifstica”, continuaré sendo a base de toda anilise prosédica. ° Egudosaprofundados especialmente dedicados 20 assunto dispensam-nos de analsar esas teicas denathadamente (Cf. Léon e Mari, 1970, Metas, 1971) 48 AAs diferentes fases da andlise mental foram sucessivamente mecanizadas a partir de fins do século XIX. ‘A gravacio da fala poderia ser considerada uma memorizagio mecdnica, ‘global, da expressso sonora, Os diferentes métodos que permitem a extragdo da frequéncia fundamental (cf. Léon e Martin, 1970) - a partir da andlise de Fourier até a andlise cepstral (Nool, 1967, 1968) - assim como a representacio grifica das mudangas de freqliéncia (Scripture, 1906) reproduzem no plano material a abstragio de um fator fisico pertinente, fator esse que € o responsivel pela percepcto do "movimento melédico” ‘Anilises estatisticas das variagbes de freqiéncia (e de intensidade) permiten ‘evidenciar os elementos melédicos pertinentes em relagdo as estruturas verbais as quais cles se acham ligados (ef. von Essen, 1961, Delattre, Poenack e Olsen, 1965) Um engenhoso procedimento técnico idealizado por Cohen e t'Hart (1967) parece reproduzir fidedignamente o processo mental da abstragdo. Passagens sucessivas de uma gravacio séo apresentadas a um individuo que deve escolher uma frequéncia, correspondente & do estimulo que ouve, manipulando um osciloscépio. Dessa forma, uma curva continua de freqiéncia transforma-se avlomaticamente em uma série de ‘mudangas descontinuas. As simplificagies sucessivas dessa curva descontinua geram estruturas melédicas cada vez mais “abstratas”, configuragdes que slo quase geomeétrica, © que correspondem a determinadas estruturas sintéticas de uma dada lingua (cf. também Hart e Cohen, 1973). As experiéncias de Issatschenko e de Schidlich (1966) levaram ao mais alto _grau o processo de abstracio mecénica. Esses autores substituiram a curva da frequéncia de frases alemis naturais de 150 Hz e de 178 Hz, formando duas “linhas mel6dicas” ‘A “melodia frastica” passa a apresentar portanto apenas passagens bruscas de um nivel 4 outro. Variando 0 local das “rupturas tonais", pode-se atribuir diferentes melodias simplificadas & mesma frase: () Er plant (2) Erplant eine Reif 36 (3) Er plant eine [Rei (4) Erplant eine | Reise ( Ele planeja uma viagem ) @ alle A primeira variante fot imerpretada na maior parte dos casos como uma frase declarativa. A segunda como uma questio, a terveira como uma frase declarativa com énfase sobre o vocdbulo Reise (viagem) e a quarta como uma frase inacabada, Em 49 81,3% dos casos os ouvintes que participaram dos testes deram respostas "corres", isto é, de acordo com as previsdes. O intervalo entre as duas linhas melédicas pode ser reduzido a um semitom sem que isso comprometa a distingdo auditiva das quatro configuragbes (Issatschenko e Schadlich, 1966). f interessante observar que mesmo nesse nivel particularmente elevado de absiragio, as frases inacabadas permanecem claramente distintas das frases interrogativas. ‘As experiéncias de Issatschenko ede Schadlich pressupdem e provam que sto es da freqiéncia fundamental que caracterizam as configuragdes melédicas, as estruturas entoacionais. Essa conclusio implicta foi posta em evidéncia por testes feitos com frases sintetizadas ou manipuladas com um vocoder, um “codificador vocal", capaz de modificar um ou varios elementos das frases naturais previamente gravadas (cf. Flanagan, 1965) Peter Denes fez, jd em 1959, incursdes pioneiras nesse dominio da intonologia (P. Denes, 1959, Denes e Milton-Williams, 1962). Péde ele entdo verifcar, entre outras coisas, que © tom elevado, ascendente ("high rise") € geralmente interpretado como o de uma questo (surpresa). Enguanto Denes, a partir de uma concepedo de "tons", de "pitch phonemes”, 4quase independentes da estrutura fristica, apresentou aos ouvintes dos testes variantes, mel6dicas desprovidas de qualquer estrutura verbal, segmental, Elisabeth Uldallconferiu ‘uma frase inglesa (de modalidade indeterminada) He'll be here on friday padres rmel6dicos lineares, geométricos, como, _correspondendo aproximadamente a curvas de freqiéncia fundamental medidas em frases interrogativas e declarativas naturais. Os testes de percepcdo feitos a partir de quatorze variantes levou-a a concluir que as frases eram interpretadas como questio se a subida mel6dica (continua) atingisse ‘0 nivel mais elevado, independentemente da configuragao melédica global. Elas eram percebidas como assergBes se 0 tom descesse, mesmo sem atingir 0 nivel mais baixo do enunciado, sendo que as curvas descendentes-ascendentes eram geralmente interpretadas como assergOes se a subida final nio ultrapassasse o nivel médio. A partir do momento em que a subida final ultrapassava o nivel médio, sem todavia atingit 0 nivel mais elevado do enunciado, as opinides se dividiam. Esse padrio mel6dico parece corresponder a certas entoagdes reais de modalidade ambigua (Uldall, 1962). Esses resultados sio compardveis aos obtidos por Odette Mettas (1964, 1966), ‘A modalidade da frase parece depender da importancia da subida final: uma subida disereta € ainda perfeitamente compativel com a modalidade assertiva, uma subida ‘continua importante conferiré, a0 contrrio, um cardter interrogativo & mesma frase Como vimos precedentemente, essa autora pode igualmente constatar uma superposicao das modalidades interrogativa e assertiva, a exiséncia de padroes melédicos suscetiveis de serem interpretados a um s6 tempo como quesides e como exclamagdes surpresas. Experiéncias mais recentes - baseadas na manipulagio alternada de trés parimetros: freqléneia fundamental, intensidade € duragio - trouxeram-nos certas precisées. Notou-se que é sobretudo 0 Angulo da subida, endo sua amplitude, que ‘ngue exclamaglo assertiva da questo total. Uma subida continua, uma curva concava (/) conferem a frase um caréter interrogativo. Uma subida brusca, de igual importincia, favorece as interpretagdes "exclamagdes assertiva’ (/). Finalmente uma sublda lenta, apresentando uma forma convera (~), sugere uma frase inacabada (a reflexdo, a hesitaglo). A intensidade pode igualmente ser pertinente em alguns casos, especialmente se 0 Angulo da subida melédica for médio. Uma curva de intensidade ascendente reforga 0 aspecto interrogativo da frase. Se Ihe substituimos uma curva de intensidade onde uma subida répida € seguida de uma queda igualmente brusca, a frase erderd 0 seu caréter interrogativo € se transformaré numa assereo exclamativa (Grundstrom, 1973, Fonagy e Bérard, 1973, 1. Fénagy, J. Fonagy e J. Sap, 1979). Os testes indicaram ainda a presenca discreta de uma terceira dimensio perceptiva, a musicalidade. Se aumentarmos a "musicalidade™ da frase (0 que se consegue

You might also like