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é a nossa condução / Mas não se- R: Não foi a primeira vez que mor-
guimos à toa / Não seguimos à toa.” reu alguém em um show de rock. Quan-
(Arnaldo Antunes, Volte para o seu lar)
do muita gente se reúne, pode haver
alguma confusão, principalmente no
3. “O Guns N’Roses, hoje com certeza a Brasil. Fiquei sabendo que o garoto que
banda mais popular do mundo, entra morreu estava com uma machadinha.
em cena ao vivo e a [sic] cores no Ele, então, não foi ao show com boas
maior estilo rock-rebelde: palavrões intenções. Ele não estava ali para ouvir
cabeludos, sexo, drogas, quebra-que- música, mas para brigar (...). Culpar o
bra, atrasos enormes e até interrup- rock por uma morte é mais fácil do que
ções nos shows comprovam que os achar o verdadeiro culpado.
‘bad boys’ continuam fazendo o estilo P: E quem é o verdadeiro culpado?
‘inimigos públicos nº 1’. Com voz ras-
gada, eles ‘descem o verbo’ na disci- R: Acho que é o País inteiro, o esta-
plina, na política, nos amantes, nos vi- do em que o País se encontra.
zinhos, nos críticos e na imprensa.” (Entrevista com Max Cavalera, vocalista do grupo de
rock Sepultura. IstoÉ Senhor, 9/10/91)
(Edição especial de Top Metal Band
sobre o Guns N’Roses)
6. “Hoje é véspera de Natal de 1999...
4. “Policiais e pretos, é isso aí / saiam do Apesar do medo da guerra nuclear,
que ainda nos assusta, conseguimos
meu caminho (...) / Imigrantes e bi-
chas / Não fazem nenhum sentido pra sobreviver às freqüentes guerras en-
mim (...) / Radicais e racistas / Não tre tribos surfísticas antagônicas(...).
Multidões de jovens hipertensos de-
apontem o dedo pra mim / sou um
garoto branco, vindo de uma cidade dicam-se a destruir ondas que mere-
pequena / apenas tentando acertar ciam ser acariciadas pela superfície
lisa de suas peles e pranchas(...).
as pontas.”
Fiscais uniformizados e armados pa-
(Guns N’Roses, One in a million) trulham as praias para controlar as
violentas guerras entre os surfistas.
5. Pergunta: O tipo de som produzido Além disso, aplicam tranqüilizantes
por bandas como a sua não incita à nos surfistas que freqüentemente
violência? piram com a tensão do cotidiano(...).
Resposta: Acho que sim. Mas é Discussões entre surfistas são de-
uma violência que não faz mal. É um cididas em combates rituais, onde a
lance de rebeldia liderada aí no show, morte está sempre presente. Nas ruas
sem precisar agredir ninguém. das cidades imundas e perigosas,
marginalizados povos primitivos que
P: Se é assim, por que então um ga- habitavam as favelas agora vagam
roto morreu baleado num concerto que famintos e agressivos.”
os senhores deram, em maio, na praça (Tito Rosemberg, Lendas e Tribos: Revisando o Futuro,
Charles Müller, em São Paulo? Fluir, out./90)
— 40 —
disso. Se as pessoas não estives- 10. “Vivi puxando difícil de difícel, peixe
sem de astral tão baixo, ele não ven- vivo no monquém: quem mói no asp’ro,
deria tantos livros. A auto-estima co- não fantasêia.’ (...) Viver é muito peri-
meça a melhorar quando você tem goso...”
controle sobre sua vida econômica. (palavras de Riobaldo, personagem de Grande Sertão:
(A crise já era, Veja, 12/10/94) Veredas, de João Guimarães Rosa)
— 42 —
ringas e agulhas, sem ônus, aos vicia- tribuição reduziu o ritmo de dissemi-
dos. Portanto, esse órgão público asso- nação da Aids.”
ciou ilegalidade à complacência. ”
* junkies: termo inglês que significa
(Vicente Amato Neto [médico infectologista],
drogados.
Painel do leitor , Folha de S.Paulo, 18/9/94)
(O pico à luz do dia, Veja, 7/9/94)
A carta acima faz referência a uma
proposta polêmica do CONFEN (Conse- 2. Em nosso país, exige-se o diploma para
lho Federal de Entorpecentes): o forne- que alguém aplique injeção endove-
cimento gratuito de seringas e agulhas nosa, porque pessoas não treinadas
a viciados em drogas injetáveis. criam perigos para si ou para outros,
ao realizar inoculações. Fornecer agu-
A ) Caso você concorde com a proposta lhas e seringas a pessoas não habili-
do CONFEN, escreva uma carta ao tadas para seu uso é como dar um
Dr. Vicente Amato Neto, procuran- carro a menores de idade, ou uma
do convencê-lo de que ela pode arma a quem não sabe utilizá-la. Isso é
de fato contribuir para evitar a dis- pelo menos indesejável para a socie-
seminação do vírus da Aids. dade, além de ser ilegal. No caso, a
B) Caso você discorde dessa propos- ilegalidade se tornaria incontrolável,
ta, escreva uma carta ao Presiden- pois o distribuidor dos medicamentos
te do CONFEN, procurando conven- e agulhas seria o próprio Estado. A
cê-lo de que ela não deve ser pos- proposta de um programa como esse
ta em prática. não leva em conta a realidade, cau-
sando desperdício de recursos já pre-
Ao desenvolver sua redação, além cários. Tais propostas são feitas por
de expor suas opiniões, você deverá ne- pessoas que nunca viram, de fato,
cessariamente levar em consideração a como funciona uma “roda”*, provavel-
coletânea abaixo. mente dirigentes sem formação médi-
ca e sem assessoria adequada (socio-
1. “Graças a uma legislação liberal, a
lógica, por exemplo). Não é difícil adivi-
maior cidade suíça [Zurique] criou
nhar que se trata de um plano que só
uma área especial — Letten, uma
beneficia vendedores de agulhas e
estação de trens desativada — onde
seringas e burocratas de escritório,
é possível comprar e usar heroína
não tendo qualquer conseqüência
em plena luz do dia. (...) Desde 1992,
para a epidemia da Aids.
quando os junkies* se mudaram da
Platzpitz, uma praça no centro da ci- * roda: prática, comum entre droga-
dade, para Letten, o consumo não dos, que consiste no uso de uma mes-
pára de crescer — um fato atestado ma seringa por várias pessoas.
pelas 15.000 seringas descartáveis
(adaptado de Vicente Amato Neto & Jacyr Pasternak,
distribuídas diariamente na velha es- A doação de seringas e agulhas a drogados,
tação. A única vantagem é que a dis- O Estado de S. Paulo, 5/9/94)
— 44 —
5. Ao Estado confere-se autoridade para cidade onde milhões vivem na pior mi-
promulgar e aplicar as leis que defi- séria e violência. Venda essa idéia
nem os costumes públicos lícitos, os como imprenscindível à nossa moder-
crimes, bem como os direitos e as obri- nidade (...) e imponha o decreto aos
gações dos membros da sociedade. poucos, antes como conselho, depois
Exige-se dos membros da sociedade como multa e só no fim como prisão.
obediência ao governo ou ao Estado, Transforme os que aplicam as penali-
mas reconhece-se o direito de resis- dades em propagandistas do Estado,
tência e de desobediência quando a militantes da pureza (do ar, por en-
sociedade julga o governo ou mesmo quanto); submeta as vítimas a sermão,
o Estado injusto, ilegal ou ilegítimo. além de multa. Como na Alemanha dos
anos 30, vá criando uma atmosfera de
A idéia de sociedade pressupõe a
vergonha, estigmatize quem não se in-
existência de indivíduos independentes e timidar (...). Desloque os opositores,
isolados, dotados de direitos naturais e in- aqueles para quem democracia é mais
dividuais, que decidem, por um ato volun- do que uma ditadura da maioria, de
tário, tornarem-se sócios ou associados modo que eles se vejam obrigados a
para vantagem recíproca e por interesses defender as causas mais ridículas: o
recíprocos. A sociedade civil é o Estado direito de se esborrachar no trânsito,
propriamente dito. Trata-se da sociedade de fumar até morrer. (...)
vivendo sob o direito civil, isto é, sob as
leis promulgadas e aplicadas pelo sobera- O que ocorre é que em toda parte o
no. Feito o pacto ou o contrato [social], os Estado deixa de regular a economia e
contratantes transferiram o direito natural transfere sua força de repressão para
ao soberano e com isso autorizam a trans- a vida particular, psíquica e compor-
formá-lo em direito civil ou direito positivo, tamental. O próprio Estado parece des-
garantindo a vida, a liberdade e a proprie- milinguir-se, mas só nas aparências: ele
dade privada dos governados. apenas muda de lugar, infiltra-se na
capilaridade social. (...) Não é que o Es-
Os indivíduos aceitam perder a liber- tado esteja em crise e por conseqüên-
dade civil; aceitam perder a posse natural cia a sociedade se torne mais livre; ao
para ganhar a individualidade civil, isto é, contrário, a sociedade se totalitariza.”
a cidadania. Enquanto criam a soberania
(Otavio Frias Filho, Cortina de Fumaça,
e nela se fazem representar, são cida- Folha de S.Paulo, 28/9/95).
dãos. Enquanto se submetem às leis e à
autoridade do governante que os repre- 7. O Partido ordenava que o indivíduo
sentam, chamam-se súditos. São, pois, rejeitasse a prova visual e auditiva.
cidadãos do Estado e súditos das leis. (...) Eles [os intelectuais do Partido]
estavam errados! O óbvio, o tolo e o
(adaptado de Marilena Chauí, As filosofias políticas,
Convite à Filosofia, 1994) verdadeiro tinham que ser defendi-
dos. Os truísmos são verdadeiros,
6. “Pegue uma idéia com charme interna- esse é que é o fato! O mundo sólido
cional, embora algo supérflua numa existe, suas leis não mudam. As pe-
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dras são duras, a água é líquida, os terceiro dia, mais símbolos apareceram
objetos largados no ar caem sobre a no batente esquerdo. Sua esposa, Moon-
crosta da terra. Com a impressão (...) shadow, desde o aparecimento das pri-
de estar fixando um importante axio- meiras inscrições, passava os dias exa-
ma, ele escreveu: minando antigos recortes de jornais, en-
rolada em uma manta indígena, entoando
A liberdade é a liberdade de dizer
estranhos cânticos. Na tarde do quarto
que dois e dois são quatro. Admitindo-
dia, Theodore encontrou um novo con-
se isto, tudo o mais decorre.
junto de símbolos, agora inscritos na pró-
............................................................. pria porta. Ao entrar em casa, constatou
que Moonshadow havia desaparecido.
Não podia mais lutar contra o Parti-
Procurou imediatamente a polícia. Foi as-
do. Além disso, o Partido tinha razão. De-
sim que esse estranho caso chegou às
via ter: como poderia enganar-se o cére-
minhas mãos. Comecei por tentar deci-
bro imortal coletivo? (...) A santidade era
frar o significado dos símbolos, que des-
estatística. Era apenas a questão de
cobri fazerem parte de um código alfabé-
aprender a pensar como o Partido. (...) O
tico. Consegui decifrar algumas palavras.
lápis pareceu-lhe grosso e desajeitado
Mas e os desenhos no centro da porta?
entre os dedos. Começou a grafar os
Certamente não se tratava do mesmo có-
pensamentos que lhe vinham à cabeça.
digo... A partir da coletânea acima, ela-
Primeiro escreveu em grandes le- bore uma narrativa em que o nar-
tras trêmulas: LIBERDADE É ESCRAVI- rador (investigador de polícia) apre-
DÃO. Depois, quase sem pausa, escre- sente a solução para o misterioso
veu por baixo: desaparecimento de Moonshadow.
Siga as INSTRUÇÕES GERAIS.
DOIS E DOIS SÃO CINCO (os tre-
chos acima, extraídos do livro 1984, de INSTRUÇÕES GERAIS: o foco nar-
George Orwell, tematizam a angústia da rativo deverá ser, necessariamente, em
personagem Winston, que vive em uma 1ª pessoa; se julgar necessário, você
sociedade governada totalitariamente poderá introduzir outras personagens
por um partido único). na história.
humanas podem produzir miséria. De ma- excelentes. Por exemplo: quando desen-
neira mais geral, a lição que permanece até volvo uma espécie no meu criadouro de ani-
hoje é que as instituições não são imutá- mais, procuro no acasalamento não mistu-
veis. Sermos cruéis uns com os outros rar o sangue de um macho todo ferradinho
não é uma determinação natural. É uma in- com o de uma fêmea maravilhosa. O burro,
venção das instituições que pode ser mu- o incompetente, o que foi comido pelo leão
dada. (...) / Veja — A permanência da mi- não vai passar o gene para frente. Nisso,
séria no mundo moderno pode ser tomada Hitler tinha razão. / Veja — Dentro desse
como demonstração de sua tese de que o ponto de vista, a escolha de Maitê Proença
simples passar dos anos não traz pro- — loura, linda e de olhos claros — para
gresso? Gould — Quando digo que não mãe de seu filho é perfeita? / Fasano —
existe progresso, estou me referindo ape- (...) Quero ter uma cria para ensiná-la a
nas à evolução dos seres vivos ao longo praticar esportes e a amar a natureza. Mor-
das eras. Digo que não há progresso, no ro de medo de que ela se ligue em computa-
sentido de que as espécies, incluindo a hu- dores. Por isso gostaria que meu filho nas-
mana, não sofrem variações com o objeti- cesse de uma mãe que pensasse como
vo de ser cada vez melhores. Elas variam eu. Acho que Maitê é essa pessoa.”
ao acaso. Na natureza não há progresso (Veja, 11/10/95)
como o experimentado pelas culturas e
pelo conhecimento humano, que são cu- TEXTO II
mulativos. Ou seja, o que se aprende em “Hitler, antes de se matar no famoso
uma geração é transmitido à outra, que tra- ‘bunker’ em que se refugiava na Chancela-
balha sobre a herança recebida e passa ria do Reich, escreveu o mais sinistro dos
adiante algo potencialmente melhor. Na na- capítulos da história. Não há (...), em ne-
tureza não há esse trabalho. As variações nhum outro texto trágico da saga da humani-
ocorrem ao acaso e, se o ambiente as dade, nada que se compare ao que fizeram
favorecer, os portadores e seus descen- Hitler, Goebbels, Himmler e o sinistro Men-
dentes terão mais chance de sobreviver.” gele em termos de ódio puro ao homem que
(Veja, 22/9/93) não cabia nos conceitos ‘raciais’ do aria-
nismo. (...) Caso Hitler houvesse ganho a
Na entrevista acima, o biólogo Ste- guerra que perdeu em 1945, nosso mundo
phen J. Gould defende a idéia de que as seria hoje inteiramente diverso do que é. A
variações que sofrem as espécies não gente se irrita com a miséria que grassa no
visam a torná-las “melhores”. Segundo Brasil, com a guerra da Europa Central (...),
ele, as variações ocorrem ao acaso. mas nada disso nos dá uma idéia, pálida que
Abaixo você encontra duas opiniões re- seja, do mundo em que estaríamos vivendo
lativas à possibilidade de aprimoramento caso a guerra tivesse sido ganha por Adolf
da espécie humana. Hitler. (...) Garanto a Victor Fasano que mal
valeria a pena estar vivo em tal mundo. Nem
TEXTO I com Maitê Proença embalando um berço
Veja — (...) Você é nazista?/ Victor com uma bonita criança dentro.”
Fasano — Algumas idéias nazistas são (Antonio Callado, Folha de S.Paulo, 28/10/95)
— 49 —
Tomando por base uma leitura cui- 3. "O defeito maior do presidencialismo,
dadosa dos textos I e II, e considerando no Brasil, é que o presidente pode
a entrevista do biólogo Stephen Jay muito e manda pouco — ou não con-
Gould, reflita sobre os aspectos consi- segue mandar. Há sempre alguém, na
derados na questão da evolução da es- cúpula federal, que, embora podendo
pécie humana, e: menos, manda mais. Ou desmanda."
• Caso você discorde das idéias de- (Joel Silveira, Guerrilha Noturna)
fendidas pelo Sr. Victor Fasano, es- BLOCO 2: 1. "Vejo a literatura como
creva-lhe uma carta procurando um exército que está sendo derrotado
convencê-lo de que não se pode
pela cultura das massas. Vanguardistas
tratar a questão do aprimora-
são os autores que conseguem dissua-
mento da espécie humana ape-
dir o inimigo."
nas do ponto de vista biológico.
(Ricardo Piglia, escritor argentino, O Globo,
• Caso você concorde com as idéias Frases do Ano. CD-ROM Folha 1994)
do Sr. Victor Fasano, escreva uma
2. “Os jornais eletrônicos, que estão sen-
carta ao Sr. Antonio Callado pro-
do proclamados como substitutos de-
curando convencê-lo de que o
finitivos dos veículos impressos, são
aprimoramento biológico é um
uma caricatura do jornalismo.”
fator importante no processo
(Alberto Dines, jornalista, Jornal do Brasil,
evolutivo da espécie humana. Frases do Ano. CD-ROM Folha 1994)
ATENÇÃO: AO ASSINAR A CARTA, USE
APENAS AS INICIAIS DE SEU NOME. 3. “A Idade Média nos deu as catedrais
góticas e a Divina Comédia. A nova
FGV-SP/96 — Fragmentos de tex- Idade Média nos dará excelentes se-
tos divididos em 2 blocos para escolha des bancárias e um belo catálogo de
de um deles. eletrodomésticos que poderemos
BLOCO 1: 1. “Em todos os países mandar vir de Miami pelo correio.”
que estão tentando uma adesão perifé- (Carlos Heitor Cony, jornalista, Folha de S. Paulo,
Frases do Ano. CD-ROM Folha 1994)
rica ao processo de globalização, e fa-
zem isso simultaneamente com planos
FAAP-SP/95 — PROPOSTA I
de estabilização, surgiu um fenômeno:
os presidentes ficaram levemente de- TEMA A: “A arte não é um espelho
corativos. Seja ele um gângster, um cor- que mostra a realidade como ela é. A
rupto ou um intelectual.” arte mostra-nos um mundo refletido por
(José Luís Fiori, Veja) uma mente incomum que impõe um estilo
no que retrata.”
2. "Quem vai dar as regras do jogo sou (Walter Kaufmann)
eu. O candidato a Presidente da Re-
pública sou eu. O presidente serei eu." TEMA B: “Curtir filme ruim, música
(Fernando Henrique Cardoso. Folha de S.Paulo.
vagabunda e programa de índio vira
Frases do Ano. CD-ROM Folha 1994) moda entre os jovens brasileiros, que
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xava, puxava, fui ficando aflito. Totó quei assustado, Dona Cecília vivia san-
dava ganidos estrangulados, entupidos, grando, só que era sangue invisível. Ela
como o choro do Gentil. Seu Quinca es- e o Gentil, de manhã até a noite sendo
tava vermelho de ódio, as orelhas pare- treinados, como não percebi antes? Lar-
ciam maiores, o dente de ouro mais pon- guei a carrana no chão com nojo, quem
tudo, cuspe no canto da boca: importa que roubem, melhor pros cachor-
ros! Voltei correndo pra casa, com medo
— RASTEJA senão te acabo com de Seu Quinca chegar. E me enfurnei no
a raça! quarto pra fazer curativo no pescoço
Quando abriu a mão para ajeitar me- do coitado do Totó. (...) Na hora da janta
lhor a coleira, Totó deu sua melhor piru- a Mãe disse pro Pai:
eta. E, no caminho de ida, mordeu a mão — Dona Cecília e o filho dela fize-
de seu Quinca. Fez três furos num arra- ram a mala e pegaram o trem das seis.
nhão de sangue. Mordeu e correu para Nem deixaram o endereço. Ela veio se
casa. Como um corisco. Seu Quinca fi- despedir de nós, disse que vai pro ser-
cou uma fera. Gritou: tão, não quer ver nunca mais a cara de
Seu Quinca.
— Depois eu acerto as contas com
esse cão do diabo, ele me paga! Você (Valle, Dinorath do. Totó Piruleta e o Menino do Povo.
Curitiba: Criar Ed., 1986, p. 22-25.)
vai pra casa, leva a carrana pra mim, dá
pra Cecília guardar. UFMT/99 — Os textos abaixo, de
A carrana era a coleira. Cheguei em fontes diversas, apresentam opiniões,
casa assustado, Totó estava tremendo de fatos, dados sobre aspectos da reali-
baixo da cama. Tirei a maldita carrana de dade social, econômica e cultural vivida
seu pescoço com cuidado, havia sangue pela criança brasileira.
nos pêlos. Fiquei parado com ela nas Leia-os atentamente.
mãos, medindo a maldade das garras, ca-
1
paz de fazer qualquer um rastejar. Eu ain-
da chorava quando bati palmas na porta da
casa de seu Quinca pra entregar a coleira,
nunca mais vou deixar treinar o Totó.
Não havia ninguém lá, era quase
absurdo, Dona Cecília não tinha ordem
de sair nem para ir na esquina comprar
sal. Fiquei parado olhando a porta, a boa
fechadura mais o cadeado. E tive, de
novo, uma idéia-urubu bem pretinha des-
cendo em minha cabeça: — Dona Cecí-
lia também usava carrana! Uma carrana
invisível que seu Quinca empurrava pra (Marcus Vaillant. Fotógrafo — Diário
baixo — RASTEJA! Mesmo de longe! Fi- de Cuiabá, 26/7/96)
— 56 —
II. O contato entre culturas produz efei- Mais que uma lei, queremos criar um
tos também no vocabulário das línguas. Movimento Nacional de Defesa da Língua
Portuguesa. Sem xenofobia, mas com al-
............................................................. tivez e brio, é possível proteger o idioma
Atente para o fato de que os em- contra o corrosivo bilingüismo que o des-
préstimos lingüísticos só fazem sentido figura e infunde nos brasileiros a depri-
quando são necessários. É o que ocor- mente ilusão de que a língua portuguesa é
re quando surgem novos produtos ou feia, limitada e vaga. Apesar das regras
por vezes tortuosas, é bela, pródiga e
processos tecnológicos. (...) São con-
precisa, dotada de recursos léxicos sufi-
denáveis abusos de estrangeirismos de-
cientes para acompanhar as descober-
correntes de afetação de comportamen-
tas, invenções e mudanças que transfor-
to ou de subserviência cultural. A im-
mam o mundo. Como indagou o professor
prensa e a publicidade muitas vezes não
Niskier, “por que não cuidar bem dela?”
resistem à tentação de utilizar a denomi-
nação estrangeira de forma apelativa, (Aldo Rebelo)
— 58 —
E sei que a poesia está para a prosa É o que vem à existência graças ao
nosso agir. No entanto, não surge como ‘ár-
Assim como o amor está para a ami- vore milagrosa’ e sim como aquilo que as cir-
zade cunstâncias abriram para a nossa ação.”
E quem há de negar que esta lhe é TEXTO II
superior
“A liberdade não se encontra na
E deixa os portugais morrerem à ilusão do ‘posso tudo’, nem no confor-
míngua mismo do ‘nada posso’.”
‘Minha pátria é minha língua’.” (Marilena Chauí)
(Caetano Veloso)
PUC-RS — TEMA:
encharca todos os órgãos e tecidos. rapadura. Serei teu cicerone. Mas não
Mesmo o cérebro, protegido por filtros te levarei, apenas, aos bairros ricos, de
bioquímicos, é imediatamente invadido.” casas modernas e confortáveis, a Bar-
(In Superinteressante, set./95) ra, Graça, Vitória e Nazaré. Iremos nos
piores bondes do mundo para a Estrada
O Brasil está gastando cerca de da Liberdade, onde descobrirás a misé-
US$ 61,2 bilhões por ano com proble- ria oriental se repetindo naqueles case-
mas de bebidas alcoólicas — interna- bres do Japão e da China, te levarei aos
ções hospitalares, tratamento de doen- cortiços infames.
ças e assistência a acidentados no trân-
sito. Esse é o balanço do Hospital das Esse é bem um estranho guia, moça.
Clínicas de São Paulo. Outros números: Com ele não verás apenas a casca ama-
rela e linda da laranja. Verás igualmente
• Cada brasileiro consome em média
os gomos podres que repugnam ao pala-
por ano 35 litros de cerveja contra 20
dar. Porque assim é a Bahia, mistura de
litros do leite.
beleza e sofrimento, de fartura e fome,
• 60% dos leitos de ortopedia estão de risos álacres e de lágrimas doloridas.
ocupados por vítimas de acidentes
causados por álcool. Quando a viola gemer nas mãos do
seresteiro, nascido na Bahia e cheio da
• O alcoolismo é responsável por 80% sua poesia, não reflitas sequer. Moça, a
das internações psiquiátricas. Bahia te espera e eu serei teu guia pe-
las ruas e pelos seus mistérios. Teus
(In IstoÉ, 6/10/99)
olhos se encherão de pitoresco, teus
UFPA ouvidos ouvirão histórias que só os
baianos sabem contar, teus pés pisarão
CONVITE sobre o mármore das igrejas, tuas mãos
Ah!, moça, esta cidade da Bahia é tocarão o ouro de São Francisco, teu
múltipla e desigual. Sua beleza eterna, coração pulsará mais rápido ao bater
sólida como em nenhuma cidade brasi- dos atabaques. Mas, moça, estremece-
leira, nascendo do passado, rebentan- rás também muitas vezes e teu coração
do em pitoresco no cais, nas macum- se apertará de angústia ante a procis-
bas, nas feiras, nos becos e nas ladei- são fúnebre dos tuberculosos na cida-
ras, sua beleza tão poderosa que se vê, de de melhor clima e de melhor percen-
apalpa e cheira, sua beleza de mulher tagem de tísicos do Brasil. A beleza ha-
sensual, esconde um mundo de miséria bita nesta cidade misteriosa, moça, mas
e de dor. Moça, eu te mostrarei o pi- ela tem uma companheira inseparável
toresco, mas te mostrarei também a dor. que é a fome.
*Arc é marciano e invisível, vem regularmente à Terra – inclusive ao Brasil – para ver se vale a pena Marte investir
aqui. Por enquanto, ele acha que não dá...
— 62 —
cação oral e escrita com o nosso ho- que já é regra na França. O risco de se
mem simples do campo, não afeito às cair no nacionalismo tosco e na xeno-
palavras e expressões importadas, em fobia é evidente. Não é preciso, porém,
geral do inglês norte-americano, que do- agir como Policarpo Quaresma, perso-
minam o nosso cotidiano (...)” nagem de Lima Barreto, que queria
transformar o tupi em língua oficial do
“Como explicar esse fenômeno in-
Brasil para recuperar o instinto de na-
desejável, ameaçador de um dos ele-
cionalidade.
mentos mais vitais do nosso patrimônio
cultural – a língua materna –, que vem No Brasil de hoje já seria um avan-
ocorrendo com intensidade crescente ço se as pessoas passassem a usar,
ao longo dos últimos 10 a 20 anos? (...)” entre outros exemplos, a palavra ‘entre-
ga’ em vez de ‘delivery’.
“Parece-me que é chegado o mo-
mento de romper com tamanha com- (Folha de S.Paulo, 20/10/98)
placência cultural, e, assim, conscien-
tizar a nação de que é preciso agir em Levando em conta as idéias pre-
prol da língua pátria, mas sem xenofo- sentes nos três textos, redija uma DIS-
bismo ou intolerância de nenhuma es- SERTAÇÃO EM PROSA, expondo o que
pécie. (...)” você pensa sobre essa iniciativa do De-
putado e as questões que ela envolve.
(Dep. Fed. Aldo Rebelo, 1999)
Apresente argumentos que dêem
“Na realidade, o problema do em- sustentação ao ponto de vista que você
préstimo lingüístico não se resolve com adotou.
atitudes reacionárias, com estabelecer
barreiras ou cordões de isolamento à
entrada de palavras e expressões de
outros idiomas. Resolve-se com o dina-
Modelo 1 –
mismo cultural, com o gênio inventivo do
povo. Povo que não forja cultura dis- ENEM 2000
pensa-se de criar palavras com energia
irradiadora e tem de conformar-se, quei- “É dever da família, da sociedade e
ram ou não queiram os seus gramáticos, do Estado assegurar à criança e ao ado-
à condição de mero usuário de criações lescente, com absoluta prioridade, o di-
alheias.” reito à saúde, à alimentação, à cultura, à
(Celso Cunha, 1968) dignidade, ao respeito, à liberdade e à
convivência familiar e comunitária, além
“Um país como a Alemanha, me- de colocá-los a salvo de toda forma de
nos vulnerável à influência da coloni- negligência, discriminação, exploração,
zação da língua inglesa, discute hoje crueldade e opressão.”
uma reforma ortográfica para ‘ger- (Artigo 227, Constituição da República Federativa
manizar’ expressões estrangeiras, o do Brasil.)
— 64 —
(...) Esquina da
Avenida Desembarga-
dor Santos Neves com PAPAI NOEL,
Rua José Teixeira, na COELHINHO DA
PÁSCOA...
Praia do Canto, área no- PANACA! DAQUI A
bre de Vitória. A.J., 13 POUCO VAI DIZER QUE
anos, morador de Caria-
cica, tenta ganhar algum
MÃE
EXISTE!
trocado vendendo balas
para os motoristas. (...)
“Venho para a rua
desde os 12 anos. Não
gosto de trabalhar aqui,
mas não tem outro jeito.
Quero ser mecânico.”
A Gazeta , Vitória (ES),
9/6/2000.
Modelo 2 – TEXTO 2
REPORTAGEM
UFMG 99 O trem estacou na manhã fria,
Instruções
Coletânea de Textos
Nesta prova você vai planejar e re-
digir um texto argumentativo, em duas
etapas obrigatórias: Conjunto 1 — Crianças e
ETAPA 1 – preencher o esquema de adolescentes no Brasil
“Planejamento do texto”, na página 2 do
Caderno de Respostas, preparando a ESTATUTO DA CRIANÇA E DO
redação; ADOLESCENTE (Lei 8069/90)
(...)
ETAPA 2 – escrever o texto argumen-
tativo, na página 3 do Caderno de Res- Art. 3º – A criança e o adolescente
postas, respeitando o “Planejamento do gozam de todos os direitos fundamen-
texto”. tais inerentes à pessoa humana, sem
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O JOVEM E A VIOLÊNCIA
O Brasil conta com uma legislação
Conjunto 2 — A infância na mídia
de vanguarda – o Estatuto
da Criança a do Adolescen-
te (ECA) – mas os fatos in-
sistem em demonstrar que
muito chão precisa ser tri-
lhado antes que a realidade
passe a refletir o quadro de
justiça a cidadania tão bem
desenhado no papel.
Um ponto extremamen-
te crítico é o que focaliza o
tratamento dado aos adoles-
centes autores de atos infra-
cionais. O Ministério da jus-
tiça reconhece, em pesqui-
sa publicada este ano, que
o acentuado crescimento do
número de jovens em con-
flito com a lei não é fruto de
mero acaso. O problema,
aponta o documento, “é re- (Época, 17/9/99)
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(IstoÉ, 8/7/99)
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TEXTO I
o barro
toma a forma
(Veja, 22/9/99)
que você quiser
você nem sabe
estar fazendo apenas
o que o barro quer
TEXTO II
Ao realizar sua tarefa, tenha pre- Para produzir seu texto, escolha um
sentes os seguintes aspectos: dos três temas propostos abaixo. Lem-
bre-se de que você deverá escrever
♦ Evite fórmulas preestabelecidas ao uma dissertação; portanto, mesmo que
elaborar seu texto. O mais importan- seu texto possa conter pequenas pas-
te é que ele apresente idéias organi- sagens narrativas ou descritivas, nele
zadas, apoiadas por argumentos con- deverão predominar suas opiniões so-
sistentes, e esteja de acordo com a bre o assunto que escolheu.
norma culta escrita.
TEMA 1
♦ Antes de passar a limpo, a tinta, na
folha definitiva, releia seu texto com “O professor que desrespeita a
atenção e faça os reparos que julgar curiosidade do educando, seu gosto es-
necessários. tético, sua inquietude, sua linguagem;
que ironiza o aluno, que o minimiza, que
♦ Não é permitido usar corretor líquido.
manda que ele ‘se ponha no lugar’ ao
Se cometer algum engano ao passar
mais tênue sinal de rebeldia legítima, tanto
a limpo, não se preocupe: risque a
quanto o professor que se exime do
expressão equivocada e reescreva,
cumprimento de seu dever de propor
deixando claro o que pretende co-
limites à liberdade do aluno, que se furta
municar.
ao dever de ensinar, transgride os prin-
♦ Dê um título a seu texto. cípios éticos de nossa existência.”
(p.66)
♦ Lembre-se de que não serão consi-
derados: Considerando que cada nível de en-
sino requer um professor com caracte-
• textos que não desenvolverem um
rísticas particulares, e que você está às
dos temas propostos;
portas da Universidade, disserte sobre
• textos redigidos a lápis ou ilegíveis; a questão abaixo.
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TEMA 2 Modelo 6 –
“Saber ensinar não é transferir PUCCAMP-SP
conhecimento, mas criar as possibili-
dades para a sua própria produção ou
construção. Quando entro em uma sala
de aula, devo agir como um ser aberto Instruções Gerais
às indagações, às inibições dos alu-
nos; um ser crítico e inquiridor, inquieto
diante da tarefa que tenho – a de ensi- I – Dos cuidados gerais a serem
nar, e não a de transferir conhecimen- tomados pelos candidatos:
to.” (p. 52)
1. Leia atentamente as propostas, es-
Considerando que a aprendiza- colhendo uma das três para sua pro-
gem depende de inúmeros fatores, va de redação.
entre eles o comprometimento do pró-
prio aprendiz, disserte sobre o tema 2. Escreva, na primeira linha do formu-
abaixo. lário de redação, o número da pro-
posta escolhida. (A colocação de tí-
O papel do aluno na construção do tulo é optativa.)
seu próprio conhecimento.
3. Redija seu texto a tinta (em preto).
TEMA 3 4. Apresente o texto redigido com letra
“A autoridade coerentemente legível (cursiva ou de forma) em pa-
democrática, fundamentando-se na im- drão estético conveniente (margens,
portância de si mesmo e da liberdade paragrafação etc.).
dos educandos para a construção de 5. Não coloque o seu nome na folha de
um clima de real disciplina, jamais redação.
minimiza a liberdade. Empenha-se em
desafiá-la sempre e sempre; jamais vê 6. Tenha, como padrão básico, o míni-
na rebeldia da juventude um sinal de mo de 30 (trinta) linhas.
deterioração da ordem.” (p.104)
Considerando que um ambiente II – Da elaboração da redação:
propício à construção do conhecimento
pressupõe disciplina e autonomia, dis- 1. Atenda, com cuidado, à proposta es-
serte sobre a questão a seguir. colhida em todos os seus aspectos.
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2. Com base nessas idéias, faça uma da experiência foi, literalmente, ater-
dissertação em que você exponha rador, mas uma oportunidade excelen-
seus pontos de vista e conclusões. te para que possamos refletir sobre
nossa educação, valores e sobre o
3. A dissertação deve ter a extensão
roteiro que estamos imprimindo à nos-
mínima de 20 linhas e máxima de 30,
sa juventude.
considerando-se letra de tamanho re-
gular. Desnecessário seria afirmar que
esses jovens, por usar uma fita inocen-
TEMA
te, sofreram todo o tipo de rejeição
Num noticiário de TV, tão veloz e imaginável. Desde singelos apelos de
tão variado, todas as notícias parecem professores para que a tirassem em
ter o mesmo peso. nome de uma uniformidade disciplinar,
até pais que se rebelaram com o pedido
para que esperassem uma semana para