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PERFORMANCE E ANTROPOLOGIA DE RICHARD SCHECHNER organizagao: Zea Ligiéro: ton x Copyrigh: © by Zeca Ligiéro, 2012 Direitos desta edicio reservados & MAUAD Editors Lede, esa Joaquim Siva, 98, 5° andar Lapa — Rio de Janeiro — R) — CEP: 20241-110 “Tels (21) 2479.7822 — Fax (21) 3479.7400 ‘wwwmauad com.br em coodigfo com icleo de Estudos das Performances Afro-amerindias (Neras-Usano) Projo Gr: [Ncleo de Arte/Maund Eitora Ce-Brast. Caruooagio-ti-Foste Saacaso NACIONAL 995 EDTORES DE LNROS, RU P5168 erormance e Antropeogia do Richaré Schechner | Richard Schechner;selapio de ensaos organizada por Zeca Lge; [taduro Augusto Rodrigues da Siva ‘Junior. etal}, - Rio da Jansio : Navad X, 2012. 188x28,00m Inc biologrfiae indice ISON 078-88-7478-405-2 1. Schechner, Rar, 19842. Teatro = Aspectos antopologicos. 3. Atos cbnicas.Liglro, Zeca, 1950» I, Ttulo. s2.9016. ‘opp: 792.01 ‘oDu. 782.01, RITUAL (Ritual ~ do Introduction to Peformance Studies) ‘Tradugdo de Aressa Rios Ritual, jogo e performance (GERBER jr eas performances atsticas,exportva ow a vide dé “sR EegarcmR ee uepesees we ee ee icc tccnes chimes ji foi feitae dita antes ~ “até mesmo por nds". As performances artisticas mol- ddam e marcam suas apresentagOes, sublinhando o fato de que o comportamento antstico é “nfo pela primeira vez", mas feito por pessoas treinadas que levam tempo para se preparar e ensaiar! ‘assim como no Kabuki, kathakali, ballet, ou ‘nas dangas dramiticas dos povos nativos australianos. Ou pode ser congruente 20 comportamento da vida dria, como no naturalism. Além das performan- ces artisticas, existem os esportes e os entretenimentos populares, que variam do circo a0 rock, ¢, claro, os papéis da vida diéria. No texto O que é performance, eu apontei que essas performances consistem de comportamentos duplamente exercidos, codificados e transmissiveis. Esse comportamento duplamente exercido & 350 que 6 performance" fol pubicado na revista O Percevejo,n. 12, eilada por Zeca Ligiéo, PPGAC, Unio, 2904, ital (de Introduction to Performance Studios) 49 ambivalentes, Hilerarguiias © desejos que proble as normas da vida didrla, © jogo dé As pessoas a chi temporariamente o tabu, 0 excessivo e 0 an ‘ou Electra, mas vocé pode perform-los “numa pega”. Ambos, levam as pessoas a uma “segunda realidade”, separada da realidad 6 onde elas podem se tornar outros que nao seus evs didtios. Quan- do temporatiamente se transformam ou expressam um outro, elas performam ag6es diferentes do que fazem na vida didtia, Por isso, ritual e jogo transfor ‘mam pessoas, permanente ou temporariamente. Estes so chamados “titos de passagem’, e alguns exemplos so: iniciagdes, casamentos e funerals. No jogo, as transformagces s8o temporaria, limitadas pelas regras do jogo. As artes do espeticulo, esportes e jogos sfo Kidicas, mas frequentemente se utilizam dos processos do ritual, Variagoes de ritual Fitval para Princess Tura Maran, Tambo de Mins, Par Foto ca igo, 2011, Nés no podemos passar um dia sequer sem executar dezenas de rituais, ‘io rituais religiosos,rituais da vida didria,rituais de papéis sociais,rituais pro- fissionais, rituais politicos, de negécios e do sistema judicial, Mesmo os animais, performam rituais. Muitas pessoas identificam o ritual com as priticas religiosas. Na religido, ricuals dio forma ao sagrado, comunicam doutrina e moldam individuos den- tro de comunidades. Se pessoas decretam a maioria dos rituais seculares da vida cotidiana, dificilmente notam o que esti fazenclo (na vida diva, € dificil dlstinguir entre “ritual”, “habito” e “rotina”); porém, rituais religiosos sfo cla- ramente marcados, Nés sabemos quando nés os performamos, BilhGes de seres humanos encontram o ritual dirctamente através reli vidéncias de rituais religiosos remontam aos primeitos perfodos da histéria humana ¢ até mesmo a pré-histéria, Diversos sitios rupestres e cemitérios que datam de 20.000 -30.000 anos atris esto cheios de objetos de “arte” que espe- lstas concordam serem de significado ritual. Em todo o mundo, aépoca atual ‘st saturada de religito e rituais religiosos. Existem a ceia de Pascoa, as cinco prostragbes ditias em diteso a Meca dos mulcumanos, a Eucaristia Catélica Romana, a ostentagio de uma chama de cinfora no épice do puja (oferenda) hindu, as cangas, mtsicas e os discursos de uma pessoa possuida por um orix do Umbanda o Canclomblé ~ e muitos mais a listar, ainda que uma pequena tuoi mais para Deus do Fogo, Soo, Guatemala, Foto © Zeca Lgl, 2012 finglo doles. Rituals rligiosos so to varacos como as prépras rel nes Rol (do Irtrocuction to Pecormanco Stes) Prosissd Gatien de Sto Subse Guta Fala © Zeca Lig 202 Performance e Aniopotogia de Richard Schechner Ritual de abertura do Festval de Dhindades Nogres, cto dos 41 voduns da Floresta ogra Gia Toge Foto © Zeca igo, 2011 Nem é a religiZo limitada as priticas normativas do “mundo religioso” ~ islamismo, budismo, cristianismo, hindufsmo e judaismo. HA muicas varlagoes locais, regionais e sectétias das religibes do mundo. Hé religides xamanicas, animistas, pantefstas ¢ da nova era. A maioria das pessoas, mesmo as que no admitem abertamente, atualmente segue mais de uma religido. O cristo devoto pode carregar um pequeno “patud” ou consultar regularmente seu hordscopo. Na didspora, povos colonizados e catequizados combinaram as religides de suas patrias com as que foram impostas a eles. Quando em dificuldades, pessoas que normalmente no farlam isso procuram curandeiros ¢ videntes. Sagrado e secular Rituais so, normalmente, divididos em dois tipos principais: 0 sagrado e 0 secular. Rituais sagrados sfo aqueles associados com a expresso ow a promul- ‘gacdo de crengas religiosas, Entende-se que esse sistema de crencas religiosas envolve o comunicar-se, orar, quando nfo invocar forgas sobrenaturais, Estas Ritual (do Introdustion fo Peformance Studs) 33 Forgas podten Fesidir internamente ou serem simbolleadas por deuses ou ouLrOR ‘eres sobre-humanos, Ou elas poclem ser inerentes ao proprio mundo natural pedras, Hos, érvores, montanhas ~, como nas religiées nativas americanas @ nativas aust a j0 aqueles associados com cerimonials de estado, vida dist e qualquer dade ndo especificamente de cariter religioso. a Jo Diablo, Rudo, Colombia. rande parte dos comici ormances rtuais sagrado-seculares do poder do partido do Estado. A préti- so Din da Meméria no Cemitério da Virginia, nos EUA, é um ritual de Est fugrado-seculat, Do outro lado da meeda, muitos rituais religiosos incluem Wvidivles que sio defintivamente mundanas ou nio-transcendentes, como as Wilsearas, as brincadeiras, as bebidas e a sexualidade do Alan dso, muitos ia, talvex a malorin ch sagrados. Um casamento, por exemplo, 6a perform nado pelo Estado, uma ceriménia religiosa ea reuniso da amigos, (Os rituais de casamentos estadunidenses so, ao mesmo (ernipo, seculares & sagrados. Rituais seculares de casamento incluem “cortar 0 bolo”, “Jogar 0 bur qué da noiva”, “a primeira danga com a noiva’, e assim por diante. Em muitos casamentos, também se realizam rituais sagrados representados por clérigos padres. Alguns casamentos sao presididos por um juiz ou capitéo de navio ~ nesses casos, rituais de Estado sio realizados. Algumas vezes, a porcao sagrada de um casamento esté separada da porgio secular, como ao se fazer uma ceti- ‘ménia de casamento na igrejae a festa em outro lugar. O que é verdade quando se tata de casamentos, também pode ser verdade para muitas outras prticas, celebragées e eventos de passagem da vida, tais como festas de aniversétio, celebragies relacionadas ao trabalho honrando anos de servigo ou de aposenta- dori, 0 jantar de Agao de Gragas nos Estados Unidos, e assim por diante. Em certo niimero de culturas, nfo ha separagio rigida entre sagrado e se- cular. As vezes, nio ha qualquer separacio. Para os austraianos natives que continuam a viver tadicionalmente, todo e qualquer lugar tem uma qualidade “sagrada”. Essa idcia da sacralidade ordinaria é um tema importante de religi- es da Nova Era ¢ de algumas artes da performance. A dancarina-coreégrafa Anna Halprin® (1920 -) trabalha com muitos tipos diferentes de grupos para localizar e executar conscientemente os rituais da vida cotidiana ~ comer, dor ‘mir, cumprimentar, tocar, mover-se — € inventar novos rituais que “honrem” 0 corpo ea terra. Por exemplo, A Danja Planetéria de 1987 de Halprin, um “ritual de danga” de dois dias, consistiu de grupos de dancatinos em 25 pafses execu- tando movimentos sincrGnicos para fazer uma “onda” de danga circundando a ‘Terra. A danga foi repetida em 1994, Estruturas, funcdes, processos e experiéncias Rituais e ritualizagSes podem ser entendidos, pelo menos, a partir de quatto perspectivas: * estruturas ~ como os rituais so vistes e ouvidos, como usam 0 espago, quem os realiza e como si realizados; FTAnna Haprn (1920 ~): danparna @ coredgrafa american, U piv m cura Sey trabacéha donde de 1960 grupos, eulturas e individuony conduxindo 06 rituals; como o8 mudanga ar “em” um ritual Poses quatro aspectos do ritual devem ser explorados a partir de mi Angulos, [logos estudam as continuidades entre stuais animais e humanos ~ par- ticularmente, como os rituais controlam ¢ redirecionam a agressio, estabele- com e mantém hierarquia, e marcam e defendem tertitério, Neuropsicélogos ereditam que certos ritmos repetitivos estimulam o cérebro, levando a uma ‘experiéncia ocednica” de bem-estarinigualével Paleo-historindores, estudan- do a “arte” das cavernas da Europa, inferem que rituais de caga e de fertilidade ‘eram provavelmente realizados em associagao com as pinturas ¢ esculturas. A arte" pode ter sido um depésito de meméria de um grupo antes da escrita (ew tuseiaspas porque ninguém sabe o que pensava quem fez esses desenhos), Os antropdlogos observam e teorizam sobre o grande niimero de priticas rituals das sociedades humanas de hoje, Te6ricos da performance investigam es pro- cessos rituais inerentes a oficinas, ensaios ¢ performances. Da vasta literatura sobre ritual, somente alguns sio relevantes para os es- tudos das performances. Eu identifiquel sete temas-chave para explorar mais: 1, ritual como ages, como performances; similatidades e diferencas de rituais humanos e animais; rituais como performances liminares, tomando posig6es intermedidtias nas transigbes de estigios da vida e de identidades sociais; 4. oprocesso ritual; dramas sociais; 6, arelagio entre ritual e teatro em termos da diade eficécia- centrecenimen 7. as “origens" da performance em ritual, ou nfo? Rituals como ago veoneperomace ‘Nideia de que rituais sto performances foi proposta, aproximadamente, um. século atris. mile Durkheim?* (1858 ~ 1917) teorizou que as performances tituais criavam e sustentavam “solidariedade social”, le insistia que embora os rituais pudessem comunicar ou expressarideias religiosas, cles ndo eram ideias nem abstragdes, mas as performances decretam padres conhecidos de compor- tamentos ¢ textos. A relagio entre “acio ritual” e "pensamento” & complexa. Os rituals, ento, néo expressam tanto ideias como as incorporam. Os rituais so ppensamento em/como ago. Essa é uma das qualidades que fazem o ritual se parecer com o teatro, uma similaridade que Durkheim reconheceu. Arnold van Gennep* (1873 ~ 1957) também reconheceu as dinamicas tea- trais do ritual. Em seu estudo dos “rit cle passagem”, van Gennep propés uma estrutura de tr fases da agio ritual: a preliminar, aliminar e a p6s-liminar. Ele aponta que a vida é uma sucesso dle passagens de uma fase a outra, e que cada ppasso no caminho é marcado por um ritual. Na década de 1960, Victor Turner desenvolveu o pensamento de Gennep em uma teoria de ritual que tem grande importancia para os estucos da performance. Mais & frente, seri discutido 0 trabalho de van Gennep e Turner. Mas, primeiro, eu preciso explicar o ritual de ‘uma perspectiva evolutiva, Rituais humanos e animais ‘Todos os animais, inclusive os homo sapiens, coexistem dentro da mesma rede ecol6gica € es120 sujeitas ao mesmo proceso evolutivo. Porém, as animals ido so todos iguais. Homologias e analogias devem ser engendradas de forma cautelosa. Nao € correto classificar © processo de comunicasko das abelhas-rai- ‘nha com as demais abelhas por meio do movimento abdominal e os movimen- tos dos pés como 0 correspondente 4 “danga” do néctar no sentido humano, As abelhas ndo podem improvisar, alterar os padres bisicos do mavimento ou cexpressar seus sentimentos (os quais elas ndo t&m de forma alguma, segundo a compreenso humana da palavra “sentimento”). Nao existe arte onde tudo é sgencticamente determinado, onde ndo ha aprendizagem, onde nenhuma impro- 5 Eine Durkhoim (1059 ~ 1917): cintsia social francts, um dos to opologia, sooiclogin © pecologia, Autor do As Formas Elemontat an “4 ‘#70410 vacilo nfo podem) ocorrer, Entilo, o que ‘ufo fuzendo i? Eas esto se comunicando por meio de wm sistema ‘imbdlico de movimentos. Esse tipo de comunicagéo sugere uma conexdo, uma as, entre os rituais humanos e animais. es Darwin’ (1809 ~ 82), no seu livro A Expresso das Bmojdes no Homeme hos Aninais, de 1872, notou muitas similaridades em comportamentos entre hu- ‘manos e animais. Ele sentia que tais similaridades indicavam um desenvolvimento volutivo comum dos sentimentos e da expressto das emo;6es relacionado a0 da Anatomia e da estrutura cerebral. A obra de Darwin levou Julian Huxley" (1887— 1975) aafitmar que os rtuais humanos e animais estavam relacionados por meio dda evolugdo; essa ideia foi desenvolvida por muitos exdlogos e sociobiélogos, in- cluindo Konrad Loren” (1903 ~ 89) e Edward O, Wilson’ (1929 -). very cbserences, rites of cooled ad hoe soors police celebrations —passane forms forms a eee sae oem SOCIAL RITUAL uwan RITUAL IZATION Fined & fre: birds, marinas Genaialy fae insets ah RITUALIZATION ‘Aexclugo do tua dando una prspoctivaetligca pode se Husraca como ‘ino dnvore Guanio mai no ato da sore, mls complexos sto os rials, ‘Os plimatss no hurnande enoenan uals eocls, mas somanta.os humans ‘eolzam thsi rlgoeos «eats. Desento de Richard Sehechner 5 Ghanes Darwin (1609 ~ 62): naturalista Inglés quo desenvoiveu a teota da evclucéo pola tolegao natural Ném do seu cléssioa A Orgem das Espdcis (1850), Danwin tambon escravel, cada vee mal inlienta A Expresso daa Emop60e no Homam o nes Animals (1872) V7 = 1975): bidlogo ingle, autor de Evelugdo: A Sintose Madoma (1042) © Yinla (1964), donee varias outras obras, tual” (veja a figura da pigina anterior), Animals com un si et0s e peixes, realizam rituais geneticamente flxad ples, tais coms acima da escala evolutiva, algummas espécies de mamiferos e passaros ‘Papagaios, por exemplo — elaboram seus rituais a partir do que thes ¢ dado pela ‘genctica € io capazes de aprender, mimetizar ¢ improvisar. Muito préximo dos hhumanos esto os primatas nfo-humanos. Entre estes, algumas espécies de chimpanzé ¢ de gorila pecformam de forma muito parecida com os humanos, mas cde maneira alguma préximos da complexidade, diversidade ou qualidades cogni- tivas dos noss0s rituals. Estes desenvolveram o ritual em sistemas complexos & sofisticados, divididos em trés categorias principas: ritual social, ritual religiosoe ritual estético. Como j& notamos anteriormente, essas categorias nao estio isola- das umas das outras, mas se sobrepGem ou convergem frequentemente, Para vislumbrar 0 quo préximos estio alguns dos maiores primatas dos hhumanos, deve-se recorrer a estudos de campo, assim como a alguns experi- ‘mentos de laboratério em tomo da aquisigio e uso da linguagem. Jane Goodall (1934 -) descreveu a performance por meio de um chimpanzé macho jovem da reserva Gombe Strean, na Tanzania, onde um jovem animal desafiou © macho lider alpha no por meio de combate, mas através de uma exibigo rituaistica, Nio muito tempo depois de sua cemonstracao, “Mike” substituiu “Goliath” ‘como omacho lider alphe da trupe. Note que os animais observados por Goodall no foram treinados ou domesticades. Goodall os nomeou apenas para identi- ficé-los. Onde entra o ritual? Como em tantos outros confrontos entre animais enwolvendo dominacio, envolvimento, territério e comida, 0 desafio de Mike se dew na forma de ritual, como uma demonstracio simbélica, néo como a “coisa real’, combate mortal, Goodall observou otstras performances de chimpanzés que ela acreditava serem muito semelhantes 20 teatro humano. George Schaller” (1933 -), que estudow o gorila da montanha em Uganda, também demarcou semethancas entre humanos e primatas nao-humanos, Schal- ler demonstra que ages como as brincadeiras, 0 aceno e jogar objetos realizadas, or torcedores de eventos esportivos so muito patecidas com 0 que os gorilas, fazem, Estudos recentes confirmam que torcedores esportivos estio envalvidos de tal maneira, que passam por mudangas tanto fisiol6gicas como psicolbicas. Exibigées entusiasmadas ou mesmo violentas nio so raras nos jogos de futebol tam se tomado mals demonstrativos, para nfo dizer tumultuaclos, EE no apenas eventos esportivos. Formagées ritmicas de larga escilay de ferentes tipos ~ marchas, movimentos em coro, canto de hinos, discotecis, ‘enumerar alguns -, so exemplos do mesmo comportamento geneticamente baseado, Somente poucos desses exemplos apontam para a expressio indiVi- dual. DemonstragSes de massa e congregagses, ressurgimento das regis ‘gio de milhées de pessoas no Tiananmen Square de Pequim, tudo isso tral hha mesma corrente emotiva. Quando os estados emocionais (mood display)! ritualizadas em agées de massa, as expressdes individuais ficam desencota) ‘ou proibidas, so substituidas por agées exageradas, ritmicamente coordena¢h repettivase cantaas. A agresséo 6 evocada e canalizaca em beneficio do pat wore nites teansfores ‘Status 1: Boys Status 2: Men © sistema tarapors-ransteaofarconacomo na rosa. No porto nea ‘pes 0 encanta com pape ~ grav sto meen poe tonspoteders nos tantrmaccn, Rca dn Aco es haan jo gsc, doe feerers experts dean porate sme vas colanos vant ‘nano a peromanes, orc es cntizom os manos em sia inseste Date {sso pero, sera sus compannao so doaramco pre Aso Foi Des nn eta candor grants ob Pr ‘undo na conc da ica, ots antanne vino dngande= psp _vez como homens, C. Dasenho de Richard Schachner. hone va indas, embora problemética, de Turner fol sua teoria cle drama rama social é dlesenvolvido em quatro frases, uma ‘oguida da outray 1 - Ruptura 2-Crise 3 ~ Ago Reparadora 4 Reintegragio ou Separacio ‘Uma ruprura é uma situagio que ameaga a estabilidade de uma unidade soctal ~ familia, corporagio, comunidade, nagio, etc. A ctise € uma expansio da ruptura que se tornou aberta ao piblico. Podem ocorrer virias ctses sucessivas, cada uma mais péblica e mais ameacadora que a anterior. A ago reparadora jocorre para lidar com a crise, para resolver ou curar a ruptura, Muitas vezes suficiente, nessa fase do drama social, cada crise responde através de uma ago reparadora que falha, evocando novas crises, cada vez mais explosivas. A reinte- {grag € a soluco da rupcura original, de forma que a estrutura social scja unida novamente, Ou uma separagio ocorra. ‘Tome por exemplo o grande drama social europeu do séeulo XVI, chamado Reforma Protestante. O conflito nesse drama social estabeleceu-se entre a Igreja, ‘de Roma ¢ rebeldes, tais como Martin Luther (1483 ~ 1546) e John Calvin'® (1509 ~ 64). Cada tentativa de Roma no sentido de conter ott apaziguar os protestantes falhou. Ano apés ano, os protestantes cresciam mais fortes. Crise apés crise, a ruptura se alargava, gerando uma separagio a ser curada, Outros ‘exemplos de dramas sociais s40 0s conflitos em curso na Irlanda do Norte ou centre 0s palestinos ¢ 0s israelitas. Os dramas socials podem ser extremamente duradouros, amargos, ete, menos intratévels. Por outro lado, alguns dramas sociais sao resolvidos relativamente de forma répida, pelo menos na aparéncia, confito nos BUA sobre a escraviddo conduziu & separagio de 11 estados do Sul. A guerra civil (1861 ~ 65) resolven a crise em favor da Unido, com uma reintegragio forgada por armas. A ruptura foi produto da inabilidade de estados ‘escravistas ¢ estados livres concordarem com o futuro da Unido. A crise come- ‘0 com o ataque confederado no forte Sumter, Carolina do Sul, em abril de 1861. A guerra civil que se seguiu foi a principal parcela da agdo reparadora. A Fendigto do Confedterado em Appomattox, Vi Feintograglo, Hntretanto,o fim da guerra nflo dec igualdade, de liberdades civis, racismo e de justiga eeont tona na era da guerra civil e ainda estio em proceso de serem as breves aplicagdes da teoria de Turner expdem suas fiaquesas, A teotia reduz e nivela os eventos. Detalhes precisos, altos e haixos, nuances e diferengas, que fazem a andlise cultural interessante e iluminada, séo pressionados a uma u formidade. Qualquer conflico pode ser analisado como drama social ~ mas quais ‘fo as reflexes que fazem uma andlise ser procutiva? Uma vantagem da teoria é ue ela é dil em dissolvercircunstincias muito complicacas em unidades mane- jveis. Como um dispositivo de ensino, a teoria do drama social tem seus pontos positivos, Permite selecionar um ponto de partda e um ponte final, moldando um jogo de eventos hist6ricos ou socials, de forma que um aglomerado de ocorrén- «ias que podem inicialmente parecer incompletos, se orem manejéveis como um. cirama, Isso faz 0 fechamento parecer inevitével. Tal moldagem é sempre arbitra. (© que a teoria de Turner faz & misturar mundos diferentes na forma da estética do género ocidental, o drama. A progressio de ruptura e ctise para ‘aio reparadora até a divisdo (cisma) & o esquema subjacente das tragédias ‘gregas, do teatro elizabetano e do drama modemno. Isto é o que Aristételes, quis dizer quando escreveu que a “conspiracio 6 a alma da tragédia” e “cada ‘ragédia tem um comego, tum meio e um fim”, Isto 6 0 que Turner mais fami- liatizou com o teatro. Entretanto, essa estrutura fortemente afinada néo é to aparente no teatro do absurdo ou em pecas antidraméticas tais como Esperando Godot, de Samuel Beckett (1906 ~ 89), ou Mie Covagem e Seus Filho, de Brecht, om sua trama episédica, cada cena compreendendo um pequeno drama em si mesma. Isto nfo se aplica, de forma alguma, a muitos happenings ow perfor- ‘mances. Nem esté presente nos prolongados trabalhos epis6dicos de muitas culturas nao ocidentais. Peter Brook foi mundialmente criticado nos anos 1980 por transformar © Mahabharata em um drama ao estilo ocidental. Similarmente, ‘Turner péde transformar os conflitos do mundo em dramas de estilo ocidental Talvez 0 mundo de hoje, de terrorismo, guerritha, guerras civis prolongadas ¢ espionagem econémica seja melhor modelado pela arte da performance ou pe- los episédios convenientemente infinitos do Mahabharata, Pode ser que a vida espelhe a arte tanto como 0 conttitio — ¢ os teéricos sociais precisam escolhet com cuidado os géneros estéticos. ¥ Seve Becket 806-99): drama #rovsanasio na anc: ps pad i ata eatin rng: Eo me bas pan sporand Gect (198), Fm dog (17) 0D Fale 96 Nobel art 1200. B | wocial A teoria do processo ritual, Dur drama woctal, ox povos xe voleamn para 0 { guerra), para o processo legal (lo arbferio dos fp processo ritual. O processo ritual emprega uma large {vos ~divinatorios e sacificiais e, nas palavras de Turner, ‘uma desconsiruglo ¢ recombinagéo Kidiea da configuraggo cultural familiar”. [Em outras palavras, arce. Mas exatamente como a arte ajuda na resolugao dos conflitos sociais, Turner nfo faz uma elaborasio clara, (© que & mais claro e usual no modelo do drama social 6 0 relacionamen- to no muito fluido entre processos esiéticos ¢ processos socias, incluindo dramas estéticos ¢ sociais. Essa relago pode ser descrita como um niimero horizontal 8 ou o simbolo do infinito. Esse modelo proposto num continuo ¢ interminavel processo, dramas sociais afetam dramas estéticos e vice-versa. ‘Quer dizer, as ag6es visiveis de toc drama social so informadas, formedas ¢ guiadas por principios estéticos e pelos dispositivos de performance/retérica, Reciprocamente, as prticas estéticas visiveis de uma cultura sio informadas, formadas e guiadas pelos processos de interacio social. O politico, o ativista, 0 advogado ou o terrorista, todos usam técnicas de performance ~ encenam maneiras de se dirigir aos diversos piblicos, cenérios, etc. ~ para apresentar, demonstrat, protestar ou suportar agbes sociais espectficas ~ agbes projetadas para manter, modificar ou inverter a ordem social existente, Reciprocamente, ‘08 artistas delineiam as aces performadas na vida social, “eventos reais”, nfo ‘somente como matetiais a serem representados, mas como temas, ritmos € modelos dle comportamento e representagio, HA um fluxo de realimentacdo positiva entre o drama social e estético, Esse modelo demanda que cada drama social, cada drama estético (ou outro tipo de performance) seja compreendido fem suas circunstancias especificas,culturais ehistéricas. A palavra “drama” nao ‘& usada para afitmar a hegemonia ocidental, mas como uma cifra que significa qualquer tipo de representagio cultural espectica. Uma outra maneira de defi- nir esse relacionamento é dizer que cada performance — estética ou social - so ‘ambas eficazes e divertidas. Isto €, cada evento propde que algo comece a ser feito e cada evento da prazer aqueles que dele participam ou 0 observam. Deixe- -me dar um exemplo conereto do que eu quero dizer. ‘A danga “Mata-Porco” em Kurumugl junto a terras do conselho” na vizinhanga de Kurumugl, 1a Nova Guiné, eu observet, durante dois dias, formance a que eu assist) no tinha o Perigo teal do combate real Ax dangas © as ca rmovimentos de combate ¢ eantos do guerra, Ox da vestidos em parte para o combate e em parte para a dang, iu na arrumagio das casas em longas cabanas retangulares vagto de buracos para cozinhar, O segundo dia comegou com o sactificio de, aprox madamente, 200 porcos. Cada dono matou seu animal com discutsos orais ¢ melédicos, que descrevem o quanto foi penoso criar 0 porco, reforgam 0 que se prometeu, dizem que 0 animal era bom, etc, Esses recitativos eram aplaudi- dos com risos e rugidos, uma vez que eram repletos de piadinhas e conotagées cobscenas. Entio, os porcos foramn estripados, partidos ao meio e inseridos nos buracos para assar sobre as rochas quentes. As entranhas erain penduradas nas redes sobre os fornos, que emitiam fumaga e cheiro. As bexigas foram sopradas ‘em balées, para que as criangas brincassem, Enfim, uma cena festiva, Assim que 0 cozimento comesou, os homens retiraram-se para as cabanas. Eu observei um homem olhandlo um espelho e aplicando pigmento azul, ver- melho € preto nos seus bragos, cara e torso. Pintou a metade do seu natiz de vermelho ¢ a outra metade de azul. Eu perguntei a ele o que os padrées signi- ficavam. Ele disse que os escolheu porque gostou da maneira que apareciam. Quando ele terminou, ele surgiu: seu ar ocasional desapareceu e ele, literalmen- ‘te, empurrou seu t6rax parao alto, deu um longo grito, colocou sua longa cauda de pavio e seu cocar de penas casuar e ficou se mostrando, Ble nao estava fantasiado para ‘um papel imaginério em um jogo, ‘mas para um papel na vida ~ exi- indo sua forca, seu poder, sua riqueza © sua posi¢o no grupo. Juntou-se a seus camaradas, cujos trajes cram como 0 dele, mistura de tradicio-local © novidade-im- pportagio: bonés e éculos de sol im- portados, suportes de cigarto e ca- chimbo caseiros, calgées camufla- dos ou saias de palha. Mas apesar do que um purista poderia chamar de intrusées, um ritual tradicional do “retorno” foi representado, A ‘matanga do porco, em, Homa crt pa donor no Kurang, Papua Nove Gung 19t2 Foo (1926 - 97) westemunhou em 1963 - uma in regularmente descle © comego do sécu- sas Kurumugl foram adaptadas dos movimentos performance lo XX. Como no militares. (Os visitantes que se aproximam de Kurumugl nfo vém como amigos para luma festa, mas como invasores que se aproptiam do que Ihes pertencia. A me- dda que os invasores ~ armados com langas de combate ~ dangaram seu ata- {que nas terras do consetho, foram repelidos pelo grupo seampado devidamente mado homens e, aproximadamente, vinte mulheres inteiramente armadas, aque dangavam, defendendo came. Os invasores comegaram a atacaragres- sivamente, dezenas de vezes. Um valioso campo de amendoim foi pisoteado ra lama. Cada ataque foi enfrentado por um determinad conera-ataque. Mas, passo a paseo, 0s invasores penetraram no coracéo das terras do conselho, em diegéo ao monte da carne ¢ ao altar de mancibules e flares em seu centro. Quando os invasores aleangaram a carne, fundiram-se com seus “inimigos” em tum 66 prito, canto e na danga circular dos guerreiros. Dangaram em torno da carne por, aproximadamente, uma hora Fu estava parado junto a uma frvore, entre guertezos ¢ carnes. Ent, de repente, a danga parou. Os oradores mergulharara na care, retirando uma per- na ou um flanco, gritando-cantando coisas como (em inglés corriqueiro): “Eu te dou esse porco pelo que voc! deu ao meu pai tré anos ats! Seu porco era agro e no tinha gordura nenhumal Mas mes porco é enorme, com toneladas de gordura e ima carne —veja! veja! -, muito melhor do que o que voce deu pro meu pai! Meus irmos e eu lembramos que 0 que nés estamos dando a vocé hoje € muito melhor do que 0 que vocé nos dew, Se nés 0 chamarmos para nos ajudar em uma luta voce deve vi! Voc® nos deve muito!” [As vezes, a fala entoava rosas, Insultos eram langados antes @ depots. A diversdo movimentava todos os lados. Os paticipantes nfo esqueceram que hit io tanco tempo eles eram inimigos de sangue. Depois de mais de uma hora die discursos, a cane foi distribuida, Hasteada no alto dos trends, arecompensa foi carregada no alto dos ombros, por todas as familias, com muito canto, e elas partiram com sua parte. O significado dessa came se encontra no melo da rede dl obrigagesrituais em lugares longe de Kurumugl e para muitos que nfo es- tavam presontes naquele dia nas teras do conselho. flemto que analtou as performances ntuais ;ubilou ensalos sobre uma Leora gral Tim vos de uma invasto secrotn na festa, existiam to omar vitimas humanas, eles tomaram a carne, Em vex da 0 entrar em tertitério inimigo, como aconteceria em uma gueia, tod A petlor- ‘mance realizou-se nas tertas do conselho, uma terra de ninguém. E a0 invés da

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