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A crise da medicina no imperialismo do corpo The crisis of medicine on body’s imperialism DOI: Foi-se com os bilhdes em isencdes fiscais do estado do Rio as grandes empresas Dr. Murilo Cardoso de Castro Dndo. Joao Cardoso de Castro murilocdecastro@gmail.com joaocardosodecastro@gmail.com Universidade Federal do Rio de Janeiro Universidade Federal do Rio de Janeiro Acrise da medicina é fruto de uma opgao equivocada diante da cisdo na unidade de visio do que é o humano; uma cisio no que se contempla como ser humano. O momento cartesiano agravou um esquecimento do ser que se prenunciava no pensamento grego antigo, tornando-o abandono do ser. O médico decidindo pelo corpo, como identidade do humano, em seu encontro com o paciente ¢ a doenga na clareira do ser, no compartilhamento desta experiéncia a trés, vive um cinismo iluminado cercado de ciéncia e tecnologia, porém exilado deste ai-ser. PALABRAS-CLAVE Medicina. Cigncia Moderna. Heidegger. Corpo The crisis in medicine is the fruit of a mistaken option in the face of the split apart of the unity of vision of what is the human; a split apart in what is that one contemplates as human being. The cartesian moment turn it more serious the forgottenness of being already predicated by ancient greck thought, making it an abandonment of being. The doctor deciding for the body, as identity of the human, in his meeting with the patient and the sickness in the clearing of being, in the sharing of this triadic experience, lives an enlightened cynicism circled with science and technology, but exiled of there-being. KEY-WORDS Medicine. Modern science. Heidegger. Body ‘Actise da medicina no mperiaismo do corpo 115-135 De MuriloCardoso | nd Jodo Cardoso de CastroqueM de Castro (UFR Apresentagio O termo crise que utilizamos é aquele de seu sentido etimoldgico det vado do grego Arisis, de um momento de decisdo diante de uma distingao que assim se mostra. No caso da medicina, € o rompimento de uma unidade do olhar, uma decisdo sempre renovada de acatar um lado apenas de uma distingo que se aparenta, uma ciso no que se contempla como ser humano'. E como se a fonte incomensuravel e inesgotével que proporciona a abertura do ser, que somos, fosse esquecida por conta da “evidéncia” do humano, que também so- mos, Segundo Hans-Georg Gadamer (1998, p. 83-84) a experiéneia do mundo, tal qual os gregos nos transmitiram, se deixa transparecer numa passagem do Fedro, de Platio, em que este retoma o que eélebres médicos gregos jé tinham afirmado: “um médico ndo poderia tratar um corpo sem tratar a alma e que 0 seria ainda insuficiente, pois ndo seria possivel tratar 0 corpo sem- possuir um saber abarcando todo o ser”. Gadamer ainda esclarece (1998, p. 84) que esta expresso designa também o “ser integro”; “integridade do todo”, saiide do ser”, “saiide da integridade”, so expressGes estreitamente conexas. mesmo is A crise, a cisio no olhar da medicina, a faz ver de uma dualidade de uma unidade que se estende do ser-ser ao ser-corpo. Mais grave ainda, de- termina 0 corpo como sendo o ser humano ou o humano como “sendo”, sem que ai se veja uma conjugagiio do verbo “ser”, mas apenas a presenga de um ente-simplesmente-dado (Vorhandenheit). O imperialismo esta justamente em outorgar dominio total sobre este olhar miope que apenas reconhece 0 que se en- contra mais préximo ¢ imediato na relagdo com outros entes, Podemos tomar por empréstimo a expresso cara a Michel Henry (1990, p. 91) -“monismo ontolégi- 0” - para nos referir a este imperialismo do corpo, na medida em que subordina © ser € suas condigées de fenomenalidade a uma forma exclusiva, reduzindo o ontologico ao ntico, ou seja, a uma tinica esfera de manifestagao e de realidade. Nosso guia principal seré Martin Heidegger, embora tenha reconhecido que nada disse diretamente sobre 0 corpo, pois considerava 0 corporal como 0 mais dificil de ser tratado ainda & época de Ser e tempo. Sua analitica existen- 1 Seguindo a assertiva de Heidegger em Ser e tempo (2006, p. 64) de que o Dasein &“o ser do homem’, adotamos aqui a expressio ser humano, com itélico enfatizando ser, como correlato do intraduzivel termo chave de Heidegger, Dasein; embora usualmente traduzido por ser-ai ou, como preferimos, a/-ser. © humano que ualifica 0 ser na expressio ¢ justamente 0 ai: “O ‘al 6, entre outras coisas, o espago que emerge om si, mas nio se fragmenia e esfacela em meio a casa emergéncia. [..] © espago que se abre cm meio a uma tal irupgio nada mais ¢ que uma determinagao essencial do ai, junto & qual primariamente demonstramos um elemento essencial do ente que somos” (HEIDEGGER, 2008 p. 144), 2“Em grego antigo se diz hole ousia para designar ‘todo 0 ser” (GADAMER, 1998, p. 84, itélico nosso na citagéo). Ekstasis: revista de hermenéutica e fenomenologia V5 1N2Z 2016] 116 ‘Actise da medicina no mperiaismo do corpo 115-135 Dr Murilo Cardoso de Castro us do. Jodo Cardoso de Castro(ure cial, examinando a constituigdo fundamental do ser humano enquanto ser-af (Dasein), elabora nesta obra sua esséncia, a existéncia, no sentido transitive, O ser-ai se apresenta como um ambito de estar-aberto- abertura de onde e & luz do qual as significagdes do que nos vem ao encontro falam ao humano do ser. Por conta de tal constituigo, o ser-ai esté sempre em relagfio com algo que se Ihe revela. Segundo Heidegger (2001, p. 244), isso no seria possivel sem uma instincia - 0 corpo - ¢ ainda diria mais: sem um mim- -mesmo que se identifica com este corpo. -mundo, um estado de Podemos nos aventurar a inferir que 0 corpo justamente vem ao encontro no modo de ser-d-mdo, desde a inauguragdo do ser-ai em sua constituigao fundamental ser-a-o-mundo, desde 0 momento do nascimento do ser humano. Através deste “instrumento”, seu organismo e sua funcionalidade, € po um “agarrar, um formar ¢ transformar de outros acontecimentos ‘materiais’ animados ou inanimados que vém ao encontro” (HEIDEGGER, 2001, p. 244), ivel Entdo tudo 0 que chamamos a nossa corporeidade, até a tl- tima fibra muscular ¢ a molécula hormonal mais oculta, faz parte essencialmente do interior do existir; nfo 6, pois, funda- mentalmente matéria inanimada, mas sim um ambito daguele poder perceber néo objetivivel, nio opticamente visivel de significagées do que vem ao encontro, no qual consiste todo ser-ai. Este corporal forma-se de tal modo que pode ser utli- zado no trato com o material do animado ¢ do inanimado do que vem ao encontro. Mas a0 contrério de uma ferramenta as esferas corporais do existir nfo so descartadas do ser- -homem. Néo podem ser guardadas isoladas numa caixa de ferramentas. Ao contritio, elas permanecem permeadas pelo ser-homem, seguras por ele, pertencentes a ele, enquanto um homem viver, No entanto, a0 morrer, este Aambito corporal transforma seu modo de ser naquele de uma coisa inanimada, nna massa de um cadaver que se decompée. Certamente, corporal do ser-ai admite que ja em vida ele seja visto como um objeto material, inanimado, como uma espécie de maquina complicada. Tal observador, na verdade, {id perdeu de vista para sempre o essencial do corporal, Entio, perplexi- s essenciais do corporal. a consequéncia de tal observago insuficiente dade perante todas as manifestasé (HEIDEGGER, 2001, p. 244) Ekstasis: revista de hermenéutica e fenomenologia V5 1N2Z 2016] 117 ‘Actise da medicina no mperiaismo do corpo 115-135 Dr Murilo Cardoso de Castro us do. Jodo Cardoso de Castro(ure Essa longa citagdo era necessdria para situar o solo e por onde nosso ensaio deve perambular. A idéia fixa da medicina sobre o corpo e, mais recentemen- te, mais ainda sobre a doenga, onde corpo é visto exclusivamente como seu “hospedeiro”, esquece 0 ser logo ao inicio do alvorecer da Modemidade’ e, posteriormente, abandonou 0 ser, aquilo que faz do humano um ser humano, As relagdes humanas no ambito da medicina, no institucional, no organizacio- nal eno individual, demonstram o foco reduzido ao corpo, ao mais imediato do humano do ser, tanto na concepgao de saiide como na ocupagao cotidiana de todos aqueles implicados, sejam individuos (profissionais de satide, pacientes, assistentes administrativos, agentes de seguro, ete.), organizagdes (hospitais, clinicas, laboratérios, farmacéuticas, seguradoras, etc.) ou instituigdes (agén- 1s de governo, cdmaras legislativas, foruns judiciarios e ete.) Nao serd possivel, diante das limitagdes deste ensaio, elaborar a subjacente questio do ser em Heidegger, sua “aparente” polissemia nos escritos da década de 1920. “Aparente” (entre aspas), pois, de fato, Heidegger ainda se esforgava por deixar clara a questo que julgava digna de se pensar, qual seja: a questo do sentido do ser. Questo que, por sua formulagdo no singular, sentido do ser, s6 admite um sentido a ser re-velado, ou seja, velado naquilo que se enunci Se a questio do ser persegue seu curso apés a ontologia grega té-la aberto e recoberto, é na fixagdo das respostas que, apés os gregos, cada grande filosofia vai aportar a esta questio. Es- tas respostas se declinam em tantas “teses sobre 0 ser”, deter- minando cada uma o que ele ¢ [...]. Tal 6, portanto, a questo do ser, Outra & todavia, a questio posta por Heidegger em Ser e tempo. Posto que reabrir a questo do ser no é somente tird-la do esquecimento onde eaiu, dessa Vergessenheit evo- cada desde a primeira linha de Ser e tempo, & reelabord-la. ‘Nao se trata mais de determinar ser como sendo “isto ou aguilo”, forga ou vontade, por exemplo, mas de se inquitir, no sentido de uma questio prejudicial, do sentido do ser, pre- viamente a todas as determinagdes que ele pode receber no curso da histéria da metafisica, de Parménides a Nietzsche, (ARJAKOVSKY, FEDIER & FRANCE-LANORD, 2013, p. 438). 3“ Modernidade”, “Tempos Modemos” e “Raziio Moderna” so termos usados por Heidegger em referéncia a nossa era. “O pensamento modemo no apareceu de um momento para o ou tuo, Os primérdios fazemese sentir no século XV, na escoléstica tardia. O século XVI trouxe, de forma intervalada, investidas ¢ recaidas. No século XVM, pela primeira vez, realizam-se as clarficagbes e as fundamentagdes decisivas. Todo este acontecer encontrou a sua primeira conclusdo sistematica e criadora com o matematico e fisico inglés Newton; isto aconteceu com, ‘sua obra principal Philasophiae Naturalis Principia Mathematica, publicada em 1686/87 (HEIDEGGER, 1992, p. 82-83), Ekstasis: revista de hermenéutica e fenomenologia V5 1N2Z 2016] 118 ‘Actise da medicina no mperiaismo do corpo 115-135 Dr Murilo Cardoso de Castro us do. Jodo Cardoso de Castro(ure Em suas tentativas de responder a tal formulago mais precisa e tmica da genérica questio do ser, Heidegger, na década de 1920, ensaiou pela facticida- de [Faktizitat], pela vida [Leiben], pelo ser-ai [Dasein], até chegar ao Ereignis, © acontecimento-apropriador. A referéncia ao ai-ser cede lugar aquele acon- tecer que, acontecendo, se apropria de tudo que af acontece. “O ai a clareira do acontecimento apropriativo [Ereignis]” (HEIDEGGER, 2013, p.203). Neste nosso ensaio, ficaremos aquém deste aprofundamento, aquém do Ereignis, po- em sua diregdo, no caminho que a ele Heidegger nos conduz. O médico Segundo Gadamer (1998, p. 30-31), 0 que caracteriza particularmente 0 oficio de médico é 0 servigo que é chamado a prestar para o re de um estado natural, ou seja, para desobstruir qualquer impedimento & dinami- ca espontinea da physis, enquanto auto-desabrochar e auto-generar. Diferente- mente das outras artes ou técnicas, cuja tarefa consiste em fabricar um arte-fato, aarte médica deve manter ou restabelecer um equilibrio natural, como é 0 caso nos oficios agricolas e de criagdo de animais. Mas a diferenga ainda mais funda- mental é a que trata do equilibrio natural de um ser humano, o que limita ainda mais 0 aleance da competéncia cientifica do médico apenas ao aspecto corporal humano. Este aspecto corporal, se ndo afetado exteriormente por qualquer aci- dente ou fato degenerativo, aparenta ou nao saiide organica, que no pode valer como obra da parte do mi a propria physis enquanto auto-generacio. belecimento "0, como no caso de um artifice, mas somente como Para Gadamer (1998, p. 82), corpo e corporeidade, enquanto experiéncia corporal, ou melhor, corpo e vida (Leib und Leben) adquirem uma presenga mé- gica, pois simboliza a impossibilidade absoluta de dissociar o corpo da vida que o anima, Qual poderia ser um discurso de e sobre a alma sem a experiéneia da vita- lidade do corpo e de sua degradagdo, Assim, Aristoteles ainda tem razio quando diz que a alma nao € outra sendo prinefpio de vida do corpo. Ele a denominou por isto mesmo entelecheia (enteléquia, realidade plenamente tommada real), a de- finindo como essa existéncia de nosso mim-mesmo que se realiza nela mesma. neste sentido que a alma é pensada desde Platio, de forma tripartite segundo os aspectos, faculdades ou poderes que apresenta: Jogistikon (raciocinio), thymoei- des (irascibilidade), epithymetikon (apetitividade) (SCHAFER, 2012, p. 37). Ekstasis: revista de hermenéutica e fenomenologia V5 1N2Z 2016] 119 ‘Actise da medicina no mperiaismo do corpo 115-135 DrMurilaCardoso | Dndo.Joio Cardoso de Castro us de Castro(ure Embora no elaborado em Ser e tempo, nem em outras obras de Heideg- ger', arriscamos inferir que o corpo é uma instincia imediata do mim-mesmo e, este, por sua vez, fenmeno do si-mesmo’ (Selbst), este ai do ser-ai, este tlti- mo em sua constituigdo fundamental, ser-a-o-mundo (In-der-Welt-sein). Cor Po, mim-mesmo, si-mesmo sio desdobramentos que se dio a partir do ser-ai, a abertura do ser. A estrutura unitaria ser-a-o-mundo, é a clareira do ser, em que somos, em que se &, em que os entes intramundanos 0, Percorramos estes desdobramentos em sentido inverso, ou seja, em seus dobramentos. A montante, na fonte origindria, 0 acontecimento apropriador (Ereignis) do ser dobra ser-ai como abertura do ser, com este si-mesmo que somos. Caron (2005, p. 1449) assim esclarece este acontecimento apropriador originério: “O ato tnico em que ser e si mesmo se entre-pertencem em se vol- tando um para 0 outro, este ato que dé toda a textura de reciprocidade & doagdo do Simples, ¢ isso que Heidegger denomina Ereignis”. 0 acontecimento apro- priador constitui algo primacial no retrocesso a origem dos desdobramentos €, ao mesmo tempo, o nome primal do ser, posto que o mais original. O acon- tecimento apropriador “nio & ‘mais profundo’ que 0 ser, mas o resultado da Viragem (Kehre), o resultado do aprofundamento de um pensamento que, a0 contato do ser em que se imergiu, sabe doravante ai olhar a verdade do ser” (CARON, 2005, p. 1449). Para Caron (2005, p. 1450), sendo 0 Ereignis, termo de dificil tradugdo, a ligagdo misteriosa que permite a apropriagdo miitua da ipseidade (si-mesmo) e do ser-do-ai, ele justamente permite a possibilidade do surgimento do ser humano em sua complexidade estrutural. O Ereignis € 0 ser mesmo que detém a possi- bilidade de abertura a sua propria abertura e que proefere em si seu proprio eco, © si-mesmo. O Breignis diz o ser-ai em que se desdobra uma morada, 0 af para © ser, um “onde” onde o ser pode se manifestar enquanto tal ou vir a habitar. ser-ai é esta abertura do ser onde pode ser como ser e abrir progressivamente a0 pensamento o que é, em miltiplas relagdes que irradiam de um centro, si-mesmo. O ser-ai nao é um outro nome para 0 homem € muito menos um sujeito cartesiano. Heidegger ndo usa o termo como figura retérica para designar um ente, mas como convite a pensar o que supde este ente. De todos os entes, ser humano guarda este privilégio de intimidade com o ser, ou seja, uma aber- ° ‘4Execto uma noticia em Se ninérios de Zollikon (2001, p. 243). 5“O si-mesmo & uma totalidade que possui suas qualidades (presentes), seus desejos ou pro- jetos (a vir), suas possibilidades ou capacidades (constitutivas de seu pasado); 0 si-mesmio & portanto, a unidade de tés relagées temporais, de trés relagdes das quais nenhuma poderia set posta entre parénteses:relagdo ao presente, a0 futuro e ao passado” (CARON, 2005, p. 67) Ekstasis: revista de hermenéutica e fenomenologia V5 1N2Z 2016] 120 ‘Actise da medicina no mperiaismo do corpo 115-135 DrMurilaCardoso | Dndo.Joio Cardoso de Castro us de Castro(ure tura ao ser, ¢ justamente esta abertura € muito mais que o ente que ela deter- mina, ¢ é isto justamente 0 que Heidegger denomina ser-ai (Dasein). Segundo Caron (2005, p. 777), poder-se- lizer que a tradugao melhor do termo usado por Heidegger, Dasein, seria ai-ser: ai, h uma zona de aparigao, ou, ainda, ai, nao hé somente um aqui, mas um. © um espago para tudo aqui. a ser enquanto ser, ou, af, hi 0, EntGo, como aceitar, sem entrar por uma subjetivagdo que entenda o ser-ai como outro nome para o sujeito cartesiano, a afirmativa de Heidegger (2006, p. 86) de que “o ser que esté em jogo no ser deste ente sempre cada vez meu"? Da mesma maneira que deve se aceitar quando ele também afirma (2006, p. 86): “dizendo-se o ser-ai, deve-se também pronunciar sempre o pronome pes- soal devido a seu carater de ser sempre meu: ‘eu sou’, ‘tu és”. O que se afirma por este “meu”, este “mim-mesmo”, & 0 si-mesmo, em seu carater si na mesmi« dade do ser, ¢ nao uma propriedade do ego ou do sujeito. existencial, uma “categoria” da existéncia, ou seja, uma determinagao ontolbgi- ca precedendo toda apreensio que posso ter de mim-mesmo. “Ser sempre meu” est a montante de mim-mesmo, mais proximo de sua fonte no ser. E justamente porque hé no seai um “ser sempre meu”, um ser-seu, um Seine, é possivel ‘um sujeito como derivative, O que leva Caron (2005, p. 781) a concluir: *O ser-ai & relagao antes de poder surgir como um mim-mesmo; ele & ser-seu antes de ser visivel como sujeito, um si-mesmo antes do aparecimento em um mim- -mesmo”, Mais ainda, a estabelecer 0 stamos diante de um senso interno” de um mim-mesmo: Todo senso interno s6 é possivel na associagdo operada pelo ser-ai entre uma integridade biolégica que eu sou enquanto vivente e 0 fato que, como telagio ao ser, eu posse me fazer parecer enquanto mim mesmo: somente entdo nasce 0 senso interno, tomado possivel pela pré-compreensio ontologica; le nasce quando esta totalidade vivente aparece em sua pre- senga a um si-mesmo que se identifica com ela e que identi- fica cada sensagio com o fato que ai esto suas sensagdes. O ser-seu se aplica doravante ao corpo e, neste fendmeno que & © senso interno, nos encontramos face a cumplicidade em um, de dois fendmenos: o ser-ai se apega a um ente, no caso a um corpo; ¢ este ente a0 qual ele se apega sendo seu corpo, se tor- nna para ele um ente insigne, posto que o sinto a cada instante. Relaciono assim a transcendéncia, que nada é de ente, a um tente que como tal permanece aquele que me € mais proximo Ekstasis: revista de hermenéutica e fenomenologia V5 1N2Z 2016] 121 ‘Actise da medicina no mperiaismo do corpo 115-135 DrMuriloCardoso | Dndo. Joo Cardoso de Castro ura] de Castro(ure entre os entes, © senso interno nasce da identificago entre aquilo que eu vejo © aquilo que eu sinto, [...] 0 “se sentir” nio & possivel a tal grau de intensidade porque este ente, que cu sinto ¢ que é meu corpo, apareceu, gragas a relagio ao ser que permite fazer surgir sob meus olhos um ente, como o ente privilegiado que me é apegado. Quando o si mesmo se centra sobre seus estados, sobre seus vividos, sobre sua interiori- dade, precisamente ele se centra; logo & porque ele estava previamente no exterior. (CARON, 2005, p. 782). Esta longa citagZo capta, de modo conciso e claro, esta identificagio do si- -mesmo com 0 corpo, constituindo neste ato de identificago um mim-mesmo. Esta tendéncia de identidade por apego a0 corpo torna opaca a totalidade uni- taria, 0 ser-a-o-mundo, constituigao fundamental do ser-ai. Predomina na cla- reira do ser 0 mim-mesmo, enquanto corpo, ente entre entes que ora se do sob a marca corporal, em relagdes onde vige o senso interno, o corpo. O corpo, por sua vez, € um ente intramundano em harmonia com seu meio imediato, am- biente fisico em seu mundo circundante. O corpo € um ser-d-mdo (Zuhanden- sein), um instrumento especial, enquanto instincia imediata espaciotemporal, em todas as relagdes ser-a, ser-em, ser-junto-a, co-ser-ai que se dio na clareira do ser. Ainda assim um simples instrumento, ente intramundano, que vem a0 encontro na mundanidade do mundo. Na perspectiva que aqui nos interessa, na moderna relagdo médico-paciente, 0 corpo assume e reduz 0 ser-com eo co-ser-ai & objetificagao de um corpo doente sob a subjetificagao de um ser-ai encamando o papel de médico, Mas conhecemos igualmente o aspecto exterior do mundo, conhecemos todas as formas sob as quais ele aparece e, entre estas, conhecemos igualmente nossas experiéncias do corpo; © objeto dessas experiéncias foi aquilo que conduziu a ci- éncia moderna, em sua evolugdo metédica, a proceder por objetificagio, investigagio a qual a cigneia no poderia se eximir € da qual a pritica no pode ignorar os resultados. Mas isso no impede que percebamos os limites deste modo de conhecimento nem que se desperte cm nés uma conscién- cia hermenéutica dos limites disto que impossivel de obje- tificar. A questio se coloca entio da seguinte maneira: como a experiéneia do corpo ¢ a ciéncia se articulam? Como uma procede da outra? Como uma - a cigneia - & capturada pela Ekstasis: revista de hermenéutica e fenomenologia V5 1N2 [2016] 122 ‘Actise da medicina no mperiaismo do corpo 115-135 DrMuriloCardoso | Dndo. Joo Cardoso de Castro ura] de Castro(ure) outra? Ou ainda: a experigneia da singularidade se perder definitivamente em um novo baneo de dados ou em um outro dispositive mecanico (GADAMER, 1998, p. 82)? Um exemplo da insidiosa predominancia do corpo na relagio médico-pa- ciente, nos dias de hoje, é dado por Gadamer (1998, p. 31), ressaltando como Jo entre a teoria e a pritica se radicalizou sob o efeito das condigé impostas pela cigncia moderna. O diagnéstico médico sempre pés em jogo a arte medical e, mais que tudo, uma cultivada relagiio do médico com o paciente, inclusive com sua vida familiar, nos tempos do médico de familia, Entretanto, a introdugdo de técnicas ¢ equipamentos altamente especializados no Ambito laboratorial e clinico, levaram 0 médico a expor seus pacientes a0 anonimato de um aparato tecnolégico clinico, em muitos casos operados por simples tée~ nicos, que se empenham em defender seu papel de operadores destes aparatos € de produtores dos resultados dos exames praticados. O paciente 6 assim, submetido, por vezes durante muito tempo, a uma relagdo direta e, no minimo, desconfortével com equipamentos, em intencional ignorancia da experiéncia que compartilha com o operador da maquina, arel Arelagio médico-paciente. Linguagem e comunicagao. Para se entender a relagdio médico-paciente, é necessario nos despojar, mes- ‘mo que provisoriamente, do olhar ordindrio que os olhos corporais proporcio- nam de dois corpos separados, em relacionamento por gestos, falas, “caras e bocas”. Seguindo o pensamento de Heidegger, o que temos é um acontecimento apropriador em uma abertura do ser nesse ai em que ser-a-o-mundo & a clarei ra do ser em que médico é, paciente é ¢ doenga é. O momento estrutural ser-a ‘ou ser-em de ser-a-o-mundo & experimentado como ser-com (Mitsein) ¢ como co-ser-ai (Mitdasein), Segundo Marcia Schuback, nas notas de sua tradugdo de Ser e tempo (2006, p. 570), “o ser é sua dindmica de exercfcio e por isso sempre difusivo de si mesmo”. O ser-ai é o lugar desta imbricagao da difusao do ser, dai suas coneretizagdes na existéncia serem expressas pela preposigdo “com” (mit). Como Schuback afirma: “todo ser é sempre ser-com” (2006, p. 570). A questio do ser (Seinsfrage), tJo cara a Heidegger, & também a questdo do ser do ser-ai e, assim sendo, a questo do ser que ser-ai inquire, ou tenta recuperar de seu abandono, é também a questito do ser-com (Mitseinfrage). Ekstasis: revista de hermenéutica e fenomenologia V5 1N2 [2016] 123 ‘Actise da medicina no mperiaismo do corpo 115-135 DrMurilaCardoso | Dndo.Joio Cardoso de Castro us de Castro(ure Logo, nao apenas & Mitsein uma questio fundamental para qualquer investi- gagdo ontolégica, mas & também equiprimordial com a questo ontoldgica, a questo do ser. Este “com” (mit) no é aditado a ser (Sein) para fazer ser-com (Misein), mas 0 ser do ser-ai é Mitsein. Formulada assim, Mitsein € a questo de base, ou ainda, podemos dizer, o proprio solo de uma relago de ent ‘um ai, onde no ha somente um aqui (médico ou paciente), mas um espag. um espago para tudo aqui (médico, paciente, doenga, ete.). em Por outro lado, nas relagdes entre dois entes vindo ao encontro na aber- tura do ser, ambos no modo de ser-ai, ou seja, no Mitdasein, manifesta-se 0 que Heidegger denomina solicitude (Fiirsorge) como uma espécie de ocupa- cdo (Besorge), porém nio como esta altima, com os entes que veem ao en- contro nos modos de ser-d-mdo ou de ser-simplesmente-dado. A solicitude & um comportamento do ser-af para com outros entes que veem ao encontro no mesmo modo de ser-ai, corporalmente ou nao, préximos ou distantes. Assim como estamos em ocupagdo permanente com os entes que nos ceream, tam- bém estamos em solicitude constante com outros como nés, outros no modo de ser-ai; tratam-se (Besorge e Fiirsorge), portanto, de existenciais constitutivos da clareira do ser, de ser-a-o-mundo. A esséncia do ser-ai, a cura (Sorge), na raiz destes existenciais, & esta auto-afecgdo’, esta atengdo a tudo ¢ a todos, esta “paixiio” que nos mantém em ocupagdo ou solicitude. A cura promove e sus- tenta as conexdes entre os entes que se manifestam na clareira do ser. No caso de médico e paciente, dois ser-ai compartilhando esta convivéncia de doenga e satide, na clareira do ser, é de suma importincia a comunicagdo, a linguagem, © logos, € nem tanto os corpos do médico, sio ¢ altamente especializado, ¢ do paciente, doente ¢ altamente fragilizado. Partindo da afirmagao aristotélica de que o homem é 0 “zoon logon echon” (vivente dotado de /ogos), Heidegger (1998, p. 252) visa superé-la, indo muito mais adiante, através do resgate de Hericlito e da importincia dada ao logos em seus fragmentos. O logos, como ser que assim se dota “humano”, é, ao mesmo tempo, o que confere ao ser-ai os existenciais que o fazem capaz de compre- ensao, fala, discurso e comunicagio, condigdes inequivocas e indispensaveis do Mitsein (ser-com) ¢ do co-ser-ai (Mitdasein). Nao & nem preciso lembrar a significdncia destes existenciais no exercicio que o ser-ai se da na ocupagdo (Besorgen) do médico com o paciente. 6Nos termos de Michel Henry (2015, p. 151). Ekstasis: revista de hermenéutica e fenomenologia V5 1N2Z 2016] 124 ‘Actise da medicina no ‘mperiaismo do corpo 115-135 DrMurlo Cardoso de Castro ura] Dido Jodo Cardoso de Castro(ure © homem fala. Falamos quando acordados em sonho. Fala- mos continuamente, Falamos mesmo quando ndo deixamos soar nenhuma palavra, Falamos quando ouvimos © lemos. Falamos igualmente quando ndo ouvimos nio lemos ¢, 1 invés, realizamos um trabalho ou ficamos toa. Falamos sempre de um jeito ou de outro. Falamos porque falar nos é natural, Falar ndo provém de uma vontade especial, Costuma- -se dizer que por natureza © homem possui linguagem, Guar- da-se a concepsdo de que, & diferenca da planta ¢ do animal, © homem é o ser vive dotado de linguagem, Essa definigdo no diz apenas que, dentre outras faculdades, o homem tam- bem possui a de falar, Nela se diz. que a linguagem & 0 que faculta o homem a ser o ser vivo que ele enquanto homem. Enquanto aquele que fata, © homem é: homem. [...] A lingua- gem pertence, em todo caso, a vizinhanga mais préxima do bumano (HEIDEGGER, 2003, p. 7) Consideremos a linguagem ¢ a comunicacao, segundo nos propde René Schérer (1971, p. 157-170). Comecemos pela linguagem, no em sua relago a coisa nomeada por ela, mas em relagio ao uso que dela fazem aqueles que a utilizam. A linguagem existe enquanto ligagdo nas relagGes intersubjetivas, como aquelas entre dois seres humanos, “médico-paciente”. Um ser humano “dela dispde com o propésito de comunicar suas experiéncias, suas resolugdes, suas tonalidades afectivas. A linguagem serve a compreensio” (HEIDEGGER, 2000, p. 55). Esta fungdo encontra sua aplicagio eminente no didlogo “desde de que somos um dislogo e que podemos ouvir uns aos outros” (HEIDEGGER, 2000, p. 56). Assim parece, entio, que, se o sistema das palavras, das regras, pode ser tratado como contingente em relagdo a esséncia da linguagem, o didé- Jogo, ao contratio, constitui sua esséncia, “Mas que significa entio um didlogo? Evidentemente 0 fato de falar uns com os outros sobre algo. A linguagem & entio o mediador que nos faz vir e chegar uns aos outros” (HEIDEGGER, 2000, p. 56). Entretanto, o didlogo supe o poder entender e o poder falar; ou © “poder-entender, longe de ser uma simples consequéncia do fato de falar uns com os outros, é a0 contrario, a pressuposigao” (HEIDEGGER, 2000, p. 57). E: esticando apenas os ouvides para o soar das palavras nas expressées de quem fala, ainda nfo escutamos nada. Assim nunca chegaremos a escutar alguma coisa em sentido pré- prio, Mas, entdo, quando é que se di e acontece esta escuta? Ekstasis: revista de hermenéutica e fenomenologia V5 1N2 [2016] 125 ‘Actise da medicina no mperiaismo do corpo 115-135 DrMurilaCardoso | Dndo.Joio Cardoso de Castro us de Castro(ure Nés s6 escutamos quando pertencemos ao apelo que nos traz 1 fala, Pois bem, dizer o apelo da fala € isto que diz legein (HEIDEGGER, 2002, p. 190). Schérer (1971, p. 158) esclarece, portanto, que 0 “poder-ouvir”, proposto por Heidegger, concemente a possibilidade do didlogo, visa a um além das significagdes: a questio nao é de saber como significagdes so recebidas e co- municadas, uma vez que ela nao concere de modo algum a nossa comunicagao com outro, mas o fato que © homem, em sua origem, mora na linguagem e que por aio didilogo aberto, Ela no conceme ao encontro entre pessoas que irdo se tomar interlocutores, mas, a principio, & abertura do “humano” ao ser, na lin- guagem. Heidegger também insiste nisto destacando o uno do didlogo; uno que nada mais é que a unidade origindria do ser a partir da qual o didlogo é aberto. ® no esquecimento desta unidade, ou ainda, na “queda fora do ser”, que interlo- cutores estardo separados e deverdo se rejuntar pela troca das palavras buscan- do para eles a unidade de uma significagdo. O sentido ontoldgico profundo da linguagem entre “nds” se refere, como sua relagiio as coisas, & possibilidade de dizer o ser, da comunhao no logos uno-miltiplo. Schérer (1971, p. 159) clarifica, entdo, os termos do problema da comuni cago. Denominar nao se coloca em lugar do ser, denominar nao “eria” 0 ser no sentido ordinario, ativo, desta palavra, mas o funda ou, em sua verdade, 0 desvela. Isso significa que a linguagem nao é uma criago do homem, um ins- trumento, mas é contempordnea de sua existéncia e de sua presenga ao ser, de seu ser-ai, Compreender a linguagem, é se esguiar da “simples linguagem", ir a “linguagem do ser”, ao logos. A etimologia e 0 uso do termo no pensamento grego nos permitem, se- gundo Schérer (1971, p. 159), libericlo das implicagdes que o velam. Porque o logos e 0 legein em sua otigem nao significam a “lingua”, nem o “falar”, pode- remos dar & lingua seu justo lugar em sua proximidade do ser do ente. O desen- volvimento desta “demonstragio” se far em duas diregdes conjuntas: nisto que conceme ao Jogos, mostrar sua independéncia a respeito de sua interpreta: tardia como simples linguagem, como simples pensamento, cial ao ser; no que concerne A lingua ¢ ao pensamento, mostrar como encontram no logos sua origem e sua esséncia. essen Vamos logo ao decisive e investiguemos: o que significa lo- gos e legein, se néo significam pensar? Logos significa a pala- ‘ra, 0 discurso e legein significa falar. Did-logo ¢ 0 col6q Ekstasis: revista de hermenéutica e fenomenologia V5 1N2Z 2016] 126 ‘Actise da medicina no mperiaismo do corpo 115-135 Dr Murilo Cardoso de Castro us do. Jodo Cardoso de Castro(ure ‘moné-logo, o soliléquio, Nao obstante, originariamente, lo- gos nao significa discurso nem dizer algum. Essa palavra niio possui, em seu significado, nenhuma referéncia imediata a Jinguagem. Logo, legein, em latim legere, é a mesma pala- vra como a alema, “lesen” (ler): Ahren lesen (colher espi- gas), Holz lesen (juntar lenha), die Weinlese (a vindimia), die Auslese (seleedo). “Ein Buch lesen” (ler um livro) € apenas um derivado de “lesen”, em sentido proprio, Lesen signifi- ca por uma coisa ao lado de outra, junti-las num conjunto, ‘numa sintese; coligir, reunir. Coligindo, colhendo, a0 mes- ‘mo tempo se seleciona, se distingue ¢ separa uma coisa da outra, Nesse sentido usam os mateméticos gregos a palavra Logos. Uma colegdo numismatica néo 6 um simples amonto- ado de moedas ajuntadas de qualquer maneira, Na expresso “Analogia” (correspondéncia = Entsprechung) encontramos até juntas ambas as significagses: a origindria de “relagdo’ (Verhalinis), “referencia” (Bezichung) ¢ @ de “linguage “fala”, embora com a palavra “correspondéncia” (Entspre- chung) mal pensemos em “falar”. “Analogicamente, também, 08 gregos no pensavam, com a palavra logos, necessaria- mente em “discurso" e “dizer” (HEIDEGGER, 1999, p. 149). Schérer (1971, p. 160) lembra ainda que a physis grega é lida por Heidegger como distinta da natureza no sentido classico e modemo do termo e, deste mesmo modo, o logos nao é o latim ratio, nem palavra ou verbo, Tanto physis quanto lo- gas sto 0 ser nas suas determinagdes origindtias. O logos “abre 0 set ao homem” ¢, por ai, se encontra feita precisa esta auditibilidade, o “poder-entender” de que & questdo na conferéncia sobre Hélderlin (HEIDEGGER, 2000, p. 57), e que cons- titui a unidade do didlogo origindrio, a partir do qual o didlogo corrente, 0 uso da inguagem so possiveis: “O simples ouvir se dispersa e destrdi no que se pensa e se diz, no ouvir dizer, na doxa, na aparéncia, O auscultar auténtico, porém, no tem nada a ver com orelhas ¢ palavreados mas segue aquilo que 0 logos &: a uni« dade de reuniao do ente em si mesmo” (HEIDEGGER, 1999, p. 154). Asatividades comunicativas, para Schérer, que caracterizam o ser humano se esclarecem a partir do logos: © dizer ¢ ouvir s6 so justos, quando se orientam, previa- mente, e em si mesmos, pelo ser, o logos, Somente onde esse se manifesta, a vor chega a ser palavra. Somente, quando se percebe o Ser do ente, que se re-vela, o simples ouvir por ai se converte em auscultar (HEIDEGGER, 1999, p. 157). Ekstasis: revista de hermenéutica e fenomenologia V5 1N2Z 2016] 127 ‘Actise da medicina no mperiaismo do corpo 115-135 DrMurilaCardoso | Dndo.Joio Cardoso de Castro us de Castro(ure Donde resulta que é preciso, certamente, neste caso, que o ser humano ele mesmo seja; sua humanidade pertenga ao ser. A esséncia e a modalidade de ser ‘humano ndo podem se determinar sendo a partir da esséncia do ser. Tomar-se ciente do logos, como afirma Georg Kithlewind (1985, p. 13), & tornar-se ciente do Jogos em si mesmo. Que a comunicagao é possivel ¢ aconte- ce, que algo & comunicado, ¢ 0 ser ativo do logos entre seres humanos, O con tetdo da comunicagao importa pouco, a principio. O fato que se dé é a presenga do logos. Sem o logos no haveria nem a tentativa de comunicar, nem qualquer reivindicagao & comunicagZo. “Logos nao é palavra, lei, sentido, razio, medida, etc, E tudo aquilo que os torna possiveis: um relacionamento comum ao mun- do, um mundo comum. £ 0 elemento conector”. (KUHLEWIND, 1985 p. 20) O cinismo medical Tendo seu olhar cada vez mais reduzido ao corpo e¢ as mediges labo- ratoriais e clinicas que este corpo Ihe proporciona, sua comuni paciente resumida a consultas pontuais e delimitadas, e seu status inabalado na sociedade e na economia, o médico, ainda assim, é visto como um profissional dos mais bem formados, segundo o saber cientifico mais avangado dos Tempos Modernos. As conquistas na medicina sdo sobejamente enaltecidas ¢ os “ho- mens de branco” sio reverenciados. No entanto, ndo é preciso um olhar muito perspicaz. para reconhecer um cenério de Mluminismo decepcionante, propicio a0 que Peter Sloterdijk (1987, p. 25) denominou de entrada do cinismo moder- no, que “se apresenta como este estado de consciéncia que sucede as ideolo- gias ingénuas e a seu Iluminismo [Aufklérung]". O cinismo medical que vamos examinar é, portanto, a “falsa consciéncia médica iluminada”, uma consciéncia infeliz modemnizada sobre a qual o Iluminismo agiu e ainda age, com sucesso no discurso, mas com miséria na pratica, Sloterdijk, em sua Critica da Razao Cinica (1987, p. 335-346), esboga um ataque contundente sobre o cinismo “marcante, explosivo ¢ inatacavel” dos Tempos Modernos. A antiguidade conheceu o cinismo (do grego kynismos), onde o cinico era um original solitario ¢ apresentava-se como um moralista provocador e obstinado. Didgenes, vestindo um tonel ¢ ironizando mordaz- mente a todos, é considerado o patriarca do cinismo. J4 0 cinico modemo, se- gundo Sloterdijk, ¢ um caso-limite de melancolia, 0 qual consegue controlar seus sintomas depressivos e permanecer capaz.de trabalhar e manter uma vida Ekstasis: revista de hermenéutica e fenomenologia V5 1N2Z 2016] 128 ‘Actise da medicina no mperiaismo do corpo 115-135 Dr Murilo Cardoso de Castro us do. Jodo Cardoso de Castro(ure social. A atual definigdo seria: “o cinismo é a falsa conscigneia esclarecida - consciéncia infeliz sob uma forma modernizada” (SLOTERDIIK, 1987, p. 28). Outras definigdes que propde: “o desejo impetuoso que tém os individuos de se autoconservar como entes viventes e, certamente razoaveis, contra as torgdes © os empreitadas semi-razodveis de suas sociedades” (1987, p. 278); “um pen- samento que s6 pode aparecer ai onde as coisas podem suscitar duas maneiras de vé-las, uma maneira of © uma maneira nua, uma do ponto de vista do herdi ¢ uma do ponto de vista do submisso valete” (1987, p. 278). Em toda civilizagao se desenvolveram papéis sociais a serem desempenha- dos em contato com corpos moribundos ou mortos. Segundo Sloterdijk (1987, p. 336), € no papel de profissional de saide que se constréi o realismo mais aprofundado da morte corporal e, portanto, um conhecimento téenico mais in- timo da fragilidade do corpo ¢ do movimento de regenerago do organismo, da saiide, ¢ de degeneragdo, doenga ou envelhecimento, Talvez o catrasco seja aquele papel que possui um saber mais “pritico” do aspecto material da morte do corpo. No entanto, s6 0 profissional de satide, apesar do paroxismo do titu- Jo, € 0 mais habilitado profissional da morte. Desde a exposigio académica a autépsias, o cadaver The ensina 0 materialismo integral, a “morte mua e crua” em que se reconhece uma segunda nudez do corpo, quando sobre a mesa de dissecagdo os érgdos se expdem sem pudor. ial e uma maneira nao oficial, uma maneira velada A crise atual da medicina provém em parte do fato de que ela abandonou sua ligagio funcional de outrora com o sacerdécio para entrar em seguida cla mesma em uma relagdo tortuosa © equivoca com a morte. Na lta entre a vida a morte, os sacerdotes e os médicos escolheram campos opastos. $6 0 sacerdote pode, sem se tornar cinico e pondo um olhar eini- camente livre sobre a realidade, se alinhar do lado da mor- te, porque, nas religides ¢ nas cosmologias vivas, a morte considerada como 0 prego normal da vida e como uma fase da grande ordem do mundo, com o qual o saber do sacerdote “soprava” de um mesmo sopro, “conspirativamente” ligado com ele. A mortalidade em geral ndo deve embaragar o sacer- dote assim como a agonia individual em particular. Em uma e outra, uma facticidade de um géncro superior esta em opera- Ho, onde nossa vontade nio ¢ interrogada. B de outro modo para o médico. Ele se define pelo fato que deve tomar partido pela vida. Deste parti pris absoluto, deriva todo idealismo mé- Ekstasis: revista de hermenéutica e fenomenologia V5 1N2Z 2016] 129 ‘Actise da medicina no mperiaismo do corpo 115-135 Dr Murilo Cardoso de Castro us do. Jodo Cardoso de Castro(ure dico que hoje em dia ainda, até nas contorges mais einicas, guia os combates absurdos da medicina pela vida de corpos destruidos ¢ moribundos desde muito tempo, O médico toma © partido do corpo vivente contra o cadaver. Como os corpos viventes so a fonte de todo poder, aquele que salva 0 corpo toma-se um homem de poder. Nesta medida, torna-se ele mes- ‘mo uma espécie de homem no poder posto que conquista uma parte do poder central do qual dispdem todas as hegemonias, © poder de vida ¢ de morte sobre os outros. Assim, 0 médico vem ocupar um lugar intermediério: por um lado, partidario “absoluto” da vida; por outro, associado do poder das hege- ‘monias sobre a vida, Af esté preparada a cena para entrada do cinismo médico (SLOTERDUIK, 1987, p. 335-337), Considerando que na relagdo entre os papéis de médico e de paciente todo 7) oferece trés respostas: 1. A alianga que se estabelece entre o médico e as tendéncias natu- rais da vida a se auto-integrar ¢ a se defender contra a degeneragdo parcial ou total. A vontade de viver ¢ os recursos da arte médica sto os principais ingredientes desta alianga, que qualificam ainda mais o papel do médico como “salvador”. O poder do médico prova sua legitimidade e se confirma pela eficdcia das sugestdes vitais e das medidas praticas que toma para salvar © corpo da degeneragao da doenga, da velhice ou da morte. Em diferentes civilizagdes este “salvador” era revereneiado e remunerado distintamente. Na antiga China, por exemplo, regularmente enaltecido e pago por manter a satide, ¢ aviltado ¢ descreditado na doenga ou na morte, Neste modo, “salvador” esté integrado e sob o controle da comunidade, que de- tém o poder sob seu papel e seu servigo, Mas outras sociedades, em particular as modemas, optaram pelo “salvador” auténomo, chama- do quando da necessidade de seu papel, e que, assim, se subtrai ao controle comunitirio, inclusive definindo sua propria remuneragdo. 2. As dividas invadem o paciente nos casos mais graves de dege- nerago. A vontade de viver, agente importante de toda cura esté ameagada e carente ao extremo, Ha a necessidade imperativa de uum aliado euja conspiragdo incondicional com a vida The inspire valimento & dado ao corpo, saudével ou nio, vivo ou morto, de onde se da o poder medical? Sloterdijk (1987, p. 3 Ekstasis: revista de hermenéutica e fenomenologia V5 1N2Z 2016] 130 ‘Actise da medicina no mperiaismo do corpo 115-135 DrMurilaCardoso | Dndo.Joio Cardoso de Castro us de Castro(ure confianga. Deste modo, 0 paciente projeta as forgas de auto-cura de seu corpo no médico, que saberia eleviclas e fortificd-las, su- prindo sua deficiéncia corporal. paciente que confia e se entrega ao médico perfaz o papel dos antigos pacientes dos iatromantis, entregando-se de corpo ¢ alma aquele que, por seus poderes magi- cos e da palavra, alcangavam a cura. sim que ainda hoje em dia os médicos retiram de tais mecanismos psicolégicos seu estatuto magico. Sloterdijk (1987, p. 338), no entanto, afirma o distancia- mento entre o antigo iatromantis e 0 tecnocrata cinico do corpo, que se tomou o médico atualmente. 3. E sobre o corpo do monarca que o poder do médico alcangou seu pico. Quando o rei adovcia, © médico reinava de fato por um tempo sobre 0 “corpo do poder”, ¢ elevava-o a0 nivel da medici- na dos mestres (do grego arch-iatros, o primeiro médico). Quem cura os poderosos se tomna detentor central do poder, o que ainda se constata nas tribos onde o feiticeiro divide o poder com o lider. Este curandeiro, conjurador, vai com o passar dos tempos se tornar © “doutor”, o conjurador erudito das doengas desde o século XV. A medicina em seu “doutorado” vai entio se interessar mais pelas doengas do que pelos doentes, Na aurora da ciéncia modemna, no século XVI, é mais importante o conhecimento cientifico que do- ravante se prenuncia fundamentada na relago sujeito-objeto carte- siana e na matematizagdo da natureza galileana, segundo a metafi- sica da modernidade, a representagao, A medicina se desenvolve na Modemidade em um universo de patologia e de terapia. “corpo vivo” sob qualquer forma que seja, como padro de forma de vida adotado pela medicina, impede mais e mais os médicos de ser atentos, a satide. Destrdi o enraizamento do ser-af daquele que cura e daquele que curado em sua experiéneia comum de ser em um realismo que diz sim a vida promulgada pela medicina e que desafia 2 morte do corpo do outro. Assim, 0 médico é cada vez mais poderoso no papel do moderno tecnocrata do corpo doente, porém cada vez mais cinico no papel de terapeuta (gr. therapeutes = servidor, cuidador, cultivador da iatrica, da arte de curar). © atual poder medical, sob a regéncia de uma feoria embasada na ciéncia modema e seus pressupostos, e assentado na intensificagdo do uso de tecnolo- gias e seu consequente determinismo, na arte e pritica médicas, esta perfeita- mente apto a vir a se orientar por um cinismo, O distanciamento sujeito-objeto, Ekstasis: revista de hermenéutica e fenomenologia V5 1N2Z 2016] 131 ‘Actise da medicina no mperiaismo do corpo 115-135 DrMurlo Cardoso de Castro ura] Dido Jodo Cardoso de Castro(ure) que a ciéncia determina em seu método, imposto na relagdo médico-paciente, assegura ainda mais este cinismo médico insidioso nesta relago que ndo po- deria deixar de ser essencialmente humana, mas que se faz degenerada sob a forma “Eu-Isso”, tio bem caracterizada por Martin Buber (2009). © Eu da palavra-principio Eu-Isso, o Eu, portanto, com qual nenhum Tu esté face-a-face presente em pessoa, mas & cercado por uma multiplicidade de “contetides”, tem s6 pas- sado e, de forma alguma, presente, Em outras palavras, na medida em que o homem se satisfaz com as coisas que expe- riencia ¢ utiliza, e privado de presenga. Ele sé tem diante de si objetos, e estes sio fatos do passado (BUBER, 2009, p. 14), vive no passado e seu instante A medida que a relagao se faz cada vez mais assimétrica, portanto mais inu- mana, mais desigual se toma este encontro entre dois seres humanos, pois isto nio se passa somente na relago médico-paciente. O trago de unido nesta relaga assimétrica, que se impSe como do tipo “Eu-Isso”, ganha mais e mais carter sujeito-objeto, médico sujeito e corpo-doente objeto; mais e mais densidade tec- nolégica se introduz em seu “trago de unido”; mais e mais “inautenticidade” do ai-ser (Da-sein) ¢ de ambas as partes; mais ¢ mais “objetificagao” da doenga em sie seu repertério de indicadores dados por exames laborato! predomfnio da imagem de mundo da metafisica da modemnidade, a “representa gio” (HEIDEGGER, 2002, p. 114), o “quadro clinico” de um corpo-doente. is; mais e mais Deixar ficar este ente - assim-e-assim-como-Dasein em seu ser= -assim s6 6 possivel desistindo-se do projeto do ente (no caso do homem) como ser-vivo dotado de azo, como sujeito na relagZo sujeito-objeto, como ser vivo auto-producente (Marx) se, antes de tudo, 0 projeto do ser-homem como Da-sein for realizado e mantido constantemente - apenas & luz deste pro- Jjeto 0 ente (homem) pode ser examinado conforme o Dasein. Exige-se do pesquisador justamente isto, o mais dificil, a passagem do projeto do homem como ente vivo dotado de razdo para ser-homem como Dasein. Assim, ¢ absolutamente equivocado que o caminho para o tema do médico pesquisa- dor poss (homem) & luz do Da-sein & extremamente dificil ¢ ins6lito, no somente para o cientista de hoje, mas também para aque- ser “extremamente simples”. O deixar-ser do ente Ekstasis revista de hermenéutica e fenomenologia V5 1N2 [2016] 132 ‘Actise da medicina no mperiaismo do corpo 115-135 Dr Murlo Cardoso de Castro urs Dido Jodo Cardoso de Castro(ure le que esté familiarizado com o projeto do Da-sein, devendo ser constantemente examinado de novo. O “deixar” [Lassen], isto &, aceitar [Ziulassen] o ente, assim como ele se mostra, 86 se tomar um deixar-ser apropriado se este ser, o Da-scin, ficar antes e constantemente a vista; isto é quando 0 proprio pesquisador tiver experienciado e experienciar-se a si mesmo como Da-sein, como ek-sistente e determinar-se toda a reali- dade humana a partir dai. O climinar e afastar representagdes inadequadas sobre este ente, o homem, s6 & possivel se 0 tr no da experiéneia de ser homem como Da-scin tiver tido éxi- to e iluminar toda @ pesquisa do ser humano sadio e doente. © deixar-ser imediato do ente 6 & possivel se, e na medida em que, antes © sempre for mediado, isto é, possibilitado & permitido pela comsc-para-execusio simultinea do projeto do ser-homem no sentido do Da-sein, Mas © quanto isso & dificil esta sendo provado ha décadas pela interpretagdo equi- vocada do ser-no-mundo como uma ocorréneia do ente huma- no no meio do ente restante em sua totalidade, do “mundo” (HEIDEGGER, 2001, pg. 235-236), © cinismo vai, entdo, incidir na conformago de um quadro de encontro “médico-paciente” totalmente impessoal e tecnocientifico, onde o médico ain- da tem a certeza de que do lado do “Isso”, do corpo-doente, ha “algo vivo” com 0 qual pode estabelecer uma alianga com as tendéncias naturais da vida manifesta no corpo, a se auto-integrarem e a se defenderem da dor. © poder medical prova sua legitimidade, mantendo a relagio Eu-Isso, e se confirmando pela eficdcia das sugestdes vitais e medidas praticas que toma para curar (medi« camento, intervencio, dietética). ‘A “vontade de poder”, aqui demonstrada, se evidencia exatamente como a caracteriza Heidegger (2007, p. 6): “designagdo do que perfaz.o cariter fundamen- tal de todo ente”. A vontade de poder ¢ o que vigora na relagdo médico-paciente, enquanto palavras-principio “Eu-Isso”, e “denomina o cardter fundamental do ente”, neste caso, o corpo-doente. A teoria médica, de fundamento tecnocientifico, orienta a arte e pritica médicas, a se distanciar de uma relagio Eu-Tu, reduzindo Tua Isso, ¢ finalmente, Isso em diregdo ao corpo-doente. A vontade de poder per- faz assim o carter fundamental do “corpo-doente”, doravante o ente objetificado, A expresso “vontade de poder” denomina o carter fundamental deste ente; “todo ente que é, na medida em que é, &: vontade de poder. Com isso enuncia-se 0 cardter do ente como ente”, (HEIDEGGER, 2007, p.19) Ekstasis revista de hermenéutica e fenomenologia V5 1N2 [2016] 133 ‘Actise da medicina no mperiaismo do corpo 115-135 DrMurilaCardoso | Dndo.Joio Cardoso de Castro us de Castro(ure Conclusio A crise da medicina é fruto de uma opgaio equivocada, diante da cisio na unidade de visio do que é 0 humano; uma ciséo no que é que se contempla como ser humano, O momento cartesiano agravou um esquecimento do ser que se prenunciava no pensamento grego antigo, tomando-o, entdo, o que Heideg- ger denominou o abandono do ser. Na voga da ciéneia moderna, errou o médico ao decidir por olhar o humano como seu corpo, como sendo esta a identidade do humano. Este olhar equivocado reduziu seu encontro com o paciente ¢ a doenga, na clareira do ser, no compartilhamento dessa experiéncia a trés. Desta condigdo surgiu um cinismo iluminado cercado de ciéncia e tecnologia, porém exilado desse En humano, que procura fragilizado por algum distirbio corporal, mesmo de ori- gem mental, Sugerimos Martin Buber, em scu exame dos tipos de relagdes Eu- -Tu ¢ Eu-lsso, como uma possivel reflexiio que nos recupere do abandono do ser € do imperialismo do corpo nas relagdes humanas, em especial na relagdo médico-paciente. er. dria uma nova relagdo do profissional de satide com 0 outro ser Entendemos nossa indicago da notivel reflexdo de Martin Buber em “Eu Tu”, como um primeiro passo acessivel nossa mente ainda submissa 4 Raziio ‘Moderna, 4 metafisica da modemidade, a representago. A representago do que temos em uma relagio, ainda que sob o paradigma sujeito-objeto, pode ser clevada pela atengo ao que a rege: Eu-Tu ou EuIsso, Ainda estamos aquém da justa visio proposta por Heidegger, do ser-ai, do ser humano, que nos guiou ao longo deste ensaio, Entretanto, escalamos um degrau em sua dirego, nos abrin- do pela reflexdo proposta por Buber, para a possibilidade de admitir a grandeza do ser-com (Mitsein) ¢ do co-ser-ai (Mitdasein). Ekstasis: revista de hermenéutica e fenomenologia V5 1N2Z 2016] 134 Recebido em: 24.09.2016 Aprovado em: 14.03.2017 ARJAKOVSKY, P; FEDIER, F; FRANCE-LANORD, H. Le dictionnaire Martin Heidegger. Paris: Cerf, 2013 BUBER, M. Ew e tu. Sao Paulo: Centauro Editora, 2009. CARON, M. Heidegger Ja subjectivité. Paris: CEI Pensée de l'étre et origine de F, 2005, GADAMER, H-G. Philosophie de la santé. Paris: Grasset-Mollat, 1998, HEIDEGGER, M. Que é uma coisa?. Lisboa: Edigdes 70, 1992. Heraclito. 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