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sae | | | O HOMEM PERANTE O INFINITO 1 eigfin, julho de 1956 2° edigho, janeiro de 1958 OBRAS DO AUTOR 82 edig&o, Janeiro de 1960 = *Filogotia ¢ Cosmovisio"™ — 4 ed. ~- "glen € Dialéetiea” — 4° ed. = “Psicologia” — 4.0 ed == “Teoria do Conbceinenta” — (Gnosiclogia © Critdrilogia) — 8 ed, — *Ontologia © Cosmologin” — (Aw Giéncias do Ser e do Cosmos) — 2M ed, q "0 Home que foi um Campo de Batatha” — (Prélogo de “Vontade de Poténeia”, de Nictzsche") — Hsgotada. — "Curso de Oratéria ¢ Retéviea” — 78 ed. "0 Homem que Nasceu Péstumo” — 2 vols, — 24 ed. — "Assim Falava Zaratustra” — (Texto de Nietrsche, com ands sim Sia) — 2 i "réenen do Discurso Moderno" —~ 42 ot. ‘ +894 Estings Falun..." —- (Com 0 paudnine de Dan Andorsn) ADVERTANCIA 0 LEITOR t = Bagstala = "Realiede do Home” — (Com paounino de Dan Andores) — Sen divi, yore a Hlowfio, 9 vocabuléis & de ; Engotala. imazina importiciae,sbretud, 0 eam einotico 3 = "Andlive Dinléston do Marninmo” — Bagotada tte comporictn don termes Camo, na ertografia tual a —Gtteo de Inegragto Petal” =~ 8 el Sto dpononas certs canantes, muda, entretanto, na tratado de Beonoala” — (o. mimeografada) — Bogotada iinpuagem de hoje, nin an eonserenmon apenas quando ~ SArletitees e an Mutagies" — (Reexposgio analitcodigétien do tox contribu pars ejonta dimos que facliton 2 melhor to aritetic, nompanhada da een aoe male famouse eonantaris Smpreente da formapio hstnien do tr exeregedo, toy a ale ‘apenas quando julgamns comvenionto ehamer a atencdo do Teter pore éles. Facemos esta obseronnto abmente ava evitar a eatranhers gue posea rausar a eonservagso ie tal graf “Fiona da Crise” — 92 6 v — "Tratado de Simbéliea" — 2 ed. 10 Hlomem perane 0 TnGiito” — (Tenaga) — 2° = selon Gera” — 20 . 5 — -iwnia Coeceta” — 2 von, — 28 0 MARIO FERREIRA DOS SANTOS — “Sociologia Fundamental © Rtiea Fundamental” —~ 2.9 ed. = sprites de Onna” — 29 — shshim Deve Palon soy omens” — 28 0, “Pitdgoras @ o Tema do Numero”. — "Filosofia Conereta dos Valéres". — “Bsentat em Silencio”. = “A Verdade 0 0 Simbolo”. ‘A Arte e a Vida". — “Vida nfo & Argumento” — 2% ed, ‘Certag Subtilesas Humanas” — 2 ~ "A Luta dos Contrézios” — 2° ed, “Filorofias da Afirmagio e da, Negagdo. fetieas” — 2 vols “ Mint Léigicns © Di TODOS OS DIREITOS RESERVADOS ie! A SAIR "Epeielopédia do Saber” —~ 8 vols “Diciondrio de Filosofia ¢ Ciéacias Afina” — 5 vols "Os Versos Aureos de Pitégoras ‘Tratado de Estética™. “Tralado de Esqueroatologia ‘Teovia Geral das Tensves' Filosofia ¢ Histria da Cultura” “Tratado Decudlaléetico de Economia’ “Temética ¢ Problemdtiea das Ciencias Soeiais “As Trie Critiens de Kant “Hegel e Diuletien’ “Dieionério de Simbolos © Sinale™ “Obras Completas de Plato" — eomentadas — 12 vols. “Obras Completas de Aristételes” — comentadas — 10 vos. TRADUGORS ‘Vontade de Potineia” — de Nietasehe Alden do Bem e do Mal” — do Nietasche “Aurora” — de Nietziche, Diério fntimo” —~ de Amie. Saudagio a0 Mundo” — de Walt: Whitman, Art art Art art Pema fot An, Art TEMA Art ‘Art TEMA At Art, Ar Art Art Art Are Art INDICE 1 == Objeeto da Peologtn n 2 — Justifieagho da Teaiogin u 8 — Novos angumentos em favor da justifiengio da Teologia 4 = Teisma © Deismo a 4 1 — A oigem da Relig ue 2 — As teorias evolucionistas stbre a origem da Relisido 7 2 — Fundo Céamico da Religie 2 m 1 nosio conhecimenta de Deus 2 — A experitnels natural de Deus 1 1 — Da esistineia de Dear ‘a 2-— Argumento ontolégico da exieténeia de Des: a 8 — Objeegies ao argumenta de Santo Ansele fe 5-— Anflise da critiea ao argumento anselmiaio a 5 — As provas idenligiens me 5 — As provas a pusteriori. AS cinco vies do Torts ae Aquino 1 — A primeira via: 4 via do movimento © suas objet § — A segunda via: a subordinagia das causas eficia tes — Objeccies 9 — A tevocira vias da contingéneia dos séze 10 — A quarta vin: of graus da Pevfeighe 11 — A quinta via: finslidade 32 — As provas paleoligieas 19 — Das provas peieolégicas — A prova eudemonolérien 14 Ting provas moraie da existéncio de Deu. 1B. Ax provas se Dus Seat . 1 ~ Da natures de Deus Art. 2 ~ 0a atributor metavisicas de Deus 2 4 Art, Do atributo metafiicn da perfeigho e da bendade Art 4 — De atributo metafisico da ifinidade Ark §— Do steibuto metafisen da inessidade © dab oidade Act. 6 — Dog atributos morais de Devs Art, T= Da vide e da vontade de Dens Ar, 8 — Dia predestinacio © da reprebagao va 2 — Da eviapio em eral 2-0 probiewa do mal imgratia eltada 60 2 aaa 234 255 TEMA 1 ARTIGO 1 ORJECTO DA THOLOGIA Bim face dos grandes enigmas do universo, hi uma série de perguntas, cujas respostas veferentes apenas a imanente mio satisfazem a0 homer, Na "Noologia”, temos oportunidade de analisar as valora- cgées humsnas em suas fases mais primérias. O3 valores de- Tmoniacos, 0% que elo propriamente adversos ao homet, exe! tam-no a realizar préticas religiosas, rituais, ete., no intuito de aplacé-les, diminui-los ou deavid-los, Quer veneer ou apla~ ear 9 que The ¢ prejudicial, contvério, antagonica, B se 0 hhomem, mal amparado em sua fraqueza, reverenciow a fOreas do Mal, fazia-o na conviegéo de poder deti-las a0 desvid-la Mas o espetiieuto do mundo, por mais pessimista que surja A nossa visto, nfo € apenas um apontar para yalGres opositivos. HA no existir, no contérno que cerea a vida humana, uma boleza que esplonde ma natureza, uma alegria que anima ox peitos huimanos, 0 advento de factos que oferecem satistacde: © deixam a meméria de ums agradabilidade que nos leva a de- sejar aumentar 0 bem do mundo, pata o préprio bem humano. No mundo, hit mal e bem. O bem é positive © o mal tam: bem 0 é; éste 6 um pensamento primério da humanidade. Reconhece-se a existéntia do mal ao qual 0 bem se op6o; 0 dualismo do bem e do mal proclama a positividade de ambos embora oposta, de vectores diferentes. A esta fase, sobrevém 4 da valorizagio do bem, em que, a pouco e poueo, 6 nexada 4 positividade do mal, que passa a'ser apenas privagio do ber para finalmente desembocar na aceitacio de que bem ¢ mal sid ositividades valorativas, valores do existir, afirmando a po- Sitividarle do Bem, que s@ converte no Ser. Neste caso, estamos em face do bem como ama afirmagio ie si mesmo, sem necessidade de seu oposta para afirmar-se; 1» Rem como’ perfeigzo, que, como o Ser, enquanto ser, & acto puro, dispensa os opostos para a sua afirmagao, Estamoy aqui cm face da idéia do infinite, que oportuna- monte examiniremos. 12 MARIO FERREIRA DOS SANTOS 0 estudo dessas fases, sobretudo da dltima, eabe, em parte, a Teologia fazer : Mas estariamos delimitando 0 objecto da Teologia a um sentido muito restrito, e sobretudo ineompleto, se disséssemos que apenas 6 éste o seu objecto. Antes de esclarecermos devidamente como iremos estudar a Teologia nesta Eneiclopédia, impde-se que estracturemos pre yiamente o esquema desta disciplina, para que nossa posigdo fique desde logo claramente dehineada Na “Cosmologia”, vimos como a explieaglo da matéria da vida e do nosso espirlto torna-se incompreensivel se procura- mos reduzir 0 superior ao inferior, como tantas vézes foi tentado. Sabemos, através do estudo da historia do pensamento hhumano, que, desde as mais primitivas sociedades, tem o ho- mem procurado responder as intorrogagiex que naturalmente surgem, sobretndo aguelas que exizem respostas sobre a ordem césmica, sobre 0 pordué da existéneia, sdbre a origem de thdas as coisas, E desde as mais primitivas sociedades humanas, as respostas enderegaram-se sempre A afirmagio de um ser supericr, organizador déste cosmos, E julgam ainda todas as religides’ que saber dessa entidade ot entidades nfo é um saber inventado pelo homem, mas que Ihe foi dade, que Ihe foi revelado. Portanto, © eonjunto das respostas no traz a ‘marca humana da falibilidade, mas, sim, a marea da infalibili- dade que Ihe do Ser Superior. Fundam-se, assim, todas as religides em revelagoes, e aceitam a sua veracldade. A palavra Teologia tem sua origem no térmo grego Theos, Deus, e, Logor, diseurso, tratado, Btimoldgicamente, Teologia 0 Tratado de Deus, ou a diseiplina que trata da divindade. 0 térmo Teodiecia vem do mesmo étimo © de diké ou dilsaia Custiga ow justificagio, ot defesa), Nesto caso, é a Teodiegia a doutrina da justifieagao de Deus Este ultimo nome se deve a Leibnitz, que 9 eunhou em sua obra "Besuis de la Théodiede sur la bonté de Dien, ta ti berté de Phomme et Corigine du mal”, editada em 1710, no intuito de, respondendo a Pedro Bayle, justificar o mal, que Esempre 6 argumento preterido ¢ realmente poderoso de todos os adversirios da existOneia de Deu Neste caso, @ Teologia seria a ciéneia de Deus, enquant Deus; a Teodicéia seria a de Deus, enquanto eausa primeira de todos os seres autor da nossa natureza, Mas tais emun~ ciados silo ainda parcos se auisermos oferecé-los como os que fesquemiticamente melhor so referem a diseiplina de tal im- portiinein 0 HOMEM PERANTE 0 INFINITO B A Toologia, tomada em seu sentido geral, interessar-se-ia, nfo 86 pelo estudo da divindade enquanto tal, mas também, pelos seus mistérios, os mistérios de sua vida intima, de suas relagées com 0 Cosmos, e, finalmente, a prova da sua existénci A Teologia cabe ainda justifiear se, como discipline fil aéfiea, tom ela ou nfo procedéncia, ¢ sea existéncia de Dews 6 algo que se pode atirmar ou negar, © por quais meios. Gabe assim & Teologia estudar no 86 2 posi¢ao teisia eomo a ateista, Cabe-lhe reunir as provas da existéneia de Deus, como os argumentos que Ihe sic contrérios. Mas todo ésse trabalho imenso néo pode deixar de fundar-se num método, qual deve, por saa vez, ser justifieado, Como a Teologia se apresenta com varios nomes que a especitieam, no poderiamos prosseguir em nosso estudo sobre tal diseiplina, sem que préviamente a justificassemos. E com sce intuit, alinharemos as razdes pro ¢ contra a sue justifi- cago, Bo que faremos no artigo seguinte. TEMA I ARTIGO 2 JUSTIFICAGAO DA TEOLOGIA Partamos de um ponto de vista antiteolégico, como & 0 ateista, para apés reunir as justificagoes apresentadas pelos que se colocam do ponto de vista teista. Os nomes aieu e ateista tém sido usados na filosofia para classificar os que nfo admitem a existéneia de uma divindade, ‘Nao hi dfvida que tais palavras tom sido usadas em sentido muito particular @ até pejorative, sobretndo nos periodos em que a 2é € predominante. 0 {érmo ateu pronunciado por um cerente, tem sempre um sentido ofensive, M4, porém, alguns que a nsam como um titulo de gloria. Noutras ocasiées, tem @ste térmo servido para infamar todos quantos nflo accitam uma determinada posi¢io religiosa, ou se abstém de tomar par- te om certas prdticas, sem serem, na verdade, ateus, Dever-se-ia empregar tal tOrmo apenas aos ateus mili tes, isto 6, Aqueles que empreendem uma luta contra toda idé ita. Costuma-se dizer que ateista 6 aquéle que néo admite a existéncia de Deus, Mas, convém distinguir as diversas mo- dalidades que apresenta o ateismo, ypossivel qualquer espe- ceulagio em tomo da existéneia ou no de Deus (os agnésticas, por exemplo). Para eles, a existéneia on nfo de Deus ¢ algo {que no se pode postular, porque nos faltam os meios suficien- 4es para um eonhecimento seguro ») Outros, porém, postulam a no existéneia de Deus, & sin étes considerados verdadeiros ateistas, como 0 fol, por exemplo, Cabanis, em certa fase de sua vida, quando exclamou, no Instituto de Pranes, estas palavras: “Suro que néo ha Deus! E pego que eeu nome nfo soja mais pronunelado neste recinto”. Diderot propunha uma distinggo entre as ateus, © divi- ia-og em Urs classes: 12 — Os quo negam terminantemente a exi Deus (verdadeiros ateus) © — Os que nada sabem ou podem afirmar sobre Deus (os expt cia de © HOMEM PERANTE © INFINITO 6 que procedem como se néo admitissem a sua ‘io os “fanfarrées de partido”, como os chamava iderot, © qual os desprezava, “Detesto os fanfarrées: éles so falsos; deploro os verdadeiros ateus: toda consolagio me Darece morta para dles; @ pego luz para os eétior: faltatnes ‘Verdadeiros ateus no sio nem os ateistas pritticos (os que vivem como se Deus nfo existisse), nem os eéticos, mas apenas 0s que afirmam a inexisténcia de Deus, isto 6 que con- sideram que sabem que Deus ndo existe, Sio éates ditimos em mrimero menor, No século pasado, e neste, muitos cientistas se proclamaram decididamente ateus, como Le Dantee. Outros, porém, nao o faziam til elaramente, como Laplace, que digia, no perguntar-Ihe Napoledo, porque nfo inserevera em sua obra o nome de Deus: “Nao tive neces- sidade dessa hipstese”. Afirma 0 atelsmo nfo s6 a desnecessidade da idéia de Deus, como, por tomar uma posigao condicionalista, julga que hi cabal explicagdo de todos os factos dentro apenas da con- Gicionalidade dos mesmos. Ne verdade, a actual situacdo da ciéneia, muito diferente da que parecia prometer a do séeulo XIX, ndo oferece a segu- ranga de que os atefstas estavam possuldos. B hoje, outra ver, vemos surgir, na maioria dos eientistas, a crenea numa divindade, necessdria para a compreensio do cosmos. As razdes que cabem sos ateistas, teremos oportunidade de vé-las quando examinarmos as teses’ da existéncia ¢ da ine- xisténcia de Deus, Nessa acasifio, nfo deixaremos de expor fas raaSes de todos com a maior clareza ¢ o maior respeite. Bm face, portanto, da Toologia, os ateistas s6 podem to- mar uma posigio: negar a justifieaglo de tal diseiplina, pois seu objecto & para éles, naturalmente ficticio. Conseatientemente, uma ‘Teologia ateista 6 impossivel de levar-se avante, porque estabelece, de infelo, a nadifieacko do objeto. A’ iniea posiedio eabivel ante a ‘Teologia, por p: te de um atefsta, seria estudala apenas como um repositério do pensamento humano sébre a idéia de Deus, justificando-a apenas neste sentido histérieo, mas partindo, ab initio, da ab- soluta falta de base de tal idéia, Instifiengio teista da Teologia no entanto, totalmente diferente a posielio do tefsta te procura justiflear a procedéneia desta diseiplina, e a eon sidera, milo npenas uma deserigho histériea ou temétiea das 16 MAMIO FERREIRA pos SANTOS estudos teolégicos, mas como uma disciplina arquiteténica de todo o saber humano sdbre a Divindade. Poderiamos simaplificar a justificaggo teolégica, com a sintese do que expe Tomas de Aquino, com tanta clareza e precisto. Partindo do principio da imprescindibilidade de um ser necessirio, o Ser, ao menos a existéneia déste se impfe neces siriamente, pois 'o que é necessdrio, existe. Se 0 abjecto da Teologia necessério, a Teologia & auto- miticamente necesséria. a Teologia em Teolngia natwral ou Teodicéia, « qual considera a Deus pelas fércas da razo humana, eoghosefvel através das coisas eriadas e sensiveis, em suma, ¢ conheeimento da causa pelos efeitos, Deus 6 assi cogndscivel por meio natural, pelas coisas waturais (meio ob- Jeetivo), pela luz natural da raziio (meio subjective) E chamam Teologia eagrada a que nos oferece um melo sagrado para conhecer a Deus, que é a divina revelacéo (di ving revelatio). Nao se encontra Deus através das coisas, mas sim, pela sua manifesta Como j4 vimos, todas as grandes religiGes afirmem ‘Teologia sagrada, ¢ colocam-na acima da ‘Teologia natural. ‘Sao as verdades divinas transcendentes capacidade hu- mana de conhecer? Ulurapassum elus os mefos muturals de que dispde © ho mem, eabendo-lhe apenas confiar na revelacao? Ou dispde o homem de meios suficientes para sleancar a verdade divina? A posigho eseolistica afirma que a verdade divina & alean gavel apenas por via de revelagao, Nao quer eom isso exeluiz 48 poasibilidades que ® rezio oferece, mas ests, neste sector jenos, trabalha mals @ posteriori. Bla busea uma justi- ‘racional do que ¢ dade ao homem. Portanto, a verdade religiosa encontra na razdo um sustenticulo, mas é suficiente uma £6 Mas seria um @rro dai concluir-se que a Teologia fieasse subordinada & £6, A. 16, sezundo o pensamento eseolastico, term dois olemen- tos: um objective, 0 objecto que se cre, as verdades, formal e explieitamente teveladas, e um subjeetivo, que decorre do assentimento da mente aos mistérios da 1é (Toms de Aquino). As verdades veveladas encerram muitas outras que nelas esto reveludas de um modo virtual ¢ implieito. Pode o erente accitar a £6, pela graca divina, mas a demonstragao da credi- hilidade da £66 algo obtide pelo estude teol6gieo, poraue, pela © HOMEM PERANTE 0 INFINITO Ww ria, éle compreende, de alguma maneira, os mistérios pro wstos, usando os métodos que a ontologia oferece, analisando Sng@es, comparando analogias com as verdades materiais, relucfonando-as 20s mistérios, justificando opiniées e crengas, e defendendo, inclusive, as afirmativas que compdem 0 contexts dls sua erenca (como se da com a Apologética) 0 objecto de tda ciéneia é triplo: material, formal termi- nativo © format motivo, E material todo aquéle que eabe & ciéncia que estuda ox objectos materiais. O objecto material da visio ¢ tudo quanto 1 visio pode ver: coisas, homens, etc. © objecto formal ternvinativo & a formalidade ou perfei- «ilo que 6 considerada e estudada pela ciéncia, como a cor, que ©o objecto formal da visio © objecto formal motivo & o instrumento, 0 meio pelo qual ma ciéncia considera seu objecto formal ‘terminativo. No 39 da visio é a luz 0 objecto material pode pertencer a viirias ciéneias. Tam- dim eféneias distintas podem ter um mesmo objecto formal terminativo. (Por exemplo, a redondez da Terra pode ser ex- plicada pela Fisica pela Astronomia) Mas 0 objecto formal motivo ¢ exelusivo da ciéncia deter minada; do contrario, duas ciéneias, que tivessem o mesmo objecto formal motivo, deixariam de ser duas para fandirem-se Fi fase ohjectn que a eamnetarinn ea especition Rim suma* é um objecto formal terminativo, afectado ou modificado pelo formal motive, sendo éste o que di a Gltima determinagio ao objecto, sob a’ razio formal de objecto, ¢, conseaiientemente, Rciénela (Ramirez). A Teologia para os escoldsticos tem: — como objecto material: Deus (1) } — como objecto formal terminativo, segundo Tomas de Aquino, é Deus sob a razio propria ¢ intima da Divin- dade, Beus enquanto Deus, com os atributos que The sho préprios e exclusives, cognaseivels apenas pela re- velagéo; como objeeto formal motivo: a divina revelagio. Desta forma, o objecto formal da 16 é a revelacdo formal © explicita, mas o da Teologia 6 a revelagio virtual, vista sob vx lozes naturais da razio humana. (1) Doms Seot die que a Teologia se dlstingue de tdas ax otras inweiae paras © seu objecto & singular (wubiectum illiue ext sinpware). How rons of sonia utes « ojocte teaterit a Tenlaga 8 MARIO PERREIRA DOS SANTOS Chama-se de revelacio virtual, a continéneia virtual ow implicita de uma verdade em outra, formal ¢ explicitamente revelada. Poder-se-ia ainda dizer que se deve distinguir a £6 da Teo logis. Muitos tém a 6, ¢ nde tém aquela. Uma coisa ¢ sabe 0 que se erd e outra por que se cr. © objecto da 16 & 0 que nfo vemos. (Files est de non visis). A Teologia estuda, investiga, diseute, Pode dizer-se, como em Tomas de Aquino: “de Deo scire non passumas quid sit” (mio podemos saber 9 que Deus é), mas 4 Teologia Investiga, Pode a vida intima de Deus ser um mistério inaleangavel, Mas Portanto, a Teologin tem seo objecto: o de procurar saber © que Deus & como € 0 cou hdbito, como se diz na eseo- Vastien, A vida intima ¢ resdndita de Deus 6 um objecto, portan- to, formal terminativo da Teologia. ‘A sagrada Teologia ¢ uma impressio, sigilagao ou par- ticipagio da ciéneia divina, no homem”. Desta forma, a Teo logia sagrada e a Teologia natural so ambas especulativas, universalissimas, e tem o mesmo objecto: Deus em sua vida intima ¢ seeretissima, Na Metafisica, a Ontologia estuda o ser enquanto ser, Na Teologia natural, parte-se das eriaturas para aleangar a Deus, Na Teologia sagrada, parte-se de Deus para explicar fas criaturas, A Teologia natural parte de baixo para cima; a sagrada, de cima para baixo, A primeiza parte dos efeitos para alean- car as causas; 2 segunda, das causas para explicar os efeitos Por essas razdes, coneluem ox escolisticos que a Teolosia natural 6 inferior i 'sagrada, e seu eonhecimento tem de ser Forgosamonte limitado, parcial, inadequado ¢ imperfeito. Portanto, uma verdade deve partir de cima. A Teolozia natural, se Ihe faltar a f€ divina, néo dar ao homem send uma pureza puramente humana e subjectiva, insufieiente, # a Teologia wma ciéncia? Argumentam muitos contra a Teologia que, fundando-se ln em prineipios nao-ovidentes, em mistérias, no ume cién- cia, pois The falta a evidéncia, earacteristica que Aristételes atributra s téda cifnein, Explicam os eseoldsticos, que € a Teologia uma ciénefa aubalterna; # Teologia #6 ofereco a evidéneia da conclusio, da 0 Hom MM PERANTE 0 INFINITO Wy uunferéneia ou ilagéo, do nexo entre 0 prinefpio ¢ a verdade in- frida. A evidencia s6 pode ser dada pela eiéncia divina que tio é revelada. A Teologia Natural dé-nos uma evidéneia da eonelusdo, ¢ nfo do eoneluido, Podemos distinguir as cidncias em fisicas e metafisiens. Nas fisieas, estudam-se as propriedades fisieas, enquanto, nas ulafisicas, as propriedades metafisieas, que’ se distinguem apenas conceitualmente do sujeito ao qual so atribuidas, A ciéncia teolouien & fisiea ou metafisiea? Responde ‘Tomas de Aquino que a Teologia € uma ciéneia eta fisiea. Se a posigio escolistien mantéin para a Teologia a funegao sw nuhordinada i Revelagao, pode o feslogo, independentemen. tesla £6, estabelecor uma Teologia fundada na propria andlie ‘nloligiea.O'ser, corso acto, eomo bem como valor, como subsistente em tods of entes, principio de todos os entes, pode wr extudado eomo fonte e orlgem de tudo, e que em tude se siunifesta ou de tudo se distingue A Teologia encontra na metaffsica sua base, ¢ sem querer eamerecer @ posi¢éo que accita uma Teologia sagrada, fan- dud na vevelagio, pode ela procurar uma justificativa desea mesma revelacio, gecltamos o ser, perguntaremos: @ Deus 0 ser por suinela? fe dle © fpauh ease subsiefows, » proprio. ser see iene? Tal pergunta oferece um aspecto gendinamente ex iwevlative, 8 éle-a norma de nossas acgdes? Tal ‘pergunta ‘lithe tum sentido eminentemente prético, Dessa formar a Venlo € uma cléneia filoséfiea eminentemente especulativa itica, embora mats espeeuiativa que pritica, Colocada a ‘Teologia neste ponto, é ela a suprema das cién- « humanas, pois estuda a sabedoria suprema, a de Deus, 1 isso, os escoldsticos consideram sempre a filosofia eomo viva da Teologia (Ancilla Theologiae). Mas essa servidio, uleyavam, nao a rebsixava; ao contrério, exaltavan cervir a’ Deus reinar”, ARTIGO 3 NOVOS ARGUMENTOS EM FAVOR DA JUSTIFICAGAO DA TEOLOGIA No estagio intelectuat do homem moderno, se nos colocar- os ante as esperancas do séeulo paasado, nila 6 de admirar uige se tivesse manifestado entre os intelectuais um grande de- sinierésse pelos temas teolégicos, O avango que oferecia a cieneia, a promesss, ¢, para muitos, a certeza, de que nos labo: ruldeios seriam resolvidos os grandes problemas da filosofia, em térmos inversos ags da filosofia classica, animava a muitos ‘xpiritos reheldes, como ainda os anima. ‘Mas eféneix, em lia a sua marcha, que aparentemente parecis estar preste: derruir as velhas erengas, prepara, a pouca e pouco, uma hustifiengao desss mesmas crengas, permitindo esperar que siderise entre elena, filosoia e religiio ciminulra até surg hima nova eosmovistie, que a® englobaré num tinieo © grande «her oculto, Ao oxaminar as diversas concepgdes filosétieas, notamos vue Todas, sem exeecao, colocam-nos ante aporias, ante difi- culdades teorétieas insoliveis, dentro do esquematismo da mes: int eoneepeao, No entanto, outra eoncepedo pode resolver esta 14) aguela. aporia, que se encontrava na anterior, mas, por sua vey, propée_novas aporias insohiveis, dentra dos quadros dx tu eoneepedo, B possivel o exame das diversas concepgdes do angulo da aporia, Nesse caso, veremos que as eoneepgdes elissieas, que \" apoiam, com construcdes racionais, nas idéias religiosas, si vs que apresentam menor nlmero de aporins, E no se argu- mente, como 6 comum fazé-lo, que, aceitandd ae religives, ent eval, um Ser Supremo, todo poderoso, tudo passa a ser ficil- mente explieado, porque a aceitacko filoséfiea de um ser todo juteroso realizase através de uma demonstragio sdlidamente iuuiada na filosofia, como se objectivou no pensamento Mental, através désse momento alto do pensamento que foi a evobistica, Nao hi ai ima mera postulaedo sem prova, porque as di- versa crengas religinsas jnstifieam exuberantemente sen por 22 MARIO FERREIRA DOs SANTOS to de vista, como ainda teremos oportunidade de verifiear no decorser déste livro, As concepcées. materialistas, pragmatistas, positivistas, relativistas, ele, que nfo sio propriamente solugies, eoloeam © homem em maior niimero de aporias que as eoneepedes fun- dasdas em crencas religiosas. Aquelas eoncepedes, pritieamen- te, ndo resolver nenhum dos grandes problemas filosoticos, nem os que The sio inerentes. Podemos exemplifiear com 0 mate- Tialismo quo no eonsegue sequer expliear a matéria, caindo, como vulgarmente se vé, na concepedo ultrametafisiea de admi- tira matéria brula a matéria dos sentidos, como a fonte omni- potente de tudo. Gra, 2 propria fisiea moderna, apesar de sen Alto progress, nfo consezue resolver tio maguo problema, que ‘encontra solucées muito mais seguras e efieazes em outras con- eepeies nio-materialistas (1) {A tinica soluglo consiste em atribuir & matéria uma omni- potincia, pois seria cla a fonte de tudo, primeiro prinefpio, o ser. A aceltaeio de um ser primeiro, omnipotente.e prinefpio de tOdas as coisas, é uma consegiiéncia inevitivel de toda and- lise filosstiea que empreenda uma busca séria no campo da ontologi. Mas, accitar que tal ser primeiro seja a matéria brute, a matéria apenas passiva, € um contransenso filosétieo de tal monta, que tal concopcad se exclui automaticamente do campo da filosofia pelo seu primarismo ultrametafisico, pois se funda numa afirmagio que nem 6 experimental, nem Togicamente ve pode comprovar, € ¢ ainda tundamentalmente falsa Ora, as armas, que essrimem a quase totalidade dos ad. rsGirios da Teologin como diseiplina filosética, séo, ynais on menos, as ofereeidas pelo materialismo, ¢ outras doutrinas se- melhantes, que seguers caminhos semelhantes Para Pitégoras, a ciéneia suprema é a Méthesis, de onde vem o térmo matemitien, A Mathesis é a efdncia divina de ‘que os homens podem participar. A filosofia é apenas o afa- (2) Preoeupou-nos sempre a consteueio dessa dlseipling, que & a aporitica, ewjo objecto € 0 estudo da problemiticn filoséfiea ¢ das difi- culdades teorétiess. Colocando-e entre as diteiplinaa filosicas, estamos realleando aigo que dara ainda sexs frutos, como estamos certs que os dark 2 Simbdliea, a Noologia, a Rsquematologia, a Teoria Geral das Ten aes ¢ a Decadialietiea, que propusemes, com seus objectos formais dete ‘minados, como nova diseiplinas que muito viséo eontribuir pars 0 estudo 4a filosofia, © para e solucio de muitos de seus magros problemas © HOMEM PERANTE 0 INFINITO 28 nar-se por “amor ao saber”, a busea da Méthesis, a suprema instrucgéo, o conhecimento supremo, Tal eonhecimente 6 al- cancado pelo homem proporcionalmente & sua eapacidade; por tanto, & proporgio que aumentam seus esquemas de conheci= mento, pode aumentar a assimilaedo correspondente, A sic prema instruccao esta oculta ao Komem comum que dela so participa através dos simbolos religiosos, enjo nexo revela, mas ccrengas populares, e nas religides em geral, uma visio de exté jo primario da causalidade © do nexo do universal acontecer. E isto facilmente verificivel na mentalidade infantil vepete essas fases do conhecimento (1) ame saa Tt 2 css 0% Sveum uta verdad, revel « ver dade, porque esta € 0 ser em si meno, ¢ todo ser, enquatto tal, ¢ Serdadetro, como o Ser Um, fonte © principio de" tonee as coisas, é'a suprema verdade, ‘May caplaos 4 verdad das Ceisas segundo 0 gran que dela participamos, Bdele parts elparmos. na proporgio que podemos Wsvelar os wéas. ce nechmento ¢ 4 mareha através do que se calla ans, cone © fol brilnante de Iz ofusea os nossos olhoo, seul dua le, tninosidade aos olhos do tego. O'cemo pode negara his Pore rio ve- ‘via sua raudo cstara at, “O homem prosane pede hegar os sazratdos mistérion we se ocultam nos sets ioe os mnisterios da mdthenis, que € preciso desvendar, ‘Nise rove: Faro ons coms. Estes esto eogoe's ia Wt “Mfae a poteo.e pouco {e através dos graus da iniciagto), pelo comer Cimento e pela mesltacto, 0/homem aleanea wm whe sala ves rials peofindo, penetra’ na suprema instrcelo&cotheee Simp, sexunde. dx gras adquitidon, ac iso" Cosmos, os Grithmot archi, os mnaeros supreme, a ciéncin do Ser Ui, que é em suma, a Teologia. Um exemplo clartica 0 sentido pitagérieo da mdthon No campo de eansaidade, ee esticarmos tus: genese, Mo 68 como, st manifesta no. pensamento infanci, ‘aus fame, través das diversas erenas poptlares, «até nas obee THlbsofes de Ledos os tempos, verificamos que 4 comprosnoge ta eauselidade upresenta faces misticas, miveiniens de en taoio meramente formal, de explicagto merasente paceloeien tiv explcagao dindmatea, de fnalicade purn de sxteayss fe noménien, de explieagao articialistay e muftas outias: des ‘as revelam cettos graun do eonheetrsenta, © nko aie abo (1) Em nossas obvas de Noologia, toremoe oportunidade de extudar wevenca doa eaquemas infantis wieridos a0 homem moderna, © mam revs quo ultrapassa a expeetativa comum, bem enmo a preserga le tale ‘equemms mz divorsne roneopgies do muda © nay reli 24 MARIO FERREIRA DOS SANTOS tumente falsas. Apantiam algo da verdade das coisas, mas promerelonado ao grau da esquomética do ser que media 6- we @ causa @ 0 efeito. E na andlise dos fildsofos, © até con sagrades, da modernidade, encontramos estas adevéncias sub- Jectivas da esquemétien infantil nas suas idéias, justitiendas com um ardor extraordindrio, que nfo ocultam uma Ingen! dade infantil. A Méthesis, como suprema instrugdo, nao ¢ ainda 0 saber final, supremo ¢ absoluto, no € 0 saber da Teologia Di quo exigiria uma mente intnita, como seria, neste cas0, a men- te de Deus, ‘A mente humana, por ser finits, e a mente de outros séres superiores ao homem, que possam existir, podem aprofundar- -se nesse afanar ao saber, na filosofia, em direcgio a mdthests Suprema, sem jamais aleangi-la em tada a sua plenitade, E verdade que « obra de alguns pitagéricos favorece a admissfio de que a0 homem seja possivel aleanear o estado de plenitude beatifies, que o tornaria apto a contemplar a verda- cle em téda a sua suprema e infinita beleza, como seria o esta- lo de epiphania, que aleangaria 9 epopter, iniciado em grav superior, Mas, Yfundados ainda nos estudos que temos feito fo pitagorismo, ¢ que eportunamente publiearemos, 0, etato le epifania, que é 0 de iluminagio “por todos os lados”, asse- melka-se ao estado beatifieo dos misticoa, que est ainda longe ‘la beatitude, que cabe aos santos nas relisides, ¢ da suprema eatitude de’ Deas (1) De qualquer forma conhecer 6 sempre afirmar um limite, porque o conhecimento jamais se afasta désse cm, que ainda eneontramas no gnoscere, no g, pois eonbecer € assimilar o se- melhante ao semelhante, portanto, todo conhecimento & sempre dual. O conhecimonto 6 da eriatura e é, portanto, em sua l- tima_andlise, dual para o pitagorico de’grau superior. $6 Ser Supremo, o Supremo Um, tem o eonheeimento do Um, que © a fusao do Ser e do Saber, porque néle todos vx opostos se identificam, A Méthesis Divina € o propria Ser da Ser Um, eo saber nao ¢ ali diseursivo, operacional, porque no neces” sita da assimilaeo, da comparagao do semethante ao semethan- te, para eonhecer. Na verdade, no ¢ outro o pensamento dos teélogos esco- lagticos, quanto as possibilidades do conheeimento supremo por parte do homem. Mas, convém ressaltar algumas diferencas (2) A primeiva & a beatitnde imperfeits, elewngdvel pelo homem; segunda, a perfeta, aleangada pelos bem-nventurados 0 HOMEA PERANTE 0 INPINTTO 25 importantes, que faremos préviamente, para depois examinar © pensamento tomista e escotista, no referente a teologia ¢ As verdaies toolégieas Para o pitagorico de gran superior, eujo saber ¢ dontvina ‘do pode ser confundida, nem deve, com 0 pitagorismo de grat ce puraskei?, de grav de aprendiz, que & o freattentemente ex- pesto como sendo o pitayorismo mais elevado “para aaucl, ‘4 na epitania um conhecimento que & intransmissivel 20 ho- mem comuin, pois hé af um tanger espiritual do Ser Supremo, que € verdadeiro na relagio entre 0 homem e Deus, pois tadas as nosgs verdades, por eslasem nessa rela, ndo Sgnifieam que sejam apenas relativas. Na Criteriologia, ao estudarmos a verdade, ¢ up examinar © pensamento escolfistico sdbre o saber do todo, e nfio exaus tivo da eoisa (totum et non totaliter), verifieamos que a0 co- nhecer algo na sua unidade, aleangamos @ verdade som alean- ila totalmente. Ao dizermos que o Ser é, dizemos uma yer- dade, poraue o nada mo é mas nfo esgotamos tds a verdade A Teologia fundamenta-se, assim, numa longa experiéneia ea simbéliea humana, porque todo hosso conhecimento, por participar de uma verdade, por nos dar um simbolo de um sim- bolizado hierarquieamente mais elevado, que, por sua vez, € simbolo de um simbolizado superior, aponts, afinal, ao Grande Simbolizado, que & o Sex, o Um. Cortos fil6sofos, como os agnésticos, pragmatistas, mate- rialistas, ete, por deficiéncia de doutrina, e por nfo poderem ir além dos simbolos, que s4o despojados' de sua significado, negam valor & teologie, Por nao serem eapazes de bem com- preender 0 simbolismo das religiées, acabam por fusionar 9 simbolizado com o simbolo, como procede o fetichista. Em suma, tais doutrinas nfo deixam de ser fetichismo fi- losdtieo, pois considera o simbolo camo sendo o simbolizado, efectuando, déste modo, 2 fustio mais priméria que realiza a inteligéncia humana, Estamos, ai, em face de uma verdadeira aderéneia subjectivo-infantil, presente ainda em adultos, como teremos oportunidade de demonstrar em nossas obras de Nowlogia. Podemos exemplificar com a eritica de Hume & eausalida- de, que niio passa de uma explicagio fenomenista, semelhante a jue encontramos na erianga de seis a sete anos, e que repre- uunut dis frases primsrins do desenvolvimento da eaiue- nates inumstna, 26 MARIO FERREIRA pos SANTOS © homem moderno, metropolitano, j4 0 saliontamos, ca racteriza-se muito bem por sua inaptidks & via symbotiea, que The permanece oculta. Assim, no noivado, usa a allangn’ sem saber claramente 0 seu significado, Quando desoja alguma coisa, toex na madeira som suber a simbéliea désse gesto. No hhomem moderno tals gestos so supersticiosos, pois nai alean- gam ao significado do madeiro, como stmbolo’do Sagrado m&- deiro da Cruz de Cristo, para’ exemplificar. As superstigies homer moderno, tals gostos slio supersticiosos, pois nao alean- rituals de antigas erencas das quais perdeu o’signifiendo sim: bilieo, imerggindo, déste modo, no mais infantil fetichisto. Em “Filosofia Conereta”, soyruindo a linha entolégica, ve- rificamos, depois de longas demonstragées, que ha um ser sti premo, fonte e origem de tas as eoises, pois, do. contvério, eles viriam do mada, Daquele ser tidas @s coisas participam, segundo varias manciras de participar, Desta forma, todas as coisas apontam um eaminho de conhecimento ¢ uma via para o Ser Supremo. Fé 0 métode simbéllco, por n6s exposto em “Tratado de Simbélica”, um dos melhores vefeulos para percorrer essa via mystica, que 6 a penetragio no simbolizado, partindo dos simbolos A Teologia é, assim, uma cifneia que encontra aun plena justificagio. $6 por primarismo filos6fico, se poderia consi- doré-la dispensivel, como procedem alguns pensndores que tio conseguiram veneer a esquemitiea Infanti, aderida ainda ao seu pensamento. Eo mais notavel de tudo isso é que tals es pititos julgam que os estudos teoldgicos so revelagdes de ine fantilidade, quando, na verdade, exigem Uma verdadeira vie- ‘t6ria sobre as nossas deficienci Ante a Metafisics, a Teologla 6 um tema de estudo o de iseussio, em vista da’ problematica que oferece Reconheciam Tomas de Aquino e Duns Scot, seguindo agai © eaminho tragado por Avicena, que 6 o ser 0 objecto primeiro do nosso intelecto. Todo conhecimenta implica o sex, porque tudo quanto eonhecemas ¢ de certo modo, € 0 préprio cognos- cente afirma o ser. Mas, se 0 sor 6 0 objecto primeiro de noss0 inteleeto, 6 le eaptvel por nds através da sua heterogeneidade. © bjecto primelro da visio é a cdr, ¢ alcanga assim a tudo quanto é colorido. E assim como tudo quanto & colorido pode ser conheeido pela visdo, e como o intelecto humano é fdequadio ao conheeimento do ser, tude quanto é, € cosvascivel Mas, como hi uma proporgdo entre o cognoscente e eonhecido, © ser, embora cognosefvel, nfo 0 6 em tda a sua plenitude, porate 0 cogmoscente néo poderia eonhecer mais do que Ihe é 0 HOMEM PERANTE 0 INFINITO 1 proporcionado & sua natureza, pois, do contrério, tal conheci- mento viria do nada, B seo homem eonhece além dos seus limi- tes, tal conhecimento the 6 revelado, nfo por le mesmo, mas por outrem, O que ultrapassa ao natural ndo pode ser conhe cido por meios naturais. Tmpde-se que haja um suprimento de saber para saber, um euprimento dado por outrem. Ora, « intelecto humano conhece apenas o que lhe 6 proporcionado. Esto concordes os escoldsticos que 0 homem nfo pode co- nhecer 0 sobrenatural (como, por exemplo, seu destino, seu tim uiltimos em suma, tudo quanto pertence & eseatologia, & eriacao, A inearnatio, nos mistérios, cte.), sem a revelagio divina, Duns Scot nfo exclui, no entanto, do filésofo a capacidade de conhecer, filosificamente, 0 Ser Supremo. I o que mostra- mos em “Filosofia Conereta”. O que éle nega a0 homem nao 6 um conkecimento especulativo-abstracto da natureza divina, ‘mas sim, a visdo beatifica de Deus, a visio directa da Divindade, Estabclece, assim, 2 deficléncia do conhecimento natural que dé a0 homem a sis salvagao. Nos préximos artigos, mos- traremos que todos os séres actuam, dirigindo-se para’ sett bem, O homem tem um conheeimento profundo do seu bem, © 86 poderia desejar aquilo que éle conhece. Os escolisticos tabelecem, no entanto, que o homem no 6 eapaz de conhecer © seu fim tiltimo sem o apoio da revelagho. Nega Duns Scot A filosofin a capacidade de aleancar Oste fim ditimo, funda- mentando-se na obra de Aristételes, Poderiamos, no entanto, contrapor argumentos fundados na prépria obra de Bsiagirits, mes poderemos ir mais distant, na filosofia pitagorica, onde o fim ultimo esta plenamente es- bocada e é aleancado através de uma especulagao, verdade que Pitégoras nfo desconheeia 0 que postula- vam as religides do Egito e dos povos asifticos, e sabia que clas estabeleciam éste fim filtimo, Mas a especulagio filos6 fica, atendo-se apenas ao campo da propria filosofia, permitia aleangizlo de certo modo, Bste ponto de vista & no entanto, rejeitado pelos eseolasticos. A tose filogéfica 6 decomposta em trés momentos expostos por Gilson, fundado em Duns Sot. Bim primeiro lugar, a natureza do homem é naturalmente vel ao homem por nio ser ela desproporcionada & sua lade de conhecer, decorrendo, dai, que, uma vex eonhecida naturvza, 0 sou fim pode ser também conhecido de ma- rir natural 28 MARIO FERREIRA DOS SANTOS Em segundo tugar, se @ natureza do homem € cognoscivel a0 iomom, deve dsie conhecer 0 fim que naturalmente deseja; ceve, portanto, ter éle um conhecimento natural. fm tereeiro Ingar, como nos mostea Avicona, & natural mente evgnoseivel que. Dets poset perfeitamente 0 ser: ora, O'fim de una Faculdade qualquer € © melhor do que se inch ha sew objecto primeiro, pois € apenas nsle que pode encontrar perfeitamente tlegria ¢ Fepouso. Pode-se, portanto, conhecer naturalmente que, quanto ae seu infelecto, 0 homem esté ordenado a Deus como a seu fim. Lista aintese do pensamento de Duns Seot e Avicena apre- senta os argumentos fundamentais do filésofo, embora no to- dos. F aio tis argumentos combatidos pelos téslogos escolis- ticos. Argumenta Duns Scot: “nossa alma nfo nos € conhe- cida, assim como a nossa natureza, pro statu isto, que sob uma nogao geral tal que se pode abstrai-la das coises sensiveis", 0 que nao é suficiente para nos fazer conhecer que seu objecto mais perfeito seja Deus. Quer dizer: no estado presente do homem, seu inteleeto € proporcionado a éle. Notitro estado, ppoderia eonhecer mais a'sua natureza, No estado em que es tamos, nfo somos capazes de aleancar ésse conhecimento, 0 argumento fundamental de Duns Seat é que todo nosso conhecimento de Deus € proporelonadda aos esquemas que pos suimos, ans eoneeitos, os duais sao imperfeitos, dando, assim, iin Importeitn conherimanta da divindirle Falam 0s escoldstieos que a teolosia dos bem-aventurados é um saber directo da divindade. Mas esta teologia ainda esta- ria aquém da teologia de Deus, do saber de si mesmo. A nossa teologia (Theologia nostra) nko & uma visio beatifien. Ela 6 limitada; ¢ uma terceira teologia proporcionada ao estado fem que nos encontramos. Bla nos é revelada, O homem a aleanga, através dos arrebatamentos misticos ¢ da revelagao, Nada se poderia objactar aqui, ¢ as longas discussées neste seetor néo ofereeem uma eolugéo 20 problema, Fea, entretanto, que salientar, como mostramos em "Filosofia Conereta”, que © homem pode aleanear ser infinito, nao como um atributo do ser, mas como um modo intrinseco do Ser Sapremo. Nao €o infinite outro que » ser, mas » proprio ger na sua pureza ¢ simplicidade, B Ose infinito, adverblalmente considerado eomo modali- fade do, Ser Supremo (sincateoremtticamente, como driam 0s escolasticos) & 0 proprio Ser Supremo, Ipsum Esse, pois 0 infinite é néle subsistente, porque é ale. me (0 HOMEM PERANTE 0 YNFINITO 29 Aste sor infinito é propriamente o objecto da Teologia e, neste ponto, nfo haveria. discordanela cam os tedlogos eseo- listieos. A’ nocio de infinitude ¢ acessivel & razdo humana, ce é por ela alcangada, nfo a sua visto directa, nem a fusiio total com ela, que eaberia ao estado beatifieo, mas proporcio- hada & nose mente. O homem pode alcancar sabendo 0 que Geo que nao € dle, sem que o seu conhecimento revele total deficiéncia, porque & verdadeiro nessa proporcko. Ao conhecer o limite do proprio conhecimento, 0 homer o supera, © é na Teologia, filosdficamente estudada, que a inte- Tigéncia humana revela a sua grandeza. © Ser Supremo 6 al- cancado em térmos de inteligéncia e a esquemética que pode- ‘mos eoneluir 6 congruente com o objecto infinita, ¢ assim como © objecto da visio € todo o ser coloride, nés sabemos que hi ‘0 que The escaps, sem que o ¢olocado, além da esquemitica sen- sivel da visio, seja um nada, mas, sim, um ser eognoseivel por outros meios. Aleancar a cognoscibilidade j4 é um modo de conhecer, mesmo quando nao tenhamos déle o conheeimento actual, ma Apenas por inferéneias proporcionadas 20 nosso espirito. ‘Pode a nossa inteligéneia ser uma inteligéncia decaida, mas, nem por isto, ela perde a sua nobreza e perfeigao. Rstamos submetides As Timitagdes da nossa natureza, mas econhecemos que somos um ser em crise, e este conhecimento Jnos liberta, porque sabemos que ha algo que esti além de nés. E @ste além torna-se objecto do nosso conhecimento, por- que a coneeituaedo que déle formamos ndo o contradiz, assim como podemos saber tida a geometria sem saber, na verdade, fo que umn grandera, bem como saber a fisica © dominar as coisas sem conhecer a esséncia da matéria, Transcende, assim, ‘© homem 03 seus proprios limites, ¢ pode éle, com a filosofin, construit uma visio coerente, sem contradigses, do Ser Supre- mo. E por meio delx eonhecomos a Deus como ser, embora hao possamos aleaneé-lo como Deus, na sua infinitude ommi- potente, sendo proporeionadamente aos nossos esquemas, A metafisien pode, assim, aleancar a verdade teologica, se guindo outros earninhos que nfo os da Teologia Sagrada, ‘Tan- semos, aqui, um tema cuja magnitude exige outros estudos que Virflo @ seu'tempo. Longa é @ polemica neste sector, e ainda nap esté encerrada. Oz homens eserimirao ainda outros ar- gumentos, mas, seja como for, de algo temos certera; se nao pollemos ter a visio dirceta da divindade, a nossa mente é Entretanto, eapaz de conhecé-la. Esta proporcionalidade reve: Ta también a nessa grandeza eomo s nossa, pequenc. MARIO FERREIRA DOS SANTOS A filosofia, a0 investigar o ser infinito, aleanga o seu mais alto objecto ¢, nese sfanar pelo saber, que se caloca além dos nossos limites, ela tange as tronteiras do que nos transeende. Nao podemos deixar de salientar, antes de encerrar éste arti go, que hi, na palavra dos tedlogos religiosos, inequivocos res- uicios da’ natural desconfianca que sempre revela 0 homem religioso sobre as especulagdes que realiza o espirito humano, pois sempre deseré de suas verdadeiras possibilidades. Sa¢ ossas possibifidades que o filésofo defende com ardor. A so- luedo final a esta polémica seré dade quando o homem for capaz de construir uma visio filoséfiea que aleance os mais profundos temas teolégicos, apenas munido, para iluminé-los, da luz da razdo, da inteligéncia. TE se tal se aleancar, nfo virla em desabono das religides, porque, se ao homem foi revelada a verdade, é porque o homem podia recebé-la, Resta saber se 1G apenas um caminko. TEMA 1 ARTICO 4 TEISMO B DEISMO Ante a idéin de divindade, hi duns posigdes: a tetsta, que aceita a existéncia de Deus, ¢ a atefsta, que nega ou duvida desta existéncia No entanto, convém esclarecer dois térmos muitas vozes empregados como sindnimos, mas que oferecem nitidas distin- ees; sfio dles: felsmo e defsmo, “Teismo opée-se tanto ao atelsmo como também 20 pantefs- mo. Para o teismo, Deus € pessoal, e causa do mundo. Para © panteismo, tudo € Deus, Para 0 deismo, a concepedo de Deus nfo é nitida, E os deistas earacterizam-se por sua oposiglo A revelaglo, as reli- sides reveladas. Bste térmo fol cunhado por Littré. ' Bossuet classifica o deismo de um “ateismo disfargsdo”. Ha certa semelhanca entre o deismo ¢ a teosofia moderna, A teosofin apresenta-se como um eonhecimento de Deus ¢ das coisas divinas, obtid atravéa de um aprofundamento da vida interior. 0 te6eofo nfo ¢ um metafisieo, mas um vidente ro ligioso, iluminado, ‘Tende naturalmente a interpretar tudo pe- log exquemas religiosos que constrdi, ¢ a dominar as foreas da nalureza pela prdtiea de certos meios. Costuma-se inelufr entre os teé: Swedenborg e Steiner. ‘A. teosofia & também eonsiderada um pantefsmo emana. tista, como se vé por estas palavras de Annie Besant, um dos seus apéstolos: “Cremos num Prinefpio Divino universal, do qual tudo procede © no qual tudo sera reabsarvide no fim do Brande ico do Ser.” Nossa Deltade ¢ (i? im, em neutro) 0 misterioso poder de evolued e de involugao, a omnipresente, a omnipotente e até ommisciente Potencialidade eriadora”, fos a Jacob Bochme, Historia da Teotogia Bm todos 08 cielos culturais, vemos os temas teolégicos surgirem, como matéria filoséfies, no periodo intermédio en: tre a fase de fermagio de uma cultura e o perfodo de m; 32. DARIO FERREIRA DOS SANTOS dade, o perfodo clissico, Assim, por exemplo, na cultura hinds, mndo da époea dos bramanes, dos hinos védieos, © dos Ups nishads até a dos Sutras, os temas teolduticas sao tratados mai religiosamente, sem método metaffsico. Em nossas palavras: 2 teologia religioss, sagrada, prepondera sdbre a teolo inval, que ja procura uma justificagko filoséfiea, e que $6 pole surgir naqueles instantes ém que a £6 vacila ante as oposicoes. Eo que sucede no perfodo que vai dos Upanishads até a for- mado dos seis sistemas da filosofia hindu. Na cultura grega, encontramos esparsamente, entre os au- tores pré-nocraticos, referénelas sdbre temas teologicos. Mas, & sobretudo com Platio, que éstes surgem com a coneepeao do Bem e do accidental Demiurgo, que é apenas tm simbolo, por muitos julgado como fundamental da sua filosofia, érro que wa porpeton por deficlénia de anise simbilien por parte de certos estudiosos. Aristoteles trouxe para a Teologia grandes eontribuigées. A idgia de Deus é nitidamente expresss, nfo mais por simbo- los, mas por analogias mais directas com a realidade, e passa le’ a sero motor imével, que poe tudo em movimento, 0 Acto puro, necessério, imutivel, Ble nfo conhece as coisas do mundo. £ 0 motor imével dos astros, Carece até de liberdade. Como Aristételes ace! tava eéreal de 55 motores iméveis, incriados, diferentes entre si, muitos o elassificam de pluralista, Com Plotino, Deus 6 uma entidade dniea, transeendenta- lissima. Sobre éle nada sabemos como ¢, mas apenas como do 6 A sun Toologia 6 negativa, eomo o 6 thda Leologia que tus a neguedlo de tudo quanto ¢ finito, determinado, para dizer ‘© que é Deus pelo que nao € Assim, éle é in-finito, in-menso. Contudo, para Plotino, Deus a origem de todas as coisas. Na primeira fase do cristianismo, no Ocidente, tivemos 0 periodo dos apologistas, defensores da nova fé. Com os Santos Padres, surge a fase da patristica, com nomes como Justino, Minticio Félix, Irene, Clemente de Alexandria, Orizenes ¢ Sante, Axostinhe, Neste perioto, os temas Iigics sio tratados ilosoticamente, Na chamada Made Média surxe a escoldsties, ¢ nesse periodo, aparecem as grandes figuras de Santo’ Anselmo, Tunduddy da escoldstics, Alexandre de Hales, Almaricus del Beng, Alberto Magno, Sdo Boaventura, Tomas de Aquino, Duns Scot, e posteriormente Suarez, Fonseca, Molina, Bufiez & mui- tos outros, (© HOMEM PERANTE 0 INFINITO 33 Nessa fase, a teologia natural conheee seu pleno desen- volvimento, Na chamada Made Moderna, temos em Deseartes, em Leibnilz, e modernamente no intuicionismo, com Malebranche, Rosmini, Gilberti, ete, a tentativa de abordar, sob novos an- gulos, os temas teol6gices, como também os engontramos entre 95 filésofos da chamaca “dade contemporanea”, como Balfour, Taberthomiére, Bronetigre, Olé Laprune, Blondel, Gabriel Mareel, Maritain, Lotze, Garrigou-Lagrange, Gonzalez, Marin, Barbado, ete. No decorver dos estudos sobre os temas de teologia, tere ‘mos oportunidade de fixar os aspectos diferenciais das diversas posigdes teolégicas, TEMA w ARTIGO 1 A ORIGEM DA RELIGIAO ‘Nao seria proprio entrar no tema das provas da existéneia de Deus, sem que o precedéssemos por um estudo da origem da religifo, pois € preciso reconhecer que a especulacdo sdbre 0 tema da divindade € precedida, na histéria humana, pelo da formacio religiosa. © térmo religido € freqtientemente considerade, em sua origem otimoldgiea, como proveniente de re-ligare, conforme © expde Cicero. Neste caso, 6 religilo tudo quanto religa 0 ‘homem com a divindade. Se, realmente, hi na religitio, e sobretudo em suas préticas, um “ligar de novo” o homem ao seu criador, através dos meios que a religido oferece, entretanto preferimos procurar outra origem para a palavra. Ha, em grego, um verho alegeyn, que signifiea venerar. Alegé significa: ocupo-me de, inquieto-me por... Eo térmo religido de étimo duvidoso, ¢ as diseussdes sobre sua origem interessaram a diversos estudiosos, No en- lento, tanto em re-ligure, ou ein relugere, “ler” de nove, ott pereorrer de novo um caminho, temos sempre a iddia de dois ‘érmos que so ligam: um tormo de partida e um de chegada, em que principio e fim sao 0 mesmo. Se atendermos para o radical leg, do lee, que 4 vimos em inteleeto, significa dle captar, tomar. E lego, logos vem do mesmo radical, Relego € eaptar, colhér de novo, reler, (pols legere & colhér), captar os sinais inseritos. Religio, em latim, € algo que ocupa, preocupa, o mesmo que alegd, no grego, eon) Ja vimos Em face do mundo, o ser humano primitive encontrou-se ante forgas gdversas. Sua vide foi, em certo periodo, diffell A obtencao de alimentos exigia cada vex mals esforgos a serem dispendidos. FE em face de tudo, de todos os enigmas e mis- térios da existéncia, pos-se a venerar, a prestar hom: por palavras (logos), por atitudes, gestos, ademanes 0 HOMEM PERANTE 0 INFINITO 35 ue éle migicamente procurava dominar, ou desviar, ow ape- A religito 6 ésse venerar do homem, por mefo de praticas, fos poderes que dle considera superiores a wi, e os quais o pre: ‘ocupam, pois éle os teme. # compreensivel facilmente que ésse conceito de rel 6 muito elementar e primério, mas adequa-se perfeitamente 20 primarisme do homem nessa fase em que os poderes opositivos eram para éle motivo de ierror. B terror e veneracio atervorizada foi a sua primeira ma- nifestagio religiosa (1) Mas oa valéres positives também se revelam. E se hit um poder do mal, hd um poder do bem, Aterroriza-o 0 poder do mal, mas alegta-o 0 poder do bem, Hntre o terror ea sa- tisfacdo, instala-se 0 temor, meio térmo feito de esperancas ede diividas A religiao & assim: a) ou uma religiao do terror; b) ow uma religido do temor, e 86 finalmente, quando a espeeu'acdo teolégiea se forma, ¢ a divindade nao pode ser concebida como ma, mas apenas como usta, € que a religido se tora ©) a religifo do amor, sem que os elementos de terror & de temor deixem de permanecer nela (como se vé no Cristia- nismo). 18 religiio do amor, quando 03 valéres positives, que so atribuidos & divindade, e'séo, portanto, divinos, surgeri a0 ho mem contra og valores opositivos, atribuidos ao anti-deus, ao diabo, a0 deménio (2). A catharsis, a desearga emotiva do ser humano, como 0 vemos na "Bstética”, leva 0 homem a manifestar a emogio que The causa o terror 0 temor césmicos, que déle se apossam ante a morte, ante o espaco e ante o tempo, que jé se Ihe esbo- ‘cam eomo impossibilidades, que néo pode veneer nem dominar. (1) Sabre gate tema, compendiamos as mia seguras opinides no ccapitnle onde tratenor da Paicogénese « Noogéness na *Novlogin” © foo “Pilosofin @ Histévis da Cultura” ) A palavea deménio vem do grego doimon o, nesta époen, nis tintin um sentido exclusivamente opositive, pois um datmon podia ser Ienctien, 36 ‘MARIO FERREIRA DOS SANTOS ‘A religifo tem, assim, uma raiz nos factires emergentes, que sio 65 biondmicos e os psicolégicos, com a coutribuicdo dos factores histdrico-sociais, directamente construidos sobre aquéles. 0 desenvolvimento da Teologia, nos perfodos especutatives, em one o homem emprega a inteligéncia © o saber epistémicn na andlise das erengas religiosas, que tem uma raiz emergente muito mais poderosa do que julgan muitos, e que traz a marca de alta cultura, Jevam-no 2 eompreender mais profundamente © sentimento religioso, nilo como usna simples manifestagio do torror ¢ do temor edsmivos, mes a eompreender que 0 edsmica um simbolo de algo mais profundo, de um referide oculto, que ¢ 0 grande simbolizado, 0 principio, @ origer de tudo, 0 Ser Suprenso © ser bumano, toda a ver que nav pode vesolver uma die fieuldade por meios téenicos, lanea mao de meios. mAgieos. Na Técnica, que é o emprégo sistematico de meios para 8 obtengho de fing, hé sempre uma relagio rigorosa de causa © efeito, enquanto, na Magia, essa relagdo néo € rigorosamente adequada, pois pode accitar-se que pequenas causas realizem randes efeitos, ou nao. Nao hé sociedade sem Maxia e sem Técnica. No entanto, fa relagdo entre ambas pode variar, nunea chegando nenhums delas # fesaparecer totalmente, Na génese da religito, penetra tanto a téeniea como a ma sia. Pois, a maxia é uma “técnica” sem rigorismo de adeaua- eae entre caust e feito, enguanto a téenien 6 uma “magia” com ésse rigorismo, pois aquela pretende dar mais poder A religio, no entanto, no pertence apenas ao campo his- torico-social, pois nela penetram os faetires emergentes, aue ineluem os biondmicos ¢ os psicoldgicos, que ja estudamos. FE nesses factores (examinados na “Decadialéctiea”), ¢ através doles, a eatharsis, a emogio exteriorizada, manifesta-se em arte, em pensamento, em querer. Por isso, nZo ha religiao sem luma arte, sem tum pensamento, e sem um’ querer, Estudemos agora as diversas teorias sdbre a origem da veligifio, TEMA 1 ARTIGO 2 AS TEORIAS EVOLUCIONISTAS SOBRE A ORIGEM DA RELIGIAO A coneepedo evolucionista, que tanto influiu sdbre 0 pen samento cientifieo no século passado, caracteriza-se, em geral, pela tendéncia a reduzir as formas’ superiores as inferioves, isto & por expliear a formagho do que 6 superior como unt desenvolvimento do inferior. ‘A religifo das culturas superfores 6, sem diivida, uma tor- na evolueionada da religido dos povos inferiores, '& qual se ajuntaram novas contribuigées especilativas do espirito hu- mano. Para os nuturalistas, a religiao surge da personitic das foreas da natureza, as quais sio adoradas, Dai, Angusto Comte admitir o fetichisma como a forms primaria de religigo (1). 0 fetichismo julgado petos positivistas como o culto mais clementar do homem. Cyuisiste ee na aduragao das wisn como sendo encarnagées de espiritos © com poderes migieos Para Augusto Comte, ésses corpos so considerados pelos po- vos primitives como possuidores de um poder, ou animados de forgas superiores, henéfieas ow maléficas Eneontramos ésse fetichismo néo sé cm povos primitivos, mas até em povos eivilizados. Entretanto, ¢ preciso distinguir. Um viajante, que per- corria 4 Afriea, tendo ocasifio de clogiar a superioridade do homem branco, ouviu de um negro uma resposta bastante ex- pressiva. Disse-lhe @ste que, absolutamente, nfo via nenhuma superioridade no branes, “Ao contririo”, ‘ajuntava, “6 bas- tante estiipide. Basta dizer-te que os brancos pensam que n6s acreditamos que as imagens que construimos possuem, em si mesmas, um poder superior. Deus nfo pode ser representado por imagens, nem pode estar em nenhuma hebitagao constr (OA palavra fetiehiamo, vean ao Iwi Intiny fete, te inden 8 Foitign. eva ey Feity Habeas pela lemon 98. MARIO FERREIRA DOS SANTOS da pelo homem. Deus esté no alto, ¢ bem no alto, e de la nio desce”. E Trilles, citado por Foulguié, diz que um pigmeu, tecendo comentiirios sobre essas coneopedes dos braneos, pro- nunciou estas palavras: “Como devem ser estiipidos os bran- cos para acreditarem que fossemos t&o estipidos!" No entanto, se hii entre os adoradores de feitigos os que sentem apenas 6 simb6lico de tais coisas, ha, e sobretudo entre (08 civilizados, os que acreditam em poderes reals sobrenaturais Imanentes a certas eoisas (1). Convém notar que os povos primitives tm um pensamen- to predominantemente simbélico, E sentem com muito mais acuidade 0 sfmboto do que nés. o que nos prova a expresso postica predominante em todos os povos. Seria um gravis- Simo érro julgar que ésees povos tivessem um pensamento fe- tichista t20 forte, como se pensa, pois sabem melhor do que nnés que simbold é sempre um apontar uo cculto, ao miste- Tioso, ao quo esté além de tudo. Nos somos muito mais fet. chistas que os homens primitivos, e poderfamos até dizer que, quanto maie eivilizadas, mais tendemos a idolatria, que 6 sem= pre o considerar-se 0 simbolo, no como simbolo, mas como se Tasso a presenea do simbolizado, Com Max Milller, surge uma nova explicacéo da origem da religiio. O homem, 20 contemplar o eéi, a0 ver os plané- tas, 05 mistérios que ocultam, a alternfincia do dia, com a presenca do sol, e da noite, eom a presenga da Iua, a influgn- fahe sal exéree em certo paftes, » a da Tha, predominante fem outros, explicar-nos-ia a formaedo das religides que surgi- rriam, assim, de eultos solares, como no Egito, ou de cultos lu- nares, como na Mesopotamia. verdade que Max Maller fan- da-se em aspectos lingufsticos, e nota que sempre a divindade etd ligada a Gases dois astrs, to importantes para a nossa Nas regides, onde as enchentes dos grandes rios so im- portantes, e como as fases da lua influem sobre a agricultura, Gcla considerada a maior divindnde; enquanto noutros, onde © papel do sol transparece com supremacia, 6 éste o adorado, No Hegito, as enchentes do Nilo, como eram de origem deseo nhecida para os egipeios, o sol tinha um papel evidentemente muito maior que 4 lua, Téda a religifo egipeia ostructura.so em tdrno de simbolos solares, enquanto as da Mesopotamia, em timo de simbolos Iunares. (2) Sobrenatural mo 6 © quo 6 contra ou fien além da natoreza, mas apenas o que uitrapatea a natareaa de wna enisa, Ura homem falar 4 natural; uma pedra fazé-o seria sobrenatural © HOMEM PERANTE 0 INFINITO 39 Uma apreciagio meramente superficial lova a accitar esta hip6tese. Mas compreender-se simbolicamente que 0 sol é apex nav algo da ordem eésmiea e nao um deus de per si, e que seu papel € préximo a nés, mas uma causa secundaria e no pri- mavia, ¢ claramenie exposto no pensamento ogipcio. Basta ‘Que 8¢ leiam 08 livros atribuidos @ Thot (Iermes Trismegistos, na cultura grega), para que se compreenda, desde logo, que 6 20] 6 apenas um’ simbolo e nao um simbolizado. “& verdade ue se pode eonsiderar que a maioria néo apreende esoterica- monte as religioes, mas apenas exotéricamente através dos Hmbolos e nfo dos referidos que Gles apontam. Mas hi em {isdas esas eoneepgdes um qué de verdade, como teremos opor- tunidade de salientar em nossa anélise dvcadialéetien dav re- ligiéo. Outra concepeiio evolucionista 6 a do animiamo, Enquan- to os naturalistas fundam a religiio no culto das foreas da natureza, og animistas fundam-na no conhecimento da alma humana. 0s sonhos mostrariam aos homens a presenga de um “du- plo”, um duplo subtil, animado, pois seus antepassados, j& mor- tos, ‘surgiam vives em sonho. Havia, assim, para éles, uma vida apés a morte. E mesmo quando’ sonhando sdbre ai mes ‘mo, via-se © hamem, em sonhos, percorrer eampos em felizes ou desastrosas caadas, viajando por regides deseonhecidas, eoneluiu que havia néle um outro, um duplo, que podia sair do corpo e divigir-se a varias regides, bem como perdurar apés morte, A aceitagio da imortalidade da alma, ou, pelo menos, de gua Sobrevivencia ao corpo, seria 9 ponto de partida pars uma seqiigneia de especulacées posteriores sobre a vida de ém-timulo ¢ & estructutagio mais complexa, posterior, das 8 religiosas, Herbert Spencer chamou de manismo (de manes, almas dos antepassados) 0 culto que se prestou aos antepassados, & ‘que estructurou, através de rituais e praticas, a religiéo, Sur- ge, dai, uma nova manifestacso do evhenerismo, culto'e eon- ‘eepeio que vem de eras primevas, que proclama que os deuses nada mais so que herdia mortos, divinizados pelos povos, Hi, assim, em téda religifio, uma personifieagio da di- vindade, que assume caracteristicas semelhantes as do ser humano, Lévy-Bruhl, em sua obra “Les fonctions mentales dans les sociétés inférieures”, diz: “Na vida do homem, tudo o que ‘equivale a tima'simples reacgio do organismo as, excita cies que reeebe, & necessiriamente de natareza social”, 40. MARIO FERREIRA DOS SANTOS A religiio no se observa entre os animais, que sto bio- Togicamente semelhantes aos homens. A religigo & assim, de origem social, proclama. A ordem social nio é uma mera ordem animal, ela, na verdade, ultrapassa o simples anima- iso, E, segundo Durkheim, € 0 eulto do totem (que ¢ um eulto do tempo ou no tempo), culto aos antepassados, que seria a origem da roligiéo, 0 totemismo seria a forma mais elemen. tar da religiao. No entanto, Frazer nos mostra que © totem nao é um deus nem € adorado pelos indigenas. Nem Ostes consideram seus pais ou antepassados como deuses. 0 totemismo ndo é assim uma verdadeira pratiea religiosa, Se o indigena se abstém de comer a carne do animal totem, também se abstém de comer a carne de seu pai © irmios, acrescenta Frazer. Ele vé no totem um semelhante e nfo um superior, nem tampouco um deus. Além disso, pode alogar-se que 0 totemismo, se € bas- tante difundido, nfo é universal Os estudos modernos, efectuades por Andrew Lang, ¢ con firmatos por P, Schmidt, demonstram que hi nos povos um monoteismo primitive que, por degradacao, se torna politeista Desta forma, hé a origem de uma crenga num Deus tinico ¢ omnipotente, eriador de tudo, Os simbolos désse Deus sd0 as ‘manifestagbes da eriaedo. Q considerar-se posteriormente tais simbolos como simbolizados, levou ao politeismo. Portanto, 0 monoteismo € antecedente ao politelsmo, @ que Inverte 0 que até entiio ee considerava corto. Os inquéritos realizados pelo padre Schmidt, que € eaté- lico, so postas em diivida por muitos, que julgam que hd nas suas conclus6es um desejo de impor uma hipotese que néo tem. fundamento suficiente. No entanto, outros estudiosos dos seus, irabalhos, e que os controlaram, chegaram & coneluséo que aesiste ao famoso antropologista grande fundamento em suas afirmativas (1), Ne cultura hindu, como na cbinesa e na egipeia, e inela- sive nas da Mesopotamia, um estudo euidadoso dos textos, que ‘ainda nos sebram, vem em favor da tese do P. Schmidt. ‘Todos (os relatos dos povos primitivos nos revelar a aeeitagho de um monoteismo que no se deve mais, como até hé poueo se fazia, considerar como de origem judaica, j& que o encontramos em todas as coneepgies esotéricas das réligiges, em todas as altas (1) Bm “Tratado le Simbéliea” aio exarninades os teabatho do Sebi © HOMEM PERANTE 0 INEINITO a culturas ¢ até no pensamento esotérico, hibride de maior con- tingente dle magia, dos povos primitives. A religitio deve ser considerada sob dois aspects a) como esotérica — penamento das “elites” religiosas, sempre monotefsta, que aceita um grande simbolizado, que b) eotericumente se manifesta através dos simbolos, que, cenfundidos como simbolizades, levam a formas idélatras po- pulares, Reproduzimos a seguir as pala por Foulquié, expressiv: a0 livro “Souve ‘as de Grouard, citadas ase de grandes sugestées. Pertencem de mes soixante ans d'apostolat”: 'Um indio de Mackensie disse-me um dia: “Padre, antes de te ter visto, ex sabia que Deus existe”. — Como o sabias? Creio que fui o primeiro a te falar de Deus. “ » — Na verdade — retrucon — antes de ti, ningvém me havia falado néle, e contudo eu sabia que hf um Deus. Um dia, quando tinha eatorze ou quinze anos, fui & caga com o met ‘arco e minhas flechas. Conhesia os bosques, 03 rios, os Jastos por onde havie passado, buscando matar algume aga. Nesse dia, no verdo, eheguei 4 borda de um lego eer. eat de bolas drvoren. Patna doseiam sfhro a fgua, o tol bri hava no eéu sem nuvens: ld longo, montanhas elevavarn em variadas alturas. Detendo-me, contemplel tudo isso. com tum imenso prazer. Subitamente, « idéia me vein: “Quem fez tudo isso? Nao fomos nés, nem tampoueo os ingléses, pois so homens semethantes a nds. E preciso que haja algiém mais forte que todos os homens que’ tenha feito tudo isso. "Ves, aereseentou 0 Indio, eu sabia que essas floresias, éstes Ingos, asse_ sol, mio haviam sido feitos por si séx Eu nfo. podia explicar-me mais corretamente, Mas, quando tu nos ensiniaste “Creio em Deus, pai todo poderoso, Criador do e6u e da terra”, ou compreendi jogo e disse a mim mesmo? "Eido; eu sabia aque éle existia™ TEMA 1 ARTIGO 8 FUNDO COSMICO DA RELIGIAO Fundando-nos na dialéctica e na decadialéetica, torna-se féeil colocar o tema da origem da religiio em bases realmente seguras. Ha om todas as posigées filoséficas, nas suas afirmativas coneretas, uma positividade. Se considerarmos os factéres internos e externos, temos de classificar: : Pactéres internos (emergentes) : 08 bionémicos e os ps coldgices, que estructuram o histérieo-social. Se considerarmos 0 factdres externos, os predisponentes, temos 0 ecoliigico e o histérieo-social. superiores, sem que haja ainda nitidamente uma conscién« Hemmer Sor hemano € psouicemente estructurado em bases (0 HOMEM PERANTE 0 INFINITO podem predispor & precipitagtio désses esquemas na construgé de uma atitude de respeito s férgas da natureza, e as teor! de Miller e a do sociologismo encontram, também, elementos coneretos para justifiearem suas posigdes. Cometem elas 0 érro abstracionista, quando negam, quan- do exeluem outros factdres que so, por sua vez, coordenadas basilares da realidade religiosa. Quando o ser humano medita sdbre tudo isso, compreonde (G4 numa fase genuinamente racional), que um ‘poder nico, © maior de todos, € a fonte e origem de tudo, © pensamento simbolico dos homens primitives, que véem em tédas as coisas ndo a presenga actual do poder supremo, mas apenas algo que esté em lugar de..., que é 0 verdadeiro sentido do simbolo, leva-os a compreender, por um impalso muito mais profundo, que vem da raiz da vida e até de uma raiz mais longingua, edsmica, primeva e anterior a tudo, que tm poder inigo, um ser supremo preside a thda a exiséncia A complexidade posterior do pensamento teolégieo surge, numa fase de andlise, eoadjuvada pelos métodos da filosofia, sobretudo os usados pela mictafisica, € se precipita num pen- samento coordenado ¢ poderoso. Também se poderia fazer uma anélise decadialéctica, se- gundo 03 planos do sujeito e do objecto, observando os aspe tos do conhecimento © do desconhecimento, quer racional, quer intuitive, bem como objectivamente na antinomia das ordena de intensidade ¢ de extensidade, para aleancarmos, afinal, a invariancia da forma religiosa, apesar da varidnein das for mas histéricas que nos apresenta, Mas, tal andlise, ja familiar fos que extudaram “Diaiétiea™ e "Detadiléticn’, € de tel Fealizacao. Desta forma, ante as observagdes de Andrew Lang ¢ P. Schmidt, © das eoneepedes evolucionistas, maturalistas, ete., po- demos dizer que a religido é uma estrueturagio de um pathos muito mais profundo do ser humano, com suas rafzes na sei sibilidade, que, por sua vez, penetra no proprio eésmieo, que nossa razio racionaliza em exquemas abstractos. Ni 6 como se vd, mera eriagfo do espfrito humano, inane, sem_um contetido mais profundo nem apenas um produto de factores predisponentes; mas, como tudo quanto € eriado pelo homem, tem uma origem nos TaetOree emersentes,cujas rales se aprofundam em todo 0 ser. Nossa eapacidade de apreciacho, a timese parabética, que process por uma eomparagao com a sua perfeigso especi- Tien, morcee que ke medite agora, sobre ela, teoldgieamente a4 MARIO FERREIRA DOS SANTOS ‘Toda a natureza, tudo quanto existe, tem o intuito de al- cangur o seu Bem. 0 Bem est presente, eomo meta e como impulso, em tudo quanto se agita no universo, como origem e como 'finalidade. Tédas as coisas buseam a sua perfeigao, Nos séres humanos, revela-se uma posse virlual da perfeigao. Se entre varios verdes sabemos quais so os mais verdes ou (os menos verdes, ¢ se diseutimos, Zazemo-lo com conviegao, Podemos eonstruir eoneeitos de perfeigdo, eomo os de sa- hedoria, de bem, e o d& propria perieicio. Podemos, no en- tanto, nio saber operatiriamente expo-las eom todo 0 rigor ‘que a razSo deseja. Blas no podemos negar que temos a posse viveneial de tais coneeitos, que os vivemos com conviegiio, € que s6 poucos podem estructurar em esquemas abstractos, Se examinarmos os séres, nos diversos planos do nosso co nhecimento, que se referem 20 quaternério, ao campo tetra- dimensional de nosso cosmos, no plano da ‘fisico-quizmiea, da viologia, da psicologia e da sociologia, vemos que tudo busca 6 seu bem, todos tém um impeto para a perfeigdo da sua espe ie, fmpeto ora mais ou menos frustrado pelos outros séres, que também buscam a sua perfeigio, Pode nfo haver consciéneia psicolégica, quando do plano psicalégice © social, mas hi ésee impulso que se revela, deade a microfisiea ao microteos humano. Ha em t6da a naturesa 1 obediéncia 2 uma lei, que por ora chamaremos a lei do Bem, que busea, através do menor esférco, 9 maior proveito, lei onto- Kigicamente dominante no plano da fisico-quimica, no da bie- logia, no da psicologia e no da socielogia, Resa tei do Bem, euja explieagdo ¢ fundamento eneontrs- remos na “Teoria Geral das Tens6es”, com 0 seu enunciady definitivo, é universal. Todas os séres’ buseam © melhor com © menor esfGreo, menor dispondio de energia. ¥ o equilibrio de um maximo e de um minimo. Um méximo de bem e um minimo de mal, de perda. Essa lei ontologies, porque valida em todos os pianos, tem um fundamento esmico muito mais profundo, por ser ontolégica. & uma lei do existir, e da qual © homem’ tem consviéncia © posse. Quando Plato falava da memorizagéo do mundo verdade, referia-se le & nossa eapacidade de “recordar”, de saber 0 de ‘que no temos a experiéneia( empirica), mas que temos ap’ dio para aetualizar em nbs, Sabemos que a perfelgdo se di, mas podemos ndo saber imité-ls, delimité-ls, “prendé-la” num conceito rigidamente estructurado, Sabemos que uma coisa € mais ou menos per- Feit, © HOMEM PBRANTE oO INFINITO 5 medimos, tomando por medida a sua perfeigdo ¢specitica. “Me. dizemos que éste é mais verde ou menos verde que aquéle, sem gue tenhamos a medida perfeita do verde. Assim, podemos ai. sentirmos que mais se aproxima dessa sabedoria perfeita, a ‘qual sabemos que 6 perfeita, que é plenitude. “ Sebemos que perfeicfo é plenitude, ¢ que tudo busca plenitude € atingila-in quanto fase" tudo quate pore Sa sem dispéndio alzum, sem perda, isto é aleangando ao seu Portanto, sentimos que aqucla macieira, t macis, atinee uma. perfsigi, como sabemos que 6 keke sa perTeleto ds poteneit, que, por ser potencia, tia apeitac de exist, de actualizarss, e, 40 fazt-l, realita © nue pe Mas essa perflgio hibrida que conucemosy geet nese por feicdo, nao esgota ainda o nosso conceito vivencial, porque si liemos que o que atinge ao acto hibrido ainda tem potaians Ges para aetunlizar; portante, ainda ¢ imperteitore ater uma perfeigdo maior ao actualizar novas pastblidades teneialmente, nao é em seto, tudo quanto pode ser, ndo atinge, assim, a plenitude do ser de si mesma. E sendo prefixada, li, miteda, encontraria sempre no limite, um nao poder-ver que todo pretizar existenci almente a sistincia, aponta-nos um li- fer queso aoe de tudo quanto pe ser am, Ea Bes, 9 Senca actual do bem e do mal, segundo os graus ¢ a: formas ‘Temos, assim, consciéneia da posse virtual do bet Virtual que a tem’ todos as entes. “Nes 0 tubemoy, 6 ealeeeee ue 0 aera “Bee nog ese targa me, © ee 48 MARIO FERREIRA DOS SANTOS vés de todos os nomes que a filosofia, no decorrer do tempo, tem nomeado, como vontade schopenhaueriana, vontade nietzs~ cheana, Eros, 0 ineonselente de Hartmann, élan vital, ete, Fase impeto A perfeigdo, éste saber da perfeigio, que nfo 6 um mero caber judicatério, mas um saber pathco, viveneial, desperta-se no hotnem pela experiéncia do mundo empirieo, Nao surge da experiéneia, mas ¢ algo que ultrapassa o campo desta vida, dizin Platao, ¢, portanto, 6 algo que recordamos do mundo das formas perfeitas, mas que a experiéneia humana lespertou, aetuando como predisponente, em forma de eons- cléneia religiosa, com a sua simbélien, Sabemos que isto nao é a perfeicio da sua espécie; sabe- mes que ha uma perfeigao da espécie. Mas essa perfeigdo nao cestd topicamente delineada. Neste momento, hi de haver no mundo um leo que reatizn mais plenamence'® Teonidade, como 9 diria um platonieo (1). Mas @ste nao € a perfeigo Ieonina, porque pode ter ha- vido Win ledo ma lofo'do que ele, ou pode ainda sobrevir um mais Yeo do que Nao sei qual é a perfeigfo do lefo se me perguntarem. Mas sei que, neste momento, hé um ledo que € 0 mais lefio dos ledes vivos, ¢, na historia de téda a espécie leonina, hi de haver um exemplar que atinja a maior perfeigao da sua raga, ‘Se entendo de ledes, como cortos homens entendem de ca valos, posso julgar qual’ 0 leo mais Tego, como o entendedor de eavalos pode julgar qual o cavalo, que tem 2 cavalaridade mais acabada, Que 6 essa cavalaridade? Uma palavra pare fazer rir os iumoruntes? Ha nesses termos, algo mals que & preciso eaptar Trent Vataon exon Hato em face desta aed.” sla tagd € maga e nao 6 péra, por que nela se realiza o quo tm Pulutstasum materiastay chamaria de relacionemento d= Fulzclonamentos, que a torna maga e mio péra, qe Ine di esta Forma e nao aqiele, 2) to stclariaam tai expres por nly peer compen etal” nbougniin tl afmatva ua pois de te painiea Now See ues ets ouput weave do osu Tv, apeendemen Te SUNS Joan ins aca oo solo dsc, eatar © a0 rae yuhive ma era dar soft, ain a nocoidade das tlle eh ds ua cestaneimente serfs da dan grades mess ‘ens lo ulom compres Dem lew 0 HOMEM PERANTE 0 INFINITO at Neste caso, nao pode negar o materialista que hi relacio- namento e relacionamentos. E que ¢ste relacionamento mio 6 aquéle, Portanto, nesta magi se deu um certo relacionamento, que nao & um qualquer. Este, so nao fésso como 6, daria, conse- qlientemente, um outro ser; digamos, uma péra. Mas'a ques- to 6 que dev magi, porque 6 diferente do que aé-a péra, Mas, o que € ésse relacionamento? Ble implica relagio, téda relagao impliea nimero, pois entra o numeroso. 0 rela~ cionamento da magi é portanto, um mimero que, ao dar- cosmos, também no podem ser considers @as como nada. Assim, a fruta V, que ainda possa surgi, ou o ser X, gue ainda posta naseer, Maas que ainda nio é ahi € agora, essa forma, que 6 um relacionamento de relacionamento, como 9 diria o matetialista, que ¢ um nimero a actualizarse, # nada? So é nada, nio tem aptiddo a ser. Ese um dia for, gute agora, tinka aptidfo a existir. ra, portanto, um modo die ser que néo apresenta as caracteristicas da topicidade do ‘que € aqui ¢ agora, portanto um ser que no 6 aqui nem agora, ‘cae no ocupa espago, nem se d4 no tempo, mas que se di no ser universal, como tma possibilidade do ser universal, pots ‘indo quanto possa vir a ser, J@ esta ao menos em possibilidade nw ser. Portanto, no ser, no Ser supremo, hi tudo quanto pode ser. Nao € a hibridez de nosso acto © poténeia (lempo-espa- al), mas 6 da sua eternidade, porque tudo quanto pertence ‘metaieo © ao prometéieo, se se deu, ou se se df, on se 6 poteneial ow nfo para nés, esi fundado no acto do Ser, tue o sustenta, Se no conhecemos o epimetdico e o prome- Iie @ que éles estilo em poténeia, virtualizados para nés, mas 48 MARIO PERREIRA DOS SANTOS ‘esto li, no ser, contemporiineos, e vencendo 0 tempo, eternos nna eternidade do ser. Chegamos, assim, a captar algo da perfeigéo do Ser, aue é tudo quanto pode ser, 0 6 eternamente, enquanto nds, como yattieipantes dl, temos apenas uma vito de particpagin, ‘Portanto, & parte nio tem a posse actual da perfeigho, reas gpenns's poste situa, porgue & parte. Mas sabemon ue Id enna perfeicéo. Fa cla anelamos, a ela buscamos em cada uma das nossas aecées., E é ela anelada pelos entes. E como provar tal afl wetiea? Prova-se pelo aetualizar constante de todo 0 devir. O devin nio ¢ eterno, mas o devir é a afirmagia mais fands- rental e viva do eterno; é 0 simbolo do eterno, embora pa- Meesse x muitos a sua contradigéo. O devir & um continuo Jotualizar das possibilidades; 0 devir 6 0 constante reallaar-se ds potdneia em acto. 0 devir divge no ser, que 6 perfelto, rea fizando-we na existencialidade prefixada. ‘© ser ¢ tudo quanto pode ser, eo devir, um modo de ser, que the pertenee como Poder-ses, pois, do’ eontrario, como se daria o devir? Nao Eponta o\devir a perfeieho? | Pois no afizma éle o ser em Todos de ser? Nao afirma que o ser 6 nosse imenso sendo fe todo 0 existir, no existindo de todo ser? ‘Mas tudo o que esté em dovir ¢ um ser participado, que nao é todo 0 sor; 6-0 ser existencialmente prefixade, 0 devir Discs 0 aetualizar constante, eterno ¢ ineansivel de todo o ser tm seus modos de ser, que 14 este contidos, em acto, no ser Chguinto ser, pois tudo quanto pode ser J8 & Cle, puis, do contratio, como podia vir-a-ser? poo vie 0 oo que vera a ser nio 6, vir-s-ser prometfien viria do nade, nese caso, o nada teria aptiddo do ser, 0 que J& the Garin uma eficacidade e deixuria de ser nada ‘para ser ser. Neste case, tido quanto se dé no devir jé & ¢ © devir é 0 Aponlar do que 6; € 0 apontar do set, O devir 6 portanto, simbolo do ser " E como em todo simbolo hé um snalogante em relagio a tum analogado, bi entre o devir e 0 ser um momento de iden- {ifiengio que esté em ser. O devir, portanto, nfo noga o ser, mas o afirma, Ve-se como dialeeticamente se pode perfeita nents reumir os eontrérios numa concregdo. O devir e 0 ser Tonerecionan-se m0 proprio ser. O devir 6 0 ser due se tem- poraliza, que sucede. ‘Todo ente procura realizar a plenitude de sua forma, © tum impeto que & 0 veetor do seu existir. O que o obstaculiza, 0 HOMEM PERANTE 0 INFINITO 49 ‘© que 0 impede de atingi-la, tem ura valor opositive, £ o mai, embora tal cbstéculo seja outro ente, que também procura sua plenitude, mas que toma um veetor diferente do primeiro, ‘0 mal, como valor opositive, esta no ente, como o bem eomo valor positive. Bem e mal, na hibridez do existir, no devir, io produtos de actualizagdes de relacionamentos, mas tém am- hos uma positividade no ente; pois éste ente é enquanto ser, © bem, mas enguanto aflrmacio pde-se ob, ou pode por-ve ob n outro ente, Ease possibilidade, que 6 dele, traz um valor opasitivo ao que éle se opde. E uma positividade, mas ob, a outro, mas positividade do ente, na sua opositividade, nao én- quanto ser, porque 9 ser, que hi em tudo, é o sustentéculo de ‘alo, & um bem, por isso ens et bomum convertuntur, 0 ser ¢ ‘© bem se convertem, como dizem os escolésticos. © bem é o valor supremo do ser, enguanto ser. E todos os entes procuram-no porgue jf 0 tem. Temos a posse virtual a bem € 0 tem o ente, mas, como séres essencialmente pre- fisados e como partieipantes do ser, opomo-nos aos outros en- ‘es também participantes do ser; por isso, somos, neste mo- mento, de certo motto, um valor opositivo, mal. 0 que nos leva a desejar a plenitude do bem 6 proprio bem, que 0 ser em nds. O ser em nds é bem, mas nv sleanga 2 plenitude do bem porque somos séres existencialmen- te profixados. Portanto, @ perfeigao, a posse virtual da per- feigho, a nossa capacidade de timese paraditiea, nao é algo aye adquirimos pela experiéneia, mas algo que J trazemos em nds, emmsis do ser, vinincsis do'mundo da eternidade, amnésis die perfeigio, que nao adquirimos aqui no mundo da experién cia, mas aue femos, porque somes. © que adauirimos, o que formamos nds, é o esquema abs- tracto, 0 que estructurames operatiriamente através da accho cia nossa consciéneia. Nao € a nossa conseigneia da perfeiedo, que & a perfeieao. Ela independe de nossa conseiéncia, porque ela existe em nds, como em tudo, tenhamos ou fo conseiéneis, porque todo existir tem um s6 vector: busear a perfeiego do seu bem, 0 seu marimam de perfeigéo com o minimum de dis- péndio, de oposicionalidade. Deus, como ser supremo, mazi mum. & minimum, © como no ha um ser maior que ¢ Ser, é © masimum, @ como menor que ser é nada, néle mazimum e puimimann so identitieam. Por isso, 6 a maxima purfeigho, 0 ideal de todo o existir que, no homem, tomou consciéneia. Portanto, ha um impeto emergente em nos que vem das vaines edsmicas, que permitem que, no homem, onde o ser exis tencialmente prefixado tomou eonseiéneia, sureisse nas formas de religiae, 50 MARIO FERREIRA DOS SANTOS Gy Forman eta anstsSo, eancestria ao Tlie tntlgete joe ta novices = a0 Um cayae stats argomentam an ec iio prmne soe, oe nega o Imei a ban 2 amar eS minima raid Basta reponder apenas que eee a Dune sina un em, at ne motbdes, por Sanozbs= Seat eae, rou snpors TEMA mr aRriGo 1 DO NOSSO CONHECIMENTO DE DEUS 0 nosso saber dos objectos varia segundo @ funceionalida- de dy nosso eapirito (zous). Na funecéo da inteleetuslidade ha: um saber da singularidade, que nos é dado pela intuigio sensivel, direetamente, imediaio; © um saber mediato, discir- sivo, operatério, judicatdrio, que é 0 racional, A ndesis, na intelectualidade, realiza-se com 0 objecto, & gnasis, é eum-nos- ere, conchecer, a qual nos da Uma conteido, um nomee, imagem Cimago). Este € singular, por referir-se uo singular, que 6 prdprio da intuigio sonsivel, Hd, ademais, um noema ractonal, 0 contedido nemético ¢ factico no primeiro caso; & eidético (indicando a generalidade), no segundo. A néesis intelectual desdobra-se, portanto, em néesis intuitioa e néesis racional, Téda intuigio oferece, num grau maior ou menor, uma néest rracional, 8 qual a operagdo racional (com funegdes discursivas judicatérias) veduz ao esquema abstracto-cidético, da ra- A intolectu HA um saber sensivel, da sensibilidade, objectivo-subjecti- vo, pois € um saber com, um eonbecer, que é assimilade aos Csplemas do sensério-motriz, do mesmo modo que sio assimi- vlog os conhecimentos da intelectualidade aos esquemas inte- Jectuais, Base saber da sensibilidade, ao tornar-se canseiente, pode ser intelectualizado, e serve, portanto, de abjecto de co: Theeimento a operagio cognoseitiva intelectual, como j4 vimos mt “Paieologia”, Hi ainda um saber vivencial. pathico (de Pathos), a afec- tividude, em que a separabilidade sujeito + objecto se’estums, pia permitir maior fuséo, na vivéncia, que é um viver com, lum stber nivencial das coisas, mas um saber eonsigo mesmo, a je funeciona assim eomo um todo. (1) Bm toda, fio a0 2. A eaptagio do eldan, dan of de proporeionalidade da revs pie mia vert aleangar ea. coneeito 7™"6, ese estan na" Nooletia Ge oe em *Tratada de Esque. 52 MARIO FERREIRA pos SANTOS cas Ai gre gitaia obecng Go enc Sor fenettocua certeza, com téda a sua gama afectiva. Acme esa eee em seis ia, sabe, ee he trae co un ure, Canario" apa a re es amt, oman aero tere clad ttravée da batori do ponsamento tulip: 6 finale: ana ames ae ¢ ims, npn abe a om ne ag, dn mun sible at roten nada significando sendic a si mesmos, e n&o representando av Veet Seah Sea ee sume sito nade ae come flo 7 (1) A justitieagio desta aflimativa © a exposigdo sdive a tin et bition um verdadelro iinerariem ounticuny, @ por née extadado em Tr oaks de Sinden © HOMEM PERANTE © INPINTTO 53 identifieactio nfo muito remoto. Hse no ha, 0 simbolo nfo € simbolo, mas apenas um psettdo-simbolo, Por isso, poder-se-ia perguntar se hd um conhesimento simb6lico de Deus através do sensivel, j& que nao se admits 4 objectivacdo de Deus como cognosefvel através dos esquemas lo sens6rio-motriz, Neste caso, teriamos de dizer que, no pli no da sensibilidade, como conjunto dos esquemas do sensdrio. -motriz, como funccionamento primério do gue em biologin te chama orgenizacdo, nin hi tal conheeimento. Resta apenas que coloquemos 0 simbolo onde 0 simbols pode ser coloeado quanto A sua apreensio: na polaridade in. telectualidade-afectividade, E desde que 0 caloquemos ai, oll. tras sugestées surgem, Mas antes de analisé-las, examinemo. as diversas opinides que se oferecem sabre éste mano tema teoldgieo, que é 0 do conhecimento humano de Dens. Rostariam, assim, dois caminhos pare aleangar a Deus: 0 dla intelectualidade e o da afectividade. 0 primeito, permitiria tum conhecimento racional ow intuitivo-empitieo, 0 segimdo, ‘apenas afectivo. Pascal, por exemple, quando diz: "é-o core iio que sente Deus e nie a raxfo. Bis o que éa f6: Deus vem. sivel ao corngio © nfo & razd0”, coloca-te na posigdo atectiva Toda a vex que alguém aftrma que o conhecimento de Deus, pelo homem se processa pela afectividade, por uma expe- rlencia pathies, & classifieada como partidario We uma eeporitneta miatica de Deus, Os térmos mistica e mistieo so sobejamente conhecidos por nis. E sabemos que tém gles origem no verbo myetn, estar fechado, dai myd, ew oculto, myston, o que penetra mo ocalte, mystagoges, 0 que eonduz no veulto. De misticn vem imistério (mysterion), 0 que permanece oeulto, o que & sexredo, 2 due ndo é reveladn, 0 que exige que alguém procure, comece a procuré-lo, inieie « sua busta, que € o iniclado, 0 mystos, 0 ‘aye comega & procurar solver © mistério, B verdade que, na linguagem vulgar, emprega-se 0 téemo em outro kentido, © considera-se mfstien o que esta afectiva. mente préso a uma idéia qualquer, a qual no € justificada por meios operatérios, racionais, Também se considera como tal a atitude que nega valor realidade sensivel para devota-lo totalmente a uma idéia, a um desejo, ete. Em sentido teotogico, € mistico o que tem um conhecimento recto e experimentalmente afectivo da divindade, B uma intuiedo, portanto, um captar directo da divindade, vivido; e faaw_um conheeimento aperatérin, mediate, camo o racional, ba MARIO PERREIRA DOS SANTOS Chama-se de teclogia mistion a eidneia, enjo objecto ¢ a experigncia mistiea da divindade, a qual estuda as comunica- fgoes direetas entre a alma humana e divindade. 0 conceito de mistica J4 0 expusemos manitas vozes, mas hé necossidade de re- tornar a éle, aqui, a fim de tornar clara a nossa posi¢lo, para que se fundamentem as 1 ‘gue faremos afinal 0 estitico, em suma, nos 6 revelado através dos sentidos. Esta era a acepgio clissica do térmo, pois toda arte é wm en: deregar-se aos sentides, Os meios de captagdo do mundo sen- sivel so mein estétices (ou estésiens, como se podem chamer hoje, desde que se d@ ao termo esttico 0 sentido que The dio os estudos sobre a arte), Pode-se ainda ampliar 0 conceito de estético, incluindo em sua extenséio tudo quanto tem para nos uma presenca actual € que, como tal, © captamos, ° nfo pord émbolo, por exemplo, ¢ uma presence actual, para nbs, 0 simbolizado por éle referido, que se nos oculta. © simbolo, enquanto objecto, pode ser objecto da intuigfio sonsivel, mas, como simbolo, é um significante, Ao saber que algo é simboto, $4 se eapta de certo modo o culto, pois o sim- Hole lem wa linguagem de referencia, oignificativa, A estética 6, assim, uma mistica, pois ela, em suas mani- Festagées, procuta penctrar nos simbolos, E uma mistica do simbolo. Mas a wisticn 6 um aprofundar-se, cada vez mais, no sim- bolizado, Ora, no “Tratado de Simboliea", vimos que os sim- polos apresentam planos. O simbalo primario tem um simbo- izado, que, por sua vez, é simbolo secundério de outro sim- bolizado, que é simbolo tereiério de outro simbolizado, e assim sucessivamente. 0s grans de simbolismo silo os graus onde nos ‘Um passazo que vor contra uma tempestade pode ser simbolo da liberdade, ‘Temos ai um simbolo primério da liberdade ‘Mas, esse simbolo, por sua vez, aponta a outro simbolizado, pois, ‘no subeonseiente de quem 0 eria, o facto de afirmar que o sim- holo da liberdade € um pssaro zoundo contra a tempestade, 4 0 especifica de tal modo, que simboliza a vivéncia de quem fem uma Iuta contra obstaculos que deseja veneer para lber- tarse. © HOMEM YERANTE 0 INFINITO 85 Péssaro vosndo, como simbolo de liberdade, nfo é apenas um simbolo primério consciente, mas também ‘tereiario, pois aponta ao inconseiente colectivo humano, Tal simbolo surge tem todos os povas e em tdas as eras, e revela o anseio humano de voar, de ir além da prisio da superficie, que Ihe € um obs ‘tieulo, tm limite ao anseio maior de liberdade, no sentido pr rio’ de loeomocio, No “Tratado de Simbélica”, esindamos 8 outros sete planos do simbolo, que nes permitem passar do mbolo para 0 simbolizado. Podemos dizer, desde ja, aue todo simbolizado € simbolo de outro simbolizado, porque todos 03 séres participam das perfeides do Ser, que os analoga, 0 que favorece encontremos pontos de identifleacio, gue nos permi= tem construir uma dialéetiea analogica do profandas conse. giiéncias, ¢ compreender, afinel, que tudo & simbolo do Grande Simbolizado, 0 Ser Supremo (1). Desta forma, a marcha através dos sfmbolos sensfvels a0 simbolizado, o qual escapa aos sentidos, 6 mistica. E uma ¥ Sia mistica é sempre um penetrer no ovulio, no mysterion. A. pnistien Gy asi, im contr do mistéio, uma eaten do aime Com ates elementos, podemos agora examinar como se 4 a experiéneia mistica, Caracteristicas da experiéneia misticn A experiéncia mfstiea, na forma como & compreentida em geral, € antecedida pela passividade de quem a experimenta, Burger mayueles que levam uina vide de purifieagio, produip de uma ascese (exerecicio) de despojamento de tudo quanto & material, mandano, comm, Revelam tais experiéneias uma clareza ¢ uma obscuridade, um penetrar por entre trevas, um ¢larear de sombras mas sem luz. Falam os misticos em “luz nvisivel”, “treva luminosa”, e expresses semelhantes, Consistem mais em estados de alma do que em visdes in- telectuais; sio mais afectivos, portanto. Outro aspecto que também se evidencia entre os misticos 6 a forga de que dispdem. Em vez de fracos, so fortes, nfo ‘temem os peristos, enfrentam-no com humildade e seguranca, pois eonfiam em Deus, Explicaches da experiéneia mistica Todo aquéle que nfo experimenta estados misticos, tem naturalmente a tendéncia a néo admiti-os, Palta-lhe a expe- (1) ste tema 6 examinado, wo lado de grande polémica edbre “Filosofia Conereta” 56 ‘MARIO FERREIRA DOS SANTOS riéneia viva da realidade misties para que ela se torne sub- jectivamente evidente, Como nao € possivel negar que os mis Yieos conhecem eslacdos especiais, deve-se procurar explicd-los. A solugio mais simples ¢ declarar que tais estados meramente patolégiess © mérbides, Essa explicagko, de to facil, no expliea nada, Chareot @ Janet elassificavam o misticismo como histeria, 6 que nao teve grande éxito cientifie, sengo por algum tempo. iragas 48 yespostas precisas de Babinski. Janet, posterior rnente, explicava os estados misticos nela psieastenia, e, desta maneira, 0 mistieo, quer moral, quer fisieamente, nao passava dle um deprimido constitucional, com o eampo retraido, ao mo- worm.” Os frou viram apenas’ no amor mistco um flesvio do amor sexual ‘gumentos como tais procedem nos easos patolégicos, de cortos doentes mentais, que realmente revelam tais fraquezas Tisieas. "Mas hd casos, como o de Santa Tereza de Avila, que nfo apresentava fraquezas fisiens, pois era ela saudavel, re sistente. Os srandes misticos do eristianismo nfo mostravam ais fraquezas, Outzas explicam o estade mistiee por acedo do subeon: clonte, que revela, em cerios momentos, 0 trabalho que realiza invade 0 conseiente, dando a ilusao de’ uma fOrca que penetrss no ser humano, Bsin 2 explienglo de Delacroix, que, na verdade, natin expliea. Por que © subconsciente opera assim em uns © nfo em outros? Ademsis, as grandes iluminagées geniais, @ clareza que se forma sébre as trevas que perduravam, a realizagao estétiea superior, revelam-nos algo que no & apenas uma operactio do snbeonsciente, pois seria substanciatiza-lo, As inteligéncias que ultrapassam 0 quarto estigio até o Aécimo, 08 quais estndamos na “Noologia”, no eo explicadas apenas como um mero funccionar do espirito, pois revelam 2 presenga de aptiddes que ultrapassam ao comum. tendéncia, Freqiiente na ciéneia mal orfentada, que consiste em querer re- duzir 0 superior 20 inferior, caracteristica dos séculos XVII © XIX, © ainda neste, néo Soluciona nada, pois nao se pode explicar o mais pela menos. E preciso compreender que, ns aascese mistica, e nos estados pathiens do mistico, hé algo mais faue wim mero estado fisieo comum; ha um penetrar onde nao penetra o mais inferior, e nilo estamos sempre em face de de- fieiéneias e sim de profieiéncias, como revelam os realmente mrandes génios da humanidade e os misticos realmente grandes. 0 HOME PERANTE © INFINITO ar William James, em "Psychology", nos afirma que os es- tados misticos, que’ pertencem & actfio do subconsciente e do inconseiente, nao tém apenas uma explicagéo somaties, pois io um penetvar, um entrar em comunicagéo com outro mundo, Destn manvira, os {actos misticos silo irreduetivels nos factos estudadas pela’ psicologia, “0 homem yé claramente que seu eu superior ou potencial 0 seu verdadeiro eu. Chega a compreender que ésse eu su- perior faa parte de alguma coisa de maior que éle, mas da mesma natureza; alguma coisa que actua no universo fora déle, que pode vir-Ihe om auxilio e ofereeer-se a &le como um reffgio supremo, quando seu ser inferior naufraga” (William James) Outro no é 0 pensamento de Fechner, que James acom- panha ¢ apoia. Bem seus esturdos sobre a experidncia religiosa, prossegue William James: “LY — Os estados misticos, chegados ao seu pleno desen- volvimento, se impdem, de facto e de direito, com ums abso- Juta autoridade, aos que os experimentam, 2° — Por outro lado, nada obriga aos que nilo os expe- rimentam s acciti-los sem eritien, 3° — Biles se opéem, contudo, autoridade da conseién- cia puramente racional, fundada inicamente no entendimento fe nos sentidas, pravinda que nie aio mais que moos da cons ciéncia. Abrem uma perspectiva sdbre verdades de outra or- dem, as quais comos livres de erer, na medida em que corres- pondem a nossa vida interior”. Estudaremos a seguir as experiéneias naturais de Deus, © deixaremos para depois a eritica das opinides expostas, TEMA ur ARTIGO 2 A EXPERIENCIA NATURAL DE DEUS Ante a eritica a9 racionalismo, muitos conclufram que nio era possivel ter um conkecimento de Deus através da raz, pois se esta nos demonstra que a existéncia de Deus é uma Fealidade, nada nos diz sobre a sua esséncia, nem pode nos mostrar 0 que éle & Aleanca-se, assim, @ uma afirmativa ‘agnislice quanto ds possibilidates de conheeimento racional ou seja, da néeais moramente racional © movimento chamado modernista, na Tgreja, que foi com- batido por Pio X (Hneicliea Pascendi), negava pudéssemos saber alguma coisa de Deus. 6 pelo sentimento chegtivamos até éle, ou entio pela ex. pevigneia imediats. Deus nos € imanente.” "O conhecimento Peligioso 6 a experineia do divino operando em nés” (do Pro- Brama dos Modernistas) Um eélebre axinma esealistien dint quidauid recipitur ad motum recipientis reeipitur, 0 que € recebido o € segundo as disposigdes do recipiente. Chegamos a Deus porque ja 0 temos, do contrério, nunca © captariamos, Portanto, Deus nos 6 imanente. ¥ a 0} Ge Blondel e de Edouard’ Le Roy, que acrescentam ainda que Deus esté presente em todas as acgdes profundas do homem, Para Le Roy, as provas clissicas da existéncia de Deus sio jneficazes, pois quem eré em Deus nfo eré porque, rucionai- mente, 0 exeontna, mas por que o vive numa experiéncia inte- riot, através da tomada de consciéneia dos dadas obscuros, im- plicados nas exigencine du vida e da pratica. © pensamento conereto implica a erenca em Deus. E eis como E. Le Roy 0 prova: “Alirmar o valor absoluto do pen samento afirmar Deus: ora, toia corteza implica esta afir~ magao: logo, tado pensamento implica a afirmagéo de Deus”. Le Roy usa 0 silogismo, processo deduetivo racional, para provar a sua tese, que é proposta para dar a certeza de que ‘a raulio nfo 6 capaz de dar. © HOMES PERANTE 0 INFINITO Eo) Mas tal nao implica que o seu silogismo seja falso. A premissa menor é verdadeira, mas a maior: afirmar o valor absoluto do pensamento, convém distinguir, se afirmamos o valor absolut do pensamento (sentido amplo), como tal, ou se afirmamos o valor absolato do pensamento’como acto de pensar (sentido restrieto). Como amplo, concedemos, pois o pensamento é 0 sery como J vimos, em tédas as suas modalidades © afirma, por- tanto, sempre 6 ser. Como restrieto, como acto de pensar, néo tem tm valor absoiuto como tal, mas apenas 0 ser que néle apontado, Nao prova a adequagao entre éle e o sou contetido uma verdade, mas apenas uma eerteza, e a certeza, por se subjectiva, pode ser logicamente falsa, ‘A Dens chegamos, segundo éle, nfo pelo racioeinio, mas pela intima evidéneia. Poder-se-ia aeusar a tese de E. Le Roy de pretender con- lerar como imediato o que o nosso subeonsciente realiza atra- vés de operagdes discursivas complexas, numa rapidez tal, que nilo podemos perceber. Maurice Blondel reconhece 0 valor @ a necessidade das provas racionais, mas afirma quo 86 a acqo nos pode eonceder um verdadeiro conhecimento de Deus, ‘porque ultrapassa a frialdade da razio, que consiste numa tomada de conseiéncia. Desta maneira, 26 através de uma colaboraglo constante do pensamento discursive e do intuitive, podemos ter uma verda- deira idéia de Deus. Critica A verdadeira experiéncia mistica nfo é a patolégiea, mor ida, A penebracio no oculio, no que fica além do simbolo, oferece uma esealaridade; tem sraus, portanto. Penetrar no mais profundo até alcancar 0 que ultrapassa 0 cidetico, © ter uma Vivineia do mais intimo, temos opor- tunidade de estudar na “Noologia”, pois as estructuras mora rene intencionais, que 0 nosso espirito eapta, sem a esquem- tizagho efdética, nio podem ser examinadas aqul L&, ¢ estabelecido 0 estudo das inteliggneias superiores, ow soja, a eapacidade superior de nosso espirito em captar os pen~ samentos mais ceultos. Com ésse comhecimento, vé-se logo que a eritien uo misti- co, realizada pelos freudistas, e pelos que ainda seguem a linha dv Chareot ¢ de Janet, 6 grandemente descabida, valida apenas nos casos patoldgices. 60. MARIO PEREIRA DOS SANTOS Se ha séres, que ao sofrerem estados de deficiéneia fisien, julgam ter atingido o mais profundo, 0 verdadeiro mistieo profieiente, porque pode aleangar, através do existir, os sim- botizados mais ocultos, & fei, ante o que em espécie examinamos nagueles livros, observar quanto hé de positivo em todas as coneepedes. Assim, hi uma positividade no mistico, na coneepgio pragmatista de William James, no intuicionismo bersoniano, na teoria da 10 de Blondel, no imanentismo dos modernistas, como na teoria da acco de E, Le Roy, e, como ainda poderiamos. ver, nas eoncepgées do ontologismo de Thomassinus, de Gioberti, dos representantes do ontologismo mitigado, como Ubarhs, Hugo- nin, ete, Também estes admitem que temos um conhecimenty imediato e intuitivo. directo de Deus, ‘Também sao intuicio- nistas Max Scheler, Rudolf Otto, K. Adam, J. Hessen, M. La- os, 0. Grundler, na Alemanhi, ‘Todos admitem que aleancamos a divindade, através de caminhos irracionais, através de experiéncias religiosas. Os fildsofos da igreja catética negam tal intuigho, e ai fa admitem de modo sobrenatural pelos beatifieados, inalean- gavel nesta vida até pelos santos, salvo as excepedes de Moisés ede Cristo, Potemos, no entanto, dizer, que as posigies defendidas pelos misticos e pelos intutefonistas, que se fundam, portanto, hha frcnase afectiva ou no conkecimento do singular, Intuitive, haseiamese, em parie, na capacidade mistien que tem 0 ser hu= mano, em raros easos € certo, de captar, através dos simbolos, os simbolizados, até o simbolizado supeemo, que ndo & nem poss ser objecto de uma intuigéo sensivel da mistiea do despoja- mento dos simbolos, & algo que se realiza através do estado beatifico que invade subitamente um campo, onde sentimos Aesaparecer os limites e um penetrar no ilimitado, F um misto, portanto, de plenitude © de exaltagio, que oferece & alma humana satisfagdes desconhecidas aos que ape- nas se prendem ao mundo do esteético, e muito menos ainds aos que apenas se prendem ap mundo do estésico, que mo tem outro significado, sendo o de su presenea, mas que nao pode negur 0 prazer supremo que nos da a invasio no deseonhecido, satisfnggo que muitos t€im uma leve experiencia, quando con” seguem resolver um problema ou deseobrir algo deulte, ow des- vyendar um enigma. Essa satisfagko nos pode de leve mostrar 4 que experimentam aguéles que penetram no mais profunde, © ao aleangar, nessa marcha, a singularidade da unieidade, al- cangan aguéles momentos de intuiglo pura, que a erianea eo- © HOMEM PERANTE 0 INFINITO 6 nihece tantas véves, ¢ que nds $6 os conseguimos, em raros es- tados estéticos, quando captamos uma singularidade em téda fa sta pureza, em sna unieldade, sem assimilagio av geval (1) ‘Ao eaptarmos, no pereebermos algo, num désses raros mo- mentos de intuigo pura, em que o facto é senticlo por nés em sna extrema unieidade, sem que se dé sua imediata assimilaga aos esquemas eidético-noéticos, gerais ou aos estracturuis, to- mos wina sensagio esquisita de novidade, de unicidade; do finico, em suma, Tais estados #6 nos surgem em raros mo- mentos, como no orgasmo sexual, em certos imprevistos, que apresentam unicidade, oferecendo, entéo, um prazer intenso, embora rapido. ‘Téda universalizagio 6 um virtualizar a wnigidade e, por- tanto, um embotar a eapacidade de sentir o unico, e de ter, esse momento, a presenca viva da singularidade, com a sa~ tisfacao que nd pode ser transmitida por conceitos, mas qu> cala utn conhece em raros instantes de sua vida, como o sent ‘© grande artista quando capta o eternamente actual. |A penetracio no simbolizade oferece-nos momentos com. fais, instantaneos, H4 uma profunda experiéneia que o mis- fico’ conhece, na qual goza o prazer imenso da comunicagie com o Ser Supreme, deliguio inexplicdvel no eampo da pa- tologia Postos @sles temas, restanos agora exeminar 0 conhesi mento racional de Deus, 0 que iremos mostrar nas provas de sus existOneia e nas objecgdes oferecidas, Para os que se colocam na posiglo intclectualista, @ conhe- cimento sélido de Deus nos 6 dado pelo inteleeto, que & © mais analogo u éle e, portanto, © que melhor esté aparelhado para capté-lo, Nao negam os intelectualistas o valor da f6, nem fa intuigao da existéneia divina. Mas negam que nds,’ como ‘es humanos, ter de Deus uma intuigo cle sua esséucia. (a) No estodo dn Psieagtnese © da Nooginese, em “Noologia”, esaosinaiaoe éte ponto Smpovtantissime. A intuieho pura é de ravns instantes, Em née eVetizadas, tudo quanto eonhecemos, J esté eivady slo venetido, Por Saso, prssixamot da novidade, do imprevicto, do inespe- vals, para que experimentemos alum prazer. ‘A contezplagio de uma verdad, © goro que seutimes ao eaptar uma tim exemple de beatitudo imporfelts, aleangive! yelo (0 tema shx ection extulamion agai, rma em nes wy senha, ferege-n 62 MARIO FERREIRA DOS SANTOS Se tivéssemos uma intuicko imediata de Deus, teriamos um conhceimento déle, ¢ teriamas consciéneia désse conheeimen- to. Mas, na verdade, no temos nenhuma eonseiéncia dessa cognigio, portanto, niio temos um conhecimento imediato de Deus. Apesar das objeccdes apresentadas, as exposiedes, por nés feitas, sobre o fundo césmico da idéia religiosa, oferecem-nos Gialécticamente (incluindo 0 racional eo intuitive) uma visio, uma experiéncia da divindade, suficiente para conter em seu bojo, 0 que ha de concretamente positivo nas diversas eoncep- goes, sem desprezar o que elas, por abstractas, excluem, TEMA W ARTIGO 1 DA EXISTENCIA DB DEUS Por niio ser suficiente a muitos, a néesis pathica (a fr0- nese), com a divindade, e por nao terem éstes, conseatiente- mente, uma vivencia de Deus, a prova de sua existéneia exige outros meios, os intelectuais, para fundamenté-la, Deus nfo se prova, Deus 6 provado, dizia B. Le Roy. ‘Mas nem todos tém ess experiéneia de Deus. Nos perfodos de grande £6, no ha necessidade da prova da sua existéncia, Esta surge entre os tedlogos, quando ha uma creseente des- crenga e a #6 est ameagada, "Nao se destina, é compreensivel, Aqueles que ja fém Deus, mas apenas aos outros, aos que ainda duvidam, ads que ainda’ sentem vacilar as suas crencas. E tais argumentos, surgidos em diversas ocasides em que hf perigo de deserenga, tomaram tal vulto e tal forma, que hoje os argumentos em favor da existéneia de Deus, eonservam apenas 2 autoria da origem, mas siio do patriménio comum do pensamento humane. Sio imimeras az provas apresentadas, bem como os argu- mentos opositivos. Iremos expor as principais, acompanhadas dos argumen- tos favordvels e dos eontrarios, fecendo, sempre que canvenien- te, uma critica aos argumentos expostos. Quanto & ordem de apresentagdo, usaremos 0 método mais emprezada, que ¢ 0 de dividir as provas em: 1°) a priori e 2°) @ posteriori. Outros costumam dividi-las em provas me- tafisieas, pravas fisieas e provas morais. Mas 0 que nos inte~ ressa nfo sfio as elassifieagées, mas as provas, As provas @ priori silo as que partem de nogées que ine cluam ums existénela, ¢ ndo de um facto da experigneia, como procedem as provas @ posteriori. As provas a priori fundam-se no principio de ientidade, enquanto as outras fundam-se no de ru2Go suficiente, Antes de procedermos a anil e das diversas provas e Ae afore’ idas, teriamus que partir da solugdo de um di- fut 1 MARIO FERREIRA DOS SANTOS lemma: ou Deus & evidente, ou nfo & Se é evidente, nav hi nocessidade de provar a sua existénela, Se no 6, eonvém pro ‘vila, Mas 6 cemonstravel a existéneia de Deus? Bis outra pergunta que exige resposta. E se é que é em suma, Deus? Procedamos, pols, na anilise dessas perguntas © fas ves. ‘postas eorrespondentes, Vejamos a primeira pergunta: se a existéncia de Deus é verdade de evidéneia imediata, ‘Ao responder pergunta de tal importaneia, diz-nos Tomice le Aguino que uma proposigio pode ser evidente de duas ma 12) om si mesma (secundum se ou quod se) © quanto-a (quoad no8) ; ou 22) sé om si mesma e nfo quanto & nés Uma proposicao ¢ evidente quando 0 predicado esta inchui- fo no coneeito do sujeite, eamo, por exemplo, "o homem € ani mal", porque animal entra no coneeito de homem, Por isso, acrescenta Tomas de Aquino: “Se, pois, todos conhecessem x natureza do sujelto e a do atributo de uma proposicdo qual- faner, esta seria evidente para todos, como o silo os primeiros prineipios, eujos térmos, ser e nao-ser, todo e parte, e outros pareeidos, so coisas tio'sabidas, que ninguém as ignora. Mav, se hi quem ignore qual é a natureza do sujeito e a do predi cada, @ proposi¢sio em si mesma seri, sem davida, evidente, mas no o sera para aquéles que ignoram tais extremos: e por sso sucode, como diz Bogeio, que hé coneeitas comnns ite 85 evidentes pars os sibios; por exemple, que 9 incorpores nao weupa Pega Por conseguinte, digo que a proposigdo Deus existe, om si mesma, 6 evidente, porque nela o predieado se identific: com 0 sujelto, jf que, como adiante veremas, Dens ¢ o seu prio ser. Mas quanto a n6s, que desconhecemos a naturez: diving, nio 6 evidente, e sim precisa ser demonstrada por meio dde coisas por u68 mais conhecidas, embora, por sua naturezs, sejam menos evidentes, quer dizer, por seus efeitos Acoiin Tomas de Aquino que temos certo conhecimento eontuso da existéncia de Deus. Deus 6 sentido como a felici- dade, e 9 homem a aspira, Mas nfo ¢ tal coisa eontecer a Deus, pois muitos podem acreditar que a sua Felicidade esteja nos praveres, nas Figuezas, ou em qualquer autra eoisa, Desta. forms, conelul que a verdade, em geral, existe, o ue ¢ evidente; nao é porém, evidente para nos que exisia « yerdade suprema, Portanto, precisamos demonstrar a existéncia de Deus, porane, pele simples coneeito dat essneia divina, nto podemos (© HOMES PERANTE 0 INFINITO 65 ver se a existéneia real Ihe convém. Ora, 0 predicado nao pode ter maior realidade que 0 sujeito, “Deus existe”: nesta proposic¢do, Deus tem uma realidade de representacio no de intuigio, desta forme, o predicado agui convém a Deus em co~ gitacdo, em idéia, nao em realidade; portanto, a prova da rea- idade de Deus exige outros caminhos que nfio o simples enun= ciado da proposigdo “Deus existe”. ¥ possivel demonstrar a existéncia de Dens? N&o se acei- ta Deus pela £6? Bo que é de #8 nao se pode provar, porque 86 podemos ter £8 no que nfo vemos, pois erer no que se Ve, no & ter #6. Além disso, no podemos saber 0 que Deus é, ‘mas apenzs 0 que nfo é. ' Portanto, como 6 possivel demons- trar a existéucia de Deus? Além disso, s6 poderiamos tentar cemonstrar a sua existéncia por seus efeitos. Mas tais efeites so parciais, € nfo tém nenhuma proporesio com éle, j4 que o considerames infinite ¢ os efeitos so finitos; e que proporeao pode haver entro 0 finito eo infinito? Da mesma forma que ni se pode provar uma eausa por um efeito, que Ihe € des- proporeionado, como possivel provar a exisiéncia de Deus? Ante tais objeccdes, surgem diversas respostas. Ha duas espéeies de demonstragio, esclarece ‘Tomés de Aquino: wma que se baseia na causa, e discorre partindo do ‘que em absoluto é anterior em direegio ao que é posterior (ar- gumento a priori) ; a outra parte do efeito, e se apoia no que € anterior iinicamente com respeito a n6s (a posteriori) Desta forma, partindo de um efeito, podemos chegar ac conhecimento da eatisa ¢ da site enisteucia Quanto & demonstrabilidade da existéncia de Deus, pode- mos eneontrar as seguintes posiges: 1") nexa-se, porque nfo hi nexo de eausalidade entre Deus @ 0 mundo; hé tma falta de meio objectivo; 22) se hé © homem no & eapaz, por falta de luz e forgas, de partir dos efeitos para alcangar a causa. © primeito argumento & o dos agnésticos. Os tradicions- lisias, que se apoiam na #8 usam o segundo argumento, bem como também os kantianos, © 03 modernistas, que aceltam ape- nao sentimento, a vivénela de Deus, nfo sendo, portant, ateistas, Sabemos que o efeito é semelhante ao agente que o realiza, sequndo a forma como opera. O efeito subordina-se e depende dda eausa que o produziu, "OG conhecimento do efeite leva lo camente ao conkecimento da causa; o conhecimenta da subor- epenidéneia actual do feito, ao eonhecimento, a0 into perfeito ou imperfeito, mas proprio, da matures seattmdo se trate de efeitos univoeos cu analogs. A. 66 MARIO PERREIRA DOS SANTOS dependéncia actual de um efeito nos descobre a existéneia de Sun casa; ea semelhanca mais ou menos perfeita, que tem com a causa, nos manifesta, com maior ou menor perfeigzo, 0 natureza da'mesma” (Franeiseo Muniz) Nima demonstracio « pasterior’, 6 efeito, como depen- dente e subordinadto de uma causa, é, por nés, melhor eoahecida gue esta, que seré conhecida por aghele, e 0 inverso se dard numa demonstracio « priori. Para que uma causa soja demonstrada por seus efeitos, se impéem 08 seguintas requisttos 12) que essa eause tenha efeitos; 29) que ésses efeitos, formalmente considerados sob a ra- zo de dependéneia e de subordinagéo, sejam mais eonheeidos due a caus Toms de Aquino, por ser realista (¢ earacteroldgica © morfo-psicoldgicamente 6 evidencia o seu biotipo) aceita que a existencia de Dens nfo pode ser demonstrada a priori, (por- que néo € ua efeito de uma causa, pois & incausada, e existe por virtude de sun propria esséncia), mas apenas a posteriori, porque tem efeitos, ° estes séo mais conhecidos, e déstes pode” ‘mos partir para aleangar a existéneia de Da B pelo principio de causalidade que chesaremos & prova, da existineia de Deus. Combater éese principio, ¢ atirar-se no agnosticisme. Admitilo, 6 aleangar Deus inevitivelmente (1) E, assim, diz Tomés de Aquino: “Embora, pelos efeitos desproporeionadios «uma caust, nao se possa tor um eonbeel- mionto pesfeito dela, could, yor ui efeito qualuues, pode de monstrar-se, sem eaher dividas, a existéncia de sua’ eatsa, ©, ste mado, 6 possivel demonstrar a existéncia de Deus por seus efeitos, embora éstes nko possam dar-nos a eonhecer, ta © principio de causalidade pode nos levar a saber que Deus existe, © é # primeira causa e sitimo fim de todos os séres do universo. Sho éstes os prefimbulos da £6 (preambata Fidei) de Tamas de. Aquino. ‘Todo o ente é intcligivel, Admitida a entidade de Deus, esté admitida a sua inteligibilidade. Mas a entidade de Deus € infinita, portente, a inteligibilidade soré infinita, Mas a ldéia de inteligibibitade implica escola, separacio. Uma inte- ligibitidade infinite excluirin escolha, separagdo, Consogilen- (1) A secitagio da valides ineoatestavel do prinsfyio de eausalida die vara a prova da existéneio de Deus, por parte daa tomistes, eva o3 Steiatar dos titios aéeulos a ataci-lo vigorosamente, convieios que, diste odo, dervuiviam completamente a dniea base sélida para provar a exis- tineia de Dene, (© HOMEM PERANTE 0 INFINITO temente, Deus nio ofereeeria para nés uma inteligibilidade pro- porcionsil wa entidade Ova, Deus, em si, é suma inteligibilidade (quoad se), mas ‘quvnd nos (para nos}, & preciso entio distinguir: se em pro. poreio a nés (nn proporgao dos noseos esquemas), concords-sey mas como um conhecimento perleltamente adequado a. le erase” este enso, surge uma pergunta: qual 0 nosso conhecimen- to aoe pergunta: 4! conhecimen A adequago do nosso conhecimento dopende de nossos esauomas, -Portanto, hit una’ adequagao ‘fuowd nos once (quanto a 16s todos), isto &, captavel a todos, e uma adequs go ouoad nos sapicntes tantum (para. alguns de n6s. 08 bios). “A. evidénela de uma verdade é assim proporcionada quem a tem, ou a quem a capta, A verdade de Deus, para Deus, ¢ infinite, porgue 6 em si (quodd se); para nés (quoad nos) € proporelonada, Caloeatio 9 tema até aqui, podemos disp a), € possivel a demonstiacio da exislOnc de Aquino} 1) mio 6 possivel (a dos agnéstcns em sera Ms argumentos expostos mostram-nos que hé uma possi- bilidade proporeionada’ entre inos-e Deus. hima. proporgao de simbolo e de simbolizado. Partimos do efeito-simbolo para dleangar o simbotizado. Nas relagdes entre causas ¢ efeitos uunfvoeos, isto é em que o efeito é igual causa cause gout offectum fo axe i estidatnon em “Pitre. Coomovisto™), lentificagao. Na relagio andioga, que pode surgir apenas transtormagao, Na telagio cousa est effectus (causa 6 ofeito), estamos em face de analogia. A eausa é parcialmente 0 efelto, po éste tem um ponto de semelhanga com a causa e outro de @ ferenea. Os efeitos que conhecemos sio finitos, ea idéla de Deus implica infinitude; portanta, os efeitos de Deus (estes ‘que “aqui e agora” conhecomos) ‘so conseqtientemente and logos nfo univons, Accitar'a univocitads geri ete no pan- cismo. Nao aceité-la, 6 colocar-se ema outta posigdo, que’ aos 1poueos teromes oportidade de bem esclareeer. Se 0 simbolo so identifieasse com 0 sltnbolizado, teriamos 4 presenga actual do simbolizado. Ora, 0 simbolo nfo 6 total: monte o simbolizado. Neste caso, o simbolo é simbolicamente ainalogo, portanto), proporeional ao simbolizado, - Ora, pode mos chegar go simbolizado gragas 20 simbolo. Bi se tal pode. mos, wartindo dos efeitos, qhe aio sinais mals proporeionados, tpockmos eheyar proporcionadamente 4 eausa,” Seo simbol®- aula (Detes no m0ss0 eas0) € infinite e 08 simibolos 0, aon em dois lados ia de Deus (po- 68 ‘MARIO FERREIRA DOS SANTOS nos, finitos, éstes nfo podem dar um conhecimento proporcio- nado de Deus, nem 0 eonkecimento quoad se déle, que 8 Dens poderia ter endo n6s, porque eonhecer, para nés, @ intelee- {oalmente delimitado, O mesmo se daria na relacio, causa efeito, 86 a fusko com Deus, o bakhti yoga nos hindus, a eatitude dos misticos, nos levaria a Ble, e ao conhecimonto beatifies, por Tusio, fronese mistiea com fle, o que a Tgreja nega ser possivel 20 homer, enquanto tal, pela limitagdo de sua propria natureza, Niio potlemos deixar de aceitar que a verdade existe. Ou- amos Tomis de Aquino: “E evidente que existe a verdade, porque quem nega sua exist@neia concede que existe, pois sé A verdade nfo existisee, seria verdade que a verdade nto exis. toe 6 claro que se algo 6 verdadeiro, 6 preciso que exista a vyerdade”, "A verdade existe pelo menos quoad se. Resta saber se existe quoad nos. Deus & a verdade, teremos de ndmitir. Chegariamos, entio, neste caso, a aceltar que hé uma evidéneia imediata de Deus, Mas, responde Tomés de Aquino, quo é evidente que a verdade, em feral, existe, mas no o & para nés que existe a verdade suprema. Portanto, em faco de tudo quanto dissemos, hi necessida- de de provar a oxisténcia de Deus. ‘As posic6es intuicionistas de Deus, a dos tradicionalistas, ete., nao as desmerece Tomis de Aquino, que as classifica como conhecimentos confusos da existencia ‘de Deus. | Precisamos, tno entanto, ter um conheeimento oxacto, adequado 2 todos os nossos melos, ¢ dste exige a prova. Os tradicionalistas respondem que nfo ha tal necessida- de, pois a verdade da existéncia de Deus foi revelada, ¢ ha 0 consensus humano. Mas éase conaersus niio 6 suficiente, pois nem todos 0 aceitam, Portanto, é preciso provar. A evidin- ia é que vale, ¢ nao a autoridade do género humano, que nfo 6 sufieiente para dar a ovidencia, Aceitar, por eiéneia infura fou por iluminagdo, ndo € bastante por falta de validez univer- sal, afirmam os tomistas, Portanto, consideramos as provas a priori em primeiro lugar, ¢ depois estudaremos, em especial, as provas de ‘Tomas de Aquino, as famosas cinco vias, aproveitando a oportunidade para, apés os argumentos, colocar os que os objectam. Ea Capitulo especial, examinaremos © pensamento de Duns Scot, ‘cue, por sta subtileza, exige que sejam primeiramente estuda~ das as diversas maneiras de colocar as provas da existéncia de Deus, ja que aquéle contribui com novas vias para a sua de- monstragio, TEMA Ww ARTIGO 2 ARGUMENTO ONTOLOGICO DA SXISTENCLA DE DEUS Como vimos, parte-se, nas provas @ priori, nfo de um facto da experiéncia, mas'de uma nogdo, ou, segundo Tomis de Aquino, de uma causa para explicar 0 efeito, Apoiam-se tais argumentos no principio de identidade, Desde Plat&o, na filosofia grega e através de Santo Agos- tinho, e modernamente em Descartes, é aceito que dispomos de um conjunto de idéias, independentes da experigncia, as quais nos permitem propor uma prova @ priori de Deus. Aristételes, Tomas de Aquino ¢ os racionalistas-empiristas rejeitam ais provas, para aceitar apenas aquelas que se fun. damentam 4 posteriori (1). Nossa critica dialéctiea, através de nos trou que a unilateralidade, tanto dos aprioristas eomo dos apos- ‘erioristas, surge de uma visdo abstracta e ndo conereta da realidade, tanto das idéins como dos factos do mundo empirico, pow aquélas podem ser tratadas coneretamente, como amda ‘veremos. compreendemos que os esquemas, que presidem priv mento a nossa experiéneia (pois nao poderiamos eonhecer, similar nada se nio tivéssemos esquemas prévios acomodados) so éles construfdos, como o mostramos na “Noologia”, através ‘ia propria experiencia, o que implica uma contomporaneidade ilo esquema aecmodado com o facto assimilado, torna-se, desde Jogo, elaro que nfo hi um conhecimento absolutamente’ aprio- istico nem absolutamente aposterioristice, Um nfo se dé sem 0 outro, Hi esealaridade, pelo maior papel que exerca o esquema préviamente dado sobre 0 conhe- (1) © um Gx conaiderar as idéian inatas, em Platio, eomo 34 vstrueturadas em nés. Ha er ns uma eptidio a formé-las, 2 esquema- eklas, a dowvelé-lae, las esto como “esquecidas", mas virtuais. Sua veteueturagio nfo pode vir do estimulo exterior, pois no hf ineoeporario, iene portant, aoe, em mie alta ae Teale, e Base alge este de ho viotualy pele sui Hoi o que sinus om *Teorin do Cheherimenta” cn MARIO FERREIRA DOS SANTOS cimento, ou o estimulo sdbre o esquema. Mas se actualizamnos um e virtualizamos 9 outro, eometemos um Orro, Ura visio verdadeiramente dialéctica tem de fundar-se numa posigao real- -idealista, que afirma a presenca, a contemporane'dade dos dois aspectos, ¢ a sua reciprocidade, sem ox quais no seria possi- vel estructurar-se nenhuma forma de conhecimento. xaminemos um dos argumentos mais debatidos da teo- logia: © argumento ontolégico de Santo Anselmo, sobre cuja analise nos demoraremos, devido is incompreensdes que pro- Verificaré o leitor, se prestar a devida atengio A segiién- ia dos raciocinios que iremos expor, que éste argumento tem sido o eseolho de muitos pensadores, que, por ndo o terem en- tendido em t0da a sua pujanga, modificaram-no uns, refuta- ram-no outros, com argumentos inadequados, e desprezaram- -no muitos. Alongaremos esta parte, porque se impde o sea exame cuidadoso.Reprodusiremos ‘af yalavras de. Santo” Anselmo; Dosteriormente, uma sintese da critiea de Gaumilon, que se tor- nov indevidamente famosa, e, finalmente, uma sintese da res- posta de Santo Anselmo. ‘Teceremos alguns comentarios que facilitem a boa compreensto déste importante argumento, © evidenciaremos, par! pasiu, as falsificagées que ele sofren. Desejamos, desta forma, fazer justica ao grande pensador de Bee, tantas vézes incompreendido, mas que revelou, através désfo uraumento, um dos pontos mais altos do pensamento teo- légieo, « uma sugestin que ainda nao deu todos os frutos pos B verdade que éste argumento surge muitas véves na filosotia, modifieado por um ou por outro, como o foi por Descartes, Mas az {nvestigaches hhst6ricas’ mostram-nos que sie nunca len obra apologétiea de Santo Anselmo, como znem fampouco a leu Tomas de Aquino, Sfio tais razées que lovaram a éstes a nfo captar em toda ‘a sua intensidade ¢ extensidade a grandera déste argumento, que é @ priori, mas que possul uma base de experiencia e de posterioridade, virbuslizada & visio formalista, nfo porém, 2 Sialéeticn. B se nos prolongamos, estamos certos de que fazemos jus- tiga ao argumento, tantas vézes combatido. Quando expuser- ‘mos as refutagées Go Gaunilon, teremos oportunidade de acres- centar outras que foram propostas, que, em suma, sho apenas corroboradoras dagueles argumentes, com pequenas variantes. Antes de expormos, com as prdprias palavras de Santo Anselmo, o seu Jamoso arzumento, desejamios chamar a aten~ © HOMEM PORANTE 0 INFINITO a edo para o estilo em que ¢ vazada essa ex da maneiva dialéctiea de expor na Idade Media, quando ainda perduravam as eoneepedes platinicas. O estilo & pesado, e, em muitos pontos, de bem dificil compreensio, Impdese uma leitura muito cuidadosa, paciente, a fim de que possamos aco- modar nossos esquemas aos esquemas dessa época, permitindo, afinal, uma inteligéneia eabal do assunte, por meio de uma assimilagio que, de inicio, ¢ dificil, igho. ‘Trata-se Se se compreender a posigio filozética de Santo Anselmo, que era de influéneia agostiniana, platonica em muitos asec. tos, poder-se-ia dizer que, desde que nos mostra éle a realidade de uma idéia (¢ realidade agui em genuino sentido platénico). a realidade da existéneia esta conseqiientemente provada, Os seus adversérfos frdo esprimir arguments provindos do mundo empirico, do tetratimensional, para combater 0 que & por Santo Anselno, colocado transcendentalmente. A exise téncia da idéia do ser “que nada de maior se pode conceber” nfo impliea uma existéncia 6ntica, mas uma existéncia onto- Sgica e transcendental, Nio pretendia, ecm ésse argumento, 4 nos térmos existenciais das coisas tempo-espaciais, existéncia désse sor. Foi 0 que nfo compreenden Gaunilon, que esgrimiu, ao objecté-lo, e como 0 fazem ainda outros, do ponto de vista empirico, argumentos fundados na experiencia, quando Santo Anselmo apenas queria fandar-ce numa die: a de que podemos coneeber im ser que nada de maior pode ser concebido, ¢ dete ser & Deus, que necesssviamente. evista, transcondentaiments a nbs, mas sustentaculo e subsisténcia do ser infinite Oucamos, primeiramente Santo Anselmo: avgumento entotigien Este argumento ¢ oxposto assim nos eapitulos que abaixo traduzimos do "Proslogion”. “Capitulo I — Que Deus exlete verdadeiramente, emdora 0 insensato diga em seu coracdo: “Deus ndo eaiste”. Pois, Senhor, Tu, que das @ intelig@neia de £6, concede- -me, na medida em que sabes conveniente, que eu compreenda que Tu existes, como nés 0 cremos, e que Tu és tal eomo ere- mos, Ora, eremos que Tu és algtima coisa tal, que nada de maior pode ser concebida (polo pensamento). ‘Trata-se de sa ber se existe uma naturera semelhante, porque disse 0 ineen- suto em sen eoracdo: “Deus néo existe?” (Ps, XM, 1). Mas, cerlamente, ésse mesmo ingensato, quand entenda o que eit digo: “Alguma eoisa de que mula de maior pode ser ponsada 2 MARIO FERREIRA DOS SANTOS compreende 0 que ouve —e o que éle compreende est em sua {nteligéncia, mesmo que nfo compreenda que tal objecto de seu pensamento existe. Pois, 6 uma coisa ter a idéia de um objecto qualquer, e outra, compreender que ésse objecto existe. Quan- ddo-o pinior pensa de antemio no quadro que vai fazer, pos- suino em seu espfrito, mas sabe que ainda nao existe, pols ainda nfo 0 exeeuion. "Mas, apés havé-lo pintado, éle néo 86 © tem em sua intelizéncia, como sabe também da existéncia do que éle féz, 0 insensato também deve convir ue éle tem, a0 menos na inteligéneia, alguma coisa que éle no pode con: eaber outra que The soja’ maior, pois, quando ouve tal pensa mento, dle 0 compreende, e tudo quanto é compreendido esti nna infeligéncia, Mas, cettamente, 0 que nada de maior pode ser coneebido, nfo pode existir somente na inteligéneia, Com feito, se existisse apenas no espirito, poder-se-ia coneebé-lo como’ existindo tambem na realidade; 0 que seria superior. Portanto, se o que nada de maior pode eer coneebido eit sb- mente no espirito, Gese mesmo que nada de maior se pode con- ober, 6 alguma coisa que outra maior se pode eoneeber — o que nfo seria, portanto, uma conclasio legitima. Existe, por- tanto, sem qualquer divida, alguma coisa.de que nada de maior se pode conceber, nem a inteligéncia, nom na realidade, Capitulo IIT — De como ndo se pode pensar que Deus néo existe. Pelo aue acabamos de dizer, Deus existe tio realmente, ‘que niio se pode pensar em sua néo-existéneia, Porque, po: de-se coneeber um ser tal que nfo possa ser pensado como nfo existente na realidade, e que, por conseguinte, & superior Aiguele cuja idéia no implica necessiriamente a existéncia, Bis por que, se o ser, acima do qual nada maior se pode conceber, & passivel de sor considerado como niio existento, so- gue-ce que éste ser, que nio tinha igual, ja no é 0 acima do gual nfo se pode conecher coisa maior, conclusto necessaria- mente contraditéria, Bxiste, portanto, verdadeiramente um ser aeima do qual nio podemos conecber outro maior, e de tal ‘maneira que nio se possa sequer pensar como nio existente; éste ser és Tu, 6 Deis, Senhor nosso! Existes, pois, 6 Senhor, Deus meu}, ¢ to verdadeiramente que no 6 sequer possivel pensar-Te como nfio existente, @ com Tazo. Porque, se uma inteligeneia pudesse conceber algo que fésse melhor qhe Ta, a criatura se elovaria por cima do Cria~ dor, e viria a ser 0 seu juiz, o que 6 absurdo. Ademais, tudo, menos Tu, pode, pelo pensamento, ser suposto como nao exis- tindo. A'Ti 6, entre todos, perience a qualidade de existir (© HOMEM PERANTE 0 INFINITO Rm verdadeiramente, e no mais alto grau. Tudo 0 que néo és Tu, niio possui mais que uma realidade inferior © recebou o s em menor grau. Por que, entiio, 0 inacnsato disse em sew co- rago: Nao ht Deus, quando 6 to facil a uma alma racionsl compreender que existes, mais facilmente do que tédas as coi- sas? Precisamente porque 6 insensato e sem inteligéncia. Capitulo IV — Como o insensato disse em seu coragao © awe niio se pode pensar. Maa, como o insensato disse em seu coragio 0 que nfo pode pensar ou como nfo pode pensar o que disse em seu co- ragio? E se se pode dizer verdadeiramente que pensou, pois © disse em seu coragio, e ao mesmo tempo gue nio 0 diss2 fem seu coragdo, ponjue nfo pode pensé-lo, 6 preciso admitir que hé muitas manciras de dizer em seu coraedo ou pensar. Ponsa-se de distinto modo uma coisa, quando se pensa palavra que a significa ov quando a inteligéncia percebe e compreende propria coisa. No primeiro sentido, pode-se pensar que Deus niio existe; no segundo, nfo. Aquéle que compreende o que 6 Deus, nio pode pensar que Deus nio existe, embora posca pro- nunelar estas palavras em si mesmo, ja sem atribulrlhes.ne- nhum significado, jé atribuindo-lhes’ tm significado estranho, porque Deus é um ser tal, que ndo se pode eonceber outro maior gue Ele. O que bem eompreende isto, eompreende ao. mesmo tempo que tal ser niio pode ser conechido sem existir le facto Por conseguinte, aquele que compreende estas eondigées da existéncla de Deus, néo pode pensar que nfo existe, Gracas, pois, te sajam dadas, 6 Senhor! Porque o que er a prinefpio pelo dom que me fizestes, compreende-o agora pela Juz com que me iluminas, e ainda quando nao quisera ever que existes, niio poderia con¢ebé-lo”. Numa nota a éste capitulo, Julian Alameda tece éstes co- mentérios: “O sentido exacto déste capitulo é 0 seguinte: Se alguém representa a Deus de maneira vaga e defeituosa, pen- sando no que uma definieao puramente nominal ou gramatical de Deus pode dar a conhecer, poder cair, ser contradizer-se, que Deus nio existe, Mas, se fixar seu pensamento sobre a propria coisa, que é Deus, ou sébre o que a definigéo real Deus expressa, a saber, que Deus é 0 ser infinitamente perfe' to, no Ihe ser possivel, sem cair em uma contradigéo formal, pensar ou dizer que Deus ndo existe, porque diria que aqudle, ue € intinitamente perfeito, nfio existe, Este 6 0 pensamento de Santo Anselmo, E exaclo? Se entende que nosso espirito io vé mais que ume idéia-imagem do ser perfeito, seu racio- 1 MARIO FERREIRA DOS SANTOS cinio seria falso, Porque, nessa hipétese, poder-seia pergun- tar, sem cair em nenhuma contradicao, se existe realmente um objecto que responda a essa imagem, j& que antes de dover admitir a existéncia de Deus sdbro o’testemunho dessa idéia, seria necessirio demonstrar a fidelidade desta sltima”. Antes de fazermos nossa erftiea final ao argumento onto- logico, vejamos as razdes apresentadas em favor do “insensa- to” por Gaunilon, a defesa de Santo Anselmo, e, finalmente, as criticas mais célebres que Ihe foram enderegadas. Ax objecedes de Guxniton As objecgdes de Gaunilon fundam-se numa série de argu: mentos que procuraremos sintetizar com = méxima elareza, pois o seu pensamento ohscuro é sempre uma das maiores di- ficuldades para todos quantos se debrugam sobre o texto, Toma éle a defesa do insensato. Nao que niio creia em Deus, pois um monge, mas apenas nega valor probative ay argumento ontolégico, também eonhecido por argumento a si- moulteneo. Partindo do principio de que existir na Inteligtncia e na realidade 6 mais do que existir apenas na inteligencia, se 9 objecto buseado esté apenas na inteligéncia, seria menor que © outro que estivesse om ambas. Neste caso, ee 0 objecto bus- cado existir apenas na inteligéncla, nfo seria o maior de todos, © que contradiria 9 conceito que déle temas. Portanto, segue. “so dagui, como coisa necessaria, que 0 que 6 maior que tudo © mais, cuja idéia esta na intoligéncia (0 que j8 se provou), deve existir na realidade, pois, do eontravio, nao seria. maior éo todos. Ora, afirma Gauniion, se um objecto esti no espirito, apenas porque compreendemos as palavras que o exprossam, nko devemos esquecer que muitas coisas falsas ¢ inexistentes podem também ser compreendidas ao ouvir #s palavras que ag expressam, ‘Haveria diferenga seo objesto de gue se trata nfo estivesse nas mesmas condigies das coisas falsas, no sen- tido de que, nao somente, compreendem as palavras que 0 ex pressara, eomo também, que o seu sentido, 0 seu objecto, esta ‘ha minha inteligéneia, em eujo easo eu no poderia pensi-lo sendin compreenilendo que existe. © HOMEM PERANTE 0 INFINITO 6 Distinsue, aqui, a simples inteligdneia das palavras, ea intelig@ncia do proprio objecto, que, neste caso, implica sua existencia. Portanto, ha 0 objecto pensado, e o objecto como cexistente, Admite, ainda: 2) que se pode pensar na nfo existéncia de Deus; b) pode-se desconhecer a existéncia de Deus; do con- trGrio, para que haveria preoeupacao em demonstré-la? Mas j& aqui, modifiea o pensamento de Santo Anselmo, no “Prosiogion” éste no fala ainda em Deus, mas apenas ser que esti acima de todos os sdres, aquéle ser quod ‘mains cogitart non potest. 0 argumento seria vélido, continua Gaunilon, se se fizesse uma prova ineontestavel, que éste objecto 6 tal que nfo se pos- sa, nem de leve, duvidar de sua existéneia, deste 0 momento fem que é pensado, e nao apenas que existe na minha intel ia, porque a inteligencia porteria, como pode, eonter idéias duvidosas ¢ faleas até, embora compreendidas, quando pronun- ciadas as palavras correspondentes. Assim, 0 pintor que pretende realizar um quadro, tem-no ‘apenas na inteligéneia, e $6 quando o realiza dé-the uma exis- ‘téneia. ‘Como nko conhego 2 Deus, néio poaso também eonduir a sua existéncia pela analogia com algo que The seja parecido, pois Santo Anselmo afirma que Deus é tal que nada pode ser- she semelbante. Se ougo falar de um homem que me é deseonheeido, posso contudo representi-lo como um sor real, segundo a idéia de homem. Mas poderia tal homem no existir, apesar de eu jé t@lo represontado sob a imagem de algo verdadeiro, E se nto exa o homem em particular era, contudo, um verdadeiro ho- mem em eral, Mas, quando ougo dizer que Dous € 0 ser maior que qualquer outro, no posso ilo na inteligéneia e no pen- samento de uma maneira facil como, por exemplo, posso ter do homem de quem se falou. Podenios pensar no homem como um ser completo e vei dadeizo, porque esta idéia nos 6 eonbeeida, mas de Deus ja tenho que falar por intermédio de uma palavra da qual nlio se pode em absoluto, senfo difieilmente, deduzir a realidade do que expresso. Ao ouvirmos uma palavra, compreendemos nitidamente o seu contetido, cuando éate contetide ji & conhe- ido, do contrario, € duvidoso que se consiga captalo. Sé desta maneira, pode a minha inteligéncia compreender alguém que diga que lum ser maior que todas as cobsts que se poss pensar. 76 MARIO FERREIRA DOS SANTOS i, aqui, nesta frase de Gaunilon (“aliquid maine omnibus quae valeant’ conitari"), uma modifieagao do pensamento av selmiano. Porque nflo se trata de pensar num ser maior qe as coisas que se podem pensar, mas, sim, de que se pode per- sur mum ser maior do que tédas as coisus, quer pensadas ou ndo, Bate esclarecimento & importante como ainda veremos, Quanto ao arcabougo do argumento de Santo Anselmo, io este os argumentos refutatdrios de Gaumilon: Se se quer considerar como existente no espirito uma coisa que, eoniudo, 0 pensa mento no pode representi-la sob a forma de um ser real qual- wer, nfo o nego; mag, como, desta maneira, a existanc'a tdeal no So segue nevessiriamente que exista na realidade, nao Ihe concedo esta existéncia, 2 menos que me demonstrem por uma prova irrefutdvel, Porgue o que conclui a favor da oxisténcia Géste ser, partindo do prineipio de que, se nio existisse, seria o maior de todos, néo se da bastante conta do es do seu interlocutor, j4 que nfo simente nfo afirmo sta exis. téncia, mas que a nego categdricamente. Duvido, pelo menos que scja efcctivamente maior que todo outro objecta real, nio The concedo mais existéncia, se assim poss0 chami-la, qu A que The dé 0 esféreo que realiza o meu espirito para repre- fentar uma coisa que nao eonhece mais do que por playras quo ouvix. Como so pode demonstrar, entio, prassegue Gat nilon, gue date ser, maior que todos os outros, existe de facto, pelo simples facto de ser tal, quando eu 0 nego, ot, pelo menos, dle duvido, ¢ quando ste ser, maior que nenhum outro, nao std em minha inteligéncia, nem em meu pensamento, como, de gual maneira, posso dizer de muitas outras coisas dividosts € ineertas? f pois necessario préviamente que eu tenha certezs qu éste ser supremo exista, Neste caso, estaré para mim fora de davida que subsiste em si mesmo, Aqui esté 0 esquema da refutagio de Gaunilon, que pos- teriormente seria usado por todos os que corsbateram o argu- mento ontolégico, Para corroborar as suas palavras, apresen- ta exemplos que vamos sintetizar. Admitamos que se afirma a existénela de uma ilha chamada Pordida, devido & dificulda- de ou impossibilidade de encontréla. Se’ the atribulssem ri quezas e delicias incalculaveis, em maior abundancia que na Ihas Afortunadas, e que, em produtos, ultrapassa a tédas « terras habitadas pelos homens, qualquer pessoa poderia com- preender ficilmente estas minhas palavras, Mas, se depois, com a impressao de quem tira uma eon- scqiiéneia riporosa, dissesse que ndo se pode mais duvidar, da- ai por dinvte, da’ existéneia dessa dha, pois que dela se tem (© HOMEM PERANTE 0 INFINITO 7 uma idéia clara, e que 6 mais existir na realidade do que sb- mente na inteligéncia, pois, do contririo, qualquer outra terra existenle seria mats importante que ela; se, com semelhantes, racioeinios, quisessem fazer-me admitir a existéncia de tal itha, acreditaria gue 0 angumentador brines, ou nao saberia eu qual de nés dois é mais insensato, Histdo aqui compendiadas as razdes a favor do insensato. Vejamos agora. A rosposta de Santo Anselmo a Gaunilon De inicio, Santo Anselmo, om sua defesa, faz a afivmativa de que a demonstracio de Gaunilon é improcedente, sobretudo quando aproveita o ergumento da ilha perdida. Inicia Santo Anselmo com estas palavras a sua dofesa: Se o ser do qual nada se possa conceber maior nila ¢ compreendide pela inte- ligéneia, nem sequer concebide no pensamento, isto & nem se quer imaginado, eertamente teremos de dizer: ou que Deus nfo 0 ser acima do qual nada se pode conceber maior, ou nao 6 nem compreendido pela inteligdneia nem eoneebido pelo pen samento. A propria 1 © a propria consciéneia de Gaulilon Gemonstram que pode ser coneebido. Portanto, compreende- mos ¢ concebemos, tomos na inteligéncia e no pensamento, algo que estimamos mais do que nenhuma outra coisa”. Ei dirigin- do-se a éle diz: “ou os argumentos em que apoias tous ataques nao 820 verdadeiros, ou as eonclusées que déles thras nfo si0 legitimas”, Mostra'o processo do pensamento de seu opositor, que sintetiza da seguinte maneira: 1°) que se pode pensar uma coisa acima da qual outra no se pode conceber; 2.9) mas dai nio se segue que ésse algo esteja na intelt- gencia; 32) ¢ se estiver na inteliga necessiriamente na realidade. fia, nilo se segue que exista Mas retruca Sento Anselmo: “afirmo, com corteza, que algo, desde 0 momento que pode ser pensado, existe ne- ‘Ariamente, e vou provi-lo”, H, assim, prossegue: “o ser acima do qual nada se pode naginar de superior, necessiriamente tem que ser represen. jado como earecenda de prineSpio © nfo pode ser considerndo como possivel sem ser realmente, porgue um possivel pode ser considerado como comecando a existir. Mas éle nfo. Por- tanto, se © penstmente pode admitir sua existéncia, éle existe

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