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, F a XY co wl c\ Se l Compromisso de todas as areas Organizadores lara Conceigao Bitencourt Neves Jusamara Vieira Souza Neiva Otero Schaffer Paulo Coimbra Guedes Renita Kliisener ‘Uercd Fer oo anda do Sumario Prefacio ... Apresentagio . Introdugao Artes Ler e escrever em artes visuais..... 2000.02.00. ooe ccc eeeeeeeeeee 21 Isabel Petry Kehrwald Ciéncias Idéias e palavras na/da ciéncia ou leitura e escrita César V. Machado Lopes ¢ Elaine B. Ferreira Dulac Educacao fisica Ler e escrever também com o corpo em movimento ............... 45 Clezio J. S. Gongalves Geografia Leitura e escrita na geografia ontem ¢ hoje...................... Guilherme Reichwald Jr. Ler ¢ escrever a geografia para dizer a sua palavra e construir 0 seu espago................... 71 Nestor André Kaercher Ler a paisagem, o mapa, 0 livro... Escrever nas linguagens da geografia Neiva Otero Schaffer Leiturae escrita 7£22 r= na geografia (Boarsina Sind) ontem e hoje GUILHERME REICHWALD JR. A(s) geografia(s) critica(s) escolar(es), portanto, concebidas(s} nestes termos, devem ser ao mes- ‘mo tempo uma forma concreta de pratica educa- fiva e um vir-a-ser, isto é, estard sempre “em cons- frugdo" mesmo sendo implementada, (Vesentini, 1989, p.75) Geografia. um saber para o cidadao A geografia como area do conhecimento é sistematizada e oficiali- zada pelo sistema de ensino a partir da segunda metade do século 19. Neste momentoya Europa Ocidental vive a Revolugao Industrial. Asia ¢ Africa esto serido fragmentadas pelo colonialismo dos paises em industrializa- ¢40. Mercado e mao-de-obra sao garantidos através do sistema colonial e de estados nacionais fortes. Os territérios dos paises imperialistas, na Eu- Topa ou em outros continentes, representam a possibilidade de continuar ou no sua expansdo industrial. Dois vizinhos concorrem entre si, Franga eAlemanha. O primeiro ja é um estado nacional consolidado e com vasto poderio colonial ultramar, o segundo é um estado nacional em formago (unificagao) ¢ com algumas colénias, E um momento em que a Franga defende suas frontciras ja delineadas ¢ a Alemanha procura (re)definir as suas em detrimento do territorio do pais vizinho. A geografia é a ciéncia’) nova que articula discursos para legitimar posses ¢ organizagées territori- ais dos estados nacionais imperialistas. Vidal de La Blache, francés, ¢ Friedrich Ratzel, alemao, so os mais importantes representantes da nova ciéncia moderna. Ler o mundo Leitura e escrita na geografia ontem e hoje 65 * —ay e seus territérios na defesa do estado nacional imperialista ¢ de ambos, embora com énfases diferenciadas, A geografia académica ¢ escolar sao articuladas para forjara iden. i tidade nacional com base na defesa do territério do estado em expansig * ow jaconsolidado. De qualquer forma, ler textos gcograficos (escolares “ou nao) representa estar diante de instrumentos fomentadores do cida- dao soldado, como fala Vesentini (1995). Escola ¢ universidade fazem ‘da geografia uma ciéncia que contribui na formagiio do sujeito Patriota, acritico ¢ obediente. Lacoste (1988) fala da geografia dos professores ou da geografia alienante, um conjunto de conhecimentos sobre um mundo pronto scm conflitos ¢ sem dinamicas diarias. A literatura, através do livro Os quatro cavaleiros do apocalipse, de Ibajiez (1987), permite-nos conhecer como a geografia universitaria ¢ escolar bem formou os patriotas defensores das disputas do imperialismo nacionalista europeu que culminou na Primeira Guerra Mundial. objetivo | Aqueles individuos de barba fluvial ¢ lunetas de ouro, pacificos coc- Ihos do laboratorio ¢ da catedra, haviam preparado a presente guerra com sofisma e orgulho. | .-Enquanto 0 soldado alemio de classe social baixa pilhava o que podia | 2 ¢ fuzilava, ébrio, quem apanhasse pela frente, o estudante guerreiro lia ' no bivaque Hegel ¢ Nietzche. Era demasiado culto para executar com as proprias mios tais atos de justia histérica... Mas ele e seus respectivos professores haviam excitado todos os maus instintos da besta germanica, dando-Ihes um verniz de justificagao cientifica. (Ibafiez, 1987, p.353) A produgao de manuais ¢ livros geograficos foi, durante muito tempo, reprodutora da(s) geografia(s) proposta(s) por La Blache e Ratzel. Hoje ainda no Brasil encontramos esse tipo de publicagao, por exemplo 0 uso exclusivo dal divisao regional brasileira em cinco ma- crorregiées sem propor discusso do que é regionalizar ¢ dos motivos contextuais dessa proposta adotada pelo IBGE em 1941. Pior que os produtos da industria editorial foi a boa ligdo aprendida por muitas ge- tag6es de professores ¢ professoras de ensinar a ler o mundo geogra- ficamente através de lentes apoliticas, acriticas quanto as contradigoes constantes da sociedade ¢ desta com a natureza. Ler mapas, livros de geografia ¢ literatura de modo geral sem ver se? intengaio da construgao da identidade nacional e/ou regional significa 4 a aceitacdo das frontciras dos estados nacionais como elementos a- histéricos, isto ¢, feitos pela natureza; representa continuar com a tra~ digdo iniciada por La Blache e Ratzel. Ler e escrever -.-0 aparelho ¢statal controla cada um de nds ¢ sabemos disso, inclu- sive pela observacdo dos curriculos escolares: ha todo um sistema de controle para que se ensine determinadas coisas; para que se passem determinados valores. e, desta mancira, a escola serve como instrumen- to de reproducdo da sociedade. (Gongalves, 1987, p.11)_ Ao estudar municipios ¢ muito pouco explorada a relagao entre os limites politicos e os processos que determinam tais linhas divis6- nas. Ja para o Brasil, escala nacional, esta énfase também nio é ob- jeto de preocupagao por parte dos professores/as nas aulas sobre o . pais, ou seja. a gcografia ¢ a-histérica, nao tem processo, 0 espago é <= algo pronto/acabado. — = Nao podemos ignorar ofarater politico da geografia) bastando lembrar A © saber geopolitico ou, se quisermos citar um fato mais corriqueiro, em- ~ ~~ brar a cinematografia de guerra, onde. quase sempre, o estado maior com seus generais (¢ nunca os soldados) é que esta com um mapa na mado, ~ ~ Enfim. a geografia deve ser entendida como um momento necessario da sociedade, que s6 pode ser compreendido dentro da totalidade soci- ~ _ alde que faz parte e que ajuda a constituir. (Gongalves, 1987, p.12) As divisdes regionais estudadas na sala de aula como elementos inquestionaveis também so bons exemplos da geografia do estado nacional, do cidaddo soldado. “ Arenovacao do ler e escrever geografia no século 20 Nos anos 60 ¢ 70, a geografia sofre um processo de mudanga.{ importante nos scus objetivos e praticas. E com um conjunto de dife~ Tentes propostas articuladas na chamada geografia critica que a refle- x40 do(s) papel(éis) exercido(s) até entao pela ciéncia de Ratzel e Lae Blache sao postos em xeque. A obra Geografia — isso serve, em pri- meiro lugar, para fazer a guerra, de Lacoste (1988), é um marco de tal renovagao que também influencia a geografia brasileira.* ‘No bojo da renovagao ¢ dos novos caminhos trilhados, dialogar com as Areas do conhecimento, ler a geografia com base em textos variados.das diferentes ciéncias, da midia, do imaginario popular, etc., algo enfatizado » com as mudangas dos anos 80, em especial. A geografia passa a utilizar 0 saber sistematizado na linguagem escrita como referéncia para entender 0 €spago como resultado ¢ elemento influenciador da realidade social Leitura € escrita na geografia ontem e hoje 67 A geografia, bem como a economia, a sociologia ¢ as demais ci- €ncias sfo, na verdade, fragmentagdes que precisam reconhecer suas proprias limitagdes. A geografia, a sociologia, a psicologia, a economia, etc., no so a realidade. Esta é mais complexa do que cada uma dessas cigncias em particular, Ressalto isto a fim de evitar 0 psicologismo, 0 so- ~ ciologismo, o cconomicismo ¢, obviamente, o geografismo. E preciso, por- ~ tanto, instrumentalizarmo-nos teoricamente para superar a divisdo do ~ trabalho cicntifico que nos foi imposta, E tanto nos foi imposta que, in- clusive, sofremos com ela para aprofundar o debate (Gongalves, 1987). Desta forma, o exercicio da analise geografica tem maior compe~ téncia de aproximagdo a complexidade do mundo se. também for plural internamente: buscar diferentes pontos de vista para ler analiticamente ~o mudd €'timbém ser capaz de escrever sobre isso sob diferentes as- /> pectos. Portanto, trés cixos explicativos da organizagao espacial preci- sam estar permanentemente incluidos na leitura do mundo: a) o politico - poder associado a apropriagao da natureza e ao trabalho como gerador de pobreza/riqueza e aos papéis sociais de decisao ou exclusiio; b) o cul- 4Y tural -os diferentes valores e representagées advindos das diversidades tnicas, religiosas, de género, de classe social, etc.; e c) 0 econémico,- |_ apropriagiio da natureza e as relagdes sociais dai decorrentes. A geografia tem escrito muito na perspectiva econémica, isso na escola e na universidade. O poder politico pouco esta contemplado normalmente ¢ a dimensio cultural é raramente trabalhada. A escola tem o desafio de ler e escrever mais na perspectiva do didlogo entre as Areas e nas dimensGes espaciais, além do olhar econémico, Conhecendo j 0 espago do nosso aluno como expressao de valores culturais e politi- " cos, além dos econémicos, ajuda significativamente na construgao de uma geografia mais envolvente/proxima, A ciéncia espacial também incorpora na sua renovagiio o traba- ho de interagao constante entre diferentes escalas: 0 espago local ex- » plicado ¢ analisado a partir de s@as Telagoes COMT o regional c o inter- nacional c vice-versa. Lugar, territério e paisagem sao referéncias para lermos ° mundo através do espago que reflete tempos e linguagens (matematica, cartografica, musical, po¢tica, corporal, etc). Analisar Pelotas, Ijui, Santa Cruz do Sul, Sant’ Ana do Livramento e Porto Ale- gre sO ¢ possivel criando relagdes com o contexto regional, nacional ¢ internacional ao longo do processo historico. =a A literatura, aliada ao olhar geografico, com certeza forma um indmio que possibilita aos alunos ¢ alunas lerem o mundo nas suas omplexidades e dindimicas, Na aula de geografia, pode-se tomar a obra iteraria como um dos subsidios para entender os contextos do lugar. 68 Ler e escrever (espago que da identidade ao sujeito) ¢ as interagées que este espaco} tem com outras partes do pais c do mundo (relagdes de escala), As! tramas literarias representam a pessoa “comum”, seus dramas (politi ca, cultura ¢ economia) e scus espagos cotidianos (0 lugar). r Para a Geografia do Brasil os escritores que abordam as realida~ des regionais so grandes mestres, a cxemplo de Graciliano Ramos (Vi- das secas). José Lins do Rego (Igo morta), Erico Verissimo (O con- tinente) c Jorge Amado (Mar morto). Das geragées mais novas no contexto do Rio Grande do Sul, Luiz Anténio Assis Brasil (Videiras de cristal), Moacyr Scliar (Ciclo das aguas) ¢ Charles Kiefer (Quem faz gemer a terra) sio nomes de destaque. A literatura é referéncia’ de Ieitura como também de escrita. Provocar os/as estudantes a tex- tualizarem a anilise espacial com base em romances ¢ mais prazeroso| ¢ rico que escrever tomando como base livros didaticos. ‘ Lendo e escrevendo textos de geografia hoje Ao longo dos anos 80, as fontes escolares de leitura mais usadas, os livros didaticos, comegaram a espelhar as mudangas da geografia ad- vindas da critica a La Blache. Sao do inicio da década de 80 os primei- ros livros didaticos que fogem das propostas geograficas classicas. O professor Melhem Adas foi emblematico como representante da mudan- ¢a. Esses livros didaticos pioneiros responderam a um grande desafio ¢ continuam melhorando. A linguagem adequada para criangas ¢ adoles- centes foi (é) um dos obstaculos na construgao de textos onde, de fato, o/a estudante interaja aprendendo a analisar 0 espago. E nos anos 90 que se difundem, de maneira representativa, Os Jivros paradidaticos, obras tematicas muitas vezes elaboradas na lin- guagem literaria de romances. Esses textos respondem a construgao de analiscs mais aprofundadas e com maior capacidade de interagao por parte de criangas e adolescentes. Essa interagdo, muitas vezes, pro- yoca o/a aluno/a a escrever. ° . a E importante que os/as professores/as tenham os livros didaticos ou paradidaticos como referéncias da construgdo do saber do/a aluno/a ena sua pratica profissional. A trama da realidade do mundo so se aproxima_ . sala de aula quando variamos as fontes de informagécs. Assim, 0 livro,) escolar ndo pode ser nossa unica orientagao de Ieitura na sala de aula. ft O trabalho de campo ¢ a pesquisa bibliografica variada sao ins" trumentos igualmente interessantes de Ieitura ¢ escrita para o ensino da geografia, O trabalho de campo demanda nao s6 observagao, mas escrever/ler roteiros dos espacos pesquisados, dos clementos a obser- Leitura e escrita na geografia ontem € hoje 69 var, das perguntas a serem feitas, bem como do confronto com tudo que foi visto na sala de aula A midia, jornal c televiséio em especial, ¢ instrumento que nos in- forma de mancira rapida sobre o mundo. Tomar meios de comunica- gdo como contrapontos a outras fontes, é um exercicio que valoriza a midia, mas a relativiza, pois o jornal ca televisao tém olhares ¢ interes- ses que nao sfio os mesmos dos livros cscolarcs ou da literatura ou da ~ \produgiio universitaria. Cabe ao/a professor/a ser Ieitor/a dessas fon- tes ¢ proporcionar aos alunos ¢ alunas acesso a essas diferentes Icitu- ras. Escrever também ¢ um desafio para o/a professor/a, pois refletir sobre os temas da geografia escrevendo nao ¢ a mesma coisa que pen- sar e/ou falar sobre os mesmos, ‘ Produzir textos para os/as nossos/as proprios alunos/as nos aju- ~ da a interagir ¢ a valorizar mais a tarcfa de textualizagio em sala de aula. Ouvir os/as estudantes no que nao ficou tao claro no nosso texto c.utilizar analogias, constantemente, sfio recursos importantes para uma melhora progressiva da nossa propria produgao. Oportunizar/possibilitar leitura ¢ escrita pela geografia também nao é simples, mas pode ser prazeroso ¢ colaborar na formagao de pes- soas mais atentas para entender o mundo e participar na transforma- ¢40 do mesmo. Referéncias bibliograficas GONCALVES, C.WP. Reflexées sobre geografia e educagio. Terra Livre, Sido Paulo: AGB/Marco Zero, n 2, p.9-42, 1987. IBANEZ, B. Os quatro cavaleiros do apocalipse. 7.cd, Sao Paulo: Circulo do Livro, 1987. = LACOSTE, Y. Geografia: isso serve, em primeiro lugar, para fazer a guer- ra, Campinas: Papirus, 1988. VESENTINI, J. W. O método ¢ a praxis (notas polémicas sobre a geografia tra- dicional ca geografia critica). Terra Livre, Sio Paulo: AGB/Marco Zero, n2, p.59-90, 1987. / Nota \*No Brasil, somente no final dos anos 70 ¢ década de 80, com o processo de ~ democratizaciio do Pais como um todo ¢ com a atuagio da Associagiio dos Ge- » égrafos Brasileiros (AGB), cm particular, que esta reestruturagdo toma-se signl- ficativa. O congresso da AGB em Fortaleza/CE, em 1978, simboliza a mudanga. | Milton Santos, com 0 livro Espaco e método, é pega-chave neste proceso. 70 Ler ¢ escrever Ler e escrever ageografia para dizer . a sua palavra e construir oO seu espacgo* NESTOR ANDRE KAERCHER Introdugao O método de conscientizagio de Paulo Freire refaz criticamente esse processo dialético de historiciza- 40. Como todo bom método pedagogico, niio pre- tende ser método de ensino, mas sim de aprendiza- gem; com ele, o homem nao cria sua possibilidade de ser livre, mas aprende a efetiva-la ¢ exercé-la.A pedagogia accita a sugestio da antropologia: impde- se pensar e viver ‘a educagtio como pratica de li- berdade”. (Fiori citado por Freire, 1987, p. 18) . Parece-nos claro que, o ensino de geografia, como alias 0 de qual- quer outra area, sé sera valido se conseguir fazer um didlogo com o mundo real, extra-escola, isto 6, que supere uma visdo, ainda muito arraigada em nés professores, de que o estudo serve para o genérico iluminar cabegas, ilustrar mentes, uma espécie de enciclopedismo ilus- trado, cultura geral. A geografia escolar tradicional se enquadra bem’ ~. dentro deste perfil de ciéncia desinteressada, repassadora de informa- g6es atualizadas, contemporaneas aos alunos, Precisamos superar essa visdo ingénua, descompromissada, apa- rentemente apolitica, pois cla ¢, justamente um modelo politicamente conservador, produtor de uma cidadania contemplativa, inerte, do tipo “em sala eu dou informagées, os alunos que fagam as conexées 1 fora”. A geografia buscava, com este perfil, o estatuto de “ciéncia” ja que, Ler e escrever a geografia para dizer a sua palavra... 71 na €poca de seu nascimento (fins do século 18), 0 medo de ser taxada de “politica” fazia com que se buscasse sua despolitizagao, sua assep- sia. Como se isso fosse possivel! Uma outra afirmagao a se evitar é: “No futuro isso - nossos conteiidos - sera util para 0 vestibular”! Nos- sa agdo pedagégica fica 4 mercé de um futuro que nunca chegara para boa parte deles. Sabemos que, uma porcentagem reduzida de nossos alunos concluira o ensino médio. Os alunos, via de regra, ndo fardo, por si s6, estas relagées, isto ¢, estas informagées ficarao soltas ¢ des- conectadas na cabega dele, ¢, rapidamente serao deletadas. Por qué? Porque foram artificialmente memorizadas. Ser educador, fazer ciéncia implica fazer relagGes entre escola e vida, entre a sua area € as outras, mostrando um mundo mais real, li- “gado, organico numa visao que supera o irreal mundo por nds cons- truido - modelo vigente ainda em muitos livros didaticos - na tradicio- nal concep¢ao natureza (clima, relevo, vegetag4o, hidrografia, mine- ralogia), populac4o (dados estatisticos, médias uniformizantes) e eco- nomia (extrativismo mineral, vegetal, agropecuaria, industria, comér- cio, transportes). Que fique claro, este modelo ¢ irreal, s6 existe em nossos livros didaticos ena nossa cabega, professores de geografia. Em tempo: aqueles que dizem que “integram estes assuntos em sala de aula”, “fazem relagGes entre natureza e sociedade” apenas remendam pano velho, fazem jogo de palavras porque, efetivamente, com este alicerce nao ha palavras que venham a superar essa visdo dissociada e irreal de mundo. Por qué? Porque esta concepeao retratada no livro e, por conseguinte, em nossas aulas, nao é apenas uma visao de geogra- fia, ¢ uma viso de ciéncia, uma concepgao politica, uma filosofia de vida, resumindo, uma concepgao epistemoldgica de conhecimento nada neutra e que de cientifica tem muito mais de pretensdo do que'de efe- tividade. Explico: esse projeto de geografia, presente ha décadas em nossas salas de aula, ¢, sejamos claros, uma visdo particular de cién- cia, a geografia iluminista-positivista, que ainda vigora hoje no Bra- sil, as portas do século 21. Iluminista porque concebe o saber escolar como uma luz a iluminar as trevas da ignordncia. Positivista porque pretendia ser “neutro”, longe das polémicas e conflitos. Entende-se assim a crenca arraigada até hoje de que a geografia deve apenas descrever os locais, ficando presa as aparéncias, buscan- do assim a “objetividade” dos fatos. E um projeto particular, o da bur- guesia (cabe destacar que as classes sociais nao acabaram) do final do século 19, na Europa. E um curriculo que apresenta uma visio parti- cular de mundo, o mundo do branco, do cristao, do homem, do ociden- 72 Ler e escrever

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