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82 Denise G. Guichard No mundo capitalista ocidental, um dos maiores focos de degradacio ambiental ocorre nas grandes concentragdes urbanas. Este problema agrava-se no Terceiro Mundo. A Regio Metropolitana de Sé0 Paulo (RMSP) 6 um exemplo ilustrativo, A concentragéo de demande por alimento, trans- porte, energia, 4gua, etc. 0 lado da concentrago da pro- duedo industrial, cria uma sobrecarga nas condigées natu- rais locals. ARMSP assenta-se em um ambiente natural e dele de- pende ainda cue a complexidade do cenério urbano obscu- reca este fato. Através des alteragées em seu consumo de Agua, lengamento de esgoto e consumo de energia, esté constantemente modificando 0 ecossistema onde se encon- tra, A quebra do equilibrio ecolégico Todas as formas de vida, das mais simples até as mais evoluidas, estéo relacionadas por processos de interdepen- ‘encia que constituem 0 ciclo bioldgico e 0 ciclo de energia da naturezs. € importante lembrar que, embora se tenha energia por tempo ilimitado (0 so! como fonte inesgotévell, a matéria-prima para se obter moléculas organicas que ir8o acumular energia & escassa. ange 5, Gaicard— pidloss, solos peosulans om anblanie scutieoe urna ¢cazeniv algae em caaraeSoanclntl na Seeeaa Go Agri oestosimenlSoreo ge Peers Forest Um fio limpo 6 um rio em equilibrio em relagéo ao seu meio. Para nele se lancar esgotos biodegradéveis, & neces- sério obedecer a um limite imposto pela sua vazio e sua profundidade. Caso contrério, haveré uma quebra daquela interdependéncia, gerada pela proliferacéo de um dos varios organismos aquéticos presentes, causada por excesso de alimento. Como consequléncia, haveré ume baixa do oxigé- nio dissalvido na Sgua, devido a0 consumo através da res- piracéo deste organismo. 0 excesso de efluentes em um rio também impede ou dificulta a penetracdo da luz, prejudi- cando 2 realizac3o da fotossintese por algas e vegetais aquaticos. Assim sendo, quanto maior for 0 volume de es- goto despejado no rio, maior seré o consumo de axigénio, 0 ‘que acarretaré a morte dos seres que ali habitam, Outra forma de quebrar 0 equillbrio ecoldgico de um rio @ através do lancamento de compostos industrials. Estes muitas vezes no séo biodegradéveis e a restituigéo, a0 meio ambiente, do carbono utilizado na sua fabricagao s6 6 possivel por incineracéo, Dos dejetos domésticos que contribuem pare a poluigéo dos ios, fazem parte detergentes sintéticos muito comuns, do tipo ABS (Alguil Benzeno Sulfonatos). Estas substancias tensoativas s80 extremamente resistentes 8 e¢8o de bacté- rias decompositoras, infiltrando-se no solo e nao mais sain- do, caracterizando uma gua espumante e mal cheirosa, Qutros compostos recalcitrantes (biorresistentas) en- contrados em alguns rios poluidos so: plasticos, inseticidas do tipo DDT e alguns herbicidas. Estudos estéo sendo reali zados com 0 objetivo de destruir o préprio ABS por ativida- de microbiolégica, tentando evitar assim 0 agravamento da poluicéo nos nassos ros, Os recursos hidricos da RMSP A AMSP apresenta cinco bacias: Tieté Alto-Cabeceiras, Tiet® Alto-Zona Metropolitana, Billings, Cotie e Guarapiran- ga. A bacia do Tieté Alto-Cabeceiras se localize desde es nascentes do Tieté até a divisa com Itaquaquecetuba, quase na entrada de S80 Paulo, Apenas 1,3% da area abrangida pela bacia 6 ocupada por matas naturals. A prepondersncia da ocupacéo é dada por pastagens e atividades hortifruti- granjeiras. Nesta érea concentram-se 64% da produgao hor- tifrutigranjeira da Grande Sao Paulo, A medida que 0 rio Tieté se aproxima da Capital e atra- vessa Mogi das Cruzes, 199 inddstrias despejam seus esgo- tos no Tieté © em seus atluentes, totalizando 20.700 kg (Gears mab ors when Sept Holds tangas num Ho, parse © Soe ameectnence So Paulo em Perspoctiva, 34:62-84, out.idez, 1989 DBO dis (1), segundo dedos de 1987, Os mananciais que abastecem a Grande S80 Paulo si- tuados nesta zona hidrogréfica so: Ponte Nova, Taiacup ba, Paraitinga, Birtiba, Jundiat, com 33,84% (dados da Sa- besp) de seus recursos hidricos aproveitados, Outros max nnanciais, como Pogo Preto/Ribeir8o do Campo, Cemburu, Itepanhau e Itatinga, complete o sistema de abasteci- mento, na RMSP, do Tieté Alto-Cabeceiras. A bacia do Tieté Alto-Zona Metropolitana compreende © rio Tieté © seus afluentes, desde @ entrada de S80 Paulo até a Berragem de Pirapore. A zona metropolitana vai desde a serra da Cantareira até as bacias de Cotia, Guarapiranga & Guaié, contendo 14 muni Ao norte da bacia do Tieté, se encontram a serra da Cantareira e 0 rio Juqueri e seus afluentes, integrando o sisteme Cantareira de abastecimento da Regio Metropoli- tana, com uma vazo de 2m*/s, Qutra parte das Sguas é for- necida pelos rios Atibaia, Jaquari, Cachoeira e Jacarel, que formam o rio Piracicaba @ s30 responsdveis por 31m*/s de égua. Grande parte dos despejos Ifquidos vem de um nimero reduzido de indistrias bastante poluidoras localizades nas regides do ABC, Guarulhos @ Osasco. Outros efluentes s40 lancados nos rics por um némero bastante elevado de in= duistrias de pequeno porte, responsavels pela principal fonte de poluigdo na RMSP. A bacia do rio Baquirivu-Guagu, localizada em Guaru- 'hos, apresenta uma forte poluico orgénica vinda de 172 indstrias, Entre elas, seis emitem seus despejos liquids na rede de esgotos, 55 langam seus efluentes nos corpos d'é- Que € 0 restante os libere no solo, A carga potencial destas indidstrias € de 5.140 kg DBO/dia, sendo que a carga polui- dora que resta 6 de 989 kg DBO/dia, Um grave probleme que afeta a comunidade vizinha dos leitos dos rios séo as enchentes do rio Tieté seus afluentes, que causam transtornos ao transito e aumentam o imero de casos de leptospirose, Jé foram registrados 1.740 casos da doenca na Grande Sao Paulo entre 1983 1988, com 250 mortes, segundo dados da Secretaria de Saiide do Estado. A causa principal destes transbordamen- 108 6 a elevaco do nivel do rio, em Edgard de Souza, obje- tivando a reversao do Tieté Alto para a represa Billings, através do bombeamento no canal do rio Pinheiros. A bacie se localize em éreas de alta pluviosidade, de solo predomi- nantemente argiloso, predispondo a enchentes no veréo. O escoamento de gua ocorre de forma superficial e em ritmo lento, agravado pela poluigéo langads no rio. Os demais trechos do Tieté Alto formam a bacia do rio Juqueri, ineluindo sete municipios, sendo que 20% de po- ulacdo se encontram na regido protegida pela Lei dos Ma- anciais, na rea da represa de Pirapora, no Municipio de Mairipora ina barragem Paiva Castro}, com érea rural for- made de vegetagéo natural e reflorestamento. Convivem com algumas indéstrias pouco poluidoras: porém, apresen- tam atividades hortifrutigranjeiras, que colaboram com grande parte da poluigae no municipio. A represa Billings esté integrada ao sistema Tieté-Alto, Recebe, entre outras, os rios Grande, Pequeno, Bororé, Ta- quacetuba © ainda &guas do Tieté-Pinheiros, através de 83 i eerieeeiemsemmemmieiemeieninetuittieatemidiainiemiemmiemntes mie bombeamento em Padreira. Essas Aguas so bastante po- lufds’s, pois no recebem tratamento de nenhuma espécie. Conflito com a geracao de energi De 1970 a 1989, @ populacéo na AMSP aumentou em mais de 8 milhdes de habitantes. A complexidade do abaste~ cimento de équa da Grande Sao Paulo é bastante acentuada pela conflito entre os usos do sistema hidrogrético ~ gera~ io de energia, abestecirnenta de Agua e langamento de es- gotos. Um aspecto ilustrativo deste confit & a reverséo dos cursos dos rios Tieté e Pinheiros. Com 0 objetivo de gerar energia, uma parte das 4guas, do rio Tieté junta-se a0 rio Pinheiros - que também tem seu ‘curso invertido ~ para alimentar a represa Billings. A partir dat as 4guas sfo lancadas serra abaixo para produgao de energia, indo juntar-se ao rio Cubatao. Com isso, 0 Tieté 0 Pinheiros passaram a ser afluontes do Cubstéo, apesar de pertencerem a bacias diferentes. © bombeemento das aguas do Tieté e do Pinheiros chegou a tornar as 4guas do reser- vatério Billings 200 vezes mais poluidas do que seriam devi- do apenas & sua bacia contribuinte (em 1987, @ carga polui- dora chegou a 368,000 kg OBO/dia ~ contra 1.400 kg DBO/dia, que é a carga orgnica industrial lancada em sua bacia contribuintel, Para que fosse preservado o sistema de captagdo da represa, foi necessdrio construir uma barragem, permitindo a continuidade do abastecimento do ABC. Para gerar uma quantidade relativamente pequena de energia elétrica, foi realizada uma forte interferéncia, alterando-se 0 curso natural dos rias e, a mais grave, comprometeu-sé a gue de Billings, limitando seu uso para 0 abastecimento, devido & intensa poluicso causada pelo bombeamento das ‘4guas do Pinheiros e Tieté. A situagdo nao seria tao grave se 08 racursos hidricos utilizados para geracéo de eneraia néo estivessem completamente poluidos. © Tieté, depois de atravessar a cidade, ndo apresenta tragos de oxigénio, praticamente deixando de ostentar a caracteristica de rio para assemelhar-se a um canal de es~ goto. A qualidade das suas Sguas vai piorando & medida que se aproxima e penetra no Municipio de S40 Paulo, em virtu- de do adensamento populacional e industrial. Na altura da ponte das Bandeiras (antes de receber o Tamanduatet), pou- co se percebe 0 oxigénio dissolvido. Mas, a partir da chega- da do Tamanduatef, nenhum vestigio de oxigénio é encon- trado, nem na época das cheias. 0 tio Tamanduate! desgua no Tieté apés cruzar a re- gio do ABC e receber seus esgotos domésticos e indus- trigis, As induistrias, em geral, ndo tratam seus esgotos lan- gados aos cursos d’égua, ou seja, fazem uso privado do rio, socializando o énus representado pela poluigSo. ‘Outro sério problema origina-se na ocupaga0 desorde- nada nas éreas de mananciais. Os loteamentos clandestinos sobrecerregam os recursos hidricos quanto @ sua funcéo de escoamento de esgotas domésticos. Hd um grande desres- peito Lei de Protecdo eos Mananciais. Segundo a Secreta- tia Municipal de Habitacdo, surge um loteamento irregular or més na Grande Sao Paulo. Dos quase 500 km? da érea dos mananciais da 20na sul da capital, 18% estao irregular a4 mente ocupados. A ocupacdo dessa area representaré, sem divida, um comprometimento de parcela substancial da ca~ pacidade de abastecimento dos manaciais. S20 Paulo, num ro préximo, teré de pedir égua emprestada a cidades vi- zinhas como Campinas, caso continue @ especulagao imobi- lidria na regido sul, acerretando dificuldades de abasteci- mento também naquela cidade. Isso acontece pois a ocupa- gfo clandestina nas éreas dos mananciais gera 51m°/seg de gua poluida ne bacia do Alto Tieté. Esta possui ums vazdo de 90m°/seg. Ainde restam 39m*/seg de égua para serem aproveitados. A previséo é de que, em 1990, a populacdo, aumentando, necessitaré de uma vazio de 71m?/seg, desen- cadeando 0 caos no sistema de abastecimento. E ineficaz a fiscalizec3o dos lotesmentos irregulares na regio dos mananciais- da Grande Sao Paulo e do desres- peito as leis vigentes de protecao aos mananciais. Séo 1.202 lotes vendidos sem registro no Certério de Iméveis, Possibilidades Os conflitos entre os diversos usos da bacia hidrogrética @ 8 desconsideracio dos limites de adaptabilidade dos ecos- sistemas provocaram a recente crise no sistema de abaste- cimento de qua, quando mais de 3 milhdes de pessoas da Grande $0 Paulo viram-se sujeitas a0 racionamento. O aumento de quantidade de material organico proveniente dos esgotos, 20 lado de condicées ambiontais fevoréveis 20 seu desenvolvimento, desencadeou a proliferacdo de algas, que provacou deficiéncias do sistema de abastecimento. 0 aproveltamento dos recursos hidricos dentro de uma metrépole como a Grande Sao Paulo nao implica necessa~ Fiamente a provocacéo de desequilfbrios graves. Além dos objetivos bésicos como abastecimento de Agua e geracao de onergia, também os relacionados 20 lazer, como pesea e na- vegac8o, poderiam ser incorporados. Com isso 0s ios po- deriam verdadeiramente fazer parte de paisagem © da cul- tura urbanas, Esse objetivo, no entanto, implicaria primei- ramente a reformulac30 do comportamento de agresséo 20 meio ambiente, em especial aos recursos hidrogréficos, que traz como conseqiiéncia a marginalizacao dos rios pela ci- dade. LEITURAS COMPLEMENTARES ‘BRAN, 5,1 Pollo: a morte de possoe ae Sto Paulo, Aste, 19. Sana Se PREIS, SETR OS SIMEMITS AMIENTAL (CETESD) Cuatitage "ine Agus iterires do Eatado de Sto Paulo, 1985. S20 Patio, Cass, ‘ter! Seige Ste inten do Eade oe S80 bw, dr Brocassosinteratives homer ~ mo ambiente, S86 Paul, Dil, 1885, FOUNA O's. PAUL, See Paulo, cto BULL PE BUM, £8. Energy boce for man ard rare Now Yor, coral ae

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