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peemerns [2]! / as grandes / é bi) sinteses \ nm , ™fh 4% * /), L NOT cl ND) | psiiatria do século XX | ,funcao dos universais: [° \ tempo : \_ espaco \. realidade = Kocssscercaspenncsedd COSMOS ll DNase neieeniics crane cr ac iis AS GRANDES S{NTESES PSIQUIATRIA DO SECULO XX — FUNCOES DOS UNIVERSAIS: TEMPO, ESPACO, REALIDADE E COSMOS* J.L. Moreno, M.D. Moreno Academy Beacon, New York Tradugio de Margit Ellen Irene Reinecke sidade de Barcelona, Espanha, de 29 de agésio a 3 de setembro de 1966. PREFACIO Apresentar o Professor Moreno ao piblico Brasileiro seria um nao- senso pois se trata de uma figura mundialmente conhecida como criador da Sociometria, do Psicodrama e do Sociodrama. O que queremos aqui é aproveitar a oportunidade da sua vinda ao Brasil, por ocasido do Quinto Congresso Internacional de Psicodrama ¢€ do Primeiro Congresso Internacional de Comunidades Terapéuticas, para prestar uma Homenagem ao grande Mestre. Figura e Personalidade marcante, Moreno poderia ser caracterizado antes de tudo pela espontaneidade; ¢ uma pessoa que ilustra, “in vivo”, © que fala e prega; € um Homem que irradia Calor Humano e incentiva, pela sua presenga ¢ pelos seus escritos, 0 Amor Universal. Quero também retribuir-lhe a calorosa recepedo da qual fui objeto, por éle e sua to simpatica e dindmica esposa ¢ colaboradora, Zerka Moreno, em Nova York. Este folheto é a reproducdo integral da Conferéncia que Moreno pronunciou no Congresso de Barcelona. E provavelmente uma das mais felizes sinteses que éle j4 escreveu sobre o scu pensamento e Psicoterapia, e sobre as suas concepgdes ted- ricag em relagd4o ao movimento psicoterapico mundial. Este movimento precisa realmente de uma evolucdo que caminhe para uma nova sintese que abranja ao mesmo tempo, a tridimensiona- lidade do Espago e do Tempo. O Psicodrama, com Moreno, abriu a clareira da Sintese. E 0 nosso desejo que esta clareira seja a porta de entrada, para mui- tos, de novas abordagens, devidamente comprovadas por pesquisas, em beneficio da evolugao da Humanidade e da eliminagio das suas contra- digdes maiores, entre outras a procura da Paz através da preparagao para a guerra. Belo Horizonte, 31 de julho de 1970 Pierre Weil he cuatro, universais de psicoterapia si abordados aqui: © conceite le tempo, 0 de espaco, o de realidade ¢ 0 de Cosmos. © objetivo do psicodrama era, no inicio, construir um proceso terapéutico que utilizasse a vida como modélo, para integrar néle tédas as _modalidades de vida, comecando pelos universais — tempo, espago realidade € cosmos — até todos os detalhes e nuances da experiéncia da realidade e da vida. PSICOTERAPIA E PSICOPATOLOGIA DO TEMPO Comecemos por um dos grandes universais — 0 tempo. O que acon- tece com a fungio de tempo no curso de psicoterapia, neste século? Nao me retiro ao tempo como um conceito filosdfico, mistico ou feno- menolégico, mas como um coneeito terapéutico. Do ponto de vista dos procedimentos terapéuticos, até que ponto a dimensdo tempo se introduz © opera nos processos psicoterapéuticos? O homem vive no tempo — passado, presente e futuro — e pode sofrer de uma patologia relacionada com cada um. © problema é como integrar tédas as trés dimensdes em operagées terapéuticas significativas. Nao é suficiente que figurem como referéncias “abstratas”; precisam tornar-se vives dentro das modalidades de tralamento. O aspecto psicolégico do tempo precisa ressurgir em sua totalidade. Consideremos em primeiro lugar a psicanilise. Quando digo psica- nilise, refiro-me a posigo freudiana ortadoxa. De acdrdo com a psico- logia ‘psicanalitica, © tempo é enfatizado em térmos de passado, Freud, expoenie da psicologia genética e da psicobiologia, achava que retro- ceder e tentar descobrir a origem das coisas era particularmente interes- sante, Freqiientemente, quanto mais voltava, tanto ma acreditava des- Cobrir alguma coisa que f6sse valiosa como causa. E entdo, os psicanalis- comecaram a retroceder cada vez muis, até o ventre, c, se possivel, tas Tmais. além, até se cansarem desta-futil “recherche du temps perdu” € comegarem a voltar. Por mais importante que scja o passado, como dimensio do tempo, € uma posigio unilateral, um “tempo reduzido”, que negligencia ¢ distorce a intluéncia total que o tempo tem sébre a psique. Tocamos agora em seu primeiro conflito com 0 ponto de vista freudiano, Acentuei que © tempo possui outras fases que sio importantes, uma das quais € 0 pre- fembe Painamica do presente, do Aqui e Agora, hic et nunc. As expe riénclas que ocorrem continuamente no contexto do Aqui e Agora foram desprezadas, distorcidas, ov inteiramente esquecidas. Por isso, em minhas primeiras publicacGes (1914-1924) — de fato ja em meu primeiro lives, em 1914 — comecei a enfatizar 0 momento, a dinamica do presente, 0 Aqui e Agora, ¢ tédas as suas implicagGes pessoais, sociats e culturais ime- diatas. Mas noyamente nio os considerei somente sob o ponto de vista da filosofia e fenomenologia, sendo também do ponto de vista do ie cesso terapéutico, como ocorre em relagdo aos pacientes, em grupos pacientes: 0 Encontro. © Encontro é um fendmeno de tele. © processo Piadamental do tele é a reciprocidade — reciprocidade de atragao, reci- ” procidade de rejcicao, reciprocidade de excitagao, reciprocidade de ini bigdo, reciprocidade de indiferenca, reciprocidade de distorsao. n Gang zu zwei: Auge vor Auge, Mund vor Mund. Und bist du bei mir, so Will ich dir die Augen aus den Hélen reissen und an Stelle der meinen setzen, und du wirst die meinen ausbrechen und ‘an Stelle der deinen setzen, dann will'ich dich mit den deinen und du wirst mich mit meinen Augen anschauen”. “Um encontro a dois: élho a dlho, face a face. E quando estiveres perto, Arrancarei teus olhos e os colocarei no lugar dos meus. E arrancards meus olhos € os colocaras no lugar dos teus. E passards a ver pelos meus olhos, e eu verei apenas pelos olhos teus”. “) Ha outra dimensao do tempo terapéutico que tem sido negligenciada até recentemente — o futuro, Todavia, 6 um aspecto importante da vida, uma vez que nés Certamente vivemos mais no futuro do que no passado, Desde hoje de manha cedo estive preocupado em ser pontuat a éste encontro. Mas, uma coisa é considerar as expectativas dos acon- tecimentos futuros em nossas proprias mentes, e outra “estimuld-los”, construir técnicas que nos permitam viver no futuro, agit como se o futuro estivesse A mao, aqui mesmo, “A la recherche du temps de l'avenir”. Por exemplo, através de nossas técnicas terdpicas de futuro, posso re- presentar uma situacao que espero que acontega amanha, com um névo amigo, ou um encontro com um patrio em perspectiva, simular 0 ama- nha tao concretamente quanto possivel, a fim de prevé-lo ou, talvez, estar mais preparado para éle. Muitas vézes tive clientes que sofriam de neurose de emprégo ou neurose de desemprégo; que estavam ansiosos para conseguir um traba- Iho, ou pelo fato de ter uma entrevista com o patrao para pedir aumento de salario, Freqiientemente preparamos tal cliente com uma semana de antecedéncia para o que pudesse acontecer; é um tipo de “preparagao para a vida”, Esta técnica de preparacdo para a vida também ¢ eficaz com clientes preocupados com assuntos ligados a0 coragao — casamento, divércio, nascimento de um filho, ou qualquer outra coisa em perspec- tiva. O problema é como integrar estas expectativas € interésses do cli- J. L., “Einladund zu einer Begegnung”, fevereiro, 1914. ente na operacdo terapéutica como realidades, de tal modo que seja valioso, tanto para o cliente quanto para o terapeuta. mifco’ fol eatateada do futuro como percepcao e como significado dina- Adler, Horney ¢ Sullivar outros, ao longo dos anos, como por exemplo ler, Horney e Sullivan, Mas a configuracio especial, em térno ¢ dentro da situagdo do futuro, permaneceu impessoal e nao estruturada . Entao, as trés dimensoes do tempo — presente, passado ¢ futuro — se retinem no psicodrama, como i : acontece na vida, do ponto d terapia funcional. lo ponto de vista ae PSICOPATOLOGIA E PSICOTERAPIA DO ESPACO Consideremos agora 0 conceito de espaco. O espaco também foi quase totalmente negligenciado em tédas as psicoterapias, nao do ponfo de vista de Semantica e Psicologia, mas, novamente, como parte de um processo terapéutico, Se vocé entrar no consultério de um psicanalista, encontrard uma cama abstrata, um diva, mas 0 testo do espago do con sult6rio ndo relacionado com o processo terapéutico. O cliente € cen- trado na linguagem e © terapeuta se preocupa em ouvir. Todavia, em- bora tédas as terapias tenham negligenciado abertamente o elemento de, espago, os tisicos, astrénomos e astronautas nao o fizeram. Pela afluén- cia césmica de nosso tempo, espago e comunicagao fisica se tornaram categorias enormemente importantes na mente do homem, em sua visio da vida ¢ do universo, quando planeja viajar para a lua, planétas © even- tualmente estrélas. Se vocé entrar em um consultério, em que qualquer uma das va- riedades correntes de psicoterapia é praticada, pode ser que vocé encon- tre somente uma cadeira. O espago em que o protagonista experimenta seus traumas nao tem lugar naquele processo. A idéia de uma psicote- rapia de espaco foi primeiramente explorada pelo psicodrama, que € cen- 2 trado na ac&o e procura integrar compreensivamente tédas as dimensoes da vida. E uma espécie de “recherche de Vespace concret, vecu”. Se um cliente entra no espaco terapéutico, in: os em uma descricio, deli- neacdo ¢ realizacdo de espago em que a cena seguinte sera apresentada, suas dimensdes horizontais e verticais, os objetos presentes, ¢ sua distincia e relacionamento entre si. Eis uma ilustragao de um caso real: O cliente € um menino de dez , anos. Ele diz: “Doutor, tenho médo de ir para casa hoje a noite”. Per- gunto-Ihe: “Por qué? O que aconteceu?” — “Bem, esta tarde mamae ¢ papai tiveram uma discussdo, e meu pai bateu em minha mie, fazendo-a cair escada abaixo, Eu a vi ld, ao pé da escada & fiquei tio furioso com meu pai que o agredi. Mas entio eu fiquei apavorado, peguet minha sa- cola de roupas e fugi. Estou aqui € nao ouso ir para casa”. 22 Como comecamos a psicodramatizar o inci- ora, 0 que fazemos? - dente Parunto a0 menino: “Jack, onde fica a escada? E onde est Mamie?” Jack anda pelo palco, aponta a localizagao da escada, colo~ aw en el janelas, paredes; mostra a posigdo de sua mie so ao cha ao pé da escada, a direcéo do corredor, a porta da frente, os quartos, sala, elc., movendo- se no espago em que experimenta éste episddio, es- truturando-o diante de nossos olhos. Nesse momento usamos a técnica do futuro. “Jack, vocé vai para casa avora, mas aqui nesta sala, Digamos que vocé estar em casa da- ‘a uma hora, Estabeleca tédas as configuragées espaciais o mais cxata- mente possivel. Quem esta em casa quando vocé chega, e onde esto localizados no espaco?” Jack explica e constréi fisicamente 0 arranjo es- pacial: “Bem, antes de mais nada, entro pela porta da frente, aqui, na sala de estar. Acho que meu pai esta ali, em sua cadeira, no canto da sala, zangado. Minha mae est4 no quarto, no segundo andar, chorando”, Agora Jack prossegue, arrumando 0 resto do espaco: o teto, portas, ja- nelas, Telagdo com outros compartimentos da casa, jardim, tédas as coi- sas que considera signiticativas. Ele se aquece cada vez mais e gradual- mente se envolve na situagdo, A seguir comeca a ver quadros na parede; nota que sua mie usa determinado vestido, que o pai fuma um charuto. Em outras palavras, as proprias configuragdes de espaco se transformam imediatamente em um parametro para o processo terapéutico. qui Nao ha necessidade de nos determos demais nos detalhes. Entretanto, néo me canso de enfatizar que, em nossa pesquisa, a configuragao do es- paco, como uma parte do processo terapéutico, € de extrema importancia. Aquece © protagonista para ser e agir em um ambiente que é modelado de acérdo com aquéle em que vive. PSICOPATOLOGIA E PSICOTERAPIA DA REALIDADE Chegamos agora ao terceiro universal — realidade, Este também so- freu mudanca nos Ultimos trinta ou quarenta anos. Como nossa psiquia- tria surge cada vez mais na comunidade do que em hospitais, a realidade comega a adquirir novos significados. A tendéncia se dirige as linhas de controntagdo e cancretizagao. a) Infra-realidade Pode-se dizer que a realidade no consultério de um psicanalista, do ponto de vista das terapias, é um tipo de “realidade reduzida”, uma “infra- realidade”. O contato entre o terapeuta e o paciente nao é um didlogo genuino, mas uma espécie de entrevista, uma ago de pesquisa ou teste projetivo. Qualquer coisa que esteja acontecendo ao paciente — por exemplo, uma idéia de suicidio ou um plano de fuga — nao é uma fase de confrontagdo ¢ realizagéo diretas, mas permanece no nivel da ima- ginacao, pensamento, sentimento, temor, etc. De certo modo, isto tam- bém ¢€ vilido para a realidade no consultério de um terapeuta centrado no cliente, existencial ou de entrevistas. b) Realidade da vida A préxima etapa é a realidade da propria vida, da sua € da minha vida cotdiana, © de tédas as pessoas comuns, como vivemos em Nossa casa, em nosso trabalho, em nosso relacionamento de uns com os outros € com todos os individuos que afetam nossa vida — nossos maridos, canta, filhos, patrdes, professdres, sacerdotes — e¢ com o mundo em geral. _ No entanto, a maneira pela qual vivemos a realidade, em. nossas re- lacdes com as pessoas significantes em nossas vidas, pode ser inadequada ou incompleta e podemos querer mudur para experimentar novos modos de vida. Mas a mudanga pode ser tanto ameagadora quanto extremamente dificil, de tal modo que permanecemos em nossos costumes familiares, em vez de nos arriscarmos a uma calamidade que no podemos controlar. Entdo, torna-se necessiria uma situagdo terapéutica, em que a realidade pode ser simulada, de forma que as pessoas possam aprender a desenvol- ver novas técnicas de vida sem se arriscar a conseqiiéncias ou desastres sérios, como poderia ocorrer na propria vida. ¢) Realidade excedente Chegamos ainda a outro nivel de estruturagio, que representa as di- mensées inatingiveis, invisiveis, da vida intra ¢ extra-psiquica, que chamet de “realidade excedente”, Quando criei éste térmo fui influenciado pelo térmo “valor excedente”, que Marx usou em “O Capital”, paga indicat que os capitalistas absorvem lucros excedentes dos trabalhadores. Isto se tornou, para éle, uma das razdes pelas quais uma tevolugio econémica. era necessiria para restaurar os direitos dos trabalhadores. Entretanto, 0 excedente é apenas um térmo aniilogo; em nosso caso, significa que ha certas dimensoes invisiveis na realidade da vida, nao completamente expe- rimentadas ou expressas, ¢ por isso que precisamos usar as operagoes excedentes e os instrumentos excedentes para fazé-las surgit no processo terapéutico. Uma das técnicas de realidade excedente mais populares em psico- drama € aquela da inversdo dos papéis. Se, por exemplo, o marido e a esposa brigam na realidade da vida cotidiana, cada um permanece cm seu proprio papel, em sua propria situagio de vida. As percepgGes, as expec- tativas, temédres, decepgdes, etc., de cada um, permanecem inalterados. E mesmo que os dois cheguem a algum ponto de acordo ou desacérdo, continuam mantendo o mesmo Status relative que tém na vida. O marido continua sendo o marido, a espésa continua sendo a espésa. Mas, na in- versio de papéis, solicitamos 4 espdsa que tome 0 papel do marido € ao marido que assuma o papel da espésa. Esperamos que facam isso, nao apenas nominalmente, mas que se esforcem para examinar 0 processo Teal de inversio de papéis, cada um procurando senti i, @ seu modo, os padrs; de comportamento, sentimento e pensamento d Penrose lo outro, E claro que isto € particularmente dtil em situa ten Vamos citar um caso especifico: Sao. oito © marido, que € chefe do escritério de vendas, desc cozinha ¢ diz a espésa: “Mary, © que aconteceu com vocd, voee sata louca? Por que voce nio me acordou? Ja so vito horas © vocé sabe que tenho que estar no escritério as oito e quinze!” Ela comeca a gritar: “Mas estou preparando seus ovos! Bati na Porta trés vézes e vocé nao. acordou! Por que vocé tem que gritar comigo? Estou fazendo tudo que pesso. O que esti acontecendo com vocé” Entio cla comega a chorar ele tea mal humorado. Este € 9 momento critico para a inversio dos Papeis, Neste ponto, o terapeuta entra e diz: “Agora Bob, vocé fara o papel de Mary © Mary, vocé tomaré o papel de Bob”. E agora vocé vé Bob no papel de sua espdsa, ao lado do fogio, tentando preparar os ovos € chorando amargamente porque Mary, no papel do marido, é tio sddica, E ela que fica mal humorada agora, que corre escadas abaixo, entra na cozinha gritando, “seu desgragado, 0 que esti havendo com vocé — vocé est louco?”. Ges provocadas por horas da manha e © as escadas, vai & Nao € sempre facil estabelecer identidade com o nosso proprio eu, em determinada época de nossa vida, retomar os préprios sentimentos ¢ comportamentos em um cpisédio crucial — por exemplo, como crianca ou adolescente — mas é ao menos plausivel. Entretanto, como € que Se pode estabelecer identidade com outra pessoa, quando se pede que faca uma inversio de papéis? Achamos que isto seja possivel, especial- mente entre individuos que viveram juntos durante muito tempo em situa- Goes intimas — assim como marido e espésa, mae e filhas, pais filhos, irmdos e«irmas, ou bons amigos. Recentemente falei a um grupo de tedlogos que me perguntaram: — “Qual é a diferenca entre a antiga hipdtese cristi “Ama teu Préximo € a sua hipotese?” Respondi: “Bem realmente no methoramos muito com relacio ao “Ama teu Proximo”, exceto acrescentando “por meio da inver- sao de papéis”. Nao praticamos estas técnicas de realidade excedente, como a aver: so de papéis, na propria vida; € por isso que foram introduzidas = terapia. Entretanto, posso prever que algum dia elas serao tao om la~ res como alguns avides a jato que voam de um Jado a outro do pais, de um lado a outro do mundo. Num futuro distante, as eisoas come carao a fazer o jogo da inversdo dos papéis entre si ¢ com os habitan' es de outros planétas. Mas, no presente, precisamos déstes métodos para mi Ihorar nossas técnicas de interagdo humana. Um dos instrumentos basicos, ao construir ° mundo petoocramatics de um paciente, é aquéle do ego auxiliar, bastante cone cones ei ite presentagio de absentistas, de individuos, desilusdes, sivcinagtes, pala los, ideais, animais, € objetos. Tornam seal, concreto ¢ tangivel o do protagonista. Contudo, a medida que se torna éste mundo real ¢ di namico, numerosos problemas emergem, como por exemplo o uso Borcai: ato corporal. Contato corporal tem sido, de algum modo, um tabu em todas as psicoterapias . Entao, quando uma enfermeira vé um patienté sofrendo © nao pode fazer nada a nao ser tocd-lo e dizer-Ihe: Olhe. Jack, nao se preocupe, tudo vai dar certo”. Seu gesto pode significar mais para o rapaz do que as palavras que diz, nao de um modo abertamente sexual mas como um tipo de aproximaciio maternal, protetora. Entretanto, um psicanalista que se tornasse, de alzum modo, fisicamente pessoal com seu paciente, seria condenado ao ostracismo. No entanto, na abordagem psicodramatica as relagdes humanas. es- tamos interessados em seguir o modélo da prépria vida e, dentro dos | mites, fazer uso terapéutico da técnica de contato corporal. Esta técnica é obviamente contra-indicada, se for usada para gratificar a necessidade do terapeuta; porém muito indicada se dé ao paciente calor € proximidade de vida, em uma drea em que necessita déles, nfo somente em palavras, mas em acao. Por exemplo, se vocé tem como cliente uma jovem que sofre de funda alienagdo pelo marido ou familia, vocé Ihe dara um ego auxiliar (homem ou mulher) que a cliente espera Ihe seja caloroso € pessoal; co- loque o bracgo ao redor dos ombros da paciente ¢, se for indicado, mais do que isso. O grande problema € onde colocar as limitagSes éticas, es~ téticas e terapéuticas, Mas vocé nao pode ser um ego auxiliar — a mie, © pai, o filho, etc. — a nao ser que vocé o viva. Se nao puder vivé-lo, torna-se abstrato, sem sentimento e no terapéutico, Naturalmente o tera- peuta pode ter grandes problemas com a sua conduta e, como adverténcia, gostaria de contar um caso real, ocorrido em um grande hospital dos Estados Unidos. O caso envolvia uma jovem paciente, noiva e que estava profundamente deprimida e necessitando de grande afeigio. Deram-The um ego auxiliar para representar 0 Nnolvo. De acérdo com as regras, 0 noivo auxihar tornou-se caloroso, colocou o brago em térno de seus om- bros, e beijou-a. Ele nio foi longe demais, posso assegura-lo, mas 0 sufi- ciente para despertar a célera do pai da noiva, que era um Senador! Quando éle ouviu falar da sessao, chamou imediatamente o Superintendente do hospital e disse-Ihe: “Que grande idéia permitir que um estranho re- presente cenas de amor com minha filha num palcot” O Superintendente respondeu-lhe: “Senador, isto é terapia, Nao é nada mais do que Terapia! Estamos tentando tratar de sua filha, O senhor nado manda sua filha ou espdsa ao ginccologista ou obstetra, ou a outro especialista quando elas precisam de atengado profissional, ¢ éstes médicos nado usam todos os tipos de método que podem ser um tanto embaragosos? O que tem o senhor contra a psicoterapia, quando ela se torna um pouco real?” E assim tudo se acalmou, A filha melhorou, e um bom metodo foi encontrado para acalmar até mesmo um senador! Dramatizagao & outra técnica importante de realidade excedente. Nes- ta, uma pessoa pade ser treinada para desempenhar mais eficientemente seus papcis reais; por exemplo: patrao, empregado, estudante, instrutor, pai, filho, colega, amante, amigo, etc. No processo terapéutico do Psico- Grama, 0 protagonista é livre para tentar ou fracassar em seu papel’ nor Que sabe que the sera dada a oportunidade para tentar novamente, eoey alternativa, e mais outra, alé que finalmente aprenda novas abordasers As situagdes que teme, abordagens que pode, entio, empregar in situ, as propria vida. gar in situ, na ‘Técnicas de “simulacio da realidade”, que usamos tio freqiient mente em psicodrama, sao agora empregadas para treinar astronautas, Os engenheiros simulam, em um laboratorio, as condigées reais no ex: paco. Temos visto na televisao os astronautas sendo treinados para flutuar no espace, para viver em maves espaciais, para encontrar naves espaciais no espago, etc, Existem ainda muitas outras técnicas eficazes de realidade excedente, tais como a cadeira vazia (presépio vazio, banco vazio, cama vazia, etc.), a cadeira alta, a loja magica, a representacdo de sonhos, a técnica de Deus, ensaio para o futuro, validacao existencial © comunidade terapéu- tica, ©) PSLCOPATOLOGIA E PSICOTERAPIA DO COSMOS Chegamos agora ao quarto universal — 0 cosmos. No inicio do sé- culo XX, durante minha juventude, duas filosofias das relagdes humanas eram particularmente populares. Uma, era a filosofia de que tudo no uni- verso se resume no individuo, na psique individual. Isto foi particular- mente cnfatizado por Sigmund Freud, que pensava que o grupo era um epitenémeno, Para Freud tudo era epi, sdmente o individuo tinha valor. A outra filosofia era a de Karl Marx, Para Marx, tudo se resumia no homem social, ou mais especificamente, o sécio-econédmico. Era como se isso fOsse tudo que existia no mundo. No inicio de minha carreira, che- guei @ uma posigao em que considerava que havia outra drea, um mundo mais amplo, além da psicodinamica e sociodinamica da sociedade humana — “a cosmodindmica”. O homem é um “homem césmico”, e nao somente um homem social ou um homem individual. Quando eu disse isso pela primeira vez, cérca de cingiienta anos atras, soava um pouco como um misticismo altamente exagerado. Hoje é quase senso comum. O homem € um ser césmico. Desde tempos imemoriais, 0 homem tentou compreender sua posigio no universo mais amplo e, se possivel, controlar o fenémeno que deter mina esta posigio-evolucdo, nascimento, morte, sexo, ¢ a funcado do pré- prio Criador do mundo, Para fazer isso, 0 homem inventou, no passado, religiées, mitos, fabulas. Submeteu-se a forte organizacio, a fim de su- jeitar-se as leis do universo como éle as concebia. As leis de Buda, os dez Mandamentos de Moisés, os numerosos rituais de varias culturas primi-~ {iy Weja Moreno, J.L, — Psicodrama, Vol. I ¢ WI. tivas, todos sfio testemunho da profunda ansicdade di . i funda jo home: 5 tar-se a um sistema de valores invisivel. im Pare sujei- Desde que entramos na era da bomba atémica e do computador, as concepsdes do homem mudaram radicalmente. A atirmacao de que Bes, esta morto pode ser insignificante; ée pode nunca ter existido. Mas € importante que sejamos capazes de crid-lo em nossa mente. A evolugio do futuro esta totalmente aberta d especulacio. Nascimento € morte po- dem nao ser linats, mas podem receber novos significados através de des- cobertas cientilicas. Mesmo as diferengas entre os sexos ndo pode ser fic ‘ada, mas pode ser transitéria. O sexo de uma pessoa pode ser mudado. A possibilidade de milhdes de outros sétes em outros tOcs que nunca enfrentamos tio claramente como a planétas levanta ques- wora, Assim como as fungdes de tempo, espago c realidade, a funcio de cosmos deve ser tao integrada no processo terapéutico que tenha’ valor de experiéncia ¢ existencial para o protagonista. Dentro do quadro de re- feréncia do psicodrama, por meio de seus numerosos métodes, 0 fend- meno de cosmos pode ser integrado no processo terapéutico. Um método terapéulico que nio se preocupa com estas enormes implicacées césmicas, com © proprio destino do homem, é incompleto ¢ inadequado. Bem como nossos ancestrais encontraram estas mudancas por meio de mitos e fa- bulas, tentamos encontra-las em nossos dias ‘com novos recursos, E neste ponto que as técnicas de realidade excedente na cosmodinimica assumiram © poder. No mundo psicodramitico, a diferenciagdo entre os sexos & negli- genciada ¢ ultrapassada. Nao existe sexo em psicodrama. As diferencas de idade sio desprezadas. Nao existe idade em psicodrama. As realida- des de nascimento ¢ morte sio desprezadas. Nao existe morte no psico- drama. © nao-nascido ¢ o Morto sio trazidos A vida ou vivem novamente no palco do psicodrama, E uma forma de arte excedente aplicada 3 cos- modinamica! Estas exteriorizagdes esto, contudo, intimamente relacionadas com a subjetividade e¢ imaginagado do protagonista. A mulher que gostaria de ter nascido homem pode representar um homem no palco do psicodrama e assim corrigit as injusticas do universo como ela as percebe. Por outro lado, um homem pode representar o papel da mulher. Um velho pode representar uma crianga ¢ assim corrigir a perda da infancia ou experi- mentar a infancia que éle acha que nunca teve. Anatomias. ¢ fisiologias, e biologias, nao importam, O que importa é a expansio do homem em Telacio ag necessidades e fantasias que traz consigo. Torna-se senhor da anatomia ¢ fisiologia, em vez de escravo. Um homem também pode, no cosmos. odramatico, personificar animais — cies, tigres, ursos, peixes, pissaros, insetos — qualquer forma de séres reais ow imazinarios, no como forma de regress%o, mas como envolvimento criativo. Ele est livre das al- gemas dos fatos e realidades, mas com o maior Tespeito por @les. E tem base razodvel para acreditar, como a ciéneia repetidamente nos pelle que as coisas est’io mudando e podem ser mudadas ainda mais; ate es condigSes que pareciam absolutamente fixas hi milénios. Isto Bae ¢ i Pretexto: para o “ilusionismo” ou uma fuga da realidade, mas contrario, um pretexto para a criatividade do homem e criatividade do universo, E por isso que, através da fé humana na criatividade infinita do cosmos, aquilo que representa no mundo psicodramatico pode um dia realmente se transformar em verdade. E assim, como o Fausto de Goethe, no final de sua vida, olhou para o futuro de um modo visiondrio e diss: “O que acontecera, entio, algum dia, no futuro distante, que ja estou ex- perimentando agora”, 0 psicodrama torna possivel ao homem antecipar a vida cm um fufuro muito distante sem ter que esperar até que se trans- forme em realidade. Tem a realidade do futuro hic et nunc. Um dos maiores dilemas do homem, em nosso tempo, é que éle per- deu a fé em um ser supremo e, muitas vézes, em qualquer sistema de valor superior como um guia para a conduta. O universo € governado apenas pelo acaso e espontaneidade? A resposta psicodramatica a afirmacao de que Deus esti morto é que éle pode ser facilmente restituido A vida. Se- guindo o exemplo de Cristo, nds the damos © podemos dar-lhe una vida nova, mas no da maneira pela qual os nossos ancestrais o fizeram. Nés substituimos 0 Deus morto por milhdes de pessoas que podem encarnar Deus em suas proprias pessoas. Entao, tornam-se necessirias algumas explicagdes adicionais. O fato importante na religiéo moderna era a substituigdo, sendo abandono, do Su- per-Deus cosmico, ilusdrio, por um homem simples que se chamou Filho de Deus — Jesus Cristo. © importante ndo era a magia intelectual ou de sabedoria, mas o fato da encarnagdo. Viveram, neste tempo, muitos homens intelectualmente superiores a Cristo, mas eram intelectuais amole- cidos. Em vez de fazerem um esforco para encarnar a verdade como a sentiam, falavam dela, No mundo psicodramiatico, o fato da encarnagdo € central, axioma- tico ¢ universal. Qualquer pessoa pode pintar sua versio de Deus atra- vés de suas proprias acdes e assim comunicar sua prépria versio aos ou- tros. Esta era a idéia de meu primeiro livro, em que afirmei: “Eu-Deus”. Nenhum de meus pronunciamentos e inspiragdes, no entanto, foram mais criticados, mal entendidos e ridicularizados do que as idéias que procla- mei como Deus, como Pai de minha mie e meu pai, de meus ancestrais, e de tudo que vive. Se tivesse apresentado Deus como um “Ele” ou pelo menos como “Vés”, como Cristo, meu livro poderia ter sido elo- giado, como o poeta inglés Christopher Isherwood disse apés a sua lei- tura, “o maior poema profético de nosso tempo”. Mas é o Eu que importa; 0 Eu foi provocativo e névo. E é com o Eu-Deus que estamos todos li- gados. E o Eu que se transforma em Nos. £ divertido recordar que minha proclamagéo do Ew foi considerada como a manifestagio mais saliente de megalomania de minha parte. Re- almente, quando o Eu-Deus é universalizado, como o é em meu livro, todo © conceito de Deus se torna fraco, humilde ¢ inferior, micromania, em vez de megalomania, Deus nunca foi descrito tio modestamente e tio uni- versal em sua dependéncia como em meu livro. Foi uma transformagdo siginificante do Deus césmito dos hebreus, 0 Ele-Deus, ao Deus vivo de Cristo, 9 VosDeus, Mas foi uma transformacio ainda maiy desfindora do VosDeus em Eu-Deus, que colocou tda a responsabildade. sabre mim € 963, cu € © grupo. Outro aspecto da micromania do livro, em seu anonimato, € © que ruidosamente proclamou que nio é 0 Eu de uma pessoa particular ¢ solitdria, mas 9 Eu de cada um, A encarnagao do Ey foi feita por mim na propria vida, muito antes de tomar uma forma psi- codramatica. ee De, ¢ ferapeutas de foros os tempos sempre tentaram homem, seu poser ‘u por sdbre as pobres pessoas, o pequeno : » SC | © superioridade magnificos. No mundo psicodrama- ico, os quadros se inverteram. € mais o senhor, o grande sacerdote ou 0 grande terapeuta que encarnam Deus. A imagem de Deus pode tomar forma e ser encarnada por qualquer pessoa — o epilético, 0 esqui- zofrénico, a prostituta, o pobre e 0 rejeitado. Todos éles podem, a qual- quer momento, subir no palco, quando surgir 0 momento de inspiragao, dar sua versio do significado que o universo tem para éles. Deus esté sempre dentro e entre nds, como esté para as criancas. Em vez de des- cer dos céus, éle entra pela porta do palco. Deus nao esti morto, esta vivo, no psicodrama! As hipsteses gerais postuladas sao: I — Vivemos dentro do quadro de referéncia do tempo, espaco ¢ rea- lidade, mas aprendizagem de tempo, aprendizagem de espaco e aprendi- zagem de realidade, nao podem ocorter e ser aperfeigoadas a nao ser que sejam testadas em um processo € reintegradas, dentro do quadro de referencia de uma psicoterapia que é modelada segundo a prépria vida. Por outro lado, a separagao entre as experiéncias de tempo, espaco realidade na propria vida e suas epresentagdes dentro do processo tera~ péutico, podem permanecer sem conexao. E paradoxal se suas patologias sido inteiramente negligenciadas ou insuficientemente consideradas em uma situagdo de teste, Entéo, torna-se imperativo transferir éstes fendmenos da propria vida para o processo terapéutico e de volta do processo tera- péutico para a propria vida. II — O processo de concretizagao de experiéncias vividas e fantasiadas € particularmente significativo para a psicopatologia da pesquisa de tempo. Tempo abstrato € espontaneo, como foi experimentado nas sessdes de psicodrama, difere em intesidade, duragio e perspectiva. Algumas das maiores dificuldades que encontramos nos contextos de comportamento sdo deficiéntias de tempo, de aquecimentos complementares e de previsio de conseqiiéncias futuras do comportamento presente. ; III — Pesquisa na psicopatologia das configuragdes espaciais deve- ria ser desenvolvida em processos de laboratorio, onde a determinacao pra- uca de proximidade ¢ distancia, de movimentos para ou contra, horizontal ¢ vertical, pode ser testada. IV — A psicopatologia da realidade e fantasia di realidade podem ser estudadas em processos psicodramiticos de Jaboratério, expecialmente & concretizacao de simbolos — simbolos de sonhon, ilmoen ¢ alucinagaes. O processo de simbolizacao € retirade do dominio da linguayem ¢ interpre- ges, e colocado no dominio mais inclusive da ago concreti. V — A psicopatologia das experiéncias césmicas pode ainda ser mais explorada © aperfeigoada no proceso psicodramitico, SUMARIO Quatro universais — tempo, espago, realidade ¢ cosmos slo avalia- dos aqui, dentro do quadro de referéncia da psicoterapia ¢ purticularmente dentro do quadro de referéncia do psicodrama. O objetivo do psicodrama era, em seu principio, construir um proceso terapéutico que utiliza a vida como modélo, para integrar dentro déle tédas as modalidades da vida, comecando por éstes universais, até todos os detalhes ¢ nuances da expe- tiéncia da realidade e da vida. .

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