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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES


AVM FACULDADE INTEGRADA
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS PELO DIARISTA

AUTOR

LAURA PEREIRA SÁ DE ALENCAR

ORIENTADOR

PROF. CARLOS AFONSO LEITE LEOCADIO

RIO DE JANEIRO
2011
2

UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES


AVM FACULDADE INTEGRADA
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS PELO DIARISTA

Monografia apresentada à
Universidade Candido Mendes – AVM
Faculdade Integrada, como requisito
parcial para a conclusão do curso de
Pós-Graduação “Lato Sensu” em
Direito e Processo do Trabalho.
Por: Laura Pereira Sá de Alencar.
3

Agradeço a todos aqueles que de


alguma maneira contribuíram para a
realização deste trabalho.
4

RESUMO

Trata da prestação de serviços pelos diaristas e a latente discussão quanto à


sua caracterização como uma relação de emprego. Inicialmente, apresenta-se
o conceito e tece-se considerações gerais de acerca da relação de emprego,
com a respectiva descrição de seus elementos caracterizadores. A partir daí,
conceitua-se a figura do diarista com suas peculiaridades e expõem-se, ainda,
os direitos dos empregados domésticos que não se estendem aos diaristas
quando não configurada a relação de emprego. Situa-se o diarista no
ordenamento jurídico brasileiro, se detendo na apreciação da continuidade
versus eventualidade, como divisor de águas no reconhecimento ou não do
liame empregatício. Nesse contexto, inserem-se os entendimentos doutrinários
e jurisprudenciais no ordenamento jurídico pátrio acerca do tema. Por fim, o
presente estudo apresenta o Projeto de Lei n.º 160/2009, já aprovado pelo
Senado Federal, e no aguardo da aprovação pela Câmara Federal, segunda
Casa do Congresso Nacional, que visa a regulamentar a categoria profissional
de diarista, com o escopo de pacificar, de uma vez por todas, as discussões
doutrinárias e jurisprudenciais acerca do assunto.
5

METODOLOGIA

A metodologia adotada para o desenvolvimento do tema proposto

consistiu na pesquisa bibliográfica especializada, considerada relevante e que

contribuiu para a compreensão do tema. Para isso, foram compiladas

informações das mais diversas fontes disponíveis, como livros, artigos, Internet

e entendimentos doutrinários e jurisprudenciais acerca do assunto.

A inclusão do posicionamento de doutrinadores do Direito e de julgados

de nossos tribunais foi de fundamental importância para dimensionar o quanto

é latente no ordenamento jurídico brasileiro a discussão acerca do

reconhecimento ou não do vínculo empregatício aos diaristas.

O estudo comportou os procedimentos comparativo e monográfico,

ambos comumente aceitos no mundo acadêmico. Comparativo porque se irá

comparar a relação de trabalho e a relação de emprego. Monográfico porque

enfoca, especificamente, a prestação de serviços pelos diaristas e a

caracterização da prestação de serviços como uma relação de trabalho ou

como uma relação de emprego no cenário jurídico atual.


6

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.................................................................................................... 7

CAPÍTULO I

A PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS E A RELAÇÃO DE EMPREGO .................. 10

1.1 – CONSIDERAÇÕES GERAIS ................................................................. 10

1.2 – ELEMENTOS DA RELAÇÃO DE EMPREGO.........................................14

1.3 – A RELAÇÃO DE EMPREGO E O EMPREGADO DOMÉSTICO............ 17

CAPÍTULO II

ELEMENTOS CARACTERIZADORES DO DIARISTA .................................. 21

2.1 – UNIVERSO FÁTICO................................................................................ 21

2.2 – DIREITOS QUE NÃO SE ESTENDEM AOS DIARISTAS EM VIRTUDE

DO NÃO RECONHECIMENTO DO VÍNCULO EMPREGATÍCIO.................... 24

CAPÍTULO III

O DIARISTA NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO........................ 26

3.1 CONTINUIDADE X EVENTUALIDADE .................................................... 26

3.2 O PROJETO DE LEI N.º 160/2009 ............................................................ 36

CONCLUSÃO................................................................................................... 43

BIBLIOGRAFIA................................................................................................ 45
7

INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem por objetivo abordar os aspectos fático-jurídicos

da prestação de serviços pelos diaristas no ordenamento jurídico brasileiro. O

que se pretende é analisar se essa prestação de serviços configura uma

relação de emprego, com a exposição do posicionamento doutrinário e

jurisprudencial dos tribunais pátrios.

Para a configuração da relação empregatícia, a Lei n.º 5.859/72,

regulamentada pelo Decreto n.º 71.885/73 e pela Lei n.º 11.324/06, dispõe

sobre a profissão dos empregados domésticos, e, em seu artigo 1.º, impõe

como requisito que esse profissional preste serviços de natureza contínua no

âmbito residencial da família.

Da dicção desse preceito legal é inescapável a conclusão de que, para a

configuração do vínculo empregatício, a lei trabalhista brasileira exige a

habitualidade, ou seja, a continuidade na prestação dos serviços prestados. No

entanto, definir a exata extensão do termo natureza contínua usada pelo

legislador no supracitado dispositivo legal tem suscitado controvérsias

doutrinárias e jurisprudenciais.

Quando se trata dos diaristas, o termo continuidade denota ainda mais

polêmica e controvérsia ante a falta de uma definição legal da quantidade de

dias trabalhados na semana (dois, três?) que caracteriza a atividade do

diarista. E é exatamente por essa ausência de critérios precisos que a

jurisprudência tem adotado interpretações divergentes em relação ao assunto

nos tribunais brasileiros.


8

A ausência de uma definição precisa reflete a lacuna legal existente no

ordenamento jurídico pátrio. E é justamente essa lacuna que suscita, não é de

hoje, entendimentos variados sobre a possibilidade do reconhecimento do

pacto empregatício aos diaristas, alimentando os embates judiciais pelos

tribunais em todo o país.

Não existe, é bem verdade, uma unanimidade entre os julgados nos

tribunais, restando o exame das peculiaridades de que se reveste a prestação

do serviço. É certo que os Juízes do Trabalho têm considerado que a

prestação de serviço em um ou dois dias exclui o critério de continuidade, ao

passo que os que trabalham mais de três costumam tê-la reconhecida. Mas

esse entendimento, ressalte-se, não é pacífico, muito menos unânime em

nossos tribunais. Daí a controvérsia do tema.

O presente estudo buscou apontar, justamente, onde se concentra toda

a celeuma que envolve este assunto. Portanto, fazendo análise das expressões

continuidade e eventualidade – ponto-chave na caracterização da prestação de

serviços pelos diaristas como uma relação de emprego ou não à luz da

doutrina e da jurisprudência pátrias.

O presente trabalho por fim apresentou o Projeto de Lei n.º 160/2009, de

autoria da senadora Serys Slhessareko (PT-MT), que visa a regulamentar a

profissão dos diaristas, permitindo diferenciá-la da do empregado doméstico. O

referido projeto está em andamento, e até a conclusão desta pesquisa, ainda

não foi aprovado pela Câmara dos Deputados Federais, onde tramita como PL

n.º 7.279/2010 desde 10 de maio de 2010.


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CAPÍTULO I

A PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS E A RELAÇÃO DE EMPREGO

1.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS

Antes de se lançar aqui qualquer conceito, é importante registrar que foi


a partir da evolução das relações de trabalho que se chegou ao que hoje se
denomina relação de emprego como uma das espécies de prestação do
trabalho humano. Isso implica dizer que foi em razão das transições dos
períodos de escravidão à servidão, de servidão às corporações de ofício e
destas ao período pós-revolução industrial que se desenvolveu a relação de
emprego subordinado, assim como o próprio Direito do Trabalho, como forma
de disciplinar as controvérsias decorrentes desse ramo da ciência.

No Brasil, a primeira lei a tratar dos requisitos da relação de emprego


surgiu em 1830. Mais tarde, em 1916, o Código Civil concebeu a prestação de
serviços com grande amplitude e compreendia variedade de prestações de
serviços humanos.

A relação de emprego se assemelha à prestação de serviços, pois o que


é contratado é o serviço e não o produto final. No entanto, ressalte-se, a
primeira difere da segunda pelos seus requisitos, hoje elencados nos artigos
2.º e 3.º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que, juntos, relacionam
todos os elementos fático-jurídicos que caracterizam a relação empregatícia.

Por enquanto, é crucial dizer que a relação de emprego é a relação


jurídica de natureza contratual que se configura como uma relação formal de
trabalho e que define obrigações de um empregado perante seu empregador
de maneira subordinada. O requisito da subordinação, vale dizer, apesar de
não ser o único elemento caracterizador do liame empregatício (como será
visto mais adiante), é elencado por muitos doutrinadores como um dos grandes
marcos deste tipo de relação.
10

Diz-se relação jurídica de natureza contratual, porque o contrato de


trabalho1 é inerente à relação de emprego. Pactuado com o consentimento de
ambas as partes, empregado e empregador (sujeitos da relação empregatícia),
e formalizando o vínculo empregatício, que é a relação de emprego em si, o
contrato de trabalho é aquele que determina a prestação dos devidos serviços
mediante remuneração ao empregado.

Nesse sentido, assim se manifestam Délio Maranhão e Luiz Inácio


Barbosa Carvalho:

A relação de emprego, também chamada de relação jurídica de


trabalho, é a que resulta de um contrato de trabalho, quando se trata
de um contrato de trabalho subordinado (MARANHÃO & CARVALHO,
1998, p. 50).

Ressalte-se, porém, que, sob o ponto de vista dos princípios que


norteiam o Direito do Trabalho, a relação de emprego é um “contrato-
realidade”, no qual se deve investigar a existência ou não das características
típicas do empregado e do empregador, independentemente da formalização
deste contrato.

Desta feita, não será a falta de prova documental o empecilho para que
se caracterize alguém como empregado de fato. A Legislação Trabalhista, que
rege as relações de emprego, portanto, não exige qualquer formalização para a
caracterização do liame empregatício. Trata-se, como bem frisa a doutrina, de
um contrato consensual, conforme dispõe o artigo 443 da CLT, como tantos
outros negócios jurídicos.

Assim, a simples prestação de serviços, sem qualquer formalização, não


é óbice para que se forme uma relação de emprego. Isso, claro, desde que
presentes os outros elementos fático-jurídicos que caracterizam o liame
empregatício, colocando a relação formada à tutela da legislação trabalhista
pátria.

A natureza jurídica deste conceito de relação de emprego – jurídica, pois


depende formalmente de um contrato – determina direitos e deveres de ambos

1
Segundo o artigo 442 da CLT, contrato de trabalho é o acordo tácito ou expresso correspondente à
relação de emprego. Portanto, o consentimento a que se refere o artigo pode ser expresso ou
subentendido.
11

os lados da relação de emprego. Dentre eles, podem-se citar os poderes de


controle, de direção e de organização competentes ao empregador (que ainda
serão aqui comentados), e os direitos trabalhistas inerentes ao empregado
previstos em lei, como, por exemplo, aviso prévio, férias remuneradas, licença-
maternidade.

A relação de emprego, inclusive, possui caráter bilateral, oneroso,


sinalagmático e comutativo, características, portanto, também inerentes do
contrato de trabalho. É bilateral, quer no sentido de depender da vontade de
duas ou mais pessoas, quer no sentido de que as enlaça, simultaneamente, em
uma teia, mais ou menos complexa, de prerrogativas e deveres. É onerosa,
porque dela resultam obrigações recíprocas para os contratantes. É
sinalagmática e comutativa, porque esses direitos e essas obrigações nascem
a partir do momento em que a relação jurídica se constitui, dentro do
pressuposto de equivalência perfeita entre os encargos assumidos pelo
empregado e pelo empregador, um em face do outro.

Vale lembrar que a relação de emprego é um conceito formal e jurídico


da relação de trabalho, já que aquela é, em essência, espécie desta. No
entanto, inobstante o fato de ser mera espécie do gênero a qual pertence, a
relação de emprego se destaca por ser a modalidade mais importante de
pactuação de prestação de trabalho, do ponto de vista econômico-social. Tanto
isso é verdade que foi em torno dela estruturado o próprio Direito do Trabalho,
tudo como forma de garantir direitos mínimos àqueles que são responsáveis
pela circulação de riquezas do país, com uma vasta reunião de normas e
princípios próprios.

Nessa seara, eis as palavras de Maurício Godinho Delgado:

Passados duzentos anos do início de sua dominação no contexto


socioeconômico do mundo ocidental, pode-se afirmar que a relação
empregatícia tornou-se a mais importante relação de trabalho
existente no período, quer sob a ótica econômico-social, quer sob a
ótica jurídica. No primeiro plano, por generalizar-se ao conjunto do
mercado de trabalho, demarcando uma tendência expansionista
voltada a submeter às suas regras a vasta maioria de fórmulas de
utilização da força de trabalho na economia contemporânea. No
segundo plano, por ter dado origem a um universo orgânico e
12

sistematizado de regras, princípios e institutos jurídicos próprios e


específicos, também com larga tendência de expansionismo – o
Direito do Trabalho (DELGADO, 2008, p. 286).

Ora, se a relação de emprego é vista como a mais importante espécie


de relação de trabalho no cenário jurídico-trabalhista brasileiro, faz-se
necessário tecer alguns comentários acerca dos sujeitos desse tipo de relação,
o que será feito a seguir.

Na relação de emprego, a lei confere ao empregador certas


prerrogativas sobr o trabalho do empregado, que é quem está subordinado ao
poder hierárquico (ou poder de comando) do empregador. Esse poder é
garantido por força do contrato de trabalho e reconhecido pela nossa
legislação, atribuindo ao empregador, também, o poder de direção ou poder
diretivo, que nada mais é a faculdade atribuída ao empregador de determinar o
modo como a atividade do empregado, em decorrência do contrato de trabalho
pactuado, deve ser exercida. Esse poder diretivo, vale dizer, subdivide-se em
poder de organização, poder de controle e poder disciplinar.

Nesse contexto, empregado2 é a pessoa física que, subordinada ao seu


empregador, trabalha durante um período (carga horária) definido em contrato
e tem remuneração e outros direitos garantidos pela execução das funções
profissionais. O serviço, necessariamente, tem de ser subordinado, ou seja, o
empregado não tem autonomia para escolher a maneira como realizará o
trabalho (eis aí o requisito da subordinação descrito anteriormente e que será
abordado em detalhes no tópico seguinte). O empregado estará, sempre,
sujeito às determinações do empregador e deverá prestar os serviços da forma
pactuada no contrato de trabalho.

Essa subordinação, porém, não retira do empregado uma série de


direitos que lhe são conferidos por lei, como, por exemplo, férias, gratificação
natalina (também chamado de décimo terceiro salário), aviso prévio, licença-
maternidade, entre outros. Além disso, diferentemente da figura do
empregador, o empregado não precisa assumir os riscos de ordem econômica
do negócio.

2
O empregado descrito no artigo 3.º da CLT é espécie de empregado urbano, visto que o empregado
rural é regido por legislação própria (Lei n.º 5.889 de 8 de junho de 1973).
13

1.2 ELEMENTOS DA RELAÇÃO DE EMPREGO

Segundo o que dispõe o artigo 3.° da CLT, para que surja a figura do
empregado, é necessário que estejam presentes os seguintes pressupostos:
a) que a prestação do trabalho seja feita por pessoa física; b) que haja
pessoalidade; c) que o trabalho não seja eventual; d) que exista onerosidade;
e) que o trabalho seja prestado de forma subordinada. Observe-se que os
requisitos para configuração de uma relação de emprego são, portanto,
analisados a partir do próprio conceito de empregado.

Presentes os cinco pressupostos anteriormente descritos, estará


caracterizada a relação de emprego, protegida segundo os dispositivos
previstos na Constituição Federal Brasileira, na Consolidação das Leis do
Trabalho, na legislação esparsa e nas convenções e acordos coletivos
firmados entre as partes interessadas.

Decerto, só será empregado, e por consequência só restará configurado


o vínculo de emprego, aquele que reunir, na relação que mantém com o
empregador, todos esses requisitos legais específicos, a seguir detalhados,
quais sejam, pessoa física, pessoalidade, continuidade ou não-eventualidade,
onerosidade e subordinação. Alguns doutrinadores incluem um sexto requisito
nesse rol legal: o da alteridade.

No que tange ao requisito pessoa física, o empregado jamais será uma


pessoa jurídica ou uma entidade coletiva. Afinal, o Direito do Trabalho visa a
proteger a vida, a saúde, o lazer, a convivência familiar, a integridade moral,
entre tantos outros bens inerentes ao empregado, já que apenas este,
enquanto pessoa natural, pode usufruí-los. Este elemento fático-jurídico limita-
se, portanto, e apenas, à figura do empregado, e não ao empregador, que,
como já visto, pode ser tanto pessoa física quanto pessoa jurídica.

O elemento pessoalidade implica dizer que o serviço é prestado


pelo empregado segundo as suas qualificações pessoais ou virtudes (formação
acadêmica e técnica, perfil profissional, personalidade, grau de confiança etc.).
Mesmo nos dias atuais, em que há grande disposição de mão-de-obra, não se
14

contrata um empregado sem que sejam analisados seus requisitos pessoais,


seu currículo ou suas recomendações.

O contrato de emprego tem, portanto, caráter de infungibilidade, a qual


decorre das qualidades únicas e pessoais do empregado. E aí não se incluem
situações de substituição legalmente previstas, como ocorre, por exemplo, no
caso de afastamento por doença ou acidente do trabalho ou no caso de férias
do empregado.

Ressalte-se que a pessoalidade, como pressuposto de existência do


vínculo empregatício, deve estar presente tanto no momento do
aperfeiçoamento do contrato, quanto no momento de sua dissolução, já que
a morte do empregado dissolve, automaticamente, a relação de emprego.

A continuidade é elemento fático-jurídico relacionado ao modo com que


o trabalho é prestado, há várias teorias que tentam explicar esse requisito,
porém, registre-se, que não há consenso na doutrina a respeito.

Em linhas gerais, pode-se dizer que, na Justiça Laboral, o requisito da


não-eventualidade pressupõe a idéia de permanência do vínculo que une
empregado e empregador. Isso acaba sendo reforçado pelo princípio da
continuidade da relação de emprego, pelo qual se incentiva, normativamente, a
permanência indefinida do liame empregatício.

A onerosidade significa que os serviços realizados têm como


contraprestação o recebimento de uma remuneração. Aliás, é essa
contraprestação que acaba por impulsionar o empregado a continuar a realizar
o trabalho, já que dele precisa para sobreviver, como meio de manter não só a
si próprio, como também a sua família.

Nas palavras de Sérgio Pinto Martins:

A onerosidade é traço essencial da prestação do empregado por


derivação de um caractere do contrato individual de emprego. Seria,
de fato, socialmente insustentável admitir-se gratuidade nessa classe
de contratos, uma vez que a prestação do empregador (o salário) é
fator de subsistência do empregado. Logo, onde for admissível a
prestação gratuita do trabalho não estará caracterizada a figura do
empregado, como prestador (MARTINS, 2010, p. 121).
15

A subordinação revela-se como o requisito mais importante para a


caracterização da relação empregatícia dentre todos os outros pressupostos
já citados.

Essa extremada importância atribuída à subordinação talvez se deva ao


fato de esse requisito constituir o grande elemento diferenciador entre a relação
de emprego e as demais relações de trabalho. Ele é, inclusive, utilizado para
definir a própria relação de emprego, ao se usar a expressão contrato de
trabalho subordinado.

É necessário que se verifique que, sob qualquer ângulo que se observe,


hoje, a subordinação não pode mais ser vista ou entendida como se incidisse
sobre a própria pessoa do empregado. Não é essa a intenção da lei. A
subordinação não cria um estado de sujeição, é, apenas, uma situação jurídica.
Ela existe em razão da realização da atividade para a qual o empregado foi
contratado, e não sobre a pessoa do empregado, e é neste aspecto que incide
o poder de direção e de fiscalização do empregador, já discutidos
anteriormente.

Maurício Godinho Delgado muito bem sintetiza essa ideia ao dizer:

A subordinação é situação em que se encontra o trabalhador,


decorrente da limitação contratual da autonomia de sua vontade, para
o fim de transferir ao empregador o poder de direção sobre a
atividade que desempenhará. Como se percebe, no Direito do
Trabalho, a subordinação é encarada sob um prisma objetivo: ela
atua sobre o modo de realização da prestação e não sobre a pessoa
do trabalhador (DELGADO, 2008, pp. 302-303).

Decerto, ainda que o empregado seja protegido pelo Direito, que o


defende das agruras econômicas, ele deve, juridicamente, obediência e
fidelidade ao seu empregador. Nesse contexto, tem-se que a contraposição à
subordinação é a autonomia. Quem é subordinado não trabalha por conta
própria, não é senhor do destino de sua energia de trabalho.

Muitos doutrinadores ainda incluem um sexto elemento fático-jurídico


caracterizador da relação de emprego no rol legal, qual seja, alteridade.
Etimologicamente, alteridade significa “natureza ou condição do que é outro, do
que é distinto”. No âmbito do Direito do Trabalho, e mais especificamente da
16

relação de emprego, o requisito da alteridade significa que o empregado


trabalha por conta alheia, ou seja, ele não corre o risco do negócio. Nesse
sentido, diz-se que se o empregado não está auferindo o fruto máximo de seu
trabalho, ele está, apenas, tendo seu trabalho explorado por outrem.

Este requisito (que alguns denominam princípio da alteridade) é extraído


do artigo 2.º da CLT, conceito já visto anteriormente, segundo o qual
empregador é “a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da
atividade econômica...”. Justamente pelo fato de esse elemento fático-jurídico
se encontrar no artigo 2.º, que compõe o conceito de empregador, e não no
artigo 3.º do mesmo diploma legal, que traz o conceito de empregado, é
comum entre os doutrinadores a não menção a este elemento.

Essa omissão, entretanto, não exclui a alteridade como elemento


fundamental na caracterização da relação empregatícia. Afinal, se não houver
alteridade, haverá autonomia e, logo, mera relação de trabalho, jamais relação
de emprego.

1.3 A RELAÇÃO DE EMPREGO E EMPREGADO DOMÉSTICO

O empregado doméstico, para caracterizar-se como tal, deve combinar


os elementos fático-jurídicos caracterizadores da relação de emprego descritos
anteriormente, além dos elencados pela Lei n.º 5.859/72, que rege o
empregado doméstico, regulamentada pelo Decreto n.º 71.885/73, quais
sejam, natureza contínua, finalidade não-lucrativa e âmbito residencial.

Levando em conta os elementos fático-jurídicos da relação de emprego,


Maurício Godinho Delgado explica, de forma completa e sucinta, o conceito de
empregado doméstico em sua acepção técnica, como sendo:

[...] a pessoa física que presta, com pessoalidade, onerosidade e


subordinadamente, serviços de natureza contínua e de finalidade
não-lucrativa à pessoa ou família, em função do âmbito residencial
destas (DELGADO, 2005, p. 365).

A Lei n.º 5.859/72, em seu artigo 1.º, define o empregado como sendo
aquele que presta serviços de natureza contínua, de finalidade não-lucrativa, à
17

pessoa ou à família, no âmbito residencial destas. Essas três características


especiais que diferenciam o empregado doméstico das demais figuras
trabalhistas de emprego sobressaem desse conceito legal. Tamanha sua
importância, a análise desses aspectos diferenciais se faz necessária.

a) Natureza contínua: só é considerado empregado doméstico aquele


que exerce sua atividade com intermitência. Portanto, quem presta o serviço
ocasionalmente não pode ser considerado empregado doméstico.

Vale dizer que a lei do doméstico utilizou a expressão natureza contínua


no lugar de natureza não-eventual utilizada no artigo 3.º da CLT. Essa
diferenciação no uso das expressões faz surgir duas correntes.

Vólia Bomfim Cassar muito bem as elucida:

A primeira corrente entende que é irrelevante a diferença e que os


critérios para apreciação do trabalho contínuo são os mesmos para o
trabalho não-eventual da CLT, isto é, o que importa é a necessidade
permanente da mão-de-obra do doméstico, que é demonstrada pela
repetição de seu trabalho durante todo o contrato, mesmo que
exercida uma só vez por semana, por quinzena ou mês, mas durante
muitos meses ou anos. Alguns autores chamam essa corrente de
teoria da descontinuidade. Para os defensores desta tese, seria
doméstico tanto o empregado que trabalha de segunda a sexta,
durante seis anos para uma família, como aquele que trabalha
apenas às segundas-feiras para a mesma família, durante estes
mesmos seis anos.

[...]

Outra corrente entende que foi proposital a distinção, porque o


conceito de trabalho não-eventual previsto na CLT (artigo 3.º)
relaciona-se com a atividade empresarial, com seus fins e suas
necessidades de funcionamento e o empregador doméstico não
explora atividade econômica lucrativa, não é empresa. Neste
sentido, o trabalho “contínuo” relaciona-se com o seu conceito
linguístico, isto é, vincula-se com o tempo, com o trabalho sucessivo,
seguido, sem interrupção, como conceitua o Dicionário Aurélio.
Segundo a doutrina e a jurisprudência majoritária, a repetição dos
trabalhos domésticos deve ser analisada por semana, desprezando
o tempo de duração do contrato, de forma que o trabalhador
doméstico execute seus serviços três ou mais dias na semana, por
18

mais de quatro horas por dia (CASSAR, 2007, pp. 355-356).

À parte as controvérsias, o que deve ficar claro é que a natureza


contínua deve ser interpretada da forma mais simples possível. Se não há
compromisso de o trabalhador para comparecer em dia e horário certo e
subordinar-se às ordens do contratante, é notório que se trata de trabalho
eventual, ainda que a mesma prestação de serviços se alongue por meses ou
anos. Mas se o contratante exige a presença do trabalhador em dias certos e
jornada de trabalho definida para sujeitar-se às suas ordens, mediante
remuneração, ainda que em apenas alguns dias da semana, fica claro que a
natureza do trabalho é contínua. Resta configurada essa continuidade embora
tenha sido tratado que os serviços sejam prestados em dias alternados ou
descontínuos.

b) Finalidade não-lucrativa do serviço: a prestação do serviço por parte


do doméstico não pode gerar lucros ao contratante, ou seja, não pode ter fins
econômicos, comerciais ou industriais. Isso implica dizer que o interesse no
trabalho do empregado doméstico deve ser pessoal do tomador ou de sua
família.

c) Aspecto familiar da prestação do serviço no âmbito residencial: essa


característica comporta duas vertentes. A primeira diz respeito à necessidade
de a prestação do serviço doméstico destinar-se à pessoa ou à família. O
conceito de família deve ser entendido como a reunião espontânea de pessoas
para habitação em conjunto, mesmo que não haja entre elas nenhum grau de
parentesco.

A segunda vertente da característica aspecto familiar da prestação do


serviço diz respeito à “necessidade” de a prestação de serviços ocorrer no
âmbito residencial da família. O uso das aspas no vocábulo necessidade tem
sua razão de ser. Em um primeiro momento, pela leitura do dispositivo legal,
pode-se ter a impressão de que o serviço deve ser prestado, necessariamente,
no âmbito residencial, tomando-se por referência o aspecto “casa”. No entanto,
não se pode levar ao pé da letra a redação do artigo 1.º da lei do doméstico.

Deve-se observar a questão dos profissionais liberais. Por exemplo, se


um médico atende em sua residência, mas utiliza os serviços de motorista para
19

seus atendimentos fora, ele não pode tratar o referido motorista como
doméstico, ainda que este passe maior parte do tempo na residência.

Assim, caracteriza-se como da atividade do emprego doméstico o


caráter não-econômico da atividade no âmbito residencial do empregador. Vale
registrar, ainda, que a expressão âmbito residencial deve ser entendida em
sentido amplo, e abrange, também, casa de praia, sítio ou fazenda, por
exemplo.

Ante o exposto até então, fica evidente que o elenco das funções que se
desempenham na comunidade familiar é ilimitado. Integram a categoria os
seguintes trabalhadores: cozinheiro, copeiro, mordomo, governanta, babá,
lavadeira, faxineiro, vigia, motorista particular, professor particular, jardineiro,
acompanhante de idosos, entre inúmeras outras. O rol, portanto, não é
taxativo, é meramente exemplificativo.

Nesse aspecto, vale aqui ressaltar que o ponto básico para a


qualificação do trabalho doméstico não é a periodicidade da prestação de
serviço, mas sim o trabalho contínuo subordinado a uma pessoa física, com
objetivos exclusivos de manutenção doméstica, sem fins lucrativos, no âmbito
residencial, seja ele urbano ou rural.

Observa-se, porém, uma grande quantidade de pessoas que trabalham


como diaristas, prestando serviços à família em um ou em alguns dias da
semana. Essa prestação de serviços, porém, gera grande controvérsia na
doutrina e na jurisprudência pátrias. A discussão que se traz à análise é
justamente o confronto das teses de que tenha ocorrido no lar o trabalho como
diarista (eventual) ou doméstica (contínuo). E é justamente aí que se instaura a
celeuma, porquanto a análise dos vocábulos passa a ser subjetiva na Justiça
do Trabalho com entendimentos absolutamente diversos.

A grande questão é: quando o trabalho prestado pela diarista deixa de


ser meramente caracterizador da figura da diarista e passa a refletir, de fato,
uma relação de emprego, momento em que se faz presente o vínculo
empregatício? O problema reside no fato de que o trabalho em três dias da
semana é igualmente tratado como trabalho doméstico e como trabalho de
diarista.
20

CAPÍTULO II

ELEMENTOS CARACTERIZADORES DO DIARISTA

2.1 UNIVERSO FÁTICO

Apesar de o legislador não ter identificado o profissional liberal que


presta serviço de natureza não-contínua com a denominação de diarista,
conceituou-o como a pessoa física que exerce funções junto ao ambiente
residencial, de família ou pessoa física, sem o requisito da continuidade. Ou
seja, a prestação de serviços é eventual e esporádica, em dia previamente
pactuado entre as partes, em especial pelo trabalhador, já que também exerce
atividades idênticas em outras residências nos demais dias da semana.

Os diaristas prestam serviços e recebem ao final do dia a remuneração,


geralmente superior àquilo que receberiam se trabalhassem continuamente
para o mesmo contratante, indevidamente qualificado de empregador, pois nela
estão englobados e pagos diretamente ao trabalhador os encargos sociais que
seriam recolhidos a terceiros. O “salário” recebido é, portanto, diferenciado,
uma vez que exercem suas atividades por diária; daí, consequentemente, o
termo diarista.

Além disso, se não quiserem mais prestar serviços para um ou outro


tomador, não precisarão avisá-los com antecedência ou submeterem-se a
nenhuma formalidade. Isso porque é de sua conveniência, pela flexibilidade
que gozam, não manter um vínculo estável e permanente com um único
contratante, já que possuem variadas fontes de renda provenientes dos vários
postos de serviços que mantêm.

Os diaristas têm a liberdade de escolha, portanto, eles próprios


determinam as condições em que serão cumpridas suas funções, uma vez que
o cumprimento de serviços no decorrer da semana e do mês se dá em vários
locais; ficam isentos da obrigação de cumprir critérios exigidos pelo
21

contratante, como, por exemplo, horários preestabelecidos, dias fixos e


remuneração mensal; podem deixar de comparecer para a prestação de
serviços sem que sofram, por isso, qualquer penalidade (o único reflexo do não
comparecimento é deixar de receber pelo dia de trabalho) e ainda a tarefa
desenvolvida por eles poderá ser substituída a qualquer tempo por outro
profissional sem que isso acarrete danos a ambas as partes.

Nesse sentido, eis o julgado do Egrégio Tribunal Regional do Trabalho


(TRT) da 5.ª Região:

RELAÇÃO DE EMPREGO. INEXISTÊNCIA. DIARISTA. Mantém-se


a sentença farpeada que julgou improcedente a reclamação quando
se verifica que a reclamante laborava como diarista recebendo
apenas os dias trabalhados, podia fazer-se substituir por outra
colega, assim como ausentar-se do serviço por longo período, sem
sofrer qualquer penalidade (TRT 5.ª Região. Processo n.º 0028800-
30.2009.5.05.0011. 2.ª Turma. RO n.º 027232/2009. Relatora
Desembargadora Dalila Andrade. DJ 15/10/2009).

Trata-se, pois, de serviço autônomo3 (uma das espécies de relação de


trabalho lato sensu), e não de relação empregatícia. Por essa razão, não se
aplica, aos diaristas, a Lei n.º 5.859/72, que foi promulgada para regulamentar
tão-somente os empregados domésticos.

Do ponto de vista de uma avaliação técnico-jurídica, trabalhador


autônomo é apenas aquele que ostenta os meios de produção e trabalha para
si, sem intermediários, junto ao mercado de consumo, usufruindo, integral e
livremente, do fruto de seu trabalho. Daí a configuração de uma relação de
trabalho, e não de uma relação de emprego.

Afinal, como já visto anteriormente, o reconhecimento do liame de


emprego, conforme a legislação trabalhista pátria dispõe, está condicionado à
presença, cumulativa, dos requisitos: pessoa física, pessoalidade, onerosidade,
subordinação e continuidade. Em geral, no caso dos diaristas, todos esses
pressupostos caracterizadores da relação de emprego estão presentes, com
exceção da continuidade, da pessoalidade e da subordinação jurídica.

3
A definição legal de autônomo está no artigo 12, inciso V, alínea “h”, da Lei n.º 8.212./91, que
preceitua que é a pessoa física que exerce, por conta própria, atividade econômica de natureza urbana,
com fins lucrativos ou não.
22

Se os diaristas podem fazer-se substituir por outrem na realização dos


serviços sem prejuízo para si próprio ou para o tomador de serviços, tem-se,
pois, ausente a pessoalidade, um dos elementos fático-jurídicos
caracterizadores da relação de emprego.

No tocante ao pressuposto da subordinação, inexiste nos diaristas a


subordinação jurídica inerente à relação de emprego, vez que esses
profissionais prestam os serviços por conta própria, segundo as suas
necessidades e as suas possibilidades. No entanto, isso não significa dizer que
não devam seguir algumas orientações dadas pelo contratante acerca de como
o serviço deverá ser feito.

Corroborando o entendimento de que os diaristas são trabalhadores


autônomos, o Egrégio TRT da 5.ª Região vem adotando o seguinte
posicionamento:

RELAÇÃO DE EMPREGO. DOMÉSTICA DIARISTA PRESTADORA


DE SERVIÇOS DE LIMPEZA. FAXINEIRAS. Faxineira que trabalha
como diarista, em residência particular duas vezes por semana, com
liberdade para prestar serviços em outras residências, não se
constitui empregada doméstica para efeito de aplicação da Lei n.º
5.859/72, mas prestadora autônoma de serviço. Ausente o requisito
da continuidade. Recurso ordinário improvido (TRT 5.ª Região.
Processo n.º 0037000.62.2008.5.05.0463. 5.ª Turma. RO n.º
001093/2009. Relator Desembargador Esequias de Oliveira. DJ
16/2/2009).

Outra diferença importante entre o trabalho autônomo (o dos diaristas) e


o dos domésticos, além dos pressupostos já elencados anteriormente, repousa
no tocante à inscrição junto à Previdência Social (PS). Os diaristas, por não
terem o vínculo empregatício reconhecido, são enquadrados como
contribuintes individuais e devem eles próprios, efetuar seu recolhimento da
contribuição previdenciária, mês a mês, de acordo com os seus rendimentos. A
inscrição como contribuinte individual deve ser feita pelos diaristas nas
agências da Previdência Social.

Vale lembrar que a expressão diarista não se aplica, apenas, a


faxineiras e passadeiras, (modalidades mais comuns dessa prestação de
serviço). Ela abrange, ainda, babás, cozinheiras, tratadores de piscina,
23

pessoas encarregadas de acompanhar e cuidar de idosos ou de doentes,


motoristas particulares, dentre inúmeros outros exemplos.

Ante o exposto até então, o reconhecimento do vínculo de emprego


ocorrerá se a atividade da diarista for caracterizada como periódica e habitual.
Situação que não estará evidenciada se o tomador de serviços, ao contratar
um diarista, procure alternar os dias de trabalho, faça o pagamento ao final do
dia, emita recibo de todos os pagamentos efetuados e verifique se o
trabalhador presta serviço em outros locais e dias diferentes.

Ainda assim, para caracterizar que se está diante do trabalho de


diaristas, deve-se levar em conta quantos dias na semana o trabalhador presta
o serviço. E é justamente nesse ponto que paira a dúvida: qual o número de
dias que a diarista pode trabalhar sem que fique configurada a relação de
emprego?

No caso de uma ação trabalhista, o juiz pode considerar que, se alguém


trabalha em uma casa apenas duas vezes por semana, mas sempre às terças
e quintas-feiras, por exemplo, há continuidade (ou habitualidade) e, portanto,
existe o vínculo. Porém, nada impede que outro magistrado não reconheça o
vínculo ainda que o trabalho aconteça em um único dia por longos anos. É
justamente neste ponto que se concentra toda a celeuma acerca do
reconhecimento ou não do liame empregatício.

2.2 DIREITOS QUE NÃO SE ESTENDEM AOS DIARISTAS EM VIRTUDE DO


NÃO RECONHECIMENTO DO VÍNCULO EMPREGATÍCIO

Já foi visto neste capítulo que diarista é quem presta serviços


domésticos de forma eventual, sem o condão da continuidade que caracteriza
o empregado doméstico e faz surgir o liame empregatício. Trata-se, pois, de
serviço autônomo, como já registrado. Essa caracterização de uma relação de
trabalho, e não de uma relação de emprego, traz uma série de repercussões
em relação aos direitos trabalhistas garantidos aos empregados domésticos e
não aplicáveis aos diaristas.
24

Nessa seara, uma vez não reconhecido o vínculo de emprego e


caracterizada a prestação de serviços como autônoma, ter-se-á a figura do
diarista, razão pela qual o tomador de serviços não é obrigado a fazer o
registro na Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS)4, muito menos
recolher as contribuições mensais para a Previdência Social.
Além disso, não se aplicarão à categoria profissional dos diaristas os
direitos constitucionalmente garantidos aos empregados domésticos,
elencados no artigo 7.º, parágrafo único, da Carta Magna de 1988.
O salário mínimo foi o primeiro dentre os direitos concernentes aos
trabalhadores previstos em nossa Lei fundamental a ser estendido aos
empregados domésticos por força do parágrafo único do artigo 7.º. Tal direito,
porém não se estende aos diaristas, pois aos mesmos é garantido o
pagamento aos serviços prestados feito imediatamente ao término da tarefa.
Dada a ausência de previsão de salário mínimo aos diaristas, também
aos mesmos não se estende o direito à irredutibilidade de salário, e também o
direito ao décimo terceiro salário, posto que o valor percebido pelo diarista não
é fixo e é fruto do acordo entre este e seus diferentes contratantes.
O repouso semanal remunerado, as férias, a licença maternidade e a
licença paternidade, são direitos que não se estendem ao diarista em
decorrência da liberdade que o mesmo tem de organizar e determinar seus
horários e dias de trabalho, bem como os de descanso.
Por não haver subordinação na prestação do serviço pelo diarista, o
aviso prévio é direito não assistido a este, haja vista que o desejo de não
perpetuar com a prestação de serviço não precisa ser previamente notificada.
Quanto à previdência social, o próprio diarista é o responsável por sua
inscrição pagamento, inclusive por isso sua remuneração é superior ao valor
correspondente ao dia de um empregado doméstico.
Ressalte-se que todos esses direitos destacados, bem como os
anteriormente descritos serão estendidos ao diarista se restar configurado o
liame empregatício.

4
Registre-se que é direito do empregado doméstico ter a sua CTPS devidamente anotada, com a
especificação de todas as condições do contrato de trabalho, como, por exemplo, data de admissão e
salário ajustado.
25

CAPÍTULO III

O DIARISTA NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

3.1 CONTINUIDADE X EVENTUALIDADE

A expressão diarista já está popularizada para designar o profissional,


sem vínculo empregatício, que presta trabalho como autônomo nas
residências. O conceito jurídico de diarista já estava definido na própria
legislação previdenciária, por meio do Decreto n.º 3.048/99, que, em seu artigo
9.º, parágrafo 15, inciso VI, define juridicamente este trabalhador como aquele
que presta serviço de natureza não-contínua, por conta própria, à pessoa ou
família, no âmbito residencial desta, sem fins lucrativos.

Subsiste avaliar, porém, se a circunstância de o diarista exercer seu


mister nesta condição enseja, ou não, o seu enquadramento nos mesmos
moldes da legislação do trabalho aplicável ao empregado doméstico.

Nesse desiderato, antes de se ater à discussão doutrinária e


jurisprudencial acerca de quando é reconhecido o vínculo de emprego aos
diaristas, vale comentar, aqui, a controvérsia doutrinária se a figura do
doméstico, preceituada pela Lei n.º 5.859/72, é diferente da figura do
empregado, prevista na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Registre-se
que existem opiniões contrárias sobre o entendimento de haver ou não
distinção entre as expressões natureza contínua5 (ou continuidade), prevista no
artigo 1.º da Lei do Doméstico, e não-eventualidade6, contida no artigo 3.º da
CLT, ao definir empregado.

5
Artigo 1.º da Lei n.º 5.859/72: “Ao empregado doméstico, assim considerado aquele que presta
serviços de natureza contínua e de finalidade não-lucrativa à pessoa ou à família, no âmbito residencial
destas, aplica-se o disposto nesta lei.”.
6
Artigo 3.º da Consolidação das Leis do Trabalho: “Considera-se empregado toda pessoa física que
prestar serviços de natureza não-eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário.”.
26

É importante esclarecer, portanto, que, para boa parte da doutrina, o


conceito de natureza contínua do trabalho é, sim, diferente daquele de não-
eventualidade exigido no artigo 3.º da CLT para a caracterização da relação de
emprego.

A natureza contínua, expressa pela lei, não está relacionada,


necessariamente, com trabalho diário; na verdade, a expressão denota
característica que se liga ao tempo, devendo este ser ininterrupto, seguido,
sucessivo, de forma que o trabalho se desenvolva de maneira expressiva ao
longo da semana.

Já a não-eventualidade se define pelo nexo da atividade laborativa e a


atividade da empresa. Relaciona-se, assim, com a natureza do trabalho
prestado, que deve ser necessário à atividade normal do empregador, mesmo
que prestados de forma intermitente denotando idéia de permanência.

Sérgio Pinto Martins, renomado doutrinador, não vislumbra, porém, essa


diferenciação entre as expressões acima transcritas. E arremata:

O fato de a diarista prestar serviços uma vez por semana não quer
dizer que inexista relação de emprego. O advogado que presta
serviços em sindicato, sob o sistema de plantões, uma vez por
semana, atendendo exclusivamente aos interesses da agremiação, é
considerado empregado, e não autônomo. O importante, no caso, é a
faxineira ter a obrigação de comparecer sempre em determinado dia
de semana, v.g., segunda-feira, a partir das oito horas até as
dezesseis horas, ficando evidenciada a subordinação pela existência
de imposição patronal quanto ao dia e ao horário de trabalho
(MARTINS, 2000, p. 55).

Nessa seara, para que os diaristas sejam, de fato, enquadrados na


relação de emprego, mais especificamente na de doméstico, há que se verificar
se ocorre in casu a reunião dos demais elementos necessários a caracterizar o
doméstico, quais sejam: natureza contínua, finalidade não-lucrativa e prestação
de serviço no âmbito residencial.

Nesse sentido, apesar de o diarista exercer as mesmas tarefas que o


empregado doméstico, ainda assim, ressalte-se, aquele não se confunde com
este, eis que ausentes os requisitos da subordinação jurídica e da continuidade
na prestação de serviços.
27

Pela Lei n.º 5.859/72, percebe-se que o reconhecimento do vínculo


empregatício do doméstico está condicionado à continuidade na prestação dos
serviços, não se prestando ao reconhecimento do liame a realização de
trabalho durante alguns dias da semana. O traço distintivo do trabalho
doméstico e do diarista encontra-se, pois, na forma da prestação dos serviços,
que, para o doméstico, precisa ter natureza contínua ao passo que, para o
diarista, tem natureza eventual.

Diarista, portanto, não é a mesma coisa que empregado doméstico, este


com direitos assegurados constitucionalmente e profissão regulamentada nos
termos da supracitada lei, como já asseverado em outras passagens do
presente estudo.

A contratação de um diarista para a realização dos afazeres domésticos


se justifica, pode-se dizer, pela intenção que muitas pessoas possuem de evitar
um vínculo empregatício, economizar gastos com encargos sociais, férias,
décimo terceiro salário e outras garantias já consagradas ao empregado
doméstico pela Carta Magna de 1988 e poder romper de forma direta e
imediata o vínculo de prestação de serviços. Embora essa realidade seja
frequente na vida das pessoas, ainda há o desconhecimento real das situações
que podem ou não gerar um vínculo empregatício quando se trata da
contratação de diaristas.

O motivo de tanta discussão é que, por diversas vezes, a contratação


desse profissional torna-se objeto de litígio no Judiciário, que, uma vez
provocado deve manifestar-se acerca da existência ou não do pacto
empregatício entre trabalhador e contratante.

Antes de se analisar aqui o contraponto entre continuidade e


eventualidade, ponto-chave no reconhecimento ou não do liame de emprego, é
importante tecer algumas considerações acerca de outras questões que podem
em um primeiro momento, ajudar na caracterização da prestação de serviços
como autônoma ou como uma relação empregatícia.

Inicialmente, é importante focar-se na questão da escolha dos dias em


que ocorrerá a prestação do serviço e da carga horária definida. Se não
houver, por parte do contratante, imposição de dia e horários determinados
28

para a prestação dos serviços, ou seja, se couber ao profissional a escolha dos


dias de trabalho e do horário a ser cumprido, sendo-lhe permitido alterá-los
sem grandes problemas, entende-se que se está diante de um trabalhador
autônomo, diarista, portanto. Afinal, na situação hipoteticamente aqui
apresentada, inexiste subordinação jurídica, logo não há caracterização do
liame empregatício.

Doutrina e jurisprudência também são consoantes quanto à questão da


finalidade não-lucrativa da prestação. Ou seja, se a prestação dos serviços
pelo profissional envolver atividade com fins comerciais, não há que se falar na
figura do diarista, ter-se-á configurada a relação de emprego, eis que presente
a finalidade lucrativa.

Além dessas duas questões principais anteriormente descritas, outras


podem contribuir para o reconhecimento da relação de emprego doméstico em
detrimento da prestação de serviço como diarista. Uma delas é o fato de o
diarista receber, mensalmente, e não, como seria o correto, ao final de cada
jornada de trabalho realizado, pelos serviços prestados em determinado
período naquela residência.

Afinal, como não possuem qualquer vínculo com o contratante, os


diaristas podem, ao final do dia, decidir não mais prestarem serviços àquele
tomador a partir daquela data, sem terem qualquer obrigação formal de pré-
avisarem sua saída ou de cumprirem aviso prévio.

Em suma, o contratante, para garantir a ausência do pressuposto da


subordinação jurídica, não poderá estipular quantos dias na semana o
profissional deverá prestar os serviços, nem determinar quais serão estes dias
ou estipular a carga horária ou a jornada diária ou semanal de trabalho. Além
disso, o pagamento deve ser feito antes do término diário de cada serviço
prestado, ou seja, no final do dia.

Vale, aqui, lembrar, que também é importante o contratante emitir


recibos de todos os pagamentos que efetuar e procurar verificar se o
profissional contratado presta serviços em outras residências em dias
diferentes. Assim, será mais fácil comprovar, em uma possível ação trabalhista,
o caráter eventual – e não periódico e habitual – da prestação de serviços, o
29

que, certamente, irá afastar o reconhecimento do pacto de emprego pleiteado


em juízo.

Ao contratante cabe, apenas, definir qual o trabalhador autônomo


(diarista) irá contratar para realizar o serviço. A forma com que o serviço será
realizado, as habilidades aplicadas, o tempo que irá dispor para o cumprimento
das tarefas, se irá designar eventualmente outra pessoa ou não para realização
do serviço, cabe ao diarista decidir, não ao contratante.

A celeuma surge, porém, quando se passa à análise de quantos dias de


prestação de serviço podem vir a caracterizar o requisito da continuidade ou
reforçar a essência da eventualidade, na realização do trabalho. Afinal, os
entendimentos acerca do assunto são divergentes.

Até hoje, não há uma definição legal que preceitue quantos dias
configuram a relação autônoma da diarista. Trabalho em três dias por semana
é igualmente tratado como trabalho doméstico e como trabalho autônomo.
Assim, muitos diaristas acabam sendo enquadrados como domésticos quando
não era esse o espírito do contratante que se vê surpreendido com uma ação
trabalhista.

Também não há uma regulamentação da atividade desse profissional


capaz de por fim a qualquer interpretação errônea da prestação de serviços.
Pelo menos, isso é o que acontece por enquanto, tendo em vista o Projeto de
Lei (PL) n.º 160/2009 que tramita na Câmara dos Deputados Federais e que
ainda será objeto de estudo na presente pesquisa.

Para fomentar ainda mais o assunto, a legislação não estabelece o


significado da expressão natureza contínua, presente no artigo 1.º da Lei n.º
5.859/72, ficando a cargo dos aplicadores do direito a adequação da norma ao
caso concreto. E, nos últimos anos, a Justiça Laboral tem tomado decisões
diferentes sobre a matéria.

Parte da doutrina entende que a continuidade na prestação de serviços


relaciona-se à inexistência de intermitência, ou seja, o trabalho deve ser
prestado de maneira não casual ou esporádica, projetando-se durante a
semana. Já para outros juristas, a expressão refere-se à perpetuação da
prestação de serviços no tempo, não importando a quantidade de dias
30

laborados durante a semana, mas sim há quanto tempo o serviço é prestado


pela mesma pessoa.

Enquanto o PL supracitado não vira lei, o exame particularizado de cada


situação gera entendimentos diversos quanto à questão da continuidade e da
eventualidade, o que reflete consequentemente, no reconhecimento ou não
do liame empregatício. Não há, pois, unanimidade acerca do assunto.

Nessa seara, boa parte dos juízes trabalhistas diz ser necessário
demonstrar a prática do serviço por três vezes ou mais na semana para a
configuração do pacto laboral. Outros têm considerado que a prestação de
serviço em dois dias exclui o critério de eventualidade, e caracteriza o
pressuposto da continuidade, restando assegurado, por consequência, o direito
ao vínculo empregatício. A controvérsia é tamanha que há, ainda, quem
sustente que apenas um único dia laborado na semana, se for com frequência,
já o incida.

Em um processo julgado em dezembro de 2004, por exemplo, a


Subseção I Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do
Trabalho (TST) reconheceu o vínculo de emprego de uma faxineira do
escritório de uma empresa comercial, mesmo ela trabalhando apenas um dia
na semana. Para o relator do processo, se o serviço é efetuado dentro das
necessidades da empresa, com subordinação e dependência econômica,
pouco importa se a sua prestação se dá em período alternado ou descontínuo.

Nessa mesma seara, o TRT da 9.ª Região também reconheceu o


vínculo empregatício pleiteado por uma diarista que prestou serviços em uma
mesma residência, em um único dia da semana, por vinte e sete anos. No
entendimento do Egrégio Tribunal, trabalhar um dia por semana em todas as
semanas durante vinte e sete anos é prova do pressuposto continuidade,
necessário para reconhecimento do liame de emprego.

Uma argumentação comum nas reclamações trabalhistas desse tipo é a


de que, muitas vezes, o diarista, embora trabalhe apenas um ou dois dias na
semana, mantém a relação ao longo de muitos anos, o que seria por si só
suficiente para caracterizar o pressuposto da continuidade. No entanto, alguns
31

ministros do TST defendem que a longa duração não altera a natureza do


trabalho.

A seguir, tem-se exposta uma coletânea de alguns julgados dos


Tribunais pátrios acerca do tema que demonstram as divergências nas
interpretações acerca do mesmo assunto. Nesses primeiros compilados,
decisões que não reconheceram o vínculo de emprego aos diaristas:

DOMÉSTICA. FAXINEIRA. DIARISTA. A Lei n.º 5.859, de 1972, que


dispõe sobre a profissão de empregado doméstico, conceitua-o como
aquele que presta serviços de natureza contínua e de finalidade não-
lucrativa à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas. Verifica-
se que um dos pressupostos do conceito de empregado doméstico é
a continuidade, inconfundível com a não-eventualidade exigida como
elemento da relação jurídica advinda do contrato de emprego firmado
entre empregado e empregador regidos pela Consolidação das Leis
do Trabalho. Continuidade pressupõe ausência de interrupção (cf.
Aurélio Buarque de Holanda, Novo Dicionário da Língua Portuguesa,
2. ed.), enquanto não-eventualidade se vincula com o serviço que se
insere nos fins normais de atividade da empresa. Não é o tempo em
si que desloca a prestação de trabalho de efetivo para eventual, mas
o próprio nexo da prestação desenvolvida pelo trabalhador, com a
atividade da empresa (cf. Vilhena, 1975). Logo, se o tempo não
descaracteriza a não-eventualidade, o mesmo não se poderá dizer no
tocante à continuidade, por provocar ele a interrupção. Dessa forma,
não é doméstica a faxineira de residência que lá comparece em
alguns dias da semana, por faltar na relação jurídica o elemento
continuidade (TRT-MG. RO n.º 9.829/91. Relatora Desembargadora
Alice Monteiro de Barros. DO 26/8/92).

DIARISTA. NÃO-CARACTERIZAÇÃO. Faxineira que trabalha como


diarista, em residência particular duas vezes por semana, com
liberdade para prestar serviços em outras residências e até para
escolha de dia e horário de trabalho, não se constitui empregada
doméstica para efeito de aplicação da Lei n.º 5.859/72, mas
prestadora de serviço autônoma (TRT 15.ª Região. Processo n.º
1.692/98. 1.ª Turma. Acórdão 4.426/99. Relator Juiz Luiz Antonio
Lazarim. DOESP 9/3/1999).
32

DIARISTA. VÍNCULO DE EMPREGO. INEXISTÊNCIA. A prestação


de serviços em apenas três dias por semana na execução de
serviços domésticos revela a condição de diarista, cuja relação, por
se ressentir dos requisitos da continuidade, subordinação e
dependência econômica, não configura o liame empregatício previsto
no artigo 1.º da Lei n.º 5.859/72. Recurso provido (TRT 10.ª Região.
3.ª Turma. ROPS n.º 00131-2006-010-10-00-3. Relator Juiz João Luiz
Rocha Sampaio. DO 11/2/2007).

RECURSO DE REVISTA. VÍNCULO DE EMPREGO -


CARACTERIZAÇÃO. A teor do art. 1º da Lei nº 5.859/72, constitui
elemento indispensável à configuração do vínculo de emprego
doméstico, a continuidade na prestação dos serviços. Assim, sendo
incontroverso que a reclamante somente trabalhava duas vezes por
semana para a reclamada, não há como reconhecer o vínculo
empregatício. Ademais, esta Corte, já vem decidindo que no caso de
diarista doméstica, que labore apenas uma ou duas vezes por
semana em residência, não se vislumbra o vínculo de emprego, mas
apenas prestação de serviços. Recurso de revista conhecido e
desprovido. Processo: RR - 239400-41.2006.5.09.0005 Data de
Julgamento: 16/03/2011, Relator Ministro: Renato de Lacerda
Paiva, 2ª Turma, Data de Publicação: DEJT 25/03/2011.

RECURSO DE REVISTA. DIARISTA. INEXISTÊNCIA DE VÍNCULO


DE EMPREGO DOMÉSTICO. AUSÊNCIA DE CONTINUIDADE. Para
a caracterização do empregado, regido pela CLT, exige-se a
prestação de serviços -de natureza não eventual- (CLT, art. 3º):
embora o trabalhador venha a não laborar por todos os dias da
semana, sua condição não estará desnaturada quando as atividades
de seu empregador admitirem tal comportamento e assim se houver
pactuado. Já a Lei nº 5.859/72 exige que o empregado doméstico
preste serviços de -natureza contínua-, no âmbito residencial da
família, o que equivale a, em princípio, trabalho em todos os dias da
semana, com ressalva do descanso semanal remunerado
(Constituição Federal, art. 7º, inciso XV e parágrafo único). Não se
pode menosprezar a diferença do tratamento dado pelo legislador a
cada qual. São situações distintas, em que os serviços do trabalhador
doméstico corresponderão às necessidades permanentes da família e
do bom funcionamento da residência. As atividades desenvolvidas
33

em alguns dias da semana, com vinculação a outras residências,


apontam para a definição do trabalhador autônomo, identificado como
diarista. Os autos não revelam a intenção das partes de celebrar
contrato de trabalho doméstico, para prestação de serviços de forma
descontínua, o que, embora possível, não se pode presumir, diante
da expressa dicção legal e da interpretação que se lhe deve dar. O
aplicador do direito não pode, sem respaldo na Lei, transfigurar
relacionamento jurídico eleito pelas partes, dando-lhe, quando já
produzidos todos os efeitos esperados, diversa roupagem. Haveria,
aí, o risco inaceitável de se provocar instabilidade social e jurídica.
Recurso de revista conhecido e desprovido Processo: RR - 192800-
38.2008.5.15.0097 Data de Julgamento: 15/12/2010, Relator
Ministro: Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, 3ª Turma, Data
de Publicação: DEJT 04/02/2011.

Em sentido contrário, eis alguns posicionamentos jurisprudenciais


pátrios em que houve o reconhecimento do vínculo empregatício aos diaristas,
admitindo-se, pois, a relação de emprego doméstico:

RECONHECIMENTO DE VÍNCULO EMPREGATÍCIO. DIARISTA.


TRA-BALHO SEMANAL PRESTADO AO LONGO DE VINTE SETE
ANOS PARA A MESMA EMPREGADORA CONTEMPLANDO
TODAS AS SUAS NECESSIDADES BÁSICAS E COTIDIANAS DO
SERVIÇO DOMÉS-TICO. A Reclamada não conseguiu demonstrar a
existência de pressupostos válidos contidos no artigo 896 da
Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), visto que, in casu, não
restou demonstrada afronta ao artigo 3.º da CLT e nem ao artigo 1.º
da Lei n.º 5.859/72, porquanto consignou o Regional que a
continuidade da prestação de trabalho não quer dizer
ininterruptividade, pois trabalhar um dia por semana, em todas as
semanas do ano, durante vinte e sete anos e contemplando suas
necessidades básicas e cotidianas do serviço doméstico é, sem
dúvida, prova de continuidade. Ademais, no Dicionário Aurélio, o
vocabulário contínuo significa seguido, sucessivo. Melhor dizendo,
não há necessidade de que o labor ocorra todos os dias da semana,
e, sim, de que, na forma contratada pelas partes, seja habitual,
conforme o caso dos autos. Recurso não conhecido (TST. RR n.º
18756/2003-002-09-00.0. 2ª. Turma. Relator Ministro José
Simpliciano Fontes de F. Fernandes. DJ 30/5/2008).
34

VÍNCULO EMPREGATÍCIO. DOMÉSTICA. O conceito de


continuidade tal como constante do artigo 1.º da Lei n.º 5.879/72, que
define o trabalhador doméstico, conquanto não guarde sinonímia com
o de não-eventualidade tem com este simetria, já que indica
permanência. A circunstância de um trabalhador prestar serviços por
dois ou três dias na semana não o descaracteriza como empregado
se, atuando de forma subordinada, o fizer de modo reiterado, isto é,
com vinculação a uma determinada fonte de trabalho, devendo ser
reconhecida a relação de emprego (TRT/SP. Processo n.º
02210200704602003. 2.ª Turma. Acórdão 20080683635. Relator Luiz
Carlos Gomes Godói. DOE 19/8/2008).

DIARISTA. VÍNCULO EMPREGATÍCIO RECONHECIDO. Não se


pode nominar eventual o trabalho prestado uma vez por semana,
para o mesmo empregador, durante um lapso de tempo equivalente a
quase quinze anos, sem registro. Diz-se eventual o trabalho realizado
sem expectativa de sequência. Imprescindível ainda o trabalho
contínuo, entendendo-se como tal a prestação de serviços de forma
reiterada durante um prazo determinado de tempo. A diarista, que
presta serviço por longo período, como na espécie, na execução de
tarefas de limpeza, revela a continuidade do labor, nos moldes da Lei
n.º 5.859/72 (TRT-PR. RO n.º 15.241/00. 4.ª Turma. Acórdão
18.970/01. Relatora Juíza Rosemarie Diedrichs Pimpão. DJPR
13/7/2001).

RECURSO DE REVISTA. DOMÉSTICO. VÍNCULO DE EMPREGO.


CONTINUIDADE NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS.
CARACTERIZAÇÃO. O empregado doméstico é aquele que presta
serviços de natureza contínua sem finalidade lucrativa à pessoa ou à
família no âmbito residencial, nos termos do que dispõe o artigo 1º da
Lei nº 5.859/72. No caso, incontroverso que a prestação de serviços
pela reclamante se deu por quase doze anos, três vezes por semana,
às segundas, quartas e sextas-feiras, mediante o recebimento de
salário mensal, o que denota a continuidade na prestação de
serviços, de modo a reconhecer o vínculo de emprego entre as
partes. Recurso de Revista conhecido e provido. Processo: RR -
250040-44.2004.5.02.0078 Data de Julgamento: 26/05/2010,
Relator Ministro: Aloysio Corrêa da Veiga, 6ª Turma, Data de
Publicação: DEJT 11/06/2010.
35

DIARISTA. RECONHECIMENTO DE VÍNCULO EMPREGATÍCIO. O


Colegiado Regional reconheceu o vínculo empregatício entre a
reclamante (tida por diarista) e a reclamada, considerando o estado
de subordinação jurídica da trabalhadora. Enfatizou, com alicerce na
prova, que a reclamada dirigia a prestação laborativa da reclamante,
determinando os dias e locais de trabalho (3 dias em casa da
reclamada, 2 dias na residência de sua genitora e um dia em casa de
sua irmã) e pagando os salários respectivos. Tal tessitura fática, nos
termos dos artigos 2º e 3º da CLT, não pode ser reexaminada nesta
esfera recursal, a teor da Súmula-TST-126. Agravo de instrumento a
que se nega provimento. Processo: AIRR - 8140-15.2003.5.01.0018
Data de Julgamento: 12/05/2010, Relator Ministro: Horácio
Raymundo de Senna Pires, 3ª Turma, Data de Publicação: DEJT
28/05/2010.

Não resta dúvida, portanto, de que o assunto é extremamente


controverso, tanto que são cada vez mais frequentes processos nos quais
diaristas buscam na Justiça do Trabalho o reconhecimento do vínculo de
emprego. Embora o tema ainda não seja objeto de súmula ou de orientação
jurisprudencial das seções especializadas, as decisões têm apontado
claramente no sentido de estabelecer distinções entre os empregados
domésticos e os diaristas.

Toda essa controvérsia, porém, pode ter uma trégua, caso seja
aprovado, na segunda Casa do Congresso Nacional, o Projeto de Lei n.º
160/2009, que visa à regulamentação da profissão dos diaristas. O referido PL
será o próximo tema a ser abordado no presente estudo.

3.2 O PROJETO DE LEI N.º 160/2009

Ter a profissão regulamentada é a luta de milhares de trabalhadores


brasileiros. No Congresso Nacional (CN), a papelada se aglomera. São mais
de 100 projetos de lei que regulamentam profissões à espera de votação. Entre
36

eles está o Projeto de Lei (PL) n.º 160/2009, de autoria da senadora Serys
Slhessarenko (PT-MT), que visa a regulamentar a profissão de diarista.

A idéia do projeto é que, com a sua promulgação e posterior publicação,


passe a existir no ordenamento jurídico brasileiro base legal, ao menos é o que
se pretende, para dirimir a grande divergência na doutrina e nos tribunais
pátrios acerca do reconhecimento ou não do liame de emprego aos diaristas.
Toda a celeuma existente no cenário jurídico-trabalhista acerca do assunto, e
que enseja uma quantidade infindável de demandas judiciais, pode estar com
os dias contados.

Nas palavras da senadora Serys Slhessarenko (PT-MT), autora do PL:

O principal objetivo foi acabar com a indefinição jurídica do conceito


de diarista que tanto prejudicava contratantes e trabalhadores, pois a
definição da situação jurídica nestes casos ficava sempre ao critério
da sentença de cada Juiz do Trabalho (DIREITO DOMÉSTICO,
2010).

O caput do artigo 1.º do referido projeto reserva-se à definição da


atividade de diarista. Em seu parágrafo único, é estabelecida a obrigação
desse profissional de apresentar, ao contratante, o comprovante de
recolhimento de contribuição à Previdência Social, como contribuinte
autônomo, que, hoje, seria de 11% sobre um salário mínimo. Já o artigo 2.º
estabelece que o Poder Executivo poderá promover campanha publicitária para
esclarecer a população sobre o teor da lei que resultará desta iniciativa.

O PL, cuja tramitação iniciou-se no Senado Federal em abril de 2009, foi


aprovado pela Comissão de Assuntos Sociais (CAS) dessa Casa do Congresso
no dia 14 de abril de 2010, em caráter terminativo, ou seja, sem a necessidade
de ir ao plenário para votação. O relator inicial do projeto, no período de 13 de
agosto de 2009 até 31 de abril de 2010, foi o senador Edison Lobão Filho, que
fez alterações no texto original do projeto que não agradaram aos
parlamentares (assunto que será abordado em detalhes mais adiante).

Tamanha a relevância do assunto, a CAS, antes da aprovação do PL,


realizou audiência pública para discutir a definição jurídica da profissão de
diarista. A audiência, solicitada pela senadora Fátima Cleide (PT-RO), ocorreu
em novembro de 2009. Entre os convidados para o debate estiveram o ministro
37

do Trabalho e Emprego, Carlos Lupi, e a ministra da Secretaria Especial de


Políticas para as Mulheres, Nilcéa Freire7.

Em 10 de maio de 2010, o PL seguiu para a segunda Casa do


Congresso, a Câmara dos Deputados Federais, onde tramita como PL n.º
7.279/2010 e tem como relatora a deputada federal Sandra Rosado na
Comissão de Trabalho. Atualmente o projeto está passando pelas Comissões
Permanentes da Câmara – neste caso – Comissão de Trabalho de
Administração e de Serviço Público (CTASP). Onde ocorrerão 5 sessões a
partir de 07 de junho de 2010.

Se for aprovada na Casa acima citada – Câmara dos Deputados


Federais – vai para a sanção do Chefe do Executivo – Presidente Dilma
Rousseff, para ser transformado em Lei.

Se sancionada, a lei regularizará a situação de mais de 2,3 milhões de


diaristas e fixará normas para o reconhecimento legal dessa categoria
profissional, diferenciando-a do trabalho prestado pelo empregado doméstico.
Regulamentará, pois, o trabalho do diarista, considerando como tal aquele
trabalhador que prestar serviços de natureza não-contínua, até duas vezes por
semana, por conta própria, sem fins lucrativos, para pessoa ou família, no
âmbito residencial destas, ainda que em residências distintas, e com o
pagamento sendo efetuado no final do dia.

No PL, consta, ainda, como dito anteriormente, a obrigatoriedade de o


diarista contribuir, de forma autônoma, com a Previdência Social, ou seja,
deverá efetuar o seu próprio recolhimento da contribuição previdenciária para
ter direito aos benefícios previdenciários. Essa previsão legal retira do
contratante, ou tomador de serviço, a obrigação de fazer os recolhimentos das
contribuições previdenciárias do diarista, como ocorre com o empregado
doméstico.

Como se vê, o projeto define a relação de trabalho da diarista como


autônoma, desde que o trabalho seja prestado por até dois dias na semana,

7
Participaram também do debate Daniel de Matos Sampaio Chagas, do Ministério do Trabalho e
Emprego; Eunice Lea de Moraes, da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres; e Gilberto
Augusto Leitão, do Tribunal Superior do Trabalho (TST). Também foram convidados os presidentes da
Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas, Creusa Maria Oliveira, e da Organização Não
Governamental Doméstica Legal, Mário Avelino.
38

para o mesmo tomador de serviços. Sob essas condições, não vai restar
configurado o liame empregatício. Este só se formará caso o trabalhador preste
serviços por três dias ou mais durante a semana, situação em que se
descaracteriza a figura do diarista e configura-se a de empregado doméstico,
quando, então, o prestador de serviços passa a ter direito ao registro na CTPS
e aos direitos reservados ao empregado doméstico.

O principal ponto deste projeto, portanto, foi colocar em uma lei o que a
Justiça do Trabalho já vinha aplicando, ressalte-se, na maioria de suas
decisões (e não em todas, daí a controvérsia): o reconhecimento do vínculo
empregatício quando o trabalhador prestasse o serviço por mais de dois dias
em uma mesma semana para o mesmo contratante.

A demora na tramitação do projeto na primeira Casa do Congresso


Nacional tem respaldo. Os senadores consideraram que o substitutivo proposto
pelo relator Edison Lobão Filho (PMDB-MA), membro da CAS do Senado,
criava uma série de amarras que dificultavam o exercício da profissão e que
deviam ser mais bem debatidos.

O peessedebista Papaléo Paes destacou:

A proposta de Lobão Filho, da forma como está, praticamente


inviabiliza a regulamentação da profissão de diarista. O parecer é
ruim para todas as partes – contratantes, diaristas e empregadas
domésticas (INFOJUSb, 2010).

Entre as propostas do relator criticadas por parlamentares como Flávio


Arns (PSDB-PR), Paulo Paim (PT-RS), Augusto Botelho (PT-RR) e Mozarildo
Cavalcanti (PTB-RR), estavam: o estabelecimento de um piso para a diária de
um quinze avos do valor do salário mínimo8 (o que, atualmente, corresponde a
R$ 31,00); a carga horária de oito horas de trabalho diárias (hoje, a carga
horária é combinada entre diarista e contratante) e o aumento de dois para três
dias semanais o prazo para que não se configurasse o vínculo empregatício.

Flávio Arns assim justificou a demora na tramitação do PL no Senado:

É necessário um prazo maior para discutir essa matéria e dirimir


todas as dúvidas. O projeto estabelece valores para a diária em um

8
Ressalte-se que, hoje, o valor cobrado pela diária varia de acordo com a região; no Recife, por
exemplo, a diarista cobra, em média, R$ 40,00.
39

país heterogêneo e para uma profissão em que há uma série de


variantes (INFOJUSc, 2010).

A mudança proposta pelo supracitado senador causou polêmica devido


ao risco apontado por entidades que defendem a categoria de alterar a relação
de trabalho entre domésticas e seus empregadores, provocando desemprego e
informalidade. Mario Avelino, presidente da ONG Doméstica Legal9, e também
autor do livro “Empregadas Domésticas x Patroas – Conflitos e Soluções”, era
um dos defensores dessa idéia.

Ele diz ter percorrido o gabinete de trinta e nove senadores para


entregar uma carta com o título “Senador, não assassine o emprego
doméstico”, em uma tentativa de pressionar os parlamentares da comissão
para não votarem o substitutivo apresentado por Lobão Filho. No texto, Mario
Avelino tentava convencê-los de que as mudanças propostas pelo parlamentar
Lobão trariam desemprego e prejudicariam as relações de trabalho ante a
estipulação dos três dias de trabalho para caracterização da figura de
diarista.

Ele pontua:

Caso o projeto seja aprovado com o texto proposto por Lobão, vai
estimular os empregadores a demitirem suas domésticas e a
contratarem uma diarista, diminuindo a quantidade de trabalhadoras
com vínculo empregatício, ou seja, ter uma carteira assinada vira
artigo de luxo. É um retrocesso nas relações de trabalho, além de
gerar desemprego (DOMÉSTICA LEGAL, 2010).

Sobre a regra de estabelecer o valor da diária como um quinze avos do


salário mínimo, Mario Avelino recorda que os pagamentos negociados entre
contratante e diarista variam de acordo com o trabalho a ser realizado. Para
ele, novas ações trabalhistas poderiam ser geradas por tomadores de serviço
de baixo poder aquisitivo que não têm como arcar com esse valor, em especial
nas regiões Norte e Nordeste do Brasil, caso o substitutivo tivesse sido
aprovado pelo Senado Federal.

9
De acordo com dados da ONG Doméstica Legal, existem no Brasil cerca de 6,7 milhões de
trabalhadores que prestam serviços domésticos. Desses, 27% são empregados com carteira assinada e
72% trabalham sem carteira assinada. Do total de trabalhadores, 93% (cerca de 6,3 milhões) são mulheres
e apenas 6,2% (418 mil) são homens.
40

Quanto à estipulação de carga horária para as diaristas, o presidente da


ONG considerou a proposta absurda. Na sua visão:

Uma diária é como se fosse uma tarefa. Pode-se gastar tanto uma
hora como dez horas, a depender da eficiência e da rapidez da
diarista. E quando a tarefa exige uma carga horária maior, o próprio
diarista estabelece um preço que pague de forma justa esta jornada.
[...] hoje nem mesmo o empregado doméstico tem jornada de
trabalho definida em lei (DOMÉSTICA LEGAL, 2010).

E a polêmica não para por aí. Entidades que defendem os empregados


domésticos entendem que o projeto de lei vai tornar ainda mais precário o
trabalho doméstico. Além disso, vêem a regularização da atividade de diarista
abrindo portas para a redução da oferta de trabalho doméstico, uma vez que as
pessoas vão preferir contratar diaristas.

O Ministério do Trabalho e Emprego, inclusive, manifestou-se


contrariamente à aprovação do PL. O seu representante Daniel de Matos
Sampaio Chagas defendeu que o CN deveria reconhecer que as chamadas
diaristas atuam, na verdade, como domésticas, e, por isso, deveria estender-
lhes os direitos conferidos a essa categoria profissional.

E pondera:

Diarista é a pessoa contratada para executar tarefa específica e


eventual. Em sua avaliação, a regularização da atividade de diarista
pode intensificar a informalidade da profissão de doméstica, bem
como tornar mais precária essa atividade profissional (INFOJUSa,
2010).

Com a aprovação do referido PL pela Câmara, ter-se-á a Lei


propriamente dita, apta e capaz de gerar direitos e obrigações à sociedade. A
partir de então, estará praticamente encerrado – ao menos é o que se espera –
o embate jurídico que paira nos tribunais trabalhistas pátrios acerca do tema,
visto que estará sedimentada a questão do reconhecimento do vínculo apenas
para prestação de serviços que ultrapassem dois dias na semana.

Afinal, tendo em vista a futura regulamentação da profissão de diarista, a


tendência natural é a diminuição do número de reclamações trabalhistas que
pleiteiam o reconhecimento do pacto laboral. Ainda assim, certo é que o projeto
41

de lei será objeto de muitas discussões, debates e reflexões, não só por parte
dos operadores de direito, mas também por toda a sociedade, e, inclusive, pela
própria categoria profissional. Esses questionamentos são necessários até que
os entendimentos sejam sedimentados pela doutrina brasileira e pela
jurisprudência dos tribunais.

À parte de qualquer nova celeuma que, por ventura, possa surgir, não
seria exagero afirmar que se trata o PL de uma medida legislativa que procura
atender os dois pólos da relação jurídica. Afinal, de um lado, determina quantos
dias caracterizam a prestação de serviços do diarista. De outro, concede a
segurança jurídica necessária aos contratantes. Nessa seara, é essencial que
resguarde o equilíbrio entre os interesses de trabalhadores e contratantes para
que alcance, de fato, o seu real propósito, o que só o tempo será capaz de
registrar.
42

CONCLUSÃO

É do Direito do Trabalho que emana todo o conjunto de normas jurídicas


que regem as relações entre empregados e empregadores, e os direitos
resultantes da condição jurídica dessa relação. No Brasil, estas normas estão
compiladas na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), protegidas pela Lei
Fundamental pátria e tuteladas nas várias Leis Esparsas, como, por exemplo, a
Lei n.º 5.859/72, que regulamenta o empregado doméstico.
Os empregados domésticos, em decorrência de sua regulamentação,
têm conceito, direitos e deveres normatizados, o que coloca à disposição dos
doutrinadores e dos operadores do Direito algumas bases legais para o
reconhecimento não só do vínculo de doméstico, mas também do rol de
garantias estendido aos tutelados. Ainda que dúvidas sejam suscitadas em
determinadas situações, busca-se nos dispositivos legais pertinentes que
regem a categoria a solução para os embates que, por ventura, se façam
presentes.
O problema surge quando inexiste uma regulamentação para uma
determinada categoria profissional, como no caso dos diaristas. Estes estão
imersos no ordenamento jurídico sem qualquer amparo legal, e por isso, ao
logo de décadas, têm ficado à mercê de entendimentos jurisprudenciais e
doutrinários diversos, ora há o reconhecimento de uma relação de trabalho, ora
de uma relação de emprego. Ainda que os conceitos de uma e outra relação
não se confundam, reconhecê-las, na prática, não é tarefa das mais simples e
repousa no ponto central da análise se existe ou não a chamada continuidade,
em oposição à eventualidade, na prestação dos serviços.
A falta de regulamentação da profissão dos diaristas gera uma
insegurança jurídica, que se prolonga desde há muito tempo. E é justamente
dessa inércia dos legisladores ordinários pátrios que surgiu o Projeto de Lei
(PL) n.º 160/2009, já aprovado pelo Senado Federal, mas ainda em tramitação
na Câmara dos Deputados Federais10, com o escopo de regulamentar esta
categoria profissional.

10
Ressalte-se que até a conclusão da presente pesquisa o referido projeto ainda não havia sido
aprovado.
43

O PL, lançou-se com a expectativa de pacificar, de uma vez por todas, o


entendimento de quantos dias, de fato, ensejam a caracterização do liame de
emprego aos diaristas. Se aprovado, o PL pode trazer mais tranquilidade
àqueles que contratam prestadores de serviços esporádicos em suas
residências. O ideal, mesmo, é que possa, além disso, vir a lançar bases para
legislações futuras, capazes de fortalecer, a atividade dos diaristas, tão comum
no nosso país.
Ainda não é possível prever e dimensionar todos os reflexos dessa nova
lei, caso o PL venha a ser aprovado, nas relações que se formarão a partir de
sua sanção, promulgação e publicação, quando então tomará o corpo de lei.
Por isso, toda a comunidade jurídica e a sociedade ficam no aguardo das
benesses desse novo diploma legal no ordenamento jurídico-trabalhista
brasileiro.
O presente estudo teve por ambição servir como um instrumento de
reflexão e análise das várias interpretações hoje existentes e, muitas vezes,
distintas, e inclusive contraditórias, emanadas por juristas, magistrados e
doutrinadores acerca do tema aqui proposto, que se revela tão antigo, mas
igualmente tão atual.
Esta pesquisa não esgota toda a controvérsia acerca da caracterização
da prestação de serviços pelos diaristas como uma relação de trabalho ou
como uma relação de emprego. Tendo em vista que a prestação de serviço
realizada pelo diarista tem natureza domestica, enquanto persistir a
inexistência de regulamentação desta categoria a citada controvérsia
dependerá da análise do caso em concreto.
44

CONCLUSÃO

É do Direito do Trabalho que emana todo o conjunto de normas jurídicas


que regem as relações entre empregados e empregadores, e os direitos
resultantes da condição jurídica dessa relação. No Brasil, estas normas estão
compiladas na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), protegidas pela Lei
Fundamental pátria e tuteladas nas várias Leis Esparsas, como, por exemplo, a
Lei n.º 5.859/72, que regulamenta o empregado doméstico.
Os empregados domésticos, em decorrência de sua regulamentação,
têm conceito, direitos e deveres normatizados, o que coloca à disposição dos
doutrinadores e dos operadores do Direito algumas bases legais para o
reconhecimento não só do vínculo de doméstico, mas também do rol de
garantias estendido aos tutelados. Ainda que dúvidas sejam suscitadas em
determinadas situações, busca-se nos dispositivos legais pertinentes que
regem a categoria a solução para os embates que, por ventura, se façam
presentes.
O problema surge quando inexiste uma regulamentação para uma
determinada categoria profissional, como no caso dos diaristas. Estes estão
imersos no ordenamento jurídico sem qualquer amparo legal, e por isso, ao
logo de décadas, têm ficado à mercê de entendimentos jurisprudenciais e
doutrinários diversos, ora há o reconhecimento de uma relação de trabalho, ora
de uma relação de emprego. Ainda que os conceitos de uma e outra relação
não se confundam, reconhecê-las, na prática, não é tarefa das mais simples e
repousa no ponto central da análise se existe ou não a chamada continuidade,
em oposição à eventualidade, na prestação dos serviços.
A falta de regulamentação da profissão dos diaristas gera uma
insegurança jurídica, que se prolonga desde há muito tempo. E é justamente
dessa inércia dos legisladores ordinários pátrios que surgiu o Projeto de Lei
(PL) n.º 160/2009, já aprovado pelo Senado Federal, mas ainda em tramitação
na Câmara dos Deputados Federais11, com o escopo de regulamentar esta
categoria profissional.

11
Ressalte-se que até a conclusão da presente pesquisa o referido projeto ainda não havia sido
aprovado.
45

O PL, lançou-se com a expectativa de pacificar, de uma vez por todas, o


entendimento de quantos dias, de fato, ensejam a caracterização do liame de
emprego aos diaristas. Se aprovado, o PL pode trazer mais tranquilidade
àqueles que contratam prestadores de serviços esporádicos em suas
residências. O ideal, mesmo, é que possa, além disso, vir a lançar bases para
legislações futuras, capazes de fortalecer, a atividade dos diaristas, tão comum
no nosso país.
Ainda não é possível prever e dimensionar todos os reflexos dessa nova
lei, caso o PL venha a ser aprovado, nas relações que se formarão a partir de
sua sanção, promulgação e publicação, quando então tomará o corpo de lei.
Por isso, toda a comunidade jurídica e a sociedade ficam no aguardo das
benesses desse novo diploma legal no ordenamento jurídico-trabalhista
brasileiro.
O presente estudo teve por ambição servir como um instrumento de
reflexão e análise das várias interpretações hoje existentes e, muitas vezes,
distintas, e inclusive contraditórias, emanadas por juristas, magistrados e
doutrinadores acerca do tema aqui proposto, que se revela tão antigo, mas
igualmente tão atual.
Esta pesquisa não esgota toda a controvérsia acerca da caracterização
da prestação de serviços pelos diaristas como uma relação de trabalho ou
como uma relação de emprego. Tendo em vista que a prestação de serviço
realizada pelo diarista tem natureza domestica, enquanto persistir a
inexistência de regulamentação desta categoria a citada controvérsia
dependerá da análise do caso em concreto.
46

BIBLIOGRAFIA

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49

ÍNDICE

RESUMO............................................................................................................ 4
METODOLOGIA................................................................................................. 5
SUMÁRIO........................................................................................................... 6
INTRODUÇÃO.................................................................................................... 7
CAPÍTULO I
A PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS E A RELAÇÃO DE EMPREGO .................. 10
1.1 – CONSIDERAÇÕES GERAIS ................................................................. 10
1.2 – ELEMENTOS DA RELAÇÃO DE EMPREGO.........................................14
1.3 – A RELAÇÃO DE EMPREGO E O EMPREGADO DOMÉSTICO............ 17
CAPÍTULO II
ELEMENTOS CARACTERIZADORES DO DIARISTA .................................. 21
2.1 – UNIVERSO FÁTICO................................................................................ 21
2.2 – DIREITOS QUE NÃO SE ESTENDEM AOS DIARISTAS EM VIRTUDE
DO NÃO RECONHECIMENTO DO VÍNCULO EMPREGATÍCIO.................... 24
CAPÍTULO III
O DIARISTA NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO........................ 26
3.1 CONTINUIDADE X EVENTUALIDADE .................................................... 26
3.2 O PROJETO DE LEI N.º 160/2009 ............................................................ 36
CONCLUSÃO................................................................................................... 43
BIBLIOGRAFIA................................................................................................ 45

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