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TECNICA DO DISCURSO MODERNO — Todos os direitos reservados — INDICE Introdusio necesria . Providinciss indispensiveis pars bem falar ‘Exercicion de dialéctica Teonica do dicure. Invengio, disposigio ¢ elocucio Meine pans atquisir os cinco wstodes da orador © exsisio Em face de win audisério sdvereo Peroragdr ov epg: A natragio © a divisio Regras pritieas sAbre 0 diseurso A orcemn das arguanentos Dos estas © das atitues © eatilo do discuss ObservagBes Tebricn-Prlcies see os cams tatados As palavras de valor As Figncdes Nove Regras tre o empréso dae figura: RograssSbrewempatge das figsas Come proceder quando hi intersupgaes Brerctcioe pritios Byereios para a meméria Para dar brilhn © vigor 4 vor Novos exercicles analiticas e siniétieas Dioteoe exerecios pritcne Recontendagice importantes 50 cegrs Re gc pr oii po Regras para discursaevegundo 08 temas Com se deve der «coma nfo deve dizer amos gogo ttn: Preto latnoe Prefinos Gros miquecmento do rocabultn ‘Origem € siguifieasio das palavras. u B 2 8 4 eo Si 3 30 6 o 87 ”5 WoL 1B 33 ML M5 133 1B 187 193 197 205 25 23 INTRODUGRO NECESSARIA Em complemento ao nosso “Curso de Oratéria ¢ Retérica”, ‘oferecemos agora ao leitor “A Técnica do Discurso Moderna”. Esta obra, eminentemente pritica, tem wm excopo delineado: dar ao estudioso da arte de falar em piblico o que ainda hé de actual nas regras clisscas da retética, permitindo-lhe o manejo mais eficiente da palavza Nio se pode deixar de recoahecer que 0 discurso dos nossos dias no pode mais cingirse totalmente as regras da rctSrica srega, ca retérica romana ow da Renasceng europeia, nem ‘muito menos 20 condoreirismo excessivamente eloquent, mas palavros0, dos discursos do periodo que antecede & Revolugio francesa que perduraram, ateavés do romantismo, até 08 20808, dias nfo s6 na Europa, como entse nds. Aquele exigéro na adjectivagio, o abuso das imagens da retdrica, das figuras que servem para embelezar a frase, os ade- -manes ¢ os g2stos excessivos, 0 tom trémulo e gargarejante da ‘voz, ou excessivamente tonitroante, o efeito espectacular das oragées, tudo isso, na verdade, perdeu seu valor, devido a0 abuso cometido por oradores menores. A sobriedade eloquente da oratéria moderna, que exige idcias claras, preciss, nftidas, revestidas de expresses adequadas, simples, mas apresentadas com a mfxima seguranca, leva-nos a0 abandono de muitas das velhas normas ¢ o aproveitamento mais comedido de outzas,a par de inovagdes, que sio de grande aproveitamento para quem empreende esta arte pedtiea, to Util e nevessitia, que #0 pleno dominio das palavens. uv MARIO FERREIGA BOS SANTOS: O mnétorlo empregado neste livro serve pata corsoborar 9 que apresvntimes em nossa primeira obra de dratéria, Os diseusos analisados neste e a5 regras expostas, bem como os capitulos, onde sintetizamos 0 que de mis eficiente se pode usir na oratéria moderna, muito auxiliario ao estudioso 0 pleno exercicio de suas faculdades, com a acquisigio ficil, no decoreer do tempo, da palavra fluente, ao lado de uma forma adequada 4 boa expresso das ideins. Prosseguindo na orientago de nosso liveo anterior, neste “apresentamos novos cxercicios, como os que se referem ao forta- lecimento da meméria, a0 desenvolvimento do raciocfnia e da meditagio, esta to necessdria para a construcio da personali- dade, sem a qual nenhum orador consegue persuadir ou dissia- dir, exercfcios de andlise dialéctica, e os que se referem As origens das palavras ¢ derivados destas, permitind, assim, 0 enriquecimento do vocebulftio, imprescindivel ao orador. © estudo prético dos érimos verbais, a andlise técnica dos elementos do diseurso,a maneira de orgavizé-o, ea coordenagio dos gestos, voz e palivras, cooperando para a formagio de urn todo. expressivo, os ertos e defeitas que se deve evitar, 0 estudo de cinquenta novas recomendagies impetiosis a0 orador, tudo isso esté insert nesta obri, que complementa 0 que haviamos realizado em 0 "Curso de Oratéria e Ret6rica”. A longa experitncia, que obtivemos através dos nosses cursos de oratéria, nos habilita a justificar plenameente as afirmativas © normas que oferecemos no decorrer de nossas obras, que con servam 0 que hé de proveitoso nas cléssicas normas da retSrica ‘grega e romana, como compendia, ademais, 0 que de novo conquistimos no decorer do Renascimento ¢ na chamada poca moderna, com a apresentagdo de um método mais seguro para alcancar 0 desideratum dos que se deicam ao estudo desta nobre arte. Mirio Ferreira dos Santos PROVIDENCIAS INDISPENSAVEIS *PARA BEM FALAR A RESPIRAGAO Um dos pontos mais importantes, cuja ieregularidade pie em risco a nossa satide, € a falta de uma respizagio bem ordenada, Geralmente ao respiramos bem. Quando em crianga, época fem que nos deveriam ensinar a melhor forma de respira, nossos pais e mestres de tal se descuidam. Posteriormente, quando homens feitos, muitos dos nossos males decorcem de uma tes- piragio deficiente e mal orientada Para quem usa da palavra, mesmo muma conversa, 9 boa respiracio € fundamental, A perda de félego acarteta a dimi- auigio do volume de voz, tornando inintcligivel aos ouvintes © que diz. 0 orador. Em nosso “Curso de Oratéria ¢ Retérica” muito falamos sobre a necesidade da regularizagho da respiraglo, e dems ale guns exercicios que ausiliam a fortalecer a vor, aumentar-lhe 9 volume, ¢ dar-he mais brilho. ‘Mas, hoje, quezemos estudlar um exercicio de magna impor- tncia, que € o da meditagio, imprescindivel para o desenvolvi- mento intelectual do orador. Para chegarmos até If, precisamos examinar préviamente um exereicio. respiratério fundamental, que deve ser praticado, durante pelo menos 5 minutos, duas vezes ao dia, ao acordar antes de deitar-se O exercfeio respiratdrio & 0 seguinte: Lava-se primeiramente, com um pouco de gua, que seaspira, as narinas, Toma-se depois a posigfo erecta, Com as mios te MARIO FEKREERA DOS SANTOS enticerivadas ates lt nica, inickese a inspiragi mésima pos sivel, que deve demorar o tempo que se leva a contar até 4, snentalmnente etén-se ar inspirado durante 0 tempo em que contamos 1 10 ou 15, expirando-o, depois, lentamente, cnguanto conta nos até 6. Apis esa expiragio, fazemos um descanso, enguanto conta wos até 3, sem respirar, reiniciando, a seguir, o mesmo exercicio. Quando da expiracto, vergamos 0 corpo em direegin sos joelhos, tanto quanto nos for possvel Kisse exercicio pode set feito em ntimero, de inicio, del vezes, aumentando-se até 20, fzendo-se intereilos, para descanso, de Sem 5, ou de 10 em 1) veres © uso deste exerecio nfo exclui outros que acaso costume fice 0 leitor. Mas é inprescnivelfaser ete, pelo menos. HK. & noite, antes de deitar, deve ser repetido. RESPIRACAO RITMICA Ao deitarmo-nos, em dectibito dorsal, isto & com as costas wottadas para baixo, estiramos as pernas, abrianos levemente os bbragos, em arco, € com as mifos tocando no corpo, iniciamos cxercicio de respiragio sitmica, por um tempo indeterminado, Viste exercicio consiste no seguinte: deve, quem 0 emprega, aulquisis, a pouco ¢ pouco, um ritmo regular entre a inspiracio +2 expiragio, reaizadas leatamente, Deinora-se na inspiragio enna expiragio, até adquicir-se © ritmo natural, fluidico, da tespiragio. Com o decorrer do tempo, consegue-se ating tal Huidez, que Iuutece nem sequer respiranos. AGERICA DO DISCURSO MOBERNO ” Apis este exercicio, que no inicio exigiri a convergtncia de toca nossa atengio para o ritmo constante e igual da inspiragi espiragio, pratica-se 0 exerccio de meditacao, Aquele exercicio fuidifica 0 pensamenta de tal modo que facilita uma meditagZo com poder atencional cada vez maior o que robustece a nossa capacidade de pensar e de examin, ideias, imprescindivel ao bom orador. Esse mesmo exerc{cio pode ser realizado durante o dia. Pode set praticado de outra forma: Sentamo-nos numa ca- deira, sem deixar que nossas costas se juntem a0 encosto, em posigio erecta, Unem-s¢ as pernas © eruzam-se as mos, com as palmas volta- clas para cima, a mao direita sobre a esquerda, e realiza-se 0 exercicio ritmico de respiracio. E posivel que, no inicio, sucedam alguns factos que nfo nos dlevem preocupar, como, por exeimplo, tremuras, respiragio ofegante € descontrolada, estremecimentos, te. ‘Todos eles sfo naturais no infcio, mas tendem a desaparecer 4 proporedo que o exercfcio € realizado. Com 0 decorrer do tempo se adquite o pleno equilibrio, e a respiragio ritmica fluidilica-se de tal modo, que sentimos um bem estar em todo 0 corpo, Apts a realizagio desse exercicio, no qual pomos, de inicio, toda a atengio, passimos 3 posigio normal, na mesma eadeira cou na cama, e meditamos sobre um tema, isto é, realizamos 0 EXERCICIO DE MEDITACAO Importantissimo este exercicio pelas seguintes raades: 1) Acostuma-nos 4 mxima atengio 3s ideias. Quem adquire esa capacidade, obtém na vida uma fortuna. Os grandes homens, em todos os sectores, quer do conheci- mento, como sibios, fildsofos, etc. quer da agio, como chefes is MARIO FERREIRA DOS SANTOS nilitares, politicos, industriais, comerciantes, que realizaram, tanto em (Go pouco tempo, e que slo cafiazes de resolver um problema em minutos, que outros necessitariam anos, que vém vvantagens ou cesvantagens numa posigio, que outros nem se- quer percebem, foram e sfo homens de uma grande capacidade stencional as ideias (o que na psicologia se chama de refleedo) E esta capacidade se adquire pelo exercicio de meditar. Prestar a atengio a uma ideia & aumentar a tensio do nosso esplrito, dirigida para o que nos interessa, o que aumenta nossa capacidade de pereeber semelhangas ¢ diferengas, Assim, nds, quando olhamos desatentamente alguma coisa, no captamos ‘Go bem os seus diversos aspectas como quando dirigimos nossa tensio psiquica para o objecto, isto ¢, prestando-lhe atencio, Esse exerefcio tende a dar ao espisito uma capacidade re- dobrada de tengo, o que fortalece a inteligéncia, muito mais do que se possa julgar. 2) O exercicio de meditagio, obtigando a prestar atengio a uma ideia, permite, por sua vez, captar quanto ela contém. Process-se da seguinte maneira: 4) vé-se, em primeiro lugar, o que diz a idea, Digamos que vamos meditar sobre a guerra, = Primeira providéncia é ver o que é guerra, qual 0 conteudo esse conceito. Uma guerra é uma luta, Mas uma luta qual quer nfo é guerra. F. necessirio que nessa luta haja lutadores armados, que se opdem. Mas hi guerra entte dois antagonistas armados? Realmente s6 se poderia empregar 0 termo guerra reste caS0, num sentido muito Tato. No sentido normal, pax lavra guerra quer indicar a luta entre bandos armados, que se antagonizam e procuram impor-se um ao outro, isto &, veneer 0 adversirio, 8) Realizada esa colocacio do conceito, vejamos em que esté contido, A guerra, onde se dé? Dé-se entre homens, por exemplo, mas podemos admitir guerra entre anicnas, armados das armas naturais? Mas entre os homens tais TENICA DO Disct RS MODERNO 9 {guerra implicam instrumentos ofensivos e defensives, Ela dése na sociedade humana, entre grupos, nagies, povos, ete ) Que implica o conceito? O conceito guerra implica arma mento, organizagao, indéstria, etc. Neste caso, quem ‘medita sobre este tema poderd juntar iniimeros pensa- mentos que a ele se associam, COMO SE PROCEDE A MEDITAGAO, Durante a meditagio, toda a atengfo do esplrito deve ditigir- se para o tema que se medita, Mas essa atengio, no prinefpio, € quase impossivel conseguir-se, pois ideias vagabundas, outras ‘dias, que nio esto contidas prdpriamente nem relacionadas com 0 tema, sobrevem © nos desviam a atengio. ‘Que fazer em tais casos? A providéncia que se impie € nfo icritar-se por isso, pois €absolutamente natueal que tal acontega, Quando se percebe que nosso esplrito esté divagando, focali- zando outras ideias, volta-se novamente ao tema cin meditagio, evitando-se (0 que é importante!) abocrecer-se com tal coisa, Niio hé necessidade nenhuma, nem convém em absoluto, ficarmos nervosos por nfo poder manter por muito tempo uma ‘meditagio sobre um tema. Toda preocupasio, todo nervosismo, aqui, 56 pode prejudicar. Compreenda-se que é natural, ¢ re- torne-se ao exercicio, tantas vezes quantas pudermos. Finalmente, apés algumas semanas, ¢ em certos casos, ainda normais, alguns meses (3, 4 e até 6), adquire-se o pleno dominio da atengio, ¢ estando aptos, desde esse momento, a visualizar, com 0s olhos do espirito, qualquer pensamento, ¢ a desdobrilo sob todas as formas possiveis, através de anilises, Este exercicio do 8 desenvolve a capacidade de pensar, como a inteligencia ea meméria das ideias, 0 que ¢ importante, no 36 para a oratétia, como para integragio da pessoa humanal n MARIO FERKEIRA DOS SANTOS ‘TEMAS PARA MEDITAGXO. (Os mais variados temas podem ser aproveitadas para este exercicio, Vamos estabelecer algumas condigdes indispensivcis para o bom éxito a ser aleangado, cujo emprego é importante: 1) Tomar uma postura, € pert ‘mento do compo, bragos, ee. ser nela, sem fazer movi- 2) Por os oltos fixamente sobre vim ponto, «fim de ter toda a tensio psiquica voltada para 0 assunto. Seria conveniente fechar os olhos ¢ fisar 0 olhar sobre a direcgio da ponta do nariz, Se causar mal-esta, fist-lo mais distante. Pode fazer-se, também, com os olhos abertos mas, neste caso, hi perigo de desateng 3) Escolher um higarsilencioso, se possivel, ¢ permanecer sb, Procutar pronunciar tntimamente as palavras que formam as rages construidas, buscando dar-Thes ums forma regular gramaticalmente perfeita, tanto quanto possivel. 4) Realizar 0 exercicio tantas quantas vezes se puder. 5) © tempo é indeterminada, A principio bastam alguns segundos, depois minutos. Uma meditagio de 5 minutos 44 étima, 8) Os temas podein ser os mais wariatlos, desde os mais sim- ples aos mais complesos. A principio cacolhem se os mais simples: por exemplo meditar sobre um dos aforismas que oferecemos em nosas obras de oratéria. Toma-se um pensamento, ¢ medita-se sobre ele. Realiza-se uum discurso interior, analisando todas as ideias, contidas 2a ideia exposta. Pode tomat-se uma palavra € analisile, e asim complexionar 0 exercicio, a pauco ¢ pouco, tanto quanto for posivel Nunca desanimar encontrando dificuldades no prinetpi, por- que estas séo naturals, PEENICA DO DISCURSO MODERN, a 0 dominio da meditagio sf se consegue depois de umn grande esfotgo, mas os beneficios adquiridos so supinaniente compen saoces, Realizé-o ditriamente, antes de dormic, quando ji estamos deitados, logo apés haver feito o respiratétio, DIALOGO INTERIOR ‘Com o decorrer do tempo, ¢ depois de se haver conquistado, certo dominio na meditacSo, convém discutir interiormente, pondo as ideias em choque, Poddemos desdobrar-nos em dois antagonistas, que defendem ideas opostas ou levemente discordantes, sobre 0 tema em meditagdo. Neste caso, juntam-se as razies de ‘um lado em oposigio &s razics do outro, e fazem-se paralclos, andlise, to complexas quanto possfvel, De inicio, poclemos escother temas politics, ideolégicos ou religiowos, ¢ fazer a discussio interior, apresentando rizies de uum lado € d'outro. Deve-se procurar encarnar a posigio de cada Jado, para acostumarma-nos a ver 0s lactos, segundo as suas oposigdes, ¢ evitarmos, no futuro, as visées unilaterais. Com esse exerefeio nos acostumamas, 20s poucos, a canhecer 4s possiveis rates do arlversfrio, ea preparar as respostas con- venienies, capazes de fortalecer ¢ justificar 0 ponto de vista que sustentarmos. Nos exerefios analiticos e sintéticos, oferecemos insimeros temas, Stimos para 9 meditagio, ‘Mas quem pratica este exercicio deve, por s! mesmo, escolher os temas Em nossa época, discate-se muito 0 problema da mulher Deve ela penettar ou nfo na vida econdimica ¢ competi com 0 homem? MARIO FERREIRA DOS SANTOS Ponderar as razdes a favor eas taxes contrérias. Fo divércio conveniente ou ni Ponderar as razécs de um lado ¢ de outro, Colocé-las mental: mente, segundo as diversas posigles, Analistlas. Ver os argu- mentos que podem robustecer esta ou aquela posiglo. Colocar os diversos argumentos ¢ analisé-los separadamente para descobrir-Ihes as falhas ou virtues. Sopesar, balancear os argumentos pré ¢ contra, e procurar conclusées, etc. Todos esses exercicios sfo de grande utilidade, pois além de ausiliar 0 desenvolvimento da inteligéncia, aumentam a capa- cidade de atengo mental, desenvolvem o raciocinio, © poder de argumentacio, e a palavra mais fil Esses exercicios, que sio feitos interiormente, no excluem os aque se devem fazer a “auditérios imaginérios”, j4 com a pro- smincia das palavras, por nés tantas vezes aconselhades, pois uns fortalecem os outros, favorecendo-nos a conquista dessa nobre arte, tio dil também, que é a oratéria. EXERCICIOS DE DIALECTICA Oferecemos uma série de exemplos de exerefcios dialécticos, que servem para mostrar ao estudioso de oratéria, como ¢ nnecessrio dspor com atengio as afirmativas que faz, ou a8 que faca seu adversirio, para que encontre 0 pontos fortes e of fracos, que Ihe failtem uma andlise,capaz-de permitir-Ihe res ponder a um argumento apresentado. Sombart, em seu famoso liveo “O Apogew do Capitalismo” reproduz. esta passagem de H. Lugardelle, cujo tema pode ser analisido dentro das bases da dialéetica (I) Diz aquele autor: “O socialisno € 0 sindicalismo ... so, aeste morsento em que falo, os agentes essenciais da civlizagto no mun- do. Tmpelem 0 capitalismo aos caminlias do mais alto aperfeigoamento posivel. Quanto mais. pressionantes iv ws exigucias da clase obser isis wudaionas event seras injusticas, e mais se acelera ese intensfica o desen volvimeato téenico, As conquistas do proletasiado no permitem uma indstria rotineisa, enraizada nos velhos métodos, sem iniciativa nem auddcia, Feliz do capita lismo que encontra ante sf um protetariado combativo © exigente”. Esta afirmativa, endossada por Sombart, merece andlise. De antemio, é possivel tomar duas atitudes, ambas perigosas, por serem unilaterais e absolutistas: ou asiste verdade ao autor citado ou ndo the assiste, i) Pore um Bom esse da salefes o da dscodaitetes, scmmetiones oo tetor on rouor dor “Lips Diclcten" @ "Floto Comovso” gue ‘foracom or mies babes pare cole oma Shige ergumenaree, 26 MARIO FERKEIRA DOS SANTOS Mas, nifo se pode esquecer, que € possfvel ¢ fundado racio cinar deste mocio, Se cstabelecemos que a afirmagio acima & uma regra geral, que aceita excepeio, podemos concordar com cla. Resta apenas verificar se realmente se do tais excepedes Se hi excepgées nao se deve acetar wma afirmagio geral como absoluta, Belo menos, estas precisam ser consideradas. Examinando-se os factos que decorreram no mundo, veri- ficamos que as greves, com a finalidade de aumento de saléio, quando vitoriosas, levaram muitos capitalistas a melhorar a téenica de produgio, a fim de poder colocar no mercado os produtos sem aumento do prego. Tal se verificou, em muitos «as0s, nos grandes paises, como na Alemanha, Inglaterra, Estados Unidas, ete Entretanto, em outros, tais aumentos de salério levaram os capitalistas a um aumento do custo da produgio e consequente- mente a um aumento do prego de vena, redabrado, como é 0 exemplo do Brasil Aqui, entre nds, as greves nfo conseguiram, senio muito leve- mente, forgar os capitalistas nacionais a melhorar a técnica da prodigio A solucia mais simples ao aumenta de eusto de produgio no é a reforma técnica, pois nfo somos produtores de méquinas, nem o nosso capitalismo encontra da parte do consumidor uma resistencia aos aumentos dos pregos. Por isso, resolve pelo mais simples (¢ 05 meios mais simples sto quase sempre os piores), que € 0 de aumientar o prego que, por sua ‘yer, por um mecanisino prejudicial, como se pratica no Brasil, € dliplice ou triplicemente aumentado para 0 consumidor. Ao intermedistio nao interessa manter os pregos, pois os seus Iuctos slo proporcionais aos pregos de venda, rario pela qual Jogo os aumenta, quando o produtor se vé obrigedo a aumentar, por sta parte, 0 prego de venda. Onde 0 consumidor resiste aos aumentos de presos, 0 pro- utor nfo pode aumentar os seus a0 intermedidtio, pois este TRENICA DO DISCURSO MODERNO- perde em vez de ganhar, ¢ opie-se ao aumento, Desta fori restadhe apenas a solugio da melhoria técnica «ht prolugio, diminuigio de gastos, etc., que vém beneficiar a toxlos, sem serifiear a ninguém, Esta a r2zo porque em certos paises a ago enérgica de wm proletariado organizado acaba tornando-se favordvel a torlos. E por outta parte permitiu, facilitou e apressou a reforia técnica da sociedade, que & muito mais importante do que s¢ julga, e que irk provocar, com o decorrer do tempo, transforma Bes que poucos so capazes de prever. Mas estariamos examinando tudo parcialmente se considers semos sdmente os factores que apresentamos até aqui. fi outros, e importantes, gue entram # funcionar ¢ a predispor condigées para tais modificagies téenicas. A concorténcia internacional, a necessidacle de competi, no mercado internacional, com os produtos de outros paises, leva ‘a muitos is modificagées técnica, a fim de conseguir uma pro- dugio de custo menor, 0 que provoca tuma emulagio reefproca, com vantagens para todos. Os pafses que defendem a sua incistria, como 0 nosso, contra 4 concorréncia estrangeira, se por um lado realyzam algo de benéfico, por outro, provocam males. Uma protecio’ indiistria, ¢que Ihe permita dominar o mercado, com aumentas sucessivos de custo, sem ser forgada a uma modificasto intensiva ¢ exten- siva da técnica, s6 pode ser prejudicial a todos. Na verdade verificamos entee nds um progreso téenico em alguns sectores, ‘mas este € ainda pequeno para assegurar 4 nossa indéstria uma capacidade tal que 2 coloque face a face & indstria estrangcira, Anda no podemos competir industrialmente, ¢ de tal modo € patente a nossa inferioridade, que a nossa indristtia ainda ndo conseguiu organizar-se amplamente para exportar seus produtos. Tudo isso se deve 20 lado peraicioso das leis protecionistas, ¢ sobretudo 3 falta do desenvolvimento progressivo da técnica, aque as greves, aumentos de silérios ¢ leis sociais nfo conseguiram promover suficientemente. ® MARIO FERREIRA DOS SANTOS Portanto, atravessamos uma época cheia de problemas que estdo a exigir a melhor atenglo dos nossos homens péblicas (se & que eles a prestam &s coisas pitblicas, © que davidamos em face dos factos). ‘Nio encontrumos apoio &s iniciativas inventivas, como as ttm ‘outcos paises. Noss povo, que tem revelado uma grande eapa- cidade criadora, que muitos brasileios, por ignorfincia ou ce- _gueira, no podem ver, nio consegue ordenar uma ampla agio, com modificagies técnicas que facilitem e melhorem 2 producio, porquc, entre nés, embora pareca inerivel, tudo se fa, para que 0s inventores nacionais seam coartadas em sua ago. No Brasil, tado inventor & recebido de antemiio com descon- fianga. Provoca déxte logo uma reagio pessimista. Somos um pave colonialista pussivo, descrente das nossas possibilidades, sem 1 fem nds mesinos, ¢ nenhum inventor (a nio see que seu nome seja estrangeiro) encontra ambiente favordvel. Tif muita coisa extraordindria criada por inventores macionais, sem o menor aproveitamento, Jamais um Santos Dumont poderia veneer se tivesse vivido no Brasil. Este aspecto € muito importante, ¢ nia deve ser esquecidn quincla se pretonde estar algsem toma de cconomia ox de tecnologia. ‘Temos, em So Paulo, organi mos valiosos, técnicos de real valor, e © mesmo se verifica em todo 0 pais, mas nfo encontram o menor apoio para levar avant fs scus inventos. E até mesmo so obstaculizados pela agio do governo, que cria as maiorescificuldades, a par do desinteresse dde grande parte dos nosso industrais, que sé desejam leis pro- tecionistas, que thes permitam permanecer numa forma in- cipiente, primitiva e sobretudo paleorécnica de produgio, mas qe Ihes assegura importantes lucros. Muitas outras andliscs caberiam aqué, mas 36 a podem fazer cs que esto habituados aos usos da ecadialéctiea, Estes, tra- balhando com os factores de emergtncia e de predisponsncia, analisando pentadialecticamente nos planos e decadialecticar ‘mente nos campos, poderiam desenvolver, em torno desta siea- APEENICA DO DISCURSO MODERNO »” ples afirmasio de Lugardelle, uma ampla exposigio, que afere ceria nfo s6 uma visio global, (que reuna tudo quanto analties mente se poss fazer) sobre um tema de tanto interes, ainda permitisia outras sugestBes para longos exams. (ue ‘mos apenas mostrar, com o exemplo supra, que uma afirmagio, embora feita gentricamente, com os perigos que daf devorrem, pode servir, no entanto, para acharem-s¢ os pontos fortes que sGo de grande utilidade, e que podem oferecer campo para novas investigagdes, Para os que lerem nosso livro “Légica ¢ Dialéctiea”, chama- ‘mos a atongfo para a parte final, onde estudames o tema do valor na economia, ¢ observem como se pode construir uma visio global, dialéctica, que inclua em seu bojo todas as anlises parciais, oferecidas pelas diversis posigdes, petmitinde uma visio mais clara e mais segura da matéria Analisemos, agora, outra tese de Sombart, exposto no livro gue acima citamos, Em sua fase de apogeu, no capitalismo, 0 instinto de poderio € o impulso acquisitive se unem par o dominio dos homens e das coisas. TTeria 0 marsismo conseguidlo, em sua agfo, sublimar ess fmpetos, para aleangar uma outra posigio? ‘Acessa pergunta, Sombart responde negativamente, afieman- do que 6 marsismo nfo alcangou, na Rass, essa sublimagio, descjada pelos socialstas, mas apenes conjugou aquele instinto e aguele impulso com o Estado, paca servir aos fins politicos de uum partido, sem aleangar 0 beneficio almejado, Impéem-se agai alguns comentérios. Em primeito lugar, o capitalismo carseteriza-se pelo seu aff aquisitivo sobrerudo de lucro, Nenhum capitalista tem outra intengi Ora, 0 lucro é sempre tm mais ens toca de wm menos. Por tanto, 0 capitalists pretende sempre dar menos ¢ receber mais. ” MARIO FERREIRA DOS SANTOS Correlativamente decorre que alguém recebe menos © dé sna. Desta forma, quer queiram quer nfo, 0 capitalismo sempre gera um desequilibrio, Ademais os capitalistas nio podetiam impor o seu regime sem ter uma base de poder que os asse- ‘gurasse. Seria dificil que os homens, sem ser forgadas pelas leis «¢ pela fOrga que a sustenta, se conformassem com a situagio de dar mais € receber menos. 86 podem tolerar o capitalistio os capitalistas, o que € natural. Portanto, © capitalismo ado pode defxar de manejar 0 drgi0 do Estado, que é 0 monopolizador de férsa, de coaccio, para poder manter sua situacio, corroborand-a com uma propa- ganda bem feita, com uma coordenagio de capitalistas menores scmi-capitalistas, afim de poder manter sua ofdem. Os socialistas, em todo o mundo, sempre desejaram destruir esa ordem, sem entretanto pensar, em geral, na destruigio das pessoas que a encarnamn, A fornia soviética substicuiu a figura do capitalist, mas no substituiu a ago politica da frga do Estado, que ascegura a coacsio, © que a realiza, e que mantém a maievalia, na forma de impostos ¢ de cantribrigfes 20 goveeno. De qualquer forma, a populagio consuinidora df mais do que recebe. Nao se alegue que o Estado arrecada tais conteibuigdes para aplicélas no bem comum, pois € ele o Srgio menos hibil para ais realizagées, pois as encarece. |AS organizacées particulares podem realizar as obras sociais com um dispEndio muito menor, como se verifica em todo 0 mundo. Além disso, pelo seu papel eminentemente politico, por sua fatal organizagio burocritica, pela necessidade de organizar um aparelhamento coactor (policia, exército, etc.), como se veri- fica em toda a histta, em todos os tempos e em todos os povos, © Estado nfo assegura a superacio da situagio do capitalista, ‘pois, wo contrétio, ainda a agrava. Os pafses, em que o Estado AEENICA DO DISGURSO MODERNO “ € mais poderoso, ¢ intervém nos negéeios da economia, so os de custo de vida mais alto, Consequentemente, © socialismno, com os métodos estatais, cempregados, no assegura a solugio do defeito acusido a0 capitalismo. Colocacio.o problema neste ponto, quantas anslisesdialéctieas ccabem aqui? ‘So tantos os aspectos que podem ser investigados, que terla- mos de escrever pginas © pginas para justificar os pontos onde fizemos certs afirmagies. Além disso, ainda caberia lugar para ‘uma pergunta como esta: hi possibilidade de se encontrar uma solugio socal, que evite os males, que decorsem clo capitalismo, e estabelecer una forma que mantenba uma reciprocidade justa centre dar e receber, utes pergunta ainda caberia: € toda mais-valia um mal? [As obras sociais no exigem, para que se calizem, que se institua uma mais-valia? E seré o Estado 0 melhor érgio para aplicd-la a0 bem comum, cou haverd outros meios, de iniciativa colectiva, mais aptos para al? Assim como 0 tema anterior implica que se discutam 05 as- pectos do liberalismo econdmico, do protecionismo, do cimbio- livre, etc. este ponto implica o estudo de outras posigies ideo- lgicas, que ante os factos da economia levam a conclusées di- vergentes, todas merecedoras e capazes de uma ampla anise diakéetica, Vejamas outro tema: Pode a paz humana ser assegurada? Quererdo, na verdade, os homens a paz? Nio ser a guerra uma rnecessidade? Quais os meios de assegurla? Podem falar em. paz. aquéles que se armam? Al temos uma sequencia de interrogagées que permitem tam- bbém muitas andlises dialgeicas, 2 MARIO FERREIRA. DOS SANTOS Mas vamos, aqut, apenas colocar a problemitica da paz, para que observe o leitor as grandes passibilidades de argurmentos e rarbes, que se podem apresentar, quando tratamos de tema de tal importancia como este problema da paz ¢ insepardvel do problema da guerra. Se 4 paz é um grande desejo humano, a histéria nos mostra que cla frégil e constantemente solapada pelas guerras quesucedem. Por que os homens vio 8 guerra ou dela usam? Se pensamos nos homens primitives, logo nos acodem as imeras razBes que levavarn os povos a se guerzearem entre si Ngo eram apenas factores econBmicos, pois havia guerras Jevadas por factores bionémicos (normas vistas), como para con- quista de mulheres, etc. Por outro lado, encontramos guerras motivadas apenas por desmedidas ambigbes de mando, ¢ até pelo prazer desportive de suerrear Tais factores slo sobejamnente estudados nas obras dos antro- pologistas Pavos agricultaree sho em geral pacificos, enquante ot eaga- dores, criadores, ete., sio em geral guerreiros. As necessidades de terras, de pastos, ete. levavam povos a inyadir outros. B, consequentemente as guerras defensivas ou ofensivas se processivam. Quando o homem atingiu a fase da realizagio das altas eul- ‘tras, as guerras proseguiram, Aqui deve o leitor procurar cestabelecer todas as razées (Factores), que intervém para preci- pitar as solugdes bélicas. Quando ha unidade de vistas, unidade econémica, interésses reciprocos ¢ fundacos, entram 5 povos em guecra? . Quando bé choque de interésses, vemos eclodirem as lutas entre os povos. {PEENICA DO DISCURSO MODERNO a Como seria possivel assegurar uma paz se entre as homens Ii clues le interésses? F, roidmente, uma verdadeita utopia ou no pensirse mat posibildade da realizagio da paz, quando os motivos past as Jtas entre 0s homens sio mantidos? Quais sfo os pontos de divergéncia entre os homens? Reuna-os 0 leitor. Quais deles sio passiveis de uma solusio? Porterfamos encontrar meios de reunir 0s homens num grande interésse comum, que 05 levasse a nio penser mais na solucio barbara e priméria da guerra? Vejamos, agora, um factor psicolégico. No hf no homem impetos guerreiros? Poderia o ser humano permanecer satisfeito numa sociedade fem que se respirasse apenas a paz? Nfo se sentiviam eansidos da pr6pria paz € nio procurariam as guerras, sob os mais rid culos pretextos? Por outro lado, & possivel dar uma vasio a esses impetos des- trutivos por melos sublimados, que permitissem a descarga cenergética nfetiva, sem precisar levar povos \ destruigio? FE fell encontrar uma salugho universal, cape de solver os conflitos ¢ evitar as guerras? Nao hi povos mais ricos¢ poves mais pobres, €a inveja destes nfo os pode levar aos conflitos. armados? Ea guerra sinda uma fonte de ganho? Podem as guerreiros conhecer genuinas vitérias, quando atingimos a um gra da téenica que a destruicéo é quase total? Se é inegtvel 0 anclo universal da paz, nfo encontramos néle uum ponto sélido para marcharmos para uma transformagio social? Neste caso, terlamos que nos apoiar num factor emergent, psicolégico. Basta o desejo humano de paz ou impéem-se ainda medidas que devem ser empregadas para alcancar esse des deratum? 4 MARIO FERREIRA DOS SANTOS: E quais seriam os meios a ser empregados? Podem os povos que se armam até os dentes falar ein paz? Quezem a Rissa ¢ os Estados Unidos a paz? Pode a Riss, ‘com a sua produgio, a mais cara do mundo, como o afirmou o préprio Stalin, competir com a ind istria de outros povos teni- camente mais avangados que ela? E posivel uma cooperagio entre as nagies pare que desa paregam essas diferengas técnicas, © surja uma reciprocidade justa? Quais os meios que favorecem a conquista desst meta, € quais fs que oferecem obsticulos? Conhecendo-os, podemos tragar planos de acgio que nos permita avangar seguramente no caminho desejado? E 0s obsticulos que se antepdem 3 conquista dese fim, poclem ser afastados, tt contornados ou até desteutdos? E da sua destruigio, nfo podem surgir outros obsticulos naiores? Em sum, vé claramente o leitor que cada tema oferece uma grande problemdtica, E es problemitica exige uma dialéctica segura para analis la, Desses excrcicios, tem o leitor um exemplo de como se pode pensar, sob diversos angulos, e captar, imediatamente, afirma- fo unilateral de um provivel adversirio, que se firmara num poato de vista unilateral e, portanto, fraco, enquanto o leitor pode colocar.se num ponto amplo, que englobe todas as possi- bilidades, e que 0 impeca de wma visio primétia e superficial dos grandes temas, favorecendo-o para que os Veja em profundi- dade, intensiva © extensivamente, Os exercicios desta espécie, aparentemente dificeis no inicio, terminam por se tornarem fceis, logo que o leitor se familiarize ‘no emprego da dialéctica, que, como a preconisamos, é um nétodo de inclusio das ideias, ¢ que permite wma visio com: pleta e total do tema, sem o perigo das quedas nos unilateralis- {EENIEA. DO DISCURSO MODERNO 6 ios, € no abvolutism, que x6 pote leva getar um fanatismo, que & simplesmente ri frequente nos dias de hoje. orig falsis TEMAS PARA MEDITAGAO Um dia foi preso um homem que tentava assaltar @ caixa de wma casa comercial. Perguatado por que fizera tal acto, quando tina emprego ¢ um ordenado que he perm menos, viver modestamente, ele alegou: “Sempre desejei fazer a barba didriamente, € no podi Queria mudar de camisa difriamente, ¢ ao podia, No almd ‘eno jantar desejava sempre tomar uma garrafa de vinko, e nfo podia, Se meu ordenado nfo dava para isso, que deveria fazer? Conformar-me? Nio quis. Ganhac mais, era impostvel. Pouco aptendera, © minha eapacidade nfo & grande, Tornar-me comerciante, precisava de capital. Néo quis conformar-me com mink sitaagio, Isso foi tudo...” (Os jomais chamaram de cfnicas a estas palavras. Mas poderfa- mos pensar sobre elas. Nao h& povos, classes © homens que, em todas as épocas, sempre se apossaram clo que era dos outeos por motives semelhantes? Quando um povo inveja a riqueza de outro ou nfo se con- focina com a pobreza, procura meios para realizar 2 pilhagem, como guerras, ete Outros, amparados na fei, stquciam os seus semelhantes. Essas razies, to humanas, slo Sticamente injustas. Mas, a verdade, € que elas sfo 2 segunda intengio de muitos actos coletivos. Meditemos sobre elas. Nao € a crueldade uma virtude ... dos Lobos? 36 MARIO FERREIRA DOS SANTOS A cartncia que nos déi mais nfo & aquela que julgamos mereceriamos de justo titulo? Nio houve sempre os que se afirmaram possuidores da verdade? Que foi feito de tantas verdades? (© man que se reconhece como man, e proclamao seu defeito, possui uma vireude? Qual vale mais: a pritica ou a teoria? Que vale mais um saber pritico-prético, um saber teérico-pritico ou um saber terico-teérico? Meditemos profundamente sobre 0 bem. bem que se fem tudo, e no que todos desejam, Como compreender, © excesso de elogios pode ser insultoso? Qual a diferenga entre a delicadeza © a cortezia? Podemos crer em dores fecundas? Pode-se ser infeliz por excesso de bem estar? A vida é demasiadamente curta para ser pequena”. (Disraeli) Queremos tudo, Seremos capazes de nos contentarmos com pouco? Bia liberdade um direito que se adquire? Onde hé liberdade fo h4 responsabilidade? Ba liberdade um previlégio? Nio é a pritica da liberdade que torna a liberdade peética? TECNICA DO DISCURSO INVENGAO, DISPOSICAO E ELOCUCAO, Um orador deve ser apto a falar sobre qualquer tema ¢ em qualquer ocasito. Necessita, portanto, dispor das seguintes qualidades: 1) invengdo, que consiste na capacicade de dispor de argu mentos seguiros, slides, evidentes, ou pelo menos verossitni Ihantes, capazes de convencer, Portanto in 4) Confianga em si, A confianga em si € uma das virtudes mais importantes. Sea temos, devemos fortelect-la, Se rio a temos, devemos adqui-la. Como podeef um orador convencer, se suas palaveas revelarem inseguranga? Quem pode persuadir se entre as palavras surgem cons- tante os “quem sabe”, “talvez soja, “als”, “pode sce”, “assim parece”, “quero cter”, “julgo que assim seja”, “tudo parece indicar que”, “estou poracreditar que”,etc.? Se est inseguro em suas afirmativas, provoca dévidas. Mas, regra importante: io basta vtar 0 emprego de termos ge indiguem heida ¢ inseguranga E preciso mais: preciso ter confianga em si mesmo e no que dial 40 MARIO FERREIRA DOS SANTOS Portanto, confianca em si mesmo e confianga nas pa- lavras, na expressio. Como se adquive confianca em si mesmo? HA muitos que, por timidez, por defeitos de educagio, duvi da de suas possibilidades. Por isto se inibem constantemente, isto ¢, timidamente se calam quando deveriam falar. E passado ‘0 momento de perturbaco, as palavras jorram com intensidade, sobretudo quando se encontram consigo mesmos, sbzinhos. Consequentemente, a pessoa que passa por tas estados, pBe- se a duvidae de suas possbilidades, ¢ manifesta-se cada vex nas {raco, mais impotente. No entanto, é preciso que se diga mais uma ver: todos podem adguirir confianga em si mesmos. Que precisamos fazer? Meditemos, primeiramente um pouco. Na verdad, cada um de nés & um ser humano, que dispoe de suficiente inteligtncia capacidade para tornar efectivas as suas possibilidades, Sc sofremos malogros muitas vézes, nfo nos esquegamios que io hi quein nio os sofra, E preciso, por iss, estimular-se. E para tanto, convém Fembrat-se do seguinte: se nds mesmos nfo nos amparamos, quem nos amparacd? E dliga cada um dentro de si mesmo: “se eu nit tiver con- fianga em mim, quem teré confianca? Portanto, a confianca fem mim mesmo € imprescindivel.. Primeiramente preciso tet confianga de que teret confianga. Posso realizar muitas coists. ‘Nenhum ser bumano éabsolutamente impotente, Posso andar, posso agitar-me, posso fazer isto e aquilo”. E memorizemos 0 que temos feito. “Se posso fazer isto, por- ‘que nio podetei fazer mais? Quando crianga, quantas coisas io podia fazer. Os anos passiram-se e hoje realiza snuito do que me parecia tio dificil. Se sou capaz. de tantos progress, serei de muitos outros”. VEENIEA DO DISCURSO MODERNO, a E afirmativamente, para si mesmo, com toda confianga, deve dizer: “Bu poso, eu quero, € et tenho confiznga em mn!" A confianga em si mesmo adquite-se assim. Para certos ess € preciso usar de outro exercicio, que é de um efeito e ordinstio. Ao deitar-se, no instante penumbroso em que © sono estt querendo nos dominar, digamos, com energi “Bu tenho confianga em mim ¢ cada vex terei mais”, ‘A mesma frase, dita com confianga, deve ser repetida a0 acordar, ditriamente, Oexerciciofisico, que jf aconselhamos em “Curso de Oratéria ¢ Rewirica”, deve set feito ditriamente, sobretudo os respira trios, jf indicados. Desta forma prepiramos 0 terreno para adquirir a confianga fem nds mesmos, E obtida esta confianga que hé de infundir nas palavras io serd dificil nem longingua. para tal, basta evitar térmos dubitativos, expresses que indiquem divida ou indecisio. Pordem sor uradas expressiee dubitativas, como também apresentarse, durante um dis cutso ou uma palestra ou uma conversa, algumas divides sobre a realidade ou nio de um facto, Mas, imediatamente devemos apresentar os argumentos que afirmario alguma coisa, sempte acompanhados de expresses positivas, Desta forma, esté o orador capacitado para construir a parte da invengao com a méxima seguranca, Impée-se ainda mais: 4) dispor de argumentos seguros, sides, evidentes ou pelo menos verossimilbantes, capazes de convencer, Com a presenga da confianga em sie da confianga expressa através de térmos positives, j4 podemos trilhar © caminho que nos levars aos argumentos sélidos. 2 MARIO FERREIRA DOS SANTOS Em nosso livro citado, expusemos @ arte de argumentar. Neste, a seguir, oferecemos novos elementos que fortalecem ‘@ maneita de coordenar os argumentos. 2) A disposigiéo — Consiste esta em ordenar os argumentos e dispS-los ordenadamente, colocados em seu devido Jugar. No capftulo em que estudamos a “Arte de Persuadir"” demos as regras da disposigio dos argumentos, segundo grau de convencibilidade, Nos capttulos préximos oferecemos novas regras otras sugestées, imensamente creis ao leitor. 6) A elocugio — Consste esta em saber revestic 05 argit ‘mentos com as expresses mais seguras, ¢ mais conve- nientes. Os diversos exemplos de exercicins, expostos na obra citada, sobretudo 0s sintéicos € so analiiens, sto muito ‘ites. A sua pritica deve ser constante. Desta forma, obteremos 0 pleno dominio, sobretudo da sintese, Um argumento siatticamente exposto, com firmeza, tem uum poder imenso de conviegio. Em otras passagens déste livre, estudaremos novas sregeas com os respectivos exemplos, que muito auxiliario a obter 0 dominio desejado, 4) Membria — & preciso exercitéla, Tornd-la capaz de guardar os argumentos que precisumos usar, quando do discurso, ¢ também a ordem que deverio ter. H& muitos livros que nos ensinam a obter o pleno dominio da meméria, Neste, daremos algumas regras priticas, e sugesties, de fécil emprégo. ©) Gestos, vos e fisianomia — Nossos gestos, & vor © suas inflexdes, ¢ a fisionomia devem regularse de modo a completar adequadamente 0 que desejamos dizer. Re- pportamo-nos ao nosso trabalho anterior, 3s regeas que ji expusemos. Voltaremos, neste, a tratar de outros aspectos, de grande utilidade. MEIOS PARA ADQUIRIR ESTAS CINCO VIRTUDES Para adquitir estas cinco virtudes expostas, que sio impres cindiveis para o bom oraior, impoe-se empreguemos série de meios, que passaremos a expor. Em primeiro lugar, 0 conheckmento das regras apresentadas ‘em nossos trabalhos anteriores ¢, ent segundo lugar, a asi dade dos exercicios préticos. Em suma: teoria © prética. E inditilinsistie sbbre éstes pontos, pois o leitor jd tem plea consciéncia do seu valor ¢ da sua importncia, COMO PROCEDER COM A REALIZAGAO DA INVENGKO Um discurso pode ser considerado como composto dle seis paries,altidamente distingutveis, conforme % clissica divisio da retérica. A bon organizagio dessis seis partes € capital para a feitura de um bom discurso. 1) Exérdio — Eo inicio, € a sua abertura. Deve chisnar 4 atengio, predispé-la para 0 que 0 orador vai diver. A habilidade nos exdrdios € tépica dos grandes oradores Hi vdrias regras priticas para provocar a atengio dos ou- vintes, que passiremos oportunamente a estucar. 2) A nanragto — F. a exposigio dos factos que se deram ou poderio dar-se. 4 MARIO FERREIRA DOS SANTOS 3) A divisdo — paste oa qual se colocam em oposicio nossas afirmagées ou a de nossos antagonistas. Nesta parte sio ret- nidas as idéias por todos aceitas ¢ as em que hi profundas divergéncias 4) A confirmagio — Nesta parte juntam-se 0s argumentos a favor de nossis iia. 5) A refutagio — Nesta sio refutadas as razdes do adver- sirio, © juntas as provas que podemos apresentar. 6) A peroragéo — 0 final, que por seu vigor e arte deve servir de coroamento do discurso. Esta clasificagio é importante, Vem ela da retérica greco- romana ¢ ainda é viva para a oragio moderna. E a prova do que afirmamos est fundada na anélise destas seis partes e das regras, que elas permitem estabelecer, bem como das nosmas que convém segui. 0 EXGRDIO Pode ser de quatro modos: Apés a saudaglo, que corresponde aaturslmente 4 abertura de um discurso, quando oramos ao ptiblico, 0 exérdio apre- senta diversas mocalidades, Vamos usar da palavra. O tema que nos cabe tratar pode 4) tera que, pela sua nobreza, todos devem defender. ‘Trata-se, por exemplo, de um discurso sbbre os deveres do cidado paca com a coletividade, de um pai para com um filho, dos esposos entre si, da veneragio aos mortos, etc 4) Ou tema que representa algo que todos devemos com- bater; 6) ou tema que trate de algo em que hi dlvida entre de- feoder ou combater; TAENICA DO DISCURSO MODERNO “ d) 01 de algo que merece nos desprtzo. ‘Analisemes os diversos temas © as regras conv nies: Em primero lugar, 0 exérdio deve prender dese logo a atengio. Mas como proceder? Una frase cuidada de inicio, breve, concisa, que expo- nha 0 que prevendemos, despertars a atengio © a sim patia dos ouvintes. Examinemos a seguir uma série de temas, € 05 exemplos que se podem usar de abertura: Uma saudagio de casamento “HE sempre um mistétio que agusa 0 nosso esplrito, quando dois séres juntam os seus destinos para formar vum 36 destino”. Nuon enterro “O pé a0 pé hé-de tomar! Mas hé-de tornar a0 pé fo que € pé, diz a velha sentenga. Mas 0 pé é inerte como o € a matéria, Neste corpo, porém, houve luz © houve inteligéncia, ete.”. Ou: “Quando o corpo de um homem desce & sepulture, aqueles que o estimaram em vida, sentem ainda palpitar tem si mesmos algo que no morte”. Ante uma ameaga estrangeira “O perigo ronda ameagadoramente as nossts fron- teiras”, “Neste momento, vindos de terras distantes, paitam sObre nds ameagas que nfo tenemos”, Estes exemplos poderiam ser multiplicados. © que inter- essa, porém, € guardar o leitor um conjunto de regtas que servem para ‘despertar a atengio do auditério e, consequen- temente, a simpatia ww MARIO FERREIRA DoS SANTOS 1) Estando-se ao par do que interesst 40 auditério, as nossas primiras palavras devem sempre sugcrir 0 que é da preocu- pacio dos ouvintes Ou sio os adversirios, ou slo os amigos, ou até a situagio dos préprios ouvintes: 2) Uma fabula de infcio, curta ¢ singelamente exposta, que se adapte ao tema de que se pretende falar. 3) Um pensimento célebre, curto, mas enérgico, e que desperte a atencio; 4) Ao falar aos ouvintes, lembrar alguma coisa que jé fi zeram de grande, “Vés, que soubestes em tal ocasifo reper tal coisa. ..”, ““Vés, que nos momentos preciosos, sempre estivestes a postos...” “Vés, cuja atengio 8s boas causis, nunca foi desmenti- “Vés, em cujos coragdes sempre ressoaram as nobres campanbas....” “Vés, que em todos os momentos de vicissitudes, tives- tes tum fimo sereno forte...”. 5) © puincipal deve viv seupe en dltinn lugar. As pri ‘meisas palavras devem despertar a atencfo para 0 que se vai dizer, Pro ex.s “Devem ser repelidos aqueles que enganam os povos...” nflo provocaria 0 mesmo interésse do que usando ‘outta ordem, como por ex.: “Aqueles que enganam os povos (pausa, © em tom levemente mais forte e marcado) devem ser repelidos, dever ser desprezados": No segundo caso, a atengio & melhormente provocada que ‘no primeivo. © orador deve sempre, no inicio, até conquistar o pleno dominio da palavra, ter a sua frase de exérdio préviamente feita, lembrando-se sempre que é preciso despertar a atengio dos ouvints, EM PACE DE UM AUDITORIO ADVERSO Poxiemos estar em face de um anditério, hostil As idéias que defendemos ou até contra nds. O espirito dos ouvintes fai indisposto, por aqueles que nos precederam, ou est& preps ado contia ads, F 0 que se di, por exemple, quando defendemos alguém sobre o qual pest tin acusagdo tertivel, HA visios meias de inieiar: 4) Bo facto abomindvel, ¢ nfo o acusado. “Reconhecemos que éste facto (descrevé-lo) € abo- mindvel. Nio 0 é porém, 0 acusido. O facto, como © descrevern os acusidores, € abomindvel. Mas estamos fem face de um acontecimento rotalmente diferente... Se @ste facto se tivesse dado como pintam os nossos adversirios, também estariamos revoltados. Mas € pr ciso examinar a verdade, ete. 5) Podemos iniciar elogiando o espirito de justiga do audi- tério, a justiga que tantas vézes © povo (ou 0 tipo 2 que pertencem os ouvintes, milirares, operdrios, etc.) tem ‘demonstrado, 0 que lhe impede deixar arrastar-se sem ‘ouvir as razdes de ambos 0s ladoss 2) Se 0 auditério revela que estd totalmente com nossos adyersirios, tomamos uma das frases pronunciadas por tum déles ou a titima, e a pronunciamos. Fazemos uma pauisa, depois afirmamos que € sobre ela que se apoia dda 4 sua argumentagio. E rebatemo-a afinal. “ MARIO PERRENRA DOS SANTOS 6 auditério esti fatigado, convém usar no exérdio algo que 0 alegre, que o faa rir, uma graga, uma anedota histérica, um verso curto, umm sentenga famosa. Ou entio, afirmamos que seremos breves, € iremos imediatamente 20 asunto. Ou: seremos breves mas inci “quero respeitar © vosso tempo ¢ © pouco que vos direi serd suficiente ...", “\poucas serio as minbas polavras "5 4) Se 0 aulitério est muito interessado, devemos iniciar sem pressa, com certa lentidio, pausadamente. J) Evitar: os lugarescomuns, 0 banal. O que & banal é (© que pore ser aplicado a vérios discursos. O lugar comum € a repetigio, o chavio, a frase feita, jd corrente, exério nao deve conter ners o banal nem o luger-consu. 8) Nio deve ser longo. 4) Mas deve ser capaz de provocar a simpatia, © interése €-2 atengio dos ouvintes. Ao regresser sua terra natal, a Bahia, Rui recebeu a mais centustistica ovagio que se asistira em Sio Salvador. Emocionado, contrulu com estas palavras 0 exdrdio de tama das suns mais famoas orngécs: “Depois disto ...diante disto ... nfo sei como principie ... ‘Aos pritneiros sorrisos longinquos de minha terra na curva azul de sua enseada, enquanto o Vapor me aproximava rhpida- mente destas doves plagas, onde minha mie me embalou 0 primeiro ¢ meus filhos me velario, talvez, o Ultimo sono, vendo pendurar-se do céu.e estremecer para mim o ninho, onde cantou Castro Alves, verde 1inho murmuroso de eterna poesia, debrugado entre as ondas ¢ os astros, parecia-me que a saudade, amado fantasma evocado pelo coracio, me estendia (5 bracos de téda a parte, no longo amplexo do horizonte. Minha vida inteira, 0 remoto passado fugitivo recompunha-se- ‘me nalguns instantes, de uma infinita suavidade triste, como as das grandes afeigSes tenazes, que lutam contra a volubi- 4a AFENICA DO DISCURSD: MODERNO ” lide dos sncessos, © procuram fivar-se % beiea dt corrente irrsistivel dla vida, abragando-se-aos ramos im Newe crescer, porém, de recordagies, onde o nieu espirito, flutwava, anelante, de vaga em vaga, de pensamento em pe sumento, de resurrcigio em resurzcigo, mais vivas, mais ins tentes, mais obsessivas entre tOdas se me dlebuxavam na me- néria as impressBes da minha «iltima visita a éstes lares. Vai por cinco anos. Era em 1888. Corriam os iltimos dias de abril, Poucos me etam dades, para respirar @stes ares, a cujo foxigtnio se formou a minha paixio pela liberdade, Eu vinha s6 coma minha fé, a Gnica forga que a natureza nfo me recusou, a companheira fiel das minhas provagies, 0 vidtico de meu ‘caminho acidentado, A atmosfera do Império e da escravidiio ‘oprimia-nos, abafadiga, de todos os lacos. Os partidos mondr- ‘quicos brigavara, enfezados, na sua rixa de lagartos, na raiva preguigoss de estélios coridceos, & luz de uma publicidade indi- fetente, ou hostl, como os raios do sol que acaticiam 0 torrio ptdspero, mas flagelam a estepe escalvada, ao sil@ncio, no ma- rasmno, na solidio moral da pdtria, caleinada por uma esteri- lidade maldita, ‘Quisestes entio ouvir-me, amigos meus, bons conterrincos, meus irmiios...irmios, porque fomos ninados todos no mesmo bergo destas encostas arredondadat ¢ meigas como regago de fada bemfazeja, todos amnamentados aos seios da mestna mie, a alma Bahia, mae da inteligencia, da generosidade e do entu- siasmo...". tis do ideal, A NARRAGAO E A DIVISAO [A exposigio dos factos, que se deraim ou poderiam terse dado, merece a maxima atencio, Impie-se que seja breve, clara ¢ verossimilhante. Estas trés regras sio as de tda retdrica. Poucas palavras, clareza na ex- posicZo, para que nfo pairem dividas. Convém descrever os factos de maneiva a cerem semelhanga com a verdade, sem fantasias, sem exageros, que apenas server, para criar dividas. Devem les ser descritos em sas linhas gerais, Evitar com ‘© miximo cuidado demorar-se em pormenores. Absolutamente rio fugir ao assunto, associando outros factos, afim de evitar confuses. Evitar reperigées, ¢ tudo 0 que embrulhe, como longas di- ‘gressbes, ete, Os factos devem ser descritos de maneira a que se acredite neles, isto &, contados com t6ela a verosimithanca, € evitar invengBes que’ possim desviruud-los € servir de apoio a0 adversitio. Quando vamos enumerar os factos, € se anunciamos os pontos principais, nunca devemos classifed-os além de tet Sendo mais, os ouvintes podem desconfiar de que nos pre- paramos. E preciso dara impressio da improvizagio, ¢ para tal deve-se dividie os factos em trés pontos importantes, aqueles para os quais mais nos interessa chamar a atengio, 2 MARIO FERREIRA DOS SANTOS Em certos discursos, como os de casamento, batizados, etc., ‘a narragio nfo € a mesma de um discurso, por exemplo, para um juris Oquese enumera,entio, pode ser de mode litertio, potico, como ainda veremos. A CONFIRMAGAO E A REFUTAGAO Aqui a arte de persuadir exige a observincia das regras jd expostas, A argumentagio compde-se de cinco partes, clasficadas pela retérica clissica, € validas ainda para nés: proposigio, prova, confirmacio da prova, ornamentos, conclusio, 1) Proposigiéo — exposigio breve do que queremos provar; 2) Prova — breve selato do facto ou texto, que revela a verilade do que dizemos; 3) Confirmagio — parte em que se usar os argumentos, também brevemente expostos; 4) Ornamentos — algumas frases breves, com figuras expres sivas, pata solidificar os argumentos; 5). Conclusio — curto resamo do pensamento, sintetizando as quatto partes anteriores, Estas cinco partes nfo sio totalmente necessirias. Mas sem- pre coavém usi-las. Podemas dispensar os ornamentos ¢ a conclusto, se a argumentagio € forte. As vézes a ornamentagio pode ser desigradvel, devido ao assunto a0 qual nfo se actequa, Exitar uma argumentagio defeituosa, Evitar falsas afirmativas que poclem ser desmentidas. Evita as yeneralizagbes, atribuindo a todos alguma agi, pois 1é diferencas entre os homens, e os ouvintes, consequente- mente, considerardo fraea @ argumentasio, TECNICA DO DISCURSO: MUDERNO a Se alguém diz: “Todos os homens em igi fariam 0 mesmo”, esté sujeito a um desmen Nio se deve, também, totalmente negar um facto que pode acontecet ou jd aconteceu, embora raramente, Cuidar de nio esquecer uma posibilidade, que pode ser in portante para servir de base a alguma argumnentagio contin, Evitar as falsidades. Sio fracas as provas que aio correspondem & propesicio, isto & quando se fndam no que se deve provar. Nunca esquecer que uma prova bem feita solidifiea uma argumentagio. Enitar definigies falss, Evitar contradighes. Nao prometer provar qualquer coisa ¢ depois nifo provar. Evizar disputas apenas sObre palavras, Evitar comparagées defeituasas. A PERORAGAO OU EPILOGO Na peroragio, depois da sintese dos argumentos, evitar os lgares-comuns A vor deve ser mais alta e mais exaltada, mais quente, e cheia de convii E segundo 0 tema tratado no discurso, deve provocar a com paixio, se tse & 0 nosto intuito, ou a revolta, ete Nao deve ser longa, mas curta, expressive, directa, e convicta REGRAS PRATICAS SOBRE O DISCURSO Oferecem ox retdricns dle raos os tempos ima série de regras priticas que passaremos a compendiar: 4) O exérdio pode ser construido com palavras nossas 0:1 com palavras pronuneiadas por um orador que nos pre- cedeu, ou com a frase ou palavra pronnnciada por am dos ouvintes, darante um aparte, ou durante um aplauso, etc. 4) Se pretendemas louvar alguém, iniciaremos mostrando 0 nosso dever em face da amizade, ou do respeita, ou da reveréncia, segundo 0 caso. Se quisermos justificar nosso acto, basta dizermos poucas palavras sobre a virtude que deve ser louvada, ou shbre o gesto nobre que deve ser aplaudido, ou sobre os _grandes momentos que sempre devem ser lembrados, ou sbbre os grandes factos que devem ser conhecidos, MARIO FERREIRA DOS SANTOS: Exs.: “Num mundo como o de hoje, em que a amisade & cada vex mais sara, um verdadero amigo 6 quase uma excecio, Se a amizade, em t6das as épocas ¢ digna de louvor, hoje, mais do que nunca deve ser louvada....” “"Tados os povos tém, no acervo de seus acontecimentos, alguas factos que nunca devem ser esquecidos da meméria dos homens...” “Se queres conhecer os amigos, cai no infortdnio”, dizia Napoledo. Nestes easos, uma frase famosa, aplicada ao tema, que orientard 0 discurso, € de grande efeito para 0 exérdio. Se desejamos responder a acusagées injustas ou a atos indignos, devemos iniciar expondo nosso direito 3 resposta, Exs.: “Nada &maisindigno que uma ofenstinfundada”. “FHA crimes, que pela sua frieza ¢ hediondez, espantam, cestarrecem, apavoram”. “Repelir uma afronta € um dever que cabe a um homer de brio”. Se queremos elogiat uma pessoa que 0 merece, devemos Iniciar mostranda que é jst elogiar as grandes abras, ou pessoas. ides do orador, aqui, soam bem. Por ex.: inhas palavras, embora clogiosas, mas justas, no poderio alcancar a grandeza de quem me quero sefetic "| “Os factos sio mais eloquentes que as palavras € 0s clogios sio mutes vezes palidos ante a grandeza da obra elogiada’”. Se pretensdemos falar de quem 0 auditério desconhece, convém fizer uma ripida desericSo da pessoa, mas bem répida, deixando para depoisa andlise dos factos realizados. Ex: “'Quero vos falar de um homera, cuja dignidade €um exemplo para todos, Esse homem é,..” TECNICA DO DISCURSO MODERNO: ” “Nada melhor fala do valor de um homent que os seu actos piblicos. Fulano de Tal, que fez isto © isto. J) Ao louvar alguém, pode-se, desde ini baragado, o que & de bom efeito. “SGo tantas ¢ tantas as grandes obras de benemertncia mostzar-se em de F.... que nfo sibemos por onde comecar para enumerd-las, pois nos vém de roldio as imagens clas suis realizagbes ...” ©) Ao exbrdio pode seguir-se a narragio, se 0 tema o exigis, como nos casos anteriormente examinados, em qe 0% factos devem corroborar as nossas afirmativas. A) Se nfo cabe lugar narragio, adivisdo, que devers seguie- se, pode constar de um balango expositive do que é favordvel e clo que se apresenta de desfavordvel. $6 apts essa exposicio, & que entra a justficagio ou confirmagto. 1) Nos elogios a pessoas, potlemos chamar a atengio para a familia \ qual pertence, mestranclo-o como um digno continvador dos antepassados. Se ¢ modesta, ao facto de sero realizador das suas préprias qualidactes, que se devem 0 seu exclusivo esforgo. Se estudioso, 20 esforgo dispendido por noites a dentro ‘no manuseio dos livros, o abandon aos prazeres ficeis, 0 intuito de elevar-se pelo conhecimento para ser stil aos seus concidadios. ‘Tem boa saude, deve-a 3 vida disciplinada e honesta. E doente, ao excesso de trabalho e As preocupagdes, etc. Se perdoou, deve-se & magnanimidade de sua alma, Se castigou, & grandeza de sua justiga, Estas normas deve ser honestamente empregadas, © aio com 0 intuito de satisfazer interésses mesquinhos. "Tda pessoa realiza em sua vida actos dignos, a par de outros de valor inferior. E preciso ter 0 méximo cuidado na anilise dos factos antes de descrevé-los, A ORDEM DOS ARGUMENTOS Emo “Curso de Oratéria ¢ Retérica”, ao expormos a dialéc- tica como arte de persuadir, oferecemos algumnas regras priticas para uso do leitor na organizagio das razdes que deve usar. Apresentamos agora novas regras de grande utilidade Ena parte do discurso, que se chama disposiga, onde se alinham 0s argumentas que desejamas usr. Na ordem do diseurso, a disposicio, em certos casos, e segundo certas circunstincias, pode vir logo apés o exécdio, E em alguns casos pode até precedé-lo. Os exemplos ilustrarfo as nossis afirmativas: A narragio répida de um facto, sObre 0 qual quererios argu- mentar, pode preceder ao exdrdio, que passatia a sucedé-lo, ‘com a idéia que the caberia, Se a narragio € pouco plausfvel, convém antecede-[a com uma justficacio, Tais modificagBes so ditadas pelas circunstlncias, e eabe a0 orador siber usé-las, sobretudo quando encontramos ambiente pouco favorivel as nosas palavras. Jé vimos que o argumento mais forte deve ir para final. Os mais fracas para o meio ¢ podemos iniciar com um argumento midiamente forte, sem set o mais forte. De ingcio, uma prova sélida provoca forte impressfo. Sobre- ‘véea as mais fracas, para serem, afinal, sucedidas por uma mais fore, ou MARIO FERREIRA DOS SANTOS ‘As intermédias ficam sobustecidas pela ago da primeira ¢ tla iltioa, ‘As mais fracas, as centrais, por sua ver, valorizam a primeira ¢ sobretudo a dltima, Fsta regta vale tanto para as provas como para os argumentos. A sequtncia dos argumentas expastos deve ser acompanhada pelos gestos correspandentes, que estudamos em “Curso de Oratéria © Retética”. Esses gestos completam a simbolizam a ago, ¢ estimulam, no ouvinte, uma predisposigfo simpética A voz, aqui, é de importincia capital. Qualquer fraqueza pode contribuir para desmerecer a prova ou 0 argumento. E preciso fazer-se os exercicios de entonagio, sobretudo ¢ da variagio das inflexdes, que nunca devem ser exageradas, mas inteligentemente dirigidas. Se, no exdidio, nio elevarmas demasiadamente a voz, 0 que se deve evitar para nfo cansar, quando fr preciso usi-la mais alto, té-la-cmos fel Os exescicios propostos em nos trabalho anterior sio de capital importincia. De vez em quando, durante 0 discurso, deve-se voltar a0 tom da conversigio, para descansar a vor, pare poder ustla firme e alta quando necessitio, Evite-se, durante a argumentagio, qualquer excesso que possa criar um clima de ridiculo, como falsetes, voz gritante, metilica. Evitem-se as frases muito longas que eansam. Comecar calmo. Nunca dar téda a vor possivel no into 6 em rapidtssimos discursos, de dois ou trés minutes, admite- se tal proceder. Primeiro, porque & desagradfvel ao infcios segundo, porque cans totalmente, TEENICA DO DISCURS MODERNO| ol TH& casos em que slo admitidos, mas tsses so raros, ¢ deve sot bem cuidados, Nada mais desagradvel que ver un orador iniciar com ‘todo volume”, como se diz popularmente, ¢ de: pois cair num tom fraco, apagado de vor, esmaecido, estruindo, afinal, todo 0 bom efeito que poderia obter. Vejamos algumas regras sbbre o tom de voz: Energia — quando € necessfrio energia: erguer gravemente 8 vod; Refutago — quando € para confirmagio © para a refuragio, cergué-la enbrgicamente; Excitagio — quando & para excitar os ouvintes 3 indignago ow ‘& provocar compsixio, ampliar a vor ou baixé-la com dogura, Mas cuidado com 0 exagérol Gravidade — Nos momentos de gravidade, uma voz alma. Descrigdo — SBbre um facto, que aconteceu on pode acontecer, ‘um tom explicativo, ou descritive, Humorismio — Quando se quet fazer rir ow dar impressto de ridiculo, umn tom humoristco, bem dosado. Dizemos bern dosado, porque 0 auditério tem facilidade de rir quando se dizem gracas, mas conwém ter cuidazo em dizt-as, pois se nfo provocavem iso, podem servir contra o orador, criando uma atmosfera de desagrado. Célera — Quando se quer provocar a célera, usa-se 0 tom de- clamatério. Mas & preciso ser comedido. Os exageros podem levar 20 ridiculo, pois a exaltagio desejada deve ser posivel e jd ter, nos ouvintes, un ponto real em que se funde e nfo apenas apoiada numa mera possibilidade, afima de evitar 0 malégro. Conpsiito — Quando se quer levar 8 compaio, o tom decla- ‘matério na descricio dos infortinios é de grande efeito, obedecende-se, parém, a0 cuidado silientado na alinea anterior. Neste ltimos casos, o declamatério pode atingir fo patético, mas nunca aleangar 0 exigerado. a MARIO FERREIRA DOS SANTOS Seriedade — Quando se quet emprestar um tom sério & conver- sagio, convém teduzir levemente 0 volume da vor, falar calmamente, empregar pausas constantes, pare que se grave no espfrito dos ouvintes o que pretendemos dizer. ‘Narrativo ~ Quando pretendemos nartar, conyém entonagdes variadas, que parsgara imitar cada facto com se deu. Se € algo decisivo, enunciar ripidamente e com decisio; se algo que se realizou A vontade, retardamos a voz. Quando h4 motives de tristeza, ou de alegria, ou de diivida, nossa vor deve expressar tais estados. Se quando falamos emprestamos polavras a outros, estas ddevem ser pronunciadas em tora diferente do empregado por nds. Humor — Quando pretendemos dar certo humor 3s nossas palavras, convém, se queremosdizer algo em tom de brinea- deira, tomar uma vor trémula, com ligeira expressio de riso, mas sem trago de histrionismo, nem de foucura, pas sanclo do tom sério ao delicadamente brincalhio, Ekeagéo — Quando se pretende um tom elevado, ergue-se levernente o volume dle voz, com inflextes variadas, sc- gundo o tema tratado, deixando para o fim a elevacdo da vor, cujo volume deve crescer com a velocidade das pala- vvtas pronunciadas, Excitagdo ~~ Quando pretendemos excitar, 0 tom declamatério €0 melhor, © cmprega-se uma voz bem baixa, forte, sem imetalismo algum, com a elocugio cortada, por puss, mas sempre em volume igual, com momentos de mulanga frequente de entonasio, e alguns de grande rapidez Pasético — Se queremnos aleangat ao patético, depois de excitar, reter a voz, dar uma entonagio triste, pausas mais longas, smtagées bem marcadas. Um longo exercfcio de vor se impie, ¢ sobretudo ume grande autocritica, evitando sempre 0 excesso ou 0 aspecto conven- cional das entonagées, YEENICA BO DISCURSO MODERNO oo E preciso corrigir-se ¢ treinar hem o emprégo dos diversos tons, Estas rogras serve niio x6 para 0 discurso em patlice, como numa conversigio entre pesoxs conheciths, €, at com certo cuidado, quando da converst mais fatima com otra pessoa (redrindo-se, neste casos, o volume ea qualidade da vor). © wecho de uma defesa de Rui, que ora reprodtrinos, & un exeinplo vivo das regras por nds expostas até aqui, ¢ pode vervir ao leitor para exercicio das diversas tonalidades de vou, que acima estudémos: “A mesma idéia, a idéia da igualdade ¢ de responsabilidade universal, a mesma id¢ia que me pairava sbbre 0 espirito, ao comecar desta defesa, levanta-se outra ver diante de mim, 20 terminicla, Somente, 2 principio, ela erescia em t6rno de nbs, sob as proporgies de um grande espetéculo humano, ¢ agora sinto penetrat-me sob a influfncia de um prestigio divino, Hi hoje, A mes, em que vos sentais uma cadeira vazias dessa ca- deira ergue-se uma sombra, que se estende sobre todo 0 tri- bunal. Seré um vivo? Seré um morto? Tio eépida é a transi- io, eo recente a austacia, que muitas vézes, n0 curso déste debate, nfo resistizeis 2 ilusio da sua presenga, da sua fisio- fnomia, da sua toga, da sua voz, do scu olhar, com que fito ‘agora mesmo cm mim, no momento em que vos falo. Ao cncetar desta campanka pelos oprimidos, pelos alts, le estava atte vés, no meio dela, A vespera da conjuntura decisiva, uma intervengio imprevista arrcbata-o ao aredpago da justiga. Ela continua @ ser a justiga, como 0 oceano a set 0 ocean, emquanto as ondas perpetuamente correm sébre as ondas, como as existéncias sBbre as existéncias. Mas essa desaparigdo subi- tdnea de um julgador dentre os julyadores, na hora do julga- ‘mento, nos embebe dos sentimentos da igualdade pelo senti- ‘mento da morte, mostrando-nos & rapidez, com que, por obra de um minuto no infinito do tempo, os julzes, da majestade do pretério, onde julgvam, sio transportados ao scio da obscura ‘multidio inumerivel, que aguarda a sua sentenga no dltimo plendrio, & barra do supremo tribunal, o verdadeiro, aquele que ‘nfo erra, Vosso nome ¢ um nome de empréstimo, um reflexo 4 MARIO FI ERREIRA DOS SANTOS dessa magistratura invis'vel cujo primeiro elo os crentes puse- rain no eu, os estéicos na coasciéncia, o instinto humano na opiniio dos sobreviventes sBbre os mortos, dos. governades sBbre 0 governantes, dos sentenciados sBbre 0s sentenciadores. Instincia passigeira na hicrarquia desta funcio soberana, que em wés tem 0 seu érgo por exceléncia na terra, julgais hoje sem recursos, para amanhi serdles julgados sem indulgEncia. E, ‘agota, que exerceis essa autoridade cavolvida em luto, estais mais perto que nunca da sua expressio mais sublime. Eu niio conheco duas grandezas to vizinhas pela sua altitude, tio semelhantes pelas suas ligbes, to paralelas na sua eternidade, como estas: a justisa ¢ a morte. Ambas tristes ¢ necessftias, ambas amargis e salvadoras, ambas suaves ¢ terriveis, si0 como dois cimos de névoa e de luz, que se contemplarn nas alturas imaculadas do horizonte. Em vio se agitaré derredor dessas duas fatalidades inevitiveis tudo o que é mesquiaho e efémero no homem e na aglomeragio social: as misérias da baixeza, da ambigio e da crveldade, 0s apetites das partidos, 0s cSlculos, as irresponsabilidades ¢ os triunfos dos déspotas, as fraquezas, os interésces ¢ as traigdes dos intérpretes da Jei,sacerdotes infdis lo seu culto, que a renegaram nas crises de provacio. Quando vito, lucraram adiar a hora da conta para a hora lo desapare- cimento, entrar para 2 expiag%o pela porta da posteridade, Mas urna incerteza indefinivel envolvea regio destas probabilidades; € 0 tirano, que oprime, no sabe a quantos passos esté da terra, que sepulta; o demagogo que pede a iniquidade nfo mede ‘quantas inhalagées do ar, que éle empesta, 0 separam da cor- rupgio, que hd de decompé-lo; 0 juiz, que deixa cair na urna inapelavel uma esfera impia nfo presente quantas palpitagdes do coragio o distanciam da reparagio infalivel. Muites duvi- dario de que esst justiga se consume numa vida futura; mas, ‘40 menos, ela hi-de vir necessiriamente nesta, ¢ as testemunhas das suas decisGesirreformaves tfm de ser os restos mais sensiveis da nossa alin, as partes mais vivas da nossa vida, nossos filhos, noses viuvas, nosas familias, os que usarem o nosso nome € petpetuarem o nosso sangue. {EENIEA DO DISCURSO MODERNO 8 Neste momento, podeis crer, estamos todos nds num cui dy cininente da historia, © teabulhando para o porvir. Vasst Juulavra seri recolhida no segago do tempo como um oxiculo ile liberdade ow como uma ruina. A\ politica com as suas transagies, 0s seus sofismas, os seus expintathos dissipar-se-d como a cerraggo dos maus dias. Mas ‘0 vosso aresto perdurard, fonte de energia ou de cativeiro para iuitas goracdes, © as suas queixas, ou as suas béngios coreario a vossa descenrdéacia, DOS GESTOS & DAS ATITUDES mmportante ao orador ¢ cuidado dos gestos, das atitudes fisicas © da expressio, que devem, em sua exteriorizagio, ser condizentes com as palavras. Um gesto provisa ser plaustvel &s palavras, adequado a elas, mas cor tal sdbria adequagio que todo exagéro € perigoso. XE preferivel menos do que maiz. Em suma: que diga menos do que expresse em demasia. Desta forma se evita 0 exagtro e, consequentemente, o ridiculo. ‘A oratéria moderna tem de act abbria nos geatos. A oratéria dos gregos ¢ dos romanos caracterizava-se por gestos demasiada- mente expressivas, mas tais povos no sentiam o ridiculo que tem nbs éles podem provocar. Em nosso “Curso de Oratéria ¢ Retérica’, estadémos 05 estos e, aqui, vamos apenas acrescentar algumas regras zo cexaminadas aquela obra. Sio importantes estas normas quanto & colocagio do corpo: 1) Se o tom é sério — deve o oracor permanccer em set lugas, corpo direito, com leve movimento da mao dircita, © rosto deve expressar alegria ou tristeza ou um senti- mento grave, sem exagtro, apenas levemente esbogido. Um expélho muito nos faclitard para marcar o limite exacto da express 24 3) 4 9 MARIO FERREIRA DOS SANTOS A tristeza porte ser expressa, deixando cait um pouco comissura dos Idbios, e a face. Nada de exagéro, senio surge tuma expressio de choro. ‘Na alegria, clevam-se as linhas, Os mntisculos zigomati- «cos da face devem erguer um pouco a comissura dos ibios. Nos sentimentos rosto € suficiente. jermédios uma quase pussividade do Seo tom é explicatva, neste caso, pende-se um pouco a cabega para a frente. Na verdade, sempre que queremos explicar alguma coisa a quem nos ouve, fazemos éste movimento, Se 0 som é narratvo as mesmas posturas do tom sbrio sio convenientes Seo tom € chocarreiro, ¢ quer expressat alegtia, certo humor, uma expressio de alegeia, sem mudanga dos estos. Se 0 tom é de exctagdo, impSe-se empregar um gesto um pouco excita, no exagerado. Se 0 tom é paidtco, pode-se erguer uma on outra das mis fem garra, ou os dedos recurves, até 3 altura pidaiuus Ua cabega ou do peito, conforme os casos. A expressio do rosto deve ser triste ou decomposta levemente, como a de quem. Mas apenas sugenr, cis aqui a regra de our, Atenas sugerr € no imitar, regra por nbs tantas vézes acentuada, cuja obediéncia é imprescindivel Fazer bastantes exercicias, © observar-se, Todos ésses xgestos devem indicar sinceridade da parte do orador do contrdrio sio ineficientes. Nos primeiros exerefios, para muitos, tal dominio parecer inaleangével. Mas aqui, como em muitos outros casos, & necessirio persisténcia confianga em si, e grande dase de auto-critica. © ESTILO NO DISCURSO Bim nosso “Curso de Onaidria € Retérica”, tivernos ocasiio dle estudar os tr8s tipos de estilo que 0s retéricos classificam: 0 sublime, 0 temperado e 0 simples. Nessa ocasido, apresentémos muicas regtastiteis, que preten- demos ampliar com otras, estilo sublime exige 0 emprego de expressbcs nobres, em frases cheias de harmonia ¢ brilho, enquanto 0 femiperado em- prega palavras simples que no levem 20 vulgar, ao chio, ¢ © ‘estilo simples tende a cair na linguagem familiar, quotidiana Assim como para uma oracio fiinebre ao cabe o estilo sim- ples, € sim o sublime, numa exposigio de razBes nio cabe 0 ‘estilo sublime, e sim o simples, Seo estilo suélime exige 0 emprego de figuras de oumuente, jd estudadas, o simples exige 0 emprego da frase quotidiana, sem cair, nattiralmente, no genero vulgerissimo, da linguagem do homem ignorante. Para exaltar, para alcangar o patético, é o estilo sublime 0 mais adequado, Os exemplos tornario bem claras as regras que desejamos oferecer. HINO A LIBERDADE, Liberdade! entre tantos, que te trazem na boca sem te sentirem no coragio, cu poso dar testemunho da tua identi dade, definir a expressio do ten nome, vingar @ pureza do teu ot MARIO FERREIRA DOS SANTOS vangelho; porque, ne findo da minha eonscineia ex te vejo incessantetuente como estiéla no fundo obscuro do espaso. Nunca te desconheci, nem te trairei nunca; porque a natu- reza impregnou dos teus elementos a substancia do meu ser ‘Yeu instinto derivou para éle das origens tencbrosas da vida no temperamento inflexivel de meu pais entre as mais belas tradigGes da tua austeridade ascilou 0 meu bergosminhajuven- tude embebeu-se na corrente mais cristalina da tua verdade; pena das minhas lides aparouse no fio penetrante do teu amor, ¢ punca se imbuiu mum sofisma, ou se dissimulou pum subterfigio, para advogar uma caust, que te nfo honrasse. De posto em posto, 2 minha ascengio na vida piiblica se graduou invariivelmence pela das tuas conquistas; as vicisitu des da minha cartcira acompanharam o diagrama das alternati- vas do teu curso; contra os dois partidos, que dividiain 0 Império, lurci pela tua realidade sempre desmentila; renuncied por ti, as galas do poder, suspiradas por tantos, com que éle me ascenour; sbzinho, sem chefes, nem soldados, tive por tia £6, que transpGe montanhas; ousei pr na funda de jornalista pe- quenino & pedra, de que zombaram os gigantes; aos ouvids do velho rei, sacrificado pela familia, pela efrte, pelas facgies, vibrei nos teus acentos 0 segredo da sua salvage a profecia da sua ruina; na Repiblica, stacei a esperangt do ten reinados quando a Repstbliea principio a desguerar do teu umo, enchi do teu clamor a imprensa,o parlamento, 0s tibunais; ¢, porque eu guisera fandar asim urma escola, onde te sentasses, para ceasinar 20s nossos compatriotas 0 exerccio viil do direito, oui ressoarem-me no encalgo, convertidas em grita de perseguigio, (0s cantos herdicos de civismo extrafdas outront do bronze da tua égide pelos que combatiam 2 Monarquia 4 sombra da tua bandeira, Emquanto a fascinagio do teu prestigio podia ser dil a ama deslocasio do poster, tua urea lenda foi o estribitho dos entusi astas, dos ambiciosos ¢ dos iludidos. Mas assim que 2 vitéria obtida sob a tua invocagio entrou a ver na tua severidade 0 limite aos seus caprichos, um culto novo, armado de andtemas ee PEENIEA DO DISCURSO MODERNO. o contra os éspicitos incorraptiveis no ten serviga, eon coninipdras imageas da Repaiblieae da pitta, «antes ta, ¢ dela insepaniveis. Eu no podia aceitar 0 paradise sv artificio dessa substivuigios porque eu és 0 centre se sist tlonade ambos essts idéias alongam as drbitas, e, no dia e1n q fe apagasses, ou desaparecesses do universo moral, a qu pre sites, incalculiveis perturbagées transtornariam a orden cis csferas politicas, abismando a pieria © a Republica no eclipse de tama noite indefinida Dos que deveras te amam, ¢ entendem, nem a Repiblic, nem a pétria podem receber detrimento; porque tu é part luma ¢ pata outta a maior das necessidades, 0 primeizo dos be amas segura das garantias. Sé entre os que te nfo trocam por outros interésses, a pti ‘encontrard um dla 0s capazes de reergué-la; ¢, se a Repiiblica animar a expansio da tua seiva, deixando frondescer 20 largo a piedade das tuas ramas, as dltimas sementes do outro segime mittatdo € morrerio 8 sombra da tua indiferenga, A democracia, que te nega, ou te cerceia, engoda os povos com o chamariz de uma soberania falsa, cuja destino acaba sempre 3s mios dis facgBes, ou dos avencureiros, que a exploram, _Senhoras de si mesmas, na acepgio verdadeira da palavra, so bnicamente as nagies, que te praticam sem ébices, nem rescrvas; pois sf onde a unidade humana fér livre, a coletivi- dade humana pode ser consciente. Os que falun nas tuas deinasias, esquecem que nfo te podenis desregrar, senio quando fores impura, ou nio sejas completa, ©, onde te obscrvarem por igual no desenvolvimento simul tlinco de todos, nto hé meio de contrariares o de ninguém. Af est por que eu te advoguci para a conscigncia © para a palavra, para 0 casino ¢ para 0 culto, para a imprensa ¢ para © “meeting”, para a opinifio e para o voto, ¢, depois de ter lidado com os que te dezam ao negro, entendendo que os emau- ipadores necesitavam de ser emancipados, expus-me 4 revolu- io, quando nos negaram a reforma, certo de que as instituigdes, ” MARIO FERREIRA DOS SANTOS ‘em que te encarnamos, inaugurariam entre nés uma era de sinveridace. E tempo de vires animd-las, 6 liberdade tantas ‘véves abandlonada pelas criaturas da tua propaganda, pelos ‘pequeninos, que fizeste magnatas, pelos desvlidos, que elevaste 2 onipotentes, ‘Teu nome € como o do povo: vencedor sempre na batalha, ppreterido quase sempre nos despojos, Na hora das grandes reivindicagdes triunfa ieresistivel a harmonia das tuas promessas, como 0 “poean”” grego, o hino da vitéria infalivel. Mas nio rato 0s teus apéstolos assumem no outro dia a tua tutela, © os ‘erimes conta ti concebidos passam a se perpetrar em teu nome, Aordem, a autoridade, a razo de Estado entram desde logo a hhabitar a béca de teus antigos confessores, como se a razio de Estado nto fésse a velha meretriz do despotismo, ea autoridade, ‘ou a ordem, pucdesse ter bases mais estiveis que a observéncia estricta dos teus mandamentos, Os tons podem variar, mas a gama é a mesma; autoridade, ordem, patriotisimo, povo, demo- cracia, repiblica, liberdede, tudo to mociulagio do mesmo motivo, o poder: poxler em aspiragio, poder cm geo, o& poder fem saulade. ‘Mas tu ndo és a excada para o poder: és, nas sociedades adian- tadas, o elemento sagrado, que o limita, Nao te chamas domina- Glo: chamas-te igualdede, tolerincia, justiga, Nao te entregas em monopélio. um predestinado,a una religifo, a uma parcial dade, a um sistema; existe uniformemente para todos, elimina dora do mal, fonte igual deluz, calor e prosperidade para o bem, $6 te compreendem os que te no recusim aos seus adve sdrios; porque tu és diseussio, a Iuta das inteligencias, 0 com- bate das idéias, Nenhuma opiniio, nenhuma politica, nenhuma invengio ‘humana é privilegiada contra tis sobre t8das entomas impatcial- ‘mente os teusrais, a cujo clardo 0 érro se descobre, ¢ prevalece a verdade. TTeu influso decompée as criagSes efémeras, ¢ crista- liza as divinas, Muitos séculos te rejeitaram em nome da fé religiosa, até que acima de todos os dogmas a humanidade pusesse o teu dogma, PRENICA DO DISCURSO MODERNO. n a con 3 egacice Deus as com as efi si ‘Tremendos sofrimentas atravessou o homem, primeito qu te cnxergasse nesta evidencia, percebendo a importicia «los cultos fabricados na terra, para concotrer com o que encerrasse expressio da eternidade. Destronizada, porém, a intoleranc religiosa, querem agora desmentir-te, asentando no mesmo sélioa intolerancia civil, Os que adquitiram o diveito de afirmar que Deus € 0 mal, perderam 0 de dizer que a Repiiblica ni presta. Mas € preciso nfo ter colhido os rudimentos da tua experiéncia, para nio siber que o regime, cujo principio no se discute, € um regizne pela sua prépria descontianga condenaco 4 antipatia, a0 descredito eA morte, Uma Constituicio indiscutivel é, perante a ligfo da tua ex- periéncia, uma Constituigfo caduca, gerada na decrepictez, con- denada de nascenga &scnilidace, Sé por tise diseriminam auten- ticamente os regimes. ‘Twa presenga faz as repblicas, dando- Ihes © govérno da opiniZo, férmula necesséria da realidade re- publicana. Tua auséncia as infama, as desmacara, as atrufaa, insurgindo contra elas as tuas frcas, as maiores que a nossa natureza conhece, as que revolvem até 0 fundo a alma humana, as que levantam, 20 prise da censeiéncia, as pedras das calsadas, as que fazem pairar sObre as revolugdes 0 espirito de Deus. Aidos que poem a mos na cua arca, 6 liberdade que exgues as nagBes, ¢ abates os impérios! As democracias, que atentam, contra a tua majestadle, perecerio na tirania dos Césares, ou na anarquia das rues Onde tu decais, ow te somem, nfo tarda em te seguit na desestima ¢ na extingéo o govérno do povo pelo povo. Téda rmaioria, que te comprime nos individues, ow nas minors, pronuncia a condenagio de si mesma: porque © prinefpio das tmaiotias € um principio de evolugio e roragko, em que alter- nativamente as maiorias se decompéem em minoris, eas mino- sias se dilatam om maiorias, F. gracasa essa actividade continua das twas correntes na formagio da vontade popular que as n MARIO FERREIRA DOS SANTOS dlemocracias se depuram, esclarecem ¢ legitimam. Porque nada seria menos tolersvel 4 dignidade humana, mais contrério 3 natureza moral da autoridade e da obediéncia do que a supre- ‘macia do ntimero, se tu nfo suscitasses as vacacBes, para oilami- harem, as virtudes, para 0 converterem, as capacidades, para o reprimirem, Em The faltando essa abdhada estrelada, onde rutilam as superioridades,ésses confins, que limitam a f6rca,ésse paradeiro, de onde os instintos refluem, coibidos pela razio, a sorte dos Estados entraria na zona das catéstrofes, onde, extintos os teus signos ¢ os teus fardis, rola a vaga negra da loucura coletiva, sucedendo ao povo, com a sua inteligéncia, a sua generosicade ea sua grandeza, ‘a calamidade terrivel” do teigico grego, a tirania das multidaes. ‘Quando ela espuma convulsiva nas pragas de uma cidade, imagina ter empinhado 0 cetro de um pats; ¢ os que nfo tm crengas, ou gastaram 0 cardcter no atrito dos interésses, deser- tam espavoridos & tua milfcia, para agregar o falsete da sua pusilanimidade aos bramidos da catistrofe desencadeada. Ela Fassar$, como todos os fendmenos da desordem. ‘As procelasastrombas, os ciclones devastam, mas nfo dram. O que nio passa €0 oceano das venlades eternas, indiferente a0 rugir das paixdes contemporfineas, por sdbre éle a imenst- dade sidérea das almas, que é tu, 6 liberdade. Com a fronte banhada na claridade que derramas sBbre 0 curso dos tempos, historiador, que se debrogar para a erdnica das misérias do pasado, teed muitas vézes repugndincia. em memorar entre os mais desnobres especimens da. degenetes facia no homem civilizado os panegiricos da demagogia aos crimes cometidos contra ti pelo delirio anénimo das reas. Querem santificd-tos essas despreztveis apotogias, indo bus- carlhes a origem na indignagio, que inspira agdes grandes, Ou no entusiasmo, que move os herdis, e transfigura divina- ‘mente os povos. HRENIEA DO DISCURSO MODERNO, ” Por essas voeiferagies passa a mifide a tt evocagi pro fanada, De quando em quando na cloguincit dessis eumpli des so estorce, glorificada com as tuts palit, a alin rubra de uma espécie de Kali indiana. Mas t1 nfo & lo sangue, 6 liberdade; tu é © génio da par A abafadiga magnificéncia das civilizagGes sem ideal nin te centreviu. Nasceste, quando a inteligéncia principio a devassar 0 infinito, no espirito dos que resgatavam com o ostracism, ‘ow a cicuta, o amor da verdade © a independéncia da rario contra o Estado, Na Helénia se deu um dia a medida do teu valor, quando as embaixadores de Atenas, quatro séculos antes de Cristo, afirmavam a Esparta que os atenienses nfo nego- ciariam a liberdade, para salvar o territério, Mas uma organi- zagio que dividian 0% homens, perante o dircito, em gregos beirbutos, ema cidadios e ilotos, nio podia resolver a txa incdg- nita, Foi a cruz do Nazareno que deciftou o teu mistério, Tevantando-te num pedestal, que as maiores revolugées io combaliram, nem hio-de combalir, Quando a justiga de Cesar € justiga do povo supliciaram, entre dois malfeitores, a di- vindade, que as nagées civilizadas adoram hé mill e novecentos anos, o homem viu que 0 arbitrio de matar e a autoridade de foprimir acabam Ibgicamente no deicidio, Desde ésse exemplo tremendo todo aquele que te maltratar, perseguindo uma opinigo, ou derramando 0 singue, a win semeador de idéias, comete debaixo do ex 0 sumo serilégio. O homem, que & © érro em procura da verdade, nfo poxle tragar divisdcia entre a verdade e 0 érr0; por iss, em todo pensador, em todo apéstolo, em todo reformador, em todo heterddoxo hi algums coisa, que os poderes da terra nko tém meios de siber se ¢ humana, ou divina, A maior vitima das maiorias politicas foi (9 Deus crucificarlo, E aqui esté porque a imagem da sua paixdo 6 a tua pripria imagem. Entre os bragos daquele pati- bulo, tue a verdade sofrestes juntamente, ¢ com a verdade resuegistes dos mortas. Porque tu nio é& a verdade; mas se a verdade pode entrever-se da terra, & pelos horizontes que tu nos abres. 7 MARIO. FERREIRA DOS SANTOS: Bem merecits que a reptiblica, no Brasil, te estremecesse, Gliberdade. Ela emanou de ti, da tua aspiragio, do teu pro- ama, dos sacrificios de teus amigos. Ela nunca se teria afir- mud, se nfo se anunciasse como a tua portadora. Os povos ‘io distinguem as instituigdes, a no ser pela tua presenga, on a tua falta: ¢ nisto é bom o senso que se exprime pelo instinto dos povos. A experitneia dos agitadores no tarda em. mos- trar As nagdes 0 canter otioso das fofos, com que o frenest desmagégico te intenta suprit. As nagées vivem de trangui- lidade e seguranga, de crédito trabalho, de inteligéncia © probidade; ¢ nem um 36 déscs beneficios resiste A vasa dos sentimentos, em que transborda o regime da ameaga, da into- lerincia ¢ da sedigéo. O motim nao &a democracia; a celeuma no € 0 parlamento; a rua nio € 0 pais; 0 incéndio nfo é a razios © crime ndo € 0 diteito: 0 asaissinio nao € a justia a anarquia rio és tu, 6 liberdade. ‘Teus herdis no so os gigantes da carniga, 0s cléssicos da perseguigio, os semi-deuses do terrors sfo os bons, os mansos, (0 justos, os mértires da infalibilidade politica no trono, na plebe, nas seitas ferozes, os homens limpos de singue alheio, ‘que venceram pregando, escrevendo, edificando, salvando, € morrendo, os que, abracados contigo, scmearam 2 religifo, lavraran 0 diteito, estabelecetam a ioral politica, tose come posto de moderagio, experincia € senso comum. © primeiro désses sintes, 0 arquétipa déles, expirow no Gélgota; ¢ do horror 8 violéncia, envolvide no qual o madeiro sublime alonga através da histéria a imensicade melancélica da sua sombra, cada era, cada geragio, cada povo exprime 0 sentimento sempre vivo na santificacio dos que éles viram aagonizar por ti, 6 liberdade, em cuja descendéncia de mértires nio é 0 iltimo, 6 Tiradentes. Da férea, onde padeceste a morte infamante reservada aos malfeitores, baixow 4 twa ptria 0 sonho republicano, que outras geragées tinkam de ver consumado, Teu suplicio € um dos Crimes da perseguicio, histbricamente fatais aos perseguidores. A posteridade enflorou o teu cadafalso em altar; porque 0 SNIGA DO DISGURSO MODERNO, ” vilipndio da expiagéo, que te imolou, {E75 «bt tnt 9 inizaia « padroeira nacional do lit Supliciade por uma idéia, deixaste de emblemae special dela, para te converteces cm simbolo universil inviolabifidade da opinigo humana. Morto pela repiblica, Tiradentes, & a ligio imortal, dada & replica, da aversio a sangue ¢ 2 intolerincia; és, perante a repiiblica, o advogado geral contra a vinganga ea opressio, Vitima de um terror, passaste & posteridade como a conclenagdo de todos os terrores. “Tua histétia nfo afina com os cantos da guerra cruenta, mas com as imaculadas aspiragies da liberdade, que floresce na paz. Se se erigisse um templo 2 justiga, onde os tribunais se abrigassem da politica, nz frontaria désse templo, 6 Tiradentes, seria 0 lugar para 0 feu nome. Pregar com fle a {Orga € apostolar com o do Cristo a fogueira. Na fisionomia das tuas imagens, imais ficis & verdade do teu destino do que o gesto politico da tua efigie militante, da sua contrafcigio moderna, « intuicio da arte pfs, com im toque de ideal, 0 sélo da firmeza na bondade, a vaga sombra de uma tristeza semelhante 4 do filho de Maria: a tristeza profética dos precursores, presentimento das profanagbes da sua vitér € do seu nome entre as longas vicissitudes do futuro, Se lograsses renascer, 6 Tiradentes, nfo seria para te reveres nos furores republicanos, mas para Ihes dieeres que niio te deste 4 morte, por legar ® repitblica o barago das Ordenasies, do Reino que na revolugio por ti servida 6 havia ddio aos flgozes? que ado terias tramado, se pudessis imprimir? que (os que destroem prelos, espargem conspiracies? que o exter: innio das opinides € o suicidio dos regimens? que 0 culto dos iirtires s6 nfo toleta a intolerincia? que © préprio érx0 & invielivel no seu discito de se enunciar paclficamente, por- quanto 0 juiz infilivel no se acha entre és, ¢ ése ensinou ‘aos homens a liberdade pela mais alta cas ligbes, dotando-os, ra galavra que thes deu, com a faculdade de negé-o. co MAINO FERREIRA DOS SANTOS Por iso, 6 Tiradentes, quando se pensasse deveras em con- solidar a reptibfiea, e para ése efeito crinsse o mew partida,, 6 sinico em que eu devotadamente serviria a un govérae, 0 partido da resistencia & politica agitadora, o patid da hata pelo direito, 0 partido da regeneracta pela democracia na lei, © partido da paz. na tolertncia, um partido que nfo mate, no proscreva, nfo odeic, o partido da liberdade conservados2, poderiamos, 6 Tirdentes, cleger-te nosso patrono, ¢ © te santustio nio scria defendido por baionetas, mas pela amplidiio hhospitaleira das tuas portas abertas A garantia de tas as opiniées. (Conferéncia, no Politeama Bahiano, em 25 de maio de 1897). ‘Temos, neste discurso de Rui, um exemplo do estilo sublime. © estilo temperado leva-nos a, baixar um pouco 0 tom, evitar apéstrofes, exclamagées. E um estilo calmo, serena, tranquil, seguro, Deve sempre dar a impressio da segneanga, de quem fala com a méxima fiemeza Vamos a um exemplo esclarecedor; como & éste discusso de Sécrates em sua defesa. “Fis, portanto, atenienses, que falta um pouco de paciéncia de vossa parte; ¢ aqueles que quiserem descrever vossa cidade, vio acusir-vos, difamat-vos como tendo morto Sécrates, fa ‘moso por sta citncia. Porque éles dirdo que ew era sibio, ‘embora cu ndo 0 seja, pelo prazer de vos difamar. Contudo, no tendes nada a esperar; © curso natural das coisas tem vos dado sitisfagdo. Véces minha idade, sow avangado na vida, aproximo-me do fim. E.o que digo 0 dijo a vés, mas sbmente Aqueles que me condenaram & moste E tenho ainda outra coisa a dizer-vos. Penis, por acaso, atenienses, que fuj condenado por falta de hébeis discussos, diqueles que vos persuadiriam, s¢ cu acreditasse fOsse necese PGEENICA DO DISCORSO MODERND ” sirio wdo dizer € twilo fizer para escapetr vosst seuten Nada de menos exito. 0 que me faltou pata ser absolvido, nvio foram os discurses, foi a audicia e a insoléacia, foi a vontade de ndo vos fazer ouvir 0 que teria sido mais agradivel, Séerates choxsaslo, sgemendo, fazendo ¢ dizendo coisis que julgo indignas de may, em uma palayra, tudo quanto estais habituados a ouvir de ‘outros acusados. Ni, nio poderia admitir, em nenbiwin momento, que, pars cescapar a tima desgraga, tena dircito de fazer um acto covarde, ¢ nio me arrependo agora de ter assim me defendido. Ah! como prcfiro motrer apés uma tal defest do que viver a tal prego! Nenhum homem, nem eu, nem ninguém, quer perante un tribunal, quet na guerra, deve procurar fugit 2 morte por qualquer meio, Frequentemente, nos combates, € claro que femos mis oporuinidade de viver, depondo as armas ¢ pe indo cleméncia ao inimnigo que nos domina. E até, em todos 6 outros momentos de perigos, hd muitos meios de escapar & morte, se nos dispomos a tudo fazer e a tudo dizer. Sémente, pprestal atengio a isto, juizes: que o dificil nfo é evitar a morte, znas, sim, cvitar 9 proceder mal. Q mal, védes, corre atris de ngs mais ripido do que a morte. gue quer dizer que eu, que sou velbo, ¢ ando lentamente, dine par plots lento dos dol corederes, quanto meus acusadores, vigorows e Ageis, foram pelo mais répido, que € 0 mal. Assim, agora, sairemos daqui, cu, julgedo por vés digno da motte, les, julgados pela verdade, culpados de impostura e injustiga, Pois bem, estimo a minha posigio como éles estimam a dees, Sem divida, & preciso que assim seja, © pens que as coisas sf 0 que clas devem ser. ™ MARIO FERREIRA DOS SANTOS Quanto ao futuro, desejo fazer uma predigfo, a vés que ime haveis condenado, Porque, cis-me aqui naqucla hora da vvida, na qual os homens falam melhor, um pouco antes de expicar. Anuncio, entio, a vés, jufzes, que me fazeis morrer, que vvés fazeissofrer no momento que deixarei de viver, um castigo bem mais duro, por Zeus, do que aquele que me haveis infi- sido. Concdenando-me, acreditais libertar-vos da inquisigio exer- cida em vossis vidas; pois seré 0 contririo que iré acontecer, eu vos afirmo, Vercis aumentar o niimero dos inguiridores que eu reprimia, sem que 0 percebuis. Inguiridores, tanto mais importunos, porque sio mais jovens. E. éles vos irritardo por mais tempo. Porque, se pensais que matando as pessoas, impedircis que vos repreendam de viver no mal, enganai-vos. Esta maneira de desembatacar-se dos censores, ouvi, nfo & muito eficar, nem hhonrosi. Uma sé € honrosa c, além disso, muito fic: consiste, nig em fazer silenciar os outros, mas tornar-se verdadeiramente homem de bem. Bis o que tinha a prodizer Aqueles que me condenaram. Ditas estas palavras despego-me des Quanto a vis que me absolvestes, terei prazer em conversar convosco sobre 0 que se pasou, durante 0 tempo em que os magistrados esto ocupados, ¢ nfo me conduzitio ainda para ‘onde devo morrer. Ficais, entdo, alguns instantes ainda perto de mim, Nada nos impediré de conversar tanto quanto seja possivel. Desejava expor-vos, como também aos amigos, como interpreto © que me aconteceu hoje. Sabeis, entio, julzes — porque este titulo, que vos dou, 0 ereccis € a ele tendes diteito — uma coisa maravithosa me aconteceu. Durante t6da a minha vida, a voz divina jamais eessou de se fazer ouvir, até nas coisas de minima importéneia para me PRENIGA. DO DISCURSO MODERNO. ” roter, se estivesse part fazer alyuma eos de mal. Ora, hoje, aconteced, como tivestes ocastio de ver, un coist que se poder considerar como o maior dos muiles. Pois hea, nem festa manhi quando sai de casa, a vor divina no me deteve, nem quando subi ao tribunal, nem quando fazia meu discurs, adyertiueme 0 que deveria dizer. F, entretanto, em mui outras circunstfncias, ea me detinha ‘no melhor momento «le eu propésite, Mas, hoje, ao contrario, no decorrer do debate, aio impediu nenhum de meus actos ou de minhas palavras. ‘A que motivo devo atribuir sua abstengio? Vou dizer-vos. Sem deivida, © que me aconteceu foi um bem para mim, € certamente que nos enganamos, quando julgamos que a morte um mal, Sim, isto & para mim uma prova decisiva, Nao & admissivel que meu sinal costameiro no tenha me advertido, se 0 que tivesse feito nfo {ra bom. Hi razes para se esperar que a morte seja um bem! Porque, de duas coisas, uma: ou aquele que morte, fica reduido a0 nada, ¢, nesse caso, nfo tem consciéncia de nada; ou entio, conforme o que se diz, a morte é uma mtidanga, um passagem de um estado a outro, uma transmigeagio da alma de um lugar para outro. Se a morte & a extinglo de todo sentimento ¢ assemelha-se a tum sono sem sonbos, é uma maravilha a morte! Se efetivamente, considerissemos umn dessas aoites em que se dorme profundamente, sem ter um sonho sequer para com- parla ts outras noites e dias da vida, para decidirmos se tive- mos dias ¢ noites melhores e mais agradéveis do que aquela noite, imagino que todo homem — e nfo me refiro somente aos homens em particular — mas até o grande Rei em pessoa, aché-losia bem pouco numerosos em relagio aos outros. Portanto se a morte € um sono dessa espécie, considero-a ‘um grande beneficio, pois que em todos os tempos nos aparece ‘como uma noite tinica. De outra maneira, se a morte € como uma viagem desse ugar a outro, se € verdadeiro, como se costuma dizer, onde se reunem todos os mortos, que podemos imaginar de melhor? «0 MARIO VERREIRA 108 SANTOS Pergunto-vos, juizes, admitis que chegando ao Hadys, de- sembaragados desis pessoas que se dizem julzes, devemos ‘encontrar os verdadeiros julzes, aqueles que, dizem, praticaram a verdadeira justiga, Minos, Radamanto, Eaque, Triptolemo, com aqucles seini-deuses que foram justos quando viveram; penstis que s viagem nfo valeré a pena? Quanto a mim, slesejaria morrer muitas vezes, se isso & verdadeiro. Que ma- ravilhoso passatempo, para mim particularmente, conversar li com Palamedo, com Ajax, filbo de Telamon, ou com outro heroi do tempo passido, que morreram vitioas de ui julga- mento injastol Acharia uma certa satisfigio em comparar minha sorte com a deles, Gostaria sobretudo de passir meus dis a examinac ¢ dis. cutie € a intetrogar como fazia aqui, pura ver entre eles, quais os sibios © quis os que se julgavam ser, mas no o eraras Quanto nfo x dari, jufves, para ver assim aquele que condu- ‘iu contra Tréia 0 grande exército, ou ainda Ulisses, ou Sisifo, € tantos outros, homens € mulheres, que se poderiam citar? Conversar com cles, viver na companhia deles, examiné-los, seria um prazer indefinivel! Em todo easo, ao Hadys, temos certeza de nio sor condenados 3 morte por isso, © apenas nifo se 6, de qualquer maneira, mais feliz do que aqui, como ainda se € imortal, se o que dizem é verdadero. Esta coafianga em face da morte, julaes, deveis ta como cu, se tiverdes conscitncia desta verdade, que ni hd mal possfvel para o homem de bem, nem nesta vida, nem na outra, € que 0s deuses ndo sio indiferentes 3 sua sorte. A minha no € fruto do acaso; longe disso: vejo claramente que seria melhor para mim morrer agora, do que ser libertado de tOda pena. Eis porque minha vor interior nfo me deteve em nenhum momento, e eu nfo desejo abalar a vor dagueles que me con- denaram ¢ de meus acusdores, TRGNICA DO DISCURSO. MODERNO a Na verdade condlenando-me acusando- comme cu aereditavam estar prejudicando, reprovagi eno wma coisa a vos pedir: atenivnses eastigai-os, atormentando-os como eu vos tei, se eles procurarcm a riqueza ou qualquer outra coisa mais lo que a virtue, Se cles atributirem 2 si mesmos um valor maior do que sio,, contigi-os, como eu vos corrijo, repreendei-os dese descuidarem, dle seu dever ¢ de acreditarem ter um valor, se eles niio 0 ti- Se fizerdes isso, sereis justos para comigo e para com meus {Mhos. ‘Mas, eis que chegou a hora de partir, cu para morrer, vés para viver, Qual de nds tem a melhor sorte? Ninguém 0 sibe, sdmente Deus”, Stio de Rui Barbosa estas palavras, em estilo temperado: “Retérica ou cloquincia? Eloguéacia € 0 privilégio divine dda palayra na sua expressio mais fina, mais natural, mais bel E a evidéncia alacla, a inspiragio resplandescente, a convicgio, clectrizada, a verdade em erupgio, em cachoeira, ow em ocean, com as transparneias da onda, as surprezas do vento, os reflexos, do céu ¢ os descortinos do horizonte, Como 0 espitito do Senor se librava sobre as fguas, a sensa- ‘elo da imingncia de um poder invisvel paira sobre a wibuna ‘ccupada por um verdadeiro orador. Abriu éle a boca J& ninguém se engana com a cosrente do fluido imponderivel € maravilhoso, que se apodera das almas. Ea espontaneidade, a sinceridade, a liberdade em agio, Daf A retdrica vai uma distincia incomensurdvel. A retética €0 esforgo de arte por suprit a eloquéncia nos que no a tém, ARID FERREIRA DOS SANTOS a sua singeleza, a sua abundancia, a sua luminosdade, a sua energia tciunfal, Todos os grandes oradores se vieam chamar retSricos pelos sivais impotentes da sua supesioridade. De Atenas 1 Gr Bretanha, de Roma & Franga, 4 Itdlia, 2 Hungria, & Alemanba, a eloquéncia tern vibrado e dardejado nos Idbios dos maiores hhomens de governo, os construtores de nacionalidades, 08 ui ficadores de impérios, os salvadores de constituigées, 0s condu- tores de reptiblicas e democracias, sem Ihes desmerocer jamais a cles a valia de estadistas, Péricles, Cavour, Mirabeau, Pitt, Gladstone, Cfcero, Linco, Bisinarck, Daek, Thiers, Gambetta, que foram todos eses tities do pensamento e da acto militante sen‘o prodigiosas encarta ges da palavra ao servigo do genio polftico? Vede a livre Grécia, a Inglaterra livre, a livre América do Notte, a Franga livre: outras, tantas criagdes, antigas ow modernas, da tribuna Sob cssa poténcia eterna se fez a mie das artes, a mie dos parlamentos, a mie das atuais democracias, a mie das maiores reivindicagies liberais. Na idade hodierna, todas as grandes ‘expansdes do direito, todos os grandes movimentos populares, todas as grandes transformagées internacionais sio maravilhas dda sua influtncia universal © préprio Brasil, 0 Brasil republican, que outta coist nfo & sendo a obra ds seus homens de Estado, 08 quais eraim 20 ‘mesmo tempo, os seus jurisconsultos ¢ os seus oradores? Se abstraiseisdeles em Franca, onde a Revolugio Francesa sem 2 Assembléia Constituinte, a Asembléia Legisltiva © a Convengio? Se os elimin‘ssemos da Inglaterra, onde o governo parlamentar? Varrei-os dos Estados Unidos, e tereis apagado a histéria americana, que € uma via-léctea de estrelas da palavra Exclui-as do Piemonte, ¢ vercis sumir-se esse parlamento de Turim, onde o verbo de Cavour, em doze anos de lida tribuntcia, assentou o laboratério da unidade nacional Suptimi-os, enfim do Brasil, e tereis acabado com a actividade civilizadora do Império, a luminosa jurisprucéncia dos seus HRENIEA DO DISCURSO: MODERNO HY ‘uibunsis, os seus magufficas monumentos de eoificagio © en cao Hibral has classes eultas pela escola das suas assemnblCias « conquista da emaneipagio pelos comicios populites, organi zagio tka monarquia da repiblica pelas nosis dus consti «Ges. ‘Tudo beneficio do senso juridica e do senso politica, representados ¢ deseavolvidos pela cigncia dos nossos legistas ¢ pelo inlluxo dos nossos parlamentares.” ‘Como exemplo do estilo simples, em que a linguagern € mais quotidiana, corrente vulgar, damos 0 seguinte exemplo: “Naquela tarde, que taisfactos se deram, ninguém esperaria, nninguém poderia pensar que Fulano tivesse tais intengées tio mis. Todos o conheciam como um bom homem, de vids mot gerade. Quem havia de desconfiar dele, depois de morar na quele baicro por tanto tempo, nada tendo feito que levantasse swpeias? ois foi o que se dev, ‘Todos earn ean, juando correu a noticia, ninguém quis acreditar. E os que sents al do tan, Baan pu Teor pela diivida do que pela curiosidade. Pois era tudo verdade, Sinceramente, {foi para todas simplesmente espantoso.”” Todos esses tts estilos exigem certo cuidado, pois todos cles podem levar a exageros, que a oratéria moderna no mais su- porta. Todos sabem que a sobriedade nas palavras & caracteris tica de nos era, Sem algumas épocas, os arroubos sio permi- tidos, € obtm bom @xito, na que atravessamos a simplicidade € uma exigéncia imperiosa, Muitos procuram fazer combinagées catre esses trés estilo, Quais os limites que tais combinagdes podem atingir, em breve ‘estudaremos, Analisemos, porém, com 0 méximo cuidado o emprego dos ot MARIO FERREIRA DOS SANTOS: Ocstilo sublime nfo € 0 estilo entftico, empolado, exagerado, cheio de metiforas e alegorias, que se tornam ridiculas. Quem dissese frases como estas nfo faria um estilo sublime: “Abancados como abuties sobre os magtos cores piiblicos, cesses pssaros Kigubres da inflmia e da indecéncia, no saciam, jamais a sua sede de ouro, acumalando montanhas de desgrasas ¢ afastando dos lares pobres tranquilidade e a paz, para sub- mergé-los ern Kigrimas, desesperos © choros”. Seria um completo erro, No hi nobreza nas frases. Citamos outro trecho sem indicar 0 nome de seu autor, mas de um mau gosto evidente: “As pistulas da miséria politica nacional esvurmam puz. A rnagio esté ameagada de afogar-se nesse mar de lama da corrupgfo ¢ da indignidade™. Nada hi de sublime. E possivel manter-se dentro do estilo sublime, sem cair em exageros que o enfeiain € o tornam até ridieulo, © estilo temperado pode cir, por sux vez, também, em certos erros, © 0 principal deles & a monotonia, que provoca cansago, inatengio, desinteresse. H4 muitos discursos, que encontramos nos anais da Camara, desse estilo, que devem pro- vocar sono, Vamos citar algumas frases de um desses discurss: “Os adversitios da politea econéimica do governo, segura menie nao sabem calcular 0 alcance de suas palavras, pois iio Ihes falta constantemente afirmagSes que se baseiam em dados, que no foram devidamente investigados, © que revela muica rm intenctioa até mesmo, se paderia dizer, certa audécia pouco controlads, Quando se tata de combater algumas medidas, & necessirio ponderar demoradamente, reflectir com muito cui- dado 0 que se pretende dizer, para que nio transparecam, 4s FEENICA DO DISURS > MODERNO as prinitas palavras, exxos tio grssciros, que © mis simples © snennos conhecedar de finangas desde logo percebe, express mas pulavras que no 8m outra fislidade scafo mostrar os factos diferentemente do que eles se dio na realidade.” Ao chegar aqui a desatengio }4 € geral, € © sono ameagi aposar-se dos ouvintes. Sio verdadciro fiasco estes casos, que podem ser evitados. Sc 0 orador quer permanecer dentro do estilo temperado, ¢ tem de dizer © que disse, pocaia expresarse assim: “Os adversirios da politica econdmiica do governo deveriain ter maior cuidado em suas afirmagées. Se os factos nko as apoiam, tais atitudes sfo produto ou de mé fé ou de ignorincia, Reflectir antes de flat, ponderar antes de expor argumentos, evit-Josia cair em erros gravisinos. Seria prelertvelo siléacio, a sujeitarem-se a um desmentido ffcil, imediato € definitive.” O estilo temperado exige elegincia da frase as par da simpli- dade. Nao € um estilo seco, descarnado, mesquinho. Quanto aa estilo simples & ale realmente dificil, pois 0 efeita € muitas vezes nulo. Hi perigo de eair na chatice, Deve, por isso, ser combinado com o temperado. A melhor rogea € varinr. Por exemplo, do sublime poemos variar para o tempcrado, do temperado ao simples. Deste, pode- mos ir o temperado ¢ dagui aosublime, Mas € perigoso passat lo sublime para 0 simples ou do simples para o sublime, Em casos, quando se relata um facto com simplicidade e se deseja alcangar a exaltagio, € preciso erguerse, segundo as regeas da exaltagio, quanto A w7 ¢ ao gesto, passando por um estilo temperado, répido ¢ subir, finalmente, 20 sublime, Vamos dar um exempl “Virando-se ent para a exfanga aquele homem perguntou: “Menino, onde esté tua mie? 86 MARIO FERREIRA DO’ NTOS © menino ni respondeu logo. Os ellos estavam fitos, como se recordasse, como se visse alguma coisa distante, Depois, voltou-se lento, olhos baixos, ¢ sua vor, quase fria, apagada, pronitnciow esta tnica palavra: — Morten .. © homem nfo tornou a perguntar nada. Ambos ficarain silenciosos. Mas, quanclo a crianga, com um choro jd nos lbios, aponion com a mfozinha, para longe ¢ dise: “Eles a ma- taram...", 0 homem comprcendew tudo, Exgueu o busto,inflamaram as narinas e os olhos brithaeam de édio. Passow de leve a mio pela cabeca da crianga que cho- rava, € posse a caminbar lento, depois depress, cada vez mais cepressa. Todlo seu corpo estava agora agitado por um impeto 36: vingar, Nao vingar apenas aquela mulher, vingar todos ox seus irmias que haviam tombado na ura, vingar todo 0 seu povo, que soft sobre 0 tacZo do vencedor, lutar pela Il de sua pitria, contra os birbaros invasadores. Era todo sé querer, um s6 édio, o ddio que ardia em todos os seus itmos. Como sio grande os oprimidos quando erguem seus bragos para a luta, “Que importa cair vencido 0 corpo, quando 0 esplrito se rebela, se exalta, ¢ embora vencido, o sew malogro € uma semente que germinard, afinal, as grandes explosdes colectivas da liberdade!” Temos af um exemplo de um escritor desta gikima guerra, ‘em que nos mostra como do estilo simples se passa ao temperado ceaté se alcanga ao sublime, sem perder a unidade, e sem tornar- se exagerado nem fals. Os constantes exercicios so sempre proveitosos. bom orador deve fazt-Los constantemente, pois 0 exercitardo a0 mais cuidadoso emprego. AAs vasiagdes sio, portanto, de grande valor. Permitem que © discurso no se torne monétono, © homem moderno gosta dda variedade, e a obeditncia a esta regra € sempre proveitosa. OBSERVAQOES TEORICO-PRATICAS SOBRE OS TEMAS TRATADOS Alinhamos a seguir uma série de observagdes sbbre os temas tratados até aqui, de grande utilidade para o estudiosy «a oratéria, cuja Ieitura frequente aconselhamos, a fim de bem gravar-se em seu subconsciente, € permitir-lhe a memorizagio Ficil e natural, quando do uso da palavra A posse da ““maestria", por parte do orador, exige que as diveis, adquitidas conscientemente, se tornem, de to estudadas e empregadas nos exercicios, em verdadeiros hbitos pricoldgicas, que, no decorrer do. tempo, surjam ao “instintivos”, isto & esponténcos. ‘orador como A “macstria” do orador est na proporgo em que pode usir spotancanente day nocinas que fora adquiridas, « pouco & pouco, através de muita observacio ¢ muita prétia, CULTURA DO ORADOR Em primeiro lugar, 0 orador deve cuidar de sua cultura Eya se adquire pela leitura de bons livros e por uma sélida hase filosdfice, que © habilite ao bom e seguro uso da Légica ¢ da Dialéctica, No poderd o orador alcancar uma solider uma seguranga no que diz, se nfo tiver essa seguranga interior. O segredo paicoldgico da persuasio ¢ da dissuasio dependem: 4) da confianga em si, que tenha 0 orador; 8) da seguranga interior no que diz. 88 MARIO FERREIRA DOS SANTOS: Ors, para adquirir tio importantes principio, o orador pre- isa realizar os exercfcios que aconselhamos, que sio fortale- cedores de sua personalidade, de sua tensio psiquica, ¢ de seus dotes natutais, imprescindtveis. Mas como tiansmitir esa confianga, se 0 orador revelar {que nfo tem solider em suas idéias? Nio basta apenas manifestar convicgio no que se diz. O piblico pode ser persuadido pelas palavras do orador, pela influéncia da férca de convicgio. Mas se ésse ptblico }é tem idéias formadas, nfo basta esa conviegio para convencé! E mister que 0 orador mostre firmeza nas idéias, pleno conhe- cimento do que diz, dominio dos argumentos, alinhados com seguranga, com nexo légico e dialéctico. Do contritio, dard a muitos a impressfo apenas de um homem de boa fé, de grande forga de conviegio, mas que s$ pode infndir suas ideias na- ‘queles que no se acham devidamente preparados para exa- mind-las, para analisi-las, E se a seguir surge um outro orador, que exponha opinies adversas com mais habilidade logico-dialéctica, todo o trabalho anterior estar perdido. Fis par que a aradar dove ser wm hamem crite «crm grande dominio das ideias, concatenadas dentro de uma cosmovisio (de uma visio geral do mundo) muito segura, ito é de uma filosofia sélida. Ademais nio deve © orador nunca esquecer-se que nfo hé tema, por simples que seja, que no possa merecer uma tintura de filosofia, pois esta ebrange 0 todo, e em todos os objectos do conhecimento humano tem sempre 0 que dizer. Aléim disso, aleve cor filosdfica df um carieter mais sdlido, mais respeitivel, mais nobre a que se diz. Revela-se uma seguranga que transmite aos ouvintes conviegio. Por outro tudo, © 0 mundo nos oferece esse espectéculo, muitos oradores st contradizem constantemente. Nao 36 0 fazem no corpo do discurso, como em face do que disseram *PEENICA DO DISCURSO MODERNO- ” anteriormente, Ora, tal facto causa um efeito desistr, pais nada & mais decepcionante para um ouvinte de que sentir ue © orador esté contradizendo suas palaveas anteriores. “Tal Lact causa verdadciro escindalo, ¢ 65 € admissivel naqueles oradores que revelam um progresso ao levar suas idias anteriores pontos mais clevados ¢ mais nobres. Nesses casos, 0 oruloe permanece dentro do Ambito das ideias anteriores (0 que todos logo percebem), mas oferece nelas um grau de intensil de extensidade novo, clevando-as. Neste caso, ndo Inf uma contradicgio que exclua as posigées anteriores (contracliegtn excludente), mas uma contradiccfo apenas cle. grat (contra. dicgio gradativa, que é includente e dialectica). O orador que reafirma suas ideias anteriores, mas as engue a degraus mais altos, como o exemplo do orador que sempre manifestou sua {€ na democracia, mas que afirma agora que cla deve ser limpa de tudo quanto é hfbrido, contrétio & sua ceséncia, exigindo a sua pureza, extremado em seus {mpetos, cic, causa uma impressio agrackivel, e nfo provoca nos ouvintes a impressio de uma mudanga radical de atitudes (0 que, na verdade, nfo o @, ras apenas uma mudanga intensista da atitude anterior, que se revigora agora, Portanto, sintetizando as normas fandamentais expostas, deve 0 orador: 1) Caldar de sua cultura gerals 2) Cuidar de sua posigio filosstic 3) dominar plenamente a Légica ¢ a Dialéctica. Para realizagio dos dois Giltimos itens, propomos ao Ieitor rnossas obras: “Filosofia e Cosmovisio”, “Légica ¢ Dialectica”, © “Psicologia”. A primeira oferece uma visio geral do mundo (casmovisio) filossfica, Acostumaré o leitor ao uso das ideias colocadas dua- Tisticamente, isto & ante suas oposigées, permitindolhe ver como 0 funcionamento de nosso esprito nos leva a sempre nos colocarmos cm uma das duas possibilidades pensamentais, © ‘air, por isso, em unilateralidades abstractas. O segundo ofe- 0 MARIO FERREIRA DOS SANTOS rece 0 panorama da légica de maneica pritica e segura, dando as regras fundamentaisparaum pensimento formal concxionado, € permite, finalmente, pela dialéctica e decadialéetica, o estudo {dos aspectos que nio pertencem a uma formalidade, mas que io imprescindiveis para que elas se déem, 0 que oferece uma base para uma visio concreta Dessa forma, habitua o estuxdioso a ter uma visio global dos factos € permite, que possa prever, com segusanga, os argu mentos contrérios, ¢ evitar que o acusem de unilateralismo, Com o tereciro, poderd ter uma visio geral da psicologia, do funcionamento do nosso psiquismo, 0 que oferece, no sé uma grande base cultural, como também © habilita’ a empreyar praticamente os conhecimentos ¢ a saber aproveitar as oporte. niidades para dar mais solidez e seguranga ao que diz. PRATICA: O GRANDE EXERCICIO Em complemento aos exercicios que até aqui temos oferecido, nio deve nunca 0 estuclioso de oratéria esquecer que tox éles tendem a prepatar 0 terreao para 0 exercicio dos exercicios: a pritica oratéria ante 0 pliblico. E preciso habituar-se a enfrentar o pliblico. E pata tanto, a pritica & 0 caminho da prépria pritica A tinside, que € natural, pode ser vencida por uma sétie de priticas, O melhor exercicio & o do fortalecimento interior, seguindo as normas jd aconsclhadas. O segundo consiste em enlrentar © piblico. Como se procede? 1) Aproveitar as rodas para expor alguma coist, com base, com nexo, com solider. e seguranca. Em tédas as ocasides, em. que estamos com outros, temos oportunidade de conversar sébre certos assuntos. Trat-los sempre com seguranca, evi- tando 0 falar quotidiano. Dar, precisio © orem 3s frases. Prefericlas curtas, componclo periodos também curtes, no mi- VEENICA DO DISCURSO MODERNO a simo de tres juizas. Desta forma, evitamse as digressies que levarn a perder 0 fio do que se queria dizer, Falar pausadamente (nfo exageradamente), mastrandle da minio, sem afectagio, do que se pretende dizer. Se alguém desvia 0 assunto, nfo se preocupar. Accite 0 novo tema para permitir que varie seu modo de exposicio. Se € tlmido que deve fazer? Inicie por um processo muito fécil e de bom efeito, Se ante os companheios sente-se inibido para falar, procure ler-thes, alguma coisa. Um artigo bem eserito, um pequeno cassio, trechos de um livro, uma poesia et., tudo iso serve de oporte nidade para empregar, em volume mais alto & sua voz, familia- rizando-se com cla, ¢ facilitando-o a cnftentar os outros. Antes de usar @sse processo, faga os exercicios que aconselha ‘mos para a leitura em vor, alta ,em cast. Poder perguntar: mas se nfo sei ler com arte? No se preocupe de infcio. $0 poucas as pessoas que sabem ler bem. preciso exercitar, dominar bem a voz, usir as inflexdes ensinadas, evitar os exageros, etc. E tudo isso exige pritica, pritica, pritica, Nao se preocupe cam os defeitos que observard no inicio, Lembre-se que, pelo simples facto de perceber os seus defeitos, revela uma superioridade que The ser imensimente benfica Pois quem & capaz de notar seus defeitos, # sabe que precisa ser melhor. E. se j4 sibe, conhecendo os meios de alcangar 0 progeesso, seguindo as normas aconselhadas, © adquirir! em pouco tempo. Portanto, para complemento da primeira providéncia, siga fste roteiro de exercicios: 42) ler em vor alta, em casa, dando as inflexdes notmais & von 21) er a0s outros, depois de ter feito os primeiros exercicioss 2 MARIO FEI REIRA DOS SANTOS ©) estard apto, entio, a tecer comentétios sobre o que leu a preparar-se melhor para a conversagfo entre compa- heros. Agora podemos examinar as outras providéncias: 2) Faca, primciramente, scus discursos lidos, se tiver receio desua capacidade de improvisacfo. Prefira no inicio, pequenos discursos, muito curtos, usando-os em certas ccriménias, como casamentos, baptizados, etc, 3) Faga seus discursos maiores, aproveitando dlatas solenes, etc,, mas lidoss 4) Use a palavra em piilico improvisida, depois de ter adguirido © dominio, através dos exercicios aconsethados. Inicie com temas fceis e curtos 5) Use a palavra,afinal, nas grandes solenidades, de impro- viso. Em complemento a todas esas providéncas, oferecemos uma série de anilises sobre aspectos importantes, para os quais chamamos a atengio do leitor. Pronuncie as palavras com clareza, no exercicio de Jeitura. Nio deixe de fazer os exercicios aconselhacos sAbre mimica os libiosy dauiaandy ben (ados os misculos que operam nos ‘movimentos da voz, € que jd tratamos, Experiment falar em voz baiva com as pessoas de casa, quando estéo colocadas a uma distincia de uns dex metros, e veja se elas entendem claramente 0 que pronunciou. Se 0 conseguit, fique satisfeito ¢ se rejubile. Alcangando éste ponto, atingiu um grande dominio na diesio. Quando ler um trecho, cuide bem da entonagio, Exemplifiquemos: “LA os vi, em uma sala menor, talver que metade desta, seis, ou oito, sentados nas camas onde dormiam”, Nio pocte este periodo ser pronunciado na mesma entonagio, pois nao The darfamos 0 menor brilho. Examinemos: PRENICA, DO DISCURSO MODERNO. ” 1d os ti, (paca, ergue'se um pouco a vor, quite se pre rnuncia a sflaba 2); a em uma sala menor (n0 em urna volta-se a0 exguendo-se quando da éltima silaba nor, no nwstn U0 anterior #7); salves que metade desta (aqui estamos num partntese, 0 tenn deve descer para diferenciar-se bem do torn ds palaveas anteriores, baixando-se a voz em desta, € putisi curls); seis, o1 oito, (voltase a0 tom anterior, aumentando-se ui fpouco quando se pronuncia ou otto, prolongando-se mt silaba of; pausa); sentados nas camas onde dormiam (baixa-se a vor, prolonga-se nna slaba 42, proaunciando-se o resto da frase em tom normal, baixando-se afinal em iam, pois & fim do perfodo. Procure-se o ritmo que a frase tem). Que se deduz dessa andlise? E preciso fazer sentir claramente 0 que esté em paréntese, © que & incidental do que & principal. AS PALAVRAS DE VALOR. Cuide em dar relevo &s palavras de valor. Sio aquelas que tem um papel importante, o principal, na frase. Em tOda a frase as encontrar, pois expressam a idéia principal. E. preciso descobri-las e salienti-las, Quando bé antiteses, quando duns idéias opestas sio eolo- ceadas face a face, deve dar eelevo a ambas, Exemplifiquemas: ‘O patriotismo, praticamenie, consiste, sobretudo, no traba- Tho”. (RUD. Aqui, 0 advérbio priticamente, € a palavra de valor. Nao pode ser promunciada sempre no mesmo tom esta frase. Quando se pronuncia priticamente, tem que se lhe dar a énfase, ¢ deve ser pronuncizdo mais lenta e mareadamente. O suborno, 0 nefando suborno, que campeia na politica Nefando suborno exige a énfase. Reproduzimos. « seguir um trecho, assinalando, em grifo, as palavras que merecem énfase € mudanga de entonagio: “A pattia iio € ninguém: sdo todos; ¢ cada qual tem no scio dela 0 mesmo dircito @ ideia, & palaora, 3 associagio”. (Dar a entonagio num crescendo) A pitria no é um sistema, nem uma seita, nem um monopé- lio, nem uma forma de governo: € 0 céu, 0 solo, 0 povo, a tradicgdo, a conscitacia, o lar, o bergo dos filhos e o timulo dos antepassados, a comunhio da lei, da lingua ¢ da liberdade.”* % MARIO FERREIRA DOS SANTOS Nesta frase, hi valéres diversos, € a entonagio, que acom- panlia aos valbres, precisa ser varia e consequente com éles E-xaminemos pormenorizadamente, com as entonagées corres- pondentes: “A ptria ndo & um sistema” (9 tom em sistema deve dar a impressio de quem nega, de quem refuta, de quem nfo aceita. Aqui nfo se eleva o volume, apenas se dé o tom grave de quem recusa); “nem uma seita” (0 mesmo tom € volume e com © mes:no valor anterior); “nem im monopblio” (o tom deve ser menos grave, tendendo part o agudlo, 0 volume um pouco mais alto); “nem uma fornia de governo” (eas lento, mais seguro, enée- ico, grave, mudando o tom para mais beixo, sem dimi- anit 0 volame); “é 0 cfu," (agora a entonagio é afirmativa, a vor grave, mus baixa, segura, a entonagio vem do peito, volume imais alto); “0 solo” (entonagio natural, no mesmo volume); “o povo” (der); “a tradigdo, a consciéncia, o lar” (ligados pela mesma entona- so grave, erguendo.se 0 tom part 0 agudo em lar, alongando-se a sllaba); “o benzo dos filkos eo timulo dos antepassados” (ais afectivo, mais do peito, grave, no mesmo volume anterios)s “a comunho da lei da lingua e da tiberdade” (em tom solene, na voz de ouro, num crescendo, com erguimento da cabeca). Prossigamos na andlise do trecho de Ruiz “Os que a servem sfo os que nao invejam, os que nfo is ‘natn, 05 que no conspiram, o§ que nao sublevam, os que nio fier [GA DO DISCURSO MOL NO, ” dlosilentam, 08 que na em nay sesistein, mas ensinam, mas esforgann, mets pelican, mas m, mits praticam a justiga, Porque todos os sentimentos grandes sio henigas, ¢ resident originiriamente no amor. No proprio patriotism armado, smais diffcit da voeacio, ¢ a sua dignidade, nio esti no matar, mas no morrer. A guetta, legitimamente, nio pole ser 0 exterm{nio, nem a ambigio: € simplesmente a defers. Alm désses limites, seria um flagelo birbaro, que © patriotismo repudia.” lecem, os que nile se acovarelinn, admiragio, 0 extisiase, ‘Muitas palavras de valor, mas qute, pela sua heterogencidlacte, implicam ma heterogeneidade de valoragio da vor. Vejamos: “Os que a servem sito os que nio invgjam” (Apés a pavsa do periodo anterior, que fra em tom solene, entra-se aqui hum tom grave, afirmative, em que o olhar firme convicto expresst contianca no que se vai dizer. A palavra de maior valor € inegjam, Nela o tom grave deve ser, aqui. mais afismativo}; “os que nao infamam” (deve, na entonagio, manifestarse aqui certo tom de desprezo, mas dominado pelo afirma- tivo e grave)s “os que no conspivam, os que nfo subleoam, os que no desaientam . (até) acovardam (0 tom grave, afirmativo, solene, confiante e seguro, segue num crescendo, Mas deve terse 0 cuidado que ésse ercscendo seja levemente acca: tual, pois do contrério poderia o orador perder o félego. A pauisa, aqui, deve ser mais longa, sem cair de modo algum 0 volume da voz); “as resister” (& va adversativa mas que @ nfsse deve cait, pois, oponclo-se tenazmente a tudo quanto foi dito até envio, o tom agora € enérgico, mais agudo, forte, com (5 mavilares mais fortemente apertados ¢ 0 som pronun- ciadlo com os dentes cerrado, e com expressio, com bilo nos ohos, peito inflado, punko cerrado, no gesto de %% MARIO FERREERA DOS SANTOS obstinagéo, isto é mais para baixo, numa obliqua para 0 lado diseito); “mas ensinam” (urn sortiso nos olhos, tom mais suave, sem perder a energia); “mas exforgam” (abe as mos, em baixo, voltados os dedes para cima, pronunciando esforgam lentamente, aeentuan- do a silaba for, com 0 r mais longo, sem esquecer a acen- tuagio do mas, que deve ser sempre pronunciado no mesmo tom vigoroso € enérgico); “mas pacificam, mas discutem, etc. (até) entusiasmo.” (Acene twagio do mas, pronunciando o restante num tom seme- Ihante aos anteriores, mas num crescendo, com o peito alevantado, até aleancar a palavra entusiasme, que deve ressoar longamente, clevando-se 0 tom, fazendo-se uma Jonga paust, para que as ideias se associem nos ouvintes); “porque todos... (até) amor” (tom afectivo, acentuando Benignos para mudanga de entonagio. A frase, por sen- tenciosa, deve ter o tom sentencioso, sem exagero). Pode agora o leitor, por si mesmo, proseguir exercitando-se no restante do trecho, prestando ateneio 3s palavras que mere- ccem a Enfase, como mas no morrerlegtimamente-smplesmente, € flagelo birbaro © 0 prolongar-se da prontincia da palavra repudia, com a énfase que merece © seu valor. Tome 0 leitor trechos de discursos e exercite a énfase ¢ a entonagio. Deve proceder do seguinte modo: 4) 0 trecho deve ser tomado isolado do discurso. Primeira- mente 0 leitor 0 Ie, Depois que tomou 0 conhecimento das palavras, exercita-se uma, duas, mais vezes; 4) faca a autocritica. Veja o que pode melhorar. Observe se no exagerou. Retorne 2 fazer o exercicios 2) procure eolocar-se do Angulo do ouvinte, Vejase pro- ‘tunciando 0 trecho com es olhos do ouvinte. © orador TEGNICA DO DISCURSO MODERNO- w esti num ponto alto, Ouga imaiginativamente a st pr pria vou. Logo notars os defeitos que tem. Corrja-os e retorne até aleangar a prontincia melhor do trecho, 4) Se nfo obtém progressos no primeiro exercicio, uarde 0 trecho © outro dia retorne 20 mesma, € vers que hf progresso. O subconsciente 0 ajudard. Confie nele, pois € um meio de confiar em si mesmo, AS LIGAGOES Importantissimo & este ponto nos exercfcios de leitura, No 56 & desagradavel para quem ouve alguém ler, a falta das liga- ‘des, como também é desestimulante para quem o pronuncit. As ligagdes entre as pilavras tem um efeito importante: do britho a0 discurso, evitam a monotonia, facilitam a clareza, do ceufonia, Néo se deve abusar delas, o que levaria 0 orador a0 ridiculo, Deve evitar-se as ligagées que possim provocar equi voces ou trocadilhos. Nao faga ms ligagdes nem as esquega quando necessérias, pois pode por a perder am discurso Os exemplos priticos nos mostraro com clareza: O sinal servird como indicagao da ligagio ¢ 0 sinal j como separagio: “Aspalavtasj comque-foi recebido o-met-discurso j pare cemenvolver—uma-censura, j que-nio-posso, j que-no-dlevo- deixar j sem-imediata-resposia, j porque j tal-censura, j se- hhouver, j eu j na-verdade, j nio-a-mereci.” Leia trechos ¢ cuide as ligagies, sem eair em exageros. Leia e releia © veja qual a melhor ligacéo, Com os exereicios conti nnuados, obterd, afinal, o dominio seguro das ligagies. Lembre- se que as pausissalientadas sio muitisimo curtas. As menoston- gs surgem na virgulagdo © as mais longas nos Pontos ‘Quanto As pausas mais longas ou mais curtas nfo se pode dar regras gerais. Todos os livros de oratéria que o fazem esquecem que © ten, a psicologia do assunto exigem que seja tle tomado como uma individualidade, O préiprio estudioso de oratécia deve usar o seu bom senso para evitar os excess ou as falhas, 10 MARIO FERREIRA DOS SANTOS Nunca deve esquecer que a boa distribuigio das pausas avorece a dicgio € deve aproveitar as médias © as longas para respirar, afim de facilitar a boa promtincia. DA PRONUNCIA Como acrescentamento ao que até aqui estudamos, nunca é demas salientar quanto vale uma perfeita pronunciagéo para © orador. Pronunciar tédas as palavras, de maneira que seja nltidamente express cada articulagio, € um ideal que 0 orador pore atingir, se tiver 0 cuidado de nunca abandonar os exer- icios ¢ esmerar-se na califasia, ou scja oa arte de pronunciar bem. © sotaque, 0 acento local, nfo prejudica ao bom orador, como pensim tantos, nem o colocam no ridiculo, se souber dat a entonagio justa as palavras e as pronunciar com nitider propriedade. Hi, entretanto, cerios defeitos, muito comuns entre os bra sileiros, que podem ser facilmente sandveis, Vamos a exemplos: 4) 0 s0im deasiadamente nasil. Hf certas regides do pats, onde o sotaque revela uma tendéncia a anasalar as pala- vrais. Em “Curso de Oratéria e Retérica”, oferecemos exereicios para sanar éste defcito; 8) sibilagio exagerada dos ss também facilmente sandvel; ©) vor cantada, que o exercicio ¢ a autocritica podem per: feitamente resolver Os meios indicados em nosso anterior trabalho, acompa- nhados da persistente Jeitura em voz alta, autoctiticando-sc, © procurando dominar os defeitos, terminario por favorecer tina melhoria notével na prontincia, TEMAS DE ORATORIA O estudioso de oratéria niéo deve temer abordar temas mais profundos. O que deve evitar é tratar em priblico do que no tem suficiente base para nio revelar, na controvérsia, sua ignordncia, Mas, sempre que possa, entre amigos, deve abor- AEENICA DO DISCURSO MODERNO, m dar temas de cultura. ‘Teté assim oportunidlate de ver quanto Ihe falta conhecer, quais 0s pontos fortes ¢ quai os ponte E compreensivel que para se ter uma cultura bem fandada sio necessirios anos ¢ anos a fio de trabalho ininterrupte ¢ petsistente. Mas nio deve tal facto criar ao estudiosn in mevlo ou desinimo. A cultura € adquirida 205 poucos. B sobretulo & bom senso é uma arma prodigio na mio do orador. Un bom dominio da Higica, uma ampla visio da dialectic nio Ihe permitiréo fazer afitmativas infundadas, pois sabers até onde sabe ¢ até onde pode ir. Ademais, a seguranga de que st stbe, ou de que se nio sabe infunde sempre respeito. Por outro lado, a dialéctica, por su acgio englobante, oferece recursos admirdvels para entrosat as idéias e permitir, com poucos elementos conbecidos, construir uum grande cabedal de conhecimentos, Tudo no mundo tem tum nexo € desde que conhecemos o nexo das coisas, com vim conhecimento parcial, poderemos construit uma visio ampla O orador deve ter base de humanidades e conhecer um pouco de histéria, Por outro lado, um conhecimento de psicologia é complementar, a0 lado de uma ripida visio da literatura, para que disponha de bases suficientes para enriquecer 0 discurs Os exemplos, a comparagies, as analogias entte 05 factos histdricos e os da literatura so importantes ¢ oferecem 20 orador motivos de embelezamento dos discursos. Um orador de grande cultura, tratando com seguranga clos temas em questio, provoca em todos uma atitude de admira tiva simpatia. No entanto, se tratar de temas importantes com insuficiéncia, logo parte do auditério se setiré acima dele ‘Ademais a grande cultura favorece as tclagBes humanas, pois podemas tratar do que 0s nossos companheires gostam de ouvir, especialista, por excmplo, por falta de base filosifica, no tem uma visio geral, mas parcial, apenas, do Angulo do seu saber especifico. Logo se torna desinteressante para os que no ‘© acompanham em sua citncia, No entanto, tendo cultura to MARIO FERKENA BOS SANTOS porte perfcitamente tratar do que interesst a0 ouvinte, ibrange, de todos os lados, 0 tema de que se estd tratando, ge a sem cair na aridez do especialista, como € tao comum. Nio se pense, porém, que a cultura que aqui propomos, seja aquela que razos homens atingiram, os quais foram capazes de tratar de tudo com proficitncia, Trata-se apenas de uma visio geral, cuidadosa, segura, que impega ao orador, quer na conversaeio, quer na palestra, quer no diseusso, trata do que é elevado com aguela simplicidadle, prima do lugat-comam, que 0 torna desinteressante, CONSELHOS IMPORTANTES Toda ver que possa ouvir ou ler bons oradores, nfo perea a oportunidade, Nio hi diivida que sio raras as grandes pecas ‘oratdrias © os bons discursos. Mas procure ouvir um bom Pregador. E mesmo que nio seja religios, nada perderd em ouvir um belo sermnfo, cuja arte oratdria, embora em outro tom, muito oferece para 0 orador profino. Nas ridios aparecem is vézes alguns discursos interessantes, Deve ouvirlos, observar as virtudes © o5 defeitos, e procurar aproveitar tudo quanto seja beutlivu. Todos os grandes trechos, as belas frases que Ie, anote-as Examine-as, estude-as, melhores, Acostume-se, em sum, a0 uso das belas frases, sobretudo aquelas que apresentam lo- quéncia sem 0 emprego exagerado de figueas nem de formas palavrosas. Procure dizer com simplicidade beleza, 0 que ‘uttas dizem demasiadamente omamentado, e sem ela. Ao ler um livro, encontro uma bela definiséo de alguma coisa, copie. Lew um raciocinio bem concatenado na exposi- so de uma tese, copie-o, e relciao. Encontrou um pensamento profundo, expresso em linguagem simples, mas com eloguéncia, guarde-o, FE um dito cheio de verve, uma apreciagio répida cheia de acuidade, ete., anote tudo, Faga uin repositério de belas ideias. Serd um relicirio TECNICA DO DISCURSO MODERNO 108, de belezas que procuraré, de ver enquanlo, reler. Acostume se 2 tudo isso, Quando leia um livto, escteva algumas linhas de apteci Cortijaas bem. Procure tomar 0 aspecto mais justo ¢ nt belo da obra. Se tiver tempo, faga resimos do que feu. Sobre tudo sobre uma tess. Concatene as idgias, dandodhes win forma simples ¢ eloquente. ‘Nao tome notas demais. Basta apenas algumas, as principais. ‘Também nio as faga longas nem curtas demais. Confie também tha sua meméria, © procure guardar nela 0 que encontrou dle mais belo. Deve sempre fazer exercicios de redacto. O verdadeiro orador nfo ¢ aquele que apenas sabe falar. Para alcangar 0 do- minio da oratéria, € necessirio escrever, Faga redagies sbbre os temas j4 propostes em nosis obras de oratéria. Cortija-os © guarde-os. Depois os releia, para notar os pontos fracas € os fortes, ¢ corrija-os, se encontrar motivos para tal, “A pritica da redagio tem um papel subconsciente importante. Acostuma-nos a purificar a frase, extrair dela o que hi de supéefluo, @ atingir a forma mais cuidadosa. Aos poucos nos apossamos dessa capa- cidade e, depois, ao falar, as expresses stem correctas @ as frases bern feitas. Se leu um livro do qual tem uma boa impressio, fuga um ‘esquema sobre © ponto que mais gostou, © construs, fundado rele, um discurso que procurard pronunciar a um auditério imagindrio, Se pertencer a um Grupo de Oratéria, leia-0 numa las secgGes €, sobre os tépicos principais, tega comentirios em tom de palestra. grande vantagem que oferece a redagio € acostumarino-nos a prftica da frase bem construfda e evitar assim, quando da oragio, o emprego de certas expressbes quotidianas e certos efeitos comuns da linguagem, Procure escrever com o méximo cuidado na construgio da frase ¢ sobretudo com a minima beleza € clevagio. Nuaca iow MARIO FERREIRA DOS SANTOS exquoga que o tom deve ser 0 oratério, portanto nio deve usar © estilo cxageracamente simples, mas combinar segundo. as regras que jd oferecemos sdbre 0 emprego dos estilos E nfo esqueea que a pritica da oratéria é a melhor mancira de torné-la prética € que 0 principal esercicio do estudioso & © préprio exercicio, Quem deseja ser senhor da palavra, nfo pode permanecer apenas no desejo, Tem de transformé-lo numa vontade e dae- Ihe a agio. Um pouco de sacrificio e de devotamento trardo beneficios ne Tutu. Nunca equega que oagrcutor 9 colke depois de plantar. Para um orador dissuadir ou persuadir 0 audiério Ele precisa dar iddias aos ouvintes, instruiclos; precisa agradar, precisa emocionar (mov@-los para algo), empolgélos, em suma. Pode um orador, que nada diz ao piiblico, send0 0 que 0 publica 4 sabe, dissuadir? Mas dissuadir de que? Para move lo para uma nova atitude € preciso mostrar que a que tem, de espectativa ou fo, nJo éa que melhor the conviria. E preciso ‘que instrua, indique o que deve fazer. Nio deve o orador falar por falar. Neahum auditério suporta um orador que apenas fala. Uma idéia € preciso teansmitir, uaa iddia nova, algo que oauditério ganhe, Este precisa estar certo que obteve alguma coist. Portanto, 0 ofador deve ter sempre 0 cuidado de dizer alguma coisa nova que interesse aos ouvintes ¢ que os faca aumentar os seus conhecimentos, que ele se sinta entiquecido de algo. Nada dé maior agradabilidade a0 auditério do que receber do orador algo novo, algo que alo esperava, algo que que Ihe permite ter uma outra visio das coisas, O orador agrada ‘na proporcio que dé ao ouvinte a canviegio de que, apés a eva que ouviu, éle no € mais o mesmo, agama coisa ganhou. {TEENIEA DO DISCURSO MODERNO wor Quando 0 auditério repete uma frase do oradar, ow uma idéia, pode estar-se certo que le obteve uma dis maiores victérias que a arte da palavra pode oferecer. Para tanto: clareza na expressio ¢ originalidadle na ila, Deve 0 orador evitar as formas complexas € penumbrosis, figaras complicadas e de dificil compreensio, Tanbém «love evitar as expresses rebuscadas ¢ demasiadamente téenicas, Tudo isso favorece para ser 0 orador ouvido com agrado. Todo orador deve agradar ao auditsrio, Hi ocasides em que o auditério nos € totalmente favorivel. Neste caso, a partida j& esté gana, Mas, bd casos em que certa hostlidade se insinua, € que 0 orador pode facilmente captar, [Neste caso, deve ter 0 méximo cuidado de provocar 0 agrado sem comprometcr, desde logo, a exposisio das idéias para as quais 0 auditério € host Quando sentir que j& hé uma disposigio simpética, entio, leve ¢ inteligentomente, deve dizer o que the interessa, Nestes casos, 0 exdrdio deve ser © mais belo ¢ agradivel, ¢ deve atrair 1 audit6rio. Digamos que um orador precendle combater ums ida polt- tica, que é accita pela maioria ou quase totalidade do auditéro, Se de chofre atacivla, esté perdido. Mas veja-se a génese de toda ida politica. Imaginemos que 0 orador apés fazer a studagio de praxe, comegasse asim 0 Seu exérdi “Quem poderia negar que anima a todos v6s © desejo de en deste ele para o nosso pals? Quem poderia péir em avida que em torlos 05 coragdes hd um 86 fmpeto: a grandeza cde nosst pitria? (ou a elevagio do nosso povo, ete etc,). ‘quem podria negar que desejamos toslos realizar ésse desejo? ‘Mas, se hi caminhos bons, hé os melhores. E, muitas vezes, ‘hd desvios que nos podem afastar da meta desejada, Saber cescolht-los & uma virtude imprescindivel, etc.” 108 MARIO FERREIRA DOS SANTOS FE neste tom 0 orador, 2 pouco € pouco, sem afastar-se do tema principal pode mostrar que o caminho que oferece & @ mais seguro ou o mais apropriado 3s circunstéincias, O oorador, que no mostrar fraqueza, amas convieeto, ¢ souber siguinentar, nio tendo obstinado o auditério contra le, logo 3s primers plavrs, pos tls esto de aordo gue querer (© mesmo bem, conseguird, aos poucos, persuadir pelo menos grande parte do auditério ou criar uum clima de benevoléncia que favorecerd, no futuro, 0 que descja obter. __ Muitos julgam que para ageadar um auditdrio deve-se descer 3s mais vis paises humanas, provocar 0 atumento do resent mento das massas, ou adulélas de forma servi, ete. Absoluta mente no. O auditétio sente agradabilidade quando nota a dignidade do orador. Se mostrar nobreza, domtnio de s, que estf d altura da situagio, o aucitério sentiré no orador a féaga que no tem, e 0 admirat. © orador deve agradar, mas no julgue que 0 consegue a qualquer prego. Se 0 orador se opée ao auditdrio, mas mantém sua linguagem clevada ¢ revela nobreza, serd ouvido com res. peito € com admirag Com, ‘alin ses cletentos, 0 oradorconseguitéemocionar 0 audisério, se, sobretudo, tiver habilidade no emprego ssbrio das figuras de retricae fe bem acompanhado pela vor pelox estos. , Note-se que os ouvintes esto predispostos i emogio, descjamn alcangé-la, J& encontea, por iso, 0 orador um ambiente Laven nivel, Deve saber aproveitélo. Lembrese 0 estudioso das regras que jf oferecemos € faga a prética de pequenos trechos oratGrios, nos quais busque empie {gar 08 meios para fazer brotar a emotgo _Conseguide éte ponto, pode dissuadir ou persuadir o audi- tério a tomar on nfo tomar esta ou aquela atitude, Néo quer isso dizer que basta comover 0 auditétio para dissuadilo. No VECNICA DO DISCURSO: MODERNO w nos iludamos, Muitos oradares conseguem comaver o aiario, levidlo até as explosies afectivas, e nfo o dlisnade, Passilo algun momento, e-fo que retoma ao estado anterior. fssimo, Parc isu yentas sélidos, Muitos Bisaqui, portanto, um aspecto impor dir é preciso que haja raziis fortes, argu podem ser arrastados apenas pela emosio, mas outros, que se emocionaram, podem ficilmente retornar ao estado anterior. A boa argumentacio, ligada 4 emogio, consegue persuadir. SOBRE A COMPOSIGAO DO DISCURSO Quanto As regras clissicas da composicio do discurso, que jé examinamos, nio se deve considerd-las, nem como absolutas nem, por outro excesso contritio, como o fazia Fenélon, por desprezivels, Se 0 orador tem certa liberdade de organizar o seu discurso, ale, pelo menos ter{ um inicio, um meio € um fim. Ora 0 exdrdio ado pode fugir bs regras apontadse; 0 meio, pods cofrer varifincias, mas o final, que € a peroragio, exige a “vor de couro” ¢ 0 tom sublime, do contritio que efeito terd? principal € dar a unidade 20 discurso, A unidade & um protkito da composigio. E. esta deve funcionar com aquéle intuito. A unidade deve ser dintmica, cocrente, légica, Os perlodes devem concatenar-se, de modo a estruturara unidade, um todo, E como priticamente se alcanga essa unidade? A regra & Eicil: toma-se © tema do discurso, O exérdio deve ser uma apresentacio estéica do tema. O centto & a argumentax $0 em timo déle. A peroracio & a afirmagi afectva do que se descja. uo MARIO FERKPIRA DOS SANTOS A primeira parte € senstvel, deve tocar & sensiilidade; 1 segunda parte é racional, pertence & intectualidade: a terceira deve comover, persuadir, pertence afectividade, Asim a divisio do nos espirito, como a estudamos na “Paicologia”, apresenta-se, também, no discurso. Esse deve falar aos sentidos, a0 ctrebro © a0 conagao. Estética, Légica © Dislectica, ¢ afectividade, para levar 3 Acgiio volicional (persuad A obeditacia &s regtas, jf expostas, garante a consecugio do fim desejado, Neste caso 0 discurso é uma obra unitéria, coerente © segura em seus efeitos Na passigem de um ponto a outzo do discurso, a habilidade deve ser a mais completa. Para passir do sensivel, que neste caso, €0 estético para o logico-dialectico, o tom de vor passa © plano da exposigio eo estilo deve ser temperdo, de vez enquando, com lampejos de sublime, O estilo sublime-se na pperoracio, como jé vimos. E preciso exercitar-se a pasagem de uma parte pora outra do discurso, As regras jf oferecidas so suficientes Quanto & parte da prova, nuaca esquecer as regras, sobre a ordem dos argumentos, da arte de persuadir: 1) © angumento peeswasivo: 2) 0 argamento relative: 3) 0 argumento perempidrio. Nunca esqueca que o valor do argumento depende da psico- logia dos ouvintes. Lembremo-nos das regras sBbre a escala de valores, que expusemos em “Curso de Oratéria e Retérica”. Desta forma, o argumento principal que deve vir no fim, deve ser convincente para 0 auditrio. a PEENIEA DO DISCURSO MODERNO ut Se as provas nfo sia em geral muito fortes, emuneid-hs Api ddamente, ligadas, com poucas palavres, c, © posivel, reat kis numa sintese para que possam causar bom efcit. Evite-se a secur didetica quando das provas, Nao se tome a posigio de um professor. [Nem pouco nem demais, E preciso também nfo ser curto demais nem longo demas. Nunca se deve esquecer que o estilo de um discurso deve ser um estilo falado, que se destina a ser prenunciado em voz alta, ¢ nfo um estilo erto, que € para ser apenas lido. REGRAS SOBRE O EMPREGO DAS FIGURAS Em noso “Curso de Oratéria Retbrica”, estudimos as di verses figuras, titeis a0 discurso moderno. Queremos, agora, tragar algamas regras para o sew melhor mprego, completando, assim, 0s estucdos que tivemos oportni de de fazer naquela obra Examinemos o que se deve evitar © 0 que se deve empregar. Evitar 0 emprego constante de uma palavea. Exitar os longos perlodos. Exitar 08 ec0s, as colisies, 08 sons repetids. ANAFORA Anéfora € uma repeti¢éo de algumas palavras uo int proposi oda de bom efeita quando sdbriamente empregada “'B a yds que devemos tantas obras grandioss, & a vés que devemos agradecer, & a vos que devemos sempre recordar...” Este ornamento tem muito brilho ¢ beleza. Dé nobreza e cenergia & frase, quando sbbriamente empregado, AS CONVERSOE' Certas conversfes sio tambéin muito belis. Vejamos este exempla: “Quando a fé também desaparece”. parece, a catidade desaparece e @ amor 16 MARIO FERREIRA DOS SANTOS “Pulano, que homem de talento que ele é que homem de bom coragio que ele € que alma magnfinima que cle é” Sio repetigées como tais que se podem adimitir. Mas & pre- ciso que sejam bem encaixadas “Bi a decisio o que se pede a0 noso povo, ¢ 0 trabalho pro- dutivo 0 que se pede a0 nosso povo, € executar um ideal mais alto 0 que se pede a0 nosso povol” Podemse fazer combinagées entre a angfora € a conversio, de um belo efeita “Quem atendeu a todos os chamatos? O pove. Quem res pondeu a todas os pedidos? O pove, Quem supostou todas os sacrifices? O povo”. Ou eatio: ““Aquele a quem seus amigos condenaram, aquele a quem seus particlcios condenacam, aquele & quem todos, sem ex- cepgio, condenaram ...” [As repetigées nunca devem ofender 0 bom gosto. E sig belas quanto mais bras, e valiosas quanto mais adequadas. E uma grande figura de omamento, mas.que exige o maximo cuidado e muito cxercicio. E preferivel escrevé-las, modelé-las, extrair- thes os defeitos. O estudioso de oratiria poderd consteutlas com 0 méximo cuidado, e evitar tudo quanto possa tornd-las feitas. Por outro lado, 0 tom de vor, ao pronunciftas, deve ser em “crescendo”. As idéias, por sua vez, devem ter uma ordem progressiva ou regressiva A ANTITESE A anditese, que consiste em juntar idéias conteérias, também € um meio de embelezar o discurso. __ Exemplos: “Pata os amigos, cleméneiay pata os inimigos, justia’ Ou: “Quando tados permanecemn calmos ele se agita; quando todos esperam que se aquiete, ele pOe-se em agit AFENIEA DO PISCURSO MODERNE Ww A APOSTROFE A apéatrofe, também, oferece ina belera. Deve ser wsica com parcimbnia, Ex.z “Ea ti, 6 povo, que eu me dirijo; & ati, que & sempse o sactificado, que eut clamos a ti, em queen indo morrem as esperangas de dias melhores, que eu cont Bassas exclamagdes devem ter o tom que discurso exige. Podem revelar indignagio, dor, espanto, tristeza, esperangis, anieios. O tom deveri ser o que corresponde ao clima de discurso. As apéstrofes devem ser usadas quando a grandeza do assunto o exige, e devem preteader exaltar owt indignar ou da entu- siasmo, Ef pata tais casos, pois do contritia serio indeis © inadequadas. AS INTERROGAGOES As interrogagdes exigem que tenhamos invita cuidado 0 seu emprego. Precisar ser muito clegante ¢ belss, para que pro- voquem 0 efeito desejado. Ext “Quando wilvs copecavam de tf a ago decsiva, que fizeste? Por que recuaste?” (Ou: “Quando a misria asolon os lares pobtes, onde estavann os politicos? Quando as populagées eram assoladas pela seca, pela sede € pela fore, quem veio em seu ausilio?™ Em nosso “Curso de Oratéria ¢ Retérica”, demos alguns exemplos do uso da interrogagio nos discursos. realmente sta uma das figuras mais asadas na oratéria moderna, portanto, merecedora do maior cuidado suuanto 40 emprego. “Temos plena consciéncia do que a situagio ata estd exi- gindo de nds? Prestamos a atengo que merecem os factos que se desenrolam? 1K MARIO FERREIRA DOS SANTOS Fstamos 8 altura dos nossas acontecimentas?. Somos capazes ide enfrentar as circunstincias? Saberemos resolver os nossos problemas? ‘Acaso, os nosos homens piiblicos fardo pata sf mesinos estas perguatas? Talvez nfo. Talver silenciem as interrogacies de suas consciéacias, se € que ainda as tém” A interrogagio provoca maior atengio do auditério, pois espera uma resposta, Seu uso & por isso, importante, mas o sew abuso acaba por cansar. Nos dlscursos em estilo simples, a interrogagio feita com palavras simples e diretas, que correspondem a0 nfvel dos ouvintes, oferece uma belezt, por sua vez também simples, a0 discurso, AS SENTENGAS. As sewengas io do patrimdnio da sabedoria bumana. Elas nnascem da experidncia ¢ ttm um efcito muito belo aum dis- curso. Mas devem ser de sentide hem claro, © perfeitamente adequado go tema, Devem ser evitadas as scntengas muito corriqueiris, taiscomo “quem canta seus males espanta”, “quem veste 0 alheio, na praga o despe”, “diz-me com quem andas, dirte-ci quem é&" © outras. Hi livros de sentengas, € a bibliogratia aconselhada em “Curso de Oratéria € Retérica”, apresentamos algumas obras famous © dies A vantagem que oferece a sentenga & a verdade que muitas, ‘veves encerra ¢ que nio cxige a prova, oferecendo assim um elemento de conviegio dos mais poderosos. O tom sentencioso, 40 pronuncic-las, deve ser grave, sem exagero, “Certamente hoje, ele hide recordar em sf mesmo, a pro- funda sentenga de Napolcio: “Queres conhecer teus amigos? ‘ai_no infortiinio”. Quem nfo soube ser amigo, quem nfo soube construir amigos verdadeicos aa hort da fortina, onde 5 teré quando o malogro abater sobre os seus actos? net PEENIEA DO DISCURSO MODERNO, nw Se as seatencas no exigem provas, s, pordm, podem merect-las, com finalidade de torxd-lay sinda mais lontes, ‘Mas esa prova deve ser eueta, precisa, apenas 0 suficiente par jostifictta, O uso de sentengis deve ser sdbrio, pois o excesso dé umm toni ao orador, que nem sempre é agradével. Podem, no entanto, ser mais amide empregadas nos sermdes religiosos. OS CONTRARIOS Os contrérios ofececem também uma beleza. Uma frase como esta: “Quem foi pésfido em sua amizade, poderd set um inimigo eal?” ‘Ou: “Se ele foi inepto em sua vida particular, como esperar que seja um apto na vida piblica?” (Ou: “Quem apenas olbou os interesses pessoais em sua exis- téncia, poderd olhar para os interesses priblicos, quando no per" Ou: “Quem s6 teve gestos interessados, seré capaz do desinteresse que deve animar 0 homem piblico?” ‘Ou: “Quem em toda a sua vida sempre meativ, acreditais ‘que ante 0 povo falar verdade?” E um meio de prova que deve set usico com habilidade, O efcito ¢ extraordinério, se for bem empregada esta figura. ‘A COMPENSAGAO, Outro ornamento consiste na compensacdo, Vejamos este exemplo: Sc em toda a sua vida particular 56 cuidow de seus interesss, na vida pliblica cuidard dos interesses dos outros?” “Por um lado ele & intransigente quanto aos erros dos inimi- 1408, €, por outeo, fecha os olhos aos ertos dos amigos”. 20 MARIO FERREIRA DOS SANTOS A GRADAGKO © emprego da gridagio, progressiva ou regressiva, & de grande efeito, Exs.: “Decide-se, agita-se, atace™. “Marmuta, resmunga, vorifera". Ou o inverso: “De infcio, vocifera; se resmunga; st 0 ameagam, murmurs; se 0 ata- “O povo descr, desespera-se, revolta-se” Nos exemplos de gradacio, dos contrdtios, devemos procurar ‘0 balanceamento das partes da oragio, De in‘cio é dilfci, mas, © exercicio termina por dar o pleno dominio. Consste esse balanceamento no mesmo niimero de silabas, de um lado ¢ de ‘outro. Vamos a exemplo: “A um a sorte lhe deu a felicidade; @ outro o destino he deu o inforttinio”’ Deve o estudioso de oratéria construc frases desss ¢ com pensias pelo balnceamento, O exercicio continuado dard um pleno dominio ¢ fluéncia HE certas gradagies que oferecem muita beleza. Este é exemplo célebre: “Que mais resta de uma esperanga de liber- dade, se tais homens permitem tudo quanto thes agrada, poder realizar tudo 0 que acreditam permitido, ousam tudo quanto podem realizar, fazem tudo quanto ousim, e no vém ninguém desaprovar o que fazem?" AS CORREGOES Certas corregdes, em determinados momentos, tém um papel de estimulante para exaltagbes, para reafirmagies por parte do auditério. Este exemplo nos mostra bem 0 valor de uma corregio: “Os actos que estes homens praticam desencorajama todos; melhor, slo um péssimo exemplo para todos”, Ou este outro: “Estes homens tem se esquecido dos seus de- veres para com @ pitria, melhor disei, tem traido a prépria pitria”, TEENICA BO PISCURSO MODERNO i Essas correges tem um papel importante. Se preferinos que pretendemos dizer afinal, nfo causamos o mesmo efcito, Basta que observemos se uns aceitam a primeira afirinacio, I entte 0s ouvintes os que aceitariam melhor a segunda, Acca a primeira, 6 ficil alcangar a segunda, ¢ satisic-se, assim, todos, Além disso prepara uma escala ao que se quer dizer. E esta uma das figuras mais importantes, cujo uso hibil dé {orca ¢ brilho a um discurso. A PRETERIGRO ‘Também a pretergio é outra figura de nfo menos valor. Unt cexemplo aclara € mostra a sua forga: “No quero falar do su- borno que peaticou, nem das infamias de que sua vida particular esti cheia. Quero apenas, hoje, mostrar até que ponto chegow a sua incapacidade, honestidade na malversagio dos d sua incompeténcia e a sua des aheiros ptblicos” ‘Ou enti: “Se foscereferir-me ts abras de benemeréacia que ele praticou desde a juventude, muito teria de dizer. Mas pre- firo, saientar apenas 2 sua agio nobre © proveitost na missio ‘que ora assumiu”. O REDOBRAMENTO O redobramento & uma repeticgo que serve para arplificar ou fortalecer 0 que se pretende dizer. “Infimias, senhores acusadores, inflmias sobre infmias sio as vossas alegacies”. Ou entio: “Nao te comoveram os rogos do povo nem as suas esperangas depositadas em ti, nfo te comoveram!” Qu entio: “Nia poderia colocar-te ante © povo frente a frente, traidor das esperangas populares, no poderias justificar teus actos, traidor das esperancas populares”. O redobramento pode ser feito no sb pela repetigao, mas também, pela substituigio de uma frase ou palavras somelhantes. 122 MARIO FERREIRA DOS SANTOS “Puseste abuixo a constituigio, ¢ estabeleceste um re- ime de forga ¢ de indignidade; rasgaste a constituiglo para fazer o impétio dos teus caprichos e da tua incomperéncia trans- formaclos em leis!” A COMUTAGKO A comutagéo & produtida pea mudanga da ordem das pa- lavras, que revelam pensamentos contraditérios mas que patc- com decorrer ou decorrem um do out. “O que dele se pode dizer, nfo ¢ se pode dizer”. fo que dele se diz, no “Tu nfo pores fazer 0 que queres porque 0 que fazes no queres" A HESITAGAQ, A hesitago oferece alguns momentns em que os anvintes sia. obsigados a escolher. Sobretudo quando se colocam perguntas em forma de dilemma que obrigam a escolha de um ou outro, ou de ambos. ‘Um exemplo: “Ou © governo pode nio quers quer € nfo pode, ou nem pode nem quer. Qual destas a verdadeira situagio?” Outro ex.: “Revelam tais palavras mé fé ou ignorancia, ou. ambas?” "Qual dos dois o mais verdadeiro, ou o poser da let ou a Tei do poder?” “Ante tais factos, uma pergunta nos desafia: ou confiamos no destino ov faremos 0 nosso destino?” TECNICA DO DISCURSO. MODERNO a A ELIMINAGAO, A eliminagio, que consiste em ir pasando em revista ay pes siveis ideias, para, afinal, escolher uma, pode seguir-se 4 hes tagio, Os exemplos esclarecem: “Se © que 0 governo pode ¢ nto quer, trai os interesses pdblicos; se quer e no pode ¢ incapar; se nem pode nem quer, é ademais, ineiciente”. “Nao podes alegar ignorincia, porque sabes que 0s factos no sucederam assim, Portanto, é a mé fé que te move”. Ou entio: “A Iei do poder € o abuso desenfreado da autori- dale, portanto s6 podemos desejar 0 poder da lei”. E preciso grande seguranga no uso dess figura, para que 0 efeito corresponds a0 nosso desejo. A SUSPENSKO A suspensio das particulas embeleza e di forca a um discurso, quando usida parcimoniosamente. Ex. “Homens indecisor, sem ideias, nada grande podem realizar”. A HIPERBOLE A hipérbole € sempre uma exagetagio. Mas, em alguns casos, € cla de grande beleza, © se adequa perfeitamente ao tema tratado. Por ex.: “Seu corpo é branco como a neve e seu olhar ar- dente como 0 fogo”. “Tais hipé:boles, comuns na poesia, poclem ser usadas nal oratéria, Mas convém cuidaco pata que ndo se transformer ern irdni- cas, quando demais exageradas.

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