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A VipA DOS VERTEBRADOS PARTE I DIVERSIDADE, FUNGOES E EvoLucAo NOS VERTEBRADOS s 45,000 espécies atuais de vertebrados habitam praticamente todas as partes da Terra, enquanto vertebrados hoje extintos viveram em habitats que ndo mais exis- tem. O aumento no conhecimento da diversidade dos vertebrados foi um dos produtos da expansio e das exploragdes européias que tiveram infcio nos séculos 15 ¢ 16. Em ‘meados do século 18, 0 naturalista sueco Carolus Linnaeus desenvolveu uma classifi- cago binomial visando catalogar as variedades de animais e plantas. O sistema lineano permanece como base para a denominacao de organismos vivos até hoje. Um sécuto mais tarde, Charles Darwin explicou a diversidade de plantas e ani- ‘mais como um produto da selegdo natural e evolugao e, no inicio do século 20, 0 traba- tho de Darwin foi complementado com as informagdes nascentes sobre os mecanismos de heranca genética. Esta combinagao de genética e biologia evolutiva € conhecida como a Nova Sintese, ou Neo-Darwinismo, e continua a ser a base para a compreensio dos mecanismos de evolugio. Trabalhos recentes tém ampliado nossa visio dos meca- nismos evolutivos, sugerindo, por um lado, que alguns eventos maiores na evolugao podem ser resultado mais propriamente do acaso que da seleo e, por outro, que @ seleco natural pode, por vezes, estender-se além do nfvel individual a individuos apa- rentados, populagées, ou mesmo espécies inteiras. Métodos de classificagao dos ani- mais também mudaram sua énfase ao longo do século 20, ¢ a classificagao, que come- ‘cou como uma maneira de se tentar organizar a diversidade dos organismos, tem se tornado um modo de gerar hipéteses evolutivas testaveis. A biologiae o registro féssil dos vertebrados tem estado no centro dessas mudan- as em nossa visio da vida. Estudos comparativos da anatomia, embriologia e fisiologia de vertebrados atuais frequientemente complementam o registro fossil. Tais estudos re- vvelam que a evolugdo atua através da modificagao de estruturas jé existentes. Todos os vertebrados tém caracteristicas basicas em comum, as quais s4o produto de sua ancestralidade comum, e as modificages progressivas desses caracteres podem definir © progresso da evolugdo. Portanto, a compreensao da forma e fungio dos vertebrados & bsica para o conhecimento da sua evolugao e da ecologia e do comportamento das espécies viventes. DIVERSIDADE, EvOLUCGAO E CLASSIFICAGAO DOS ‘VERTEBRADOS > = / /, Lt Le o— oN A ‘evolugiio tem um papel central na biologia dos vertebrados pois proporciona um princfpio que organiza a diversidade observada e ajuda a enquadrar as espé- cies extintas no contexto das atuais. A classificagao, inicialmente um processo visan- do associar nomes aos organismos, tem se tornado um método para compreender a evolugao. As idéias atuais sobre evolugo enfatizam a selego natural atuando a0 nfvel dos individuos como 0 mecanismo predominante na produgdo de mudangas 40 longo do tempo. Mecanismos adicionais poderiam envolver selegdo atuando em ni- veis mais altos ou mais baixos da organizacao bioldgica, assim como eventos a0 acaso. Os processos e eventos evolutivos esto intimamente associados as mudangas que ocorreram na Terra durante a historia dos vertebrados. Estas mudangas so resul- tado dos movimentos de continentes e dos efeitos de tais movimentos no climae na geografia. Neste capitulo, apresentamos um panorama do cendrio, dos participantes e das leis que governam 0s eventos que moldaram a biologia dos vertebrados, A Histéria dos Vertebrados Mencione “animal” e a maioria das pessoas pensaré em um vertebrado. Vertebrados sao freqiientemente com- ponentes abundantes e conspfcuos da experiéncia das, pessoas no mundo natural. Vertebrados também so muito diversificados: as aproximadamente 45.000 es- pécies atuais (= atualmente viventes) variam, em tama- rho, desde peixes pesando somente 0,1 grama,quando plenamente adultos, até baleias que pesam cerca de 100.000 quilogramas. Os vertebrados vivem em prati- camente todos os habitats da Terra: peixes bizarros, al- guns com bocas tio grandes que podem engolir presas maiores que eles préprios, percorrem as profundidades marinhas, as vezes atraindo presas através de luzes bri- Ihantes. Quinze quil6metros acima desses peixes, aves migrat6rias voam sobre as cristas dos Himalaias, as mais, altas montanhas da Terra. As aves podem viver em altas altitudes, nas quais mamiferos so impossibilitados de estar pela falta de oxigénio, pois os pulm@es das aves tém um padrdo de ventilagao diferente, mais eficiente na oxigenagdo que o dos mamiferos. Os comportamentos dos vertebrados sio tao diver- sos € complexos quanto suas formas. A vida de um ver- tebrado € energeticamente dispendiosa, ¢ os vertebr: dos obtém a energia necesséria do alimento que conso- ‘mem. Camfvoros alimentam-se de outros animais e apre- sentam uma grande variedade de métodos de captura de presas: alguns predadores percorrem o ambiente para encontrar as presas, enquanto outros esperam que estas, ‘venham até eles. Alguns camivoros perseguem suas pre- sas a alta velocidade, outros as trazem para a boca por suegio. Em alguns casos, os comportamentos de forrageio dos vertebrados parecem ser exatamente aque- les que maximizam a quantidade de energia obtida em relagao a0 tempo dispendido na caga; em outros, po- dem parecer predadores singularmente ineptos. Muitos vertebrados engolem as presas inteiras, algumas vezes enquanto ainda vivas e se debatendo, porém outros tem ‘métodos bastante especificos de matar a presa: serpen- tes venenosas injetam misturas complexas de toxinas, ¢ gatos (de todos os tamanhos, desde os gatos domésti os até os tigres) matam a presa através de uma mordi dda precisa no pescogo. Herb{voros comem plantas: plan- tas ndo fogem quando o animal se aproxima, mas sio de dificil digestdo e frequentemente contém componen- tes téxicos. Vertebrados herbivoros exibem um conjun- to de especializagdes para fazer frente as dificuldades de alimentar-se de plantas: estas especializagdes inclu- em dentes elaboradamente esculturados e tratos digest6rios com regides nas quais microorganismos simbiontes digerem os componentes inacessiveis ao si tema digestério dos vertebrados. A reprodugdo é um fator eritico no sucesso evolutivo de um organismo e os vertebrados mostram um conjunto surpreendente de comportamentos associa dos ao acasalamento ¢ & reprodugo. Em geral, os machos, cortejam as fémeas e estas tomam conta dos jovens, mas, ‘estas regras so invertidas em varias espécies de vertebra- dos. Os modos de reproduc empregados pelos verte- brados variam da postura de ovos a produgio de filho- tes vivos que sao grandemente ou inteiramente inde- pendentes de seus pais (jovens precoces). Estas varia- ‘ges sdo encontradas em quase todos os tipos de verte- brados: muitos peixes e anfibios produzem jovens pre- coces ¢ alguns mamiferos poem ovos. De fato, apenas as aves no apresentam variagdes em seu modo de re- producdo; todas as aves so oviparas. No momento do nascimento ou da eclosio, alguns vertebrados sao inte ramente auto-suficientes e nunca encontram seus pais, enquanto outros (incluindo os humanos) tém longos perfodos de cuidado parental obrigatério. Cuidado parental extensivo é verificado em grupos de vertebra- dos aparentemente distintos — peixes que incubam ovos nna boca, ras que incubam ovos no estomago, e aves que alimentam 0s ninhegos com um fluido denominado “lei te de pombo”, muito similar em composi¢io ao leite dos mamfferos. A diversidade de vertebrados atuais € fascinante, porém as espécies atualmente vivas constituem apenas ‘uma pequena porcentagem daquelas que j4 existiram. Para cada espécie vivente podem ter existido dez espé- cies extintas, e algumas destas ndo tém equivalentes en- tre as formas atuais. Os dinossauros, por exemplo, que dominaram a Terra por 180 milhdes de anos, so tio diferentes de qualquer animal vivente que € dificil reconstituir a vida que levavam. Mesmo os mamiferos jé foram mais diversificados do que hoje em dia: 0 Pleistoceno viu gigantes de varios tipos ~ preguigas tio grandes quanto 0s modemos rinocerontes, ¢ guaxinins € roedores do tamanho de ursos. Humanos so grandes macacos, intimamente aparentados com chimpanzés € gorilas, e muito da biologia dos humanos é melhor com- preendida no contexto de sua heranga de vertebrados. O niimero de espécies de vertebrados provavelmente al- cangou seu maximo no Plioceno ¢ no Pleistoceno, de- clinando depois. Alguns motivos de tal declfnio prova- velmente podem ser atribuidos aos efeitos de humanos sobre espécies que usavam como alimento ou que viam como competidoras, embora modificagdes no clima e nna vegetagdo também tenham sido importantes. No mun- do modemo, entretanto, os efeitos da atividade humana sto poderosos ¢ o destino de outras espécies de verte- brados é muito afetado, para o bem ou para o mal, pelas decisdes humanas. Nossas responsabilidades em rela- ‘¢do aos outros vertebrados ndo podem ser ignoradas. A hist6ria dos vertebrados é fascinante: 0 estudo acerca de onde se originaram, como evolufram, 0 que fazem e como funcionam, proporciona um ntimero sem fim de detathes intrigantes. Na preparacdo para contar essa hist6ria, devemos introduzir algumas informacées bésicas: como so denominados os diferentes tipos de vertebrados e como sto classificados, como a evolugao trabalha, € como teria sido 0 mundo no qual a historia, dos vertebrados se desenrolou. Neste capitulo, apresen- tamos um panorama do conjunto dos vertebrados e dos rocessos evolutivos ¢ das mudancas ambientais que os moldaram. Os Diferentes Tipos de Vertebrados Descrever ¢ classificar a variedade de vertebrados, vi ventes e extintos, tem se tomado mais complicado re- centemente em consequéncia das mudancas nos crtérios usados no reconhecimento de grupos naturais de orga- nismos. Muitos de nés nos acostumamos a classificar 0 vertebrados como peixes sem maxilas, peixes cartilaginosos, peixes dsseos, anfibios, répteis, aves ou ‘mamiferos. Estes nomes sao familiares; cada um invo- ca a imagem de um tipo particular de animal. Quando alguém diz “réptil”, nés pensamos em tartarugas, jaca- 16s, crocodilos, lagartos e cobras. © termo “réptil” co- munica informagdes sobre animais em particular, 0 ‘mesmo sendo verdadeiro para termos como “peixes sem ‘maxilas"e “aves”. (Os animais que reconhecemos por esses nomes ain- da existem, é claro, mas alguns receberam outros no- ‘mes e sdo agrupados de forma diferente atualmente. A razio para esta mudanga € a énfase crescente na propo- sigdo de que grupos animais s6 podem ser identificados se compartilharem uma linhagem evolutiva comum. Basicamente, o método antigo de classificagao (que pode ser denominado de sistemstica evolutiva) agrupava ani- mais com hist6rias evolutivas muito diferentes porque pareciam similares em muitos aspectos importantes. Este método produziu grupos que continham tinhagens evolutivas nao aparentadas. Em contraste, a abordagem moderna da classificagao, que é popularmente conheci- da como cladistica, somente reconhece grupos de orga- nismos aparentados por descendéncia comum, ou filogenia (phyla = tribo, genesis = origem). A aplicagao q Partel Diversidade, Fungdes e Evolugdo nos Vertebrados de métodos cladisticos esté tomando o estudo da evolu- ‘go mais rigoroso do que tem sido até agora. Os grupos naturais reconhecidos pela cladistica também so mais féceis de ser compreendidos do que 0s grupos artificiais ‘20s quai estévamos acostumados, com a excecdo de que estamos familiarizados com os nomes dos grupos at ficiais e que os nomes dos novos grupos as vezes si0 estranhos, Neste ponto, precisamos estabelecer uma base para falar sobre animais particulares, nomeando-os de novo e relacionando os nomes familiares e antigos aos novos, menos familiares. ‘A Figura 1-1 traz os grupos principais de vertebra- dos ¢ os nimeros relativos de espécies atuais, e a Tabe- la 1-1 compara os nomes dos antigos e novos agrupa- ‘mentos de vertebrados, mostrando os capitulos nos quais, as principais discusses sobre esses grupos sero encon- tradas. Nas segdes a seguir, descreveremos brevemente 0s diferentes tipos de vertebrados atuais. Feiticeiras e Lampréias (Myxinoidea e Petromyzontoidea) Unicas entre os Craniata atuais, uma vez que carecem de maxilas, as poucas espécies de feiticeiras e lampréias ‘ocupam uma posigo importante no estudo da evolugao dos vertebrados. Lampréias e feiticeiras tm sido tradi cionalmente reunidas como agnatas (a = sem, gnathos ‘maxila) ou cicl6stomos (cyclos = circular, stom boca), mas provavelmente representam duas linhagens evolutivas independentes. As feiticeiras parecem pos- suir numerosas caracteristicas ancestrais de vertebra- dos, enquanto que a linhagem evolutiva das lampréias {4 possuiu caracteres derivados nao presentes nestes ani- ‘mais viventes. A condigo agnata, tanto de lampréias como de feitceiras, no entanto, 6 ancestral ou primitiva, Lampréias e feiticeiras so peixes alongados, sem escamas e mucosos, no possuindo tecidos duros inter- nos, Sio neerbfagos e parasitas, apresentando especia- lizagdes para tais modos de vida. As feiticeiras (cerca de 40 espécies) so marinhas e ocorrem na plataforma continental ¢ no mar aberto em profundidades em tor- no de 100 metros, enquanto que muitas das 41 espécies de lampréias sio formas migrat6rias que vivem nos oce- anos e se reproduzem em rios. Tubarées, Raias e Quimeras (Elasmobranchii e Holocephali) Os tubardes tém uma reputagdo de ferocidade que a maioria das 350 a 400 espécies atuais teria dificuldade em manter. Muitos tubardes sio pequenos (15 centime- {r0s, ou menos), co tubardo-baleia, que atinge 10 metros de comprimento, éum fitrador que subsiste do plancton que retira da égua. As 450 espécies de raias so peixes achatados dorsoventralmente, freqiientemente bent6- nicos, que nadam por ondulagdes de suas amplas nada- deiras peitorais. Quimeras sio peixes marinhos bizar- 10s, com caudas longas e delgadas ¢ faces com caracte- risticas que lembram coelhos. © nome Chondrichthyes (chondro = cartilagem, ichthyes = peixes) refere-se a0 esqueleto cartilaginoso desses peixes. Amia, Lepisosteus e Outros (Actinopterygii) Os peixes sao tio diversificados que qualquer tentativa de caracterizé-los brevemente esta condenada ao fra- asso. Duas grandes categorias tém sido reconhecidas, os peixes de nadadeiras raiadas (Actinopterygii; actinos aio, ptero = asa ou nadadeira) e os peixes de nada- deiras lobadas (Sarcopterygii; sarco = lobo).. Os peixes actinopterigios que incluimos nesta ca- tegoria so chamados condrésteos, holésteos neopterigios em diversos sistemas de classificagio. A maioria apresenta corpo cilindrico, escamas espessas € maxilas com dentes cortantes. Esses peixes investem rapidamente sobre as presas, apreendendo-as na boca; eles carecem das especializagdes do aparelho maxilar que possibilitaram aos peixes dsseos avangados a utili- zagio de modos de alimentagao mais complexos. Peixes Teledsteos (Actinopterygii) Mais de 20.000 espécies de peixes enquadram-se nesta categoria, cobrindo todas as variagdes imagindveis quanto a0 tamanho do corpo, ao hdbitat e aos habitos de vida, dos cavalos-marinhos ao gigantesco peixe-lua. A maio- ria dos peixes familiares esté nesta categoria - a perca que voc# pescou na égua doce e 0 linguado que voce comeu em restaurantes. Modificagdes do aparelho ma- xilar permitiram a muitos teleésteos de serem altamente especializados quanto a seus habitos alimentares. Peixes Pulmonados e 0 Celacanto Wipnoi e Actinistia) Estes so 0s peixes Sarcopterygii. Sao os peixes atuais mais aparentados aos vertebrados terrestres. Os peixes de nadadeiras lobadas t8m corpo pesado ¢ movem-se lentamente. As quatro espécies de peixes pulmonados vivem em gua doce, enquanto a Latimeria (celacanto) € marinha. Captulo 1 Diversidade, Evolucdo e Classificagao dos Verebrados 5 [—Mniroidea + Ptromyzontoidea (0) EO ‘choices (800) ‘Aetnopterygi 73.700 Aetna + Dipnot (7) Figura 1-1 Diversidade dos vertebrados. As freas no diagrama correspondem 20 niimero aproximado de espécies atuais em cada grupo. Nomes comuns aparecem no interior do cf? culo interno os nomes formais dos grupos esto nas partes externas do diagrama. Salamandras, Ras e Cecilias (Caudata, Anura e Gymnophiona) Estes trés grupos de vertebrados so popularmente co- nhecidos como anfibios (amphi = dupla, bios = vida), devido as suas complexas hist6rias de vida, que frequentemente incluem uma forma larval aquética (a larva das salamandras e cecilias € 0 girino de sapos e 1s) € um adulto terrestre. Todos os anfibios tém pele nua (ou seja, sem escamas, pélos, ou penas), importan- te na troca de 4gua, fons e gases com o meio ambiente. Salamandras so animais alongados, a maioria terres- tre, e usualmente com quatro patas; cecflias so ani- mais Spodes aquaticos ou escavadores; e anuros (ris, sapos, pererecas) so tetrépodes de corpo curto, cabega grande ¢ patas posteriores longas, usadas para andar, ular e trepar. ‘Tartarugas (Testudomorpha) As tartarugas so provavelmente os vertebrados mai imediatamente reconhecfveis. A carapaga que recobre ‘uma tartaruga néo tem duplicata exata em qualquer ou- é Parte! Diversidade, Funcdes.e Evolugdo nas Verebrados tro grupo de vertebrados, ¢ as modificagdes morfolégicas associadas a essa carapaga fazem das tartarugas tetrpodes extremamente peculiares. Elas silo, por exemplo, os tini- cos tetrépodes com ombros (cinturaescapular) e bacia (cin- tura pélvica) internos as costelas. Tuatara, Lagartos e Serpentes (Lepidosauria) Estes trés tipos de vertebrados podem ser reconhecidos por sua pele coberta de escamas, assim como por carac- terfsticas do cranio. As duas espécies de tuatara, ani- mais de corpo robusto, encontradas apenas em algumas ithas proximas & Nova Zelindia, so os tnicos rema- nescentes viventes de uma linhagem de animais deno- minada Sphenodontia, que foram mais diversificados no Mesoz6ico. Em contraste, lagartos e, especialmente, serpentes esto atualmente no pico de diversidade. Ser- pentes so quase tio distintas e facilmente reconheci- ‘eis quanto as tartarugas, mas alguns lagartos sio dpodes como as serpents Jacarés e Crocodilos (Crocodilia) Estes tetrdpodes impressionantes (uma espécie marinha atual tem 0 potencial de crescer até 7 metros de compri- mento) sao descendentes da mesma linhagem (Archo- sauria) que produziu os dinossauros as aves. Os crocodilianos, como sdo coletivamente conhecidos, sio predadores semi-aquiticos com longos rostros arma- dos de dentes numerosos. Sua pele contém muitos os- sos dérmicos (osteodermos; osteo = 0sso, dermis = pele) localizados sob as escamas, proporcionando uma espé- cie de armadura. Os Crocodilia destacam-se pelo cui- dado parental que dedicam aos seus ovos ¢ filhotes. Aves (Aves) As aves so uma linhagem de Archosauromorpha que desenvolveu 0 véo durante 0 Mesozéico. A capacidade das aves para o vbo esté baseada nas penas que proporci nam as superficies que criam a ascensio e a propulsio, € as penas sao as caracteristicas distintivas das aves. De fato, alguns f6sseis de Archaeopteryx, a ave mais antiga conhe- Cida, foram originalmente classificados como dinossauros, ‘uma vez que nenhum trago de penas era visivel. Aves s0 conspicuas, ativas durante 0 dia (diunas), e frequen- temente vocalizam, Como resultado disso, tém sido ex- tensivamente estudadas, muitas das nossas informa gies acerca do comportamento ¢ da ecologia de verte- brados terrestres baseia-se em estudos de aves. Mamiferos (Mammalia) A origem dos mamiferos atuais pode ser tragada, atra- vés da linhagem sindpsida, até 0 Paleoz6ico Superior, a partir de alguns dos mais antigos vertebrados plenamente terrestres. Os mamiferos modemos incluem cerca de 4.050 espécies, a maioria das quais é de mamiferos placentérios Eutheria). Este nome origina-se da presenga, da placenta, uma estrutura que transfere nutrientes da ‘mae para o embrido e remove os produtos indesejaveis, do metabolismo do embriio. Quase todos os animais, familiares em todo 0 mundo sao placentéios. Os mar- supiais dominam a fauna dé mamfferos apenas na Aus- tralia, Cangurus, koalas € wombats sdo marsupiais aus- tralianos familiares. Os estranhos Monotremata, omitorrincos e équidnas, sto mamiferos ~ produzem leite para alimentar seus filhotes ~ masestes eclodem de ovos, nao nascendo ja formados como os marsupiais € placentérios. Evolugao Evolugo & 0 processo que moldou a hist6ria dos verte- brados, e 60 principio subjacente & sua biologia. A com- preensio dos principios e processos evolutivos é essen- cial para a apreciacao da diversidade dos vertebrados, jfique esta diversidade é o resultado direto da evolucio. Téias cientificas sa0 moldadas pela sociedade e pelo sistema filos6fico nos quais so concebidas e, por sua ‘vez, elas podem remodelar a sociedade e a filosofia (Qua- dro 1-1). Esse processo tem constitufdo uma parte cons- pfcua do desenvolvimento da teoria evolutiva nas socie- dades ocidentais e, mais recentemente, nos conflitos em toro do ensino da evolugdo em escolas. Grande parte do pensamento ocidental tem sua origem na filosofia sgrega, mas a evolucao ndo se inclui af. A concepgdo gre- ga de natureza é estitica ¢ a idéia de mudanga evolutiva nas espécies de plantas e animais estd alheia a0 pensa- mento grego. A filosofia de Plato foi baseada no con- ceito de ideal abstrato; as manifestagdes terrenas desse arquétipo (animais ou plantas, por exemplo) eram cépi- as imperfeitas do mesmo. Esta postura foi incorporada pela teologia cristi como a vistio de que a esséncia eter- nae inviolavel de cada objeto no mundo existia na men- te de Deus. Uma interpretacdo estrita da bfblia insiste em que tudo na Terra foi criado por Deus em sua forma presente e, portanto, nada mudou ou pode mudar. Esta visio de vida imutdvel foi incorporada ao pen- samento biol6gico ¢ ainda se manifesta em algumas pré- ticas biol6gicas. Por exemplo, as Regras de Nomenclatura Zool6gica requerem que, quando uma nova espécie é no- Caplo 1 Divrsidade, Evol ¢Classficugio dos Vetbrados 7 7 (g “dea :seperes seatapepeu i ap soxtod Souino i $0 Sopo1) 21809)3, sp1so9|a1, asseyoeyUy i (8 “deo tsnassosidey iB ‘|. ‘mwy) sosnmug e a fBKuondoon, prsojoH assepoeguy |S aE (8 “des teympdso - a) g -axted ‘opfimsa) iz a\3 soipuot;) —IS0spuoND 98S] TEIVUT : 3 8 (g ‘deo ‘sayoig) al 2 euisipe[3 MBksodomoesg. asseyoessut 3] 2 a} uBkroWounay assejoqns, =| 2 a] ag q a| Ele (“deo ssesouinb) 2 7 g| Sle neweooont gewoon aseoans | i el zl fF 3 El 2) lf ( “deo sseres ‘sagseqm) E aa €] ¢] ae iyauesqowseisy — uyouesqousseig asseioans | 4) al | El a] ale 5 3) 3] 2] 2] e] ale (9 ‘deo :seigaduey) yo a] al et ole Paprowozswoniag . af a} ye) a) g eyeworsoo49 wopIO k §) | 3 i (9 “deo ‘sesizontay) le a} dal E PapIouNs F a i ai (c ‘deo ‘oxouue) aq] ys imps0qsore4de> —— meprouporeudag o1ans S| 3] 3 a) €) & (q “deo ‘seipyose) i alee ‘erepsoysosy) erepsoysosy) o}ygns, ~ qq (2 das so;nbupqoiod . a) “ossojfouryeq) ai. g repyoysHWaH ereproyswan |] FF mo TPUaqDIp EAL ODSDDE=OD ‘sauperop exed sopeorput sojmydes so ean a1jISSeI9 Seap Sep sopeprvajduiod sep apeprTEION k Aaljax OLU el>qes vise ‘sepNIWIO UeIO} STUY SeULIO SY IpeID) waNpUOzOLY RoNpAUAISIsB HHO SaNaAtA SOPEAqaUAA SOP [EUOIDIPEN ORSeamSse|D ep opseIEdLHOD FHT BPqRI, Surcptergl (peites com mada lotada) [ ‘Amnon (expdes com embricesareseniando membrana aria) — —_—_— SO ‘eropods (ainsi com quo pass) (g “deo ‘sopeuownd saxiad) roudig (g de> towese;90) enswnsy (ew “12 "61 “seo ‘sosayuuemy yoUUEYY asSE]D, (81 ‘1 ‘et “sdeo ‘sane) saay ass) (e1 “de 1po2ou9 “sg180ef) P0201.) WAPI (51 “de9 sse9oo) saiuadieg wapiogns (61 “deo :souese}) 1u29e7] wapsoqns (1 “deo texerem) enuopouayds ‘wapsoqng yeurends w2psQ) (qi “deo ‘sedtuee) reUIpMISaL, WAPIO, (11 “deo ‘sodes ‘sey ‘wunuy WopIo, (11 “dea seyyooa) ‘euorydouwk wapid a “deo ‘sespueweyes) BI9Pe1N, WPI oudiq, wap 8 Ksaidossox3 wap, BAsoidooses assejogns| ena oD eave ons aay 28 Sara] SRDS TERA OS RIOD OT (Capiulo 1 Diversidad, Evolugto e Clasificacto dos Vertebrados ‘meada, um espécime dessa nova espécie seja designado como espécime-tipo, ou holétipo da espécie. O holstipo € depositado em um museu, onde ele serve como regis- tro permanente dessa nova espécie. O papel original do holétipo foi mostrar como a espécie era. Se vocé tives- se outro individuo que supusesse ser membro da mes- ma espécie, vocé deveria compard-lo com 0 holétipo € decidir-se. Assim, 0 holdtipo era um exemplo nico considerado ao se definir a esséncia da nova espécie. Com efeito, ele constitu‘a o representante designado do ideal Plat6nico de espécie. Nomear uma nova espécie ainda requer um holétipo, mas o pape! do holétipo mudou significativa- mente e, além do holétipo, é comum depositar-se varios, espécimes adicionais denominados pardtipos ou série paratipica. Com os pardtipos, pretende-se mostrar a amplitude de variagdo da espécie em caracterfsticas Quadro 1-1 O desenvolvimento das idéias evolutivas como 0 tamanho do corpo, coloragdo e padrdes. O holétipo, agora, define a espécie naqueles raros casos em que duas espécies ndo nomeadas foram confundi- das ¢ ambas esto representadas na série paratipica. 0 nome vai para a espécie representada pelo hol6tipo, a outra espécie recebe um nome novo. reconhecimento da importincia biolégica da varia- ‘¢40 dentro das espécies constitu a principal modificagao na, idéia de que um espécime poderia, por sis, definir uma espécie, ¢ reflete a mudanca mais significativa no pen- samento biol6gico em dois milénios € meio, desde os escritos de Platdo (cerca de 380 A.C.) até o trabalho de Darwin ¢ Wallace, no século 19. Na visdo Plat6nica, as variagdes dentro da espécie sio imperfeigdes das dife- rentes c6pias do arquétipo, ¢ nao tém significado. Para um bidlogo evolutivo, essas variagdes so a matéria prima da evolugio. O livro de Darwin, The Origin of Species by Means of Natural Selection, esgotou-se em um unico dia ao ser publicado em novembro de 1859. O fervor criado pela teoria da evolugao de Darwin continua até o presente, tendo afetado nao ape- nas a biologia como também os fundamentos fi- loséficos da sociedade ocidental. No entanto, a concepgao darwiniana de que os organismos no 840 imutaveis, mas, ao contrario, se modificam através do tempo, foi precedida por outros con- ceitos de que o mundo ndo era estatico. A idéia que prevaleceu durante a era das trevas - de que a Terra era uma entidade imutavel - come- gou a cair com as sugestdes de Copernicus ¢ Kepler de que a Terra nao é 0 centro do univer- so. As demonstragées, de Newton e outros, de ue muitos eventos fisicos seguem relages ma- tematicas precisas e, particularmente, a demons- tragdo incontestavel dos paleontélogos de que organismos extintos esto registrados como fés- seis em rochas, colocaram em questo um dos dogmas fundamentais do Cristianismo—o de que toda a vida se originou por criag&o divina e, con- sequentemente, era imutavel. Assim, a idéia de que os organismos s4o relacionados e, talvez, até descendentes de an- cestrais primitivos, ndo era totalmente nova para muitos biélogos em meados do século 19. Cien- tistas mais antigos haviam expressado a possi bilidade de animais modificarem-se ou evolui rem através do tempo. A teoria evolutiva de Darwin foi rapidamente aceita pela comunidade cientifica e, em 20 anos, tornou-se o principal arcabougo do pensamento biolégico. Que ca- racteristicas da teoria evolutiva de Darwin a fize- ram cientificamente aceitavel, quando teorias anteriores, tais como a de Lamarck, falharam? Primeiro, as evidéncias apresentadas por Darwin em suporte a evolugao foram esmaga- doras. Elas abrangiam areas tao diversas quan- to a anatomia comparada, a embriologia, a paleontologia, a geologia e a reproduco de ani- mais e plantas. A essa altura, a evolugdo n&o podia ser rejeitada como um conceito especula- tivo. Darwin documentou sua realidade com exemplos explicitos, argumentados de forma I6- gica. A descendéncia a partir de um ancestral comum explicava mais prontamente os caracte- res dos organismos do que uma multidao de (Continua) ‘Parte! Diversidade, Funciese Evolucdonas Veriebrados Quadro 1-1 (Continuagdo) criagdes especiais. Segundo, na explicagao da origem de novas espécies, Darwin forneceu 0 mecanismo, a selegao natural, que se base- ava na variagao inerente que ele verificou ser tao caracteristica de cada espécie. Em uma po- pulagdo natural, forgas seletivas, as quais pode- iam ser fatores ambientais como disponibilida- de de alimento, temperatura ou condigées de umi- dade, ou fatores biéticos, tais como predago ou competicao entre individuos, favoreceriam 08 individuos mais aptos nas condigdes daquele momento. O conceito de Darwin acerca de in- dividuos favorecidos nao se refere tanto a so- brevivéncia de individuos, e sim a sobrevivén- cia da progénie. Ele percebeu claramente que variagSes conferindo vantagem seletiva seri- am transmitidas as geragdes futuras. Variagdes desfavoraveis seriam diminuidas nas geragSes futuras e, finalmente, eliminadas. Um ponto central da teoria de Darwin é a convicgo de que a evolucdo prossegue atra- vés da acumulacao de pequenas modificagoes hereditarias e nao de grandes mudangas brus- cas, e de que as forgas seletivas atuam no in- dividuo. Além disso, foi de Darwin a argumen- tagao de que a evolugao atua sem um plano — tragos hereditarios acumulados ao acaso e se- lego natural dependendo das condicdes pre- dominantes. Por certo, Darwin nao estava a par dos me- canismos de heranga genética, uma vez que o trabalho de Gregor Mendel nao foi comunica- do até 1866 e nao recebeu ampla divulgagao até 0 inicio do século 20. No entanto, Darwin percebeu que, de alguma maneira, mudangas discretas ou mutagdes que afetam a morfologia e outros aspectos da biologia de um animal, como'o seu comportamento, ocorriam nos in- dividuos e eram herdadas. Darwin imaginou que a va-riagdo dentro de uma espécie pro- porciona 0 arcabouco sobre o qual a sele¢ao pode operar para produzir novas espécies. A evolugdo foi vista como progredindo nao ape- nas através da eliminagao de caracteres des- necessarios, mas também pela selegao de va- riagdes acumuladas ao acaso (aparecimento de novos caracteres por mutag&o ou recom- binagao). Novos atributos néo surgiram da necessidade, como postulado por Lamarck, mas sim através da atuacao continua da sele- 40 natural sobre o acumulo de variagdes nos individuos de uma espécie Embora 0 volumoso trabalho de Darwin tenha levado a répida aceitaco cientifica da evolugao, sua teoria da selegao natural encon- trou resistencia. Foi apenas na década de 20 do presente século que as evidéncias acumu- ladas, especialmente no recém-desenvolvido campo da genética, levaram a comunidade ci entifica a dar suporte a selegdo natural. A fu- 8&0 da selecao de Darwin com a teoria genéti- ca 6 conhecida como neo-Darwinismo ou como teoria sintética, a partir do livro de Julian Huxley intitulado Evolution: The Modern Synthesis. Muitos livros apresentaram dados mostrando que mutagSes pontuais e recombi- nago genética so a fonte de variagao, e que a evolugo (mudangas na frequéncia génica) geralmente prossegue em passos curtos, como resultado da selecdo natural agindo na varia- ¢40 genética. Tais processos eram considera- dos suficientes para explicar a origem dos gran- des téxons se atuassem por tempo prolonga- do. Esta concepgao do processo evolutivo é atualmente denominada microevolugao ou gradualismo filogenético. Recentemente, a hipétese de que a evolugdo prossegue através da acumulagdo lenta de pe- quenas mutagdes genéticas e/ou recombinago génica tem sido contestada por varios bidlogos que argumentam que a especiagao observa- da no registro fossil nao parece ser gradual , mas que novas espécies podem aparecer re- pentinamente (Eldredge & Gould 1972, Stanley 1975, Gould & Eldredge 1977, Vrba 1980) Subjacente a este ponto de vista apresentado vigorosamente, esta 0 fato de que as modifi- cagbes graduais ou a transigao de uma espé- cie para outra geralmente faltam no registro fossil. Freqdentemente existe uma lacuna en- tre formas reconhecidamente aparentadas, porém distintas. Com efeito, nos raros casos em que uma espécie ¢ representada por uma longa sequléncia de fosseis, suas caracteristicas nor (Continua) Capitulo 1 Diversidade, Evelucdo e Classificagdo dos Vertebrados 1 Quadro 1-1 (Continuacao) Graduafismo fiético Fregiiéocia Esruwra Tempo Equiibrio pontuado ESS I l malmente mostram variagdo, mas nao uma mu- danga direcional como esperada se a selegao natural estivesse operando. Mais do que pro- gredir através de um actmulo constante de pequenas modificagdes na estrutura, na fisio- logia € no comportamento, a evolugéo parece alternar-se entre periodos de rapida modifica- 40 € periods nos quais pouca ou nenhuma mudanga ocorre (Figura 1-2). As teorias rivais dos processos de especiagdo micro e macroevolutivos tém sido popularmen- te conhecidos por gradualismo e equilibrio pontuado. Os gradualistas esperariam que uma espécie acumulasse modificagdes estru- turais mesmo em um ambiente mais ou menos Figura 1-2 Exemplos de microevolugo (ou madificagdes gradusis) ede macroevolugio. (ou modificagbes pontuadas) apresentadas por espécies a0 longo do tempo. Nos eixos dos grafico esto plotados 0 estado do carster (por exemplo, comprimento do bico) contra 0 tempo. As varias curvas mostram a distribuigSo de frequéncias do estado daquele cardter dentro da populago em tempos especificos. A tendBncia paraespeciar, ‘ou pelo menos para adivergéncia no estado do caréter entre as populagbes, é mostrada pela separagio em duas linhagens. O evento de especiagio ocorre quando as duas populacdes tornam-se reprodutivamente isoladas, como indicado pelo sombreamento. (Modificada de E.S, Vrba, 1980, South African Journal of Science 76: 61-84.) estavel, enquanto que os pontualistas espe- rariam que uma espécie permanecesse em equilibrio estrutural, a menos que o ambiente mudasse significativamente, Central as duas visdes esta 0 fato de que o ambiente, embora estavel em ampla escala por periodos razoa- veis de tempo, oscila continuamente e, portan- to, pressiona incessantemente cada individuo. (© equilibrio pontuado proporciona uma expl- cagao para a existéncia de espécies reconhecivels a0 longo do tempo. Se espécies apareoem repen- tinamente através de répidos ajustamentos es- truturais genéticos, e ent&o permanecem em equilibrio estavel até a proxima pontuago, elas, representam entidades distintas com estrutura e periodo de existéncia definidos. 12 ‘Parte Diversidade, Funcdese Evolugdo nos Vertebrados Variacdo Biolégica A idéia de que duas pessoas (exceto gémeos idénticos) nunca sio exatamente iguais é bastante familiar. Os humanos usam diariamente a variabilidade individual em contextos que vio do reconhecimento dos amigos até a obtenco de impresses digitais de suspeitos de ctimes. A variagdo individual ndo esté limitada & morfologia, como os contomos faciais e as impressdes Cigitais; ela estende-se a qualquer caracteristica que possa ser medida, Esses tipos de variagdo so exemplos de variagiio fenotipiea. Fendtipo de um organismo significa sua forma em sentido bem amplo. Por exemplo, fendtipo pode referir-se & cor (pele clara versus escura), a0 ta- ‘manho ow & forma (alto versus baixo) ou & capacidade de desempenho (corredores répidos versus lentos). Fenétipos também podem ser definidos com base nas caracteristicas moleculares: a hemoglobina B é a forma normal da cadeia beta da molécula de hemoglobina de um humano adulto, enquanto que a hemoglobina S é a forma da cadeia beta que leva & anemia falciforme. As duas formas diferem em um tnico aminodcido: uma valina aparece na hemoglobina $ no lugar de uma glutamina. Fenstipos comportamentais também podem ser de- finidos: os guarus sdo peixes de aquério muito familiares, ocorrendo em rios naturais dos trépicos do Novo Mun- do. Em Trinidad, guarus ocorrem tanto em riachos com relativamente poucos predadores como naqueles em que 05 predadores sio abundantes, e as populagdes desses habitats diferem na coloragdo dos machos e nas respos- tas das {meas & corte de machos com coloragio bri- Ihante ou ndo (Breden & Stoner 1987). As cores vivas, dos machos fazem parte das exibigdes de corte, mas também os tornam mais visiveis aos predadores. Nas 4reas de baixa predagao, a maioria dos guarus machos, tem cores vivas, enquanto que nas éreas de alta predagao, eles so unicolores. Experimentos tm demonstrado diferengas geneticamente determinadas nas respostas das, fémeas de riachos com alta ¢ baixa predago & corte por ‘machos vivamente coloridos ou néo: fémeas de habitats, com baixa predaco preferem acasalar-se com machos brilhantemente coloridos, enquanto que aquelas de dreas, com alta predagdo preferem machos unicolores. Esta res- ‘posta aparentemente mediada pelas chances de sobrevi- véncia da prole. Machos brilhantemente coloridos produ- zem uma prole com machos igualmente coloridos. Em habitats com baixa predacdo, uma prole de machos co- loridos € vantajosa porque eles sao atraentes as fémeas, € correm pouco risco de serem comidos por predado- res. No entanto, nos habitats com alta predacdo, a prole de machos coloridos é vulneravel & predagio, eas fémeas, com tendéncia geneticamente determinada de acasalar- se com machos unicolores sio mais bem sucedidas. Estes tipos de variagdo fenotipica sto manifestagdes da variagdo genética. A evoluglo é definida como mudan- a, no tempo, nas frequéncias das diferentes formas de um gene no conjunto génico de uma populagao. Dife- rentes formas de um gene so denominadas alelos, ¢ 0s diferentes alelos produzem diferentes fenstipos. O genétipo de um individuo € sua composigao genética Lembre-se de que, em organismos com reproducao sexuada, um individuo recebe um alelo da mie e outro do pai. Usando 0 exemplo da anemia falciforme, ha {rés genstipos possiveis: se um individuo recebe a for- ‘ma normal do alelo da cadeia beta de ambos 0s pais. ele serd Hb,Hb,, ot seja, um genétipo homozigoto, produ- indo o fenGtipo normal para a cadeia beta. Um indivi- duo que receba um alelo da mae ¢ um alelo diferente do pai seré Hb,HB,, ou seja, um heterozigoto. Heterozigotos para o alelo da anemia falciforme t&m vantagens nas reas onde a maléria € endémica, apa- rentemente porque as hemécias que contém hemo- globina S colapsam quando o parasita da maléria penetra nas mesmas, e este colapso causa 0 decrésci- mo na concentragao de potéssio no interior da célula € aeventual morte do parasita (Friedman 1978). Um individuo que receba o alelo para a anemia falciforme dos dois pais ter o gendtipo HB,HB,. Estes homozigotos estio em desvantagem, pois as moléc las de hemoglobina colapsam sempre que diminui a concentragdo de oxigénio no sangue, como, por exemplo, durante 0 exercicio fisico. A evolugdo depende da existéncia de variagdo nos ‘gen6tipos dos individuos: (1) manifestada no fendtipo, (2) herdada ¢ (3) associada com diferencas no sucesso reprodutivo. A selegao natural altera a freqiiéncia rela- tiva dos diferentes alelos na populagao, ¢ essas altera- ‘Ges refletem-se em mudangas nas freqiiéncias dos di- versos fenétipos. E mais facil raciocinar em termos de fendtipos em discussbes sobre evolucio porque os fenstipos so visiveis, enquanto que os alelos nio 0 so. No entanto, os alelos 6 que s20 herdados. A variabilidade genotipicaé resultado da agao com- binada de varios processos genéticos verificados nos orga- nismos com reprodugdo sexuada, Durante a meiose e for- ‘magao de gametas (espermatozdides e 6vulos), os pares de cromossomos que constituem o genoma de um indi- viduo so primeiramente duplicados e, entio, separa- dos nos gametas que contém apenas um de cada par de ctomossomos. ( Este € 0 complemento cromossémico hapléide.) Quando dois gametas se unem para formar um zigoto (ovo fertilizado), o niémero dipléide € recu- Capitulo 1 Diversidade, Bvoluydo e Classificagdo dos Verebrados B perado: dois cromossomos de cada par estio presentes, uum do pai e outro da mae. Os alelos nao sdo entidades totalmente independentes; seu funcionamento é afetado pelos outros alelos presentes no gendtipo. Conseqilente- mente, 0 rearranjo genético que acompanha a repro- dugao sexuada € uma fonte importante de variagao fenotipica. As mutages so outra fonte de variaga de menor magnitude que o rearranjo, mas também im- Portantes. As mutagdes podem resultar de erros na c6pia do cédigo genético durante a duplicagao inicial dos cromossomos na meiose, ou podem ser causadas por eventos que precedem a meiose, tais como a exposi- ‘¢do das células sexuais & radiagao ionizante. Outros even- tos celulares podem causar modificagdes na sequéncia near dos locos genéticos nos cromossomos. Uma vez, que a ago dos alelos € influenciada por alelos vizi- nhos, essas mudangas na seqiiéncia de locos podem afe- tar 0 fenétipo. Selecdio Natural A evolucdo resulta da aco da selecao natural sobre os diversos fendtipos, e a selecdo natural atua através do sucesso reprodutivo diferencial, ou seja, a contribuigaio dos diferentes fenstipos para o conjunto génico das préxi- mas geragGes. O termo valor adaptativo é usado para descrever a contribuicao relativa de diferentes indivi- duos as geragdes futuras. Se 0 individuo A produz 100 descendentes que sobrevivem até a reprodugdo, € 0 indi- viduo B produz apenas 90 descendentes, este dltimo tem um sucesso de 90% em relacdo ao individuo A. O valor adaptativo do individuo mais bem sucedido (A, neste exemplo) é definido como 1,00¢ 0 valor adaptativo dos demais € definido em relagao ao individuo A. Logo, © valor adaptativo de B seria 0,90. Isto significa que 08 alelos representados no genétipo de B seriam sub- representados, na proxima geracao, em 10% quando comparados aos alelos do gendtipo A. Neste exem- plo, dir-se-ia que houve sele¢ao contra B, ¢ 0 coefici- ente de selecdo seria 0,10. Modos de Seleciio A selegdo natural pode afetar a distribuigao de fenstipos ‘em uma populagdo de trés maneiras (Figura 1-3). Sele- ‘gio direcional discrimina os individuos em um extremo da variagdo fenotfpica em um carster. Por exemplo, indi- ‘viduos pequenos poderiam estar em desvantagem quan- do comparados com individuos de tamanho normal ou acima do normal. O efeito da selegao direcional consis- te em deslocar, de geraco para geragdo, o valor médio do caréter em diregao aos fenstipos mais aptos. Selesao estabilizadora discrimina individuos que apresentam extrema variagao no caréter fenotipico em qualquer diregao. Ela favorece os individuos com va- lores préximos & média e pode resultar na redugdo da quantidade de variago na populagdo, mas nao altera 0 valor médio. Selecio disruptiva é 0 oposto da estabilizadora, ‘ou seja, individuos nos extremos da amplitude de varia- a0 do caréter so favorecidos, e aqueles préximos & ‘média estdo em desvantagem. A selecao disruptiva au- ‘menta a variago, mas também ndo muda o valor médio. Note-se que estas definigdes assumem que apenas um ‘modo de selegdo afeta o cardter em questio. Na realidade, ‘mais de um modo de selegdo pode ocorrer simultanea- mente, € tanto o valor médio do cardter como 0 total de variagdo podem mudar a0 mesmo tempo. E dificil de- monstrar a sele¢do natural em condigdes naturais pois forgas seletivas diferentes, ¢ por vezes conflitantes, po- dem operar simultaneamente. No entanto, so conhe dos alguns exemplos, ¢ John Endler (1986) fez uma revisio de selegao natural em campo. Niveis de Seleciio ‘Uma das reas ativas de discussio ¢ pesquisa em evolu- ‘gdo € a questdo sobre os niveis nos quais a selegao atua. ‘A evolugio pode ser definida como uma mudanga nas freqliéncias dos alelos, mas serd que a selegao atua dire- tamente nos alelos, nos fendtipos (ou seja, individuos) que tém esses alelos como parte de seu genstipo, ou ainda em nfveis mais altos da organizagao biolégica? Nos exemplos mais bem conhecidos, a selegao age através da reprodugao diferencial de individuos, porém outros tipos de selegao sto igualmente possiveis. Selegio Bénica descreve a selegio de alelos individuais. Normal- mente, um individuo heterozigoto produz némeros jguais de gametas com cada um de seus dois alelos. No entanto, podem ocorrer situagSes nas quais um dos alelos é trans- mitido em mais da metade dos gametas vidveis de um individuo heterozigoto. Este fendmeno 6 denominado distorsio da segregagio ou desvio meistico. Nesta situagdo, o alelo super-representado nos zigotos vidveis, € mais apto (deixa mais descendentes) que o sub-repre- sentado. A selecio interdémica é outra possibilidade. Um deme é uma populagdo local de uma espécie de ampla distribuigdo. Geralmente, as freqiléncias dos alelos di ferem ligeiramente de deme para deme. Se populagoes, que diferem na freqiiéncia alélica se tormarem extintas em taxas diferentes, ou se derem origem a novas popu- lagdes em diferentes taxas, a selecdo poderd atuar em todos os alelos de um deme. 14 Parte Diversidade, Funciese Evolucaonos Veriebrados Direcional Eslabilzadora AA SIN. | | Figura 1-3 Trés tipos de selegio: direcional, estbilizadora e disruptiva. [Em cada caso, 0 eixo vertical represen- ‘wa proporydo de individuos, ¢ 0 eixo horizontal mostra a amplitude de vari- aslo. Os contomnos dos diagramas su- periores mostram a variagéo inicial na populagio. Os individuos nas éreas sombreadas estio em desvantagem em relagio ao restante da populagio. Os diagramas inferioces mostram a varia- $80 nas populagses apis a selegao Ck, valor médio) Disruptiva Essa idéia pode ser estendida considerando-se que diferentes espécies podem ter caracterfsticas que as tor- ‘em mais ou menos provaveis de serem extintas. Por exemplo, espécies com pequena distribuig&o geografi- ca podem ser eliminadas por mudangas locais no ambi- ente, tais como enchentes ou secas, ao passo que espé- cies com ampla distribuigdo geogréfica stio menos vul- nerdveis 20s efeitos de alteragdes locas. A mesma linha de raciocinio pode ser aplicada a outras caracteristicas das espécies — selego de habitat estreita versus larga, por exemplo, ou habitos alimentares especializados versus generalizados. A taxa de especiagdo também pode estar sujeita 4 selecdo. A suposigdo € que uma linhagem evolutiva que origina nova espécie rapidamente tem ‘menor probabilidade de tornar-se extinta do que uma linhagem que especia lentamente. Se essas caracteristi- cas das espécies sdo geneticamente determinadas, elas podem estar sujeitas a uma seleco ao nivel de espé- cle. Esta ainda € uma hipdtese controvertida; uma dis- ccussio mais detalhada pode ser encontrada em Jablonski (1986). Evolugao de Sistemas Complexos Os organismos sdo entidades extraordinariamente com- plexas e aquela complexidade ¢ uma das principais ra- 26s pelas quais so tio fascinantes. Tentaremos ilustrar esta perspectiva ao longo deste livro enfatizandoas ma- neiras pelas quais a ecologia, o comportamento, a mor- fologia e a fisiologia interagem nos vertebrados viventes, € refletindo sobre como interagdes similares no passado podem ter influenciado a evolucdo de vertebrados. Como tais sistemas complexos evoluem? Trés ex- plicagdes gerais tem sido propostas: aos saltos, evolugao ‘em mosaicoe progressio correlata. A hip6tese dos saltos sugeriu que a mistura de caracteres que distinguem um mamffero de um réptil, por exemplo, poderia ter sido adquirida de uma s6 vez como resultado dos efeitos 20 acaso da mutagdo e da recombinagao genéticas. Esta hipétese, que esté associada com 0 infcio do século 20, no € suportada por qualquer de nossos conhecimentos atuais sobre os mecanismos do desenvolvimento ou so- bre o registro fossil. A hipstese da evolugio em mosaico e a hipstese relacionada da progressio correlata so mais consis- tentes com aquilo que observamos durante 0 desenvol- vvimento embriondrio de vertebrados e no registro f6s- sil. £ uma observagio banal que os organismos sio ‘mosaicos de caracteres ancestraise derivados. Por exem- plo, sua mio (= pé anterior) € muito parecida com o pé anterior de um lagarto, mas 0 seu pé (= pé posterior) é bastante diferente daquele de um lagarto, Similarmente, seus olhos sdo essencialmente 0s mesmos que aqueles de um lagarto, mas seu encéfalo apresenta uma tremenda elaboragdo de algumas regides, quando comparado com © encéfalo de um lagarto. A distingto entre evolugéo em mosaico e progresstio correlata focaliza-se na quan- tidade de interagdo que ocorreu entre os grupos (isto 6, pé anterior, pé posterior, olho, encéfalo) durante aevo- lugo. Evolugdo independente dos grupos devido a res- postas coincidentes ao mesmo ambiente novo & evolu- ¢40 em mosaico, enquanto que uma interago na qual modificagdes em um grupo influenciam modificagbes em outros grupos é progressao correlata. Evolupdo em mosaico e progressdo correlata so dois extremos de uma linha contfaua em vez de consti- tufrem altemativas mutuamente exclusivas; exemplos pparticulares podem situar-se em diversos pontos ao longo da linha. Um exemplo particularmente bom e que sera Caplulo 1 Diversidade, Evolusao e Classficagdo dos Veriebrados 15 tratado com mais detalhes neste livro, € a evolugao dos ‘mamiferos a partir de animais primitivos, semelhantes aos répteis. Esta transi¢o envolveu uma multido de modificagoes entre sistemas interdependentes. A endotermia (isto 6, a regulagdo da temperatura do corpo por meio de calor produzido pelo metabolismo de um animal), por exemplo, requer um mecanismo fisiol6gico para a produgdo de calor (alta taxa metabélica) e um me- canismo morfolbgico para reter calor (um revestimento isolante de pélos), sendo que nenhum desses aspectos € vantajoso a menos que um outro ja esteja presente. Esta situagdo “catch-22” é discutida no capitulo 4 e a se- qléncia do aparecimento das modificagGes na estrutura esquelética, na dentig’o, no cuidado parental e no de- senvolvimento do encéfalo, que distinguem mamiferos de répteis, & descrita no capitulo 19. No caso dos mami- feros, vemos claramente um processo de progressio correlata, no qual modificagées na estrutura esquelética foram associadas com modificagdes na locomocao, na fisiologia, na reprodugao € no cuidado parental. Valor Adaptat Definimos valor adaptativo como a contribuigdo gené- tica relativa de diferentes individuos as futuras gera- ges, € a descrevemos em termos do ntimero de des- cendentes produzidos por cada individuo. Esta é uma super-simplificagao no sentido de que os individuos de uma espécie tm alelos em comum e, quanto mais proxi ‘mamente aparentados forem dois individuos, maior seré a proporgao de alelos compartilhados. Irmaos, por exem- plo, tém, em média, 50% de alelos em comum, e meio- irmaos (um pai em comum e outro diferente) compar- tilham 25% de alelos. Como 0s alelos € que sdo trans- mitidos de geragao para geragao, € possivel que um indivfduo aumente seu proprio valor adaptativo (ou seja, transmitindo alelos idénticos aos seus) auxiliando um parente ater sucesso na reprodugdo. Por exemplo, quando seu irmao se reproduz, ele transmite a prole (que so seus sobrinhos) metade dos alelos que compartilha com voce, € 25% dos alelos no genstipo desta prole so os mesmos de seu genétipo (50% dos alelos compartilhados por irmaos x 50% dos alelos no genstipo da prole). Sua prépria prole tem 50% dos alelos de seu gen6tipo, ou seja, duas vezes mais que seus sobrinhos. Tudo 0 mais sendo igual, dois sobrinhos so 0 equivalente de um filho seu em termos da transmissio dos seus alelos as ‘eragGes futuras. Os mesmos céleulos podem ser apli- cados a relagdes genéticas progressivamente mais dis- tantes. O ponto importante é que a reprodugao de pa- rentes contribui para o valor adaptativo do individuo. ‘0 Inclusivo Em algumas situagdes, ajudar os parentes a reproduzir-se ‘com sucesso pode ser a melhor maneira de um individuo aumentar seu proprio valor adaptativo. Acredita-se que este principio do valor adaptativo inclusivo esteja subjacente a muitos comportamentos altruisticos de mamfferos e aves (capitulos 18 23). Variagdo e Evolucdo A variagdo genotfpica e fenotipica é 0 material sobre 0 4qual a selego natural opera, mas nem todos os tipos de variagdo so sujeitos a selegdo € as caracteristicas da biologia de certas espécies podem aumentar ou dimi- nuit a importancia da selecdo. Em primeiro lugar, a va~ riagdo deve ser hereditéria para que a selegao atue so- bre ela, Isto significa que @ variagao nos caracteres fenotipicos deve ter uma base genética e que os pais que apresentam um caréter em particular devem produzir uma prole que também manifeste esse cardter. Nem toda a variagdo apresenta base genética e muitos caracteres que tém base genética também sio afetados pelo ambiente. © tamanho do corpo das tartarugas, a0 eclodir, é um exemplo dessa interagdo entre variagdo genéticae induzida pelo ambiente. Tartarugas recém-eclodidas nao recebem qualquer cuidado parental: elas devem escavar seu cami- ‘nho para fora do ninho, através do solo, encontrar a 4gua € comegar a obler alimento inteiramente por meio dos pr6prios esforgos. Provavelmente, & desejavel que a tar- taruga fémea produza os maiores filhotes que puder pois 0s maiores recém-eclodidos terdo mais forga para esca- var, mover-se-do mais rapidamente para a dgua e pode- ro capturar uma variedade maior de presas que os indi- ‘viduos de menor tamanho. O tamanho da tartaruga re- cém-eclodida esté correlacionado com o tamanho do ovo do qual provém, e algumas tartarugas fémeas colocam vos maiores do que as outras. Tudo 0 mais sendo igual, fémeas que poem ovos maiores produziriam jovens maiores, Sendo mais aptas que as fémeas que colocam ‘vos menores. No entanto, a disponibilidade de agua no ninho também afeta o tamanho dos jovens ~ ninhos em solo timido dio origem a recém-eclodidos maiores que 108 de ninhos em solo seco (Figura 1-4). Além disso, os jovens provenientes de ninhos \imidos também conse- ‘guem rastejar e nadar mais rapidamente do que aqueles de ninhos secos. Este componente da variagdo do tama- nnho do corpo dos jovens nao tem base genética © no pode ser trabalhado pela selegao natural. Se a selegio agir neste tipo de variagao (c este tipo de selecdo ainda no foi demonstrado), deve ser indiretamente, através da redugao do valor adaptativo de tartarugas que esco- Them locais secos para 0 ninho. 16 Parte Diversidade, Fungies« Evolucdo nos Veriebrados Figura 1-4 Estas duas tartarugas recém-eclodidas (Chelydra serpentina) sio provenientes de ovos colocados pela mesma fémea. Os ovos eram do mesmo tamanho quando foram postos e adiferenca no tamanho dos filhotes recém-eclodidos representa um efeito ambiental. A tartaruga da esquerda eclodiu de um ovo incubado em substrato tmido, enquanto que ada diteita € proveniente de um ovo incubado em substrato seco. (Fotografia, cortesia de Gary C. Packard.) Variacio Sujeita a Selegao Natural Algumas fémeas de tartarugas tém um gen6tipo que re- sulta em ovos grandes, com grande quantidade de vitelo, ou seja, hd uma variag&o individual. A variagao indi dual € 0 tipo de variagdo na qual geralmente se pensa em termos de selegio natural — alguns individuos sao maiores que outros, ou mais répidos, ou mais colori- dos, ou mais agressivos. A lista de caracteres pode ser indefinidamente estendida e esses tipos de diferengas dependem do acaso quando gametas se combinam para formar um zigoto. Os efeitos da recombinagao genética e da mutagio levam a diferentes gen6tipos e a diferentes fendtipos, e a selec pode atuar sobre essas diferencas. A variagao individual geralmente € continua, isto 6, alguns animais so pequenos, outros so grandes ¢ a maioria esté entre esses extremos. Variagio continua € a situagao ilustrada na Figura 1-3. Um segundo tipo de variagdo ¢ a descontinua: ao invés de haver uma curva de freqléncias em forma de sino, a variagio descontinua pode ser separada em categorias distintas. O polimorfismo (poly = muitos, morpho = forma) é um tipo comum de variaga0, descontinua. A Figura 1-5 ilustra 0 padrao de polimorfismo em um sapo porto-riquenho, 0 coqut. Alguns individuos so uniformemente coloridos, alguns apresentam listras ao longo dos lados do corpo e outros {tm padres mosqueados de manchas escuras. Esses di- ferentes padrdes so geneticamente determinados ¢ a ‘Capitulo 1 Diversdade, Evolucio Clastificacio dos Vertebrados 7 prole herda os padrées de seus pais. E possfvel encon- ttar individuos com todos esses padrdes em qualquer populacdo desses sapos, mas alguns padres so mais comuns em um tipo de habitat do que em outros, pro- vavelmente porque certos padres sio especialmente cripticos (dificeis do predador detectar) em habitats parti- culares. Em gramados, por exemplo, os padrdes de listras, ‘ocorrem em alta frequiéncia, enquanto que em florestas 98 padrdes unicolores e mosqueados so mais comuns. Em éreas gramadas, os predadores véem os sapos con- tra um fundo de talos de gramineas e o padrio listrado mistura-se com 0s talos retos e de cores claras. Em flo- restas, os predadores frequentemente véem os sapos contra um fundo de folhas caidas; hé muito poucas li- has retas € 0s padrdes mosqueados e uniformes prova- velmente so mais cripticos que as listras. As diferen- as nas freqléncias dos padres em diferentes habitats, indicam que a selego natural atuou no conjunto génico, modificando as frequéncias dos alelos que produzem esses padrdes. O dimorfismo sexual (di = dois) é um caso especi- al de polimorfismo no qual machos e fmeas de uma es- pécie diferem em caracteres sexuais secundérios, como tamanho ou colorago. O dimorfismo sexual resulta dos o © Figura 1-5 Padrdes polim6rficos do coquf porto-riquenho. Estes so quatro dos mais de 20 diferentes padres descritos: (a) mosqueado; (b) unicolor:(c) lstras laterais largas: (d) lstra

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